Categoria: Sociedade

  • 33.333,33 euros: Bordalo II também é (agora) criativo no preço cobrado a entidades públicas

    33.333,33 euros: Bordalo II também é (agora) criativo no preço cobrado a entidades públicas


    Não é fácil definir o valor de uma obra de arte, e mais difícil ainda estabelecer o preço concreto de uma encomenda com dinheiros públicos. Mas a Junta de Freguesia da Carvoeira, no município de Mafra, em articulação com o escultor Bordalo II, decidiu inovar. O artista plástico preferido das entidades públicas – coleccionando 29 contratos desde 2018, sempre sem concorrência – ter-se-á ‘cansado’ de propor ou aceitar valores ‘redondos’ para as suas esculturas, e receberá da pequena autarquia da região da Grande Lisboa um montante muito sui generis: trinta e três mil, trezentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos. Os dinheiros públicos serão desviados de um programa operacional do Ministério da Agricultura.


    Da Arte, espera-se criatividade e ousadia. Mas a Junta de Freguesia da Carvoeira, no concelho de Mafra, e o artista Bordalo II decidiram supostamente elevar a Arte a outros níveis, transformando a parte menos interessante de uma futura escultura pública – o orçamento, isto é, o dinheiro pago pelos contribuintes ao artista – numa sátira.

    Na verdade, se uma obra de arte – mesmo daquelas sob a forma de escultura a colocar numa redonda rotunda, numa prazerosa praceta ou noutro qualquer recatado espaço público – tem um valor intangível, o artista tem de ver a ‘coisa trocada por miúdos’, ou seja, tem de receber o vil metal para comprar nem que seja batatas, porque Cultura só se consome e se faz com a barriga senão farta pelo menos saciada.

    Ora, Bordalo II – nome artístico de Artur Manuel Correia Bordalo da Silva – era até agora conhecido por ser o escultor com mais obras encomendas por entidades públicas. Nos últimos cinco anos contabilizam-se 29 encomendas públicas, sobretudo com autarquias locais (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia), mas onde há lugar para o ecletismo, tanto assim que a Lipor (empresa de tratamento de lixos do Grande Porto) já lhe comprou três esculturas, o Governo outras duas (em 2018 e 2020), o Governo Regional da Madeira outra e até universidades já ostentam as suas esculturas. De acordo com o Portal Base, a empresa de Bordalo II facturou, desde 2018, cerca de 775 mil euros em ajustes directos de entidades públicas.

    Mas se, até recentemente, os aspectos conceptuais da obra de Bordalo II tinham como ‘marca de água’ sobretudo o uso de materiais reciclados e a figuração de animais em formato gigante, a encomenda da Junta de Freguesia da Carvoeira pode marcar um ponto distintivo. Com efeito, até agora, a parte orçamental era um bocejo em todos os ajustes directos pela evidente falta de significado ou simbolismo. Por exemplo, o contrato de valor mais elevado, com a Lipor em 2019, estipula que “o preço contratual a pagar pelo Primeiro Outorgante é de 72.000.00€ (setenta e dois mil euros), a que acresce o IVA à taxa legal de 6%”.

    O segundo mais elevado, contratualizado em 2021 com a Junta de Freguesia do Parque das Nações (Lisboa), sofre da mesma monotonia orçamental. A cláusula terceira determina que “o preço contratual da prestação de serviços objecto do presente Contrato é de 68.000,00€ (sessenta e oito mil euros) acrescido de IVA à taxa legal em vigor (6%)”.

    Uma das três obras de Bordalo II compradas pela Lipor.

    Praticamente, todos os outros contratos celebrados por entidades públicas para compra de obras de Bordalo II surgem no Portal Base com números redondos, com excepção de três: o primeiro assinado pela autarquia de Almada em 2018, pelo valor de 16.981,13 euros; o segundo contratualizado pela autarquia de Águeda no valor de 13.207,54 euros; e o terceiro é o da Junta de Freguesia da Carvoeira, que surge com o valor de 37.983,33 euros.

    Mas se os dois primeiros nada têm afinal de criativo – acrescentando o IVA de 6%, os valores da escultura ficam redondos (18.000 e 14.000 euros, respectivamente), já o orçamento da escultura para a Junta de Freguesia da Carvoeira é muito sui generis, porque não é nada redondo. Nada mesmo, parecendo mesmo um capricho ou uma ‘zombetice’ usando dinheiros públicos.

    Assim, ao contrário da generalidade dos outros contratos, aquele que foi assinado para colocar no próximo mês de Abril uma “escultura de grandes dimensões (aproximadamente 200x200x350) em material reciclado que deverá resistir a intempéries” naquela freguesia de Mafra, discrimina os custos de transporte e instalação: 4.650 euros. Isso significa que, em concreto, o valor da obra de arte em si mesma ficou com um valor estipulado de “trinta e três mil trezentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos”.

    Extracto do contrato celebrado entre a Junta de Freguesia da Carvoeira e a empresa Mundo Frenético, de Bordalo II, onde se estipula o preço da escultura.

    O PÁGINA Um questionou a presidente da autarquia da Carvoeira sobre como se determinara em concreto o valor da obra, e os motivos de tão estranho número, bem como a opção por Bordalo II. Numa primeira fase, a presidente da Junta de Freguesia, a social-democrata Andreia Duarte, começou por referir que “o preço base estabelecido baseia-se numa pesquisa de mercado prévia ao início do procedimento, bem como no valor aprovado na candidatura que irá financiar a obra de arte”, acrescentando que “dos artistas consultados, resultou a seleção daquele que no entender da Freguesia melhor correspondia aos objetivos da execução da obra de arte, nomeadamente utilização de materiais reciclados, experiência em obras semelhantes e notoriedade do trabalho desenvolvido”. 

    Na primeira resposta ao PÁGINA UM, a autarquia não identificava os eventuais artistas sondados, sendo certo que essa consulta terá sido feita de uma forma completamente informal, uma vez que Bordalo II não foi escolhido através dos procedimentos de consulta prévia, prevista no Código dos Contratos Públicos, mas sim por ajuste directo, sem qualquer concorrência.

    Depois de alguma insistência, a autarquia da Carvoeira acabou por indicar que “os nomes comerciais contactados [foram] Bordalo II, Skeleton Sea e José Cardoso Queiroz”, embora para efeitos práticos estes contactos, a terem ocorrido, não produziram qualquer efeito legal.

    Junta de Freguesia da Carvoeira, no concelho de Mafra. A pequena freguesia de características rurais, com menos de 3.000 habitantes, localiza-se a sul da Ericeira, onde desagua o rio Lizandro.

    Além de o valor definido para a obra de Bordalo II, há outros aspecto estranho nesta encomenda. De acordo com o contrato e as próprias informações da autarquia da Carvoeira, esta encomenda será financiada por um programa operacional do Ministério da Agricultura que visa apoiar pequenos investimentos nas explorações agrícola, pequenos investimentos na transformação e comercialização de produtos agrícolas, diversificação de actividades na exploração agrícola, mercados locais, promoção de produtos de qualidade locais e renovação de aldeias.

    Embora tenha de se encontrar algum espírito criativo para encaixar uma escultura gigante em materiais reciclados – excepto se incluírem, talvez, restos de foices, martelos, enxadas, cajados, samarras, sacos de serapilheira, botas de cano alto, etc. – num programa operacional para o sector agrícola, a Junta de Freguesia defende que “a criação de uma obra de arte, que relacione os elementos paisagísticos e ambientais locais, e que se torne um elemento de atração de visitantes e de sensibilização da comunidade local para a importância da preservação da biodiversidade, enquadra-se no conceito de valorização previsto da medida”.

    E a Junta de Freguesia da Carvoeira acrescenta também um ‘interessante’ aviso: “Esperemos que a notícia seja bem feita, e que não vos venha [ao PÁGINA UM] a prejudicar”.


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  • Universidade Nova de Lisboa anula concurso público para entregar obra a empresa com capital social de 5.000 euros

    Universidade Nova de Lisboa anula concurso público para entregar obra a empresa com capital social de 5.000 euros


    Para restaurar as fachadas e cobertura do edifício VIII do seu Campus, a Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade Nova de Lisboa, no Monte da Caparica, entregou a responsabilidade, a troco de 784.400 euros (IVA incluído) a uma pequena empresa de construção local, com sede em Almada, desconhecida do sector público, e que se dedica também ao arrendamento de imóveis e ao alojamento local. O contrato foi assinado ontem, e também ontem publicado no Portal Base, onde surge também a informação do prazo de execução.

    Até aqui tudo estaria bem, poque quem reabilita obras não está impedida do negócio do alojamento local, mas há aspectos que suscitam estranheza, que não foi esclarecida pela Universidade Nova de Lisboa. Por um lado, a obra foi adjudicada por ajuste directo a esta pequena empresa, com um capital social de apenas 5.000 euros,depois de um concurso público de que pouco se sabe.

    Consultando os documentos disponíveis no Portal Base, nada se sabe da causa principal para a empreitada ter ido parar de mão-beijada à Metrical – Engenharia, uma pequena empresa cuja dimensão poderia colocar a dúvida sobre a sua capacidade para dar garantias de execução da obra. Sabe-se apenas que em Agosto passado, a Universidade Nova de Lisboa lançou um concurso público, cujas candidaturas terminaram no início de Setembro. Mas em Outubro decidiu excluir todas as candidaturas, não havendo informação no Portal Base sobre quais as empresas que concorreram nem os motivos para a exclusão de todas. O silêncio da Universidade Nova de Lisboa perante os pedidos de esclarecimento do PÁGINA UM não ajudam a saber mais nada.

    Segundo o contrato firmado com a Metrical – Engenharia, a Universidade Nova de Lisboa invoca para o negócio ser feito por ajuste directo a alínea b) do n.º 1 do artigo 24º do Código dos Contratos Públicos, que refere a possibilidade de adjudicação directa quando “em anterior concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação para a formação de contratos de valor inferior aos limiares referidos nos n.os 2, 3 ou 4 do artigo 474.º, consoante o caso, todas as propostas ou todas as candidaturas tenham sido excluídas”.

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    Contudo, na ‘ficha’ com o resumo deste ajuste directo, disponível no Portal Base, o motivo invocado pela FCT – Nova para a entrega deste negócio directamente à Metrical, sem concurso, é “ausência de recursos próprios”. Como o PÁGINA UM não recebeu quaisquer informações ignora-se, por agora, se, por exemplo, a Metrical – Engenharia, foi uma das empresas que concorreram e foram excluídas.

    Por esclarecer, fica também o porquê de a escolha da FCT – Nova para o ajuste directo ter recaído sobre uma empresa sem qualquer anterior obra feita com entidades públicas. Ou seja, ignora-se quem foi o responsável que se lembrou de convidar a Metrical.

    Também por explicar fica o facto de no ajuste directo, na 1ª cláusula, ser indicado que a Metrical – Engenharia deve possuir alvará, entre outros, na subcategoria 12ª da 4ª categoria. Não se sabe se será um lapso, mas o facto é que no IMPIC-Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e Construção não consta que a empresa tenha esse alvará.

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    A Metrical – Engenharia tem como objecto da sociedade “projectos e construção de obras de construção civil públicas e privadas, compra e venda de bens móveis e bens imóveis, revenda dos adquiridos para esse fim, arrendamento, alojamento local, administração e gestão de patrimónios, elaboração de estudos e projectos”, além de “consultoria e actividades de engenharia e técnicas afins”.  

    Anteriormente, a empresa, criada em 2010 e com sede na freguesia de Laranjeiro e Feijó, em Almada, usava a denominação JG Rabaço, e dedicava-se a remodelações e limpezas, tendo adoptado a nova designação de Metrical – Engenharia em 2021.

