Categoria: Saúde

  • Como convencer um povo pouco adepto das vacinas a vacinar-se agora?

    Como convencer um povo pouco adepto das vacinas a vacinar-se agora?

    A Ucrânia é um dos países europeus com mais baixas taxas de vacinação. Não apenas contra a covid-19, mas contra praticamente todas as outras doenças com imunizantes de eficácia histórica comprovada, por razões socio-económicas, por via dos conflitos internos e com a Rússia, e ainda pela influência dos movimentos anti-vacinas. A Direcção-Geral da Saúde publicou agora uma norma com um plano para vacinar os refugiados ucranianos, mas nem os cita. E nem diz como vai convencer um povo pouco atreito a “picas”.


    É tema quase tabu, sensível e manejado com pinças. No (quase) epílogo de dois anos de fortes restrições, muitas das quais polémicas e ainda em vigor, para controlo da pandemia causada pelo SARS-CoV-2, a Direcção-Geral da Saúde está agora perante um problema bicudo: controlar eventuais surtos de sarampo, poliomielite e tuberculose, além da própria covid-19, provenientes dos refugiados da Ucrânia.

    O problema é real, mas muito sensível do ponto de vista político e social, tanto assim que a palavra “Ucrânia” e “ucranianos” não consta na norma que a DGS fez sair discretamente, no sábado passado, sobre “vacinação de cidadãos estrangeiros no contexto de protecção temporária”.

    Refugiados ucranianos num centro de refugiados junto à fronteira polaca.

    A norma homologada por Graça Freitas refere apenas que “Portugal tem vindo a receber milhares de pessoas provenientes de países em conflito armado ou noutras situações muito desfavoráveis”, acrescentando que “uma das prioridades à chegada desses cidadãos”, nunca citando a nacionalidade, “é a vacinação”.

    Não os citando, porém, na prática esta norma visa implementar com urgência um plano para maximizar a inoculação em refugiados provenientes da Ucrânia com vacinas contra a covid-19, a gripe, o sarampo, a poliomielite e a tuberculose. E a razão é simples: a DGS, tal como outras congéneres europeias, teme surtos já há muito não vistos na Europa mais modernizada.

    O assunto é melindroso, mas já debatido de forma pela comunidade científica, como se observa por um artigo de investigadores italianos publicado na semana passado na Lancet.

    No caso da covid-19, sabia-se já que a situação ucraniana em finais de Fevereiro passado era de grande atraso no programa de vacinação, com apenas 34,5% da sua população com dose duplas. E naquele mês, a Ucrânia estava ainda a atravessar um surto, com 240 óbitos diários – equivalente a cerca de 55 mortes em Portugal –, aquando do início das hostilidades.

    Porém, o problema sanitário naquele país – e em consequência dos refugiados ucranianos – assume uma maior dimensão, e decorre em parte do atraso histórico de desenvolvimento, mas também muito dos conflitos internos iniciados em 2014.

    Há ainda outro factor delicado: por razões variadas, os ucranianos não são indefectíveis adeptos das vacinas. Não só daquela contra a covid-19, mas de todas. E por esses e outros motivos estão na cauda da Europa em muitos indicadores de saúde.

    Desde a desagregação da União Soviética, a Ucrânia tem sofrido um dramático decréscimo das condições de vida da sua população, agravado pelos conflitos a leste do país e a uma emigração massiva.

    A consequência mais visível foi uma brutal redução populacional, passando de quase 52 milhões de habitantes em 1991 para apenas 42 milhões no final da década passada. O número de nascimentos diminuiu de 641 mil, em 1991, para um pouco menos de 364 mil em 2017.

    Colocado na 40ª posição a nível europeu no Índice de Desenvolvimento Humano, e no lugar 74 à escala mundial, a Ucrânia enfrentava já uma crise humanitária atingindo cinco milhões de pessoas, das quais 3,8 milhões a precisar de serviços de saúde de emergência, de acordo com o Escritório Regional para a Europa da Organização Mundial da Saúde (OMS-ERE). A taxa de mortalidade infantil é ainda extremamente elevada: 8,1 óbitos por 1.000 nascimentos, mais de três vezes superior à portuguesa (2,4).

    O sarampo é hoje ainda endémico na Ucrânia, causada por bolsas de não-vacinados.

    Em 2012 um surto atingiu cerca de 12 mil pessoas, e mais tarde um ainda mais grave, iniciado em 2017 e que se prolongou por até 2020, afectou mais de 115.000 pessoas, tendo causado a morte de 41, incluindo 25 crianças.
    Este foi considerado um dos maiores surtos na Europa desde o início do presente século.

    Uma das regiões mais atingida foi Chernivtsi, no sudoeste da Ucrânia, próximo da Roménia, com 6.427 casos, dos quais dois terços eram crianças. De entre os doentes, 63% não estavam vacinados.

    Num artigo científico publicado em 2019 por Roman Rodyna, vice-director do Departamento de Vigilância Epidemiológica do Centro de Saúde Pública da Ucrânia, são apontadas as causas: a taxa de vacinação “diminuiu significativamente, durante o período 2008-2016, passando de 96% para 45%, devido a problemas na aquisição de vacinas no país e a campanhas de antivacinação”. Em 2016, apenas 31% das crianças elegíveis tinham sido vacinadas contra o sarampo, a papeira e a rubéola.

    Outro problema é a tuberculose. Há cerca de um ano, a OMS-ERE alertava que, embora em tendência decrescente, a incidência de tuberculose na Ucrânia era ainda de 42,2 casos por 100.000 habitantes, isto é, três vezes superior à de Portugal (14,2 casos).

    Direcção-Geral da Saúde tem novo e espinhoso desafio.

    O organismo internacional estimava que em 2018, entre os casos confirmados bacteriologicamente na Ucrânia, 6.900 pessoas tinham tido tuberculose resistente a medicamentos, representando 29% dos novos pacientes e 46% dos doentes previamente tratados. Essas taxas eram consideradas “altas” em comparação com outros países do leste europeu.

    Os dados mais recentes disponíveis mostram que a taxa de vacinação na Ucrânia com uma dose da vacina Bacillus Calmette-Guérin (BCG) foi de 75% em 2016, subindo para os 84% em 2017, ainda aquém dos níveis recomendados pela OMS (90%).

    As taxas de vacinação na Ucrânia contra outras doenças transmissíveis também são genericamente baixas ou mesmo muito baixas, sobretudo no decurso dos conflitos no leste da Ucrânia, na região de Donbass.

    De acordo com um artigo de investigadores do Departamento de Pediatria da Universidade ucraniana de Samy, em 2016 apenas 3% das crianças daquele país foram vacinadas contra a difteria, tosse convulsa e tétano durante os dois primeiros anos de vida.

    Também somente 44% das crianças menores de 18 meses de idade foram totalmente imunizadas contra a poliomielite.

    Por fim, a percentagem de bebés que receberam a vacinação completa contra o Haemophilus influenzae tipo b – causadora de graves infecções como a pneumonia e a meningite em crianças – também sofreu uma drástica diminuição com os conflitos iniciados há oito anos. Em 2013 a cobertura vacinal era de 83% e caiu para apenas 39% quatro anos mais tarde.

  • Antigos bastonários da Ordem dos Médicos não poupam (agora) críticas à Direcção-Geral da Saúde

    Antigos bastonários da Ordem dos Médicos não poupam (agora) críticas à Direcção-Geral da Saúde

    Num debate organizado pela Cidadania XXI, na passada quarta-feira, Germano de Sousa e José Manuel Silva criticaram papel da Direcção-Geral da Saúde sobre a gestão da pandemia, e nem sequer se furtaram a abordar o tema dos processos intentados pela Ordem dos Médicos que já lideraram.


    José Manuel Silva, antigo bastonário da Ordem dos Médicos e actual presidente da autarquia de Coimbra, acusa a Direcção-Geral da Saúde (DGS) de se ter “transformado num órgão político” em vez de funcionar “um órgão exclusivamente técnico, como era suposto”.

    Num debate realizado na passada semana em Lisboa, o também antigo presidente da Sociedade Portuguesa de Aterosclerose, e que ocupou ainda o cargo de pró-reitor da Universidade de Coimbra, lamentou ainda que “muitas das decisões [no âmbito da gestão da pandemia] foram baseadas em política e não em evidência científica“, por via de uma demasiada centralização.

    Neste debate em torno da gestão da pandemia, promovido pela Cidadania XXI, outro antigo bastonário, Germano de Sousa, salientou a “impreparação indiscutível do Estado português para fazer face a esta epidemia”, exemplificando com o caso dos testes PCR e de antigénio, onde foram os laboratórios privados que os asseguraram.

    Debate da Cidadania XXI com a presença de Germano de Sousa (ao centro) e José Manuel Silva (à direita), com moderação de Carlos Alberto Gomes, colaborador do PÁGINA UM (à esquerda)

    Um dos aspectos que ambos os bastonários consideraram marcante ao longo dos dois anos da pandemia foi o medo, vindo desde o início com a chegada da covid-19 à Europa. Para José Manuel Silva, instalou-se, injustificadamente, “um clima de pânico, e houve uma dramatização excessiva com as imagens vindas de Itália“. E salientou ainda alguns erros iniciais, mesmo terapêuticos, que levaram a uma maior letalidade inicial da doença.

    Na sua opinião, houve algum “experimentalismo terapêutico“, evidenciado, por exemplo, na ventilação quase universal dos doentes, independentemente da idade. Recorde-se que, nos primeiros meses, mesmo idosos foram ventilados em unidades de cuidados intensivos, uma prática que se reveliu fatal e se modificou ao longo do tempo.

    Para agravar a sensação de medo e pânico na sociedade, a DGS e a comunicação social também deram um importante contributo, segundo estes dois antigos bastonários. José Manuel Silva considerou que as estatísticas oficiais da covid-19 foram divulgadas com o intuito de “fomentar o medo da população”, mas o seu maior impacte social deveu-se muito à falta de “cultura médica” da população quando essa informação chegava pelos media.

