Os especialistas em oncologia têm estado a alertar para a elevada probabilidade de um aumento significativo de mortes por cancros devido à instabilidade e decisões do Serviço Nacional de Saúde (SNS) durante a pandemia, que levou à redução dos rastreios, diagnósticos e tratamentos. Porém, a análise do PÁGINA UM à base de dados da morbilidade e mortalidade do Portal da Transparência do SNS mostra um surpreendente paradoxo: nunca como nos últimos meses se morreu tão pouco nos hospitais por causa de cancros. Ou os doentes terminais andam a ser enviados para casa ou há embuste…
Em cerca de dois anos de presença da covid-19 em Portugal, não cessaram os alarmes nos últimos meses sobre as consequências da gestão da pandemia nos atrasos nos diagnósticos de cancros. No final do ano passado, a Organização Europeia contra o Cancro estimou que mais de 100 milhões de rastreios não se tinham realizado ao longo de 2020 e 2021 no Velho Continente.
Em Portugal, os especialistas na área Oncologia têm alertado para a iminência de uma “pandemia” de cancros, e de mortes, por via da suspensão e atraso de rastreios e diagnósticos, tanto por razões políticas como pelo medo de muitas pessoas em frequentarem unidades de saúde.
Porém, Portugal é um país suigeneris. De acordo com a base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar, disponível no Portal da Transparência, o mês com menos mortes causadas por neoplasias foi Janeiro deste ano, o último com informação desde 2017. Mas este não foi caso esporádico.
De acordo com a análise da informação realizada pelo PÁGINA UM, a redução da mortalidade causada pelos mais diversos cancros tem sido anormalmente baixa desde o início da pandemia da covid-19, em Março de 2020. Com efeito, no período pré-pandemia – e desde Janeiro de 2017, data do início do registo –, os óbitos em meio hospitalar por neoplasias situavam-se entre os 800 e os 1050 por mês. Ou seja, sem grandes oscilações.
Geralmente, os valores ligeiramente mais baixos observavam-se no Inverno, mas por uma razão simples: devido à fragilidade de muitos doentes oncológicos, muitas mortes são “antecipadas” por outro tipo de doenças, sobretudos infecções respiratórias como as pneumonias. Ora, tal significava que as doenças respiratórias acabavam por ser consideradas, em alguns casos, a causa do óbito, e não os cancros.
Em todo o caso, com a chegada da covid-19 em território português, as mortes por cancro tiveram uma queda acentuada. Em Março de 2020, os óbitos desceram para 758. Comparando com os meses homólogos do período anterior à pandemia foi uma descida significativa: em 2017 tinham morrido 914, em 2018 foram 873 e em 2019 situaram-se nos 955.
Óbitos totais por mês, por neoplasias, registados nas unidades do SNS entre Janeiro de 2017 e Dezembro de 2021. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
Em Abril de 2020, os óbitos por cancros registados em meio hospitalar ainda desceram mais: somente 678. Nos meses seguintes, apesar de os valores subirem ligeiramente nunca superaram os 830 óbitos.
Com o Outono e Inverno de 2020-2021 – que marcaria o período mais crítico da pandemia, com as mortes por covid-19 a subirem, atingindo, em alguns dias de Janeiro valores a rondarem os 300 óbitos –, os desfechos fatais atribuídos aos cancros reduziram ainda mais. No período compreendido entre Novembro de 2020 e Janeiro de 2021, óbitos mensais situaram-se entre os 700 e os 750. No total, neste trimestre registaram-se 2.173 óbitos por cancro, uma descida de 22% em relação ao período homólogo anterior.
No mês de Fevereiro do ano passado, a queda ainda foi mais notória: 514 óbitos, um valor perfeitamente atípico. Nos meses seguintes, o padrão de anormalmente baixa mortalidade por cancros manteve-se. Sempre abaixo dos 750 óbitos até Agosto, e a partir de Setembro ainda mais baixo. No último mês do ano passado, em Dezembro, as mortes por cancro nas unidades de saúde foi de 554. E em Janeiro deste ano situar-se-ia nos 469 óbitos. Note-se que, nos anos anteriores à pandemia, esta doença matou 900, 967, 980 e 933 pessoas, respectivamente no primeiro mês dos anos de 2017, 2018, 2019 e 2020 – ou seja, antes da pandemia.
Óbitos por neoplasias registados no mês de Janeiro entre 2017 e 2022. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
O absurdo está assim instalado em Portugal, e será provável que se mantenha, excepto se o Ministério da Saúde esclarecer este paradoxo, que se pode caricaturar: a pandemia “eliminou” mortes por cancro.
Obviamente, na verdade, haverá duas possíveis explicações, que poderão estar conjugadas, mas em qualquer dos casos são graves.
Por um lado, um número muito significativo de doentes oncológicos terminais tiveram – e, provavelmente, em muitos casos de forma injustificada – a covid-19 como causa de morte, inflacionado o impacte da pandemia. E, dessa forma, também de forma injustificada, a estatística dos cancros está enviesada, por subestimada.
Note-se que, nos três anos anteriores à pandemia, as neoplasias causavam por ano cerca de 11 mil óbitos, sem grandes variações, o que é normal face aos padrões epidemiológicos das doenças oncológicas em Portugal. Porém, em 2020 (com nove meses em pandemia) desceu para os 9.398 óbitos, e decaiu ainda mais em 2021: apenas 8.067 – uma descida de 28% face ao triénio anterior à pandemia. São mais de três mil mortes a menos.
No entanto, como estas estatísticas se referem somente aos óbitos registados em meio hospitalar – e, portanto, não se inclui as mortes de doentes oncológicos ocorridas em residências e lares –, poder-se-á sempre dizer – à falta da divulgação de dados oficiais pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), apesar da existência do Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos (SICO) – que os cancros passaram a dizimar menos nos hospitais, porque os doentes terminais foram enviados para casa.
Mas, se assim fosse – e significando assim que se abandonariam muito doentes à sua sorte nos derradeiros momentos de vida, o que parece pouco provável do ponto de vista humano –, deveriam então esses dados ser fornecidos de forma clara e transparente, permitindo avaliações independentes sobre o verdadeiro impacte da pandemia na evolução dos cancros.
Se assim não for, se não houver transparência, se o obscurantismo continuar a imperar, uma coisa é certa: o Governo vai anunciar daqui a uns tempos, com pompa e circunstância, que nunca como antes os problemas oncológicos estiveram controlados.
E que o Governo conseguiu recuperar todos os atrasos no rastreio, nos diagnósticos e no tratamento dos cancros. E a Estatística, se o Governo quiser, dirá que as pessoas, de facto, até morrem menos de cancro. Morreram de outras coisas, e cada vez mais, mas não de cancro… E isso será o embuste em todo o seu esplendor.
O PÁGINA UM começa, a partir de hoje, a apresentar um conjunto de análises à base de dados da morbilidade e mortalidade do Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Neste primeiro artigo revela-se que, afinal, houve muitas mortes por covid-19 que “escaparam” a tratamento hospitalar, e que a pressão sobre o SNS foi, na verdade, com excepção de um curto período (Dezembro de 2020-Fevereiro de 2021), atipicamente baixo nos dois anos de pandemia. E essa situação mostra-se evidente sobretudo a partir de Março do ano passado.
São dados oficiais. Indesmentíveis pelo Ministério da Saúde. Os registos da morbilidade e mortalidade hospitalar do Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde (SNS) revelam que, durante os dois anos da pandemia (2020-2021) morreram afinal menos pessoas nos hospitais portugueses do que nos dois anos anteriores (2018-2019).
E apesar de a covid-19 ter constituído um factor de mortalidade importante (12% dos óbitos nas unidades hospitalares) em 2020 e 2021, estranhamente, ou talvez não, uma parte relevante de doenças mortais acabaram por registar fortes quedas.
A análise do PÁGINA UM a esta base de dados do SNS – com informação detalhada por mês e mesmo por unidade de saúde, incluindo internamentos e óbitos ocorridos em unidades de saúde – desencadeia uma reflexão sobre a forma como decorreu a estratégia política de gestão da pandemia.
Nessa medida, vale a pena olhar para a evolução do registo mensal das mortes em meio hospitalar – que, sem prejuízo do aspecto humano relevante, ademais sabendo-se que houve um acréscimo importante de óbitos fora das unidades de saúde –, pois constitui sempre um indicador fundamental em termos de Saúde Pública. Neste caso, nem que seja por permitir aferir indirectamente o grau de pressão e complexidade dos casos a que sujeita o SNS e os seus profissionais.
Ora, aquilo que se verificou – pegando nos registos das mortes por todas as causas ocorridas em meio hospitalar – é que, com excepção de um curto período, entre Dezembro de 2020 e Fevereiro de 2021, o SNS não denotou uma sobrecarga. No caso de Janeiro de 2021 houve mesmo um evidente colapso com um recorde de 8.590 óbitos. No período anterior à pandemia – e desde 2017, com informação na base de dados do SNS –, nos piores meses contabilizavam-se cerca de seis mil óbitos em meio hospitalar, sobretudo no mês de Janeiro, estando associado aos surtos gripais (causadores de mais mortes por doenças respiratórias) e ao frio (adjuvante de doenças mortais do aparelho circulatório).
