Categoria: Imprensa

  • Cristina Ferreira está a descapitalizar a Amor Ponto, condenada a pagar 3,3 milhões de euros à SIC

    Cristina Ferreira está a descapitalizar a Amor Ponto, condenada a pagar 3,3 milhões de euros à SIC

    Uma análise contabilística do PÁGINA UM às contas da Amor Ponto, a empresa da apresentadora Cristina Ferreira condenada a pagar 3,3 milhões à SIC por quebra de contrato em 2020, revelam que foram desviados nos últimos dois anos, sob a forma de dividendos, cerca de 2,2 milhões de euros. A operação é controversa, e mesmo de legalidade duvidosa, porque essa saída de dinheiro da esfera da empresa só se realizou porque Cristina Ferreira não constituiu uma provisão para garantir o pagamento no caso de perder a acção contra a SIC. Apesar de ainda ter aparentemente activos, à pele, para pagar a indemnização, entre edifícios, investimentos e ‘dinheiro fresco’ (1,1 milhões de euros no final de 2023), a Amor Ponto aparenta caminhar para o ‘ponto final’. Por isso, se a SIC não se preocupar em parar o processo de descapitalização em curso daquela empresa, arrisca a ficar com uma mão-cheia de nada, porque não pode tocar no património pessoal de Cristina Ferreira.


    No conflito entre a SIC e Cristina Ferreira, a sua Amor Ponto é que vai pagar, e não terá escapatória, mas a apresentadora da TVI tem estado a descapitalizar a empresa, porque como não constituiu uma provisão, continua a dar lucros. Segundo a análise do PÁGINA UM, entre 2021 e 2023, Cristina Ferreira terá já desviado da empresa, que compartilha com o seu pai, um total de 2,2 milhões de euros.

    Apesar disso, a Amor Ponto, agora condenada pelo Tribunal de Sintra a pagar mais de 3,3 milhões de euros à SIC por quebra de contrato, possui ainda, de acordo com as demonstrações financeiras relativas ao ano passado, consultadas pelo PÁGINA UM, activos de cerca de 5,6 milhões de euros – mais do que suficientes para ‘saldar’ a indemnização à SIC –, mas o passivo, onde constam dívidas bancárias (282 mil euros) e diversas contas a pagar (superiores a dois milhões de euros) colocarão a empresa em situação aflitiva, uma vez que foi retirados 2,2 milhões de euros em dividendos.

    Cristina Ferreira / DR

    Ao contrário daquilo se seria de supor, a Amor Ponto nem sequer previu, do ponto de vista contabilístico, vir a perder a acção contra a SIC, pois não constituiu provisões em qualquer um dos três últimos exercícios analisados pelo PÁGINA UM. Essa opção não terá sido um acaso ou uma ingenuidade – e o contabilista oficial poderá também vir a ser responsabilizado –, pois se tivesse sido feita, a Amor Ponto dificilmente apresentaria os lucros que contabilizou em 2021, 2022 e 2023, respectivamente de 1,9 milhões de 991 mil e de 980 mil euros.

    Significaria assim que se fossem seguidas as regras da prudência contabilística, com uma provisão, a Amor Ponto dificilmente apresentaria lucros que lhe permitisse distribuir dividendos aos sócios, que são a própria Cristina Ferreira (que detém directamente apenas 2,9%), o seu pai, António Jorge Ferreira (1,1%) e a empresa Docasal (96%, detida maioritariamente por Cristina Ferreira, com o seu pai com uma pequena quota). Apesar de não terem sido preenchidos elementos da alteração do capital social e das demonstrações de fluxo de caixa, uma análise contabilística feita pelo PÁGINA UM concluiu que a empresa de Cristina Ferreira ‘sacou’ 2,2 milhões de euros da Amor Ponto ao longo do ano passado sob a forma de dividendos. Isto deduz-se a partir da diferença entre o somatório do capital próprio em 2020 com os lucros do triénio 2021-2023 (5,3 milhões de euros) e o efectivo capital próprio no final de 2023 (3,1 milhões de euros).

    Apesar desta elevada ‘descapitalização’, de acordo com as contas de 2023, já publicadas, a Amor Ponto ainda tem ‘dinheiro fresco’ no banco (mais de 1,1 milhões de euros) e também activos facilmente convertíveis, nomeadamente quase 2,4 milhões de euros em activos fixos tangíveis e cerca de 1,2 milhões de euros em activos financeiros. De entre os activos tangíveis, quase tudo (2,28 milhões de euros) referem-se a edifícios e outras construções. A SIC pode vir a solicitar, em caso de recurso, que seja vedada à Amor Próprio outra qualquer distribuição de dividendos, sob pena de Cristina Ferreira poder ser condenada por falência fraudulenta.

    Tribunal considerou que contrato de Cristina Ferreira com a SIC era um contrato mercantil com a Amor Ponto, que nunca constitui provisões, permitindo a sua descapitalização, através de distribuição de dividendos.

    Se Cristina Ferreira, como detentora maioritária da Amor Ponto, decidir pagar de imediato a indemnização de 3,5 milhões de euros à SIC, esta sua empresa – que tem seis trabalhadores – terá bastantes dificuldades em cumprir depois as suas obrigações, mesmo dando um lucro anual próximo de um milhão de euros com vendas a rondarem os 2,5 milhões de euros em cada um dos últimos dois anos. Com efeito, apesar de ter um nível de endividamento baixo – e até inexplicável face ao dinheiro à ordem que possuía no final do ano passado –, a Amor Ponto tem compromissos de curto prazo (a pagar em menos de um ano) de mais de 2,2 milhões de euros.

    Quanto à opção de recorrer desta decisão, os efeitos podem ser piores, uma vez aquilo que está em causa, conforme o Tribunal de Sintra determinou, é um mercantil entre a SIC e a Amor Ponto, que não foi cumprido. Se Cristina Ferreira insistir em recorrer e perder daqui a três ou quatro anos, a dívida pode subir facilmente para mais de cinco milhões de euros – e aí dificilmente a SIC aceitará que a Amor Ponto não constitua uma provisão, única garantia de haver capital suficiente para pagar se houver nova derrota.

    Recorde-se que este conflito surgiu com a saída repentina de Cristina Ferreira da SIC em Julho de 2020, quando se anunciou o seu regresso à TVI como directora e pequena accionista da Media Capital.

    Para garantir a indemnização, SIC tem de garantir que a Amor Ponto não fica descapitalizada.

    De acordo com uma nota de imprensa hoje divulgada, depois de quase quatro anos de conflito, o Tribunal de Sintra condenou a Amor Ponto a “proceder ao pagamento à autora SIC – Sociedade Independente de Comunicação S.A. da quantia de 3.315.998,67 euros, acrescida de juros, à taxa comercial, desde a citação até efetivo e integral pagamento”. No total, o valor será de 3.536.666,67 euros, mas o tribunal reconheceu um crédito de 220.668 da Amor Ponto à SIC, devido a “valores titulados por facturas emitidas e vencidas, respeitante a pagamentos de comissões de publicidade e de passatempos”.

    O PÁGINA UM tentou contactar a apresentadora Cristina Ferreira, mas não foi ainda possível obter qualquer comentário, que, a ocorrer, será inserido. Em todo o caso, para outros órgãos de comunicação social, Cristina Ferreira ainda não teve qualquer reacções sobre a condenação no Tribunal de Sintra.


    N.D. O PÁGINA UM disponibiliza as demonstrações financeiras da Amor Ponto de 2021, 2022 e 2023, usadas para a elaboração da análise contabilística que esteve na base desta notícia.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Operação Babel: Contratos promíscuos de Domingos de Andrade foram revelados pelo PÁGINA UM em 2021

    Operação Babel: Contratos promíscuos de Domingos de Andrade foram revelados pelo PÁGINA UM em 2021

    Escutas da ‘Operação Babel’ confirmam o papel de Domingos Andrade – actual diretor-geral editorial do Jornal de Notícias e da rádio TSF, e sócio de uma das empresa que está a adquirir alguns títulos da Global Media – na angariação de contratos com a autarquia de Vila Nova de Gaia alegadamente a troco de notícias. Uma parte das escutas é divulgada hoje pelo Correio da Manhã, mas desde 2021 que o PÁGINA UM tem investigado e revelado os contratos promíscuos envolvendo Domingos de Andrade e a Global Media. Mas não só. Outros grupos de comunicação social portugueses têm sido ‘apanhados’ pelas investigações do PÁGINA UM com ‘parcerias comerciais’ que envolvem a produção de notícias à medida e mesmo a realização de ‘entrevistas’. Na sequência das investigações do PÁGINA UM, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social chegou a abrir contra-ordenações a sete empresas de media por contratos promíscuos e enviou a identificação de 14 jornalistas ‘comerciais’ para a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ). Um ano depois, aquilo que daí saiu foi, para já, nada.


    Domingos Andrade, actual diretor-geral editorial do Jornal de Notícias e da rádio TSF – e também um dos sócios das empresas que se apresta para comprar títulos à Global Media – foi ‘apanhado’ em escutas comprometedoras no decurso das investigações do Ministério Público da chamada Operação Babel‘, envolvendo suspeitas de corrupção na autarquia de Vila Nova de Gaia e na sua empresa municipal Gaiurb. Nas escutas divulgadas hoje pelo Correio da Manhã destacam-se fortes indícios de que Domingos Andrade, que manteve sempre carteira profissional mesmo quando era gestor de empresas de media, ‘vendeu’ notícias a troco de negócios.

    Esta não é propriamente uma novidade, mas apenas uma confirmação de um modus operandi que afecta enormemente a credibilidade da imprensa: em 2021, o PÁGINA UM começou a publicar investigações sobre contratos promíscuos entre grupos de media e responsáveis editoriais, entre os quais despontava a Global Media e também, entre outras, a autarquia de Gaia, presidida pelo socialista Eduardo Vítor Rodrigues.

    Domingos Andrade assinou contratos comerciais apesar de, na altura, ter carteira profissional de jornalista e responsabilidades editoriais em órgãos de comunicação social do grupo Global Media. Na sequência das investigações do PÁGINA UM, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista foi forçada a aplicar uma multa de 1.000 euros ao jornalista que tem ainda activa a sua carteira profissional.
    (Foto: Captura de imagem de vídeo da audição no Parlamento)

    Foi em 26 de Dezembro de 2021 que o PÁGINA UM começou a publicar uma investigação sobre os interesses de Gaia na contratação em particular da Global Media – havendo também contratos com o Público e a Cofina, mas em valores muito inferiores: “Gaia paga mais de meio milhão de euros em contratos com grupos de media através de empresa com dívida astronómica”.

    Na altura, o PÁGINA UM revelou que a Gaiurb, empresa de gestão urbanística e habitacional de Gaia, tinha efectuado três contratos com empresas da Global Media, entre as quais a TSF e o Jornal de Notícias, num total de 465.000 euros, sendo que todos os contratos foram realizados por ajuste directo, sem visto prévio do Tribunal de Contas, e contra o código de contratos públicos.