    O contrato entre a FCT – Nova e a Metrical – Engenharia, Lda integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 14 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

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    Ontem, dia 14 de Dezembro, no Portal Base foram divulgados 890 contratos públicos, com preços entre os 3,70 euros – para aquisição de lixa de madeira, pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, através de consulta prévia – e os 51.046.250,00 euros – para aquisição de serviços para a exploração do Centro de Contacto do SNS 24, pelos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 14 contratos, dos quais nove por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro e três por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 17 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Universidade Nova de Lisboa (com a Metrical – Engenharia, no valor de 740.000,00 euros); Município de Santo Tirso (com a Rede Ambiente – Engenharia e Serviços, no valor de 677.806,43 euros); Gabinete Nacional de Segurança (com a Paradigma Resiliente, no valor de 610.388,00 euros); Eda Renováveis (com a Nalco Española, no valor de 388.901,85 euros); Empresa Intermunicipal de Ambiente do Pinhal Interior (com a CTT – Correios de Portugal, no valor de 380.000,00 euros); três do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (dois com a General Electric Healthcare, um no valor de 350.911,84 euros e outro no valor de 323.918,63 euros, e outro com a Drager Portugal, no valor de 192.102,20 euros); Unidade Local de Saúde de Matosinhos (com a Servier Portugal, no valor de 296.010,00 euros); Guarda Nacional Republicana (com a Fine Facility Services, no valor de 267.233,33 euros); Infraestruturas de Portugal (com a Ground Transportation Systems Portugal, no valor de 198.900,00 euros); Centro Hospitalar do Médio Tejo (com a Ambulâncias de Stª. Maria de Alcobaça, no valor de 175.000,00 euros); Centro Hospitalar de Leiria (com a Beckman Coulter Portugal, no valor de 158.061,60 euros); Escola Secundária Ribeira Grande (com a Caetano, Raposo & Pereiras, Lda., no valor de 147.798,78 euros); Associação de Transferência de Tecnologia da Asprela (com a Grupo 8 – Vigilância e Prevenção Electrónica, no valor de 134.208,88 euros); Hospital de Braga (com a Albino Dias de Andrade, Lda., no valor de 124.037,20 euros); e o Município de Amarante (com a Rubis Energia Portugal, no valor de 104.554,40 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 14 de Dezembro

    1 Serviços para a exploração do Centro de Contacto do SNS 24 – Lote 1

    Adjudicante: SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde

    Adjudicatário: MEO – Serviços de Comunicações e Multimédia

    Preço contratual: 51.046.250,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Serviços para a exploração do Centro de Contacto do SNS 24 – Lote 2

    Adjudicante: SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde

    Adjudicatário: NTT Data Portugal

    Preço contratual: 2.500.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso publico


    3Empreitada para a instalação de sistema de Retorno de Corrente de Tracção e Terras de Protecção em várias estações

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: EIP – Serviços

    Preço contratual: 2.237.026,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Prestação de serviços de fiscalização e vigilância em autocarros e carros elétricos

    Adjudicante: Sociedade de Transportes Colectivos do Porto

    Adjudicatário: Praxis – Segurança    

    Preço contratual: 1.864.730,64 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Empreitada de manutenção de condutas prioritárias de abastecimento de água

    Adjudicante: CMPEAE – Empresa de Águas e Energia do Município do Porto

    Adjudicatário: Redegás – Projecto e Instalações de Gás

    Preço contratual: 1.170.450,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 14 de Dezembro

    1 Reabilitação das fachadas e cobertura do edifício VIII do Campus da FCT NOVA

    Adjudicante: Universidade Nova de Lisboa

    Adjudicatário: Metrical – Engenharia

    Preço contratual: 740.000,00 euros


    2Serviços de recolha de resíduos urbanos e de limpeza urbana

    Adjudicante: Município de Santo Tirso

    Adjudicatário: Rede Ambiente – Engenharia e Serviços

    Preço contratual: 677.806,43 euros


    3Desenvolvimento evolutivo de novos módulos para o PANORAMA (ano 2023 – 2024)

    Adjudicante: Gabinete Nacional de Segurança

    Adjudicatário: Paradigma Resiliente

    Preço contratual: 610.388,00 euros


    4Fornecimento de até 58.050 kg de inibidor Nalco pHREEdom 5200M

    Adjudicante: Eda Renováveis

    Adjudicatário: NALCO Española      

    Preço contratual: 388.901,85 euros 


    5Aquisição de serviços de distribuição postal por um período de 12 meses

    Adjudicante: APIN – Empresa Intermunicipal de Ambiente do Pinhal Interior

    Adjudicatário: CTT – Correios de Portugal   

    Preço contratual: 380.000,00 euros


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  • Universidade do Porto ‘presa’ a uma tenda de 4.000 euros por mês

    Universidade do Porto ‘presa’ a uma tenda de 4.000 euros por mês


    A Universidade do Porto está a pagar mais de 4.000 euros por mês pelo aluguer de uma tenda instalada nos jardins de um palacete de que é proprietária, a Casa do Primo Madeira, onde funciona o Círculo Universitário do Porto. O aluguer, iniciado no ano passado e que poderá durar pelo menos até 2025, vai orçar em cerca de 245 mil euros, mas a Reitoria achou por bem assumir esse encargo que beneficia uma empresa de dois netos do fundador da Mota-Engil, Manuel António da Mota. Para justificar os contratos por ajuste directo à Saiotes & Etc, a Reitoria alega nos dois últimos contratos, o mais recente assinado na segunda-feira passada, que não existe concorrência por “motivos técnicos”.


    Sem concurso, alegando inexistência de concorrência por “motivos técnicos”, a Universidade do Porto vai pagar uma pequena fortuna para alugar uma tenda montada nas suas próprias instalações, no jardim do Círculo Universitário do Porto. A Universidade diz que precisa do equipamento, nomeadamente para o subalugar para a realização de eventos, sobretudo casamentos, mas a forma como justifica um ajuste directo por suposta ausência de concorrência, mostra sobretudo uma estória com algumas pontas soltas.

    O contrato adjudicado por ajuste directo, assinado na passada segunda-feira, prevê que, até ao final de 2025, a Universidade pagará mais de 4.000 euros por mês à Saiotes e Etc – Festas Lda., proprietária do equipamento. No total, a Universidade poderá desembolsar 112.634,38 euros neste aluguer, se houver a prorrogação prevista para 2025, que também incluiu mais de 11 mil euros para manutenção preventiva e corretiva. Ou seja, estamos perante um aluguer de uma tenda nos terrenos que pertencem ao ‘inquilino’, sendo que o ‘inquilino’, além da renda, paga os arranjos da tenda.

    O pavilhão alugado pela Universidade do Porto é propriedade da Saiotes & Etc. – Festas e foi instalado no jardim do Círculo Universitário do Porto em 2016 pela antiga concessionária do Círculo, com autorização da Universidade.

    A justificação da Universidade para a atribuição deste negócio sem concurso é de que não existe uma alternativa, ou seja, uma outra empresa no mercado que instale e alugue um pavilhão-tenda equipado com as mesmas características, embora o mercado seja abundante neste tipo de estruturas.

    Mas a Universidade do Porto garantiu ao PÁGINA UM que a única empresa a quem pode alugar um equipamento similar é mesmo só a Saiotes & Etc – Festas Lda., uma vez que esta empresa já seria a detentora de pavilhão-tenda entretanto montado naquele espaço universitário.

    A empresa em causa é uma sociedade por quotas, organizadora de eventos, que tem a particularidade de ter como sócios-gerentes os irmãos Maria Clara Mota de Meireles Mendes e António Mota de Meireles – netos do fundador da construtora Mota-Engil, Manuel António da Mota. Maria Clara Mendes é, aliás, uma das administradoras da Fundação Manuel António da Mota no mandato de 2022-2025, sendo também sócia-gerente, com o irmão, da Verotâmega, uma sociedade Imobiliária detida em parceria com a mãe e irmã.

    Fachada do palacete do Círculo Universitário do Porto. Nos jardins foi autorizada a instalação de uma tenda desde 2016. A Reitoria agora paga uma renda mensal de mais de 4.000 euros.

    Este aluguer não é o primeiro pela Universidade do Porto à empresa Saiotes & Etc, mas é aquele que consolida um ‘facto consumado’. Em Fevereiro do ano passado, as duas partes tinham celebrado um contrato de aluguer por três meses, no valor de 15.200 euros, mas aí a fundamentação para o ajuste directo foi por estar abaixo dos 20 mil euros. Em Junho seria celebrado outro contrato, com uma renda mensal de 3.750 euros acrescidas de despesas de manutenção, que se prolongou até finais de Outubro deste ano. Neste caso, o ajuste directo já passou a ser justificado por ausência de concorrência por “motivos técnicos”.

    Mas afinal quais são os “motivos técnicos” que impedem a realização de um concurso público pela Universidade do Porto, com a possibilidade de outras empresas fazerem propostas mais aliciantes? Ou qual o motivo para a Universidade do Porto não assumir os custos da instalação da tenda e depois a concessionar, em vez de optar por alugar um espaço nos seus próprios terrenos?

    Segundo o director de comunicação da Reitoria da Universidade do Porto, Raul Santos, “o aluguer ou a aquisição permanente de outra estrutura semelhante implicaria custos superiores a este contrato”. Aos olhos da Universidade do Porto, o aluguer da tenda é essencial se quiser obter receitas com o subaluguer do espaço para a realização de casamentos, festas e outros eventos, já que o pavilhão/tenda tem capacidade para 400 pessoas e está já equipado.

    Maria Clara Mota Mendes, sócia-gerente da Saiotes & Etc. – Festas e administradora
    da Fundação Manuel António da Mota.

    De acordo com a mesma fonte, a origem do pavilhão da Saiotes & Etc remonta a 2016, quando então existia uma concessão dos espaços do Círculo Universitário a um empresa privada, a Silva Carvalho. Na altura, a montagem da estrutura da tenda da Saiotes & Etc obteve “autorização da Universidade” e “tem licença de utilização”. Porém, não existe qualquer contrato para a instalação da tenda disponível no Portal Base, visto que o negócio acabou por ser realizado entre duas entidades privadas, não se sabendo, por isso, os moldes em que foi feito. Aparentemente, a Universidade do Porto não salvaguardou os interesses para a situação, que se veio a verificar, de assumir novamente a gestão do Círculo Universitário.

    Na altura da montagem da tenda em 2016, o objectivo da empresa concessionária (Silva Carvalho) foi substituir uma outra já existente mas em mau estado. O Círculo era então gerido pela Associação de Estudantes e que “estava em mau estado”. Mas durante a sua gestão pela Associação, o Círculo Universitário do Porto entrou em grave crise financeira com suspeitas de fraude, e a Universidade acabou por assumir a posse e as dívidas, tendo então decidido concessioná-lo até Novembro de 2021. Depois dessa data, a Reitoria assumiu a sua gestão.

    A opção pela compra de uma tenda colocou-se, mas de acordo com Raul Santos, “uma consulta ao mercado demonstrou que, atualmente, a aquisição de um pavilhão semelhante representaria um investimento superior a 280 mil euros, acrescido de IVA e do custo associado às respetivas infraestruturas necessárias para o funcionamento do espaço, nomeadamente: fundações, cozinha, instalações sanitárias, redes de saneamento, redes elétricas, entre outras”.

    Por outro lado, acrescenta a mesma fonte, “a desmontagem e a construção de um novo pavilhão, traduzir-se-ia em lucros cessantes para a Universidade, uma vez que obrigaria à paragem da atividade do Círculo Universitário [durante algum tempo], o que representaria um prejuízo de receita, na medida em que este espaço tem vindo a ser rentabilizado através do aluguer para eventos privados, existindo uma calendarização considerável de eventos já contratualizados”, justificou. Em todo o caso, saliente-se, com os três contratos por ajuste directo (alegando em dois dos casos uma norma de questionável aplicação (ausência de concorrência por “motivos técnicos”) já ascendem a quase 245 mil euros, IVA incluído, e quando chegar ao final de 2025. E novo aluguer terá de ser concretizado se a Reitoria quiser continuar a ter uma tenda no Círculo Universitário.

    Ricardo Magalhães, director-executivo da Saiotes & Etc disse ao PÁGINA UM que a compra do equipamento pela Universidade do Porto “já esteve em cima da mesa”, mas “o negócio não foi para a frente”. Até porque a compra da tenda equipada só faria sentido se a estratégia da Universidade passasse por manter o negócio de a alugar para a realização de eventos, o que não é certo. O responsável pela empresa garantiu ainda que se a Universidade optar por não usar a tenda a desmontagem será fácil, sendo necessário retirar apenas também os contentores que compõem a cozinha e WCs de apoio.

