Categoria: Saúde

  • Março de 2025 foi o mais mortífero desde 2005. É uma má notícia? Não

    Março de 2025 foi o mais mortífero desde 2005. É uma má notícia? Não

    Foram 11.058 óbitos registados no passado mês de Março. Em termos absolutos, o valor impressiona: neste século, apenas foi superado uma vez, no ano de 2005, e tem de se recuar a 1951 para se encontrar outro Março acima da fasquia das 11 mil mortes neste mês de transição entre o Inverno e a Primavera. O valor deste ano até ultrapassa inclusivamente o de Março de 2020, quando a pandemia de covid-19 começava a ganhar expressão e inquietação pública, e durante o qual faleceram 10.582 pessoas em território nacional.

    Porém, por mais inquietante seja esse ‘flash’ temporal de 31 dias, o número de óbitos não pode ser interpretado como sinal inequívoco de anomalia. Na verdade, no contexto mais alargado do último Inverno – aqui definido como o quadrimestre que vai de Dezembro de 2024 a Março de 2025 – se se quiser apntar alguma anormalidade, então é à pouco usual ‘estabilidade letal’ do Inverno de 2024-2025, o período do ano em regra mais mortífero em Portugal.

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    Ao contrário do que é habitual em muitos anos anteriores, em que se registam picos abruptos num ou dois meses — muitas vezes em Dezembro e Janeiro ou em Janeiro e Fevereiro — seguidos de quebras marcantes em Março, o mais recente quadrimestre apresentou uma mortalidade notavelmente uniforme, com todos os meses a ultrapassarem os 10 mil óbitos e com uma diferença de apenas 857 mortes entre o mês mais e o menos mortífero.

    Esta variação interna é a sexta mais baixa dos últimos cinquenta invernos, o que demonstra não apenas a ausência de surtos concentrados, mas também uma persistência de risco distribuída ao longo de todo o Inverno. Esta regularidade é rara e pode ocultar o verdadeiro impacto da estação fria: quando não há um pico, há menos alarme — mas a mortalidade, diluída e silenciosa, soma-se com o mesmo peso.

    Esta uniformidade explica a razão para Março de 2025, apesar de ter uma mortalidade historicamente elevada, não representar aquilo que se chama um ‘outlier’ estatístico com preocupantes sinais epidemiológicos. Em linguagem comum, isto significa que o número de mortes, embora superior à média, não ultrapassa aquilo que seria previsível à luz da evolução demográfica e da sazonalidade das últimas décadas.

    Mortalidade no Inverno (quadrimestre Dezembro do ano N a Março do ano N+1) nos últimos 50 anos (LINHA AMARELA) e linha de tendência (TRACEJADO VERMELHO). Fonte: INE e SICO. Análise; PÁGINA UM.

    Para se perceber a relevância desta avaliação, o PÁGINA UM analisou os dados de uma forma mais sistemática. Considerando todos os períodos Dezembro-Março desde 1974, a mortalidade média situou-se em cerca de 40.745 mortes por quadrimestre. O total observado entre Dezembro de 2024 e Março de 2025 – as tais 44.107 mortes – fica cerca de 0,91 desvios-padrão acima da média, o que, numa leitura estatística convencional, é sinal de um valor elevado, mas não invulgar, e nem fugindo à tendência das últimas décadas.

    De facto, os dados das últimas cinco décadas apontam para um crescimento consistente da mortalidade no quadrimestre Dezembro-Março, com uma subida média anual de cerca de 160 mortes, mesmo considerando os picos de mortalidade entre 2020 e 2022, decorrentes tanto da mortalidade por covid-19 como pela gestão da pandemia. Esta evolução tem raízes sobretudo na alteração da estrutura etária da população portuguesa, cada vez mais envelhecida, e nas condições de saúde associadas a essa realidade.

    Assim, um Inverno com mais de 44 mil mortes já não surpreende – é, antes, o ‘novo normal’. Aliás, tem ultrapassado essa fasquia em todos os últimos seis Invernos. E desde o Inverno de 2011-2012, inclusive, contam-se nove anos a superarem esse valor, embora apenas um (2020-2021) subindo acima de 46 mil. Nesse Inverno, a mortalidade ascendeu a quase 55 mil óbitos, coincidindo com o pico da pandemia, uma vaga de frio em Janeiro de 2021 e com o colapso do Serviço Nacional de Saúde.

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    Curiosamente, a estabilidade intermensal da mortalidade do recente Inverno pode ser explicada por um fenómeno conhecido como “efeito harvesting” (literalmente, colheita), muito estudado em demografia e Saúde Pública. Quando os meses de Dezembro e Janeiro são especialmente severos em termos de mortalidade – como acontece com surtos fortes de gripe ou vagas de frio – é comum que os meses seguintes apresentem valores inferiores à média, porque uma parte da população mais vulnerável já sucumbiu antes.

    No Inverno de 2024-2025, pelo contrário, os meses de Dezembro (11.905 mortes) e Janeiro (10.201 mortes) não atingiram níveis extremos, o que terá deixado um maior número de pessoas vulneráveis vivas até Março – mês em que, por razões naturais, ou por agravamentos clínicos cumulativos, acabaram por falecer.

    Neste contexto, pode-se afirmar que, embora Março de 2025 tenha sido historicamente elevado, ele não foi anormal – mas sim o reflexo de um Inverno prolongadamente suave, sem grandes picos nem grandes quebras, como aliás se confirma pela ausência de descidas abruptas em Fevereiro.

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    Ainda assim, há um dado que deve merecer atenção redobrada dos responsáveis pela Saúde Pública. Quando se analisa o valor global do quadrimestre em função da tendência linear esperada, constata-se que a mortalidade até ficou ligeiramente abaixo do valor previsto para o ano de 2024 – cerca de 644 mortes abaixo da linha de tendência.

    Este desvio, ainda que pequeno, pode indiciar uma acumulação de vulnerabilidades que não se expressaram durante o Inverno, mas que poderão tornar-se críticas nos meses seguintes. Ou seja, as ondas de calor mais intensas podem ser particularmente letais para os mais idosos e doentes crónicos.

  • Isto anda tudo ligado?

    Isto anda tudo ligado?

    É corrente ver em assuntos diferentes um fio condutor que decorre de determinada atitude meio oculta ou não-confessada. Geralmente, quem se atreve a enunciar esses “desvarios” é imediatamente acusado de estimular a “teoria da grande conspiração” e assim cada um fica no seu canto. Nada se demonstra, nada se nega e as convicções individuais mantêm-se mais ou menos as mesmas. Já todos o vimos muitas vezes!

    Nestes dias, em que nos aproximamos da necessidade de voltar a manifestar em quem confiamos para gerir os vários domínios da administração pública, vale a pena reflectir na experiência acumulada no passado recente.

    O governo que agora termina funções foi eleito com maioria muito escassa e instável, e a possibilidade de tudo acabar rapidamente esteve sempre presente. Assim, era imperioso e urgente “mostrar serviço” e atacar com enorme urgência todas as frentes onde a gestão pública mostrava dificuldades. Choveram aumentos (ainda que alguns limitados a meras promessas que o tempo confirmará ou não…) e promessas gongóricas de resolução de problemas continuados.

    Fosse diferente e mais robusta a maioria parlamentar governamental e tudo seria diferente, com outro ritmo, deixando as benesses para mais tarde, em fim de mandato, como é tradicional. Assim, houve que mostrar serviço rapidamente e agradar a todos os grupos profissionais que aguardavam negociações, necessariamente difíceis. Claro que o saldo orçamental positivo facilitou essa distribuição de satisfações.

    Assim, avaliar a eficiência/competência/justeza da acção governativa que durou cerca de um ano, sempre a fazer “equilíbrio no arame” e risco iminente de crise política e eleições, como aconteceu, deve ter em conta essa tentação forte de querer agradar a todos depressa. Nada garante que uma situação mais estável trouxesse igual ímpeto e generosidade. A “conta” dos constrangimentos e legislação impopular seria apresentada antes de poder oferecer mais “bombons”, com a habitual desculpa do governo anterior!

    Na Saúde, tudo foi diferente. Uma equipa ministerial pouco competente, mas com agenda ideológica tentou nomear todos os amigos possíveis em cargos directivos a todos os níveis, frequentemente com fundamentação duvidosa e conflitos de interesse, como o tempo mostrou, ao mesmo tempo que se manietou e “domesticou” a Ordem dos Médicos com várias nomeações de dirigentes para funções no Ministério.

    Ana Paula Martins, ministra da Saúde do governo de Luís Montenegro. / Foto: D.R.

    Fizeram-se promessas sem sinais de as poderem cumprir, com os métodos que usaram. Ordenaram um “plano de emergência” com coisas boas (mas pouco originais) e com coisas originais (pouco boas, como a criação/modificação administrativa de especialidades médicas, indicação de que as urgências de pediatria seriam até aos 12 anos, planos cirúrgicos oncológicos sem ter em atenção que uma enorme parte da oncologia é não cirúrgica, sem aumento da capacidade assistencial em consultas, etc).

    As urgências que “não iriam fechar”, têm evoluído como se viu. Continuaram a despejar dinheiro na contratação avulsa de médicos tarefeiros, mantendo os serviços clínicos razoavelmente despovoados.

    Quando era já certo que o governo iria terminar funções, e na sua última reunião, anunciou-se a decisão magna de evoluir os cuidados do SNS para parcerias público-privadas. Esse é um modo possível de gestão, mas a recente criação de ULS por todo o país, que incluem os cuidados médicos primários e a saúde pública, traz questões novas que o bom senso recomendaria discutir publicamente para se obter um consenso nacional que não leve a reversão, logo que o “barco mudar de direção”.

    Foto: D.R.

    Fica por explicar por que motivo o governo acha que a administração privada é mais ágil e eficiente, mas não toma medidas para conferir essas qualidades à gestão pública. Estava na sua mão fazê-lo, mas evitam esse caminho, sabe-se lá porquê.