    Recorde-se que Domingos de Andrade assumiu durantes vários anos, como jornalista, funções de responsável editorial de diversos órgão de comunicação social da Global Media (DN, JN e TSF), ao mesmo tempo que era administrador da holding – sendo o braço direito executivo de Marco Galinha até ao ano passado –, e era também, de acordo com o Portal da Transparência dos Media, gerente da TSF – Rádio Jornal Lisboa, da TSF – Cooperativa Rádio Jornal do Algarve, da Difusão de Ideias – Sociedade de Radiodifusão, da Pense Positivo – Radiodifusão e ainda vogal do conselho de administração executivo da Rádio Notícias – Produções e Publicidade. Acabou afastado durante o curto ‘reinado’ do World Opportunity Fund, durante a administração de José Paulo Fafe, mas regressou com grande protagonismo, não apenas ‘recuperando’ os cargos editoriais como assumindo um papel de charneira na passagem de alguns títulos da Global Media para a esfera de duas empresas-irmãs: a Notícias Ilimitadas e a Verbos Imaculados. Nesta última empresa – que quer passar a controlar o Jornal de Notícias e a TSF, apesar de ter um capital social de apenas 777 euros, Domingos Portela entra mesmo como sócio, com uma quota de 20%. É o único accionista em nome individual, visto que os outros são empresas: Parsoc (30%), OTI Investments (25%), Mesosystem (15%) e Ilíria (10%).

    Como o PÁGINA UM noticiou no final de 2021, um primeiro contrato com a Gaiurb foi assinado em Dezembro de 2020 para o evento “Praça de Natal Jogos Santa Casa em Gaia”, que incluía a sua divulgação “junto da imprensa e outros meios de comunicação social”, num valor de 195.000 euros. Neste contrato, o ajuste directo foi justificado com os seguintes argumentos: “não existe alternativa ou substituto razoável”; e “inexistência de concorrência”.

    contrato foi renovado, para o mesmo fim, a 3 de Dezembro de 2021, com o mesmo valor, sem justificação para ser feito por ajuste directo. No contrato de 2020 ainda se apontavam os motivos para o ajuste directo. No segundo contrato nada se refere.

    Estes dois contratos comerciais foram assinados por Domingos de Andrade, quando era simultaneamente administrador e director de conteúdos da Global Media e director da TSF, o que é incompatível segundo o Estatuto do Jornalista. Na sequências das investigações do PÁGINA UM, Domingos de Andrade acabou por ser alvo de um processo de contra-ordenação por parte da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), que lhe aplicou uma singela multa de 1.000 euros e nada mais. Apesar da evidência da ilegalidade, Domingos de Andrade impugnou judicialmente, estando o caso para decisão desde Março do ano passado. E a sua carteira profissional do jornalista/gestor, com o número CP 1723 foi entretanto revalidada, encontrando-se activa.

    Já sem a assinatura de Domingos de Andrade, a Global Media conseguiu manter contratos para a organização e promoção das festas natalícias de Gaia com a Gaiurb, sempre sem o incómodo de qualquer concorrência, porque a Gaiurb justifica os ajustes directos da forma que melhor lhe convém, perante a passividade do Tribunal de Contas; ora uns anos por estar em causa espectáculos, ora por inexistência de concorrência por “motivos técnicos”, ora por alegadamente ser necessário proteger direitos de propriedade intelectual. Quem não está protegido são os contribuintes: só estes cinco contratos natalícios que começaram a ser garantidos por Domingos de Andrade já custaram à autarquia cerca de 1,05 milhões de euros, incluindo IVA.

    Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, escreveu mais de 60 artigos como colunista regular do Jornal de Notícias. (Foto: D.R.)

    De resto, além das suspeitas de favorecimento noticioso da autarquia de Vila Nova de Gaia nas publicações lideradas por Domingos de Andrade, o próprio presidente da edilidade socialista, Eduardo Vítor Rodrigues, foi um colunista regular do Jornal de Notícias, tendo começado a publicar artigos de opinião no jornal nortenho desde Junho de 2020. No total, escreveu mais de 60 artigos, que deixaram de estar disponíveis no site do jornal. O ‘apagão’ das sapientes opiniões do socialista que preside Gaia sucedeu imediatamente depois de um artigo do PÁGINA UM ter revelado em Maio do ano passado esta relação: ou seja, um presidente de uma autarquia cliente da Global Notícias tinha um espaço de opinião no Jornal de Notícias. As relações entre a Global Media e a autarquia de Gaia contrariam todas as regras da gestão adequada de dinheiros públicos, chegando ao ponto de se pagar integralmente as verbas dos ajustes directos antes mesmo da execução dos serviços.

    O PÁGINA UM tinha também detectado um outro contrato do grupo Global Media com a Gaiurb, que foi concretizado em 29 de Março de 2021 com a TSF – através da sua empresa Rádio Notícias – por ajuste directo para a produção de 26 episódios semanais, emitidos aos microfones entre Abril e Outubro. Este contrato comercial – que possui, em nome da Global Media, a assinatura do jornalista Afonso Camões, o que constitui uma função incompatível nesta profissão – estipulava, na prática, uma subordinação editorial da TSF perante a Gaiurb.

    O contrato foi apresentado como sendo uma “parceria TSF/ Gaiurb”, tendo o programa sido intitulado “Desafios do Urbanismo”, e envolvido um pagamento de 75.000 euros. O programa foi conduzido por um jornalista Miguel Midões, mas sem liberdade editorial. De resto, este foi um dos 14 jornalistas identificados pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), em Julho de 2023, na sequência de uma investigação do PÁGINA UM que detectou 56 contratos ‘suspeitos’ assinados pelos principais media portugueses desde 2020. Os podcasts também desapareceram entretanto do site da TSF – mais uma vez após as revelações do PÁGINA UM -, mas ainda podem ser ouvidos aqui (ou confirmado a sua existência aqui, se entretanto também forem apagados). Uma parte dos episódios tinham a participação de políticos ou de entidades e personalidades de Gaia, o que revelava a existência não de jornalismo mas de promoção.

    man in red and black robe

    Além da Global Media, outros grupos de comunicação social têm assinado contratos com entidades públicas que incluem cláusulas incompatíveis com a actividade jornalística. E estes são apenas a ‘ponta do iceberg’, já que os contratos comerciais feitos com entidades privadas não são públicos, pelo que a promiscuidade entre órgãos de comunicação social e o sector empresarial e financeiro será também de relevo e é ignorada por reguladores e pelo público.

    Entre os jornalistas ‘comerciais’ que foram identificados pelo regulador dos media, constam, além de Miguel Midões, por causa dos programas da TSF relativos ao contrato da Gaiurnb, também o jornalista da Visão Luís Ribeiro (CP 3188), coordenador da secção de Ambiente da revista Visão e habitual comentador na SIC Notícias, a quem a ERC apontou a autoria de cinco textos jornalísticos (incluindo entrevistas) assinados para cumprimento de um contrato com a Águas de Portugal para apoio aos Prémios Verdes, mas que estabelecia a obrigatoriedade de cobertura noticiosa e a publicação de artigos de opinião de dirigentes daquela empresa pública tutelada pelo Ministério do Ambiente. Ribeiro já se tinha destacado por aceitar fazer a cobertura de uma Conferência do Clima (COP26) em finais de 2021 para a revista Visão sob o patrocínio explícito da petrolífera Galp. O Estatuto do Jornalista permite, sem penalização, o uso da cláusula de consciência, ou seja, a recusa de aceitar notícias patrocinadas que, neste caso, configuram greenwashing.

    Recorde-se que, nos processos abertos pela ERC, foram poupados directores e responsáveis editoriais de títulos que executaram contratos comerciais, incluindo: Mafalda Anjos (ex-directora da Visão), Rosália Amorim (ex-directora do Diário de Notícias), David Pontes (antigo director-adjunto e actual director do Público), Manuel de Carvalho (ex-director do Público), Inês Cardoso (directora do Jornal de Notícias) e Joana Petiz (ex- directora do Dinheiro Vivo).

    Luís Ribeiro, jornalista da revista Visão, foi um dos 14 jornalistas ‘comerciais’ identificados pela ERC. O regulador abriu, há um ano, sete processos a empresas de media por contratos comerciais assinados com entidades públicas que eram incompatíveis com a actividade jornalística. Ainda não há qualquer decisão do regula, que, na análise dos casos promíscuos divulgados pelas investigações do PÁGINA UM, poupou directores de órgãos de comunicação social, os quais também executaram projectos comerciais e de marketing, o que é incompatível com o Estatuto do Jornalista.

    As excepções foram Celso Filipe, director-adjunto do Jornal de Negócios (Cofina), e também o director da Exame (Trust in News), Tiago Freire. A ERC ainda identificou – para efeitos de averiguação, para eventuais processos disciplinares, por parte da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) – mais 11 jornalistas: Rute Coelho (CP 1893), Carla Aguiar (CP 739), Adriana Castro (CP 7692), Alexandra Costa (CP 2208) – por textos publicados em periódicos da Global Media –, Filipe S. Fernandes (CP 1175) e António Larguesa (CP 5493) – por textos publicados no Jornal de Negócios –, Mário Barros (CP 7963) – por um texto publicado no Público – e ainda José Miguel Dentinho (CP 882), Fátima Ferrão (CP 6197) e Francisco de Almeida Fernandes (CP 7706) – por textos publicados no Expresso.

    Isto apesar de diversos directores de media terem participado activamente na execução de contratos comerciais, nomeadamente como participantes regulares como ‘mestres-de-cerimónia’ e moderadores de eventos pagos aos respectivos grupos. E, em última análise, foram também responsáveis pela cobertura noticiosa dos eventos pagos, que em muitos casos estão previstos nos cadernos de encargos, o que constitui uma ingerência externa considerada ilegal pela Lei da Imprensa. Apesar de terem sido abertos processos de contra-ordenação pela ERC a sete empresas de media (Global Media, Trust in News, Impresa, SIC, TVI, Cofina e Público), em há um ano, ainda não foram concluídos, não sabendo assim se serão multados, ou, em alternativa, perdoadas as infracções pelo regulador, atendível a situação financeira débil da generalidade da imprensa.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Novo Banco, Impresa & Trust in News: o triângulo dos negócios de media que ‘assaltaram’ um Estado conivente

    Novo Banco, Impresa & Trust in News: o triângulo dos negócios de media que ‘assaltaram’ um Estado conivente


    Os amigos são para as ocasiões. Mas, na alta roda da imprensa nacional – ou melhor, em certos grupos de media –, haja, para além de amigos, um Estado amigo, ou mais prosaicamente, um Governo amigo.

    A história começa em 2017, quando um dos mais relevantes grupo de media em Portugal, a Impresa, fundado pelo antigo primeiro-ministro Pinto Balsemão, estava em grandes sarilhos financeiros. Longe estavam os momentos áureos da colocação em bolsa desta empresa de media – detentora do canal televisivo SIC e do semanário Expresso, e de mais de uma dezena de outras publicações.

    Em Junho de 2000, como líder incontestada no sector da comunicação social, Pinto Balsemão conseguira, com sucesso, uma oferta pública de venda (OPV) por um preço por acção a rondar os 5,6 euros (o valor de abertura em bolsa, ainda em escudos), encaixando uma verdadeira fortuna. Após essa operação financeira, e mesmo com uma posição minoritária de cerca de 30%, a família Balsemão manteve o domínio do grupo de media, e também os principais cargos (e salários) do Conselho de Administração. Mas, pouco tempo depois, o ‘sonho’ dos investidores foi colapsando. A Impresa nunca concedeu qualquer dividendo, e foi-se endividando. Sinal disso, em 2017, a cotação chegou abaixo dos 20 cêntimos, ou seja, cerca de 2% da OPV.