    Além dos três contratos já efectuados com a Universidade do Porto, a Saiotes & Etc tem apenas mais um contrato registado no Portal Base, com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, no valor de 19.988 euros. Neste último caso, o contrato, também por ajuste directo, diz respeito a “aquisição de serviços de apoio, promoção e suporte técnico” do ‘Fórum Social do Porto’.

    O Círculo Universitário do Porto está instalado num palacete oitocentista, denominado Casa do Primo Madeira, localizado na Rua do Campo Alegre. Nos anos de 1980 foi sujeita a obras de reabilitação pelo arquitecto Fernando Távora, que lhe valeu o Prémio João de Almada, para recuperação do património arquitectónico da cidade do Porto, quando já estava então na posse da Universidade.

  • Rua da Prata: Tecnovia fez todas as obras sem contrato

    Rua da Prata: Tecnovia fez todas as obras sem contrato


    Corria o dia 16 de Dezembro, e passava poucos minutos do meio-dia, surgiu a indicação de um buraco junto a um passeio da Rua da Prata, na Baixa de Lisboa. Depois viu-se que afinal era mais grave; que o colector de águas pluviais, antigo desde a época do Marquês de Pombal, estava em colapso entre a Rua Vitória e a Rua de São Nicolau. Fechou-se a via e começaram as obras, que se ‘eternizaram’ por um ano, sem muito mais se saber do que um anúncio recente de restringir o tráfego rodoviário depois da reparação do colector.

    Porém, o mais surpreendente é que os dias foram passando, e somente no mês de Setembro a autarquia liderada por Carlos Moedas decidiu, quando as obras já iam avançadas, começar a pensar na elaboração do contrato com a Tecnovia, a empresa rapidamente escolhida para uma intervenção imediata, enviando-lhe então o convite para que se formalizasse a empreitada. Setembro passou. Outubro também. Novembro idem. E só já depois das obras concluídas, depois da reabertura da Rua da Prata concretizada, e anunciada em definitivo a ‘pedonalização’ das vias, a autarquia de Lisboa e a Tecnovia acharam por bem assinar o contratos da obra feita. E dando-lhe efeitos reatroactivos.

    16 de Dezembro de 2022, Rua da Prata: quem olhasse para o abatimento não imaginaria que 12 meses depois houvesse uma factura para pagar de 1,5 milhões de euros numa obra que decorreu sem contrato em vigor.

    De facto, e contrariando o espírito e mesmo a legalidade do Código dos Contratos Públicos, somente anteontem, dia 11, a autarquia de Lisboa e a Tecnovia assinaram o contrato de uma obra que já fora executada e que apenas agora se sabe o valor final: 1.502.126,11 euros. Ora, o contrato estipula que “o prazo de execução da presente empreitada é de 355 (trezentos e cinquenta e cinco) dias, contados à data da consignação da obra em 19 de Dezembro de 2022”, ou seja, a execução do contrato ocorreu no dia anterior à sua assinatura. E salienta também que um milhão de euros será pago ainda este ano e a parte remanescente, cerca de meio milhão de euros, ficará para o próximo ano.

    Para justificar a assinatura de um contrato depois das obras finalizadas, numa das cláusulas alegou-se a “eficácia retroativa” – ou seja, a aplicação de algo já executado antes – invocando uma norma de excepção do Código dos Contratos Públicos, que prevê que “as partes podem atribuir eficácia retroactiva ao contrato quando exigências imperiosas de direito público o justifiquem, desde que a produção antecipada de efeitos não seja proibida por lei, não lese direitos e interesses legalmente protegidos de terceiros e não impeça, restrinja ou falseie a concorrência garantida pelo disposto no presente Código relativamente à formação do contrato”.

    A forma irregular, e de legalidade muito duvidosa, em que decorreram as obras adjudicadas pela autarquia fica patente no facto de a própria placa com a identificação da empreitada nunca ter tido a identificação do prazo de execução nem do valor da empreitada. Ou seja, se as obras da Rua da Prata se tivessem transformado numas novas obras de Santa Engrácia, a Tecnovia poderia ‘sair de mansinho’ sem quaisquer responsabilidades legais.

    Ajuste directo sem contrato enquanto as obras decorrem, sem prazo de execução e sem preço definido: um paraíso para o empreiteiro; uma factura que poderá ser pesada para uma entidade pública.

    Ou seja, podendo ser invocada a urgência, a inexistência de contrato ao longo de toda a duração da obra – sem que estivessem sequer salvaguardadas eventuais indemnizações e responsabilidades entre as partes, até em relação a terceiros – mostra-se de legalidade muito duvidosa, que será agora dirimida pelo Tribunal de Contas que ainda vai ter de dar o visto.

    Mesmo não desejando abordar em concreto a empreitada da Rua da Prata, Paulo Morais, professor universitário e ex-vice-presidente da Câmara Municipal do Porto, salienta que, por regra, o ajuste directo para solucionar intervenções desta natureza são justificáveis, mas apenas para o início das obras, “para uma estabilização do problema”, não devendo resultar numa ‘luz verde’ para adjudicações de toda a obra, que deveria merecer um concurso público.

    “Não parece aceitável que um contrato seja assinado depois da obra concluída”, defende Paulo Morais, acrescentando ser “expectável que, perante uma obra urgente, o contrato possa demorar algumas semanas até ser assinado, até para salvaguarda das partes, mas já foge do espírito do Código se aparece depois das obras concluídas”.

    Uma outra questão relevante, com incidência legal, sobre este ajuste directo prende-se com a escolha da Tecnovia pela autarquia de Carlos Moedas, que terá sido escolhida antes mesmo de se ter uma ideia precisa sobre a dimensão da obra. De acordo com o Código dos Contratos Públicos “não podem ser convidadas a apresentar propostas, entidades às quais a entidade adjudicante [neste caso, o município de Lisboa] já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores (…) propostas para a celebração de contratos cujo preço contratual acumulado seja igual ou superior” a 30.000 euros, no caso de empreitadas de obras públicas.

    Ora, ao longo deste ano, a Câmara Municipal de Lisboa fez mais oito ajustes directos com a Tecnovia para pequenas intervenções que totalizaram 88.559 euros (sem IVA), das quais se destaca a estabilização urgente de terrenos na Rua da Cruz a Alcântara, junto à Avenida de Ceuta, contratualizada em Setembro passado por 54.210 euros.

    Mas no final do ano passado, o município de Carlos Moedas já adjudicara por ajuste directo outro ajuste directo por alegada “urgência imperiosa” para a reabilitação do Viaduto da Avenida Mouzinho de Albuquerque sobre a linha do Norte por um preço de 232.257 euros.

    Além destes contratos de ‘mão-beijada’ – em que se mantém sempre o mistério sobre quem ‘pega no telefone’ para entregar empreitadas a determinada empresa a serem pagas pelo erário público – a Tecnovia também obteve mais dois contratos mas por concurso público: um em Agosto passado para a “execução de obras prioritárias e urgentes de conservação e manutenção de obras de arte, no valor de 650.000 euros, e outro em Fevereiro do ano passado para diversas obras, também prioritárias e urgentes”, de conservação e manutenção de muros e vedações. Mas aí a Tecnovia teve de ‘fazer pela vida’, candidatar-se contra a concorrência, e fazer por merecer a adjudicação e os dinheiros públicos por justa retribuição de serviços prestados.

    O contrato entre o município de Lisboa e a Tecnovia integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 6 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV

    Nota: Fotos das obras, da autoria de Frederico Duarte Carvalho.


    Ontem, dia 12 de Dezembro, no Portal Base foram divulgados 884 contratos públicos, com preços entre os 19,95 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Centro Hospitalar Tondela-Viseu, ao abrigo de acordo-quadro – e os 34.128.000,00 euros – para fornecimento de energia eléctrica, pelo Município de Lisboa, também ao abrigo de acordo-quadro.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 12 contratos, dos quais oito por concurso público, três ao abrigo de acordo-quadro e um por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 17 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Município de Lisboa (com a Tecnovia – Sociedade de Empreitadas, no valor de 1.417.100,11 euros); seis do Hospital de Braga (um com a Siemens Healthcare, no valor de 462.600,00 euros, dois com a Johnson & Johnson, um no valor de 462.563,53 euros e outro no valor de 271.073,62 euros, outro com a Smith & Nephew, no valor de 329.501,28 euros, outro com a Medicinália Cormedica, no valor de 247.376,00 euros, e outro com a Boston Scientific Portugal, no valor de 112.644,00 euros); Centro Hospitalar Tondela-Viseu (com a Takeda – Farmacêuticos Portugal, no valor de 309.031,20 euros); Ministério da Defesa Nacional – Marinha (com a Leonardo MW LTD, no valor de 217.232,97 euros); dois da Rádio e Televisão de Portugal (um com a Avantools, no valor de 182.669,00 euros, e outro com a Vantec, no valor de 143.923,00 euros); Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia – Espinho (com a Luso Palex, no valor de 131.725,00 euros); Instituto de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (com a Multicert – Serviços de Certificação Electrónica, no valor de 130.000,00 euros); Hospital Garcia de Orta (com a Pharmakern Portugal, no valor de 127.500,00 euros); Infraestruturas de Portugal (com a SMA und Partner AG, no valor de 125.000,00 euros); Estado-Maior-General das Forças Armadas (com a Alpha C2, no valor de 117.204,05 euros); e o Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira (com a Sanofi, no valor de 103.998,48 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 12 de Dezembro

    1 Fornecimento de energia eléctrica a instalações e escolas municipais

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Iberdrola Clientes

    Preço contratual: 34.128.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    2Empreitada de beneficiação de troço em Castro Daire

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: Construções Carlos Pinho, Lda.       

    Preço contratual: 6.184.531,43 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Empreitada designada “Unidade de Saúde Familiar do Parque das Nações”

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Construções Corte Recto – Engenharia & Construção       

    Preço contratual: 5.983.365,97 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de serviços de viagens aéreas, alojamentos e serviços conexos, para um período de 36 meses

    Adjudicante: Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal

    Adjudicatário: Transalpino – Viagens e Turismo

    Preço contratual. 4.353.587,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Reabilitação de bairro municipal em Sacavém – PRR

    Adjudicante: Município de Loures

    Adjudicatário: Wikibuild, S.A.

    Preço contratual: 3.498.659,56 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 12 de Dezembro

    1 Empreitada de execução de trabalhos urgentes no colector da Rua da Prata

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Tecnovia – Sociedade de Empreitadas

    Preço contratual: 1.417.100,11 euros


    2Upgrade da Ressonância Magnética     

    Adjudicante: Hospital de Braga

    Adjudicatário: Siemens Healthcare

    Preço contratual: 462.600,00 euros


    3Aquisição de material de ortopedia

    Adjudicante: Hospital de Braga

    Adjudicatário: Johnson & Johnson   

    Preço contratual: 462.563,53 euros


    4Aquisição de material de consumo clínico diverso

    Adjudicante: Hospital de Braga

    Adjudicatário: Smith & Nephew

    Preço contratual: 329.501,28 euros


    5Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Tondela-Viseu

    Adjudicatário: Takeda – Farmacêuticos Portugal     

    Preço contratual: 309.031,20 euros


    MAP

  • Marinha garante ‘banhos de sol’ seguros com 64 mil euros de  protector solar

    Marinha garante ‘banhos de sol’ seguros com 64 mil euros de protector solar


    Quem vai ao mar avia-se em terra. E, nessa linha, ainda mais sentido faz se for a própria Marinha, liderada pelo almirante Gouveia e Melo, a aviar-se em terra de produtos essenciais para se ir para o mar: protectores solares.

    Já se sabe que o Portal Base é uma ‘caixinha de surpresas’, onde podem surgir as mais estranhas aquisições dos mais variados produtos e serviços. Os protectores solares são apenas mais um produto nessa lista de curiosidades, constando apenas 11 contratos explicitamente registados na última década na plataforma das compras públicas. Mais curioso ainda é que, até agora, só houve três compradores: o município de Oeiras (quatro compras), os Serviços Intermunicipalizados de Águas e Resíduos dos Municípios de Loures e Odivelas (quatro contratos), e por fim a Marinha (três contratos).