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    Germano de Sousa qualificou mesmo a cobertura da pandemia pela imprensa como “chocante“. “Eu abria a televisão e via o Rodrigo Guedes de Carvalho a contar-nos histórias arrepiantes, mudava de canal e era la même chose“, afirmou. “Eu percebo que tenha dado para vender jornais, se eu fosse dono de uma empresa de televisão se calhar também tinha feito o mesmo, mas criou-se um ambiente terrível“, lamentou.

    A utilidade da testagem massiva da população, defendida como medida central no controlo da pandemia, também foi posta em causa por estes antigos líderes dos médicos portugueses. Germano de Sousa defendeu que este método só faz sentido “se for possível controlar e isolar os infectados“, algo que nem sempre foi possível. “Na verdade, gostava que me explicassem se [a testagem massiva] serviu de alguma coisa“, reforçou.

    No entanto, convém referir que Germano de Sousa é fundador e administrador de um dos principais laboratórios de diagnóstico e análises clínicas de Portugal. Conforme o PÁGINA UM revelou, no primeiro ano da pandemia, em 2020, e muito em virtude dos testes para a covid-19, a sua empresa apresentou um lucro de 31,1 milhões de euros, cerca de quatro vezes mais do que no ano anterior.

    Sobre a eficácia dos testes como opção adequada para diagnóstico da covid-19, José Manuel Silva também salientou a polémica em redor dos ciclos de amplificação nos testes PCR. Este antigo bastonário revelou ter chegado a pedir que lhe fosse indicado o número de ciclos utilizados, mas ter-lhe-ão dito que “os médicos não sabiam interpretar essa informação“.

    José Manuel Silva considerou que o problema dos testes positivos não se circunscreveu ao diagnóstico, mas também à própria gestão hospitalar ou das pessoas em quarentena. “Houve casos de pessoas já recuperadas, mas que continuaram isoladas ou internadas, porque tinham ainda testes positivo; e isso quando já existia evidência científica de que um resultado positivo não significava que a pessoa tivesse material genético viável ou que contagiasse“, salientou.

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    A polémica vacinação de crianças para a covid-19 – que motivou, no final de Janeiro passado, um abaixo-assinado por 27 médicos a pedir a suspensão imediata da inoculação de jovens e crianças – foi considerada “desnecessária“ por estes dois ex-bastonários.

    Germano de Sousa considerou ser “inaceitável, do ponto de vista deontológico, vacinar crianças para proteger os mais velhos“, isto mesmo sabendo-se que o programa de vacinação não concederia qualquer imunidade de grupo.

    Além disto, José Manuel Silva reforçou que, aquando da decisão da DGS, “não havia evidência científica de que vacinar os mais novos mudasse o curso da pandemia“.

    Para a insistência em se vacinarem crianças, o também presidente da Câmara de Coimbra lamentou que a DGS seja, em Portugal, “uma entidade de saúde que se limita a imitar com atraso o que os outros países determinam“. E advoga ainda que os portugueses deviam estar já a fazer uma vida normal desde Setembro – mês em que se atingiu uma cobertura vacinal de 84% da população –, lamentando a lentidão no alívio das restrições.

    Também em debate esteve a actuação da Ordem dos Médicos durante a pandemia, com Miguel Guimarães como bastonário, pautada pela abertura de diversos processos disciplinares a médicos, entre os quais Fernando Nobre, fundador da AMI e antigo candidato a presidente da República. Sobre este ponto, Germano de Sousa frisou que, por princípio, “não se deve punir ninguém por delitos de opinião“.

    Por sua vez, José Manuel Silva posicionou-se contra qualquer “unanimismos“, defendendo que a Ordem dos Médicos “deve promover o debate sem receios“, pese embora se tenha de cumprir a “leges artis” (métodos e procedimentos, comprovados pela ciência médica), que a “liberdade não é total”.

    Texto editado por Pedro Almeida Vieira

  • Excesso de mortes em crianças norte-americanas foi afinal um erro informático

    Excesso de mortes em crianças norte-americanas foi afinal um erro informático

    Organismo norte-americano que faz gestão da covid-19 corrigiu número de óbitos, que caíram em todos os grupos etários, mas especialmente nas idades pediátricas. Porém, desde o início do ano, os números alarmantes de supostos internamentos e mortes de menores nos Estados Unidos fizeram parte da campanha comunicacional para convencer pais a vacinarem as crianças contra a covid-19.


    Um alegado erro informático “limpou” mais de 72 mil mortes indevidamente atribuídas à covid-19 em 26 estados norte-americanos, incluindo 416 óbitos em crianças, admitiu ontem o Centers for Disease Control and Prevention (CDC), o organismo federal que supervisiona a gestão da pandemia naquele país da América do Norte. A justificação do CDC, apresentada em comunicado à agência Reuters, remete para “ajustes de mortalidade do Covid Data Tracker em 14 de Março, porque o algoritmo estava contando acidentalmente mortes que não estavam, relacionadas com a covid-19”.

    A correcção administrativa das mortes atribuídas à covid-19 atingiu todas as faixas etárias, mas no caso dos menores de 18 anos a redução foi de 24%, passando de 1.757 óbitos para 1.341.

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    Tendo em conta que a população menor de idade nos Estados Unidos ronda os 74 milhões (22,3% do total), segundo o United States Census Bureau, o número de mortes nesta faixa etária é o equivalente a 31 óbitos em Portugal para o grupo homólogo.

    Recorde-se que, em Portugal, apenas se registaram até ao momento a morte de quatro menores de idade, todos com graves comorbilidades. E saliente-se também que os Estados Unidos tem sido um dos países desenvolvidos que mostra maiores disparidades sociais em termos de impacte da covid-19, com a incidência da hospitalização a ser quatro vezes superior na população negra adulta em comparação com a população branca.

    O jornal digital Washington Examiner, de postura política conservadora, adiantou, entretanto, que a Covid Data Tracker empolou sobretudo as mortes de menores nas primeiras semanas de 2022, numa altura em que se intensificavam os programas de vacinação. Muitos órgãos de comunicação social, também em Portugal, foram aliás lestos a divulgar uma onda de internamentos de crianças nos Estados Unidos, que aparenta agora ter sido falsa.

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    Uma notícia da Agência Lusa no início de Janeiro, reportando o internamento de “cerca de 1.000 crianças” norte-americanas num só dia, teve eco, por exemplo, no Diário de Notícias, no Observador e na SIC.

    Com um título mais alarmante, o canal televisivo da Impresa noticiaria, em 17 de Janeiro, que a Ómicron seria a responsável por aquela situação.

    Ainda recentemente, na edição de 11 de Março, o jornal britânico The Guardian relatava que “um terço de todas as mortes infantis” por covid-19 nos Estados Unidos tinham ocorrido durante o surto da Ómicron. Fazia crer assim que esta variante, claramente menos letal para a população mais vulnerável, poderia ser afinal mais perigosa para crianças e adolescentes.

    Algo que, com a correcção do CDC, mostrou ser falso. O jornal do Reino Unido viria mesmo a rectificar a notícia original anteontem, passando a titular que afinal, em vez de um terço (33%) das mortes era “um quinto” (20%), anotando também que o erro da notícia se devera a “um erro de codificação” do CDC.

    Apesar do alarmismo em redor da covid-19 em idade pediátrica, o impacte efectivo neste grupo populacional é irrelevante no ponto de vista da saúde pública. De acordo com dados do CDC, os menores de 5 anos representam 6% da população e apenas constituem 0,1% dos óbitos causados pela pandemia, o que contrasta com a situação dos maiores de 85 anos: são apenas 2% da população dos Estados Unidos, mas aí se concentraram 26,7% dos óbitos. A população com mais de 65 anos (16,5% do total) registou 75,2% de todas as mortes por covid-19.

    Em Portugal, a mortalidade por covid-19 ainda é mais residual nas faixas etárias inferiores. Os menores de idade representam cerca de 17% da população, e os quatro óbitos registados constituem 0,02% do total. Já a população com mais de 60 anos concentra 95,5% da mortalidade atribuída à covid-19, representando 30% da população.

  • Sente-se mal, nunca teve covid-19 mas vacinou-se? A culpa não será da vacina; pode ser long covid, defende DGS

    Sente-se mal, nunca teve covid-19 mas vacinou-se? A culpa não será da vacina; pode ser long covid, defende DGS

    Uma nova norma da Direcção-Geral da Saúde procura orientar os profissionais de saúde a identificar e tratar sintomas crónicos decorrentes da covid-19. Porém, tudo cabe no chamado long covid, incluindo pessoas que nunca tiveram teste positivo. E mesmo pessoas que se sentiram mal depois da vacina podem acabar assim diagnosticadas. Seguindo-se esta norma, o SARS-CoV-2 tem, afinal, “costas” tão largas que até pode ser apontado como culpado por suicídios.


    3.380.263 – é este o número oficial de infecções por SARS-CoV-2 que, segundo os dados da Direcção-Geral de Saúde (DGS), tiveram teste positivo à covid-19 desde o início da pandemia em Portugal, em Março de 2020.

    Também de acordo com a DGS, houve 21.285 mortes atribuídas a esta doença, o que significa que 3.358.978 pessoas com teste positivo tiveram doença (grave ou ligeira) ou foram assintomáticas, e sobreviveram ao SARS-CoV-2.

    De entre essas, e considerando uma taxa de mortalidade mensal em Portugal de 0,01% (12 por 1.000 ao fim de um ano), podemos então estimar que quase 17 mil pessoas terão morrido de outras doenças depois de já terem contraído e recuperado de covid-19 [daqui a 100 anos será praticamente 100%].

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    Em suma, estarão seguramente vivas um pouco mais de 3,3 milhões de portugueses com comprovativo de teste para SARS-Cov-2, independentemente da gravidade.

    Porém, ainda segundo a DGS, o número de pessoas susceptíveis estarem a sofrer de long covid – ou mais prosaicamente condição pós-covid-19 – pode ser até superior a este número. No limite do absurdo, potencialmente poderá haver mais casos de long covid do que de doentes-covid.