    Ainda chegaram a existir negociações com a Globo, mas como Balsemão não desejava ceder o controlo da Impresa, o grupo brasileiro recuou. As dificuldades de liquidez eram, porém, sufocantes. Para piorar, o banco que sempre apoiara a Impresa, o BPI, fora comprado no início de 2017 pelo catalão Caixa Bank, que terá fechado a ‘torneira do financiamento”, tanto mais que se estava então em plena crise financeira do sector bancário. O passo seguinte foi optar por uma emissão de obrigações para encaixar urgentemente 35 milhões de euros, junto de investidores institucionais. A oferta de subscrição decorreu entre 3 e 14 de Julho desse ano, mas houve um desinteresse absoluto, e a Impresa teve de desistir desta opção.

    O ano de 2017 viria a ser um annus horribilis para a família Balsemão, depois lucros de 4,0 milhões de euros em 2015 e de quase 2,7 milhões no ano seguinte: teve de reconhecer 23,2 milhões de euros em imparidades do goodwill (um activo associado ao valor dos órgãos de comunicação social). Resultado imediato: os prejuízos desse ano ascenderam aos 21,6 milhões de euros. Mesmo com a dívida em fase descendente, certo é que a Impresa quase estava então a trabalhar para os bancos: cerca de um terço das receitas serviam então para pagar juros.

    E é aqui que entra a Trust in News. Na verdade, o reconhecimento das imparidades nas contas de 2017 no valor de 23,2 milhões de euros resultou, de forma paradoxal para um leigo, de uma receita, ou seja, da venda de um portfolio de revistas – onde a Visão era o título mais sonante – que se viria a concretizar nos primeiros dias do ano de 2018. Luís Delgado – um antigo jornalista, ex-administrador da Lusa e comentador de política e que estivera no negócio da restauração (Time Out Market) – criara pouco tempo antes uma empresa unipessoal com um capital social de apenas 10 mil euros. Mas, mesmo sem mais nenhum investidor conhecido, prometia pagar à Impresa um total de 10,2 milhões de euros. Como antes da venda, nos activos da Impresa, as revistas estavam exageradamente valorizadas (33,4 milhões de euros), a venda resultou, no imediato, numa menos-valia de 23,2 milhões de euros, daí o reconhecimento das imparidades, que veio a afectar o resultado líquido, dando um prejuízo histórico nesse ano.

    Antes da venda em 2018 do portfolio das revistas à Trust in News, a Impresa, fundada por Francisco Pinto Balsemão, teve de reconhecer imparidades (prejuízos de 22 milhões de euros). A venda por 10,2 milhões de euros, nunca se concretizou por aqueles montantes e os investidores nunca foram previamente informados nem saber quanto a Impresa afinal recebeu de Luís Delgado

    Concretizado este negócio em 2 de Janeiro de 2018, não se sabe, no entanto, quanto dos 10,2 milhões de euros acabou por sair dos cofres da Trust in News para, efectivamente, saldar esta compra, porque nos sucessivos relatórios e contas da Impresa, a partir de 2018, esses montantes não são referidos. Fica-se apenas a saber de reiteradas renegociações dos planos de pagamento. Isto sem que a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que supervisiona as empresas cotadas em bolsa, se tenha mostrado interessada em esclarecer uma informação relevante para os investidores.

    Em todo o caso, pelos elementos do Portal da Transparência dos Media, deduz-se que alguns milhões de euros terão entrado na Impresa em 2018 via Novo Banco. Isto porque, nos registos respeitantes a 2018, a Trust in News admite que, além de manter então ainda uma dívida de 6,2 milhões de euros à Impresa – ou seja, terá pagado no primeiro ano, quatro milhões de euros – era devedora de 2,7 milhões de euros ao Novo Banco. Ou seja, tudo indica que a operação de compra de Luís Delgado tenha sido financiada pela instituição bancária que estava em processo de intervenção estatal.

    Em 2019, o Novo Banco ainda emprestaria mais dinheiro à Trust in News. No final desse ano, a empresa de Luís Delgado já devia 3,7 milhões de euros ao Novo Banco, ou seja, a dívida para esta instituição financeira aumentara cerca de um milhão de euros. No entanto, globalmente, os financiamentos bancários à Trust in News já ascendiam aos 4,5 milhões de euros.

    Além desses alguns milhões de euros (pelo menos quatro milhões) de encaixe líquido, vindo do Novo Banco, a Impresa também conseguiu aliviar a sua folha salarial, pois só em gastos com pessoal as revistas vendidas a Luís Delgado representavam (e ainda representam) cerca de oito milhões de euros por ano. Acresce, contudo, que a Trust in News ‘herdou’ um portfolio de revistas financeiramente ‘tóxicas’. E desse modo, a empresa de Luís Delgado aumentou, ao longo dos anos, o passivo de forma descontrolada, incluindo dívidas ao Fisco, à Segurança e ao Novo Banco. Mesmo a Impresa acabou já por assumir, nas suas contas de 2023, que a Trust in News não lhe vai pagar 2,5 milhões de euros ainda em dívida.

    Luís Delgado (à esquerda) comprou em 2 de Janeiro de 2018 à Impresa um conjunto de títulos, entre as quais a revista Visão, num negócio oficialmente envolvendo o pagamento de 10,2 milhões de euros a ser concretizado em dois anos e meio.

    E tudo isto se transformou num péssimo negócio para o Estado que, no decurso do Processo Especial de Revitalização (PER) da Trust in News que deu entrada no Tribunal de Sintra em Abril, só tem agora duas alternativas, ambas perdedoras: ou deixa cair a empresa de Luís Delgado para a insolvência, não havendo activos para recuperar as dívidas à Segurança Social e à Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA); ou então aprova o plano de recuperação, assumindo um perdão integral ou parcial. Nos dois casos, o contribuinte sai penalizado.

    No meio deste estranho negócio que está agora, ao fim de apenas seis anos, na antecâmara da insolvência, surpreende, ou não, o silêncio mudo em torno deste negócio entre a Trust in News e a Impresa, envolvendo o Novo Banco. Afinal, não é todos os dias – uma força de expressão para dizer que é absurdo suceder – que uma instituição bancária, ainda mais o Novo Banco que estava sob alçada do Fundo de Resolução, autorizar a concessão de um empréstimo de vários milhões de euros a uma empresa com um único sócio, um capital social de 10 mil euros e para um negócio que não tem sido assim tão rentável nos tempos recentes

    Mais estranho ainda é o silêncio do Governo, tanto do actual como do anterior, que assiste sem reacção visível – a não ser promessas de apoio aos media com o dinheiro dos contribuintes – ao facto de uma empresa com capital social de 10 mil ter aumentado as suas dívidas ao Estado, em apenas cinco anos, acima dos 11,4 milhões de euros. Um autêntico ‘milagre’ inalcançável para a generalidade das empresas.

    Mais estranho é observar que a família Balsemão não parece estar chateada com Luís Delgado por este não lhe ter pagado integralmente, nem pouco mais ou menos, os 10,2 milhões de euros oficialmente acordados em 2018. Afinal, Luís Delgado mantém presença frequente no canal da SIC, pertencente ao Grupo Impresa, como comentador político.

    (Foto: D.R./ Ministério das Finanças)

    Mas a utilidade do Novo Banco para a Impresa não se circunscreveu ao negócio das revistas com a Trust in News. Também em 2018, no mês de Junho, o Novo Banco comprou a sede do Expresso (e agora da SIC) à Impresa, por 24,2 milhões de euros, apesar de a banca estar, naquela altura, a livrar-se de activos imobiliários. Este negócio envolveu a locação financeira pela Impresa por um período de 10 anos.

    Ninguém pode duvidar que a entrada nos negócios da Impresa de um banco a ser capitalizado com empréstimos do Estado só podia ser possível com o aval do Ministério das Finanças e a anuência do Fundo de Resolução. Em resumo, a intervenção do Novo Banco na compra da sede – e na ‘injecção’ de liquidez imediata – mostra ser uma intervenção política que visou dar a mão a Balsemão num momento de aflição

    Ou seja, em um ano, o Novo Banco não apenas pagou 24,2 milhões de euros à Impresa, com um retorno pela locação (que nem, sequer se encontra plasmado nas contas do grupo de media), como financiou parte da compra da ‘carteira’ de revistas por parte de Luís Delgado, que só teve de meter 10 mil euros para ser dono de 17 revistas.

    Acresce que, se a Trust in News está à beira da falência (se o Estado não lhe der a mão), a Impresa não está melhor, apresentando um passivo de 222,6 milhões de euros em 2023, dos quais mais de 128 milhões em empréstimos de curto e longo prazos. E 70% dos seus activos são goodwill referentes aos títulos da imprensa escrita e televisão, que não valerão, tal como se evidenciou na operação das revistas a Luís Delgado, aquilo que surge no balanço.

    Quanto ao terceiro protagonista desta pouco dignificante história de negócios dos media em Portugal, o Novo Banco, prossegue como se nunca tivesse tido pés de barro, graças aos muitos fios de aço feitos de dinheiros públicos, que o foram segurando ao longo dos anos. Até porque as dezenas de milhões que acabaram por beneficiar a Impresa e a Trust in News, em negócios que arriscam a acabar mal, são uma gota de água – uma gota de água num ‘oceano’ de ajudas do Estado.

    Recorde-se que este banco, que ficou supostamente com os activos ‘bons’ do BES, foi vendido em 2017 ao fundo norte-americano Lone Star que ficou com 75% do seu capital social, ficando os restantes 25% no Fundo de Resolução bancário – que está na esfera do Estado. O acordo de venda previa injecções de capital até 3.890 milhões de euros para suprir necessidades de capital devido ao registo de perdas, nomeadamente com créditos ‘maus’ herdados do BES. Assim, mesmo depois da venda, o banco continuou a receber injecções de capital estatais.

    Ao todo, só entre 2014 e 2020, o Novo Banco engoliu mais de 11.200 milhões de euros, sendo que, deste total, mais de metade proveio do Estado. Os contribuintes emprestaram, assim, sem garantias absolutas de retorno, 6.030 milhões de euros ao Novo Banco, dos quais 3.900 milhões na sua constituição e 2.130 milhões de euros entre 2017 e 2020, ao abrigo do acordo de venda. Desde 2020 foram feitas novas injecções de capital ao abrigo deste acordo, o que elevou o valor global para cerca de 12.500 milhões de euros. Dos 3.890 milhões de euros do mecanismo para cobrir perdas herdadas do BES, o Novo Banco consumiu 3.400 milhões de euros. Acresce que o Fundo de Resolução bancário ‘forneceu’ 1.000 milhões ao Novo Banco em 2014 e mais 848 milhões de euros entre 2017 e 2020, num total de 1.848 milhões de euros.