    Esta pressa e ligeireza, já sem falar na inclusão de unidades académicas que a ministra achava que deveriam ter regime especial, mostra de forma robusta que afinal tudo parecia obedecer a um plano para mostrar que a gestão pública é desastrosa e a gestão privada “só virtuosa”! Um amigo imaginário dir-me-ia “lá estás tu com a mania da conspiração!” ao que eu responderia, “E tu, se quisesses levar o barco para esse lado, como agirias?”. Resposta imaginária, “sim, dessa maneira…”. Pois!

    Portanto, depois de ver tudo isto, podemos dizer que “o primeiro milho foi dos pardais”, e o que se seguiria teria um paladar e consequências bastante diferentes se pudessem seguir o seu rumo. Haverá oportunidade para todos decidirem que caminho desejam para o SNS. E prepararem-se para assumir as respectivas consequências.

    Jorge Amil Dias é médico pediatra

    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Pandemia: Consulte os famigerados ‘esboços embrionários’ do IST, agora postos a nu (e analisados)

    Pandemia: Consulte os famigerados ‘esboços embrionários’ do IST, agora postos a nu (e analisados)

    O PÁGINA UM publica hoje, quase 32 meses após terem sido solicitados, os 52 relatórios do Instituto Superior Técnico – elaborados em parceria com a Ordem dos Médicos a partir do relatório 37 – que supostamente deveriam ter acompanhado a evolução da pandemia da covid-19 em Portugal.

    A divulgação destes relatórios só agora se concretiza na sequência de uma longa luta judicial, que incluiu uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul e ainda um pedido de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória. Um processo que só se justifica pela prepotência do presidente do Instituto Superior Técnico, Rogério Colaço, que lutou afincadamente para recusar a sua divulgação pública.

    Numa atitude lamentável para quem ocupa um cargo de responsabilidade científica, Rogério Colaço chegou ao ponto de argumentar, através da advogada do IST, que não tinham feito relatórios, mas apenas “esboços embrionários que consubstanciavam meros ensaios para eventuais relatórios”. Só esta afirmação, pelo seu ridículo, deveria ter justificado a sua exoneração imediata. Mais grave ainda foi a tentativa levada a cabo no Tribunal Central Administrativo do Sul de convencer os desembargadores de que, apesar de existirem um relatório 51 e um relatório 52, não havia provas da existência de relatórios anteriores.

    A demora na publicação destes 52 relatórios por parte do PÁGINA UM ficou a dever-se ao facto de o IST os ter enviado em papel, obrigando-nos a proceder à sua digitalização. Poderíamos ter recorrido novamente aos tribunais para exigir consulta presencial ou entrega em formato digital, bem como para garantir que não fossem rasuradas quaisquer partes dos documentos. Mas preferimos expor publicamente como o IST – ou, pelo menos, o seu presidente – procedeu neste processo.

    As cópias agora divulgadas pelo PÁGINA UM estão expurgadas das referências à Ordem dos Médicos – embora as rasuras estejam mal feitas, permitindo identificar as omissões –, e os nomes dos autores dos relatórios também foram ocultados. Não obstante, os autores são conhecidos: Pedro Amaral, José Rui Figueira, Henrique Oliveira e Ana Serro.

    Rogério Colaço

    Provavelmente, nada acontecerá ao presidente do IST, Rogério Colaço, nem aos quatro investigadores e professores envolvidos, porque em Portugal não se responsabilizam os protegidos da Academia. Ainda assim, a publicação integral destes relatórios – que serviram, sobretudo em 2022, para alimentar o alarme social e condicionar políticas governamentais através de ‘fugas de informação’ para a agência Lusa – pretende registar para a posteridade uma das páginas negras da Ciência portuguesa.

    Para reforçar a necessidade de um debate científico sério e transparente, o PÁGINA UM procedeu à avaliação criteriosa de cada um dos relatórios agora divulgados, com base numa grelha rigorosa. Os relatórios do Instituto Superior Técnico foram avaliados segundo quatro critérios principais: a robustez metodológica, a transparência dos dados utilizados, a qualidade científica das projeções e recomendações e a imparcialidade na comunicação dos resultados. A análise metodológica incidiu na clareza dos modelos matemáticos, na justificação dos pressupostos e na existência de cenários alternativos ou análises de sensibilidade. Quanto à transparência, avaliou-se a origem dos dados e a sua coerência interna, bem como a acessibilidade à informação fundamental para validar os resultados apresentados.

    Além disso, a qualidade científica das conclusões foi medida pela fundamentação lógica das projeções, presença de intervalos de confiança e adequação das recomendações às evidências. Por fim, foi analisado o grau de alarmismo ou neutralidade dos relatórios, verificando se a comunicação dos resultados poderia influenciar desproporcionadamente a perceção pública e as decisões políticas. As avaliações foram realizadas com recurso a Inteligência Artificial e uma grelha de pontuação de 0 a 20 valores, garantindo maior objectividade na apreciação.

    Estas avaliações não pretendem ser definitivas. Por isso, o PÁGINA UM está disponível para publicar quaisquer análises ou textos de opinião de especialistas que pretendam comentar a qualidade científica destes relatórios. Porque é isso que se exige em Ciência: debate e escrutínio. E foi precisamente o contrário que Rogério Colaço procurou evitar – numa atitude em que a prepotência se sobrepôs à inteligência, cegando até um cientista conceituado.

    Relatório Rápido nº 1 – 19 de Março de 2021 (erradamente indicado na capa com data de 19 de Maio de 2021)
    Avaliação do Relatório Rápido nº 1 – Nota: 10/20


    Relatório Rápido nº 2 – 20 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 2 – Nota: 11/20

    Relatório Rápido nº 3 – 21 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 3 – Nota: 12/20


    Relatório Rápido nº 4 – 23 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 4 – Nota: 12/20


    Relatório Rápido nº 5 – 24 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 5 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 6 – 25 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 6 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 7 – 29 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 7 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 8 – 30 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 8 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 9 – 31 de Março de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 9 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 10 – 1 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 10 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 11 – 2 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 11 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 12 – 6 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 12 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 13 – 7 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 13 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 14 – 8 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 14 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 15 – 9 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 15 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 16 – 11 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 16 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 17 – 12 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 17 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 18 – 14 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 18 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 19 – 15 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 19 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 20 – 17 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 20 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 21 – 20 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 21 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 22 – 24 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 22 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 23 – 28 de Abril de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 23 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 24 – 5 de Maio de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 24 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 25 – 14 de Maio de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 25 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 26 – 21 de Maio de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 26 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 27 – 28 de Maio de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 27 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 28 – 4 de Junho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 28 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 29 – 13 de Junho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 29 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 30 – 16 de Junho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 30 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 31 – 22 de Junho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 31 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 32 – 25 de Junho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 32 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 33 – 2 de Julho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 33 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 34 – 10 de Julho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 34 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 35 – 19 de Julho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 35 – Nota: 13/20


    Relatório Rápido nº 36 – 25 de Julho de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 36 – Nota: 12/20

    Relatório Rápido nº 37 – 17 de Setembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 37 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 38 – 15 de Novembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 38 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 39 – 18 de Novembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 39 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 40 – 25 de Novembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 40 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 41 – 9 de Dezembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 41 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 42 – 22 de Dezembro de 2021
    Avaliação do Relatório Rápido nº 42 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 43 – 16 de Janeiro de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 43 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 44 – 25 de Janeiro de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 44 – Nota: 10/20


    Relatório Rápido nº 45 – 2 de Fevereiro de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 45 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 46 – 15 de Fevereiro de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 46 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 47 – 9 de Março de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 47 – Nota: 10/20

    Relatório Rápido nº 48 – 19 de Abril de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 48 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 49 – 9 de Maio de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 49 – Nota: 13/20

    Relatório Rápido nº 50 – 22 de Maio de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 50 – Nota: 9/20

    Relatório Rápido nº 51 – 5 de Junho de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 51 – Nota: 9/20

    Relatório Rápido nº 52 – 26 de Julho de 2022
    Avaliação do Relatório Rápido nº 52 – Nota: 9/20

  • Instituto Superior Técnico ‘marimba-se’ para acórdão sobre ‘esboços embrionários que consubstanciam meros ensaios para eventuais relatórios’

    Instituto Superior Técnico ‘marimba-se’ para acórdão sobre ‘esboços embrionários que consubstanciam meros ensaios para eventuais relatórios’

    Rogério Colaço, o presidente do Instituto Superior Técnico (IST), não cumpriu o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), que determinou a obrigatoriedade de disponibilizar os 51 relatórios relacionados com a pandemia da covid-19 que aquela instituição universitária terá elaborado em 2021 e 2022 para continuar a alimentar o alarmismo numa fase em que o SARS-CoV-2 se encontrava em fase endémica.

    O acórdão do TCAS é de 12 de Dezembro passado e já transitou em julgado, sem que Rogério Colaço, que desde o início do processo deu indicações de prepotência, tenha enviado os relatórios sobre Epidemiologia por si coordenados em articulação com uma suposta equipa científica credível constituída por  Pedro AmaralJosé Rui FigueiraHenrique Oliveira e Ana Serro. Os relatórios surgiram de uma parceria com a Ordem dos Médicos, então liderada por Miguel Guimarães, actual vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD,

    Rogério Colaço, cidadão português nascido em Soure em Junho de 1968, conjunturalmente presidente do Instituto Superior Técnico, não quer entregar ‘a bem’ 51 relatórios elaborados por uma instituição universitária pública, ao cidadão Pedro Almeida Vieira, nascido em Coimbra em Novembro de 1969, conjunturalmente director do jornal PÁGINA UM.

    Um dos dois únicos relatórios científicos conhecidos, divulgado em Julho de 2022, chegava a afirmar que as festas populares e festivais de música em Lisboa estariam “na origem de 340 mil casos de covid-19” que teriam causado “a morte de 790 pessoas”. A credibilidade científica destes relatórios, ainda mais de uma instituição pública com pergaminhos, era muito questionável – e o IST fez de tudo para que o PÁGINA UM não tivesse acesso aos relatórios que foram ‘semeando’ pânico com ares de Ciência.