    Isto porque uma norma homologada esta quarta-feira pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas, determina que o “diagnóstico da condição pós-covid-19 [long covid] é clínico e deve ser considerado quando existe forte suspeita, mesmo na ausência de história de teste para SARS-CoV-2 positivo.”

    Norma da DGS considera possível sintomas de long covid, que inclui depressão, mesmo sem teste positivo ao SARS-Cov-2.

    Ou seja, mesmo pessoas sem conhecimento de terem tido alguma vez covid-19 – nem por teste PCR ou de antigénio nem por teste serológico –, portanto, dois terços da população portuguesa, podem vir a ser diagnosticadas, segundo a norma da DGS, como sofredoras de long covid.

    Para tal bastará que tenham um quadro de sintomatologia muito variado, que vai desde a dispneia súbita ou em repouso, a febre associada a dor torácica com características pleuríticas até toracalgia pleurítica e/ou toracalgia com características de angor, passando ainda por alteração do olfacto e do paladar, alteração do estado de consciência, défices neurológicos focais, cefaleia súbita e intensa, depressão e ansiedade e até mesmo sintomas psiquiátricos graves com risco de suicídio. Tudo pode ser por culpa do SARS-CoV-2.

    Embora a norma da DGS indique formas de despistagem para identificação de sequelas da covid-19 sobretudo pulmonares e cardíacos – com exames complementares de diagnósticos complementares, como eletrocardiogramas, avaliação imagiológica do tórax e provas funcionais respiratórias –, em muitas situações mostrar-se-á algo forçoso atribuir especificamente ao vírus a causa de determinadas perturbações.

    São os casos, por exemplo, dos sintomas psiquiátricos indicados na norma da DGS, como a ansiedade, a depressão, a perturbação do sono ou mesmo a ideação ou a concretização de suicídio.

    Norma inclui teste PHQ-9 para detecção de depressão por long covid.

    No limite, aquilo que a DGS aparenta querer fazer é atribuir um eventual aumento do número de suicídios não como uma consequência da gestão da pandemia e das dificuldades económicas dos portugueses, mas sim apontar um suposto diagnóstico de long covid como uma causa patológica, mesmo em “pacientes” que nunca estiveram doentes com covid-19 ou nem sequer teste positivo apresentaram em qualquer data anterior.

    Por exemplo, de acordo com o Anexo 8 da norma da DGS, que inclui a aplicação do PHQ-9, um teste clínico de diagnóstico de depressão, se alguém tiver alterações de humor compatíveis com um valor entre 15 e 28 – que indicia necessidade de tratamento – pode ser também considerada uma vítima de long covid.

    No absurdo, até sem qualquer histórico de teste positivo. Dependerá somente da decisão clínica do médico.

    Porém, mais estranho ainda nesta norma da DGS é a preocupação em se saber também, através de um detalhado questionário clínico (Anexo 2), informação detalhada sobre o estado vacinal do paciente, inquirindo mesmo quantas doses foram tomadas e qual a marca administrada (Spikevax, Comirnaty, Vaxzevria, Janssen ou outra).

    Nesse inquérito, o paciente apenas será questionado se um eventual agravamento do seu estado de saúde se registou antes da covid-19. Nada se pergunta se a pessoa teve alguma “recaída” após a vacinação.

    Recorde-se que a própria Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 admitiu que “parece existir uma maior frequência de reacções adversas sistémicas após vacinação de indivíduos previamente infectados”.

    Em suma, a DGS mostra nesta norma que não considera relevante uma avaliação sobre eventuais efeitos adversos após a vacinação, mas tão-só busca supostos casos de long covid mesmo em pessoas sem contacto confirmado de covid-19, sejam estas vacinadas ou não. Recorde-se que 91,4% da população portuguesa se encontra vacinada.

  • Cinco dos 12 consultores da DGS discordaram da vacinação universal de adolescentes, mas pais nunca souberam

    Cinco dos 12 consultores da DGS discordaram da vacinação universal de adolescentes, mas pais nunca souberam

    Direcção-Geral da Saúde escondeu discordâncias entre os membros da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 sobre a vacinação de adolescentes, dando a entender que a opção pela vacinação foi técnica e cientificamente consensual. Não foi. E nem se baseou em dados científicos consolidados. Foi uma opção política, e os pais nunca foram informados.


    No âmbito da estratégia do combate à pandemia, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) justificou a implementação do programa de vacinação em adolescentes, no Verão passado, com base em dois pareceres polémicos que mereceram mesmo a não concordância de cinco dos membros da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC). Esta situação foi inédita em todos os outros 21 pareceres.

    Na totalidade dos 23 pareceres (vd. lista em baixo), apenas outros dois não mereceram unanimidade, mas apenas por um dos membros, cada: o primeiro, referente à vacinação de maiores de 80 anos; o segundo, sobre a co-administração das vacinas contra a covid-19 e a gripe.

    Destaque-se que as discordâncias nos dois pareceres sobre vacinação de adolescentes, datados em 28 de Julho e em 8 de Agosto do ano passado, foram sempre omitidas pela DGS. Relembre-se que todos os membros, com funções consultivas e publicamente pró-vacinas, foram escolhidos a dedo pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas.

    E nunca constaram da informação dada aos pais com vista ao consentimento informado. Ou seja, os pareceres foram “vendidos” à opinião pública como se houvesse consenso entre peritos. Nunca houve.

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    Recorde-se que estes e os outros 21 pareceres – com excepção do referente às crianças que foi divulgado por pressão política em Dezembro passado – estiveram inacessíveis ao público até esta semana. O PÁGINA UM, após uma longa “luta jurídica” de cerca de cinco meses, conseguiu ter finalmente acesso aos pareceres da CTVC, na sequência de um parecer solicitado à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).

    No primeiro parecer sobre a vacinação de adolescentes, homologado por Graça Freitas em 28 de Julho, de entre 12 votos da CTVC registaram-se três contra e duas abstenções. Menos de duas semanas mais tarde, em 8 de Agosto registaram-se quatro votos contra e “uma pessoa não votou”.

    Apesar do PÁGINA UM ter solicitado, no âmbito da queixa contra a DGS na CADA, o acesso também às actas da CTVC, estas não foram ainda disponibilizadas. Ontem, o PÁGINA UM questionou a DGS para identificar os membros da CTVC que votaram contra no primeiro e no segundo pareceres, mas não obteve qualquer resposta, apesar do e-mail com essa solicitação ter sido recepcionado por pelo menos cinco técnicos dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), que assessoram a DGS, a saber: Diana Mendes, Diana Cohen, Sandra Bessa, Nélson Guerra e Bruna Cadima.

    Além das discordâncias, aquilo que ressalta nos dois pareceres foi a drástica mudança de conteúdo técnico num tão curto espaço de tempo. Em apenas 11 dias, a opinião da CTVC – longe da unanimidade – passou de uma não recomendação para indivíduos saudáveis – ou seja, apenas para jovens com comorbilidades – para a vacinação universal desta faixa etária.

    Aliás, numa primeira fase, a DGS chegou a anunciar apenas vacinação prioritária para adolescentes com comorbilidade, tendo mesmo divulgado, no dia 3 de Agosto, quais aquelas que deveriam ser consideradas, de acordo com um parecer de pediatras, classificado como confidencial. De entre essas comorbilidades estavam cancro activo, diabetes, obesidade e insuficiência renal crónica.

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    Porém, a DGS mudaria de opinião pouco dias depois, mesmo se apenas sete de entre 12 membros da CTVC tivessem concordado com essa vacinação universal.

    De acordo com a análise comparativa, feita pelo PÁGINA UM, ambos os pareceres reconhecem que a covid-19, como doença, era “ligeira nas crianças e adolescentes, com um risco de hospitalização e de morte extremamente baixo” e que existiam “algumas comorbilidades que colocam as crianças e adolescentes em maior risco”.

    Foi, aliás, nesse sentido que o parecer de 28 de Julho recomendou apenas a vacinação nos casos da existência de comorbilidades ou através de prescrição feita por pediatra.

    O texto dos dois pareceres é similar também quando referem que “está em curso a avaliação de um sinal de segurança pela EMA [Agência Europeia do Medicamento], associado à ocorrência de casos muito raros de miocardite e pericardite após a administração destas vacinas”.

    Sobre essas reacções adversas, os pareceres referem que “não são conhecidos os fatores de risco [que levaram à hospitalização] nem os seus efeitos a médio/longo prazo”. Os técnicos estimavam que “o número de hospitalizações por covid-19 prevenidas é muito próximo do número de miocardites esperadas com a vacinação universal de adolescentes, sobretudo para o sexo masculino”, conforme descrito nos dois pareceres.

    O único argumento substancial que distingue os dois pareceres – e descrito na fundamentação sumária do parecer de 8 de agosto –, diz respeito aos “resultados da vacinação de 15 milhões de adolescentes nos Estados Unidos da América, Israel e União Europeia sem novos alertas de segurança”.

    No extenso capítulo relativo à segurança das vacinas, o segundo parecer acrescenta apenas, relativamente ao primeiro, uma atualização de dados de 30 de julho do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) relativos à vacinação de 8,9 milhões de adolescentes norte-americanos (12-17 anos) onde “foram reportadas 863 reações adversas graves, incluindo 347 episódios de miocardite e 14 mortes (quatro entre os 12 e os 15 anos)”, indicando ainda que “não foram reportados casos de morte em resultado de miocardites, embora os dados sejam preliminares e apresentem limitações”.

    São ainda referenciadas o número de doses de vacinas mRNA administradas a adolescentes (12-18 anos) em 11 países europeus, e é assumido o desconhecimento sobre as reacções adversas. “No decurso da vacinação destas faixas etária na União Europeia, não foram tornados públicos dados adicionais de segurança relativamente à ocorrência de miocardites e pericardites”, refere-se no documento analisado pelo PÁGINA UM.