Óbitos totais por mês, por todas as causas, registados nas unidades do SNS entre Janeiro de 2017 e Dezembro de 2021. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
Porém, excluído esse trimestre, ninguém que agora surgisse por aqui sem saber que houve uma pandemia poderia dizer que o SNS esteve sob pressão. Pelo contrário: desde Março do ano passado, o número de óbitos mensais registados nos hospitais do SNS foi sempre atipicamente baixo (sempre abaixo dos 4.000). E esta situação observou-se sobretudo com chegada das estações associadas a uma maior mortalidade (Outono e Inverno). Por exemplo, em Dezembro passado apenas se contabilizaram 3.793 óbitos. No mês homólogo dos três anos anteriores à pandemia, os óbitos em meio hospitalar foram muito superiores: 5.089 em 2017, 4.637 em 2018 e 4.561 em 2019.
O mês de Janeiro deste ano – que já consta da base de dados do SNS – surge com 3.461 óbitos, um valor extraordinariamente baixo, tanto mais que chega a ser inferior aos meses de Verão pré-pandemia.
Mas uma análise mais detalhada desta base de dados suscita ainda mais perplexidades, e muitos questionamentos.
E a começar pelo número de mortes causadas pela própria covid-19. Apesar de ter sido considerada uma doença de elevada infecciosidade – que obrigou, na esmagadora maioria dos casos ao internamento de casos moderados e graves –, constata-se que, afinal, morreram nas unidades de saúde até Dezembro de 2021 um total de 12.837 pessoas devido à acção directa do SARS-CoV-2. Este valor é “apenas” 68% do total dos óbitos contabilizados pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) em 2020 e 2021. Ou seja, dos 18.974 óbitos por covid-19 contabilizados até 31 de Dezembro de 2021, houve 6.137 que faleceram fora de unidades de saúde, em lares ou nas suas residências.
Óbitos totais por mês, causados por covid-19 (integrados no grupo “Códigos para fins especiais), registados nas unidades do SNS entre Janeiro de 2017 e Dezembro de 2021. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
Saliente-se que, na base de dados do SNS, a covid-19 não surge explicitamente como a causa de morte, mas no grupo das doenças catalogada em “Códigos para fins especiais”. A covid-19 e sequelas associadas (código U) são praticamente as únicas doenças mortais inseridas neste grupo, razão pela qual apenas começaram a surgir a partir de Março de 2020.
Nesse mês, oficialmente morreram nos hospitais portugueses 147 pessoas com esta doença, chegando às 626 no mês seguinte. O período mais negro surgiu, como conhecido, entre Novembro de 2020 e Fevereiro de 2021: no primeiro mês deste período morreram 1.431, em Dezembro 1.643, em Janeiro 3.320 e em Fevereiro 2.512.
Até final de 2021, em mais nenhum mês se ultrapassaram os 500 óbitos. Em Janeiro deste ano – quando se registou uma vaga de casos positivos, com quase 1,3 milhões de casos –, nos hospitais morreram 560 pessoas por covid-19. No entanto, a DGS anunciou, para esse mês, um total de 1.002 óbitos, o que significa que 44% terão falecido fora de unidades de saúde. Ou então os números terão sido empolados.
Se causa estranheza esta relevante discrepância entre óbitos por covid-19 em meio hospitalar e fora das unidades de saúde – o que significará que muitos casos graves causados pelo SARS-CoV, susceptíveis de serem (como foram) letais, não terão assim tido tratamento hospitalar –, maior estupefacção surge quando se confronta a mortalidade por grupos de doenças durante a pandemia com o período homólogo anterior.
Nesta primeira parte, analisamos primeiro as doenças respiratórias – que, supostamente, “beneficiaram” do desaparecimento da gripe e, segundo a DGS, das medidas não-farmacológicas.
Óbitos totais por mês, causados por doenças do aparelho respiratório, registados nas unidades do SNS entre Janeiro de 2017 e Dezembro de 2021. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
No período 2018-2019, segundo a base de dados do SNS, contabiliza-se a ocorrência 27.285 óbitos por doenças respiratórias. Ou seja, ainda sem influência do SARS-CoV-2. Com a pandemia, durante os anos de 2020 e 2021, as doenças respiratórias não-covid decaíram para apenas 21.171, uma estrondosa queda de 22,4%. Ou, se se quiser, em valor absoluto 6.114 pessoas.
Deste modo, se se juntasse a covid-19 às doenças respiratórias, então durante a pandemia (2020-2021) terão ocorrido em meio hospitalar um total de 34.008 mortes, o que contrasta com 27.285 óbitos no período 2018-2019.
Nesta medida, só por aqui, o impacte líquido da pandemia será muito menor do que propalado: morreu-se muito por uma nova doença, mas, como em consequência “desapareceram” doenças respiratórias que tinham um impacte letal relevante, o saldo não se mostra assim tão elevado.
Óbitos por doenças do aparelho respiratório registados no mês de Janeiro entre 2017 e 2022. Fonte: SNS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.
Contas feitas, em meio hospitalar, o acréscimo líquido é de 6.723 óbitos. Mas atenção: na segunda parte da análise, amanhã, veremos que é redutor estar apenas a usar, para calcular o impacte líquido do SARS-CoV-2, apenas as doenças respiratórias.
Aliás, nos últimos meses, a evolução da mortalidade das doenças respiratórias tem sido absurdamente atípica. No ano passado, houve apenas um mês (Janeiro) em que se ultrapassou a fasquia das mil mortes por este grupo de causas. Em 2017 houve sete meses; em 2018 registaram-se oito, em 2019 foram seis, e em 2020 foram apenas três, curiosamente os do primeiro trimestre, ou seja, imediatamente antes e no mês da chegada da covid-19 a Portugal.
Ou seja, literalmente, a covid-19 “sufocou” uma importante parte das doenças respiratórias.
No passado mês de Janeiro – que já consta na base de dados do SNS –, por doenças respiratórias não-covid foram contabilizadas 632 mortes, um valor completamente irrisório para um mês de Inverno. A título comparativo, em Janeiro de 2017 registaram-se, em meio hospitalar, 2.169 mortes por doenças respiratórias, ou seja, cerca de três vezes mais.
Os centros de vacinação COVID (CVC) no Alentejo não dão alternativa imediata a quem não queira ser inoculado com doses de lotes que beneficiaram de extensão ad hoc do prazo de validade. Infarmed diz agora que houve autorização da Agência Europeia do Medicamento, mas não disponibiliza o documento nem apresenta justificação para o secretismo da medida. Ministra da Saúde mantém silêncio, não se sabendo sequer quantas pessoas foram vacinadas nestas condições nem sequer como e quem avaliará eventuais efeitos adversos da decisão de maximizar o uso de vacinas apenas para, supostamente, se poupar algum dinheiro.
Diversos Centros de Vacinação COVID (CVC) do Alentejo que estão a usar lotes de vacina fora de prazo de validade – cuja administração obteve uma autorização informal do Infarmed, através de um simples e-mail enviado em Março, conforme ontem divulgado pelo PÁGINA UM – estão a recusar uma alternativa imediata aos utentes que não queiram ser injectados nessas condições. Se recusarem, as pessoas não são vacinadas com outro lote, e ficam a aguardar convocatória em data incerta.
Contudo, não é certo que todos os utentes estejam a ser avisados, uma vez que o consentimento informado para a administração destas vacinas é meramente oral, sem comprovativo escrito sobre as condições das vacinas e efeitos adversos previsíveis apresentados de forma quantitativa.
Em causa está assim um número indeterminado de doses pertencentes a três lotes específicos de vacinas contra a covid-19, e que receberam uma autorização ad hoc para continuarem a ser administradas após o prazo de validade. São os casos dos lotes FP9632 e 1F1047A da vacina Comirnaty/Pfizer (com prazo de validade até 14 de Março e 5 de Março, respectivamente), e ainda do lote 000063A da vacina Spikevax/Moderna. Para o lote desta segunda vacina, alguns frascos tinham expirado o prazo de validade em 27 de Fevereiro e outros em 4 de Março.
Em circunstâncias normais, os frascos destes lotes deveriam ser imediatamente destruídos após esgotar-se o prazo de validade, segundo as normas do “resumo das características do medicamento” – inseridas no Portal Infomed. Porém, em Março, através de uma simples comunicação por correio electrónico à Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo, o Infarmed concedeu uma autorização de prorrogação do prazo de validade .
Essa autorização especial não consta, porém, em qualquer das habituais circulares informativas do Infarmed nem sequer foi introduzida, com identificação dos lotes em causa, no resumo das características do medicamento.
Ontem à noite, pelas 22:21 horas, o PÁGINA UM recebeu um esclarecimento do Infarmed – por “solicitação do gabinete de comunicação do Ministério da Saúde”, informando que “a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) aprovou, este ano, a extensão do prazo de alguns lotes de vacinas contra a COVID-19, em condições de ultracongelação”, acrescentando ainda que “a extensão de prazo, de três meses e de seis meses aplica-se a todos os Estados-membros e tem efeitos retroactivos relativamente a lotes de injetáveis produzidos antes da aprovação.”
Em vez de uma circular informativa, que esclarecesse e justificasse a medida de prorrogação do prazo de validade, o Infarmed decidiu apenas comunicar por correio electrónico a sua decisão ad hoc à ARS do Alentejo. Ignora-se quantas doses já foram usadas dos lotes em causa.
No entanto, apesar de reiterado o pedido de indicação dos lotes autorizados, o Infarmed não respondeu. O PÁGINA UM tentou obter informação no site da EMA, mas sem sucesso. Existem, no entanto, autorizações especiais de prorrogação de prazo para certos lotes da vacina da Pfizer pelo National Health Service (NHS), do Reino Unido, mas nenhum dos lotes são aqueles que o Infarmed autorizou ad hoc para o Alentejo.