    Após uma recusa por mensagem de smartphone do presidente do IST, o PÁGINA UM recorreu ao Tribunal Administrativo que, numa primeira decisão, em Janeiro de 2023, reconheceu o direito do PÁGINA UM ao acesso ao chamado “Relatório 52”, mas não se pronunciou sobre os restantes 51 relatórios e os ficheiros de dados utilizados nas análises. A decisão foi contestada por ambas as partes: o IST argumentava que não havia prova da existência dos relatórios anteriores – mesmo se numerara os dois únicos relatórios conhecidos com os números 51 e 52 –, enquanto o PÁGINA UM defendeu que todos teriam de ser divulgados.

    A luta judicial chegou a ter contornos constrangedores – e também confrangedores, por se tratar do IST –, pois ao contrário de se seguir o espírito científico de tudo se mostra, fez-se ao contrário. Para evitar o acesso, a instituição liderada por Rogério Colaço ‘inovou’ pelo absurdo: considerou, em finais de Setembro de 2022, que aquilo que fora divulgado seria “um esboço embrionário, que consubstancia[va] um mero ensaio para um eventual relatório”. A intenção era clara: convencer o tribunal a não se aplicar a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos. Pouco mais tarde, ainda em sede de processo de intimação, o IST diria que nunca negara “ter elaborado um ensaio, apenas afirm[ara] que não se tratava do produto final do estudo, mas uma mera abordagem embrionária, por isso era um esboço”. E acrescentava que o seu “esboço”, que associou mortes às festividades de Junho, “pode[ria] não conter informações exactas e precisas.”

    Henrique Oliveira, Rogério Colaço, Miguel Guimarães e Filipe Froes na sede da Ordem dos Médicos, em Julho de 2021, aquando da apresentação do plano de acompanhamento da pandemia. O Instituto Superior Técnico recusou divulgar os relatórios em 2022. E ignora agora perante um acórdão.

    Nunca tendo feito mea culpa por ter andado a lançar desinformação científica com chancela universitária, o presidente do IST continuou a lutar com o recurso para não dar os restantes 51 relatórios, cuja existência formal está até em causa, o que acarretaria, além de falta de integridade académica, uma situação compaginável com manipulação de dados e mesmo fraude científica.

    No acórdão de Dezembro passado do TCAS, mais de dois anos e cinco meses após o pedido inicial, os juízes desembargadores concluíram que a sequência numérica indicava logicamente a existência dos 51 relatórios anteriores. O tribunal rejeitou ainda a alegação do IST de que os documentos seriam “esboços embrionários”, afirmando que os relatórios, independentemente do seu carácter preliminar, são documentos administrativos sujeitos a divulgação.

    No entanto, a decisão judicial isentou o IST da obrigação de fornecer os ficheiros de dados utilizados na elaboração dos relatórios, argumentando que o pedido formulado pelo PÁGINA UM não especificava suficientemente a origem e o formato dos ficheiros. Esta interpretação é, no mínimo, questionável, uma vez que qualquer estudo quantitativo requer necessariamente um conjunto de dados para sustentar as suas conclusões.

    Rogério Colaço é professor catedrático e autor de um romance de ficção científica. E é ainda co-autor de 52 relatórios que não se sabe se são científicos, porque não os quer mostrar, apesar de um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul.

    Uma vez que o IST não cumpriu o prazo para entrega dos relatórios, nem recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, o processo seguirá agora para uma execução de sentença com pedido para ser aplicada uma sanção pecuniária compulsória contra Rogério Colaço, ou seja, uma multa diária a pagar directamente pelo presidente do IST por cada dia de atraso.

    Foi essa, aliás, a única forma legal que permitiu que, recentemente, o presidente do Conselho Superior da Magistratura disponibilizasse os relatórios da inspecção à distribuição da Operação Marquês. Sob os bolsos de João Cura Mariano, também presidente do Supremo Tribunal de Justiça, pendia uma multa diária de 50 euros. Caso Cura Mariano preferisse pagar, seriam cerca de 1.500 euros por mês a decontar do seu salário bruto de 7119, 50 euros.


    N.D. Os processos de intimação do PÁGINA UM são financiados pelos leitores através de donativo dirigidos em exclusivo ao FUNDO JURÍDICO, usando a plataforma do MIGHTYCAUSE. Se preferir usar outros meios, agradecíamos um aviso para procedermos ao depósito na plataforma. Se necessitar de esclarecimentos, escreva-nos para geral@paginaum.pt.


    Esta notícia foi objecto de um direito de resposta publicado a 28 de Fevereiro de 2025, cujo texto pode ser lido AQUI.

  • Presidente do Infarmed permite esconder negócios comerciais entre farmacêuticas e grupos de media

    Presidente do Infarmed permite esconder negócios comerciais entre farmacêuticas e grupos de media

    Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, será um dos participantes esta tarde no Flu Summit Portugal, um evento anual da Sanofi de promoção das suas vacinas contra a gripe. O evento realiza-se na sede da Impresa, e conta com médicos, representantes de sociedade médicas, deputados e até Luís Marques Mendes, candidato às Presidenciais que fará um ‘wrap-up’ antes do encerramento. Como anfitrião na abertura estará o CEO da Impresa, Francisco Pedro Balsemão, e a ‘mestre de cerimónias’ é a jornalista Marta Atalaya.

    Mesmo não sendo o nome mais sonante desta conferência, a presença de Rui Santos Ivo tem um forte simbolismo: o presidente do Infarmed vai estar presente, e nem é a primeira vez, num evento comercial envolvendo uma farmacêutica e uma empresa de media que não será registado na Plataforma da Transparência e Publicidade do regulador que lidera. E porquê? Porque o presidente do Infarmed tem sistematicamente permitido, à margem da lei, que se oculte um negócio de promiscuidades de milhões de euros que marca, cada vez mais, a influência editorial da chamada Big Pharma nos órgãos de comunicação social portugueses.

    Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, participa até em eventos que não cumprem, ‘nas suas barbas’, as regras de transparência impostas pela Lei do Medicamento.

    Tal como muitas outas conferência do género na área da saúde, o Flu Summit é sobretudo um encontro de influências, onde, neste caso em particular, a Sanofi reforça a sua posição junto de médicos, decisores políticos e media, funcionando como uma montra estratégica para a empresa francesa consolidar o seu protagonismo na definição das políticas de vacinação em Portugal. Não é por acaso que, na parte final, haverá um ‘networking cocktail’. A ligação a um órgão de comunicação acaba por ser um elo para validar convites ao poder.

    Conferências desta natureza são legais, mas têm regras específicas de transparência. São consideradas acções de marketing que obrigariam as farmacêuticas, de acordo com a lei, a divulgar os montantes envolvidos, e sobretudo os pagamentos que são feitos a médicos e aos órgãos de comunicação social. Contudo, apesar de se terem intensificado as relações comerciais nos últimos anos entre grupos de media e farmacêuticas, o Infarmed, através do seu presidente Rui Santos Ivo, tem permitido de forma impune e descarada o incumprimento generalizado da Lei do Medicamento que obriga as empresas farmacêuticas a revelar apoios concedidos a médicos e entidades de qualquer natureza.

    O Flu Summit é apenas mais uma das centenas de eventos patrocinados por farmacêuticas que nos últimos anos têm feito entrar valores avultados nos depauperados cofres da Impresa, sem que se saiba ao certo quanto. Serã alguns milhões, certamente, não tanto por cada evento ser milionário mas sim por serem centenas os eventos realizados por ano com a ‘ajuda’ – leia-se, prestação de serviços – de órgãos de comunicação social.

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    De acordo com o regime jurídico dos medicamentos de uso humano, um decreto-lei de 2006, “o patrocínio, por qualquer entidade abrangida pelo presente decreto-lei, de congressos, simpósios ou quaisquer ações ou eventos de cariz científico ou de divulgação, direta ou indireta, de medicamentos, deve constar da documentação promocional relativa aos mesmos, bem como da documentação dos participantes e dos trabalhos ou relatórios publicados após a realização dessas mesmas ações e eventos, devendo a entidade patrocinadora comunicar previamente ao INFARMED, I.P., o referido patrocínio”.

    Mas essa informação, se entregue, não pode ficar escondida. A lei também determina que “qualquer entidade […] que, diretamente ou por interposta pessoa, singular ou coletiva, conceda ou entregue qualquer benefício a toda e qualquer entidade, pessoa singular ou coletiva, de qualquer tipo, natureza ou forma, incluindo profissional de saúde ou qualquer outro trabalhador do Serviço Nacional de Saúde ou de organismos e serviços do Ministério da Saúde, associação, representativa ou não, de doentes, ou empresa, associação ou sociedade médica de cariz científico ou de estudos clínicos, bem como a estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde, independentemente da sua natureza jurídica e serviços e organismos do Ministério da Saúde nos casos admissíveis por lei, fica obrigada à sua comunicação, no prazo de 30 dias a contar da efetivação do benefício, em local apropriado da página eletrónica”. Ou seja, na Plataforma da Transparência e Publicidade.

    Contudo, desde 2013 – ano em que se iniciaram os registos –, nunca nenhuma farmacêutica identificou eventos que resultassem em apoios financeiros ou outras prestações de serviços na área do marketing envolvendo o Expresso ou a SIC, os principais órgãos de comunicação social da Impresa. E realizaram-se centenas nos últimos cinco anos, sobretudo desde o início da pandemia, em 2020.

    No ano passado, o Expresso também co-organizou o Flu Summit, mas apesar dos registos dos financiamentos a médicos, a Sanofi não quis indicar quanto pagou à Impresa.