    Também é indicado igualmente que “está prevista uma nova avaliação deste sinal de segurança pelo PRAC no início do mês de setembro de 2021”. O segundo parecer não refere quaisquer dados sobre Israel que fundamentem a inclusão desse país na lista daqueles utilizados como referência para a decisão. Não houve mais qualquer parecer, de avaliação e actualização, pela CTVC sobre esta matéria.

    Note-se, porém que as razões apresentadas para uma inversão completa das recomendações na vacinação contra a covid-19 na faixa etária dos 12-15 anos parecem carecer de rigor científico e de fundamentação. Os dados norte-americanos não se baseiam em ensaios clínicos estruturados, mas somente de uma avaliação de eventuais reacções adversas de curto prazo eventualmente notificadas após a inoculação em grupos anónimos.

    Os dados referidos relativamente à Europa assumem o total desconhecimento sobre as reações adversas, enquanto a informação israelita é completamente omissa. A análise também subverte uma variável essencial neste tipo de estudos – a idade –, apresentando dados que incluem idades até aos 18 anos, ou seja, fora da faixa etária dos 12 aos 15 anos.

    Em ambos os pareceres, é dedicado um extenso capítulo ao que era conhecido na altura relativamente aos riscos de miocardites e pericardites (inflamações no coração), após a administração de vacinas mRNA. Foram feitas ainda projecções sobre o “impacto da vacinação universal de adolescentes entre os 12 e os 17 anos, num período de 120 dias, em três cenários de incidência, face ao número de miocardites esperadas nestas idades”.

    person in blue denim jeans and black and white sneakers

    Em ambos os pareceres, foram projetados os casos, internamentos e admissões em unidades de cuidados intensivos (UCI) evitados, como também as miocardites, “considerando a taxa de ocorrência registada nos dados publicados nos EUA”. Os quadros servem como base para a análise risco/benefício da recomendação e verifica-se, em ambas as datas (28 de julho e 8 de agosto), que as previsões relativamente aos casos, internamentos e admissões UCI evitadas são iguais.

    No entanto, o número de miocardites esperadas é superior no parecer de 8 de agosto (24,5) face ao previsto a 28 de julho (21,8). Assim, conclui-se que a relação risco/benefício piorou para o lado do risco, mas o parecer que prevaleceu (vacinação universal) faz a interpretação exactamente contrária.

    O relatório dos técnicos refere que a projeção, utilizada primordialmente para justificar a alteração da recomendação, possui diversas limitações, como é o caso da “inclusão de pessoas com 16 e 17 anos, cuja vacinação universal já estava em vigor. Ou seja, pode haver sobrestimação do número de casos e hospitalizações prevenidas com a hospitalização”.

    Igualmente é assumido que “não existem na União Europeia dados representativos de farmacovigilância para pessoas com menos de 18 anos vacinadas com vacinas mRNA”, tendo sido utilizados dados “extrapolados dos EUA” relativamente aos riscos de miocardites/pericardites.

    Além disso, um aspecto fundamental, ambos os pareceres acabavam por confessar que “os riscos associados à administração da vacina, nestas faixas etárias, não são ainda definitivamente conhecidos”.

    Adiantam ainda que “o número de participantes vacinados nos ensaios clínicos que conduziram à aprovação da extensão de indicação das vacinas nos grupos etários dos 12 aos 15 anos para a Cominarty e dos 12 aos 17 anos para a Spikevax é baixo”, reconhecendo também que, esta situação, “não permite conhecer eventuais reações adversas muito raras, mas potencialmente graves nestas faixas etárias, principalmente quando comparados com o número de adultos incluídos nos ensaios clínicos para a indicação inicial”.

    woman in black crew neck t-shirt wearing white face mask

    Na extensa lista de considerações sobre a indefinição das reações adversas, os pareceres referem que “está em curso a avaliação de um sinal de segurança pela EMA, associado à ocorrência de miocardite e pericardite após a administração de vacina mRNA contra a Covid-19. Até ao momento, na União Europeia, foram apenas avaliados casos em pessoas com 18 ou mais anos de idade, não sendo ainda conhecidos os riscos abaixo dessa faixa etária”.

    Os técnicos da CTVC omitiram também dados referentes ao impacto das miocardites na saúde a longo prazo, apenas referindo que, a curto prazo, “os episódios são ligeiros e que os pacientes recuperam rapidamente em ambiente hospitalar”.

    As considerações sobre projecções são comuns a ambos os pareceres, mas a CTVC adicionou outras advertências à análise dos dados em 8 de Agosto, dizendo que “não foi considerada a potencial interação entre SARS-CoV-2 e outros vírus respiratórios”.

    O parecer de 8 de Agosto refere que “a implementação de medidas não farmacológicas de prevenção e controlo de infeção diminui a circulação de vírus sazonais, bem como o seu impacto no sistema de saúde”, assumindo que “não se conhece o impacto que o alívio de medidas não-farmacológicas pode ter na co-circulação de SARS-CoV-2 e outros vírus no próximo Outono-Inverno”.


    LEIA E DESCARREGUE OS 23 PARECERES INTEGRAIS DA COMISSÃO TÉCNICA DE VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19


    1 – Parecer sobre a estratégia vacinal e grupos prioritários
    Data de homologação: 01/12/2020

    2 – Parecer sobre a vacinação de doentes covid-19 recuperados
    Data de homologação: 16/12/2020

    3 – Parecer sobre vacinação de Pessoas com 80 ou mais anos
    Data de homologação: 27/01/2021

    4 – Parecer sobre a vacinação com a vacina da AstraZeneca
    Data de homologação: 03-02-2021

    5 – Parecer sobre a inclusão de pessoas com trissomia 21 nos grupos prioritários para vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 20-02-2021

    6 – Parecer sobre a inclusão de pessoas em situação de sem-abrigo nos grupos prioritários da campanha de vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 31/03/2021

    7 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção por SARS-COV-2 – II
    Data de homologação: 12/04/2021

    8 – Imunidade de grupo – Campanha de vacinação contra a covid-19 em Portugal
    Data de homologação: 21/05/2021

    9 – Estratégia de aceleração da campanha de vacinação
    Data de homologação: 30/09/2021

    10 – Efectividade e cobertura vacinal – Impacto da vacinação contra a covid-19 nas medidas de Saúde Pública
    Data de homologação: 08/06/2021

    11 – Parecer sobre estratégia de vacinação – Situação epidemiológica nacional a 26/06/2021 (variante Delta)
    Data de homologação: 16/06/2021

    12 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 25/06/2021

    13 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos
    Data de homologação: 28-07-2021

    14 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos – Actualização
    Data de homologação: 08-08-2021

    15 – Reforço vacinal em pessoas com condições de imunossupressão
    Data de homologação: 11-08-2021

    16 – Co-administração de vacinas contra a covid-19 e vacina da gripe
    Data de homologação: 14-10-2021

    17 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção de SARS-COV-2 – III
    Data de homologação: 21-12-2021

    18 – Grupos prioritários para dose de reforço (fase 3) – Vacinação na grávida
    Data de homologação: 02-12-2021

    19 – Vacinação contra a covid-19 em crianças com 5 a 11 anos – posição técnica
    Data de homologação: 05-12-2021

    20 – Vacinação contra a covid-19 em crianças de 5-11 anos (ÚNICO PARECER ANTERIORMENTE DIVUGADO PELA DGS)
    Data de homologação: 10-12-2021

    21 – Esquemas vacinais heterólogos – Vacinação com doses de reforço
    Data de homologação: 20-01-2022

    22 – Pessoas com imunossupressão – Vacinação com dose de reforço
    Data de homologação: 27-01-2022

    23 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 04-02-2022

  • Lotaria, cobaias & muitas incertezas: a perturbadora leitura do parecer 17

    Lotaria, cobaias & muitas incertezas: a perturbadora leitura do parecer 17

    De entre todos os 23 pareceres da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19, revelados pelo PÁGINA UM, há um que demonstra como a Política se sobrepôs à Ciência durante a pandemia. Para agradar a todas as farmacêuticas, nem sequer se permitiu a opção pela marca da vacina, e os dados revelam que existiam desempenhos muito diferentes. Para se chegar a bons níveis de vacinação, pressionou-se até recuperados a vacinarem-se mesmo não havendo ensaios clínicos sobre este grupo. E, no meio disto, a Direcção-Geral da Saúde mantém um silêncio ensurdecedor sobre muitas incertezas.


    Embora as orientações da Direcção-Geral da Saúde (DGS) pudessem excluir algumas marcas para determinados grupos e idades, nunca foi verdadeiramente possível escolher-se a vacina contra a covid-19 a ser administrada.

    Resultado disto: uma lotaria.

    Por exemplo, quem tomou a vacina da Janssen em Portugal teve um risco cerca de quatro vezes superior a sofrer uma infecção pelo SARS-CoV-2 em comparação com quem foi injectado com a vacina da Moderna; e quase duas vezes superior ao de quem recebeu a da Pfizer.

    Para começar, estes são alguns dos perturbadores aspectos que constam do parecer 17 (ver todos em baixo) da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC), que o PÁGINA UM obteve após uma longa “luta” para DGS os disponibilizar publicamente.

    clear glass bottle with red lid

    Este parecer em concreto – homologado em Dezembro passado, constituindo uma actualização sobre a vacinação de pessoas recuperadas – acaba por se debruçar bastante nas taxas de infecção dos vacinados (breakthrough infections), analisando o desempenho por tipo de vacina e também por grupo etário.

    O conteúdo integral de todos os 23 pareceres, finalmente obtidos ontem pelo PÁGINA UM – e que foram emitidos entre 1 de Dezembro de 2020 e 20 de Janeiro deste ano – podem ser consultados AQUI. Apesar de um parecer da Comissão de Acessos aos Documentos Administrativos (CADA), a DGS não os forneceu em formato digital, pelo que os documentos tiveram de ser fotografados página a página.