O Infarmed também não quis explicar os motivos para não ter sido produzida qualquer circular – como é habitual sempre que formalmente existe uma decisão do Conselho Directivo – sobre esta matéria.
No seu esclarecimento de ontem, o INFARMED diz apenas que a decisão de “utilização das vacinas” fora do prazo se baseou em “estudos de estabilidade apresentados pelos laboratórios”, mas não os enviou nem nunca os disponibilizou.
Após a recepção deste esclarecimento, o PÁGINA UM questionou ainda o Infarmed no sentido de saber se o regulador informou a ministra da Saúde sobre a decisão de administrar vacinas fora do prazo sob autorização “especial”. E questionou também o Infarmed sobre se não se estaria perante um “ensaio clínico” ilegal, porquanto, como o PÁGINA UM salientou ontem, nos e-mails entre o Infarmed e a Administração Regional de Saúde do Alentejo prevê-se a monitorização específica das pessoas injectadas com vacinas fora do prazo inicial de modo a avaliar posteriormente os efeitos adversos e a efectividade vacinal.
O PÁGINA UM também insistiu, junto dos três assessores de imprensa da ministra da Saúde, Marta Temido, para saber se o Governo tinha conhecimento deste expediente autorizado pelo Infarmed, para conhecer se outras ARS foram abrangidas, quantas pessoas tinham sido vacinadas com estes lotes e se esta estratégia será mantida. Não houve, até agora, qualquer resposta.
No Alentejo, foram administradas a um número indeterminado de pessoas vacinas contra a covid-19 fora do prazo. A decisão foi tomada no passado mês de Março em articulação entre o Infarmed e a Administração Regional de Saúde daquela região, mas sem base legal e contra as normas dos fabricantes. Apesar de garantir ser um processo seguro, o Infarmed acabou por estabelecer a obrigatoriedade de recolha de informação sobre as pessoas injectadas com estes lotes para posterior avaliação de eventuais acréscimos dos efeitos adversos ou de redução da efectividade vacinal. O PÁGINA UM revela os lotes das vacinas da Pfizer e da Moderna que foram injectadas já depois de expirar o prazo de validade. O Ministério da Saúde (ainda) não comentou se sabia desta decisão nem esclareceu (ainda) se houve mais lotes fora do prazo usados em outras regiões do país.
O Infarmed autorizou o uso de três lotes de vacinas contra a covid-19 fora do prazo de validade em centros de vacinação do Alentejo durante o mês de Março e Abril, em condições que aparentam um ensaio clínico não autorizado, que não cumpre os mínimos princípios éticos e de consentimento informado.
De acordo com mensagens electrónicas a que PÁGINA UM teve acesso, na noite de 14 de Março passado a directora do Departamento de Contratualização da Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo, Sandra Silva, informou diversos responsáveis daquela região que “tendo em consideração as quantidades de vacinas existentes nas ARS com prazo de validade excedido”, o Infarmed tinha autorizado a sua utilização.
Em causa estava um número indeterminado de frascos dos lotes FP9632 e 1F1047A da vacina Comirnaty/Pfizer, com prazo de validade até 14 de Março e 5 de Março, respectivamente, e ainda um lote 000063A da vacina Spikevax/Moderna, sendo que alguns frascos tinham expirado o prazo de validade em 27 de Fevereiro e outros em 4 de Março.
No e-mail daquela noite, além de acrescentar que seria enviada no dia seguinte “informação mais detalhada”, Sandra Silva transcrevia o parecer do Infarmed, constituído somente por duas frases escritas em português algo macarrónico: “Podem ser utilizadas as referidas vacinas dos lotes abaixo mencionadas por mais 15 a 30 dias apos o prazo de validade expirado de 30 dias referente ao prazo após descongelação, nas condições de 2C a 8C no entanto deverá ser preenchido no sistema Vacinas a administração das referidas vacinas mencionando validade e data de descongelação, de modo a monitorizar reações adversas se as mesmas existirem. Mais se informa que os referidos lotes de vacinas foram avaliados pelo Infarmed no que diz respeito à integridade do mRNA quando libertadas pelo fabricante da vacina”.
E-mail enviado pela directora do Departamento de Contratualização da ARS do Alentejo na noite de 14 de Março passado, informando sobre a decisão do Infarmed.
No site do Infarmed não consta qualquer aviso sobre esta matéria. Sobre as condições de conservação das vacinas covid-19, a última actualização é de 3 de Fevereiro deste ano, onde nada consta sobre a possibilidade de alargamento do prazo de validade.
E no Portal Infomed, e no caso do resumo das características do medicamento da vacina Comirnaty/Pfizer, além de se elencar de forma exaustiva as exigentes condições de conservação, salienta-se que, após descongelação, “os frascos para injectáveis por abrir podem ser conservados durante um total de 10 semanas a uma temperatura entre 2 oC e 8 oC, nunca ultrapassando o prazo de validade (VAL) impresso”.
No caso especifico da Spikevax/Moderna, o resumo das características do medicamento no Portal Infomed vão no mesmo sentido: “Não utilize esta vacina após o prazo de validade impresso no rótulo após VAL [prazo de validade]. O prazo de validade corresponde ao último dia do mês indicado”.
Em todo o caso, nunca fazendo referência às indicações dos fabricantes, na manhã do passado dia 15 de Março, a directora de Inspecção e Licenciamentos do Infarmed, Maria Fernanda Ralha, enviou um e-mail para ARS do Alentejo, explicitando melhor a “autorização” concedida.
Na mensagem aquela responsável do Infarmed garantia que “os referidos lotes das vacinas Comirnaty adulta e Spikevax mantém-se estáveis assumindo-se que nenhuma das outras condições de conservação/transporte aprovadas foi excedida [e que] poderão eventualmente se manter , por mais 15-30 dias, para além da validade aprovada quando as vacinas forem mantidas entre 2ºC e 8ºC desde a sua descongelação” (sic).
Maria Fernanda Ralha sugeria também que, “pela natureza destas vacinas COVID-19 e pelos dados de estabilidade disponíveis para outros lotes”, não se antevia para estes lotes fora de prazo “problemas de segurança”, mas em seguida acrescentava que “há no entanto que estar atentos a eventuais notificações de reações adversas em utentes que receberão estas doses pelo que é recomendado o registo deste desvio às condições aprovadas na plataforma Vacinas”. (sic)
Nessa medida, esta responsável do Infarmed acabou por instruir os responsáveis da ARS do Alentejo para tomarem obrigatórios “procedimentos, tendo em conta a salvaguarda da saúde pública”, entre os quais o registo na plataforma Vacinas da data de descongelação e administração da dose da vacina fora de prazo, de modo a ser possível uma “futura avaliação da efetividade vacinal e eventuais questões de farmacovigilância decorrentes destes desvios”.
Ou seja, assumia subliminarmente que não existiam certezas sobre a inocuidade do prolongamento do prazo de validade nem tão-pouco se ficaria afectada a protecção vacinal.
Esta decisão do Infarmed e da ARS do Alentejo não se deveu a qualquer quebra de stock de vacina. Pelo contrário, tem sido a fraca adesão às doses de reforço, sobretudo da população abaixo dos 50 anos, que tem causado “sobras” e, portanto, risco de partes de lotes expirarem o respectivo prazo de validade. Tanto assim é que a responsável do Infarmed recomendou que “as vacinas descongeladas e cujo prazo de validade aprovado já foi ultrapassado devem ser usadas antes de vacinas descongeladas em qualquer uma das datas subsequentes e só quando terminar o stock existente se passe para as vacinas descongeladas noutros dias”. (sic)
O PÁGINA UM contactou Maria Fernanda Ralha, directora de Inpecção e Licenciamentos do Infarmed, que não quis fazer comentários sobre este assunto, alegando estar de férias e que todas as informações respeitantes às vacinas contra a covid-19 deveriam ser fornecidas pela Direcção-Geral da Saúde.
Também o gabinete da ministra da Saúde, Marta Temido, foi questionado sobre se tinha conhecimento desta decisão do Infarmed e da ARS do Alentejo, e sobre quantas pessoas tinham sido vacinadas com vacinas fora do prazo de validade. E também se questionou o Ministério da Saúde sobre se noutras regiões se tinha usado similar procedimento, e se sim, se este procedimento seria mantido no futuro. Não houve, até agora, qualquer reacção.
Direcção-Geral da Saúde eliminou frases comprometedoras sobre o remdesivir na norma terapêutica aprovada em Janeiro passado, e mantém o fármaco da Gilead como terapia possível no tratamento contra a covid-19. Portugal é o país europeu com mais pessoas que sofreram efeitos adversos pelo uso deste fármaco. Infarmed continua sem ceder dados detalhados pedidos pelo PÁGINA UM, que aguarda entretanto decisão do Tribunal Administrativo de Lisboa ao processo de intimação.
A Direcção-Geral da Saúde (DGS) continua a incluir a administração de polémico anti-viral remdesivir, produzido pela Gilead Sciences sob a marca Veklury, na terapêutica para a covid-19, mesmo conhecendo-se, cada vez mais, as evidências de graves efeitos adversos, e de o seu uso já ter sido abandonado pela esmagadora maioria dos países europeus.
Na revisão da Norma 004/2020, que rege as terapêuticas, e que entrou em vigor no sábado passado, dia 23 de Abril, o remdesivir ainda permanece – dir-se-ia, estoicamente – na lista de medicamentos para o tratamento de “pessoas internadas por pneumonia por SARS-CoV-2 e hipoxemia confirmada”, mas já apenas como uma alternativa a ser considerada após a dexametasona e o metilprednisolona.