    Para não se ser exaustivo, só este ano – isto é, em pouco mais de quatro dezenas de dias –, o Expresso publicou conteúdos, alguns resultantes da cobertura de conferências, patrocinados pela Gilead, pela Bial, pela Johnson & Johnson MedTech, pela Novartis e Laboratórios Germano de Sousa, pela Sanofi. Até ao dia de hoje, e apenas desde 1 de Janeiro contabilizam-se 24 conteúdos associados a estas entidades do sector da saúde na secção denominada ‘Projetos Expresso’. Nenhuma destas entidades, apesar da obrigatoriedade legal, inscreveu qualquer um destes eventos na Plataforma da Transparência e Publicidade como patrocínio à Impresa, nem indicando assim os montantes envolvidos.

    E se houver dúvidas sobre a existência de patrocínios nestes eventos, o próprio Expresso as retira. No final de cada um dos conteúdos publicados, quer no site quer na edição do Expresso, desde há uns meses, passou a constar a seguinte informação: “Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa.” Este aviso surgiu, em grande medida, para disfarçar problema: a elaboração destes conteúdos comerciais por jornalistas acreditados, algo que também é ilegal, porque se tratam de prestação de serviços para cumprimento de um contrato externo.

    A ausência do registo de eventos patrocinados beneficiando a Impresa – e muitas outras empresas de media – não é um esquecimento; é intencional, com o beneplácito do Infarmed. Com efeito, por exemplo, a Sanofi não se esquece de registar os pagamentos que faz a médicos que participam em concreto no dia da realização da Flu Summit.

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    No ano passado, para duas edições desta conferência, surge na Plataforma apoios financeiros da Sanofi a uma sociedade médica (Pneumologia) e a seis empresas de médicos, entre os quais Filipe Froes (2.502,80 euros) e Carlos Robalo Cordeiro (1.811,79 euros). Convém, no entanto, referir que, no caso da Impresa, os montantes serão muito mais elevados, sendo expectável que, apenas para a Flu Summit, a factura ultrapasse a fasquia da centena de milhar de euros, tendo em conta preços de mercado. Obviamente, este valor é especulativo, mas desnecessariamente: se a Sanofi cumprisse a lei, e o Infarmed a fizesse cumprir, os valores eram publicamente conhecidos.

    Há mais de um ano – e perante a promiscuidade entre farmacêuticas e imprensa – que o PÁGINA UM tem pressionado o Infarmed a esclarecer as razões para que se mantenha uma obscuridade absoluta sobre um negócio – promoção de eventos com eventuais outras contrapartidas – que movimentará milhões de euros. E que, além disso, condiciona a linha editorial dos órgãos de comunicação social.

    Em Novembro de 2023, Rui Santos Ivo garantia ao PÁGINA UM, nas poucas vezes que se pronunciou sobre esta matéria, que “sempre que existam razões para crer que assim não acontece ou sempre que chega ao nosso conhecimento, por qualquer meio, (inspeção, denúncias ou outras, etc.) que este procedimento não foi cumprido”, desencadearia “um procedimento de responsabilização, incluindo, a responsabilização contraordenacional, nos termos legais aplicáveis”. Mas nada sucedeu.

    Com a intencional passividade do Infarmed, a promiscuidade e a falta de transparência entre farmacêuticas e empresas de comunicação social permite até que se realizem debates em horário nobre para falar sobre temas escolhidos a preceito.

    E o silêncio tem prevalecido sobre as relações comerciais à margem da lei, envolvendo tanto a Impresa como a Medialivre, a Media Capital, a Global Media, o Público e o Observador. Em alguns casos, como sucedeu no ano passado, num debate na SIC Notícias, em horário nobre, moderado pela jornalista Nelma Serpa Pinto, o tema da longevidade integrava-se, de forma explícita, num projecto financiado pela Novartis e pela Fidelidade.

    Sobre a Flu Summit, o PÁGINA UM colocou questões à Sanofi, questionando as razões para não incluir os pagamentos no Portal da Tranparência que tem feito para a organização e cobertura noticiosa deste evento pelo Expresso. Não houve qualquer resposta. A impunidade e à-vontade são absolutas. O Infarmed e Rui Santos Ivo assim o permitem.

  • Estudo de investigadoras brasileiras pró-vacinas causa polémica por indicar mortalidade acrescida a longo prazo em vacinados

    Estudo de investigadoras brasileiras pró-vacinas causa polémica por indicar mortalidade acrescida a longo prazo em vacinados

    Em Agosto do ano passado, as investigadoras brasileiras Nádia Rodrigues e Mônica Andrade publicaram, em parceria com mais dois colegas, um artigo na prestigiada revista científica PLOS One sobre o risco de mortalidade por covid-19 na região sudeste daquele país. Incidindo no período entre 2020 e 2023, o estudo baseou-se em dados do sistema de vigilância epidemiológica brasileiro (SIVEP), e os resultados encaixavam-se em milhares de outros estudos. Mostravam que o ano mais crítico fora 2021 e que a idade avançada, o género masculino, a etnia a baixa escolaridade e as comorbilidades como doenças cardiovasculares e diabetes destacavam-se como factores de risco significativo.

    Além de destacar que os indivíduos negros e residentes em áreas urbanas enfrentaram maiores probabilidades de mortalidade, ainda apontavam que o estado do Rio de Janeiro registara o maior risco de morte, enquanto São Paulo apresentara os índices mais baixos. E dava uma visão positiva sobre as vacinas contra a covid-19, salientando que “reduz[ia] significativamente o risco de morte”, com uma diminuição de 20% em 2021 e de 13% em 2022 entre os vacinados, apesar de apontarem que, mesmo com a vacinação, a vulnerabilidade de certos grupos, especialmente os mais pobres e com menor acesso a cuidados de saúde, permanecia relevante.

    Do ponto de vista metodológico, o estudo de Nádia Rodrigues e Mônica Andrade – e de mais dois colegas, Joaquim Teixeira-Netto e Denise Monteiro – usou modelos estatísticos avançados, incluindo análises de sobrevivência e efeitos mistos, para identificar padrões de mortalidade. E as conclusões até sublinhavam a necessidade de intervenções direccionadas para proteger grupos de maior risco e reforçar a importância da vacinação, destacando que as estratégias de saúde pública precisavam de ser ajustadas às realidades socioeconómicas e geográficas.

    Este estudo foi ‘acolhido’ com naturalidade. Mas esse acolhimento mudou com uma análise complementar de Nádia Rodrigues e Mônica Andrade, publicada noutra revista científica conceituada, a Frontiers em Medicine, na segunda quinzena de Dezembro passado. Neste caso, as duas investigadoras realizaram um estudo de coorte retrospectivo utilizando também os dados do SIVEP no período entre 2020 e 2023 com o fito de analisar os efeitos da mortalidade a médio prazo. E se no período médio após a covid-19, o risco de morte foi reduzido em 8% para aqueles que haviam sido vacinados, num período longo pós-covid, o risco de morte quase duplicou. E mais: enquanto no médio prazo houve redução na mortalidade para aqueles que tomaram duas ou mais doses, no longo prazo o risco de morte foi maior para aqueles que tomaram uma ou duas doses.

    No estudo publicado, as duas investigadoras salientaram que “algumas possíveis explicações para o aumento do risco de morte por outras causas no longo prazo (após uma ou duas doses da vacina” são os “efeitos adversos das vacinas”, destacando que “embora as vacinas contra a covid-19 tenham demonstrado ser seguras para a grande maioria das pessoas, há preocupações sobre potenciais efeitos adversos de longo prazo (ainda que raros), como miocardite, trombose ou outras condições raras associadas à vacinação. E acrescentaram ainda que “estes efeitos podem ser mais pronunciados em alguns grupos, particularmente em indivíduos mais vulneráveis, o que poderia contribuir para um risco aumentado de morte por outras causas ao longo do tempo”.

    Nádia Rodrigues, epidemiologhista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) estudou ‘tema tabu’: o risco de mortalidade por todas as causas de não-vacinados e vacinados contraa covid-19, apesar de ser uma investigadora que se tem destacado por promover as vacinas..

    Por outro lado, destacaram as investigadoras no seu artigo científico, “a vacina contra a covid-19 pode ter um efeito indirecto no sistema imunitário para pessoas com condições pré-existentes ou para aqueles com sistemas imunitários enfraquecidos (como pacientes com doenças autoimunes ou aqueles sob tratamentos imunossupressores)”, referindo que “a resposta imunológica ao vírus pode ter efeitos inesperados ou complexos que aumentam a vulnerabilidade a outras infeções ou levam a complicações de condições pré-existentes”.

    Apesar de as duas investigadoras salientarem no artigo científico as limitações do estudo – avisos comuns em Ciência – e de fazerem uma avaliação prudente dos resultados, o facto de colocarem em causa eventuais efeitos prejudiciais das vacinas contra a covid-19 num contexto de longo prazo, causou uma ‘hecatombe’ de críticas no Brasil. A própria Fundação Oswaldo Cruz, também conhecida por Fiocruz – equivalente, em Portugal, à Escola Nacional de Saúde Pública Dr. Ricardo Jorge –, reagiu na semana passada, tentando desvalorizar o estudo e apontando fortes críticas metodológicas. Isto, mesmo sabendo-se que uma das investigadoras em causa, Nádia Rodrigues, é uma das suas conceituadas epidemiologistas, de créditos firmados com mais de uma dezena de artigos científicos relacionados com a covid-19, e que, por diversas vezes, tomou posição favorável à vacinação.

    Com efeito, no início da semana passada, o denominado Comitê de Acompanhamento Técnico-Científico das Iniciativas Associadas a Vacinas para a Covid-19 – presidido pelo próprio presidente da Fiocruz, Mário Moreira, doutorado em Políticas Públicas – criticou severamente as conclusões, apontando falhas metodológicas e sustentando que “a hipótese apresentada pelo artigo [científico numa revista que teve revisão pelos pares]  contrasta com o vasto corpo de conhecimento científico publicado sobre vacinas e vacinação, não apenas contra a covid-19, mas também contra muitas outras doenças evitáveis por vacinação”. E disse ainda ser “crucial manter o rigor científico, evitando a polarização ideológica na pesquisa sobre vacinas”, argumentando que “artigos submetidos para publicação científica abordando causalidade relacionada a condições de saúde, que são multifactoriais por natureza, devem usar bancos de dados múltiplos, apropriados e robustos para testar hipóteses multicriteriais, além de declarar claramente as limitações metodológicas do artigo e das inferências apresentadas”.