    De acordo com este 17º parecer, até 30 de Setembro do ano passado – quando 84% da população já estava então vacinada e quase 1,1 milhões de portugueses tinham tido contacto com o SARS-CoV-2, dos quais 1,7% tinha falecido –, “a taxa média global de infecção de indivíduos completamente vacinados foi estimada em 5,0 por 1.000 vacinados”. A taxa mais elevada era a dos vacinados com a Janssen (8,7 por 1.000), sendo que a da AstraZeneca atingia os 6,2, a da Pfizer 4,6 e a da Moderna 2,1.

    Por grupo etário, aqueles que apresentaram maiores taxa de infecção após a vacinação foram os maiores de 80 anos, com um rácio de 7,7 por 1.000 vacinados, seguindo-se o grupo dos 50 aos 59 anos, com 6,2 por 1.000. O grupo com menor taxa de reinfecção foi o dos menores de 20 anos (1,0 por 1.000). Nos restantes grupos etários, essa taxa situava-se entre os 4,5 e os 5,1 por 1.000 vacinados.

    A CTVC alertava, porém, que estes valores dependiam de diversos factores, “nomeadamente, o grau de exposição ao vírus, o aparecimento de variantes mais transmissíveis, e a diminuição com o tempo da protecção inicial conferida pela resposta imunitária à vacina (waning immunity), a qual varia com a idade do vacinado”.

    O parecer também confirma que a protecção das vacinas é bastante curta e decai significativamente sobretudo a partir do sexto mês. Por exemplo, para as infecções registadas em Setembro do ano passado, aqueles que tinham sido vacinados antes de Março apresentaram globalmente uma taxa de infecção de 3,9 por 1.000, enquanto esse rácio foi apenas de 1,1 para quem se vacinara há um mês. Para quem se vacinou entre Março e Julho, a taxa situou-se entre os 1,4 e os 1,9 por 1.000. A DGS nunca revelou este tipo de informação.

    Dossier dos pareceres consultados pelo PÁGINA UM.

    Saliente-se, contudo, que uma taxa de infecção de 3.9 em 1.000 (ou 0,39%) não significa que a vacina conceda uma protecção de 99,61%, uma vez que o risco de se estar em contacto com o vírus no período de um mês é bastante reduzido mesmo sem protecção, sobretudo fora do período invernal. Note-se que, para atingir comprovadamente um terço dos portugueses, o SARS-CoV-2 “precisou” de 24 meses, ou seja, em média infectou 1,4% da população por mês.

    Estes números indicados pela CTVC não entram, além disto, em consideração com o surgimento da variante Ómicron – mais transmissível, mas muito menos letal –, que fez “explodir” o número de casos positivos, e, na mesma linha, as taxas de infecção entre vacinados. Com cerca de 2,4 milhões novos casos positivos (quase um quarto da população) desde Outubro do ano passado, até ao final da semana passada, a taxa de letalidade atinge apenas 0,14% – um valor já próximo de um surto gripal.

    Embora a explicação oficial, e dos chamados “peritos”, aponte sempre o grande contributo da vacinação para estes baixíssimos níveis de letalidade, a menor agressividade da variante Ómicron parece encaixar-se melhor como hipótese mais plausível. Com efeito, se até finais de Dezembro de 2020 – o início do programa de vacinação –, a taxa de letalidade da covid-19 se situava nos 1,66%, ao longo dos primeiros nove meses de 2021 – com o plano de vacinação em curso, mas dominando então a variante Delta –, a taxa de letalidade manteve-se estável: 1,68%.

    Por esse motivo, a diminuição da letalidade a partir do final do ano passado – com a variante Ómicron a “varrer” vacinados e não-vacinados – não pode ser assim explicada apenas pela acção da vacina. Se assim fosse, a taxa de letalidade entre Janeiro e Setembro de 2021 já teria de ser necessariamente muito mais baixa do que os 1,66% observados. Sobre esta questão, fundamental e elementar, a CTVC não analisa nem se pronuncia em qualquer parecer.

    Tendo em consideração que, com a vaga de casos de infecção nos primeiros dois meses deste ano, pelo menos um terço da população portuguesa (3,4 milhões de pessoas) teve já, comprovado por teste PCR, contacto (infecção) com o SARS-CoV-2 (independentemente do regime de vacinação), uma questão se coloca: justificam-se reforços de vacina ou vale mesmo a pena (e o risco) um recuperado vacinar-se?

    Sede da Direcção-Geral da Saúde, em Lisboa.

    Embora a CTVC destaque, e bem, que “a evidência mais sólida quanto à protecção de reinfecção que pessoas que recuperaram de infecção por SARS-CoV-2 mantém, provém de estudos de reinfecção”, pouco adianta depois em números concretos.

    Para o caso português, nem sequer indica a taxa de reinfecção dos recuperados não-vacinados – e essa informação deverá constar do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE) – nem tão-pouco a percentagem de reinternamentos ou mesmo de morte após uma segunda infecção.

    A este respeito, os membros da CTVC somente fazem referências mais detalhadas para os vacinados que foram depois infectados – ou seja, recuperados com imunidade natural e vacinal. Para esses, a CTVC diz que “existem vários estudos em curso (..) cujos resultados, incluindo dados de segurança, devem ser conhecidos antes de serem feitas recomendações específicas sobre a administração de doses de reforço de vacinas contra a covid-19 nessas pessoas”.

    E salienta a CTVC também (e a negrito, no original) um aspecto perturbador: “os ensaios clínicos que suportaram a aprovação pela Agência Europeia de Medicamento da dose de reforço de Comirnaty [Pfizer] e Spikevax [Moderna] excluíram pessoas com infecção prévia por SARS-CoV-2”. Ou seja, quem se vacinou nestas condições, depois da recuperação, foi uma autêntica “cobaia”. Correu bem? Depende da perspectiva.

    Por um lado, os recuperados sem vacina têm um risco “muito inferior ao das pessoas vacinadas sem infecção prévia por SARS-CoV-2”. Por outro, a própria CTVC confessa que “parece existir uma maior frequência de reacções adversas sistémicas após vacinação de indivíduos previamente infectados”.

    O PÁGINA UM confirmou que esse importante detalhe não consta do consentimento informado, ou seja, quem vai a correr vacinar-se depois de recuperado, ignora estar a arriscar maiores efeitos adversos pela obtenção de nenhuma vantagem sobretudo perante as pessoas que apenas tenham imunidade através da vacina.

    person holding white and orange plastic bottle

    Em todo o caso, com base em diversos estudos, a CTVC acaba por afirmar neste parecer, embora com pouca convicção, que “pode ser defensável a administração de uma dose de reforço em pessoas recuperadas e vacinadas de acordo com a Norma 002/2021 da DGS que apresentem risco para infecção por SARS-CoV-2 e covid-19 grave (grupos definidos para a estratégia de reforço vacinal)”.

    Face ao elevado número de infectados durante a vaga da variante Ómicron, e que tinham o esquema vacinal completo (muitos com três doses), é previsível um difícil imbróglio, sobretudo se se mantiver em uso o certificado digital que se baseia em tomas repetidas. Com efeito, a CTVC avisa que “à data não existe evidência para recomendar a administração de doses de reforço”.

    Deste modo, se o Governo – e a própria União Europeia – decidirem manter o certificado digital em função de novas tomas de vacina contra a covid-19, então das duas uma: ou a Política ignora a Evidência, ou então “convence” a Ciência a mudar de opinião.


    Nota da Direcção

    Sendo eu um recuperado da covid-19, e parte (muito) interessada em informação que respeita à minha saúde, procurei nos últimos meses, ainda com maior enfoque, estudos e informação sobre as vantagens e desvantagens da vacinação. No meu caso em concreto, exactamente por recear aquilo que a leitura do parecer 17 revela.

    Seis meses após a minha recuperação, em Dezembro passado, realizei um teste serológico, tendo registado o valor de IgG de427,0 BAU/ml, sendo 33,8 BAU/ml o limiar positivo. Não sendo uma certeza absoluta sobre a imunidade natural, tem sido um dos melhores indicadores para aferir a capacidade do meu organismo se defender em caso de reinfecção, ademais sabendo-se que a variante dominante é muitíssimo menos agressiva.

    Dias depois do resultado do teste serológico, no dia 28 de Dezembro, como cidadão português, jornalista e director do PÁGINA UM – e acreditando que um esclarecimento seria útil, e não apenas para mim –, enderecei à directora-geral da Saúde, Graça Freitas – que é a Autoridade de Saúde Nacional –, as seguintes questões:

    1 – Gostava de saber se existe algum estudo português conhecido pela DGS (ou da sua responsabilidade) sobre o nível de anticorpos de recuperados não-vacinados. Se não existe, porque nunca foi feito? Se existe, pode ser facultado?

    2 – Existe também algum estudo científico que mostre em Portugal a evolução temporal dos valores médios de IgG após a vacinação e após infecção (e dentro deste grupo, separando assintomáticos, doentes ligeiros e doentes graves com internamento)? Se sim, pode ser facultado?

    3 – Existe algum estudo sobre eventuais diferenças em termos de efeitos adversos das vacinas entre aqueles que nunca tinham tido contacto com o vírus e queles que já tinham tido contacto (recuperados)? Se sim que diferenças foram detectadas? Pode ser facultado esse estudo?

    4 – Tendo em consideração que os níveis de IgG são indicativas de uma resposta imunitária ao SARS-CoV2, está a ser ponderado algum valor de referência mínimo (em termos de BAU/ml) abaixo do qual se recomenda a vacinação ou reforço de vacinação. Se sim, qual? Se não, porquê?

    A senhora directora-geral não respondeu. Nem ninguém por ela. Nem quando se insistiu duas e três vezes.

    A falta de informação é uma forma de desinformação. E de desrespeito pelos cidadãos. Ou pior ainda, tratando-se de questões de saúde.