Gilead conseguiu vender largas dezenas de milhões de euros em remdesivir para combate à covid-19 sem existir garantia de eficácia nem de segurança.
Mesmo assim a última revisão da norma “ameniza” uma actualização feita em Janeiro último, que era bastante comprometedora para o fármaco. Com efeito, na actualização de 5 de Janeiro, a referência ao fármaco da Gilead como opção secundária era acompanhada pela seguinte nota: “Até ao momento, o remdesivir não revelou benefício inequívoco ao nível da mortalidade avaliada aos 28 dias nos ensaios clínicos. Assim, a sua prescrição deve decorrer de uma avaliação clínica individualizada, com ponderação dos riscos e benefícios para o doente, e de acordo com o Resumo das Características do Medicamento (RCM).”
Estas duas frases foram agora eliminadas, sem qualquer justificação, e o medicamento continua a ser uma hipótese terapêutica.
Certo é que vai já longe o tempo em que o remdesivir chegou a ser de uso quase obrigatório contra a covid-19, podendo os médicos que não o prescreviam ter problemas se os doentes morressem, conforme admitiu recentemente em entrevista ao PÁGINA o antigo bastonário da Ordem dos Médicos José Manuel Silva.
Com efeito, em Outubro de 2020, quando este fármaco – mesmo sem ensaios clínicos cientificamente validados – começou a ser usado em Portugal, a Norma 004/2020 quase o tornou de uso obrigatório na abordagem terapêutica em regime de internamento.
O então ponto 40 dessa norma determinava que a “terapêutica com remdesivir deve ser administrada o mais precocemente” em doentes internados com “confirmação laboratorial de SARS-CoV-2” que apresentassem um quadro de pneumonia, saturação de oxigénio inferior a 94% e idade igual ou superior a 12 anos com peso igual ou superior a 40 quilogramas.
A contínua “sobrevivência” do remdesivir na Norma 004/2020 deve-se, quase em exclusivo, ao forte “lobby da Gilead” no interior da DGS e da Faculdade de Medicina de Lisboa, que tudo tem feito para não se assumir publicamente os efeitos adversos e sobretudo o desastre económico na sua aquisição. E isto muito fruto das promiscuidades políticas e médicas com a farmacêutica norte-americana.
Recorde-se que este medicamento, inicialmente prescrito, embora com fracos resultados, para o vírus ébola, acabou por cair nas graças da Comissão von der Leyen na primeira fase da pandemia, em 2020. Em 8 de Outubro daquele ano, a Comissão Europeia decidiu assinar um acordo de compra conjunto que literalmente obrigou 36 países comunitários e extra-comunitários da Europa a adquirirem grandes quantidades de remdesivir à Gilead a preços exorbitantes. Para este “brinde” à Gilead, a Comissão Europeia garantiu um financiamento de 70 milhões de euros para a compra de 200 mil frascos de Veklury.
Para cumprir a parte portuguesa no negócio, logo em 23 de Outubro, a DGS assinaria um contrato com a Gilead com vista ao pagamento de um primeiro lote de 54.600 frascos. Custo total: 19.458.000 euros, ou seja, 356 euros por unidade. Note-se que em Novembro de 2020, o Le Monde destacava que, apesar de o custo de produção do remdesivir atingir apenas 0,93 dólares por dose – o que implicaria um custo de 5,58 dólares por tratamento –, a farmacêutica vendia-a por um preço 420 vezes superior.
Portugal deveria ter ainda adquirido um segundo lote ao longo de 2021 no valor de 15.018.645 euros – conforme determinava uma Resolução do Conselho de Ministros assinada exclusivamente por António Costa –, mas por razões nunca explicada pela DGS e pela Gilead, apesar das perguntas do PÁGINA UM, apenas foi assinado um contrato em 12 de Julho do ano passado por um valor simbólico: um pouco menos de 16 mil euros.
Não deve ter sido, contudo, indiferente para este desfecho o desaconselhamento sobre o remdesivir feito ainda em Novembro de 2020 pela Organização Mundial de Saúde (OMS); apesar de uma recente actualização ter passado a recomendá-lo para pessoas não internadas, e nos Estados Unidos tenha sido aprovado pela FDA o seu uso em crianças com mais de três anos também não internadas, desde esta semana. Fracas vantagens (um benefício de custo económico extremamente elevado para quem não apresenta um quadro clínico sequer moderado) que não faz esquecer os efeitos adversos relevantes.
Com efeito, apesar do Infarmed continuar a recusar facultar dados detalhados sobre as reacções adversas em doentes-covid em Portugal, através do sistema EudraVigilance – base de dados agregada da Agência Europeia do Medicamento – observa-se que Portugal lidera o número absoluto de casos individuais com efeitos adversos causados pela administração de remdesivir, contabilizando-se já 253. Ignora-se quantos resultaram em mortes.
Número total de casos individuais com efeitos adversos ao remdesivir. Fonte: EudraVigilance.
O segundo país com mais casos é a Itália, com 190, mas com uma população seis vezes superior a Portugal. Casos adversos relacionados com o polémico fármaco da Gilead são relativamente escassos nos outros países da União Europeia.
O terceiro país com mais casos é a Polónia, apenas com 37, mas com uma população quase quatro vezes superior à portuguesa. A Alemanha contabilizou até agora 34 casos e tem mais de oito vezes a população portuguesa, enquanto a Espanha (com 46 milhões de habitantes) contou 32 doentes com problemas decorrentes do uso de remdesivir.
Em Portugal, o remdesivir sempre mereceu um carinho especial por parte dos denominados “peritos” que aconselharam a DGS nas terapêuticas para os doentes com covid-19.
De entre esses, destacam-se três médicos – Filipe Froes, António Diniz e Fernando Maltez – que simultaneamente integram a equipa de consultores da DGS para a elaboração e actualizações da Norma 004/2020 e sentam-se à mesa com a Gilead, e especificamente para falarem do remdesivir, uma vez que constam do seu advisory board desde 2020. Já este ano, Fernando Maltez e Filipe Froes receberam, cada um, 1.832,7 euros a esse título – pelo menos essa é a verba por eles declarada no Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed.
Mas também a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa tem sido uma forte aliada da Gilead na promoção do remdesivir. A Associação para Investigação e Desenvolvimento da Faculdade de Medicina (AIDFM) – presidida por Fausto Pinto, também director daquela instituição de ensino –, tem feito para a Gilead sucessivos estudos sobre este fármaco, mas que nunca viram a luz do dia.
Filipe Froes é um dos três consultores da DGS que se tem destacado na defesa do remdesivir. É também consultor da Gilead.
Durante o ano de 2020, a AIDFM recebeu desta farmacêutica 15.375 euros para um estudo intitulado “Análise do impacto de remdesivir na capacidade hospitalar do SNS” e mais 30.750 euros para o “Estudo de suporte do pedido de financiamento público de remdesivir no tratamento da covid-19”.
Já em 2021, encaixou mais verbas para o “Estudo comparativo sobre a utilização de remdesivir” (9.225 euros) e para a “Actualização do dossier de valor terapêutico de remdesivir (Veklury) na indicação aprovada” (12.300 euros). Este ano, no Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed constam ainda mais dois estudos pagos pela Gilead: “Análise descritiva da utilização de remdesivir” (9.225 euros) e uma nova actualização do seu valor terapêutico (mais 12.300 euros).
A Gilead é, aliás, a farmacêutica com maior volume de negócios com esta associação da Universidade de Lisboa. Desde 2013, pelos mais diversos estudos e serviços, recebeu da farmacêutica norte-americana um total de 1.927.175 euros. Para se ter uma ideia da importância da Gilead nas contas da AIDFM, saliente-se que a segunda farmacêutica com maiores relações comerciais é a Bristil-Myers Squibb que “só” entregou 507.780 euros.
Entretanto, já este ano, a Gilead foi também “pescar” à política, contratando Ana Paula Martins, bastonária da Ordem dos Farmacêuticos até Fevereiro passado, e que acumulava com a docência na Faculdade de Farmácia de Lisboa. A agora directora de Assuntos Governamentais da Gilead é, desde Dezembro do ano passado, vice-presidente do Partido Social Democrata. Uma escolha de Rui Rio.
Depois de tentar convencer, sem sucesso, a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos para não dar razão ao PÁGINA UM, e manter escondidos dados sensíveis para proteger farmacêuticas, o Infarmed terá agora de convencer o Tribunal Administrativo de Lisboa de que o secretismo da Administração Pública é a melhor forma de se viver numa sociedade democrática.
O PÁGINA UM deu esta tarde entrada no Tribunal Administrativo de Lisboa com um processo de intimação contra o Infarmed, a agência reguladora do medicamento em Portugal. O processo, considerado urgente, com o número 980/22.5BELSB, deverá ser amanhã distribuído a um juiz, o que implicará que o Infarmed seja constituído réu e imediatamente citado para responder no prazo de 10 dias.
Em causa está a recusa desta entidade, presidida por Rui dos Santos Ivo – que ocupou, entre 2008 e 2011, o cargo de director executivo da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA) –, em acatar um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) para disponibilizar o acesso ao PÁGINA UM dos dados brutos relativos aos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19 e também do anti-viral remdesivir, um polémico fármaco da Gilead.