    Mas atenção: o Novo Banco poderá ainda ir buscar mais 180 milhões de euros ao Estado, depois de ter vencido disputas em tribunal arbitral com o Fundo de Resolução, como noticiou o Jornal Económico. Hoje, o Fundo de Resolução anunciou que vai pagar 128 milhões de euros ao Estado para comprar mais 4,14% do capital do Novo Banco, passando a deter 13,54% do capital. Na prática, o Fundo de Resolução compra os direitos de conversão de créditos fiscais, ao abrigo do regime dos impostos diferidos. Este regime tem permitido ao Estado deter uma posição no banco convertendo créditos fiscais em capital. Ou seja, sem esta compra do Fundo de Resolução, os contribuintes portugueses iriam reforçar a sua posição no Novo Banco. Assim, ‘encaixam’ 128 milhões de euros, pagos pelo Fundo de Resolução bancário que está na esfera estatal.

    two Euro banknotes

    O Novo Banco continuará a ser detido em 75% pelo Lone Star, o Fundo de Resolução sobe a sua posição, enquanto o Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro, dilui a sua fatia para 11,46%. Certo é que, no final de 2022, o Fundo de Resolução ainda devia mais de 6.000 milhões de euros ao Estado.

    E é neste cenário de muitos milhões, para aqui e para ali, que se vai esfumando o dinheiro dos contribuintes, e se fazendo negócios dos media, sempre com prejuízos. No final, o Governo Montenegro ainda anuncia mais ajudas para continuar a beneficiar o infractor.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

    APOIOS PONTUAIS

    IBAN: PT50 0018 0003 5564 8737 0201 1

    MBWAY: 961696930 ou 935600604

    FUNDO JURÍDICO: https://www.mightycause.com/story/90n0ff

    BTC (BITCOIN): bc1q63l9vjurzsdng28fz6cpk85fp6mqtd65pumwua

    Em caso de dúvida ou para informações, escreva para subscritores@paginaum.pt.

  • Imprensa: Dona da Visão também deixou de pagar as contribuições à Segurança Social dos seus trabalhadores

    Imprensa: Dona da Visão também deixou de pagar as contribuições à Segurança Social dos seus trabalhadores

    É um case study, ou um caso de polícia. Em seis anos, uma empresa unipessoal no sector dos media, a Trust in News, com um capital social de 10 mil euros conseguiu o ‘prodígio’ de acumular dívidas já próximas dos 30 milhões de euros e sem ter problemas em falhar sucessivamente as suas obrigações junto do Estado. O PÁGINA UM soube agora, na consulta ao Processo Especial de Revitalização (PER), que afinal o empresário Luís Delgado não deu apenas um calote ao Fisco, mas deixou também de pagar as contribuições à Segurança Social dos seus trabalhadores. A acumulação de dívidas ao Estado, que em seis anos subiram para mais de 11 milhões de euros, só foram possíveis com o beneplácito do Governo anterior. O ministro das Finanças, Miranda Sarmento, mantém-se, por agora, silencioso sobre se vai haver, no âmbito do PER, onde o Estado é o principal credor da TIN, um perdão de dívida para ‘salvar’ mais um grupo de media do colapso financeiro.


    O anterior Governo permitiu que a Trust in News (TIN) – a empresa unipessoal de Luís Delgado que detém, entre outros títulos de comunicação social, as revistas Visão e Exame – deixasse de pagar, durante anos, as contribuições para a Segurança Social dos seus trabalhadores. E agora, no âmbito do Processo Especial de Revitalização (PER), apresentado pela TIN a 23 de Abril no Juízo de Comércio de Sintra, os Ministérios das Finanças e da Segurança Social vão decidir uma solução para uma dívida ao Estado que já deverá ultrapassar os 14 milhões de euros. Em 2022, as contas da TIN revelavam que o Estado detinha já 42% do passivo total, que então rondavam os 27 milhões de euros.

    A assumpção do não pagamento das contribuições para a Segurança Social, que tem enquadramento penal sobre os gerentes da TIN, surge na identificação dos credores com direitos sobre a empresa media de Luís Delgado. Além da Autoridade Tributária e Aduaneira, da Impresa e do Novo Banco – que o PÁGINA UM já identificara no ano passado –, surgem agora reveladas nos documentos do PER, consultados pelo PÁGINA UM, os créditos reivindicados pelos CTT e também pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

    a woman covering her eyes with a white sheet

    Não são, por agora, mencionados nem conhecimentos os montantes totais dos créditos em causa para cada uma destas entidades, devendo estes ser conhecidos no final deste mês, podendo ainda haver outras que reclamem direitos. Até finais de Junho, podendo ser prorrogado por mais um mês, será elaborado um plano de recuperação pelo administrador judicial, já nomeado, que será votado: se houver acordo, com redução renegociação da dívida, a TIN mantém-se; de contrário, a insolvência segue o seu curso.

    Em qualquer caso, Luís Delgado – que só precisou de investir 10 mil euros para uma empresa a caminho de um passivo de 30 milhões de euros em seis anos – e os gerentes da TIN já estão impedidos de “praticar actos de especial relevo“, e dificilmente haverá uma futura solução de viabilização que o reponha em funções. O tribunal de Sintra já nomeou Bruno Costa Pereira, que esteve à frente do processo de insolvência da Groundforce, como administrador judicial provisório.

    Curiosamente, numa conferência no mês passado, Bruno Costa Pereira criticou o papel do Estado em processos de recuperação de empresas, “afirmando que “não ajuda nada, apenas complica”, responsabilizando até o gestor de insolvência por não conseguir equilibrar uma empresa “com graves problemas” e ao ser o primeiro a ir buscar às reservas da empresa. “O Estado responsabiliza o gestor de insolvência se este não conseguir ‘o milagre’ de recuperar uma empresa que já está toda destruída. Se isto correr mal, eu posso ser revertido fiscalmente, sou responsabilizado. E só porque tentei sou penalizado? O Estado vai correr atrás de mim? Isto leva, e bem, a que a classe [dos administradores judiciais] tenha uma predisposição para assumir desde logo que  ‘isto não vai recuperar’”, disse Bruno Costa Pereira, citado pelo Jornal Económico.

    Em 2018, Luís Delgado, à esquerda, prometeu comprar as revistas da Impresa por 10,2 milhões de euros. Não pagou ainda tudo, e aumentou para níveis astronómico a dívida ao Fisco e à Segurança Social. Em seis anos, terá colocado o passivo da Trust in News próximo dos 30 milhões de euros. (Foto: D.R.)

    O caso da TIN será, porém, especial por se tratar de uma empresa de media e, sobretudo, por a sua evolução financeira, e especialmente as dívidas ao Estado, terem tido evidente cobertura política. Em 2018, logo no primeiro ano com as ex-revistas da Impresa, a TIN somava dívidas ao Estado de quase 943 mil euros. No ano seguinte subiu para cerca de 1,6 milhões, para depois mais que triplicar em 2020 situando-se em 5,1 milhões de euros.

    E continuou. Em 2021 estava já em 8,2 milhões de euros e em 2022 – último ano com contas aprovadas – encontrava-se já nos 11,4 milhões de euros. Acresce que a TIN nunca esteve na ‘lista negra’ tanto do Fisco como da Segurança Social, o que significa que se estabeleceu acordos de pagamento, mesmo autorizando o aumento das dívidas.

    Ao longo do ano passado, o PÁGINA UM tentou, por diversas vezes, obter esclarecimentos junto do então ministro das Finanças, Fernando Medina, para o ‘tratamento’ especial a uma empresa com um capital de 10 mil euros e colossais dívidas. Nunca obteve resposta.

    Registo do Processo Especial de Revitalização (PER) da Trust in News que identifica os credores.

    Já ao longo da última semana, e numa altura em que se renovam os apelos para as ajudas estatais à comunicação social em crise, o PÁGINA UM quis saber junto do novo ministro, Miranda Sarmento, se o Estado vai viabilizar a ‘recuperação’ da TIN no âmbito do PER, através de um perdão fiscal. Em suma, saber se é possível uma empresa de media com um pequeno capital social de 10 mil euros (similar à do PÁGINA UM) pode desenvolver a sua actividade endividando-se para, pouco anos mais tarde, vir a ser salva pelo Estado. Não obteve resposta.

    Ao PÁGINA UM, Luís Simões, presidente do Sindicato dos Jornalistas, recentemente reeleito, diz desconhecer as dívidas da Segurança Social por parte da TIN, afirmando que a entidade sindical está a iniciar agora contactos para se estudar uma solução para a crise financeira na imprensa nacional, que tem agora como epicentro não apenas a Global Media como a empresa detida desde 2018 por Luís Delgado.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Transparência dos media: Vodafone apanha coima histórica de 75 mil euros por esconder accionistas

    Transparência dos media: Vodafone apanha coima histórica de 75 mil euros por esconder accionistas

    Operadora de televisão por cabo e accionista da Sport TV, a sucursal portuguesa da Vodafone andou num ‘jogo do gato e do rato’ com a Entidade Reguladora para a Comunicação (ERC) por causa da identificação dos accionistas de referência, obrigatória na Lei da Transparência dos Media. A Vodafone andou a ‘puxar’ a paciência do regulador até ao limite para não divulgar informação no Portal da Transparência que, na verdade, até constava em relatórios da ‘holding’ inglesa, onde, além da BlackRock, se fica a saber da participação da empresa de telecomunicações do Estado dos Emirados Árabes Unidos, e que tem causado polémica no Reino Unido por razões de segurança interna. O desfecho deste processo, iniciado há mais de três anos, teve agora um epílogo: uma coima de 75 mil euros, a maior deste género aplicada pelo regulador dos media.


    Foi um jogo do gato e do rato, embora o ‘rato’ seja uma multinacional inglesa: a Entidade Reguladora para a Comunicação Social multou este mês a Vodafone em 75 mil euros por esconder “com dolo” os accionistas de referência. Em causa estava uma obrigação, prevista na Lei da Transparência dos Media, que obriga todas as empresas de media a revelarem os sócios, accionistas ou outra entidades e pessoas com interesses directos ou indirectos superiores a 5% do capital social.

    A multa agora aplicada á Vodafone – que tem uma participação de 25% na SportTV, daí estar sobre a alçada do regulador dos media – é a maior já aplicada por violação da Lei da Transparência, e surge numa sequência de outros processos recentes que levaram já à aplicação de duas coimas de 16,700 euros (à PFM – Radiodifusão e à Popquestion), outras duas de 20 mil euros (à cooperativa Rádio Singa e à Rádio Ilha) e uma de 35 mil euros à empresa gestora da Rádio Santo António.

    Mas ao contrário destas empresas – e de outras mais que viram ser os seus processos de contra-ordenação arquivados, geralmente após correcção das falhas e lacunas apontadas pela ERC –, onde as coimas se referiam à falta de informação sobre os fluxos financeiros, no caso da Vodafone a sucursal portuguesa quis deliberadamente esconder dois dos seus accionistas de referência: a multinacional de investimentos BlackRock e uma empresa de telecomunicações detida maioritariamente pelo Estado dos Emirados Árabes Unidos, a ETISALAT.

    Na deliberação da ERC, ontem divulgada mas aprovada no passado dia 15, é historiada as insistentes tentativas do regulador em fazer a Vodafone cumprir o preceituado na lei portuguesa que exige conhecer-se mesmo os principais accionistas a montante da empresa que directamente detém um órgão de comunicação social.

    Ora, no caso da Vodafone, como se está perante uma holding em cascata, tipo matrioska, a sociedade anónima Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais está registado no Portal da Transparência como operador de distribuição e prestador de serviços audiovisuais a pedido, bem como accionista (25% do capital) da Sport TV Portugal. Mas esta é a sucursal da Vodafone Europe BV, que a detém a 100%. Por sua vez, esta empresa é detida pela Vodafone Consolidated Holdings Limited, que por sua vez é detida pela Vodafone International Operations Limited, e esta é detida pela Vodafone European Investments. No topo desta ‘cascata’ está a Vodafone Group PLC. E era sobre a origem do capital desta public limited company (PLC) – um termo que, no Reino Unido, se aplica a corporações com investimento privado, não estatal – que a ERC pretendia que fosse colocada no Portal da Transparência.