    Pedro Almeida Vieira


    LEIA E DESCARREGUE OS 23 PARECERES INTEGRAIS DA COMISSÃO TÉCNICA DE VACINAÇÃO CONTRA A COVID-19


    1 – Parecer sobre a estratégia vacinal e grupos prioritários
    Data de homologação: 01/12/2020

    2 – Parecer sobre a vacinação de doentes covid-19 recuperados
    Data de homologação: 16/12/2020

    3 – Parecer sobre vacinação de Pessoas com 80 ou mais anos
    Data de homologação: 27/01/2021

    4 – Parecer sobre a vacinação com a vacina da AstraZeneca
    Data de homologação: 03-02-2021

    5 – Parecer sobre a inclusão de pessoas com trissomia 21 nos grupos prioritários para vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 20-02-2021

    6 – Parecer sobre a inclusão de pessoas em situação de sem-abrigo nos grupos prioritários da campanha de vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 31/03/2021

    7 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção por SARS-COV-2 – II
    Data de homologação: 12/04/2021

    8 – Imunidade de grupo – Campanha de vacinação contra a covid-19 em Portugal
    Data de homologação: 21/05/2021

    9 – Estratégia de aceleração da campanha de vacinação
    Data de homologação: 30/09/2021

    10 – Efectividade e cobertura vacinal – Impacto da vacinação contra a covid-19 nas medidas de Saúde Pública
    Data de homologação: 08/06/2021

    11 – Parecer sobre estratégia de vacinação – Situação epidemiológica nacional a 26/06/2021 (variante Delta)
    Data de homologação: 16/06/2021

    12 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 25/06/2021

    13 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos
    Data de homologação: 28-07-2021

    14 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos – Actualização
    Data de homologação: 08-08-2021

    15 – Reforço vacinal em pessoas com condições de imunossupressão
    Data de homologação: 11-08-2021

    16 – Co-administração de vacinas contra a covid-19 e vacina da gripe
    Data de homologação: 14-10-2021

    17 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção de SARS-COV-2 – III
    Data de homologação: 21-12-2021

    18 – Grupos prioritários para dose de reforço (fase 3) – Vacinação na grávida
    Data de homologação: 02-12-2021

    19 – Vacinação contra a covid-19 em crianças com 5 a 11 anos – posição técnica
    Data de homologação: 05-12-2021

    20 – Vacinação contra a covid-19 em crianças de 5-11 anos (ÚNICO PARECER ANTERIORMENTE DIVUGADO PELA DGS)
    Data de homologação: 10-12-2021

    21 – Esquemas vacinais heterólogos – Vacinação com doses de reforço
    Data de homologação: 20-01-2022

    22 – Pessoas com imunossupressão – Vacinação com dose de reforço
    Data de homologação: 27-01-2022

    23 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 04-02-2022

  • PÁGINA UM divulga em exclusivo o teor integral dos 23 pareceres da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19

    PÁGINA UM divulga em exclusivo o teor integral dos 23 pareceres da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19

    SERVIÇO PÚBLICO: Leia e descarregue em baixo todos os 23 pareceres não revelados pela Direcção-Geral da Saúde durante meses.


    Desde Outubro de 2021, o PÁGINA UM solicitou à Direcção-Geral da Saúde (DGS) os pareceres e outros documentos da actividade da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC).
    A DGS nunca respondeu.

    O PÁGINA UM apresentou queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), que fez um parecer favorável em 20 de Janeiro passado.

    Apesar disso, a DGS continuou a não se mostrar favorável a disponibilizar os documentos, apesar de o PÁGINA UM ter reiterado o pedido, com base no parecer da CADA.

    Somente no passado dia 4 de Março, a DGS informou o PÁGINA UM de estar disponível para publicitar os pareceres, informando também que, antes desse acto, poder-se-ia consultar os pareceres nas suas instalações.

    Apesar de dois e-mails do PÁGINA UM (dias 4 e 8 de Março) para que fosse indicada a data para consulta, a DGS nunca respondeu.

    O PÁGINA UM deslocou-se esta tarde à sede da DGS, e após uma hora de espera foi então encaminhado para uma sala, onde foi disponibilizado um dossier com os 21 pareceres da CTVC.

    Apesar de ter sido feito o pedido para obtenção de cópia digital ou fotocópias, mas, após uma espera de mais de meia hora, uma funcionária da DGS disse ao PÁGINA UM não ser possível, por agora, a primeira alternativa; e a segunda teria de ser feita com tempo e um custo de 75 cêntimos por página.

    O PÁGINA UM decidiu fotografar todas as páginas dos 23 pareceres, que estão aqui disponibilizados em formato pdf.


    1 – Parecer sobre a estratégia vacinal e grupos prioritários
    Data de homologação: 01/12/2020

    2 – Parecer sobre a vacinação de doentes covid-19 recuperados
    Data de homologação: 16/12/2020

    3 – Parecer sobre vacinação de Pessoas com 80 ou mais anos
    Data de homologação: 27/01/2021

    4 – Parecer sobre a vacinação com a vacina da AstraZeneca
    Data de homologação: 03-02-2021

    5 – Parecer sobre a inclusão de pessoas com trissomia 21 nos grupos prioritários para vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 20-02-2021

    6 – Parecer sobre a inclusão de pessoas em situação de sem-abrigo nos grupos prioritários da campanha de vacinação contra a covid-19
    Data de homologação: 31/03/2021

    7 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção por SARS-COV-2 – II
    Data de homologação: 12/04/2021

    8 – Imunidade de grupo – Campanha de vacinação contra a covid-19 em Portugal
    Data de homologação: 21/05/2021

    9 – Estratégia de aceleração da campanha de vacinação
    Data de homologação: 30/09/2021

    10 – Efectividade e cobertura vacinal – Impacto da vacinação contra a covid-19 nas medidas de Saúde Pública
    Data de homologação: 08/06/2021

    11 – Parecer sobre estratégia de vacinação – Situação epidemiológica nacional a 26/06/2021 (variante Delta)
    Data de homologação: 16/06/2021

    12 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 25/06/2021

    13 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos
    Data de homologação: 28-07-2021

    14 – Vacinação contra a covid-19 em adolescentes de 12-15 anos – Actualização
    Data de homologação: 08-08-2021

    15 – Reforço vacinal em pessoas com condições de imunossupressão
    Data de homologação: 11-08-2021

    16 – Co-administração de vacinas contra a covid-19 e vacina da gripe
    Data de homologação: 14-10-2021

    17 – Parecer sobre a vacinação de pessoas recuperadas de infecção de SARS-COV-2 – III
    Data de homologação: 21-12-2021

    18 – Grupos prioritários para dose de reforço (fase 3) – Vacinação na grávida
    Data de homologação: 02-12-2021

    19 – Vacinação contra a covid-19 em crianças com 5 a 11 anos – posição técnica
    Data de homologação: 05-12-2021

    20 – Vacinação contra a covid-19 em crianças de 5-11 anos (ÚNICO PARECER ANTERIORMENTE DIVUGADO PELA DGS)
    Data de homologação: 10-12-2021

    21 – Esquemas vacinais heterólogos – Vacinação com doses de reforço
    Data de homologação: 20-01-2022

    22 – Pessoas com imunossupressão – Vacinação com dose de reforço
    Data de homologação: 27-01-2022

    23 – Vacinação contra a covid-19 na grávida
    Data de homologação: 04-02-2022

  • Tuberculose diminui durante pandemia mas por subnotificação e atrasos no diagnóstico

    Tuberculose diminui durante pandemia mas por subnotificação e atrasos no diagnóstico

    Relatório da Direcção-Geral da Saúde aponta para uma redução de casos em 2020, mas antevê já um recrudescimento da tuberculose nos próximos anos. A subnotificação por atrasos no diagnóstico explica a enganadora melhoria no primeiro ano da pandemia. O PÁGINA UM também revela que, durante 2020, houve 32 doentes com tuberculosos que foram considerados doente-covid. Destes, nove morreram.


    A Direcção-Geral da Saúde admite que a tuberculose terá previsivelmente, nos próximos anos, recrudescimento do número de casos, associados “à deterioração das condições económicas e sociais, ao aumento na demora nos dias até ao diagnóstico e ao risco de formas mais graves com consequente maior morbilidade e mortalidade”.

    Este é o quadro traçado pelo relatório de vigilância e monitorização da tuberculose em Portugal relativo ao ano de 2020, que mostra uma situação favorável apenas na aparência durante o primeiro ano da pandemia.

    Com efeito, embora a DGS destaque a tendência de diminuição dos casos notificados – 14,2 casos por 100.000 habitantes, a que correspondeu 1.465 casos, menos 383 do que em 2019 – é admitido que a descida em 2020 se deveu aos efeitos da pandemia causada pelo SARS-CoV-2. De facto, nos quatro anos anteriores a 2020, a taxa de incidência estava estagnada, em redor dos 18 casos por 100.00 habitantes.

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    Sem-abrigos e estrangeiros são os grupos mais vulneráveis à tuberculose.

    Esta redução é, porém, artificial, e até denotando uma subnotificação ou mesmo uma incorrecta notificação. Através da base de dados dos internamentos de doentes-covid, que o PÁGINA UM tem vindo a divulgar, durante o ano de 2020 foram hospitalizados com teste positivo à covid-19, um total de 32 pessoas também com diagnóstico de tuberculose. Destas, nove faleceram.

    No caso concreto de óbitos atribuídos à tuberculose, a DGS indica terem ocorrido 94 durante todo o ano de 2020. Mesmo considerando as nove mortes consideradas por covid-19 mas de doentes tuberculosos, a situação portuguesa tem melhorado consideravelmente neste século. Em 2002, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística, morreram 345 pessoas com tuberculose e em 2010 foram 205.

    Os efeitos da suspensão de muitos dos diagnósticos e exames do Serviço Nacional de Saúde (SNS) durante a pandemia, em especial no primeiro ano, também se observa no aumento do número de dias desde o início dos sintomas até ao diagnóstico.

    Evolução da taxa de notificação de tuberculose em Portugal (2000-2020). Fonte: DGS.

    Em 2020, metade dos doentes com tuberculose tiveram o seu primeiro diagnóstico ao fim de 80 ou mais dias, o valor máximo registado na última década, e uma subida de 25% relativamente ao valor registado em 2010. Em dois terços dos casos, esta demora foi atribuída aos doentes, o que também denota o medo incutido nas pessoas durante a pandemia.