    Contudo, o ramo das Forças Armadas – liderado pelo homem que ficou conhecido como coordenador da task force da vacinação contra a covid-19 – destaca-se dos outros, não apenas pelos montantes mais elevados, mas sobretudo pelas idiossincrasias das compras que, recentemente, envolveram uma compra que estava para se fazer após consulta prévia, mas que acabou por ter um concurso público, entretanto rectificado, e que terminou com duas aquisições: uma de 5.640 euros, à empresa Madrigale, e outra de 64.158 euros à empresa Ribcab. Antes desta recente compra, a anterior ocorrera em meados de Dezembro de 2020, mas envolvendo pouco mais de 14 mil euros.

    O PÁGINA UM, através dos documentos constantes do Portal Base, não conseguiu perceber as quantidades de protector solar que efectivamente foram compradas pela Marinha, porque nenhum destes contratos foi reduzido a escrito. No caso do contrato com a Madrigale há uma justificação legal, por o contrato ser inferior a 10 mil euros, mas na compra maior (64.158 euros) estamos perante uma ilegalidade. A instituição militar também não se dispõe a responder aos pedidos de esclarecimentos do PÁGINA UM.

    Aliás, pela análise dos documentos dos diversos procedimentos, verifica-se que esta compra de protectores solares não foi tarefa fácil, porque em Maio deste ano houve uma recomendação da directora do Departamento de Logística Sanitária da Marinha, a capitão-de-fragata Helena Fernandes para se comprar esses produtos, onde se refere que “para efeitos da consulta prévia sugerem-se as seguintes empresas: Ribcab Unipessoal, Lda.; Perrigo Portugal, Lda.; Laboratórios Dermatológicos da Utiage; [e] Pierre Fabre”.

    Com ajuste directo de mais de 64 mil euros, almirante Gouveia e Melo garante protecção contra ‘escaldões’. Mas com ajuste directo sem contrato escrito invocando uma justificação sem evidente enquadramento legal.

    Porém, a decisão da cúpula da Marinha terá sido de incluir outros produtos e lançar um concurso público. Assim, no passado dia 26 de setembro anunciou-se a abertura de candidaturas para fornecimento de protectores solares, com um preço-base de 64.158 euros, de repelentes, com um preço-base de 13.250 euros, e de bolsas de primeiros socorros, com um preço-base de 6.850 euros.

    Esse anúncio seria rectificado no dia seguinte – ignorando-se que aspectos foram alterados –, surgindo no anexo ao caderno de encargos a listagem dos diversos lotes. No caso dos protectores solares, a Marinha queria adquirir 6.000 embalagens de 200 mililitros com factor (FPS) 50+, mais 1.000 embalagens de 50 mililitros e ainda 35 sticks labiais.

    Contudo, apesar de o concurso público ter sido concluído – com três candidatos: Epjmédica, Tecniquitek e Madrigale –, a Marinha decidiu apenas fazer um contrato de 5.640 euros, mas ignora-se a que lote (protectores solares, repelentes ou bolsas), porque a Marinha optou por invocar uma norma do Código dos Contratos Públicos para não reduzir o contrato a escrito. Este contrato foi assinado em 24 do mês passado.

    Certo é que, sem se conhecer detalhes do concurso, a Marinha acabou por assinar um ajuste directo com a Ribcab na terça-feira passada, no valor de 64.158 euros, e com um prazo de entrega dos protectores solares de apenas cinco dias. No registo do Portal Base justifica-se o ajuste directo com base numa norma do Código dos Contratos Públicos que o autoriza, se num anterior “concurso público todas as propostas ou todas as candidaturas tenham sido excluídas”. Resta saber quais os motivos para a exclusão das candidaturas e se a Ribcab também foi excluída ou se o concurso foi anulado porque não seria a Ribcab a vencedora. E sobretudo também seria necessário perceber a razão pela qual a Marinha justifica a não redução a escrito do contrato invocando a excepção para os casos de aquisições de valor inferior a 10 mil euros quando a compra de protectores solares foi de mais de 64 mil euros. Aliás, sem contrato nem sequer se sabe se as quantidades adquiridas são as mesmas que estavam previstas no caderno de encargos.

    Face ao silêncio da Marinha, pelo menos fica-se a saber que os marinheiros, mesmo talvez nos submarinos que o almirante Gouveia e Melo em tempos ‘capitaneou’, não haverá, previsivelmente, ‘escaldões’. Protector solar deverá haver para ‘dar e vender’ como nunca.

    O contrato entre a Marinha e Ribcab integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 7 e 10 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


    Nos últimos quatro dias, de quinta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 953 contratos públicos, com preços entre os 1,00 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Hospital de Braga, através de ajuste directo – e os 6.487.190,94 euros – para aquisição de energia eléctrica, pelo Metropolitano de Lisboa, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 16 contratos, dos quais 12 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro e dois por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 24 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Instituto da Segurança Social (com a Powershield – Segurança Privada, no valor de 971.416,71 euros); oito do Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (um com a Roche Farmacêutica, no valor de 650.117,10 euros, outro com a Bausch & Lomb, no valor de 276.992,38 euros, dois com a Sanofi, um no valor de 257.535,60 euros e outro no valor de 212.697,40 euros, outro com a Gilead, no valor de 161.250,00 euros, outro com a Alloga Logifarma, no valor de 129.116,70 euros, outro com a Daiichi Sankyo, no valor de 128.000,00 euros, e outro com a Astellas Farma, no valor de 108.000,00 euros); Unidade Local de Saúde de Matosinhos (com a Astellas Farma, no valor de 445.500,00 euros); Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (com a Bloomberg, no valor de 300.000,00 euros); dois do do Hospital de Braga (um com a Alcon Portugal, no valor de 274.221,74 euros, e outro com a RB Pharma, no valor de 200.588,25 euros); Rádio e Televisão de Portugal (com a Avantools – Serviços e Equipamentos, no valor de 269.204,28 euros); Unidade Local de Saúde do Alto Minho (com a Pfizer, no valor de 261.037,40 euros); Infraestruturas de Portugal (com a Evolaje – Estruturas de Betão e Pré-Fabricados, no valor de 243.301,80 euros); Hospital Garcia de Orta (com a B. Braun Medical, no valor de 235.895,76 euros); Universidade de Coimbra (com a Icnas Pharma, no valor de 202.749,20 euros); Estado-Maior-General das Forças Armadas (com a ViiV HIV Healthcare, no valor de  171.600,00 euros); Hospital Distrital da Figueira da Foz (com a Sanofi, no valor de  156.724,40 euros); Município de Portimão (com a Carlos Manuel Pacheco, Lda., no valor de 110.000,00 euros); Serviços Intermunicipalizados de Águas e Resíduos dos Municípios de Loures e Odivelas (com a Algeco – Construções Pré-Fabricadas, no valor de 105.015,95 euros); Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (com a  Takeda – Farmacêuticos, no valor de 103.000,00 euros); e o Instituto do Emprego e da Formação Profissional (com a Soft2000 – Sociedade Portuguesa de Software, no valor de 100.116,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 7 a 10 de Dezembro

    1 Aquisição de energia eléctrica

    Adjudicante: Metropolitano de Lisboa

    Adjudicatário: Acciona Green Energy Developments

    Preço contratual: 6.487.190,94 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Empreitada de construção de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas e Centro de Dia Serviço de Apoio Domiciliário

    Adjudicante: Associação Unitária de Reformados, Pensionistas e Idosos do Casal do Marco

    Adjudicatário: NOW XXI – Engenharia & Construções       

    Preço contratual: 3.695.089,24 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Empreitada de reabilitação de infraestruturas da AdVT – Fase 5

    Adjudicante: Águas do Vale do Tejo

    Adjudicatário: Redecor – Revestimentos de Proteção e Decoração          

    Preço contratual: 2.497.069,99 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Empreitada de melhoria das condições de segurança da Barragem do Maranhão – Fase 2

    Adjudicante:  Associação de Regantes e Beneficiários do Vale do Sorraia

    Adjudicatário: Extraco, Construccións e Proxectos, S.A.

    Preço contratual: 1.955.013,85 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Aquisição de refeições destinadas a crianças e alunos das creches de educação pré-escolar e do 1º ciclo

    Adjudicante: Secretaria Regional de Educação, Ciência e Tecnologia

    Adjudicatário: Gertal – Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação

    Preço contratual: 1.680.581,76 euros

    Tipo de procedimento: Concurso limitado por prévia qualificação


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 7 a 10 de Dezembro

    1 Aquisição de serviços de vigilância e segurança

    Adjudicante: Instituto da Segurança Social

    Adjudicatário: Powershield – Segurança Privada

    Preço contratual: 971.416,71 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro

    Adjudicatário: Roche Farmacêutica

    Preço contratual: 650.117,10 euros


    3Fornecimento de substância activa

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de Matosinhos

    Adjudicatário: Astellas Farma

    Preço contratual: 445.500,00 euros


    4Prestação de serviços de informação financeira

    Adjudicante: Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões

    Adjudicatário: Bloomberg      

    Preço contratual: 300.000,00 euros


    5Aquisição de lentes

    Adjudicante: Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro

    Adjudicatário: Bausch & Lomb

    Preço contratual: 276.992,38 euros


    MAP

  • Loures: ‘Urgência imperiosa’ sem fundamentação serve para dar milhões de euros em contratos obscuros

    Loures: ‘Urgência imperiosa’ sem fundamentação serve para dar milhões de euros em contratos obscuros


    A autarquia de Loures alegou por três vezes na última quinzena de Novembro uma pretensa “urgência imperiosa” para entregar três empreitadas de grande dimensão por simples ajuste directo sem sequer se preocupar em fazer um contrato escrito. Além disto, em duas dessas obras, as empresas beneficiadas – STAP e Alves Ribeiro – nem sequer deveriam ter sido escolhidas se se aplicasse o espírito subjacente ao Código dos Contratos Públicos que estabelece limites para a entrega de contratos de ‘mão-beijada’, isto é, contratos onde os adjudicatários não têm o incómodo da concorrência nem as entidades públicas a necessidade de serem transparentes.

    No seguimento da recente notícia revelando que o município liderado pelo socialista Ricardo Leão tinha adjudicado um muro de suporte com um custo de 1,02 milhões de euros à empresa STAP, o PÁGINA UM detectou mais dois ajustes directos divulgados ontem no Portal Base em que se alega, mais uma vez, a “urgência imperiosa” para estender uma ‘passadeira vermelha’ à Alves Ribeiro e à Teixeira Duarte.

    Ricardo Leão, presidente da autarquia de Loures, promove ajustes directos de mais de um milhão de euros sem contrato escrito.

    No primeiro caso, o contrato foi de cerca de 334 mil euros (IVA incluído), e visará a concepção e construção de passagem hidráulica do Caminho do Boição de Cima, em Bucelas, enquanto no segundo contrato atinge quase 974 mil euros, para a contenção dos taludes no Bairro da Bela Vista, em Santo António dos Cavaleiros.

    Uma vez que nenhum destes contratos tem sequer caderno de encargos nem qualquer outra peça procedimental foi divulgada no Portal, não se consegue perceber se as obras em causa se localizam em terrenos públicos, ou se a autarquia se está a substituir a responsabilidades de terceiros. Nos três ajustes directos é apenas invocada, na plataforma dos contratos públicos, a impossibilidade de se cumprir os prazos para os outros procedimentos (como concurso público, incluindo urgente, ou de consulta prévia) por motivos de “urgência imperiosa”.

    Mas a autarquia simplesmente invoca a norma, em vez de apresentar a “Fundamentação” como é exigido no Portal Base, gerido pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção. Aliás, é também a suposta “urgência imperiosa” que determina a possibilidade da não redução a escrito de um contrato. Uma possibilidade que a Câmara Municipal de Loures tem aproveitado, mesmo em contratos de largas centenas de milhar ou mesmo mais de um milhão de euros, em que se esperaria maior transparência.