    A primeira vez que o regulador detectou a ausência de informação sobre os principais accionistas da Vodafone Group PLC foi em Abril de 2021, tendo sido dado 10 dias para a correcção das falhas. Mas ao longo dos meses seguintes, com muitas trocas de mensagens de correio e contactos, a falha principal não foi corrigida. Em Novbembto de 2022 – ou seja, mais de um ano e meio depois –, a a mandatária da Vodafone informou a ERC de que a “Vodafone Group PLC, entidade cujo capital social se encontra disperso em bolsa, não sendo, consequentemente, possível proceder à identificação dos detentores do mesmo”, acrescentando que, por este mesmo motivo a Vodafone Group PLC não tem uma estrutura do capital social definida na plataforma [da transparência]”.

    Não era, porém, verdade – como os serviços da ERC detectaram, e bastaria uma consulta nos relatórios e contas da própria holding. Por exemplo, no mais recente relatório anual, embora haja uma parte significativa do capital em bolsa, a própria Vodafone Group PLC identifica, como accionistas de referência, a ETISALAT detém 14,01%, a BlackRock 6,23%, a Liberty Global 4,92% e o Norges Bank 3,00%. Para efeitos de cumprimento da Lei da Transparência dos Media somente as duas primeiras teriam de ser indicadas – mas teriam mesmo.

    Só que a sucursal portuguesa manteve o ‘braço de ferro’ com a ERC, dizendo em Fevereiro do ano passado que “na generalidade das situações em que são solicitadas informações sobre a estrutura acionista de uma determinada empresa do grupo, nunca são incluídas informações sobre os acionistas minoritários da Vodafone Group PLC (empresa-mãe do Grupo Vodafone) no respetivo organigrama, uma vez que este é elaborado de forma a abranger apenas as empresas detidas (direta ou indiretamente) por esta última entidade. Por outras palavras, os organigramas fornecidos a entidades externas só identificam empresas a partir da empresa Vodafone Group Plc para baixo”.

    A partir daí a ERC fez o serviço que lhe competia e avançou com o processo de contra-ordenação, apurando também que faltavam as participações relevantes da Black Rock, detidas pela Vanguard Group (8,65%) e a Blackrock Fund Investiments (6,53%), que continuam ainda em falta no Portal da Transparência dos Media. Note-se, aliás, que a sucursal da Vodafone, apesar de ter colocado a participação da BlackRock e da ETISALAT (desactualizada), ainda não inseriu os accionistas da holding norte-americana.

    A ERC é particularmente critica ao comportamento da Vodafone, dizendo que, “dada a sua dimensão, e o facto de operar há vários anos num sector de elevada complexidade técnica, altamente regulado, não pode ter deixado de representar que tinha o dever de indicar toda a cadeia de imputação de participações iguais ou superiores a 5% do capital social”. E acrescenta mesmo que não está em causa “uma matéria meramente teórica”, mas sim algo que “assume gravidade”. Nessa linha exemplifica, de forma explícita, com a celeuma no Reino Unido causada pela entrada da empresa de telecomunicações no capital da Vodafone, por fornecer “tecnologia sensível a departamentos e agências governamentais”.

    O regulador poderia ter optado por uma coima entre 25 mil e 125 mil euros. Acabou por escolher o valor médio: 75 mil euros, “dado o desvalor da conduta e a sua gravidade, o facto de a Arguida não mostrar qualquer arrependimento ou compreensão do desvalor e, de modo a evitar um juízo de impunidade relativamente à prática da infração e da culpa”.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Controlo de fronteiras: Governo gasta 8,4 milhões de euros em ajuste directo decidido por António Costa

    Controlo de fronteiras: Governo gasta 8,4 milhões de euros em ajuste directo decidido por António Costa

    Uma Resolução do Conselho de Ministros ainda assinada por António Costa decidiu gastar, sem concurso público, 25 milhões de euros para os novos sistemas de controlo de fronteiras (Smart Borders), alegando, sem justificar, “urgência imperiosa”, um expediente de duvidosa legalidade nestas circunstâncias porque nem sequer é apresentada fundamentação. E o Governo Montenegro, que se queixou da ‘herança’ de despesas do anterior executivo, concordou com o procedimento de ajuste directo e já assinou um contrato de 8,4 milhões de euros com uma empresa (Timestamp), escolhida com base em critérios nada transparentes. A Presidência do Conselho de Ministros nem sequer mostra o caderno de encargos para se saber o que foi comprado com uma inusitada verba para este tipo de aquisições, tratando isto como se estivesse a comprar tremoços para acompanhar umas imperiais de sorte a refrescar uma tarde soalheira.


    O Governo de Luís Montenegro – que criticou o Governo de António Costa de lhe ter deixado despesas excepcionais, algumas aprovadas já depois das eleições – não aparenta particulares preocupações uma gestão criteriosa dessas mesmas despesas.

    O actual Governo, através da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, concordou em seguir uma resolução do Conselho de Ministros do início de Março, assinada exclusivamente por António Costa, no sentido de autorizar a realização de despesa para aquisição de software até 25 milhões de euros por ajuste directo no âmbito do pojecto comunitário Smart Borders para controlo automatizado de entradas e saída no Espaço Schengen.

    gray suv on road during daytime

    O primeiro contrato por ajuste directo – sem sequer se conhecer os detalhes da escolha nem aquilo que foi adquirido por nada constar no Portal Base – foi assinado na sexta-feira passada com a Timestamp no valor de 6,8 milhões de euros, já depois de um despacho no passado dia 17 de David Xavier, secretário-geral da Presidência do Conselho de Ministros. Com IVA, a despesa atingem valores próximos de 8,4 milhões de euros.

    A escolha do procedimento por ajuste directo, baseado exclusivamente numa resolução do Conselho de Ministros não é consensual, e terá ainda de ser sancionado pelo Tribunal de Contas. Isto porque a Resolução do Conselho de Ministros do Governo Costa apenas determina que se adopte os “procedimentos de ajuste directo […] por motivos de urgência imperiosa”, mas sem adiantar qualquer fundamentação. Com efeito, no Código dos Contratos Públicos, considera-se aceitável um ajuste directo, independentemente do valor – e este, para o género, é anormalmente elevado –, “na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante, não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”.

    Ora, independentemente do interesse em modernizar o controlo de fronteiras, subsistem muitas dúvidas se a alegada “urgência imperiosa” resulta mesmo de “acontecimentos imprevisíveis” pela Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, e se esta entidade está isenta de culpas por um eventual atraso na implementação do projecto Smart Borders em Portugal, que foi aprovado em 2018 na União Europeia, que integra duas componentes.

    man standing inside airport looking at LED flight schedule bulletin board

    Por um lado, o novo sistema de entrada e saída (EES), que deverá começar a estar operacionalizado no segundo semestre deste ano, prevê a agilização do controlo de estrangeiros (fora do Espaço Schengen) em viagens de curta duração, com a eliminação do carimbo do passaporte e automatização de procedimentos. Quanto à outra componente, a começar a funcionar no primeiro semestre do próximo ano, trata-se do novo Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS), que vai passar a exigir a diversos países uma autorização especial de viagem mesmo que não seja exigido actualmente necessário visto.

    O PÁGINA UM colocou diversas perguntas concretas à Presidência do Conselho de Ministros, todas respondidas com evasivas. Sobre os critérios que levaram à escolha, em concreto, da Timestamp – e de nenhuma outra –, fonte oficial diz que “a escolha da entidade em causa foi assegurada no estrito cumprimento do Código dos Contratos Públicos […], ou seja, de acordo com critérios técnicos e objetivos e com a rigorosa observância do princípio da imparcialidade”.

    E adiantou também que “na situação em apreço procedeu-se a uma consulta preliminar a várias empresas […], tendo em vista o planeamento eficaz do procedimento aquisitivo e assegurando a aquisição pretendida em condições mais favoráveis”. Contudo, não foram identificadas essas empresas consultadas, não tendo sido dada qualquer resposta quando se insistiu na identificação das empresas alegadamente contactadas para além da Timestamp, que garantiu o chorudo contrato de 8,4 milhões de euros.

    2 men in yellow and black suit action figures

    Em todo o caso, a mesma fonte garante que “não compete a qualquer membro do Governo, anterior ou actual, praticar atos decisórios no âmbito dos procedimentos pré-contratuais para as aquisições” desta natureza, e que, deste modo, “o Governo actualmente em funções não teve qualquer interferência na escolha da empresa seleccionada”.

    Apesar de ter sido pedido o caderno de encargos, e insistido, a Presidência do Conselho de Ministros não o enviou, dizendo apenas que se está perante uma “aquisição de infraestrutura tecnológica de suporte à instalação, gestão e manutenção dos novos sistemas europeus de controlo de fronteiras”, sem qualquer discriminação. Trata-se, contudo, e saliente-se, de uma compra de 8,4 milhões de euros, e não propriamente da aquisição de tremoços para acompanhar umas imperiais de sorte a refrescar uma tarde soalheira.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Lei que afasta pequenos partidos dos debates televisivos está por rever desde 2016

    Lei que afasta pequenos partidos dos debates televisivos está por rever desde 2016

    Nesta campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, os chamados ‘pequenos partidos’ têm clamado ainda mais forte contra a discriminação das televisões, porque ao contrário do que sucede geralmente nas eleições para a Assembleia da República, desta vez os convites não foram endereçados apenas para os partidos com eurodeputados, alargando-se ao Livre, Iniciativa Liberal e Chega. Alguns partidos sentiram-se discriminados e apresentaram queixas ou mesmo providências cautelares – como sucedeu com o ADN, RIR e Volt Portugal. No caso deste último partido, foi alegado que, sendo federalista, deveria ter sido contabilizado um eurodeputado alemão eleito em 2019. A Entidade Reguladora para a Comunicação Social não lhe deu razão, mas alertou para a falha da revisão da lei, que deveria ter sido feita em 2016, e da necessidade de encontrar soluções para uma melhor equilíbrio na cobertura mediática das diversas campanhas. O PÁGINA UM é o único órgão de comunicação social que, tanto nas anteriores legislativas como agora nas europeias, endereçou convites a todos os partidos para a realização de uma entrevista. Tudo isto sucede poucos dias depois dos 5o anos da Revolução dos Cravos.


    Aumentam as críticas dos pequenos partidos contra os critérios editoriais das televisões de inclusão dos debates para as europeias. Embora a Constituição preveja igualdade de tratamento, uma legislação criada no final do primeiro Governo de Passos Coelho em 2015, em vésperas das eleições que dariam início ao primeiro Governo de António Costa, abriu caminho à discriminação partidária, definindo que os órgãos de comunicação social deveriam convidar para os debates não apenas os partidos com “representação [obtida] nas últimas eleições” relativas ao órgão em causa (neste caso, o Parlamento Europeu), mas abrindo a possibilidade de incluírem “no exercício da liberdade editorial, outras candidaturas nos debates que venham a promover”.