    A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), vinculada ao Ministério da Saúde do Brasil, apresenta-se como a mais destacada instituição de Ciência e Tecnologia em Saúde da América Latina. Lançou fortes críticas ao artigo científico de uma das suas investigadoras.

    Esta posição seguiu em linha com uma nota da Fiocruz pouco dias antes, tomada para “reiterar a posição institucional de que as vacinas contra covid-19 aprovadas pelas autoridades sanitárias no Brasil são efectivas na redução dos casos graves e das mortes pela doença”, insistindo que “a vacinação contra covid-19 salvou milhões de vidas e foi fundamental para a contenção da doença e decretação pela Organização Mundial da Saúde (OMS) do fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional em Maio de 2023”.

    As pressões políticas, que também surgem do próprio Ministério da Saúde, sobre um artigo científico incómodo, chegaram, entretanto, à própria revista Frontiers of Medicine que, na passada quarta-feira, publicou uma “manifestação de preocupação” anunciando que uma “equipa de integridade de pesquisa conduzirá uma investigação em total conformidade com nossos procedimentos”, adiantando que “a situação será actualizada assim que a investigação for concluída.”

    Note-se, porém, que o artigo científico publicado na Frontiers of Medicine – e que contabiliza, só este mês quase 27 mil leituras, valores elevadíssimos para este tipo de revistas – teve edição e revisão entre pares. Um dos revisores foi o italiano Marco Rocetti, investigador com larga experiência em análise de dados aplicada à pandemia da covid-19. Aliás, num dos seus artigos, publicado em 2023 na Mathematical Biosciences and Engineering, destacava então existir uma “correlação positiva entre mortes por COVID-19 e excesso de mortalidade por todas as causas”.

    Contactadas pelo PÁGINA UM sobre esta inusitada polémica, que transcende já a esfera científica, sendo mais política, Nádia Rodrigues e Mônica Andrade defendem a integridade do seu estudo, salientando que “a discussão dos resultados foi abrangente e feita de forma imparcial considerando todas as possibilidades e com embasamento [base] em outros artigos”, refutando que não tenham usado outra informação disponível. “Existem poucos estudos sobre a curva de sobrevida de pacientes graves em médio e longo prazo e portanto, não encontramos estudos brasileiros com esta temática”, referem as investigadoras. E respondem às críticas argumentando que “embora vários pontos levantados estivessem presentes na discussão, notou-se que deveriam ser enfatizados como limitações do estudo e posteriormente, solicitamos a incorporação destas”.

    Artigo científico publicado pela Frontiers in Medicine, que causou polémica no Brasil, teve revisão de pares. Nas últimas semanas tem registado uma inusitada procura.

    Sobre os “recentes ataques disseminados em mídias sociais, associando nossas pessoas a grupos antivacinas”, Nádia Rodrigues e Mônica Andrade dizem que, tanto a título profissional como pessoal, são “defensoras incondicionais do Programa Nacional de Vacinação [do Brasil], um pilar fundamental em nossas actividades académicas, práticas profissionais, e na promoção da saúde em ambientes familiares e sociais”. E dizem ainda acreditar que “as vacinas são um dos maiores avanços da Medicina, responsáveis por salvar milhões de vidas e prevenir doenças”, reafirmando “o irrestrito apoio ao programa de imunização, que é essencial para a manutenção da saúde pública no Brasil”.

    Por fim, as duas investigadoras rejeitam “qualquer tentativa de distorção ou desinformação a esse respeito, com o compromisso de seguir promovendo a saúde e o bem-estar de nossa sociedade”.

    O tom da mensagem transmitida pelas duas investigadoras brasileiras faz, em certa medida, lembrar a célebre abjuração de Galileu Galilei perante a Inquisição em 1633, e a frase a si atribuída como lamento: “E pur si muove“, aludindo ao facto de, apesar do que então lhe impunham dizer, a Terra continuaria a mover-se em torno do Sol.

  • Hospital Garcia de Orta entrega 700 mil euros à Unilabs por serviços médicos sem contrato escrito

    Hospital Garcia de Orta entrega 700 mil euros à Unilabs por serviços médicos sem contrato escrito

    Uma aquisição de serviços de telerradiologia, um tipo de prestação onde existe concorrência, foi contratada para o Hospital Garcia de Orta através de um simples ajuste directo de 707 mil euros, IVA incluido, através da Unidade Local de Saúde Almada-Seixal (ULSAS). E ainda mais: sem sequer ter sido assinado um contrato por escrito, onde constem as condições, tipologia dos serviços e o preço unitário. O ‘feliz contemplado’ por esta liberalidade de gestores hospitalares foi a empresa Dr. Campos Costa -Consultório de Tomografia Computorizada, pertencente ao universo do grupo Unilabs.

    O anúncio deste peculiar procedimento de contratação pública foi publicado na plataforma Portal Base no passado dia 13 de Janeiro, mas o ‘contrato’ fico assumido em 26 de Dezembro, vigorando por 365 dias. Em causa, de acordo com os poucos elementos constantes no Portal Base, está a prestação de um serviço de telerradiologia, que consiste na transmissão electrónica à distância de imagens radiológicas, designadamente radiografias e TACs, bem como a elaboração de relatórios de diagnóstico por médicos especialistas.

    Hospital Garcia de Orta, em Almada. / Foto: D.R.

    No Potal Base, a ULSAS justifica esta despesa por ajuste directo e sem contrato formal reduzido a escrito “por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade”. Contudo, se o motivo de urgência pode ser invocado para não se abrir concurso público, não pode justificar um período tão longo de vigência, e teria de se confirmar se o atraso numa opção concorrencial se deveu ou não à própria estrutura local do SNS.

    Além disso, não se encontra previsto no Código dos Contratos Públicos que um ajuste directo por “urgência imperiosa” justifique a ausência de um contrato escrito, ainda mais quando atinge mais de 700 mil euros, e não se vislumbra qualquer impedimento físico ou emocional para não se pegar em contratos similares e os adaptar ao actual contexto.

    Até porque, na verdade, o Hospital Garcia da Orta já tem um longo historial com a empresa da Unilabs. Nos últimos dois anos, a Dr. Campos Costa facturou 1.016.475 euros, através de três contratos, dois por ajuste directo e um por concurso público. O primeiro contrato, no valor de 233.850 euros, foi adjudicado por ajuste directo em 24 de Julho de 2023. O segundo contrato, no montante de 207.625 euros, foi feito por concurso público no dia 21 de Agosto de 2023.

    Em resposta a questões colocadas pelo PÁGINA UM, a ULSAS explicou que o primeiro ajuste directo adjudicado a esta empresa, em 2023, resultou da “não adjudicação” após dois concursos públicos. Assim, foi decidido efectuar o ajuste directo à Dr. Campos Costa “para garantia de continuidade da prestação de Serviços de Telerradiologia, essenciais à prestação directa de cuidados de saúde, pelo período de tempo estritamente necessário até à conclusão” de um novo concurso público.  Este ajuste directo “produziu efeitos de 1 de Janeiro de 2023 a 31 de Maio de 2023”.

    Posteriormente, após a conclusão do novo concurso público, acabou por ser feita nova adjudicação à Dr. Campos Costa, produzindo efeitos de 1 de junho de 2023 a 31 de dezembro de 2023.

    Segundo a ULSAS, no concurso público que deu lugar ao contrato com a Dr. Campos Costa, em 2023, “ficou expressamente prevista” a possibilidade “de adopção de procedimento por ajuste directo para a celebração de futuro contrato de aquisição de novos serviços que consistam na repetição de serviços similares objeto do presente procedimento”. Mas tal deveria ter sido feito de outra forma, ou seja, através de uma prorrogação do contrato já estabelecido, sob condições. Assim, aquilo que se depreende é que a ULSAS usou um argumento falso para celebrar um ajuste, porque a urgência imperiosa, por não haver contrato, era exclusivamente sua.

    A empresa Dr. Campos Costa foi integrada no grupo Unilabs em 2017. / Foto: D.R.

    Em todo o caso, a ULSAS, defende que o ajuste directo ao longo do presente ano está em “respeito pelas condições constantes do contrato suprarreferido”.

    Recorde-se que a Dr. Campos Costa, que pertence ao grupo Unilabs desde 2017, foi condenada pela Autoridade da Concorrência, em 2022, ao pagamento de uma coima superior a cinco milhões de euros. Em causa esteve “a participação num cartel em concursos públicos para prestação do serviço de telerradiologia a hospitais e centros hospitalares no território nacional”, segundo a acusação da AdC.

    A Dr. Campos Costa e outras empresas do sector repartiram entre si o mercado e puseram em prática estratégias para que houvesse um aumento generalizado dos preços dos serviços de telerradiologia junto de unidades que integram o Serviço Nacional de Saúde. Na altura, a Dr. Campos Costa colaborou com as investigações da AdC, tendo admitido a participação no cartel e abdicado de qualquer litigância judicial da condenação.

    No total, esta empresa facturou 26.248.991,50 euros através de 127 contratos com entidades públicas, desde 2009. Só em 2024, a Dr. Campos Costa ganhou 4,130 milhões de euros em contratos feitos com entidades estatais, a maior parte através de concurso público e quatro por ajuste directo.

    Sabendo-se que, segundo a ULSAS, o serviço prestado pela Dr. Campos Costa é essencial, aguarda-se a divulgação de um novo concurso público ou um ajuste directo relativo aos serviços que estarão a ser prestados, eventualmente pela mesma empresa, ao Hospital Garcia de Orta em 2025. Fica na dúvida se se invocará uma nova e estafada “urgência imperiosa” com pagamentos feitos sem se saber preços unitários.