    Os homens continuam a ser o grupo de maior risco, representando 65% do total de casos, sendo que metade dos doentes tinha 49 ou mais anos. Nas crianças de idade igual ou inferior a cinco anos, apenas se contabilizaram 25 novos casos. Os distritos de Lisboa e Porto foram as regiões que apresentaram maior incidência, sendo que os sem-abrigos e os estrangeiros mostraram ser os grupos mais vulneráveis.

    Neste último aspecto, mostra-se particularmente a evolução da incidência na população estrangeira. No ano de 2020 já cerca de 27% dos casos de tuberculose eram de estrangeiros, sobretudo originários de Angola, Guiné-Bissau, Brasil e Cabo Verde. Em 2008 representavam apenas 14,9%.

    Evolução da demora mediana entre o início de sintomas até ao diagnóstico de Tuberculose (2010-2020). Fonte: DGS.

    Segundo o relatório da DGS, existe uma forte relação entre vulnerabilidades sociais e a incidência de tuberculose com o consumo de álcool ou de drogas ilícitas, bem como a residência comunitária, a constituírem variáveis relevantes.

    A associação da tuberculose ao vírus da imunodeficiência humana (HIV) também se mantém. Em 2020, cerca de 77% dos casos notificados foram testados para VIH (85,6% em 2019) e 9% apresentavam co-infeção tuberculose/VIH.

    Para Portugal atingir os objetivos fixados pela Organização Mundial de Saúde – redução do número de mortes em 95% e a taxa de incidência em 90% até 2035 face a 2015 –, em nota incluída no relatório, a directora-geral da Saúde Graça Freitas destaca “o rastreio e tratamento gratuito e o livre acesso às consultas de tuberculose nos Centros de Diagnóstico Pneumológico”.

    Contudo, esta responsável admite que “a desaceleração na redução percentual anual da doença, associada a uma diminuição abrupta do número de casos em 2020 e ao aumento da mediana de dias até ao diagnóstico, reforçam a necessidade de definir novas estratégias e monitorizar resultados.”

  • Estamos melhor ou pior do que antes da pandemia?

    Estamos melhor ou pior do que antes da pandemia?

    Apesar da falta de transparência da Direcção-Geral da Saúde (na divulgação das causas de morte) e do Infarmed (sobre os efeitos adversos das vacinas contra a covid-19), o PÁGINA UM faz uma análise detalhadas sobre a mortalidade por todas as causas por grupo etário, comparando os primeiros 60 dias do ano de 2021 com os períodos homólogos de 2016 a 2021. Estamos muito melhor do que no ano passado, mas os números são, para algumas idades, mais elevados do que seria expectável. A pandemia pode já ter acabado, mas os seus efeitos indirectos não.


    Os dois primeiros meses do ano passado foram catastróficos. Os surtos de covid-19, a par do colapso na assistência hospitalar do Serviço Nacional de Saúde em enfrentar também uma vaga de frio sobretudo em Janeiro, causou uma mortandade nunca vista. Nos primeiros 60 dias de 2021 morreram, segundo dados oficiais, 32.777 pessoas, ou seja, uma média de 546 pessoas por dia. A média diária no quinquénio anterior ao surgimento da covid-19 em território português (2016-2020) foi de 377 óbitos, o que mostra bem a verdadeira dimensão da pandemia neste período, embora não possa, e não deva, ser apontada a covid-19 como exclusiva responsável.

    Entretanto, durante a pandemia, foram introduzidas outras relevantes variáveis. Além de um acréscimo de mortalidade por todas as causas observado em Portugal sobretudo no primeiro ano da pandemia, os programas de vacinação vieram, por um lado, dar esperança de redução da letalidade da covid-19, mas também introduziram um receio sobre os seus efeitos adversos quer a curto quer a longo prazo.

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    Embora o PÁGINA UM seja intransigente defensor de análises aprofundadas com base em dados detalhados, nota-se que, infelizmente, as autoridades de saúde são particularmente adeptas do obscurantismo, não cedendo informação essencial.

    De facto, uma análise dos efeitos da pandemia necessitaria, obrigatoriamente, de informação do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) para aferir as causas distintas da mortalidade para que, dessa forma, se conseguisse separar o efeito directo da covid-19 e a variação do peso das outras doenças na mortalidade total.

    De igual modo, para dar resposta às preocupações sobre os efeitos adversos das vacinas, seria fundamental analisar as causas de morte desde o início dos programas de vacinação e comparar com anos anteriores.

    Não sendo tal (ainda) possível, o PÁGINA UM predispôs-se a fazer uma análise aos primeiros 60 dias de cada ano, entre 2016 e 2022, considerando a mortalidade total (todas as causas). Esta análise teve em conta a prevalência e incidência dos diferentes surtos gripais (2016-2020) e a situação pandémica nos anos de 2021 (ainda com fraca taxa de vacinação) e 2022 (com elevada taxa de vacinação, incluindo reforço de terceira dose nos grupos etários mais idosos).

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    Este breve exercício serve sobretudo para se ter uma rápida percepção sobre a situação pandémica actual face não apenas ao pior período (Janeiro e Fevereiro de 2021) mas também ao período anterior à pandemia. Saliente-se que, por norma, os dois primeiros meses do ano, na sua totalidade inseridos no Inverno, são os mais mortíferos.

    Caso se pretenda comparar ano a ano deve ter-se em consideração os efeitos dos surtos gripais, que constituem, no Inverno, o principal factor de agravamento da mortalidade.

    Assim temos as seguintes situações:

    2016 – surto gripal com fraca incidência e agressividade;
    2017 – surto gripal com elevada incidência e agressividade;
    2018 – surto gripal com média incidência e agressividade;
    2019 – surto gripal com elevada incidência e agressividade;
    2020 – surto gripal (anteriormente ao surgimento da covid-19 em Portugal) com fraca incidência e agressividade.

    Note-se também que os surtos gripais (com efeitos na mortalidade por infecções respiratórias) nunca tiveram impacte nos grupos etários abaixo dos 45 anos, sendo muito pouco relevante até aos 65 anos, e ganhando importância sobretudo a partir dos 75 anos e ainda com mais relevo nos maiores de 85 anos.

    Nesse sentido, as principais conclusões que se pode retirar desta análise do PÁGINA UM são as que apresentam seguidamente, por grupo etário.

    Menores de 1 anos

    Impacte da pandemia completamente nula, e indirectamente até acabou por se observar uma redução na taxa de mortalidade por todas as causas, mesmo tendo em conta a redução dos nascimentos. Note-se que o número de óbitos nesta idade é bastante baixa, tendo em consideração que se registam, em média, cerca de 80 mil nascimentos por ano.

    Óbitos por todas as causas dos menores de 1 ano nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 1 e 4 anos
    Impacte da pandemia completamente nula. Nesta faixa etária a mortalidade por todas as causas é, felizmente, bastante baixa, e os surtos gripais e a covid-19 não têm nem nunca tiveram qualquer relevância. Também não se observam quaisquer efeitos indirectos adversos decorrentes da pandemia.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 1-4 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 5 e 14 anos

    Impacte da pandemia completamente nulo, mesmo antes das vacinas. Face aos anos anteriores, 2021 foi mesmo aquele com menor mortalidade (10). Neste grupo etário, os óbitos totais em 2022 foram, no período em análise (60 dias), superiores aos de 2021 (mais cinco óbitos), mas mesmo assim abaixo da média. O programa vacinal contra a covid-19 serviu literalmente para nada.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 5-14 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 15 e 24 anos

    Em comparação com os anos anteriores, 2022 foi o ano com maior número de óbitos neste grupo etário (64), registando-se 12 mortes a mais do que em 2021 (antes do programa vacinal). Em todo o caso, parece-me prematuro, e especulativo, associar o programa vacinal a este excesso de óbitos, uma vez que os números de 2022 estão próximos de alguns do outros anos (2017 e 2019).

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 15-24 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 25 e 34 anos

    Embora neste grupo etário a mortalidade por todas as causas seja ainda bastante baixa, no ano passado registou-se um incremento significativo (108 óbitos) face à média do quinquénio anterior (92 óbitos), não podendo associar-se exclusivamente à covid-19, porquanto houve também um pior acompanhamento das outras doenças. Em todo o caso, a mortalidade por todas as causas em 2022 já se encontra em linha com a média.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 25-34 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 35 e 44 anos

    A pandemia não aparenta ter tido impacte na mortalidade neste grupo etário, mesmo se os valores em 2021 (no pior período) foi ligeiramente superior à média do quinquénio anterior (286 vs. 271). Contudo, foi mesmo assim foi inferior ao ano de 2016, que teve até um surto gripal relativamente fraco.

    A mortalidade total em 2022 foi ligeiramente abaixo da média do quinquénio anterior à pandemia (269 vs. 271), mas não aparenta ter qualquer relação com o programa vacinal, tanto mais que o valor está acima do registado em 2020 (237 óbitos).

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 35-44 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 45 e 54 anos

    A pandemia teve já um efeito relevante na mortalidade em 2021, com um acréscimo de 17% em relação ao quinquénio anterior (954 vs. 814), chegando a atingir um agravamento de quase 26% face ao ano de 2020. A mortalidade em 2022 encontra-se abaixo da registada em qualquer dos cinco anos anteriores à pandemia, o que pode resultar mais da perda do subgrupo dos mais vulneráveis (falecidos durante a pandemia) do que um efeito directo da vacina.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 45-54 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 55 e 64 anos

    Não parece existirem dúvidas do forte impacte da pandemia (directa e indirectamente) na mortalidade nos primeiros dois meses de 2021 face aos anos do quinquénio anterior, com um excesso de 30%. O número registado em 2022 (1.740) parece-me bastante preocupante, porquanto, com a covid-19 muito menos agressiva e letal, a mortalidade deveria ser muito mais baixa do que a média, o que não sucede. Isso pode indiciar efeitos de outras doenças que não foram suficientemente tratadas durante a pandemia.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 55-64 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 65 e 74 anos

    Também nesta faixa etária, a mortalidade em 2021 foi extraordinariamente elevada face à média do quinquénio anterior à pandemia (mais 49%), o que correspondeu a mais 1.494 óbitos.