    A polémica lei entrou em vigor para a campanha das legislativas de 2015 – que teve como principais opositores Pedro Passos Coelho e António Costa, e que depois daria origem à ‘geringonça’ – mas estava prevista uma revisão daí a um ano. Nunca foi revista, apesar de três eleições legislativas e duas eleições (com a próxima) para a Europa.

    blue and white flags on pole

    Na actual campanha para as eleições ao Parlamento Europeu, tem sido a aplicação desta norma legal que a causar sucessivas críticas e queixas dos pequenos partidos junto da Comissão Nacional de Eleições (CNE) e da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), porque as televisões generalistas (RTP, SIC, TVI e CMTV) decidiram incluir nos debates a quatro apenas os cabeças-de-lista dos partidos com assento no Parlamento Europeu (como seria obrigatório por lei), acrescentando, desta vez, também os principais candidatos da Iniciativa Liberal, Livre e Chega, que não conseguiram eleger qualquer eurodeputado em 2019. A representatividade na Assembleia da República terá sido o critério editorial para esse acréscimo, que objectivamente acaba por ‘afastar’ do enfoque mediático outros partidos sem representatividade no hemiciclo da União Europeia.

    Mas tanto as queixas para a CNE como para a ERC – para além de uma providência cautelar apresentada pela Alternativa Democrática Nacional (ADN), que tem como cabeça-de-lista Joana Amaral Dias –, têm caído em saco roto. Até agora, as decisões concluem que a lei de 2015 não viola a Constituição, e independentemente das questões éticas por detrás das opções dos órgãos de comunicação social, supostamente não subsistirá nenhuma ilegalidade.

     Mas a queixa formulada pelo Volt Portugal, junto da CNE, que a encaminhou para a ERC, originou uma deliberação do regulador dos media, divulgada hoje, que mostra bem o incómodo de uma lei absolutamente discriminatória, no sentido lato do termo. Com efeito, o Volt Portugal assume-se como integrante de um partido federalista europeu, e nessa medida o Volt Alemanha conseguiu eleger em 2019 um eurodeputado, Damian Boeselager. Ou seja, segundo a interpretação do Volt Portugal, o seu cabeça-de-lista nacional deveria ter sido convidado para os debates a quatro, não por liberalidade editorial mas por cumprimento da lei.

    Debates televisivos para as Europeias incluíram apenas alguns partidos sem eurodeputados, mas excluíram o Volt Portugal que alega que o partido federalista que integra tem um eurodeputado, eleito pelo Volt Alemanha.

    Contudo, o Conselho Regulador da ERC – cujos membros são nominalmente indicados pelo PS e PSD, com excepção de um que é cooptado – considerou que, apesar das eleições se realizaram para o Parlamento Europeu no mesmo período em todos os países comunitários, “o Volt Portugal é um partido político nacional e, por isso, pode concorrer às eleições europeias, no círculo eleitoral português, aplicando-se-lhe as mesmas regras que são aplicadas aos restantes partidos políticos portugueses, independentemente das afiliações, entendimentos ou alianças políticas que cada partido possa ter a nível internacional”. E, nessa linha, como a partir de Portugal o Volt não obteve qualquer eurodeputado em 2019, “é defensável que o critério invocado não se aplique ao Queixoso [Volt Portugal]”.

    Em todo o caso, a ERC destaca que a lei de 2015 até já deveria ter sido revista em 2016,o que nunca sucedeu, uma vez que estava prevista, num dos artigos, a sua modificação no prazo de um ano. Ou seja, esta lei apenas deveria estar em vigor durante um ano. Além disso, o regulador diz que já tem encorajado “vivamente os diferentes órgãos de comunicação social a que considerem a participação do universo das candidaturas nos diferentes debates que organizem, nos seus vários formatos, à luz dos princípios do pluralismo e da diversidade”, algo que tem caído em saco roto. A generalidade dos órgãos de comunicação social de maior dimensão nem sequer concede entrevistas a todos as candidaturas. O PÁGINA UM foi, aliás, o único órgão de comunicação social que lançou convites a todos os partidos para uma entrevista nas anteriores legislativas (PSD, PSD, Bloco de Esquerda e Livre não aceitaram então), e está a repetir essa iniciativa com todos os cabeças-de-lista.

    Curiosamente, na entrevista de hoje do PÁGINA UM será com o cabeça-de-lista do Livre, Francisco Paupério – que teve um comportamento contrário ao de Rui Tavares, nas legislativas, aceitando o convite –, a questão da igualdade de tratamento de candidaturas foi um dos aspectos abordados. Para Francisco Paupério – que surge com hipóteses de ser eleito em recentes sondagens –, “há uma discrepância muito grande na comunicação social” na cobertura jornalística dos partidos “que deve ser corrigida”, defendendo que “não devemos dar só primazia a quem já tem representação parlamentar”. Eleito nas primárias do Livre, Paupério diz que “a mensagem” dos partidos aceites pelo Tribunal Constitucional “também tem de passar mais na comunicação social.”

    Francisco Paupério, cabeça-de-lista do Livre, tenta uma eleição inédita para o seu partido. Foi convidado para os debates televisivos, apesar de o Livre ainda não ter eurodeputados, e defende a igualdade de tratamento nas campanhas.

    A questão da igualdade de oportunidades e, concomitantemente, na cobertura jornalística dos diversos partidos não é, porém, uma questão assim tão cristalina como parece à primeira vista, mesmo se consagrada na Constituição, e aparentemente ‘contrariada’ pela lei de 2015. “Desde que haja um fundamento material para a diferenciação de tratamento”, neste caso a questão da representação parlamentar e a liberdade editorial, “o Tribunal Constitucional, em princípio, não deve censurar as opções do legislador”, defende José Melo Alexandrino, constitucionalista e professor aposentado da Universidade de Lisboa.  

    Para o também colunista do PÁGINA UM, “a principal função da igualdade é a de exigir um fundamento racional ou suficiente para as diferenciações de tratamento, desenvolvendo, além disso, também funções heurísticas [procedimentos mentais simples para respostas adequadas], instrumentais, promotoras e de controlo”. Quanto à questão da norma que determinava que a lei de 2015 deveria ser revista no prazo de um ano, Melo Alexandrino diz que esse incumprimento não torna a legislação inválida: “São artigos de leis para inglês ver; há leis que estão por rever durante 30 anos”.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • ERC anula a sua própria deliberação que acusava o PÁGINA UM de falta de rigor informativo

    ERC anula a sua própria deliberação que acusava o PÁGINA UM de falta de rigor informativo

    Foi por um formalismo, mas é um caso paradigmático: a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) viu-se obrigada a anular a sua própria deliberação de Fevereiro passado onde acusava o PÁGINA UM de “falta de rigor informativo”, afirmando falsamente que o jornal nem sequer tinha respondido a uma notificação sobre uma das duas queixas formuladas, sob anonimato, pelo pneumologista Filipe Froes – um dos medicos com mais relações comerciais com a indústria farmacêutica. As duas notícias foram publicadas em Maio e Agosto do ano passado, usando informação oficial da Agência Europeia do Medicamento, mas numa altura em que ainda era tabu apelar para uma maior transparência e rigor no conhecimento dos perfis de segurança contra a covid-19. Perante suspeitas de que este e outros processos estejam a ser ser tratados pelo regulador de forma discriminatória ou sem que tenha conhecimento na área em causa para aferir do rigor informativo, o PÁGINA UM tem visto o regulador recusar a identificação dos técnicos envolvidos, razão pela qual seguiu queixa para a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos.


    A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) anulou a sua própria deliberação de Fevereiro passado contra o PÁGINA UM por causa da publicação de notícias sobre os efeitos adversos das vacinas contra a covid-19. Aquela deliberação, surgida de duas queixas, sob anonimato, do pneumologista Filipe Froes – um dos médicos portugueses com maiores relações comerciais com a indústria farmacêutica – acusava o jornal de “falta de rigor informativo, sobretudo pela insuficiência na demostração de um nexo de causalidade entre a toma das vacinas e as mortes e na ausência de fontes de informação diversificadas”. Saliente-se que Filipe Froes tem em curso um processo de averiguações em curso, ,as parado há meses, no Infarmed sobre as suas relações com as farmacêuticas.

    A razão formal para o Conselho Regulador da ERC anular a sua própria deliberação, aprovada no passado dia 7 de Fevereiro, prende-se com o facto de em uma das queixas de Filipe Froes os serviços deste regulador não ter, por alegado lapso, notificado o director do PÁGINA UM para apresentar defesa. Contudo, no próprio texto da deliberação de Fevereiro diz-se que “segunda participação” tinha sido remetida ao PÁGINA UM, “não tendo respondido”. Ou seja, a ERC assumiu que o PÁGINA UM, que demorara vários dias a investigar os temas sobre os quais escreveu, não respondia por desinteresse.

    person holding white plastic bottle

    Note-se que esta anulação enquadra-se também numa contenda que o PÁGINA UM tem tido com a ERC sobre a credibilidade do regulador e dos seus funcionários em analisar o rigor informativo de temas científicos, ainda mais sobre matérias sensíveis ainda não ‘consolidadas’ na comunidade científica. Contudo, até agora, a ERC tem recusado as diligências do PÁGINA UM no sentido de identificar os funcionários do regulador que têm estado envolvidos na análise da queixa, de modo a ter uma melhor percepção dos seus conhecimentos em Ciência para ajuizar da respectiva capacidade de concluírem pela “falta de rigor informativo, sobretudo pela insuficiência na demostração de um nexo de causalidade entre a toma das vacinas e as mortes e na ausência de fontes de informação diversificadas”, como se referiu na deliberação agora anulada.

    Hoje, seguiu uma queixa para a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) no sentido de obter um parecer sobre a obrigatoriedade da ERC ceder os documentos onde constem quem tem estado ennvolido na análise das queixas de Filipe Froes e quem foi responsável pela falha que resultou numa deliberação com falsidade e lesiva dos direiros de defesa do PÁGINA UM.

    Recorde-se que em causa estão sobretudo dois artigos do PÁGINA UM, publicados em Maio e Agosto do ano passado, que se basearam sobretudo em informação pública registada na base de dados da EudraVigilance, que compila informação individual anonimizada sobre efeitos adversos de medicamentos, incluindo as vacinas contra a covid-19. Essa informação é remetida pelas próprias farmacêuticas ou pelos reguladores dos diversos países que integram o Espaço Económico Europeu, passando assim por um crivo técnico e científico.

    Aliás, na primeira das notícias, publicada em Maio do ano passado, intitulada “Efeitos adversos: este ano, há quase nove mortes por dia associadas às vacinas da covid-19 na Europa” destacava-se que “embora a inclusão dos casos letais notificados na EudraVigilance não signifique inapelavelmente que as vacinas sejam a causa de morte, as suspeitas são muito relevantes, tanto mais que, em grande parte das situações, são as próprias farmacêuticas que enviam os registos individuais anonimizados”.

    Em 7 de Fevereiro passado, o pneumologista Filipe Froes, o queixoso, fez gala da deliberação da ERC antes mesmo de esta ter sido enviada ao PÁGINA UM. A deliberação foi agora anulada.

    Esse primeiro artigo, além de elencar as mortes associadas na própria Eudravigilance às vacinas contra a covid-19, bem como as reacções adversas totais e graves por marca, criticava a inexistência de dados que permitisse aferir a incidência. O artigo destacava também que “a OMS [Organização Mundial de Saúde] e os mais distintos Governos, incluindo o português, invocam as vacinas contra a covid-19 como o grande contribuidor para que o SARS-CoV-2 se tornasse endémico, menorizando o papel da variante Ómicron e a imunidade natural (dos infectados), mas esquecem de debater um dado sombrio: os efeitos adversos das vacinas”.