  • Ordem dos Médicos ‘esquece’ 144 mortes em excesso na ‘flor da vida’

    Ordem dos Médicos ‘esquece’ 144 mortes em excesso na ‘flor da vida’

    Ao contrário da mortalidade infantil – que mantém os sinais de uma evolução positiva espectacular nas últimas décadas e estabilizou desde 2012, sempre abaixo dos 300 óbitos por ano –, os adolescentes e jovens adultos estão agora em maior perigo. Nos últimos três anos, no grupo etário dos 15 aos 24 anos assiste-se a uma evidente inversão, de forma abrupta e consistente, nas taxas de sobrevivência, e os números de óbitos dispararam. Na ‘flor da idade’, quando a ‘Ceifeira’ está pouco activa, este crescimento está agora em contra-ciclo, e nem a Ordem dos Médicos – que pediu a criação de um grupo de trabalho apenas para a mortalidade infantil – parece interessada em saber a razão um excesso de mortalidade que, desde 2022, será de mais 144 jovens do que seria esperado. Haverá receio de se descobrirem causas indesejáveis associadas à gestão da pandemia, incluindo suicídios e efeitos adversos das vacinas contra a covid-19?


    O inexplicável aumento da mortalidade em adolescentes e jovens adultos nos últimos três anos inverteu, de forma abrupta, a tendência de melhoria das taxas de sobrevivência das últimas décadas. Apesar da gravidade da situação, que tem claramente um evidente ‘ponto de inversão’ em 2022, nem o Ministério da Saúde nem a Ordem dos Médicos esboçaram sequer qualquer reacção para apurarem as causas desse agravamento nas mortes na faixa etária dos 15 aos 24 anos.

    Recorde-se que, ainda na passada sexta-feira, depois de o jornal Público ter ‘requentado’ uma notícia do PÁGINA UM de início de Dezembro sobre a mortalidade infantil em 2024 ser a maior do último quinquénio, a Ordem dos Médicos manifestou agora procupação mas apenas sobre esta faixa etária, instando a Direcção-Geral da Saúde a constituir um grupo de trabalho para estudar o assunto. Em declarações à TVI, o bastonário Carlos Cortes disse ser necessário estudar “caso-a-caso” os óbitos para “saber quais foram os motivos”,  para depois desenvolver depois uma intervenção mais profunda para manter os números [baixos de mortalidade infantil] que nos têm orgulhado”.

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    A Ordem dos Médicos nada disse, no entanto, sobre o excesso de mortalidade muito mais graves em termos numéricos associado aos adolescentes e jovens adultos, que se têm agravado nos últimos três anos. O PÁGINA UM foi, ao longo dos últimos anos, denunciado o excesso de mortalidade na faixa dos 15 aos 24 anos, sem que a Ordem dos Médicos, com recursos para chegar à mesma conclusão, fizesse a pressão que agora decidiu sobre a mortalidade nos recém-nascidos até perfazerem 12 meses.

    Com efeito, apesar de toda a celeuma criada em redor da subida dos óbitos de bebés no ano passado – subindo de 219, em 2023, para 261 –, em termos de médio prazo estes números não são ainda alarmantes. O somatório da mortalidade infantil no triénio 2022-2024 (um total de 713 óbitos) está ainda abaixo do triénio 2018-2020 (um total de 769 óbitos).

    A melhoria deste indicador é, na verdade, um dos grandes ‘milagres’ da Medicina moderna. Somente em 2010 se conseguiu, pela primeira vez, registar um triénio (neste caso, 2008-2010) abaixo dos mil óbitos. No final dos anos 90 do século passado, os óbitos de bebés eram quase três vezes mais, embora o número de nascimento fosse bem maior do que actualmente. Desde 2013 não há qualquer ano acima dos 300 óbitos, sendo que os anos mais baixos ocorreram até durante a pandemia (2020, com 214 óbitos; e 2021, com 195 óbitos), que estará associado à ‘hiper-protecção’ dos confinamento, algo que seria insustentável e até contraproducente manter no futuro.

    Carlos Cortes, ao fundo, cumprimentando Diogo Pacheco de Amorim, deputado do Chega, aquando da sua posse como membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida em Maio do ano passado. Fonte: AR.

    Mas já no que diz respeito aos adolescentes e jovens adultos, os últimos três anos mostram uma evolução preocupante, sobretudo por se estar perante um dos grupos etários com taxas de mortalidade mais baixas. Por exemplo, a taxa de mortalidade infantil – que ronda agora os três óbitos por 1.000 nascimentos – é cerca de 10 vezes superior ao grupo dos 15 aos 24 anos, considerando que, no quinquénio antes da pandemia (2014-2019) se contabilizaram menos de três óbitos por 10.000 pessoas dessa faixa etária.

    O aumento da mortalidade dos adolescentes e dos jovens adultos não está directamente associado à doença (covid-19) causada pelo SARS-CoV-2, embora possa ser um efeito colateral da gestão da pandemia. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), em três anos da pandemia (2020-2022) morreram, com causa atribuída à covid-19, quatro pessoas com idades entre os 15 e os 19 anos, e mais 12 com idades entre os 20 e os 24 anos.

    Porém, se nos dois primeiros anos da pandemia o número de óbitos dos adolescentes e jovens adultos (15 aos 24 anos) estava quase em linha com o período pré-pandemia – 331 óbitos em 2020 e 312 em 2020, que contrastava com a média do quinquénio 2015-2019, que foi de 310 –, a partir de 2022 as más notícias aumentaram.

    Evolução da mortalidade por ano desde 1998. Fonte. INE e SICO. Análise: PÁGINA UM.

    Os óbitos nesta faixa etária dispararam em 2022 para 375, sendo que apenas noves se associaram à covid-19, segundo dados oficiais do INE consultados pelo PÁGINA UM. Este valor anual foi o maior desde 2011. Em 2023 desceram ligeiramente, mas acima da média (359) e no ano que agora terminou contabilizaram-se 352 óbitos.

    Deste modo, considerando os valores contabilizados por triénio – que, em certa medida, reduzem a possibilidade dos acasos –, o triénio 2022-2024 é, claramente, o pior da última década, sendo necessário recuar 11 anos para encontrar um triénio pior (2011-2013, com 1112 óbitos).

    Há uma década assistia-se então a uma evolução verdadeiramente positiva nas taxas de sobrevivência da população jovem, fruto sobretudo dos cuidados médicos. De facto, no presente século, a mortalidade neste grupo etário foi descendo de forma consistente e bem visível pela Estatística. Por exemplo, em 1996 ainda morreram 1556 adolescentes e jovens adultos; em 2022 conseguiu-se pela primeira vez baixar a fasquia dos mil óbitos (924) e a evolução positiva não ficou por aí.

    Evolução da mortalidade por triénio (somatório de três anos) em cada ano desde 1998. Fonte. INE e SICO. Análise: PÁGINA UM.

    Em 2010, os óbitos ficaram aquém do meio milhar pela primeira vez (451 mortes), e a partir de 2012 o número de mortes passou a estar sempre abaixo dos 400. Em 2018, com 291 óbitos, atingiu-se o número mais reduzido de sempre. A segunda década deste século foi mesmo um ‘período de ouro’, confirmado por números consistentemente baixos: por exemplo, entre 2015 e 2021, a mortalidade média neste grupo etário foi somente de 314 óbitos por anos.

    Por esse motivo, a inversão nos últimos três anos se mostra mais preocupante: comparando com esse ‘período de ouro’, o triénio 2022-2024, com uma média de 362 óbitos por ano, representa um crescimento de mais de 15%, ou, se se quiser um número absoluto, mais 144 mortes do que o esperado. São 144 mortes na ‘flor da idade’ que, aparentemente, não são motivo suficiente para a Ordem dos Médicos sugerir a criação de um grupo de trabalho nem identificar as causas de tantas mortes. Será pelo receio de se descobrirem causas indesejáveis?


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  • Mortalidade dos adolescentes e jovens adultos em níveis absurdamente elevados nos últimos dois anos

    Mortalidade dos adolescentes e jovens adultos em níveis absurdamente elevados nos últimos dois anos

    É no grupo daqueles que estão na ‘flor da idade’ que se está assistir, de uma forma absurdamente escondida pelas autoridades, um fenómeno de excesso de mortalidade nos últimos anos, que não estará associado à covid-19, mas à gestão da pandemia e às suas ‘sequelas’. Uma análise do PÁGINA UM à evolução das taxas de mortalidade dos diferentes grupos etários entre 2014 e 2024, envolvendo o recurso a testes estatísticos de significância, confirma que a pandemia fez ‘mossa’ quase apenas nos super-idosos (maiores de 85 anos), mas os efeitos da gestão da pandemia (ou outros factores desconhecidos e não estudados) estão a causar, ainda agora, um excesso de mortalidade entre os 15 e os 34 anos. Uma vez que as taxas de mortalidade nestas idades são baixas, não existe uma percepção pública da gravidade deste fenómeno, mas a estimativa do PÁGINA UM aponta para terem ocorrido, em 2023 e 2024, mais cerca de 200 óbitos entre adolescentes e jovens adultos do que seria de esperar se se mantivessem as taxas de mortalidade anteriores a 2020.


    Apesar de a covid-19 ter sido uma doença praticamente benigna nos jovens, a mortalidade por todas as causas nos adolescentes e jovens adultos, integrando os grupos etários dos 15 aos 34 anos, continua em níveis muito mais elevados do que no período pré-pandémico. A evolução das taxas de mortalidade, entre 2014 e 2024, assim o atesta, conforme se conclui numa análise do PÁGINA UM, com recurso a testes estatísticos de significância, que comparou quatro períodos distintos: pré-pandemia (2014-2019), pandemia (2020-2021), transição (2022, com a população quase totalmente vacinada e com reforços) e pós-pandemia (2023 e 2024).