    Cascata da Boiça, perto de Bucelas. Autarquia de Loures decidiu agora reabilitar os caminhos em redor, que já estavam em mau estado desde o ano passado, através de ajuste directo invocando, sem justificar, “urgência imperiosa”, e sem contrato. Nem sequer se sabe se os caminhos são públicos.

    Com efeito, num levantamento do PÁGINA UM aos 29 ajustes directos acima de 100 mil euros celebrados pela autarquia de Loures desde 2021, e já publicados no Portal Base, encontram-se 11 em que se invoca a “urgência imperiosa”, envolvendo um total de quase 3,1 milhões de euros. Destes, seis foram de empreitadas de obras públicas, que beneficiaram a Alves Ribeiro (dois contratos no valor total de quase 600 mil euros, IVA incluído), a STAP (também dois contratos, envolvendo um total de mais de 1,2 milhões de euros), a Obragoito (um contrato de 265 mil euros) e a Teixeira Duarte (um contrato de 974 mil euros).

    Neste lote de seis ajustes directos de empreitadas de obras públicas, apenas em dois contratos a autarquia justificou verdadeiramente o recurso ao ajuste directo e à opção pela não redução a escrito do contrato, após as fortes chuvadas há exactamente um ano na Área Metropolitana de Lisboa. Para reparar vias públicas, o município de Loures escolheu a dedo a Alves Ribeiro e a Obragoito e entregou a cada uma 265 mil euros (IVA incluído), mas pelo menos referiu-se nos registos que a “urgência imperiosa” se justificou ”em resultado dos fenómenos atmosféricos extremos e imprevisíveis ocorridos nos dias 7 e 8 de dezembro de 2022, [em que] houve necessidade de uma atuação e intervenção urgentes com vista à reposição e restabelecimento das condições mínimas de circulação e segurança para pessoas e bens, e ao afastamento do perigo real e imediato no terreno, a qual não é compatível com o desenvolvimento de um procedimento pré-contratual comum.”

    Saliente-se, contudo, que a alegação, com ou sem uma fundamentação válida, para um procedimento de ajuste directo não é uma ‘luz verde’ para não haver contrato escrito. Na verdade, constitui uma opção política de não-transparência, uma vez que existem outros ajustes directos, mesmo na autarquia de Loures, em que, invocando-se a “urgência imperiosa” se publicaram contratos escritos.  

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    Mais polémico ainda é a escolha arbitrária das empresas de construção civil pela autarquia de Loures sob a alegação de se estar perante situações de “urgência imperiosa” que não são da sua responsabilidade. O artigo 113º do Código dos Contratos Públicos refere que, no caso de empreitadas de obras públicas, “não podem ser convidadas a apresentar propostas, entidades às quais a entidade adjudicante [neste caso, a autarquia de Loures] já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores (…) propostas para a celebração de contratos cujo preço contratual acumulado seja igual ou superior” a 30.000 euros. Este limite serve para que não haja entidades beneficiadas sistematicamente, quebrando as regras de livre concorrência e a boa gestão dos dinheiros públicos.

    Ora, entre os recentes contratos por ajuste directo celebrados pela autarquia de Loures, estão duas empresas que, no último triénio (2021, 2022 e 2023) repetiram ajustes directos acima de 30 mil euros: a STAP, como referido já pelo PÁGINA UM, e a Alves Ribeiro. Esta segunda empresa, além dos dois ajustes directos por “urgência imperiosa”, teve direito a receber também de ‘mão-beijada’ (sem concorrência) a empreitada para a preparação dos terrenos da Bobadela para a recepção da Jornada Mundial da Juventude. Pelo menos essa é a referência (“Ajuste Direto Regime Geral”) que constava hoje no Portal Base, apesar de fonte da autarquia ter garantido ao PÁGINA UM que esse trabalho “não foi adjudicado por recurso à figura do ajuste direto, mas sim por via de convite, em sede de Consulta Prévia, a cinco entidades”, não identificando as outras quatro.

    Esta obra, aliás, beneficiou também de um regime de excepção por decisão governamental, e está a constituir uma ‘caixinha de surpresas’ para o erário público: depois de uma primeira adjudicação em Março deste ano por 4.442.200 euros (IVA incluído), já conta com duas modificações contratuais: a primeira em Julho, que subiu a factura para quase 4,8 milhões de euros (IVA incluído); e a segunda em Agosto, que subiu a ‘parada’ para os 4.995.110,98 euros. A diferença supera assim mais de meio milhão de euros, mas pode não parar por aqui porque actualmente surge o aviso de que o “contrato [está] em revisão”.

    A empresa Alves Ribeiro já teve direito a três ajustes directos da autarquia de Loures no último ano. O maior foi para a reabilitação dos terrenos da Bobadela para a Jornada Mundial da Juventude, que deviam ter custado cerca de 4,4 milhões de euros. Os trabalhos a mais fizeram a fasquia aproximar-se dos 5 milhões, mas as contas ainda não estão fechadas.

    O município de Loures tem, contudo, outra interpretação, “não houve qualquer violação do disposto no artigo 113º do Código dos Contratos Públicos, uma vez que se tratam de, em ambas as situações, procedimentos que não seguiram a tramitação geral da contratação pública, mas sim regimes especiais”, acrescentando que, além do caso das obras para a Jornada Mundial da Juventude, os outros contratos foram determinados por “critério material” (“urgência imperiosa” por alegados “fenómenos atmosféricos extremos verificados no território de Loures”).

    E a mesma fonte oficial da autarquia de Loures acrescenta ainda que “a escolha das entidades, em situações de manifesta urgência, são determinadas tendo por base o perfil e currículo de empresas com boas referências de mercado para a tipologia dos trabalhos a executar, bem como a disponibilidade de meios recursos face à urgência a que se pretende responder”. Ou seja, a atender pelas alegações do município de Ricardo Leão, se as empresas Alves Ribeiro e a STAP não existissem, estas obras de “urgência imperiosa” seriam adiadas, com prejuízo público, por não haver ninguém capaz de as executar.

    Dois dos contratos por ajuste directo concedidos pela Câmara Municipal de Loures alegando “urgência imperiosa” integram o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 6 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


    Ontem, dia 6 de Dezembro, no Portal Base foram divulgados 703 contratos públicos, com preços entre os 1,63 euros – para aquisição de material de ostomia, pelo Hospital de Braga, através de consulta prévia – e os 2.007.973,00 euros – para aquisição de updates/upgrades de software, pelo Instituto de Gestão Financeira da Educação, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 20 contratos, dos quais 13 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro, um por consulta prévia e quatro por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 7 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Estado Maior da Força Aérea (com a Saab, Inc., no valor de 1.239.975,00 euros); Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (com a Sanofi, no valor de 1.050.000,00 euros); dois do Município de Loures (um com a Teixeira Duarte – Engenharia e Construções, no valor de 918.835,50 euros, e outro com a Alves Ribeiro, S.A., no valor de 315.271,36 euros); Escola Secundária de Jaime Moniz (com a Porto Editora, no valor de 520.571,48 euros); Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (com a Johnson & Johnson, no valor de 233.710,00 euros); e o Município de Oeiras (com a Arquimetro – Projetos e Urbanismo, no valor de 210.000,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 6 de Dezembro

    1Aquisição de updates/upgrade de software e serviços de orquestração da Plataforma Digital da Educação (PDE)

    Adjudicante: Instituto de Gestão Financeira da Educação

    Adjudicatário: Normática, Serviços de Informática e Organização

    Preço contratual: 2.007.973,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Execução da empreitada “Complexo Residencial do Pinheiro Manso – Habitação Colaborativa”

    Adjudicante: Santa Casa da Misericórdia de Valpaços

    Adjudicatário: Anteros Empreitadas – Sociedade de Construção e Obras Públicas

    Preço contratual: 1.947.564,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Prestação de serviços para a recolha, transporte e envio a destino final de resíduos

    Adjudicante: Águas do Tejo Atlântico

    Adjudicatário: Blueotter – Circular

    Preço contratual: 1.896.917,84 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Construção do Pólo de pós-graduações

    Adjudicante: Instituto Politécnico de Santarém – Serviços Centrais

    Adjudicatário: Vomera Building Solutions

    Preço contratual: 1.888.250,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Aquisição de updates/upgrades de software e serviços de orquestração da Plataforma Digital da Educação (PDE)

    Adjudicante: Instituto de Gestão Financeira da Educação

    Adjudicatário: Normática, Serviços de Informática e Organização

    Preço contratual: 1.597.373,27 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 6 de Dezembro

    1 Fornecimento de extensão do sistema de vigilância aeronáutica

    Adjudicante: Estado Maior da Força Aérea

    Adjudicatário: Saab, Inc.       

    Preço contratual: 1.239.975,00 euros


    2Aquisição de vacina contra a gripe tetravalente de dose elevada

    Adjudicante: Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo

    Adjudicatário: Sanofi

    Preço contratual: 1.050.000,00 euros


    3Concepção e construção de solução de contenção dos taludes no Bairro da Bela Vista

    Adjudicante: Município de Loures

    Adjudicatário: Teixeira Duarte – Engenharia e Construções

    Preço contratual: 918.835,50 euros


    4Aquisição de manuais escolares digitais, bens e serviços conexos

    Adjudicante: Escola Secundária de Jaime Moniz

    Adjudicatário: Porto Editora  

    Preço contratual: 520.571,48 euros


    5Concepção e construção de passagem hidráulica

    Adjudicante: Município de Loures

    Adjudicatário: Alves Ribeiro, S.A.

    Preço contratual: 315.271,36 euros


    MAP

  • Loures: Muro de suporte de 1,02 milhões de euros ‘minado’ por ilegalidades

    Loures: Muro de suporte de 1,02 milhões de euros ‘minado’ por ilegalidades


    A Câmara Municipal de Loures entregou por um ajuste directo de 1,02 milhões de euros (IVA incluído) a concepção e construção de um muro de suporte numa rua da zona industrial de Frielas sem se preocupar sequer em fazer um contrato escrito. A justificação alegada na parca informação divulgada ontem no Portal Base é a mais habitual: urgência imperiosa, mas não surge sequer a fundamentação nem sequer se sabe quaisquer detalhes da dimensão do muro nem se os terrenos são municipais.

    A única informação é de se tratar de um muro de suporte a construir na Rua Cidade de Beja, e que a obra durará 180 dias.

    Muro de suporte na zona industrial de Frielas vai custar 1,2 milhões de euros sem contrato escrito.

    A ‘feliz contemplada’ com este ajuste directo é a STAP, uma empresa de construção e reparação de obras, que integrou o ‘consórcio’ que há cerca de cinco anos esteve a reparar a Ponte 25 de Abril. Esta empresa, sedeada em Algés, conseguiu, com este contrato de mão-beijada’, o mais elevado ajuste directo da sua extensa relação comercial com entidades públicas, sobretudo autarquias.

    Mas, no entanto, por lei, a autarquia de Loures estava impedida de convidar a STAP para a construção deste muro de suporte, porque já lhe entregara por ajuste directo em Junho passado a execução de outro muro de suporte, neste caso no Bairro Nossa Senhora da Nazaré, no Catujal. Essa obra, que também não contou com contrato escrito, teve um preço contratual de 199.880,92 euros (cerca de 246 mil euros com IVA).

    Ora, o Código dos Contratos Públicos refere que “não podem ser convidadas a apresentar propostas, entidades às quais a entidade adjudicante [neste caso, a autarquia de Loures] já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores (…) propostas para a celebração de contratos cujo preço contratual acumulado seja igual ou superior” a 30.000 euros, no caso de empreitadas de obras públicas. Ou seja, a STAP só poderia celebrar mais contratos este ano e nos próximos dois anos se fosse no decurso de concurso público ou outro procedimento que não um ajuste directo.

    Ricardo Leão, presidente da Câmara Municipal de Loures.

    O PÁGINA UM tentou obter esclarecimentos e comentários da Câmara Municipal de Loures, presidida pelo socialista Ricardo Leão, mas não obteve resposta. Não se sabe sequer se a intervenção será em terrenos municipais nem se existem relatórios sobre a urgência e os cálculos que levaram à fixação do preço contratual.