Este processo de intimação insere-se na campanha do PÁGINA UM em prol da defesa da informação científica e da transparência, sendo integralmente financiada pelo FUNDO JURÍDICO, através de donativos dos leitores na plataforma MIGHTYCAUSE, tendo como patrono o advogado Rui Amores, especialista em Direito Administrativo.
A acção de intimação do PÁGINA UM pretende contrariar a posição de obscurantismo do Infarmed que defende que devem ser apenas disponibilizados ao público “os dados constantes da base de dados EudraVigilance”, mesmo sabendo que estes são apresentados em formato agregado, não sendo possível grande detalhe informativo.
Na sua deliberação de 1 de Abril passado, onde recusa o acesso de informação a um órgão de comunicação social – violando assim a Lei da Imprensa –, a direcção do Infarmed conclui que, “face ao parecer emitido [pela CADA] e no quadro dos regimes legislativos e regulamentares supra expostos, é [nosso] entendimento (…) que os dados solicitados devem ser obtidos por consulta à base de dados” da Agência Europeia do Medicamento.
Recorde-se que, em carta enviada à CADA, onde tentou convencer aquela entidade a não conceder opinião favorável ao PÁGINA UM, Rui dos Santos Ivo defende que os jornalistas são “não-especialistas” com “um elevado potencial para criar alarme social totalmente desnecessário e infundado”.
Pagamento de custas do processo de intimação contra o Infarmed
O director do PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira, tem formação académica multidisciplinar e é mesmo sócio da Associação Portuguesa de Epidemiologia.
Opinião contrária teve a CADA, presidido pelo juiz conselheiro Alberto Oliveira, ao considerar num seu parecer de 16 de Março passado que “a informação solicitada” ao Infarmed constitui mesmo “documentos administrativos” não-nominativos – ou seja, sem possibilidades de identificar pessoas.
Por outro lado, esta entidade salientava que “o interesse público no conhecimento de elementos que possam informar quanto à segurança da vacina [contra a covid-19] é, por conseguinte, manifesto”.
E relembrava ainda ao Infarmed um aspecto óbvio em democracia: “as entidades não podem limitar o acesso com base no receio de alguma deturpação que possa ser feita”.
Este é o segundo processo de intimação intentado pelo PÁGINA UM este mês, após ter também colocado no banco dos réus o Conselho Superior de Magistratura por recusar ceder documentos administrativos relacionados com a inspecção à distribuição do Operação Marquês ao juiz Carlos Alexandre.
O FUNDO JURÍDICO DO PÁGINA UM pode ser apoiado através da plataforma do MIGHTYCAUSE ou pedindo informações complementares pelo correio electrónico geral@paginaum.pt.
Salvam vidas, mas podem tornar-se venenos. Para evitar vítimas indesejáveis, mas também controlar a cobiça da indústria farmacêutica, os ensaios clínicos dos medicamentos são uma prática comum, cada vez mais exigentes. Mas nem sempre este sector tem só bons samaritanos, e por falhas (mais ou menos intencionais) das companhias, ou por deficiências na regulação, há casos que dão para o torto. O PÁGINA UM recorda 10. Podiam ser mais, podiam ser menos. Mas, em época de pandemia, convém recordar que nunca outro fármaco teve uma utilização tão massiva como as vacinas contra a covid-19, utilizadas num regime de emergência.
Todos os anos, as farmacêuticas disponibilizam para o mercado centenas de novos medicamentos, que salvam e prolongam vidas. Mas, para que não suceda o oposto – ou seja, para que não se morra da cura –, e porque cada medicamento comporta um investimento enorme – que será deitado fora se a sua eficácia e segurança não ficarem demonstradas –, esses fármacos têm de passar por várias fases até finalmente chegarem ao balcão das farmácias.
Por norma, sempre acompanhados pelos reguladores – que vão autorizando ou não há etapa seguinte –, os potenciais fármacos passam por quatro fases de ensaios clínicos. Na chamada Fase I estuda-se sobretudo a segurança e a tolerabilidade do medicamento, recorrendo a voluntários saudáveis. Em circunstâncias especiais podem ser admitidos doentes nesta fase, se existir risco de morte evidente. Quando se fala de alguém que se encontra a tomar um medicamento experimental, geralmente trata-se de um novo medicamento que ainda se encontra na Fase I.
Caso se confirme que o medicamento não é tóxico, então passa-se para a Fase II, que tem como objectivo avaliar a terapêutica e dose terapêutica mais adequada. Neste caso, usam-se já apenas doentes com a patologia que será “atacada” pelo fármaco, abrangendo algumas dezenas de voluntários e podendo demorar alguns meses.
Se os objectivos forem alcançados, então passa-se para a Fase III, que constitui um ponto crucial para o sucesso comercial do medicamento, porque aí já se aplica um estudo comparativo.
Além de confirmar os resultados obtidos nas fases anteriores (segurança e terapêutica), na Fase III compara-se sobretudo o novo medicamento com um placebo ou com uma terapêutica já comercializada, avaliando-se os efeitos tanto positivos como negativos.
Esta fase pode demorar mesmo vários anos, em função do medicamento e da patologia, e exige assim pelo menos dois grupos de indivíduos e um número de voluntários que podem chegar aos vários milhares.
Para garantir um elevado rigor, estes estudos têm normas muito rígidas para evitar manipulação e enviesamento dos resultados. Por isso, se ouvem, muitas vezes, “palavrões técnicos” como um certo ensaio clínico ter sido “multicêntrico, randomizado, duplo-cego, duplo-mascarado”.
Na verdade, isso significa que, na maioria dos casos, ninguém sabe, no início, quem tomou o novo medicamento ou o comparativo, incluindo o voluntário, quem administra, quem escolhe em que grupo são colocados os voluntários nem que grupo está o investigador a analisar os resultados. Apenas no fim, com os resultados, isso se conhecerá.
Contudo, isto é a teoria. Na prática, se não existir transparência, e o regulador for pouco exigente, tudo se mostra possível.
Se tiver aprovação do regulador, a farmacêutica pode respirar de alívio e fazer a festa, porque começa a comercializar o novo medicamento. Porém, não escapa à Fase IV – a da farmacovigilância –, que é onde ocorrem as surpresas mais desagradáveis. Ou até agradáveis, se porventura se descobrirem, afinal, que o novo medicamento tem efeitos benéficos ainda mais estupendos para solucionar que inicialmente não estavam previstos. Nunca é demais invocar, e evocar, o famoso Viagra.
A farmacovigilância é uma fase extraordinariamente importante, porque se passa da aplicação de um medicamento em poucas centenas de milhares de pessoas para um uso que pode ser mais ou menos massivo. Veja-se o caso, por exemplo, das vacinas contra a covid-19.
Na Fase IV, que pode decorrer ao longo dos anos, os episódios de reacções adversas são individualmente reportados pelos profissionais de saúde junto dos reguladores – em Portugal, é o Infarmed.
Cada reacção adversa nunca é uma boa notícia para a farmacêutica, e aqui entra em jogo as potenciais promiscuidades ou conflitos de interesse que possam ocorrer entre farmacêuticas e peritos que colaboram com os reguladores.
Além disso, nunca esquecer que as receitas dos reguladores provêm, em grande medida, das comparticipações do sector farmacêutico. E estamos a falar das comparticipações legais, estabelecidas em diplomas legais…
Enquanto até à Fase III, um insucesso – e há muitos, daí a necessidade de o preço dos medicamentos bem-sucedidos suportarem os investimentos falhados – pode ocorrer de forma discreta, na Fase IV pode ser uma “facada”, letal até, na credibilidade de uma farmacêutica.
E redundar em prejuízos astronómicos, sem falar em potenciais indemnizações. Se forem nos Estados Unidos podem ser chorudas. No limite, um rombo financeiro ou mesmo a falência. Já sucedeu.
Assim, em abono da verdade, embora possam existir imponderáveis – porque na farmacovigilância detectam-se efeitos adversos adicionais, por interacções medicamentosas ou factores imprevisíveis –, as evidentes falcatruas são de evitar em demasia. Como o azeite em água, mais tarde ou mais cedo acabam por se saber eventuais enviesamentos, ou mesmo fraudes, cometidos em ensaios clínicos das fases anteriores.
O regulador também não aprecia ser surpreendido com más notícias, porque são reveladoras, muitas vezes, de desempenhos fracos nas suas funções. E, por outro lado, sucedem sempre muitas oportunidades de funcionários do regulador saltarem para as farmacêuticas, e vice-versa. A promiscuidade existe neste sector.
Por isso, estas questões são sempre tratadas com pinças. E, por isso, bastas vezes joga-se sujo, com sonegação de estudos, campanhas de marketing enganosas, subornos à classe médica, tudo em nome das receitas. Nos casos mais graves fica em causa a independência dos reguladores. A História tem mostrado que nem sempre a regulação defende os interesses dos consumidores.
No entanto, um alerta: na esmagadora maioria dos medicamentos, o sistema funciona. Felizmente, poucas são as vezes que temos conhecimento de problema relevante em redor de uma das 2.937 substâncias activas e 36.803 medicamentos registados em Portugal no Infomed, o portal dos medicamentos de uso humano gerido pelo Infarmed.
Mas, é exactamente por os casos escandalosos serem cada vez mais raros – e de um mais apertado controlo, embora ainda pouco transparente, nos ensaios clínicos e na farmacovigilância –, que convém estar sempre de sobreaviso quando, como sucedeu com as vacinas contra a covid-19, se saltam etapas.
Ou se escondem dados dos efeitos adversos, como tem estado a acontecer com o Infarmed em relação a pedidos do PÁGINA UM, o que nos obrigará a recorrer a uma intimação junto do Tribunal Administrativo.