    Considerando os óbitos registados no Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) e a população por grupo etário (do ano anterior, por não estarem disponíveis as estimativas do Instituto Nacional de Estatística de 2024), e evolução das taxas de mortalidade, agora para um período mais alargado, permitem um retrato mais fiel sobre o impacte da pandemia e sobretudo sobre as ‘mazelas’ ignoradas.

    group of people in black shirts

    A análise do PÁGINA UM teve como objectivo identificar ou confirmar três tipos de situações. Por um lado, determinar com rigor estatístico quais os grupos etários que, verdadeiramente, registaram um impacte relevante durante a pandemia face ao período anterior (2014-2019), num contexto de crescente processo de envelhecimento da sociedade portuguesa e da maior virulência do SARS-CoV-2 na população idosa e com comorbilidades.

    Por outro lado, procurou-se a existência de diferenças significativas nas taxas entre o auge da pandemia (com a mortalidade associada à covid-19 mais elevada em 2020 e 2021) e o período imediatamente subsequente – o ano de 2022, ainda com mortalidade total elevada, apesar de variantes menos agressivas do vírus e uma população maciçamente vacinada – e ainda o período pós-pandemia. Essa análise também permitiria, por fim, detectar dois fenómenos: o “efeito de ceifa” (ou de colheita, ‘harvesting’, em inglês) e a ocorrência de eventos em contra-ciclo.

    No primeiro caso, o efeito ‘harvesting’ é caracterizado por um aumento significativo da mortalidade num determinado período devido a um evento crítico, seguido por uma redução subsequente nas taxas de mortalidade. Este efeito resulta da “antecipação” das mortes de indivíduos mais vulneráveis, que teriam falecido num futuro próximo devido à sua condição de saúde frágil ou idade avançada. Ou seria expectável que, após uma subida da taxa de mortalidade nos anos da pandemia em determinados grupos etários se observasse uma redução significativa nos anos seguintes, mesmo com taxas de mortalidade abaixo dos níveis pré-crise sanitária.


    Taxas de mortalidade (em permilagem) nos menores de um ano e no grupo dos 1 aos 4 anos. Fonte: SICO e INE. Análise: PÁGINA UM.

    No segundo caso, a análise do PÁGINA UM também procurou detectar grupos etários onde, independentemente do maior ou menor impacte da pandemia (sobretudo nos anos de 2020 e 2021), as taxas de mortalidade em 2023 e 2024 estivesse acima das taxas no período pandémico ou do período pré-pandémico. Ou seja, a ocorrência deste evento em contra-ciclo, em determinados grupos etários, evidenciava efeitos colaterais associados à gestão da pandemia, e não propriamente à doença.

    Ora, foi neste processo que se detectaram os ‘problemas’ nos adolescentes (a partir dos 15 anos) e nos jovens adultos (até aos 34 anos). Com efeito, de acordo com a análise do PÁGINA UM, a taxa de mortalidade no grupo etário dos 15 anos 24 anos estava estável antes da pandemia (2014-2019), com uma média de 0,284‰, e subiu para uma média de 0,295 (+3,6%) durante o período pandémico, mesmo se a covid-19 não causou um número relevante de óbitos.

    Em 2022, já com este grupo maioritariamente vacinado, a taxa ainda subiu mais, atingindo 0,344, o valor mais elevado, descendo em 2023-2024 para 0,325, ou seja, acima da taxa pré-pandemia. Todas as análises feitas pelo PÁGINA UM com testes estatísticos de significância revelaram diferenças significativas, ou seja, ainda no ano passado a mortalidade neste grupo etário mantinha-se elevado.


    Taxas de mortalidade (em permilagem) nos grupos dos 5 aos 14 anos e dos 15 aos 24 anos. Fonte: SICO e INE. Análise: PÁGINA UM.

    Esta situação está, aliás, em linha com os alertas do PÁGINA UM sobre a mortalidade excessiva neste grupo etário. Se a taxa de mortalidade de 2023-2024 se tivesse mantido semelhante ao período pré-pandémico, teriam morrido, de acordo com os cálculos, menos nove dezenas de jovens deste grupo etário.

    No caso do grupo dos 25 aos 34 anos, antes da pandemia (2014-2019), a taxa de mortalidade oscilava entre 0,410 e 0,519‰, com uma média de 0,486. Durante o período pandémico (2020-2021), as taxas foram superiores, com uma média de 0,516 (+6,2%). Em 2022, a taxa rondou os 0,5o‰, enquanto em 2023-2024 subiu inesperadamente para os 0,532, portanto acima do período pré-pandémico. Ou seja, também nesta faixa etária, em vez de um efeito ‘harvesting’, com a consequente diminuição da taxa de mortalidade após a crise sanitária da pandemia, mantiveram-se elevadas as taxas (+9,4% face ao período pré-pandemia), evidenciando um comportamento de contra-ciclo.

    Fenómeno distinto, apesar aparentemente semelhante, ocorreu com os recém-nascidos. A taxa de mortalidade infantil, antes da pandemia (2014-2019), variou entre 2,88 e 3,38‰, com uma média de 3,06, e até desceu durante o período pandémico, passando para 2,47 em 2020 e para 2,30 em 2021. No ano seguinte subiu para 2,93, enquanto em 2023-2024, a média foi de 2,82‰, embora o ano de 2024 tenha atingido os 3,03‰, em virtude dos 261 óbitos. Apesar de 2024 ter sido o ano de maior mortalidade infantil no quinquénio, como o PÁGINA UM já antecipou em exclusivo há um mês, os valores são bastante baixos em termos históricos, apesar de ser fundamental investigar as causas.


    Taxas de mortalidade (em permilagem) nos grupos dos 25 aos 34 anos e dos 35 aos 44 anos. Fonte: SICO e INE. Análise: PÁGINA UM.

    A análise do PÁGINA UM também revela que, ao contrário daquilo que as autoridades de Saúde fizeram crer, a pandemia foi sobretudo uma crise sanitária com efeitos relevantes na mortalidade quase apenas para os super-idosos, isto é, os maiores de 85 anos.

    De acordo com os cálculos, as taxas de mortalidade antes da pandemia (2014-2019) rondaram os 145‰, sendo que no ano anterior à pandemia (2019) até registou um valor anormalmente baixo (da ordem dos 142, o que terá contribuído para um maior impacte do SARS-CoV-2 em 2020. Durante o período pandémico (2020-2021), a taxa de mortalidade média para este grupo subiu para quase 154 (+6,2%), mantendo-se em níveis semelhantes em 2022 (153,1‰), o que em si coloca em causa a própria eficácia das vacinas na redução da mortalidade total.

    No período pós-pandemia (2023-2024), registou-se então uma redução significativa para uma média de 142,7‰, evidenciando só então a concretização do efeito ‘harvesting’. Apesar desse efeito ter sido evidente, e estatisticamente significativo, face ao período pandémico e de transição, certo é que não existe diferença estatisticamente significativa face ao período pandémico. Esta situação mostra assim que mesmo em 2023 e 2024 houve mantêm-se as ‘sequelas’ da gestão da pandemia, porque seria de aguardar uma redução da taxa de mortalidade depois de um excesso de três anos.


    Taxas de mortalidade (em permilagem) nos grupos dos 45 aos 54 anos, dos 55 aos 64 anos, dos 65 aos 74 anos e dos 75 aos 84 anos. Fonte: SICO e INE. Análise: PÁGINA UM.

    Apesar de estatisticamente ser evidente que a pandemia atingiu, embora em menores graus (face aos super-idosos) e de forma distinta, a população portuguesa com idades superiores a 55 anos, há um grupo específico que destoa. Com efeito, no grupo dos 75 aos 84 anos não se sente um efeito negativo significativo da pandemia. A taxa de mortalidade na pré-pandemia (2014-2019) atingiu uma média de 43,36‰, tendo registado uma subida quase imperceptível em 2020-2021 para os 43,70 (+0,8%). Em 2022, registou-se então uma descida para 41,27, enquanto em 2023-2024 a média baixou para os 36,88 (-15% em relação ao pré-pandemia). Ou seja, além de não ter sido particularmente atingida pela pandemia, a taxa de mortalidade neste grupo até se reduziu face ao período pré-pandémico.

    A mesma situação não ocorreu nos dois grupos etários imediatamente antecedentes, se bem que os efeitos negativos da pandemia tenham sido,´mesmo assim, moderados. No caso do grupo etário dos 55 aos 64 anos, a taxa de mortalidade no período pandémico subiu 3,8% face ao período pré-pandemia (2014-2019), passando de 6,63‰ para 6,88. Em 2022, a taxa desceu ligeiramente para 6,74, mantendo uma redução adicional para 6,33 em 2023-2024. As diferenças entre os períodos foram marginalmente significativas, podendo-se considerar que a pandemia, como crise sanitária, apenas marginalmente teve impacte neste grupo.

    Já quanto à faixa etária dos 65 aos 74 anos, enquanto a taxa de mortalidade antes da pandemia (2014-2019) foi de 14,40‰, a subida nos anos de 2020-2021 foi de apenas 3%, para 14,83. Em 2022, desce para 14,20‰, continuando a reduzir em 2023-2024, com uma média de 13,41, ou seja, abaixo da taxa pré-pandemia.

    Taxas de mortalidade (em permilagem) nos maiores de 85 anos e na população total. Fonte: SICO e INE. Análise: PÁGINA UM.

    Esta análise detalhada conduzida pelo PÁGINA UM evidencia assim que, embora a pandemia da covid-19, como crise sanitária (não apenas associada à doença) tenha tido um impacto directo maior nas populações mais idosas e vulneráveis, os efeitos indiretos e prolongados da sua gestão recaíram desproporcionalmente sobre os adolescentes e jovens adultos, cujas taxas de mortalidade continuam a superar os níveis pré-pandémicos.

    Estes dados reflectem a necessidade urgente de políticas públicas que vão além da mera resposta à crise sanitária, abordando as consequências estruturais e sociais que permaneceram, particularmente nos grupos etários mais jovens, para prevenir perdas evitáveis e reconstruir a resiliência social e sanitária de forma equitativa. Mas isso interessará? Talvez não, até porque, na ânsia de se querer salvar tudo, deitou-se o bebé com a água do banho.