    O contrato entre a Câmara Municipal de Loures e a STAP integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 4 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV

    N.D. Por lapso, o título inicial apontava para 1,2 milhões de euros, quando, na verdade, é de 1,02 milhões de euros, resultante do preço contratual indicado (962.371,73 euros) acrescido de IVA a 6%.


    Ontem, dia 4 de Dezembro, no Portal Base foram divulgados 716 contratos públicos, com preços entre os 20,63 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, ao abrigo de acordo-quadro – e os 1.841.000,00 euros – para aquisição de serviços de concepção, consultadoria técnica, fiscalização e certificação de data center, pela Emacom – Telecomunicações da Madeira, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 13 contratos, dos quais 10 por concurso público e três por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 15 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Município de Loures (com a Stap, S.A., no valor de 962.371,73 euros); dois do Instituto Nacional de Emergência Médica (um com a Siva – Sociedade de Importação de Veículos Automóveis, no valor de 634.919,76 euros, e outro com a Prestibel – Empresa de Segurança, no valor de 101.966,42 euros); Centro Hospitalar do Oeste (com a Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação, no valor de 588.000,00 euros); Infraestruturas de Portugal (com a Bau-B Arquitectura y Urbanismo, no valor de 267.300,00 euros); Banco de Portugal (com a Sérvulo & Associados – Sociedade de Advogados, no valor de 214.500,00 euros); dois do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (um com a Gilead, no valor de 207.000,00 euros, e outro com a Advanz Pharma, no valor de 161.740,60 euros); Município da Amadora (com a Prestibel – Empresa de Segurança, no valor de 192.257,66 euros); Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (com a Sá Limpa – Facility Services, no valor de 189.314,00 euros); Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (com a 2045 – Empresa de Segurança, no valor de 176.406,00 euros); dois do Centro Hospitalar Universitário de São João (um com a Verspieren Portugal – Corretores de Seguros, no valor de 154.999,58 euros, e outro com a Jofilhos – Sociedade de Construções, no valor de 114.189,52 euros); Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil (com a Genycell Biotech España, no valor de 100.800,00 euros); e a Direcção-Geral do Património Cultural (com a V.O.C. – Antiguidades, no valor de 100.000,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 4 de Dezembro

    1 Aquisição de serviços de concepção, consultadoria técnica, fiscalização e certificação de data center

    Adjudicante: Emacom – Telecomunicações da Madeira

    Adjudicatário: Quadrante – Engenharia e Consultoria

    Preço contratual: 1.841.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Atribuição de concessão de exploração de estacionamento

    Adjudicante: Município de São João da Madeira

    Adjudicatário: Datarede, S.A.           

    Preço contratual: 1.777.153,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de filmes rígidos de PC para a produção de cartões poliméricos

    Adjudicante: Imprensa Nacional – Casa da Moeda

    Adjudicatário: Epurex Films GmbH & Co KG

    Preço contratual: 1.013.162,40 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Construção de muro de suporte na Rua Cidade de Beja

    Adjudicante: Município de Loures

    Adjudicatário: Stap, S.A.

    Preço contratual: 962.371,73 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    5Aquisição de serviços de manutenção das instalações do edifício Castilho do Banco de Portugal

    Adjudicante: Banco de Portugal

    Adjudicatário: Enviman – Manutenção de Sistemas Ambientais

    Preço contratual: 934.400,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 4 de Dezembro

    1 Construção de muro de suporte na Rua Cidade de Beja

    Adjudicante: Município de Loures

    Adjudicatário: Stap, S.A.

    Preço contratual: 962.371,73 euros


    2Aquisição de Viaturas Médicas de Emergência a Reanimação (VMER’S)

    Adjudicante: Instituto Nacional de Emergência Médica

    Adjudicatário: SIVA – Sociedade de Importação de Veículos Automóveis

    Preço contratual: 634.919,76 euros


    3Aquisição de serviços de transporte de doentes em ambulância

    Adjudicante: Centro Hospitalar do Oeste

    Adjudicatário: Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação      

    Preço contratual: 588.000,00 euros


    4Desenvolvimento do Plano de Urbanização da Estação de Leiria AV

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: Bau-B Arquitectura y Urbanismo

    Preço contratual: 267.300,00 euros


    5Aquisição de serviços jurídicos

    Adjudicante: Banco de Portugal

    Adjudicatário: Sérvulo & Associados – Sociedade de Advogados, S.P., R.L.

    Preço contratual: 214.500,00 euros


    MAP

  • Transporte de doentes: Centro Hospitalar do Oeste faz uma dezena de contratos ilegais com IPSS de Mafra

    Transporte de doentes: Centro Hospitalar do Oeste faz uma dezena de contratos ilegais com IPSS de Mafra


    Há filhos e enteados. Mas para o Centro Hospitalar do Oeste (CHO) – que integra os hospitais das Caldas da Rainha, Peniche e Torres Vedras –, no que diz respeito ao transporte de doentes há um ‘filho’ e os restantes são ‘enteados’. A partir de 2020, este centro hospitalar começou a privilegiar em especial uma IPSS de Mafra nos serviços de transporte, apesar de ter à disposição mais de uma dúzia de entidades para este serviço. Tudo à margem da lei.

    De acordo com uma análise do PÁGINA UM, a Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação (ASFE), sedeada no concelho de Mafra – e liderada por Gil Ricardo, um antigo vice-presidente social-democrata da edilidade local – conseguiu do CHO desde Janeiro de 2020, de ‘mão-beijada’ (sem concurso público nem consulta prévia), seis contratos de valor superior a 500 mil euros, cada um, e mais quatro contratos entre os 250 mil e os 280 mil euros.

    Destes 10 ajustes directos, apenas hoje e na passada sexta-feira foram dados a conhecer no Portal Base os dois deste ano no Portal Base, cada um com um preço contratual de 588.000 euros. Se se considerar o IVA, a ASFE ‘sacou’, sem o incómodo da concorrência, um total de quase 5,4 milhões de euros. Note-se que Mafra fica na parte mais a sul da região de influência do CHO, que tem as suas unidades de saúde principais em Torres Vedras, Peniche e Caldas da Rainha. Este último concelho fica a cerca de 75 quilómetros

    Além de ser questionável o recurso a ajustes directos num sector – transporte de doentes – onde é possível um planeamento (com eventuais acertos em períodos de crise) e há imensa concorrência, os procedimentos de contratação por ajuste directo pela CHO dos serviços de transporte da ASFE colidem de forma escandalosamente grosseira com o Código dos Contratos Públicos. E ainda mais escandaloso sabendo-se que a presidente do Conselho de Administração deste centro hospitalar público, Elsa Banza, é jurista com extensa experiência em administração hospitalar.

    Com efeito, de acordo com o artigo 113º do Código dos Contratos Públicos, “não podem ser convidadas a apresentar propostas, entidades às quais a entidade adjudicante [neste caso, o CHO] já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores” contratos por ajuste directo que, no caso de aquisição de serviços, como transporte de doentes, tenham superados os 20.000 euros. No caso de contratos após consulta prévia, o montante de referência é de 75.000 euros.

    Com ajustes directos do CHO, o parque de ambulância da ASFE já vai em três dezenas. Esta IPSS tem também serviços de reabilitação e cuidados continuados, além de uma residência senior. No ano passado teve uma facturação de quase 18,2 milhões de euros.

    Contudo, a ASFE que em 2018 conseguira quatro pequenos contratos por ajuste directo no valor de 26.052 euros, voltou a ser convidada para mais ajustes em 2019. Mas até esse ano, o CHO fazia com a ASFE aquilo que fazia com outras entidades que prestavam serviços de transportes de doentes: ajustes directos de poucos milhares ou de dezenas de milhares de euros. Assim, em 2019, mesmo se já colidindo com a limitação do artigo 113º, a ASFE arrecadou nove ajustes directos no valor de 140.963 euros.

    Porém, a partir de Janeiro de 2020 saiu a sorte grande a esta IPSS de Mafra, ficando praticamente com o monopólio da região Oeste para transporte de doentes para os hospitais de Torres Vedras, Peniche e Caldas da Rainha. Em Janeiro de 2020 começou com um ajuste directo de três meses por 255.000 euros, que se repetiria em Abril para mais um ajuste directo trimestral.

    Em Junho desse ano, a administração do CHO passou para um contrato com duração de seis meses por 510.000 euros. Sem IVA, a ASFE ‘sacou’ 1.020.000 euros, ou seja, 90% do valor gasto pelo CHO nesse ano. A concorrência da ASFE ficou com ‘migalhas’: a empresa Abacinus (17.607 euros), o Centro Social e Cultural da Maceira (5.895 euros) e os bombeiros voluntários de Peniche (69.598 euros), das Caldas da Rainha (9.481 euros) e do Reguengo Grande (5.678 euros).

    A jurista Elsa Banza (segunda à direita), preside o Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste desde 2018, apresenta no ‘currículo’ ajustes directos sucessivos à margem da lei e a não-divulgação dos contratos escritos com justificação sem enquadramento legal.

    Apesar da evidente ilegalidade de qualquer um dos três contratos com a ASFE estabelecidos em 2020, a administração do CHO repetiu a dose em 2021, com dois contratos com duração de três meses e um terceiro com duração de seis meses. No total, nesse ano, a ASFE garantiu em ajustes de ‘mão-beijada’ mais 1.051.500 euros, 89% do valor gasto pelo CHO em serviços de transporte de doentes declarados no Portal Base.

    Como a lei serve apenas para emoldurar estantes – ou nem isso agora, porque são publicadas em formato digital –, a administração liderada por Elsa Banza continuou a ‘festa dos ajustes directos’ com a ASFE. Em 2022 foram mais 1,11 milhões de euros em ajustes directos em benefício da ASFE, o que representou 81% dos encargos totais do CHO para transporte de doentes. Mas como já deveria dar muito trabalho três contratos, a administração do centro hospitalar optou por celebrar apenas dois.

    Assim, em Janeiro de 2022 saiu mais um ajuste directo para a ‘mesa’ da ASFE por 550.000 euros, e Junho seguinte foi outro de igual valor. Note-se que estes dois ajustes directos de 2022 só foram divulgados no Portal Base este ano, respectivamente nos meses de Abril e Julho. Portanto, estiveram escondidos durante mais de um ano.

    Montantes gastos nos últimos cinco anos, em euros, pelo Centro Hospitalar do Oeste em serviços de transporte de doentes por prestador de serviço. Fonte: Portal Base. Análise: PÁGINA UM.

    Por fim, este ano foram assinados dois contratos de periodicidade semestral, ambos no valor de 588.000 euros. O primeiro contrato foi assumido em Janeiro e demorou quase 11 meses a ser conhecido, porque apenas foi publicado em 30 de Novembro no Portal Base. E o segundo, que fora celebrado no início de Agosto, acabou for ser divulgado hoje mesmo, ou seja, ‘apenas’ demorou pouco mais de quatro meses.

    Sobre o teor dos contratos, e apesar de montantes tão elevados, nada se sabe. O CHO, liderado por uma jurista, considera que a revelação das cláusulas de contratos públicos, suportados por dinheiros públicos, e assinados por funcionários públicos devem ser escondidos do público. Com efeito, o CHO integra uma minoria de seis centros hospitalares que negam divulgar os contratos escritos, conforme o PÁGINA UM recentemente denunciou, com a desculpa (sem base legal) do Regulamento Geral de Protecção de Dados, que apenas se aplica a dados sensíveis.

    Assim, invariavelmente, nestes contratos de transporte de doentes e nos demais, o CHO publica, em vez dos contratos, uma página onde está escrito que ” tendo em consideração que nos termos do artigo 127º e 465º do CCP, é publicada a celebração do presente contrato através do preenchimento deste formulário da BASEGOV, não é necessário submeter a cópia do contrato escrito”.