Por isso, recordemos alguns dos casos mais tristemente famosos de medicamentos colocado no mercado, muitos usados massivamente, e cujas consequenciais se mostraram desastrosas.
Avandia
Concebido pela farmacêutica britânica GlaxoSmithKline e aprovado em 1999 pela Food and Drug Administration (FDA), Avandia foi a marca comercial do fármaco rosiglitazona, que visava controlar os níveis de açúcar no sangue e sobretudo para tratamento de diabetes mellitus tipo 2. Contudo, rapidamente, acabou por provar ser sobretudo desastroso para a saúde.
Em 2007, um estudo de investigadores da Massachusetts Medical Society publicado no New England Medical Journal, apontava para um risco de ataque cardíaco em cerca de 43%.
Três anos mais tarde, um outro estudo, desenvolvido por investigadores da FDA, publicado no Journal of the AmericanMedical Association (JAMA) mostrava que, entre mais de 67 mil pessoas que tinham tomado Avandia, se tinham registado quase três mil ataques cardíacos, que resultaram em 814 mortes.
Nesse mesmo ano, a EMA suspendeu a comercialização do fármaco.
Também o Senado americano emitiu, também em 2010, um comunicado que revela que a GlaxoSmithKline já sabia dos riscos associados ao Avandia desde 2000.
No início da década passada, a GlaxoSmithKline chegou a um acordo extrajudicial no valor de 770 milhões de dólares (cerca de 707 milhões de euros) para pôr fim a 16.200 processos por mortes e problemas cardíacos e hepáticos causados do fígado e morte.
No entanto, a GlaxoSmithKline acabaria, em 2012, por ser condenada ao pagamento da maior multa até então aplicada pelo Departamento de Justiça norte-americano por “fraude sanitária”: 3 mil milhões de dólares por responsabilidade civil e criminal, por ocultação de dados sobre três medicamentos (além do Avantia, também do Paxil e do Wellbutrin) e por práticas ilegais de preços.
No comunicado então emitido, Bill Corr, vice-secretário do Departamento de Saúde e Serviços Humanos, disse que “o acordo histórico (…) é um marco importante nos esforços para acabar com a fraude de saúde”, acrescentando que, “por muito tempo, o sistema de saúde norte-americano foi alvo de trapaceiros que pensavam que poderiam lucrar facilmente às custas da segurança pública, dos contribuintes e dos milhões de americanos que dependem de programas de saúde”.
Elixir Sulfanilamide Criado sob a forma de comprimido em 1937, pela farmacêutica americana Massengil, sulfamilamida era um antibiótico revolucionário. Porém, para aumentar as vendas, decidiu transformar o medicamento em elixir, para lhe introduzir um sabor agradável a framboesa.
Assim, a farmacêutica usou dietilenoglicol, um éter, e colocou o elixir no mercado sem qualquer teste de toxicidade. Os efeitos foram terríveis.
De acordo com o Independent Policy Report, morreram mais de 107 pessoas, sobretudo crianças. Em 1938, a Massengil deu-se como culpada, pagando 24 mil dólares de multa, a maior até então aplicada a uma farmacêutica.
Em 18 de Janeiro de 1939, o engenheiro químico que criou o elixir, Harold Watkins, foi encontrado em casa com uma bala na cabeça. Tinha-se suicidado.
Mediator Concebido pela farmacêutica francesa Servier em 1976, o benfluorex, comercializado sob a marca Mediator, destinava-se ao tratamento da diabetes, mas começou a ser usado como supressor de apetite para emagrecimento. Em 1998, a Agência Francesa da Segurança dos Produtos de Saúde (AFSPS) abriu uma investigação em redor do Mediator por suspeitas de efeitos adversos (valvopatia aórtica e hipertensão arterial pulmonar), mas apenas em 2003 a Servier deixa de comercializar Mediator em Espanha e Itália.
Contudo, demoraria ainda mais anos até que os reguladores cumprissem o seu dever, pois apenas em 2010 a AFSPS assumiu que as mortes relacionadas com o Mediator ascendiam então às cinco centenas. No entanto, estimativas mais recentes apontam para mais de duas milhares de mortes.
Em Março do ano passado, a Servier seria multada em 2,7 milhões de euros e a AFSPS em 303 mil euros por falhas na regulação. Um dos executivos da farmacêutica francesa, Jean-Philippe Seta, foi condenado a quatro anos de prisão de pena suspensa.
No rescaldo deste escândalo, seria criada em 2018, pela AFSPS e pelo Seguro Nacional de Saúde (CNAM) a EPI-PHARE, uma entidade para melhorar a farmacovigilância.
OxyContin
Deu origem à falência de uma farmacêutica, e serviu como mote de uma mini-série (Dopesick), estreada no ano passado, protagonizada por Michael Keaton e realizada por Barry Levinson. E, na realidade, tem todos os ingredientes de um filme: droga, conspiração, dinheiro e tribunais.
A oxicodona – comercializada sob a marca OxyContin – é um analgésico da classe dos opioides, usada para atenuar as dores severas. Embora tivesse sido sintetizada em 1917 na Alemanha, a farmacêutica norte-americana Purdue Pharma desenvolveu-a como analgésico de libertação prolongada, tendo sido aprovada pela FDA em 1995. A comercialização desta marca de oxicodona começou no ano seguinte.
Porém, a farmacêutica escondeu dos reguladores, algo que os traficantes e utilizadores rapidamente descobriram: esmagando os comprimidos facilmente retiravam a componente pura de oxicodona, para cheirar ou injectar, sendo tão poderosa como a heroína. Dessa forma, o OxyContin foi um dos principais contribuidores para a denominada “epidemia dos opioides” nos Estados Unidos. E a Purdue Pharma teve receitas recorde.
Segundo a FDA, em 2003 havia já 2,8 milhões de norte-americanos que admitiam usar OxyContin para usos não-médicos, quando quatro anos antes eram apenas 400 mil. Mas nesse ano, o regulador apenas emitiu uma carta de advertência contra a Purdue Pharma por publicidade enganosa, porque os anúncios excluíam os sérios riscos de dependência e danos para a saúde.
Somente em 2007 o cerco à farmacêutica começou a apertar, quando foi condenada a pagar 634 milhões de dólares (cerca de 582 milhões de euros) por publicidade enganosa, mas apesar de três executivos da companhia terem sido também multados, o OxyContin manteve a sua comercialização. E em 2010 seria mesmo autorizada uma nova fórmula que visava diminuir a possibilidade do seu uso não-médico, sendo retirada a versão original.
Apesar da FDA ter sempre tentado proteger a estabilidade financeira da farmacêutica, os processos judiciais em diversas partes dos Estados Unidos fizeram a Purdue Pharma caminhar para o descalabro. E em 2019, a Purdue Pharma abriu falência.
No mês passado, no dia 11 de Março, os executivos da Purdue Pharma conseguiram um acordo extrajudicial envolvendo oitos estados norte-americanos (Califórnia, Connecticut, Delaware, Maryland, Oregon, Rhode Island, Vermont e Washington) e milhares de requerentes individuais no valor de 6 mil milhões de dólares (cerca de 5,5 mil milhões de euros). Os executivos da companhia, grande parte dos quais da família Sackler, poderão ainda ser, contudo, julgados em processo criminal.
No processo de falência – que será sobretudo de plano de reorganização –, grande parte das futuras receitas serão destinadas a diminuir a crise dos opiáceos e de dependência de opioides, devendo ser propriedade principalmente da National Opioid Abatement Trust (MOAT).
Ficou também determinado que as famílias Sackler não terão qualquer envolvimento na nova empresa, devendo ainda pagar 4,325 mil milhões de dólares, além dos 225 milhões anteriormente pagos para resolver ações civis.
Talidomida
Criado pela farmacêutica alemã Chemie Grunenthal em 1954, inicialmente como um sedativo de uso geral, passou a ser muito popular entre grávidas por ser eficaz nos enjoos matinais, dores de cabeça e insónias.
O seu sucesso fez com que se disseminasse rapidamente por quase meia centena de países sob a forma de mais de três dezenas de marcas comerciais. Em Portugal foi comercializado com o nome Softenon, mas na maior parte dos países foi vendida sob a marca Contergan.
O seu uso massivo entre as grávidas de todo o Mundo veio a revelar um trágico efeito secundário: malformações congénitas gravíssimas. Em 1961, o medicamento começou a ser retirado do mercado, mas em Portugal somente no ano seguinte surgiram as primeiras notícias em jornais médicos sobre os graves efeitos da talidomida quando tomado entre os dias 14 e 50 da gravidez.
Estima-se que, pelo menos, 100 mil fetos foram afectados, dos quais 80% não se desenvolveram. Aqueles que nasceram mostravam malformações terríveis nos membros superiores e inferiores, incluindo mesmo a ausência de braços e pernas, em órgãos internos, nos olhos e ouvidos, e paralisia cerebral.
Cerca de 25% das crianças nascidas sob efeito da talidomida morreram nos primeiros meses de vida. No início da década passada, estimava-se que ainda estariam vivas entre 10 mil e 15 mil pessoas afectadas por este fármaco.
Os Governos dos diferentes países lidaram de forma muito distinta com este assunto ao longo do tempo, havendo processos judiciais em diversos países. Na Austrália, cerca de uma centena de vítimas receberam, em 2014, um total de 89 milhões de dólares pagos pela distribuidora Diageo. Dois anos antes, a Grunenthal pediu, pela primeira vez, desculpas às vítimas.