    Relativamente a esta notícia – sobre a qual o PÁGINA UM teve oportunidade de remeter um vídeo explicativo sobre a consulta da base de dados (que não é sequer referida na deliberação) –, a ERC preferiu até criticar a escolha das fotografias, achando mal que se tivesse colocado o director-geral da Saúde a sorrir.

    Já sobre a segunda notícia – a tal cuja mentira dos serviços da ERC levou à sua anulação –, estava em causa um levantamento sobre as mortes súbitas constantes nos registos das reacções adversas das vacinas contra a covid-19. E tinha subjacente sobretudo um apelo, que enobrece o jornalismo: a necessidade de estudar, com transparência, a segurança das vacinas, apresentando exemplo desse debate a ser iniciado na comunidade científica. E, por fim, apresentava um levantamento exaustivo – único na imprensa nacional – à base de dados da EudraVigilance para apurar os casos suspeitos de morte súbita associados às vacinas contra a covid19, porque, enfim, constavam nos registos destes fármacos na base de dados da Agência Europeia do Medicamento.

    Na deliberação agora anulada, a ERC até chega a elencar que o artigo em causa usa seis diferentes fontes de informação – não relevando sequer a maior, que é a base de dados – e nem sequer aponta qualquer erro ou manipulação. Porém, enviesa a análise: onde o artigo destaca a necessidade de estudos sobre segurança das vacinas com maior transparência, a ERC olha para isso como um ataque às vacinas. E chega mesmo a dizer que a escolha da fotografia de uma avestruz com a cabeça enfiada na terra “indicia uma conduta em que se deixa de lado qualquer dever de isenção”, esquecendo que um dos papéis fundamentais do jornalismo é exactamente denunciar a inércia e o obscurantismo das autoridades, que são formas de manipulação e de desinfirmação.

    A ERC é constituída sobretudo por juristas e outros profissionais na área da Comunicação e das Ciências Sociais, mas arvora-se de analisar o rigor informativo nas áreas da Epidemiologia ou da Saúde Pública que ainda se encontram em fase de consolidação na comunidade científica. E acha mal que se coloque fotos de avestruzes de cabela enfiada na terra.

    Com a anulação da deliberação, o processo iniciado com a queixa do pneumologista Fllipe Froes – que em Fevereiro passado tivera acesso á decisão da ERC em primeira-mão, antes mesmo do PÁGINA UM, divulgando-a nas redes sociais como uma suposta prova de descredibilização do jornal – volta ao início.

    O PÁGINA UM vai, por isso, enviar agora à ERC um conjunto de artigos científicos recentes sobre estudos referentes a reacções adversas, que já são agora debatidas livremente. E é bom recordar que existem processos judiciais em curso no Reino Unido sobre reacções adversas, por uma simples razão: um fármaco, mesmo que possa ser favorável a uma determinada doença, não ‘recebe imunidade’ para evitar ver escrutinados os seus efeitos adversos. E mesmo só se pode determinar se são aceitáveis em termos de saúde pública – e saúde individual – se não houver obscurantismo e manipulação. E mais: não é aceitável sequer que jornalistas procurem, contra-a-corrente, aflorar estes temas sejam ‘perseguidos’ por lobistas associados à indústria farmacêutica e por entidades reguladoras que constitucionalmente foram criadas para defender a liberdade de imprensa.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Dona do Expresso aceita calote da dona da Visão em negócio nebuloso

    Dona do Expresso aceita calote da dona da Visão em negócio nebuloso

    Em 2018, a venda do portfólio das revistas da Impresa, onde se destaca a Visão, deveria ter resultado num encaixe de 10,2 milhões de euros. Mas nunca se soube quanto lhe entregou o empresário e ex-jornalista Luís Delgado, através de uma empresa unipessoal (a Trust in News) com um capital social de apenas 10 mil euros, porque sempre faltou transparência e sucederam-se acordos para protelar os pagamentos. Agora, a Impresa assumiu que já não vai recuperar 2,5 milhões de euros, o que agravou os prejuízos do ano passado da dona do Expresso. Em todo o caso, o grupo de media fundado por Pinto Balsemão não se safou mal deste negócio, pois aquando da venda a Luís Delgado ‘transferiu’ um passivo de 19,3 milhões de euros para a agora quase ‘moribunda’ Trust in News. Quem se apresta a tramar-se é o Estado: em 2022 as dívidas fiscais da Trust in News atingiam 11,4 milhões de euros. À Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a Impresa – que tem um passivo de mais de 222 milhões de euros e pagou quase 10,7 milhões de euros só em juros no ano passado – nada comunica.


    Começava o ano de 2018, e anunciava-se um dos grandes negócios de media em Portugal: o colosso Grupo Impresa, fundado por Pinto Balsemão, com um capital social de 84 milhões de euros vendia um conjunto de 12 títulos – onde pontificavam as revistas Visão, Exame e Caras e o Jornal de Letras – à Trust in News, uma empresa unipessoal do ex-jornalista Luís Delgado com um capital social de apenas 10 mil euros. Era o Golias a vender ao David, embora sem qualquer funda. Pelo contrário, seis anos depois, o negócio está num poço sem fundo e do montante do negócio então divulgado em comunicado à CMVM – 10,2 milhões de euros, pouco se viu entrar nos cofres da Impresa.

    Pelo contrário, se os investidores esperavam alguns dividendos, desenganaram-se. O último relatório e contas da Impresa, relativo a 2023, revelado em detalhe no final do mês passado, mostra que 2,5 milhões de euros se perderam já. Assumir isto nas contas teve um colossal impacte: em vez de apresentar um prejuízo ligeiro, da ordem dos 200 mil euros, os accionistas receberam uma desagradável prende de mais de 2,7 milhões de euros de prejuízo.

    Com efeito, nas notas das demonstrações financeiras de 2023, a Impresa assume que”a rubrica de outras contas a receber diminuiu devido ao registo de uma perda por imparidade no montante de 2.520.000 Euros referente ao montante a receber referente à alienação do portfólio de revistas (Activa, Caras, Caras Decoração, Courrier Internacional, Exame, Exame Informática, Jornal de Letras, TeleNovelas, TV Mais, Visão, VisãoHistória e Visão Junior)”. Em concreto, a Impresa desiste de cobrar esse montante a Luís Delgado sem sequer recorrer às instâncias judiciais nem esperando que aquele empresário cumprisse o último acordo para pagar a dívida até 2036, Este pode também ser sinal de um prevível colapso da Trust in News que apresentava em 2022 um passivo de mais de 27 milhões de euros e uma dívida ao Estado de 11,4 milhões de euros.

    A forma como decorreu o negócio da venda das revista em 2018 tem contornos estranhos, ademais sabendo-se que a Impresa tem compromissos legais de transparência e de comunicação ao mercado de capitais. No relatório e contas de 2018 do Grupo Impresa surgia a informação de que o acordo com a Trust in News estipulava o pagamento dos 10,2 milhões de euros “em dois anos e meio”. Porém, no final de 2019, de acordo com o relatório e contas desse ano da Impresa, a dívida ainda estava nos 4,55 milhões, acrescentando-se que em 31 de Dezembro de 2018 o valor nominal da conta a receber da TIN [Trust in News] era de 6.300.000 Euros”. Mais se acrescentava que se renegociara o plano de reembolso, pelo que Luís Delgado teria de pagar 2,15 milhões de euros em 2020 e 2,4 milhões em 2021.

    Não sendo claro se a renegociação implicou um abaixamento do valor do negócio, certo é que em quase dois anos – tendo em conta a realização do negócio em 2 de Janeiro de 2018 –, a Trust in News tinha pagado, no máximo, 5,65 milhões de euros à Impresa até finais de 2019. No acordo inicial – pagamento em dois anos e meio – teria de se pagar 8,16 milhões de euros até 2020 e o remanescente (2,04 milhões de euros) no primeiro semestre de 2021.

    Luís Delgado (à esquerda) comprou em 2 de Janeiro de 2018 à Impresa um conjunto de títulos, entre as quais a revista Visão, num negócio oficialmente envolvendo o pagamento de 10,2 milhões de euros a ser concrtizado em dois anos e meio. Em finais de 2022 ainda faltava pagar cerca de 40% desse valor.

    Mesmo assim, nesta fase, o pagamento da Trust in News não foi com verbas de Luís Delgado nem de qualquer investidor externo, porque a empresa é unipessoal (apenas detida por Luís Delgado), e tem um capital social diminuto (10.000 euros).

    No balanço de 2018 da Trust in News nota-se, aliás, que foi “herdado” um passivo significativo (quase 19,3 milhões de euros) à “boleia” de um activo onde se destacava um valor atribuído às marcas (activos intangíveis) da ordem dos 10,8 milhões de euros. Entre este passivo da Trust in News destacavam-se, então, os 6,2 milhões de euros ainda por pagar à Impresa e mais 2,7 milhões de um empréstimo ao Novo Banco.

    Em suma, mesmo intervencionado pelo Estado, o Novo Banco dispôs-se a emprestar a curto prazo pelo menos 2,7 milhões de euros a uma empresa com um capital social de 10 mil euros, a Trust in News, para saldar parte da compra das revistas à Impresa.

    Em 2019, o Novo Banco ainda emprestaria mais dinheiro à Trust in News. No final desse ano, a empresa de Luís Delgado já devia 3,7 milhões de euros ao Novo Banco, ou seja, a dívida para esta instituição financeira aumentara cerca de um milhão de euros. No entanto, globalmente, os financiamentos bancários à Trust in News já ascendiam aos 4,5 milhões de euros.

    Foi a partir de 2020 que a Trust in News praticamente deixou de pagar a compra das revistas à Impresa, altura em que também começou a não pagar ao Estado. No relatório e contas da Impresa de 2020 refere-se que o valor nominal da dívida era ainda de 4,43 milhões de euros. Ou seja, Luís Delgado apenas pagou 120 mil euros à empresa de Pinto Balsemão durante todo o ano de 2020, quando tinha prometido pagar-lhe, nesse período, 2,15 milhões de euros.

    Resultado: nessa altura, a Impresa concordou em renegociar a dívida, remetendo o plano de reembolso para 2023, sendo que em 2021 Luís Delgado teria de pagar 300 mil euros, e depois 2,63 milhões em 2022 e 1,5 milhões em 2023.

    Se a Impresa tinha esperanças ou não na palavra de Luís Delgado, não se sabe. Em Abril do ano passado, aquando de uma notícia sobre este negócio, fonte da Impresa disse ao PÁGINA UM que “não se pronuncia sobre a situação económica e financeira de empresas exógenas”. Mas os dados são indesmentíveis. Nas contas de 2021, a Impresa declarou que o valor nominal da dívida da Trust in News situava-se nos 4.321.513 euros. Ou seja, se o compromisso do ano anterior era o de Luís Delgado pagar 300 mil euros em 2021 (de um total de 4,43 milhões), na verdade saldou apenas 110 mil euros. Mais: a Impresa já admitia vir receber apenas cerca de 3,55 milhões de euros, por ser esse o valor inscrito na rubrica “outras contas a receber”.