    Contactado o Conselho de Administração do CHO, as respostas só chegaram ao PÁGINA UM pelas 20h52 desta segunda-feira, já depois de uma primeira versão desta notícia ser publicada. Na missiva entretanto enviada pelo seu gabinete de comunicação, o CHO refere que entre Dezembro de 2019 e Dezembro de 2021 foram lançados três concursos públicos que terão ficado desertos. Embora sejam indicadas as datas dos anúncios e as referências de dois destes concursos públicos (Concurso Público Internacional nº 18003420 e nº 18005721), o PÁGINA UM não os conseguiu detectar no Portal Base. Na plataforma do Portal Base, o último contrato para transporte de doentes, no decurso de um concurso público lançado pelo CHO, foi celebrado com a empresa Luso – Ambulâncias Serviços Médicos em Outubro de 2016. Curiosamente, a ASFE concorreu a esse concurso público e perdeu.

    A administração do CHO diz que entretanto lançou um novo concurso público, publicado em Diário da República no passado dia 23 de Novembro, no valor de 3,9 milhões de euros, estando a aguardar as “propostas até dia 26 de Dezembro”. Este anúncio ainda não se encontra publicado no Portal Base, mas o PÁGINA UM detectou-o no Diário da República.

    Sobre a razão para a escolha sistemática da ASFE, o CHO refere que, após os alegados concursos públicos vazios, “foram consultadas todas as corporações de Bombeiros e Associações” na sua área de influência “para aferir interesse em assegurar o transporte de doentes, tendo-se apenas obtido anuência” da IPSS de Mafra. Diga-se, contudo, que em nenhum dos contratos referido pelo PÁGINA UM, e constantes no Portal Base, o CHO justifica a opção pelo ajuste directo pela existência de concursos públicos vazios ou por inexistência de concorrência.

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    Na generalidade dos contratos, como no mais recente, o CHO invoca a alínea c) do nº 1 do artigo 24º do Código dos Contratos Públicos, que serve para justificar o ajuste directo “na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante [CHO]” e quando, em simultâneo, “não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”. Ou seja, não coincide os argumentos agora aduzidos pelo CHO com a justificação dada no próprio Portal Base.

    Além disso, independentemente de se poderem justificar ajustes directos, o CHO estaria impedido legalmente, quaisquer que fossem as circunstâncias (mesmo de saúde pública), de escolher a ASFE, que só poderia ganhar novos contratos se fossem por concurso público. Mostra-se, aliás, estranho que a terem existido concursos públicos lançados pelo CHE entre Dezembro de 2019 e Dezembro de 2021, a ASFE não tenha sequer apresentado proposta, pois seria a única forma para legalmente poder celebrar novos contratos públicos com o centro hospitalar.

    A administração hospitalar justifica que assim procedeu, com 10 ajustes directos sucessivos com a ASFE, porque, “considerando os [alegados] sucessivos concursos públicos desertos, bem como a ausência de resposta de outras entidades para assegurar o transporte de doentes, este Centro Hospitalar, na defesa da saúde das pessoas, recorreu aos serviços da única entidade que garantia uma resposta em tempo útil”.

    Por fim, à pergunta sobre quem tem assinado os ajustes directos com a ASFE, uma vez que estes não são (ilegitimamente) publicados no Portal Base, o gabinete de comunicação diz apenas que é “o Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Oeste E.P.E.” Não há funcionários públicos do CHO a assumir a assinatura de contratos públicos.

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    O primeiro contrato deste ano entre o CHO e a ASFE integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 30 de Novembro e 3 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


    Nos últimos quatro dias, entre quinta-feira passada e ontem, no Portal Base foram divulgados 957 contratos públicos, com preços entre os 2,55 euros – para aquisição de isqueiro, pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, através de consulta prévia – e os 6.382.661,52 euros – para aquisição de serviços no âmbito da “Transformação do Posto de Trabalho Rumo ao Workplace do Futuro 2024-2025”, pelo Instituto de Informática, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 18 contratos, dos quais 13 por concurso público, um ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados nove contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Centro Hospitalar Universitário de Santo António (com a Pfizer, no valor de 3.907.200,00 euros); Associação de Municípios do Douro Superior de Fins Específicos (com a FCC Environment Portugal, no valor de 785.864,70 euros); Centro Hospitalar do Oeste (com a Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação, no valor de 588.000,00 euros); Universidade de Coimbra (com a Kavo Dental Iberia, no valor de 547.000,00 euros); Casa Pia de Lisboa (com a Powershield – Segurança Privada, no valor de 272.486,07 euros); Centro Hospitalar de São João (com a Sanofi, no valor de 223.892,00 euros); Município de Leiria (com a RDL – Rodoviária do Lis, no valor de 213.895,84 euros); Ministério da Defesa Nacional – Marinha (com a F3F Ibérica, no valor de 145.663,00 euros); e os Serviços Municipalizados de Transportes Urbanos de Coimbra (com a Rodrigues & Filhos, Lda., no valor de 109.700,80 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 30 de Novembro a 3 de Dezembro

    1 Aquisição de serviços no âmbito da “Transformação do Posto de Trabalho Rumo ao Workplace do Futuro 2024-2025”

    Adjudicante: Instituto de Informática

    Adjudicatário: Crayon Software Licensing

    Preço contratual: 6.382.661,52 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2 Aquisição de serviços de transporte regular colectivo de passageiros na ilha do Pico

    Adjudicante: Fundo Regional dos Transportes Terrestres

    Adjudicatário: União dos Transportes dos Carvalhos

    Preço contratual: 5.023.350,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Santo António

    Adjudicatário: Laboratórios Pfizer

    Preço contratual: 3.907.200,00 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    4Execução de empreitada denominada “EN3 – Reformulação Geométrica das Interceções aos Kms 5+779 ao 6+467”      

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: Construções Pragosa, S.A.

    Preço contratual: 2.096.689,27 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Aquisição de refeições

    Adjudicante: Universidade do Porto

    Adjudicatário: Gertal – Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação

    Preço contratual: 1.606.931,34 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia período de 30 de Novembro a 3 de Dezembro

    1 Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Santo António

    Adjudicatário: Laboratórios Pfizer

    Preço contratual: 3.907.200,00 euros


    2 Prestação de serviços de recolha e transporte de resíduos sólidos urbanos

    Adjudicante: Associação de Municípios do Douro Superior de Fins Específicos

    Adjudicatário: FCC Environment Portugal   

    Preço contratual: 785.864,70 euros


    3Aquisição de serviços de transporte de doentes em ambulância

    Adjudicante: Centro Hospitalar do Oeste

    Adjudicatário: Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação      

    Preço contratual. 588.000,00 euros


    4Aquisição de simuladores médico-dentários

    Adjudicante: Universidade de Coimbra

    Adjudicatário: Kavo Dental Iberia

    Preço contratual: 547.000,00 euros


    5Aquisição de serviços de vigilância e segurança

    Adjudicante: Casa Pia de Lisboa

    Adjudicatário: Powershield – Segurança Privada

    Preço contratual: 272.486,07 euros


    MAP

  • Até os ‘Três Mosqueteiros’ já facturam (bem) com o imbróglio dos lixos italianos dos tempos da pandemia

    Até os ‘Três Mosqueteiros’ já facturam (bem) com o imbróglio dos lixos italianos dos tempos da pandemia


    Ontem foi celebrado um ajuste directo de 853.142,61 euros entre a Agência Portuguesa do Ambiente e a empresa Transportes Os Três Mosqueteiros. Este ser o destaque de hoje do PÁGINA UM, para os contratos divulgados no Portal Base, não se deve ao chiste causado pela denominação do adjudicatário – que, por si só, seria irrelevante – nem apenas pelo valor elevado para um ajuste directo, nem por o contrato abranger serviços que, na verdade, começaram faz amanhã dois anos (em 1 de Dezembro de 2021) e terminará daqui a um mês, nem ao facto de o contrato prever que o Estado ainda paga juros a 4%.

    Não. O contrato, sendo relevante por si, merece relevância para relatar um grande imbróglio político que vem desde Agosto de 2020 com custos elevados para o erário público. Ou talvez antes, em meados da década passada, no rescaldo dos negócios de gestão de resíduos urbanos em Itália, controlada por empresas associadas à Máfia, que deixaram um passivo ambiental de cerca de cinco milhões de toneladas de lixos mal-acondicionados.

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    Em boa ou má hora, conforme as opiniões, e tal como outros países europeus, Portugal aceitou receber resíduos de Itália para auxiliar numa solução solidária, embora esta fosse também uma forma de os sistemas de gestão de aterros facturarem mais.

    Assim, embora nem toda a quantidade fosse proveniente de Itália, em 2015 entraram em Portugal para operações de eliminação, na sua maioria para deposição em aterro, cerca de 13 mil toneladas de resíduos ‘estrangeiros’. Em 2019 a quantidade subia já para as 230 mil toneladas. E estava previsto continuar aquilo que já era um negócio com nenhumas vantagens ambientais.

    Considerando existir uma situação de pressão insustentável na capacidade de tratamento, pondo em causa a autossuficiência portuguesa na gestão dos lixos, nos primeiros dias de Janeiro de 2020, a secretária de Estado do Ambiente, Inês dos Santos Costa, emitiu num despacho para objectar as novas importações a partir de Fevereiro desse ano. E pouco tempo depois, em Maio, a pretexto da pandemia da covid-19, o Governo introduziu mesmo uma norma a suspender a importação de resíduos até ao final desse ano.  

    O Porto de Leixões foi um dos destinos dos resíduos italianos.

    O Ministério do Ambiente esclareceu o PÁGINA UM que, no seguimento dessa norma de Maio, “a APA informou as Autoridades Competentes dos países de origem de todos os processos de notificação afetados por esta decisão, bem como os respetivos notificadores (responsáveis pelos movimentos de resíduos em causa)”, mas “alguns notificadores entenderam continuar a enviar resíduos para Portugal para deposição em aterro, não reconhecendo a legitimidade” da decisão do Governo português.

    Saliente-se que os movimentos transfronteiriços de resíduos são realizados ao abrigo de regulamentos comunitários que, segundo o Ministério do Ambiente, não prevê a figura de suspensão de autorizações já atribuídas. E por isso algumas empresas não concordaram e seguiram com o transporte de resíduos para Portugal. Foi o caso da empresa italiana Enski Ambiente, que insistiu em descarregar 144 contentores nos portos de Sines e Leixões, no mês de Agosto de 2020, para os quais tivera uma prévia autorização.

    E a partir daí começou um braço de ferro. Numa primeira fase, as cerca de 3.800 toneladas tinham como destino previsto o aterro gerido pela Águas de Santo André, uma subsidiária da holding pública Águas de Portugal. Mas a APA intrometeu-se e mandou realizar análises que terão detectado “características de perigosidade” em 142 contentores, com concentração elevadas de hidrocarbonetos, chumbo, cobre e zinco.

    A gestão dos resíduos urbanos por empresas associadas à Máfia levou a despejos indiscriminados. Desde 2015, perante a incapacidade de gestão imediata, o Governo italiano optou pela exportação para tratamento e deposição em condições mais seguras.

    Tudo se complicou ainda mais. O Ministério do Ambiente exigiu então que autoridades italianas retomassem os resíduos e que fossem accionadas as garantias financeiras associadas ao movimento transfronteiriço para ressarcir Portugal dos custos incorridos com a gestão destes resíduos. Mas Itália não quis assumir responsabilidades, mesmo com a Comissão Europeia metida já ao barulho.

    E em Janeiro de 2021, a empresa exportadora responderia com um processo no Tribunal Administrativo de Lisboa, visando a Presidência do Conselho de Ministros e a APA, onde solicitou uma indemnização de mais de oito milhões de euros. O advogado da empresa italiana é, saliente-se, José Eduardo Martins, ex-secretário do Ambiente e antigo deputado do PSD, que está integrado Abreu Advogados. Esta é a sociedade onde agora aparentemente será consultor Matos Fernandes, então ministro do Ambiente à data da polémica importação.

    Este ano houve mais evoluções, mas na barra dos tribunais. De acordo com fonte oficial do Ministério do Ambiente, “não tendo havido resposta das autoridades italianas nem do notificador, a APA interpôs, a 12 de Abril de 2023, uma ação administrativa conjunta (APA/Fundo Ambiental) contra o notificador e outros”.

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    Mas como todos estes processos são lentos, será previsível que Os Três Mosqueteiros, depois do contrato de ontem, e que termina no final do ano, venham a ter novo ajuste directo para mais tempo de armazenamento. O custo de armazemanento temporário é de cerca de 33 mil euros.