Na altura, o director executivo Harald Stock – durante a inauguração de uma escultura evocando o desastre da talidomida, na cidade de Stolberg, sede da farmacêutica – garantiu que tinham sido doados quase 500 milhões de euros às vítimas até 2010. Na Alemanha, os sobreviventes recebem uma pensão mensal de até 1116 euros de um fundo para o qual a farmacêutica contribui.
A talidomida continua, contudo, a ser usada actualmente para determinadas doenças, como o mieloma múltiplo.
Trasylol
Desenvolvido pela farmacêutica alemã Bayer, a aprotinina, comercializada sob o nome Trasylol, foi aprovada pela FDA em 1993 para ser usada em blocos operatórios para reduzir no sangramento em cirurgias cardíacas e hepáticas.
Apesar de existirem já avisos preocupantes envolvendo a morte de mais de 200 pessoas em que se usara este fármaco, a FDA foi pouco lesta nas investigações.
Entretanto, um estudo científico observacional publicado no New England Journal of Medicine, tirou qualquer dúvida, ao concluir que “a associação entre aprotinina e lesões graves em órgãos-alvo indica que o uso continuado não é prudente”, acrescentando mesmo que “em contraste, os medicamentos genéricos menos caros, como ácido aminocapróico e ácido tranexâmico, são alternativas seguras”.
O primeiro autor deste estudo, Dennis Mangano diria mesmo que mais de 22 mil pessoas poderiam ter sido salvas se o Trasylo tivesse sido retirado do mercado atempadamente.
A partir deste estudo, a FDA pressionou a Bayer, que acabou por confessar a existência de um estudo interno, baseado em dados com 67 mil pacientes, onde se detectara casos graves. A farmacêutica alegou “erro humano” para o atraso no envio desse comprometedor relatório. Em 2010, a Bayer conseguiu um acordo extrajudicial, pagando 60 milhões de dólares (cerca de 55 milhões de euros) para arquivamento de 150 processos judiciais.
Trovan
Antibiótico de amplo espectro, a trovafloxacina foi desenvolvida pela farmacêutica norte-americana Pfizer, sob a marca comercial Trovan, tendo vida curta e polémica, antes de ser retirado do mercado por efeitos hepáticos adversos muito graves.
Mas, antes de ser abandonado, esteve envolvido num escândalo da Pfizer que aproveitou uma epidemia de meningite na Nigéria, em 1996, para proceder a um ensaio clínico não autorizado.
A empresa, sem conhecimento prévio, inoculou 100 crianças dos 3 meses aos 18 anos de idade para um tratamento com duração de duas semanas. Destas,11 morreram e dezenas soferam efeitos secundários graves, como paralisia e insuficiência hepática.
Mesmo assim, a FDA aprovou este medicamento em 1998 para o tratamento de vários tipos de infecção, como peritonites e sinusites. O sucesso comercial nunca veio, porque o regulador foi contabilizando efeitos adversos, e recomendando o seu uso de forma cada vez mais restrita. Em 1998, a Pfizer teve apenas uma receita de 160 milhões de dólares, quando previa pelo menos mil milhões de dólares.
Após terem sido registados em 1999, 14 casos de insuficiência hepática e seis mortes, a FDA viria a suspender o uso de trovafloxacina no ano 2000. Medida similar tomou a Agência Europeia do Medicamento (EA). De acordo com a declaração publicada, esta suspensão foi efectuada depois da recepção de 152 relatórios de insuficiências hepáticas.
Apenas em 2011, quinze anos após os ensaios clínicos, a Pfizer se predispôs a a assinar um acordo extrajudicial para arquivar o escândalo na Nigéria, envolvendo 175 mil dólares (cerca de 160 mil euros) por família. A farmacêutica concordou ainda em criar um fundo de 35 milhões de dólares (32 milhões de euros) para compensar os possíveis afectados pelo uso do Trovan.
Vioxx Desenvolvido pela farmacêutica americana Merck Sharpe & Dohme, e aprovado pela FDA em 1999, o rofecoxib – comercializado sob a marca Vioxx – era um anti-inflamatório destinado sobretudo ao tratamento da artrite.
Em Portugal chegou a ser o anti-inflamatório mais vendido em Portugal.
Em 2004 começaram a surgir estudos com resultados preocupantes, que revelavam um elevado risco de enfartes do miocárdio ao fim de apenas alguns meses de tratamento com Vioxx, independentemente da dose. David Graham, investigador da FDA, estimou numa declaração ao Senado norte-americano que teriam ocorrido, por causa do rofecoxib, pelo menos 139 mil casos de ataques cardíacos, que culminaram em 55 mil mortes.
Confirmou-se também que a empresa tinha contratado médicos para assinar artigos científicos, para os credibilizar, que não tinham sido por eles elaborados.
Em 2017, a Union of Concerned Scientists denunciaria que a Merck Sharpe & Dohme manipulou os resultados sobre os riscos de ataque cardíaco e exagerou os efeitos positivos do Vioxx.
Para evitar um julgamento, a Merck Sharpe & Dohme conseguiu um acordo extrajudicial em 2007, pagando 4,85 mil milhões de dólares em indemnizações, ou seja, mais de 3,75 mil milhões de euros.
Xarelto Produzido pela Bayer e comercializado pela Johnson & Johnson, o Xarelto é o nome comercial do fármaco rivaroxabana, um anticoagulante oral utilizado sobretudo no tratamento de trombose venosa profunda. Foi aprovado pela FDA em 2011.
Porém, logo no ano seguinte, vários estudos alertaram para efeitos adversos graves. Por exemplo, o Institute for Safe Medical Practices – uma organização não-governamental norte-americana vocacionada para a prevenção de erros farmacológicos – contabilizou 356 casos graves associados ao Xarelto, dos quais 158 embolias e 121 hemorragias.
Uma outra entidade similar, o DrugWatch, indicava também que uma pesquisa em Outubro de 2018 do Sistema de Relatórios de Eventos Adversos da FDA indicava que, pelo uso de Xarelto, tinham ocorrido 92.125 casos de hemorragias, grande parte dos quais gastrointestinais.
Em 2019, a Bayer e a Janssen Pharmaceuticals chegaram a um acordo extrajudicial, comprometendo-se a pagar 775 milhões de dólares (cerca de 710 milhões de euros) para encerrar 25 mil processos de litígio, assumindo que não tinham feito os avisos necessários sobre efeitos adversos.
Zantac
Desenvolvido pela farmacêutica britânica GlaxoSmithKline em 1977, e aprovado para comercialização pela FDA em 1983, o Zantac chegou a ser o medicamento mais vendido do Mundo em 1988, superando mil milhões de euros. Sob licença ou como genérico por outras farmacêuticas, este medicamento – que tem a ranitidina como princípio activo – uma eficácia rápida no tratamento de úlcera duodenal e gástrica e sobretudo contra a azia.
Apesar das garantias de segurança, tanto assim que podia ser usado sem prescrição médica, em 2019 uma farmácia online alertou a FDA da presença de elevados níveis de N-nitrosodimetilamina (NDMA), um perigoso cancerígeno.
Na segunda metade desse ano chegou-se à conclusão que o NDMA não era apenas uma impureza, mas que advinha do próprio processo de fabrico da ranitidina. Em consequência, a esmagadora maioria dos países retiraram o medicamento de circulação nos últimos dois anos.
Em Portugal, a retirada da autorização de introdução do mercado (AIM) verificou-se em Janeiro do ano passado, mas já houvera uma retirada preventiva dos lotes em Setembro de 2019.
De acordo com o Shapiro Legal Group – um escritório de advogado norte-americano especializado em litígios contra farmacêuticas –, o Zantac terá causado 55,891 efeitos adversos graves, dos quais 66% foram cancros, alegando que já se registaram 4.926 mortes.
Nos próximos anos será provável que os casos ainda disparem mais à medida que se foram associando uma relação causa-efeito. O Shapiro Legal Group estima que só em 2018 o Zantac tenha sido usado por quase 19 milhões de norte-americanos. Prevê-se assim processos judiciais envolvendo muitos e muitos milhões.
Os portugueses parecem ter-se fartado das vacinas contra a covid-19. Apenas um terço dos pais decidiram vacinar as suas crianças com duas doses, e uma parte considerável (22%) ponderou e decidiu não dar a segunda dose. Nos adultos jovens, a dose de reforço não está também a ter grande adesão. No grupo entre os 18 e os 24 anos já são mais aqueles que desistiram da vacina.
O programa de vacinação contra a covid-19 está a perder gás, sobretudo na população mais jovem. Quatro em cada 10 crianças vacinadas com a primeira dose contra a covid-19 nos primeiros meses do ano não receberam a segunda dose.
Mesmo considerando que as infecções pela variante Ómicron, sobretudo durante o mês de Janeiro, tenha levado à não promoção, por parte da Direcção-Geral da Saúde (DGS), da segunda dose nas crianças que tiveram entretanto contacto com o vírus, mostra-se já notório que muitos pais terão desistido da segunda toma.
Embora a DGS não divulgue dados absolutos – para dificultar análises independentes –, terão sido vacinadas com a primeira dose cerca de 55% das crianças entre os 5 e os 11 anos, mas até ao dia 11 de Abril (últimos dados disponíveis), somente 33% estavam com a vacinação completa.
Assim, como 45% das crianças nunca foram vacinadas contra a covid-19, e os pais de 22% decidiram não lhes dar (ainda) a segunda dose, então significa que apenas seis em cada 10 pais que autorizaram a primeira toma quiseram depois que lhes dessem a segunda.