    Antes da venda em 2018 do portfolio das revistas à Trust in News, a Impresa, fundada por Francisco Pinto Balsemão, teve de reconhecer imparidades (prejuízos de 22 milhões de euros). A venda por 10,2 milhões de euros, nunca se concretizou por aqueles montantes e os investidores nunca foram previamente informados nem saber quanto a Impresa afinal recebeu de Luís Delgado.

    No relatório de 2021 da Impresa salienta-se que houve nova revisão do “plano de pagamentos do montante em dívida, estendendo o mesmo até 2036, prevendo o pagamento de prestações mensais de 25.000 Euros, a ser realizado pela cessão de créditos futuros da TIN [Trust in News] relativo à exploração das suas propriedades digitais, que se encontra a ser gerido por um terceiro.” Um pagamento mensal de 25 mil euros daria um total de 300 mil euros em 2022, mas mais uma vez Luís Delgado falhou.

    De acordo com o mais recente relatório e contas da Impresa, a dívida nominal da Trust in News situava-se, no final de 2022, em 4.094.295 euros. Agora, nas contas de 2023 é assumida uma ‘eliminação’ da dívida em 2,5 milhões de euros, por se assumir uma imparidade, mas no relatório e contas nada se refere quanto aos restantes 1,5 milhões de euros da dívida da Trust in News em 2022. A Impresa também não comunciou nada previamente à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) sobre estes sucessivos negócios nem os contornos da assumpção da imparidade, tendo em conta os deveres de informação aos investidores em casos de alterações materialmente relevante. Recorde-se que a Impresa tem um passivo de 222,6 milhões de euros em 2023, dos quais mais de 128 milhões em empréstimo de curto e longo prazos. E 70% dos seus activos são referentes ao goodwill referentes aos títulos da imprensa e televisão.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.

  • Santa Casa da Publicidade: contratos ‘chovem’ e já atingem 16,5 milhões de euros

    Santa Casa da Publicidade: contratos ‘chovem’ e já atingem 16,5 milhões de euros

    Enquanto continua sem divulgar os critérios para a escolha das empresas, e atribuição dos distintos montantes, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) está a transformar-se numa autêntica Santa Casa da Publicidade. Hoje, foi revelado no Portal Base mais um contrato a ultrapassar a fasquia de um milhão de euros, a beneficiar a Medialivre, o grupo de media que detém o Correio da Manhã e a CMTV. Desde Março, a factura de publicidade da SCML já vai em 16,5 milhões de euros, mais de cinco vezes o montante total da publicidade institucional do Estado durante todo o ano passado. Mas como esta instituição não é já considerada um instituto público, apesar de tutelada pelo Governo, os valores que gasta, e como gasto, nem sequer são controlados pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social. Nem sequer tem de fazer publicidade em órgãos de comunicação regional ou local; escolhe quem lhe apetecer.


    Continua a ‘chuva’ de contratos milionários de publicidade da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), cuja Mesa liderada por Ana Jorge foi exonerada na semana passada pelo Governo. Hoje foi publicado mais um contrato avultado, que já anunciava por beneficiar a Medialivre, o grupo de media detentora, entre outros títulos do Correio da Manhã e da CMTV, preparando-se para lançar o novo canal Now. Apesar de assinado ainda em Abril, este contrato com o grupo media que tem Cristiano Ronaldo como principal accionista atingirá um pouco mais de 1,5 milhões de euros, dos quais 615 mil na imprensa escrita, quase 443 mil no online e cerca de 448 mil nos canais televisivos.

    Além deste contrato, no presente mês de Maio foram ainda divulgados mais três contratos para emissão de publicidade à SCML e à promoção dos seus jogos: 726 mil euros à Intervoz, uma empresa do grupo Rádio Renascença; 430 mil euros à MEO – que, como empresa de comunicação social, detém o Sapo e é distribuidor de canais por cabo –; e 15 mil euros à plataforma OLX.

    Por agora, são 35 as empresas de comunicação social e do sector publicitário, que beneficiaram de contratos que, na generalidade têm efeitos retroactivos, porque iniciaram o sey efeito em Janeiro e se prolongam até Dezembro. Apesar do PÁGINA UM ter pedido informação à SCML sobre este contratos e os critérios para escolha e distribuição das verbas, nunca se obteve resposta. No total, pelas contas do PÁGINA UM, a SCML vai assumir custos de publicidade de 16.532.920 euros, que não incluem a produção dos conteúdos.

    Estes valores são extraordinariamente elevados face aos investimentos publicitários assumidos, regra geral, pelo Estado. De acordo com o levantamento feito pelo PÁGINA UM aos relatórios mensais da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) relativos à publicidade institucional do Estado foram gastos entre Janeiro e Dezembro de 2023 um total de 3.068.589 euros. Ou seja, os custos em publicidade da SCML é, por agora, mais de cinco vezes superior a todas as entidades governamentais e estatais ao longo do último ano.

    No entanto, a SCML está num ‘mundo à parte’ e estes contratos nem sequer serão enviados à ERC, nem sequer têm de cumprir a obrigação de uma lei da publicidade institucional que determina que 50% do investimento do Estado se aplique em órgãos de comunicação social. Com efeito, apesar de ser tutelado pelo Governo, a SCML foi classificada como pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública administrativa, o que a exclui desse ‘incómodo’. Somente num curto períoda da democracia, entre 1979 e 1983, a SCML foi considerada um instituto público.

    De acordo com os contratos já conhecidos, através do Portal Base, a SIC – Sociedade Independente de Comunicação, do Grupo Impresa, e a TVI – Televisão Independente, apanharam as maiores fatias do bolo publicitário: 3 milhões e 2,5 milhões de euros, respectivamente. Estes contratos, revelados em primeira-mão peloo PÁGINA UM, foram assinados na tarde da exoneração da Mesa da SCML, através do seu vogal João Correia. Acima de um milhão de euros estão os contratos da Medialivre e da RTP, que amealhará 1,05 milhões.

    Ana Jorge, ainda provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (Foto: D.R./SCML)

    Note-se que a forma pouco transparente com que têm sido distribuídos os montantes causa perplexidade. Os contratos têm vindo a ser assinados desde Março, a conta-gotas, abrangendo tanto empresas de gestão de outdoors, como agências de comunicação e de publicidade digital (entre as quais as empresas donas do Facebook e do YouTube) e empresas de media, mas nunca se revelaram os critérios para a distribuição das maquias. Na verdade, os contratos funcionam como um plafond a gastar, caso a caso, desde o início de Janeiro passado até ao final do próximo mês de Dezembro.

    Para a generalidade destes contratos é invocada uma norma de excepção do Códigos dos Contratos Públicos – a contratação excluída -, aplicável “à formação de contratos cujo objecto abranja prestações que não estão nem sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato ou do contexto da sua formação”. Um argumento que terá ainda de passar pelo ‘crivo’ do Tribunal de Contas, pelo menos nos contratos de maiores montantes. Em alguns dos contratos, esta justificação serve para nem sequer ser apresentado contrato escrito.

    Entre os contemplados estão também empresas estrangeiras: a Meta – dona do Facebook -, o Google – dono do Youtube – e a Walt Disney – dona de diversos canais por cabo. No caso da empresa de Mark Zuckerberg, a SCML vai pagar 600 mil euros por publicidade na rede social Facebook, não existindo qualquer contrato que estipule preços nem condições. Este será o primeiro contrato da Meta com entidades públicas portuguesas, de acordo com o Portal Base.

    No caso do Google, o montante é um pouco mais baixo: 400 mil euros, embora também não se saiba se o investimento publicitário será exclusivamente no YouTube, uma vez que o contrato também não foi reduzido a escrito. No caso da sucursal portuguesa da Walt Disney, o montante em causa atinge os 350 mil euros, e até existe contrato escrito, apesar de nada dizer sobre quais os canais onde a publicidade será colocada. A empresa tem vários canais televisivos por cabo, entre os quais o Disney Channel, Disney Junior,Baby TV e National Geographic.

    Valor dos contratos (em euros) para emissão de publicidade celebrados pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em vigor ao longo de 2024. Fonte: Portal Base.

    Quanto às empresas de media, são agora 20 as beneficiadas, sem sequer se conhecer nem compreender as razões das escolhas e sobretudo dos montantes. Atrás das empresas com canais televisivos, a maior beneficiada nos contratos da SCML é a sucursal portuguesa do grupo alemão Bauer Media, dona da Rádio Comercial, M80, Cidade FM, Smooth FM e Batida FM. Prometidas estão, desde já, 766 mil euros em publicidade da SCML. Segue-se a Intervoz, a empresa de publicidade do grupo Rádio Rensacença, que tem como sócios o Patriarcado de Lisboa e a Conferência Episcopal Portuguesa. Receberá, como já referido, 726 mil euros.

    Contudo, se se somar os contratos da subsidiária que controla a TSF, a Global Media fica próxima dos valores da RTP. Directamente para o grupo liderado por Marco Galinha, que vive uma situação financeira catastrófica, a SCML vai entregar publicidade no valor de 560 mil, mas pode também incluir mais 260 mil euros a receber da sua subsidiária Rádio Notícias. Deste modo, a Global Media encaixará da instituição liderada pela antiga ministra socialista da Saúde um total de 820 mil euros.

    A distribuição da maior fatia à Global Media não deixa de surpreender ainda mais tendo em conta também a circulação dos seus principais diários, mesmo incluindo a componente digital. Por exemplo, a Impresa ‘só’ vai receber 350 mil euros. Este montante incluirá, em princípio, apenas os títulos da imprensa escrita, uma vez que a SIC é gerida por uma empresa própria. Como a SCML não quis revelar se houve mais contratos ainda não publicados no Portal Base, ainda se ignora se o grupo de media fundado por Pinto Balsemão terá mais razões para agradecer a bondade da SCML.

    Polémicos também são os contratos que beneficiam o empresário Luiz Montez. De modo algo surpreendente, sobretudo pelo fraco alcance da rádio em questão e por envolver indirectamente uma empresa com dívidas ao Estado, é o contrato para publicidade que a SCML celebrou com a empresa da Rádio Amália, que envolve o pagamento de 176.800 euros, que representa 40% dos rendimentos que obteve em 2022. Esta empresa – a Rádio Nova Loures – pertence a Luís Montez, através da Música no Coração que, como o PÁGINA UM já revelou, nem apresentou contas em 2022, estando no ano anterior com capitais próprios negativos de quase 6,2 milhões de euros.

    Luís Montez saiu-se duplamente beneficiado neste selecto grupo de adjudicatários para prestação de serviços de publicidade á SCML. Com efeito, a SIRS – a empresa que detém a Rádio Nova, onde ele possui 25% do capital, sendo que outro tanto é de Álvaro Covões e 50% pertence ao Público – vai receber até ao final do ano por serviços de publicidade um total de 62.400 euros.


    PÁGINA UM – O jornalismo independente (só) depende dos leitores.

    Nascemos em Dezembro de 2021. Acreditamos que a qualidade e independência são valores reconhecidos pelos leitores. Fazemos jornalismo sem medos nem concessões. Não dependemos de grupos económicos nem do Estado. Não temos publicidade. Não temos dívidas. Não fazemos fretes. Fazemos jornalismo para os leitores, mas só sobreviveremos com o seu apoio financeiro. Apoie AQUI, de forma regular ou pontual.