    A estes valores deve-se adicionar um pouco mais de 1,96 milhões de euros (IVA incluído) de um contrato da Mediterranean Shipping Company, em Dezembro de 2020, apenas para pagar um serviço de transporte dos resíduos italianos, que demorou três dias, desde os portos de Leixões e Sines até às instalações de armazenamento provisório da empresa Transportes Os Três Mosqueteiros.

    Embora uma Resolução do Conselho de Ministros de 23 de Maio deste ano não explicite que sejam os lixos italianos a causa, mostra-se evidente a que se referem os 11 milhões de euros, provenientes do Fundo Ambiental e destinados a “assegurar os processos aquisitivos relativos à imobilização dos contentores, à armazenagem dos mesmos e ao processo de eliminação que engloba o transporte dos contentores do local de armazenagem até ao local de tratamento, o tratamento e eliminação de resíduos e lixos perigosos, a higienização dos contentores e a sua entrega ao proprietário”.

    Bird's Eye View Of Landfill

    Há negócios que saem caros. E quando são públicos, regra geral saem caros apenas aos contribuintes.

    O contrato entre a Agência Portuguesa do Ambiente e a Transportes Os Três Mosqueteiros para armazenamento dos resíduos italianos integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre 24 e 26 de Novembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


    Ontem, dia 29 de Novembro, no Portal Base foram divulgados 801 contratos públicos, com preços entre os 2,40 euros – para aquisição de serviço de cobrança de portagens, pelo Ministério da Defesa Nacional – Marinha, através de ajuste directo – e os 2.499.584,00 euros – para prestação de serviços de vigilância e segurança, pelo Centro de Emprego e Formação Profissional do Médio Tejo, também por ajuste directo.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados seis contratos, dos quais quatro por concurso público e dois por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados oito contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Centro de Emprego e Formação Profissional do Médio Tejo (com a PowerShield – Segurança Privada, no valor de 2.499.584,00 euros); Agência Portuguesa do Ambiente (com a Transportes Os Três Mosqueteiros, no valor de 670.531,11 euros); dois do Ministério da Defesa Nacional – Marinha (um com a Leonardo MW LTD, no valor de 488.988,83 euros, e outro com a Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Electrónica, no valor de 384.000,00 euros); Município do Barreiro (com a CGITI Portugal, no valor de 379.725,87 euros); Estado-Maior-General das Forças Armadas (com a CSL Behring, no valor de 110.000,00 euros); Município de Terras de Bouro (com a Medidata.Net – Sistemas de Informação para Autarquias, no valor de 108.195,00 euros); e o Instituto Nacional de Emergência Médica (com a WorldIT – Sistemas de informação, no valor de 100.000,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 29 de Novembro

    1 Prestação de serviços de vigilância e segurança

    Adjudicante: Centro de Emprego e Formação Profissional do Médio Tejo

    Adjudicatário: Powershield – Segurança Privada

    Preço contratual: 2.499.584,00 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    2Obras de remodelação e beneficiação do Serviço de Anatomia Patológica

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil

    Adjudicatário: Tanagra – Empreiteiros

    Preço contratual: 1.686.061,20 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Empreitada de “Parque Verde do Louriçal”

    Adjudicante: Município de Pombal

    Adjudicatário: Delfim de Jesus Martins & Irmão, Lda.        

    Preço contratual: 747.397,84 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Armazenagem de resíduos perigosos provenientes de Itália

    Adjudicante: Agência Portuguesa do Ambiente

    Adjudicatário: Transportes Os Três Mosqueteiros

    Preço contratual: 670.531,11 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    5Empreitada de construção do “Sistema de Rega das Fontainhas e Quinta Grande”

    Adjudicante: AQG – Associação de Agricultores das Nascentes da Quinta Grande

    Adjudicatário: ERUMAD – Engenharia e Reabilitação Urbana       

    Preço contratual: 651.934,77 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 29 de Novembro

    1Prestação de serviços de vigilância e segurança

    Adjudicante: Centro de Emprego e Formação Profissional do Médio Tejo

    Adjudicatário: Powershield – Segurança Privada

    Preço contratual: 2.499.584,00 euros


    2Armazenagem de resíduos perigosos provenientes de Itália

    Adjudicante: Agência Portuguesa do Ambiente

    Adjudicatário: Transportes Os Três Mosqueteiros

    Preço contratual: 670.531,11 euros


    3Aquisição de serviços de sustentação aperfeiçoativa e evolutiva LYNX MK95A

    Adjudicante: Ministério da Defesa Nacional – Marinha

    Adjudicatário: Leonardo MW LTD    

    Preço contratual: 488.988,83 euros 


    4Aquisição de Upgrade Under Water Telephone (UWT)

    Adjudicante: Ministério da Defesa Nacional – Marinha

    Adjudicatário: EID – Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Electrónica

    Preço contratual: 384.000,00 euros 


    5Aquisição de serviços de gestão comercial, printing, envelopagem e finishing, IVR e execuções fiscais

    Adjudicante: Município do Barreiro

    Adjudicatário: CGITI Portugal

    Preço contratual: 379.725,87 euros


    MAP

  • Em Abrantes, de pequenino se torce o pepino: Escola mostra contratos de tostões mas que até podem, afinal, custar milhões

    Em Abrantes, de pequenino se torce o pepino: Escola mostra contratos de tostões mas que até podem, afinal, custar milhões


    A direcção do Agrupamento de Escolas nº2 de Abrantes tem um método muito ‘sui generis’ de abastecer os bufetes: faz ajustes directos onde apenas estipula o valor unitário, escolhe os fornecedores e depois é “bar aberto”. Não há limite para despesa e mesmo nos contratos já terminados, os valores gastos registados no Portal Base são completamente fictícios. Assim se ‘aprende’ na escola como se gerem dinheiros públicos…


    Nas escolas ensina-se mais do que as letras e os números; fornecem-se os rudimentos de cidadania, presume-se, incluindo que se vive numa sociedade onde as entidades públicas, incluindo as escolas, claro, gerem dinheiros públicos. E, por esse motivo, a contratação pública deveria seguir um modelo de rigor e transparência, com responsabilidade.

    É provável que esses ensinamentos até sejam transmitidos também nas Escolas Dr. Manuel Fernandes e Octávio Duarte Ferreira, que formalmente integram o Agrupamento de Escolas nº 2 de Abrantes, cujos lema, no seu site é “uma janela para o Mundo“. Mas são pouco praticados. Com efeito, para abastecer os bufetes, a direcção deste agrupamento escolar teve a ideia de criar uma espécie de “bar aberto”: definiu os produtos que seriam eventualmente necessários, colocou um preço unitário e pôs-se a assinar contratos por ajuste directo sem haver um limite de quantidades a comprar até ao final do ano lectivo.

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    O mais absurdo destes contratos, num total de 17, todos publicados no passado dia 22, é aparentarem serem bastante económicos. Na verdade, só chamaram à atenção ao PÁGINA UM pelos valores ridiculamente baixos dos preços contratuais que surgem nos registos do Portal Base, que vão desde os 0,01 euros até aos 12,59 euros. Na verdade, esses montantes, quando se consultam os contratos, referem-se ao preço unitário, se for apenas um produto, ou ao preço unitário médio, se forem vários.

    Nenhum destes contratos estipula as quantidades máximas ou médias ou mínimas, ou o que quer que seja, até os contratos expirarem ao fim de 365 dias. Ou seja, mesmo em fins-de-semana, feriados e férias escolar, há “bar aberto”, porque as quantidades vão sendo combinadas entre a direcção escolar e os felizardos fornecedores.

    O contrato com o valor mais baixo, com registo de 1 cêntimo no Portal Base, diz respeito ao “Lote 15” que consiste na compra de saquetas de açúcar e de adoçante para as duas escolas do agrupamento escolar de Abrantes. O fornecedor é a empresa Manuel Rui Azinhais Nabeiro Unipessoal, do Grupo Nabeiro, distribuidor dos cafés Delta em Portugal Continental e nos Açores. O contrato teve início a 11 de Setembro de 2023 e termina a 31 de Agosto de 2024. Se se quiser saber quantas saquetas de açúcar poderão, no máximo, ser compradas, não se sabe. Quanto será a factura no final do ano de ajuste directo, não se sabe. No limite, é aquilo que o fornecedor e a direcção escola quiserem.

    Exemplo de um contrato, que estipula o preço unitário, mas nunca as quantidades máximas a adquirir. É um autêntico “bar aberto” até à data final do contrato.

    Nos restantes contratos celebrados em Setembro passado, e publicados apenas na semana passada, passa-se o mesmo com os mais variados produtos. E além destes contratos por ajuste directo serem opacos e esconderem as despesas efectuadas pelo agrupamento escolar, o agrupamento não disponibiliza outros documentos – como cadernos de encargos ou propostas dos fornecedores. O agrupamento também escusou-se a responder às perguntas do PÁGINA UM sobre estes contratos.

    Este modus operandi vem de trás, e ninguém parece estranhar. No total, incluindo a aquisição de produtos do ano lectivo anterior, só em 2023 o agrupamento registou no Portal Base 35 ajustes para a compra de bens alimentares para os seus bufetes, todos sem concurso público. O valor global destes contratos por ajuste directo registados no Portal Base é de uns meros 93,04 euros, mas, na verdade, o preço final, além de ser uma incógnita, pode, em teoria, não ter limite.

    Acresce que o agrupamento registou 14 dos contratos no Portal Base seis meses após a respetiva assinatura: estes contratos assinados em Setembro de 2022 só deram entrada no Portal Base em Março deste ano. A lei determina que seja feito no prazo de 20 dias após a celebração dos contratos e determina também que seja colocada informação sobre a execução dos contratos.

    Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes, em Abrantes.

    Na consulta dos contratos já terminados, claramente os valores que lá constam não são verdadeiros, uma vez que indicam um gasto que corresponde ao valor unitário ou ao valor médio unitário, como sucede no contrato com a empresa Manuel Rui Azinhais Nabeiro Lda., que terminou em Agosto passado.

    Este contrato englobava a compra de três produtos (café, descafeinado e cacau), com um preço unitário médio de 14,89 euros, e a direcção escolar indicou no Portal Base que gastou apenas 14,89 euros até ao final do contrato, algo impossível porque cada unidade de café (1 kg) custava 16,89 euros, cada unidade de descafeinado (150 saquetas) custava 21,38 euros e cada unidade de cacau (1 kg) custava 6,41 euros. A não ser que a direcção escolar não tenha comprado afinal nenhum café nem descafeinado e tenha comprado apenas 2 kg de cacau e mais 323 gramas de um terceiro saco de 1 kg, este valor será falso…

    Noutro contrato, relativo à compra de pão, aquele agrupamento registou no Portal Base a indicação de “cumprimento integral do contrato”, voltando a mencionar como valor de despesa o montante referido no contrato efetuado por ajuste directo: uns meros 12 cêntimos. Ou seja, o valor só é verdadeiro se a direcção escolar tiver comprado apenas um pão em todo o ano…

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    O registo dos contratos sem um valor indicativo de despesa global previsto é um caso raríssimo, para não dizer único. De acordo com a pesquisa efectuada pelo PÁGINA UM no Portal Base, o Agrupamento de Escolas nº2 de Abrantes aparenta ser o único a omitir o valor da despesa envolvida em cada compra. Os contratos remetem detalhes para o caderno de encargos, mas nenhum dos contratos tem caderno de encargos disponível para consulta.

    Saliente-se que apenas duas compras efectuadas por este agrupamento escolar em 2023 não envolveram ajuste directo. Foi o caso de um contrato feito através do procedimento de consulta prévia com a Beltrão Coelho para a “instalação de equipamentos multifuncionais de cópia, impressão e digitalização em regime de outsourcing”, no valor de 7.500 euros. O segundo, também por consulta prévia, envolveu a “aquisição de serviços de consultoria” para a gestão de um projeto relativo aos cursos profissionais financiados pelo Programa Operacional Capital Humano (POCH). Para este, a empresa Another Step recebeu um montante de 7.990 euros.