    A hecatombe neste grupo etário causado pela covid-19 e por outras doenças que passaram a ter menor acompanhamento deveria ter tido como consequência uma menor mortalidade nos tempos mais recentes, mas tal não se está a observar.

    Com efeito, mesmo com a covid-19 menos agressiva, ausência de surtos gripais e população com taxa de vacinação quase total, o número de óbitos por todas as causas foi nos primeiros 60 dias de 2022 superior a qualquer ano do quinquénio anterior à pandemia.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 65-74 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Entre 75 e 84 anos

    Tal como no grupo etário anterior, a pandemia teve nos primeiros dois meses de 2021 um forte impacte na mortalidade por todas as causas, com um acréscimo de 42% face à média do quinquénio anterior, resultante de mais 2.850 óbitos. Contudo, ao contrário do que sucede com o grupo etário dos 65-74 anos, observa-se aqui um efeito de “fortalecimento” (ou seja, uma menor mortalidade subsequente a um efeito negativo que implicou a morte dos mais vulneráveis).

    De facto, a mortalidade total em 2022, no período em análise, foi significativamente mais reduzida do que a média no quinquénio anterior à pandemia (6.346 vs. 6.729). Porém, mesmo assim seria expectável valores mais baixos, o que pode indiciar que existem problemas decorrentes da forma como se implementaram as estratégias de saúde pública durante da pandemia, que implicou um enfraquecimento generalizado da população mais idosa.

    Óbitos por todas as causas no grupo etário 75-84 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Maiores de 85 anos

    Durante os primeiros dois meses de 2021, a pandemia teve efeitos extraordinariamente negativos na população mais idosa, com um excesso de mortalidade de 53% face à média do quinquénio anterior (14.955 vs. 9.785), ou seja, mais 5.170 óbitos.

    Este acréscimo foi, aliás, o culminar de meses anteriores, sempre com excesso de mortalidade neste grupo etário, o mais vulnerável à covid-19. No ano de 2022, apesar deste grupo etária quase integralmente (e com dose de reforço) e de um Inverno extremamente amenos e com actividade gripal nula, a mortalidade nos dois primeiros meses esteve acima da média do quinquénio anterior à pandemia (10.156 vs. 9.785).

    Tendo em consideração a hecatombe da pandemia (directa e indirectamente) neste grupo etário, seria expectável agora um número de óbitos muitíssimo menor. Como tal não se observa, tudo indica que subsistem problemas já estruturais decorrentes da gestão da pandemia, mormente ao nível do (des)acompanhamento de doenças crónicas.

    Óbitos por todas as causas nos maiores de 85 anos nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    População global

    Os primeiros dois meses de 2021 foram particularmente dramáticos, com um excesso de mortalidade por todas as causas de 45% face à média do quinquénio anterior (32.777 vs. 22.606), ou seja, um acréscimo de 10.171 óbitos. Note-se, contudo, como atrás se foi referindo, que o impacte esteve longe de ser generalizado. Cerca de 51% deste excesso esteve concentrado na população com mais de 85 anos, que representa pouco mais de 3% da população portuguesa.

    Se considerarmos a população com mais de 75 anos, esse valor sobe para 79%, o que demonstra o particular impacte da pandemia (e dos seus efeitos colaterais) nos grupos etários mais avançados.

    Óbitos por todas as causas na população portuguesa nos primeiros 60 dias de 2016 a 2022. Fonte: SICO.

    Na verdade, no seu pior período (Janeiro e Fevereiro de 2021), a pandemia não teve qualquer impacte no vasto grupo dos menores de 45 anos (que representam quase metade da população portuguesa). O excesso de mortalidade apenas teve um contributo de 1% no grupo dos 45-54 anos, e de 5% no grupo dos 65-74 anos.

    Um ano depois desta situação, é curioso observar que a mortalidade total se encontra na linha com a média anterior à pandemia, o que parecendo uma boa notícia, não o é. Seria expectável que os valores da mortalidade total estivessem muito abaixo, tendo em conta a “limpeza” dos mais vulneráveis. Por outro lado, mostra-se preocupante observar os “comportamentos” distintos entre os diferentes grupos etários.

  • Estudo oficial em Nova Iorque assume que vacina contra a covid-19 vale quase nada ao fim de um mês

    Estudo oficial em Nova Iorque assume que vacina contra a covid-19 vale quase nada ao fim de um mês

    A eficácia relativa da vacina da Pfizer/BioNTech contra a covid-19 em crianças do Estado de Nova Iorque caiu tão rapidamente ao fim de apenas um mês que as suas vantagens, face às incertezas sobre efeitos adversos a longo prazo e aos riscos de miocardite, se mostram mais do que questionáveis.


    Um estudo realizado pelo Departamento de Saúde do Estado de Nova Iorque, e divulgado ontem no site medRxiv – ainda a necessitar de revisão pelos pares (peer review) – revela que durante a vaga da variante Omicron, a eficácia das vacinas ao fim de um período de 28 a 34 dias era apenas de 12% para as crianças dos 5 aos 11 anos. Nos adolescentes (12-17 anos), a eficácia era um pouco melhor: rondava ainda os 50% ao fim do mesmo período.

    O impacte deste estudo tem tido destaque assinalável nos principais órgãos de comunicação social dos Estados Unidos, entre os quais o New York Times, CNBC, NBC News e CNN, e mesmo deste lado do Atlântico, como o The Guardian.

    Envolvendo 365.502 crianças e 852.384 adolescentes vacinados naquele Estado norte-americano – com uma população quase o dobro da portuguesa –, o estudo comparou a incidência de casos positivos e hospitalizações deste grupo com não-vacinados da mesma idade entre finais de Novembro de 2021 e Janeiro deste ano, ou seja, em pleno surto da Omicron.

    Recorde-se que a actual vacina da Pfizer foi desenvolvida para combater a variante Alpha do SARS-CoV-2, sendo que a Omicron, agora largamente dominante, se tem revelado de maior transmissibilidade, mas também de muito menor agressividade. E também se deve salientar que as autoridades de saúde norte-americana (FDA) e europeia (EMA) autorizaram doses menores para crianças: apenas 10 microgramas por dose em vez das habituais 30 microgramas nas restantes idades.

    De acordo com o estudo norte-americano, analisado pelo PÁGINA UM, comparando crianças vacinadas e não-vacinadas, ainda se observou uma diferença significativa nas taxas de incidência na semana de 13-19 de Dezembro: 39 e 122 por 100.000, respectivamente, o que significava que a eficácia das vacinas na incidência era então de 68%. Nas hospitalizações essa eficácia inicial era de 100%, embora nos não-vacinados os números de internamentos fossem bastante baixos: 0,22 hospitalizações por 100.000 crianças, ou seja, 0,00022%.

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    Com o avançar do tempo – e também com o surto da variante Omicron a atingir o seu auge no meio do Inverno –, sendo certo que a incidência aumentou tanto nas crianças vacinadas como nas não-vacinadas, a razão da taxa de incidência – ou seja, a proporção da incidência de casos positivos entre não-vacinados e vacinados – desceu abruptamente. Se na semana de 13-19 de Dezembro ainda era de 3,1; três semanas mais tarde (3-9 de Janeiro) já só era de 1,9, situando-se em 1,1 na semana de 24-30 de Janeiro. Significa assim que os vacinados estavam já praticamente desprotegidos. Ou, do ponto de vista da eficácia das vacinas, esta só reduzia o risco em 12%.

    Em relação às hospitalizações das crianças, o efeito de decréscimo não se revelou tão drástico, mas mesmo assim foi muito significativo. Na semana de 24-30 de Janeiro, as hospitalizações de crianças nova-iorquinas não-vacinadas era de 0,60 por 100.000, enquanto as vacinadas eram de 0,31, o que significava uma razão da taxa de incidência de apenas 1,9 e uma eficácia da vacina somente de 48%.

    Note-se também, mais uma vez, que as hospitalizações nestas faixas etárias são bastante baixas tanto para os vacinados como para os não-vacinados. Com efeito, se aplicado a Portugal – com cerca de 600 mil crianças neste grupo etário –, significaria que, na última semana de Janeiro, seriam internadas por covid-19 entre três e quatro crianças se não houvesse programa de vacinação, e entre uma e duas se esse programa tivesse atingido todas. Recorde-se, ainda, que no nosso país ainda não se registou qualquer morte em crianças atribuída à covid-19.

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    Para os adolescentes nova-iorquinos, a tendência de decréscimo abrupto da eficácia das vacinas também se observou ao longo do surto da Omicron. Se em relação à protecção contra a infecção (medida em termos de incidência), a vacina mostrava uma eficácia de 85% em finais de Novembro, em meados de Janeiro já só rondava os 50%.

    Nas hospitalizações, a eficácia mesmo assim manteve-se mais estável, embora com tendência também decrescente. Na segunda semana de Dezembro rondava os 95%, mas em finais de Janeiro já se situava nos 73%. Note-se também, mais uma vez, que as hospitalizações em adolescentes por covid-19 são raras, tanto para vacinados como para não-vacinados. Na semana de 24-30 de Janeiro, observou-se que 0,00136% dos adolescentes não-vacinados foram internados por covid-19, enquanto essa percentagem era de 0,00037% para os adolescentes vacinados.

    Os autores do estudo, todos pertencentes à Autoridade de Saúde do Estado de Nova Iorque – um dos mais rígidos na implementação de programas de vacinação –, mantêm, contudo, uma opinião favorável às vacinas da Pfizer, considerando apenas ser necessário “estudar a dosagem alternativa” para crianças, e sugerindo ainda ser preciso manter “o uso de máscaras, para prevenir infecção e transmissão”.

    Os resultados deste estudo também colocam ainda mais em causa a eficácia do uso de certificados digitais como instrumentos de controlo da pandemia, uma vez que aqueles têm, actualmente, no espaço europeu, uma duração de nove meses.