    Aliás, de uma forma tristemente irónica, um dos impactes mais intensos e duradouros, porque perdurará por décadas, foi o baby bust – o inverso do baby boom – em 2021, quando a redução dos nascimentos, por via da incerteza dos potenciais pais face à gestão política da crise sanitária, atingiu cerca de cinco mil vidas. Ou seja, nasceram menos cinco mil crianças. E, neste caso, as estatísticas mostram que, nos anos seguintes, não houve recuperação.


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  • Covid-19: DGS quer despachar ‘sobras’ de uma vacina sem farmacovigilância adequada nem compensações por danos

    Covid-19: DGS quer despachar ‘sobras’ de uma vacina sem farmacovigilância adequada nem compensações por danos

    Num país que viveu a pandemia da covid-19 à cata de supostos ‘negacionistas anti-vacinas’ – que incluía quem se opunha à inclusão de jovens e adultos saudáveis nos planos de vacinação, ou considerasse que a imunidade natural era suficiente –, não deixa de ser lamentavelmente irónico que, no final de 2024, Portugal seja um dos poucos da Europa Ocidental que recusa falar das reacções adversas, não tendo montado qualquer plano de compensação das vítimas. E pior: num estranho tabu, o Infarmed nem sequer acompanha a evolução dos casos notificados. A desconfiança e o desamparo têm tido consequências: mesmo na população mais vulnerável, assiste-se a uma crescente recusa da vacina contra a covid-19. Este ano, em comparação com 2023, a ‘procura’ de reforço desceu quase 14%. Foram mais 204 mil portugueses que não quiseram saber da vacina contra a covid-19. E a Direcção-Geral da Saúde, em vez de promover uma melhoria da informação e pugnar pelo apoio às pessoas afectadas, decidiu-se por uma estranha solução: as vacinas que sobraram serão agora administradas no grupo etário dos 50 aos 59 anos. A saúde das pessoas pode ser ‘lixada’; as vacinas é que não podem ir parar ao lixo…


    Não existe qualquer motivo epidemiológico ou de Saúde Pública para a decisão da Direcção-Geral da Saúde (DGS) de alargar o plano de reforço da vacinação contra a covid-19 para a faixa etária dos 50 aos 59 anos, hoje iniciado. O motivo para este alargamento é simples: estão em stock centenas de milhares de doses, que arriscam ir para o lixo, porque cada vez há menos pessoas do grupo dos maiores de 60 anos interessadas em apanhar mais uma dose desta vacina. Isto, num cenário em que são reveladas falhas gravíssimas na farmacovigilância pelo Infarmed num país que insiste em não assumir quaisquer indemnizações e apoios médicos às pessoas que foram afectadas por reacções adversas.

    Conforme o PÁGINA UM mostrou na passada semana, através de dados do Centre for Socio-Legal Studies, Portugal integra o lote de 14 países da União Europeia que optou por nunca implementar qualquer plano de indemnização às vítimas das vacinas contra a covid-19, que integra também a Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Espanha, Grécia, Hungria, Irlanda, Lituânia, Malta, Países Baixos, Roménia e Eslováquia.

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    Ao invés, países como a Áustria, República Checa, Dinamarca, Estónia, Finlândia, França, Alemanha, Itália, Letónia, Luxemburgo, Polónia, Eslovénia e Suécia – que integram também a União Europeia – implementaram sistemas, ou aproveitaram os modelos existentes pré-pandemia – para suportar compensações em casos de dados graves resultantes da administração das vacinas contra a covid-19. Recorde-se que a Comissão von der Leyen isentou de responsabilidades as farmacêuticas. Além dos membros da União Europeia, outros países do Velho Continente têm sistemas desta natureza, designadamente Noruega, Islândia, Noruega, Reino Unido e até Rússia.

    O desinteresse dos portugueses mais idosos pela vacina contra a covid-19 – agravada pela ausência de informação fiável sobre as suas vantagens, num cenário de endemismo do SARS-CoV-2, agora com muito menor virulência numa população com imunidade natural – fica patente não apenas na comparação entre o número de doses administradas no Outono deste ano e o de 2023, como sobretudo no número elevado de pessoas que optaram por aceitar apenas a vacina contra a gripe, cujas vantagens são inequívocas sem efeitos adversos relevantes.

    Com efeito, na época de vacinação outonal do ano passado, segundo um relatório da DGS com informação referente a 10 de Dezembro de 2023, tinham sido administradas 1.516.613 doses contra a covid-19 a maiores de 60 anos, menos 240.186 doses do que as administradas contra a gripe. Deste modo, e considerando uma população de cerca de três milhões de indivíduos nesta faixa etária, em média, por cada 100 pessoas, houve 40 que optaram por não querer nenhuma das vacinas, 50 vacinaram-se contra a gripe e a covid-19, enquanto 10 só quiseram a vacina contra a gripe.

    Comparação entre as doses administradas no Outono de 2023 (até 10 de Dezembro) e no Outono de 2024 (até 8 de Dezembro) de vacinas contra a covid-19 e contra a gripe. Fonte: DGS.

    Ora, este ano, com informação recolhida pela DGS até 8 de Dezembro, o ‘abandono’ da vacina contra a covid-19 aumentou significativamente, não ocorrendo o mesmo para a vacina contra a gripe. De facto, os dados oficiais mostram que, para uma população com idade superior a 60 anos que se manteve estável, houve 1.828.767 pessoas que se vacinaram contra a gripe (mais 26.968 do que em 2023), mas apenas 1.312.295 que quiseram tomar a vacina contra a covid-19, ou seja, foram administradas menos 204.318 doses, o que representa uma queda de quase 14% face a 2023.

    Significa assim que neste Outono, em média, por cada 100 pessoas com mais de 60 anos, houve 39 que optaram por não se vacinarem contra nenhuma daquelas duas doenças, 44 que se vacinaram contra a gripe e a covid-19, e ainda 17 que se vacinaram apenas contra a gripe.

    Assim, em termos concretos, praticamente sete pessoas em cada 100 que se vacinaram no ano passado contra a covid-19 no grupo etário dos maiores de 60 anos disseram ‘não’ este ano, razão pela qual ‘sobraram’ mais de 200 mil doses. Recorde-se que o PÁGINA UM ainda aguarda, ao fim de quase dois anos de uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, uma decisão para acesso aos contratos das vacinas contra a covid-19.

    Sobre os efeitos adversos das administrações dos reforços do Outono de 2024 não existem dados públicos, mas o PÁGINA UM teve acesso à base de dados do Portal RAM, gerida pelo Infarmed, até início de Agosto deste ano. Apesar de a base de dados estar manipulada, com eliminação de variáveis, contrariando um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, um dos aspectos mais relevantes é a falta de acompanhamento das pessoas afectadas po reacções adversas. Num total de 45.337 registos individuais notificados no Portal RAM entre finais de Dezembro de 2020 e Agosto de 2024, contabilizam-se 19.224 pessoas sobre as quais o Infarmed desconhece a evolução dos sintomas ou estado de saúde. Ou seja, em mais de quatro em cada 10 registos (42,4%), o Infarmed não apurou sequer como evoluíram os sintomas e afecções detectadas.

    Países (a azul) com planos de compensação para os efeitos adversos de vacinas contra a covid-19. Fonte: Centre for Socio-Legal Studies.

    Numa análise detalhada à variável da evolução das reacções adversas – um processo moroso, porque o ficheiro do Infarmed lista o conjunto de afecções e sintomas numa mesma célula com indicações de progresso por vezes distintas –, observa-se que uma grande parte se refere a problemas que, em princípio, são ligeiros e corriqueiros, como dores no local de vacinação (quase quatro mil casos), dores de cabeça, febre ou dores (centenas de casos). Mas, de entre a lista, constam afecções gravíssimas potencialmente mortais ou com causadores de sequelas profundas. E isto altera de forma radical uma avaliação correcta da segurança das vacinas e impede, desse modo, acções judiciais com pedidos de indemnização.

    Numa averiguação preliminar, o PÁGINA UM detectou, no Portal RAM, 45 casos de miocardites ou pericardites após vacinação cuja evolução permanece desconhecida pelo Infarmed. Há ainda 22 casos de choques anafiláticos, uma reação alérgica grave e potencialmente fatal que pode levar à morte sem tratamento imediato, cuja evolução também se ignora. Foram registados 40 casos de tromboembolismo pulmonar, bloqueio de uma artéria dos pulmões por um coágulo, sem acompanhamento adequado, e 13 casos de acidentes vasculares cerebrais (AVC), suspeitos de estarem fortemente associados às vacinas, cuja evolução permanece incógnita.

    Entre as reações adversas encontram-se ainda 18 casos de síndrome de Guillain-Barré, uma doença autoimune rara que afecta os nervos periféricos e pode levar à paralisia, e 27 casos de paralisia de Bell, uma condição que afeta o nervo facial, sendo por vezes temporária, mas cuja evolução também se desconhece. Foram ainda reportados oito casos de enfarte agudo do miocárdio, 17 casos de trombose venosa profunda, 16 casos de trombocitopenia imune, cinco casos de mielite e 13 casos de vasculite, todos com desfecho desconhecido.

    Extracto da base de dados (em Excel) revelados pelo Infarmed (com mutilação de variáveis), após intervenção do Tribunal Administrativo, e analisados pelo PÁGINA UM para detectar registos com evolução desconhecida de sintomas.

    Na análise das notificações, o PÁGINA UM identificou ainda 63 casos de alterações menstruais e 22 casos de herpes zoster, decorrentes da reactivação do vírus da varicela, todos sem acompanhamento da sua evolução.

    Nenhuma destas pessoas, além das 141 mortes reportadas, beneficiaram de qualquer apoio do Estado nem tão-pouco se conhece se foi analisada, do ponto de vista clínico, a associação factual entre a administração da vacina e os efeitos adversos. E isto também por uma razão simples: o Infarmed, liderado por Rui Santos Ivo, recusa divulgar a variável da casualidade – perante a passividade do Governo e partidos da oposição.


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