A análise do PÁGINA UM aos dados da DGS também permitem aferir que não é expectável uma evolução significativa deste rácio nesta faixa etária nos próximos tempos. Entre 7 de Março e 11 de Abril a taxa de vacinação completa somente subiu de 28% para 33%, o que deverá corresponder a pouco mais de 30 mil vacinas numa faixa etária que integra quase 650 mil pessoas.
Por outro lado, nota-se que a adesão dos adolescentes e adultos em idade activa às doses de reforço está muito longe de atingir os níveis da vacinação com as duas primeiras doses.
No caso dos adolescentes, com idades entre os 12 e 17 anos, os dados da DGS nem indicam que estejam a ser feitas inoculações de reforço. Aparentemente, esta entidade, que no Verão passado tanto defendia a relevância de se vacinar adolescentes para defender os mais idosos, deixou agora de considerar relevante repetir doses, mesmo sabendo-se que a imunidade vacinal se perde passado poucos meses.
No entanto, Graça Freitas continua a manter a obrigatoriedade do uso de máscaras no interior dos estabelecimentos de ensino.
Também nas faixas etárias entre os 18 e os 65 anos, onde o programa vacinal inicial teve uma adesão praticamente total (entre os 98% na faixa dos 18-24 anos e os 100% na faixa dos 50-64 anos), a dose de reforço não está agora a ser procurada com grande intensidade. E sobretudo nos adultos jovens.
Assim, até 11 de Abril, apenas 43% do grupo etário entre os 18 e 24 anos quiseram levar dose de reforço, valor que sobe para os 58% na faixa etária dos 25 aos 49 anos e para 83% para a faixa dos 50 aos 64 anos. Mesmo nos mais idosos, a taxa de reforço não atinge os mesmos patamares, embora muito próximo dos 100%. A diferença pode advir do facto de muitas pessoas idosas que tomaram as duas primeiras doses terem entretanto falecido de causas diversas.
Apesar da ausência de dados absolutos de vacinação no último mês – por opção intencional da DGS –, considerando as estimativas da população calculadas pelo Instituto Nacional de Estatística e a evolução da percentagem de vacinados por grupo etário, terão sido inoculadas entre 7 de Março e 11 de Abril quase 215 mil pessoas. Ou seja, menos de seis mil vacinas administradas por dia.
Nunca antes se viu tanta participação num procedimento de consulta pública a um regulamento comunitário. Comissão von der Leyen quer manter certificado discriminatório de não-vacinados, incluindo recuperados, até Junho de 2023, A Alemanha, que ontem chumbou um projecto para tornar a vacina obrigatória para os maiores de 60 anos, lidera os países com maior número de comentário. Em Portugal, o debate sobre esta matéria tem sido inexistente.
Está ao rubro o último dia da consulta pública do regulamento que visa prolongar o uso do certificado digital da covid-19 por mais um ano. De acordo com a consulta do PÁGINA UM pelas 17:30 horas ao site da Comissão Europeia, onde se encontra a plataforma que permite formalmente apresentar os comentários à proposta, estavam já contabilizados 333.596 comentários de cidadãos, empresas e entidades diversas, um aumento extraordinário face aos registados no início desta semana.
Quase todos os comentários, convenientemente identificados e registados, contestam a possibilidade de se manter o sistema de controlo da pandemia da covid-19, já em fase endémica, através de restrições discriminatórias aos não-vacinados.
No domingo passado, o PÁGINA UM destacava já a existência de mais de 136 mil comentários, o que colocava esta proposta da Comissão von der Leyen como a mais polémica de sempre.
Em contraciclo com as decisões de diversos países europeus em cessar a discriminação dos cidadãos em função do seu estado vacinal contra a covid-19, e tendo em conta a evidência de as vacinas não funcionarem como “barreira” segura contra a transmissão do coronavírus, a Comissão Europeia insiste estender por mais um ano a aplicação dos certificados digitais para condicionar ou proibir a circulação aérea e o acesso a certos lugares públicos por não-vacinados.
Ursula von der Leyen, que é uma adepta da imposição da vacinação obrigatória universal, incluindo a jovens e crianças, tem já pronta uma proposta de regulamento para prolongar até 30 Junho de 2023 o controlo de entradas através deste certificado, que apenas atesta a toma de vacinas ou a ocorrência de uma infecção recente.
Como os certificados têm agora uma validade de nove meses, a implementação desta medida garante às farmacêuticas pelo menos mais um reforço vacinal. No limite, quem tomou a chamada “dose de reforço” até finais de Novembro do ano passado terá de receber uma quinta dose para não sofrer restrições de circulação até ao meio do próximo ano.
Porém, anteontem, o Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) e a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) vieram recomendar que, por agora, fossem vacinadas com a quarta dose apenas as pessoas com mais de 80 anos.
Curiosamente, nos últimos dias, a origem de uma parte muito significativa dos comentários à consulta pública é a Alemanha, o país de Ursula von der Leyem, cujo Parlamento rejeitou ontem uma proposta do chanceler Olaf Scholz de tornar a vacinação obrigatória para os maiores de 60 anos. No Bundestag, a medida foi rejeitado por 378 deputados, tendo 296 votado a favor.
Pelas 17:30 horas de hoje, provenientes da Alemanha estavam contabilizados 123.888 comentários – no domingo passado eram apenas 22.592 –, enquanto a Itália, que liderou na “contestação” à medida durante a maior parte do tempo da consulta pública, contava 37.334 comentários.
A Áustria – que chegou a implementar um sistema que visava tornar a vacinação obrigatória, sob pena de pesadas multas, mas acabou por suspender a medida por ter tido um efeito oposto – ocupa agora a terceira posição dos comentários (33.143) sobre o prolongamento da vigência do certificado digital. Com um número superior a 10 mil comentários encontram-se ainda a Holanda (28.458), França (19.704), República Checa (19.190), Eslováquia (18.235) e Bélgica (10.174).
No caso de Portugal, contabilizam-se, por agora, somente 1.947 comentários, ocupando a 16ª posição. No passado domingo eram 1.257.
Número de comentários por país no site da Comissão Europeia (17h30 de hoje) sobre a proposta de regulamento para prolongamento do certificado digital até Junho de 2023
Com o fim da consulta pública, à meia-noite de hoje, hora da Europa Central, as próximas semanas serão fundamentais para saber se a Comissão von der Leyen manterá a intenção de avançar mesmo com a renovação do certificado digital, uma vez que nunca antes houve uma tão grande participação pública contra um regulamento comunitário. Por norma, antes da decisão final, as propostas recebem poucas dezenas ou centenas de comentários.
Apesar desta contestação, em Portugal o tema dos certificados digitais, cujo uso discriminatório ainda se mantém, não tem merecido a mínima atenção da imprensa mainstream e dos partidos políticos. Na semana passada, o PÁGINA UM quis saber, por duas vezes, a opinião dos partidos políticos com assento parlamentar, mas apenas o PCP respondeu.
Partido Socialista, Partido Social Democrata, Chega, Bloco de Esquerda, PAN e Livre alhearam-se, não revelando a respectiva opinião, se é que a têm, sobre um tema que marcou indelevelmente a sociedade nos últimos dois anos.
Contrariando um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, a entidade reguladora dos medicamentos insiste em não permitir o acesso independente à base de dados dos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19 e também do remdesivir, o polémico antviral da Gilead. A derradeira hipótese de se saber a verdade é através de uma intimação junto do Tribunal Administrativo. O PÁGINA UM inicia hoje uma campanha de angariação no MightyCause denominada “INFARMED – UMA LUZ PARA A TRANSPARÊNCIA” com o objectivo específico de suportar custos de patrocínio jurídico e demais despesas correlacionadas.
O Infarmed mantém a recusa em permitir o acesso à base de dados do Portal RAM, onde constam os dados brutos dos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19, apesar de um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).
Em carta endereçada ao PÁGINA UM esta tarde, assinada por toda a sua direcção – o presidente Rui dos Santos Ivo e os vice-presidentes António Manuel Faria Vaz e Cláudia Susana Belo Ferreira –, o Infarmed não quer permitir que se tenha acesso directo aos dados anonimizados com toda a informação detalhada, e que permitira aferir para Portugal os verdadeiros impactes das vacinas, bem como a forma como são definidos os critérios para a inclusão dos efeitos adversos em cada idade.
O Infarmed defende que devem ser apenas disponibilizados ao público “os dados constantes da base de dados EudraVigilance”, mas que são apenas apresentados em formato agregado, não sendo possível um grande detalhe informativo. Na sua deliberação, onde recusa o acesso de informação a um órgão de comunicação social – violando assim a Lei da Imprensa –, a direcção do Infarmed conclui que, “face ao parecer emitido [pela CADA] e no quadro dos regimes legislativos e regulamentares supra expostos, é [nosso] entendimento (…) que os dados solicitados devem ser obtidos por consulta à base de dados EudraVigilance.”
Como o entendimento do PÁGINA UM é diferente, procuraremos criar condições para apresentar uma intimação ao Tribunal Administrativo contra este obscurantismo do Infarmed e das suas ligações pouco transparentes com a indústria farmacêutica. Em prol da verdade.
Os apoios podem ser encaminhados directamente para a plataforna de angariação no MightyCause denominada “INFARMED – UMA LUZ PARA A TRANSPARÊNCIA” com o objectivo específico de suportar custos de patrocínio jurídico e demais despesas correlacionadas.