O montante da despesa do Estado com a compra de espaço publicitário atingiu o recorde de 12 milhões de euros em 2021. O valor obliterou qualquer verba anual registada desde que são comunicados os gastos com publicidade nos media por parte de entidades estatais. A DGS foi a entidade pública mais generosa, sendo responsável por cerca de metade dos montantes entregues aos órgãos de comunicação social em 2021. As TVs arrecadaram a maior fatia das verbas. Já em 2022, no primeiro semestre, o Estado gastou em publicidade nos media mais do que em todo o ano de 2020.
O Estado foi muito generoso com os media no ano passado: 12,5 milhões de euros provenientes de 30 entidades públicas financiaram campanhas publicitárias. Nunca os órgãos de comunicação social tiveram tanto dinheiro em marketing estatal. A pandemia foi a principal causa, mas não só.
Em 2020, primeiro ano da pandemia, apenas se chegou aos dois milhões de euros de publicidade estatal, um pouco menos do que em 2019. Há cinco anos nem se ultrapassou a fasquia de um milhão.
A Direção-Geral da Saúde (DGS) foi, de longe, a entidade mais “benemérita”: pagou mais de cinco milhões em publicidade, com SIC e TVI a ficarem com a maior fatia, como noticiou o PÁGINA UM em Fevereiro deste ano.
Para passar a “mensagem oficial” em redor da pandemia, o ano publicitário de 2021 não se transformou apenas num recorde. Foi um rotundo recorde: o ano de 2021 ultrapassou largamente o total da despesa do quinquénio 2016-2020.
Os canais de televisão engoliram mais de metade desta verba: 6.841.320 euros, repartidos por 23 serviços de programas de âmbito nacional.
Entretanto, o ano de 2022 está com valores de publicidade do Estado mais modestos do que os de 2021, mas mesmo assim deverá também superar largamente os montantes no período pré-pandemia. Nos primeiros seis meses, o Estado entregou já 2,6 milhões de euros aos órgãos de comunicação social pela compra de espaço publicitário.
Num levantamento do PÁGINA UM, o mês de Junho deste ano registou a maior despesa global do primeiro semestre de 2022, com uma verba de 1.149.088 euros.
A entidade responsável pela maior despesa este ano já não é, contudo, o Ministério da Saúde, mas sim o Ministério do Trabalho e da Segurança Social, que já gastou um milhão de euros.
Estes dados, com frequência mensal, são divulgados pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), e começaram a ser alvo de registo no final de 2015.
Gastos (em euros) do Estado em compra de espaço publicitário nos media. Fonte: ERC
No relatório de 2021, além da estatística geral, a ERC reportou ao Tribunal de Contas que cerca de meia centena de campanhas não cumpriram o requisito de investimento mínimo nos media locais e regionais. Isto significa que os maiores órgãos de comunicação social de âmbito nacional saíram ilegitimamente beneficiados.
Na imprensa regional, em comparação com o ano anterior, em 2021 houve até uma queda de 7,0 pontos percentuais na atribuição de verbas para espaço publicitário, apesar de se registar um aumento no investimento global.
Globalmente, a despesa com a compra de espaço publicitário pelo Estado nos meios locais e regionais somou 3.090.278 euros, que corresponde a 25% do total investido.
A ERC afirma, no seu comunicado de apresentação do relatório anual de 2021, divulgado anteontem, que foram identificadas “51 campanhas de publicidade institucional do Estado que envolveram investimentos superiores a 5 mil euros, e destas, seis em que a parcela investida em órgãos de comunicação social regionais e locais foi inferior a 25% do custo global da campanha”. Trata-se de “um incumprimento do dever previsto no artigo 8.º da Lei n.º 95/2015, de 17 de agosto, e que foi oportunamente comunicado pela ERC ao Tribunal de Contas, que detém a competência nesta matéria”.
Entre as campanhas que violaram a lei, consta a “Campanha Covid-19”, da DGS, que apenas entregou aos media locais e regionais 15% da verba total gasta na compra de espaço publicitário, ou 754.750 de euros. Devia ter entregado cerca de 1,28 milhões de euros.
Media ganham com pandemia
Além das contínuas iniciativas publicitárias da DGS – agrupadas numa rubrica global denominada “Campanha Covid-19”, no valor global de 5,1 milhões de euros –, a pandemia deu para múltiplas acções de marketing do Estado. De entre estas salienta-se a campanha “Não deixes o vírus entrar”, desenvolvida na época natalícia de 2020, onde um dos spots mostrava uma neta a oferecer uma camisola de lã ao avô, figura do SARS-CoV, e a dizer-lhe: “vai-te ficar a matar”. Custou 422.411 euros.
Em pouco menos (398.955 euros) ficou a campanha “Não deixes cair a máscara”, uma iniciativa do Ministério do Ambiente de promoção da reutilização dos panos faciais, e que tinha como um dos lemas “sabemos que a voz pode soar mais alto em silêncio”.
A promoção da testagem – ou melhor da “massificação da testagem”, conforme surge nomeada no relatório da ERC – atingiu um preço total de 279.478 de euros, enquanto a dinamização pública do “reposicionamento” do SNS24 teve, por sua vez, um custo global de 249.920 de euros.
A divulgação da “telescola da pandemia”, oficialmente conhecida por #Estudo em casa – e que teve Marcelo Rebelo de Sousa como professor convidado contou com uma verba destinada aos órgãos de comunicação social de 215.402 de euros.
Por fim, ainda para o combate contra a covid-19, e para convencer os jovens a deixarem “abraços e beijinhos (…) para outra altura”, o Governo gastou 73.883 de euros.
Houve outros gastos publicitários em Saúde contabilizados em 2021 para sectores não-covid, mas irrelevantes: 300 euros para divulgar o Centro Hospitalar da Cova da Beira e mais 885 euros para uma campanha de prevenção de suicídios, da responsabilidade da Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano.
Refira-se, em todo o caso, que em 2021 as despesas publicitárias do Estado também foram relevantes para três iniciativas “esporádicas”: as eleições presidenciais (405.275 euros) e autárquicas (199.785 euros), e ainda a promoção dos Censos (1.168,628 euros) pelo Instituto Nacional de Estatística.
O silêncio como resposta. Uma semana após o PÁGINA UM revelar que Licínia Girão, actual advogada-estagiária de 57 anos, foi eleita para liderar o órgão regulador e de disciplina dos jornalistas – onde sempre se exigiu “jurista de mérito” –, não há nenhum dos outros oito membros da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista que queira revelar como foi feita a sua cooptação. O currículo desta jornalista freelancer, sobretudo associada à imprensa regional, mostra-se paupérrimo para a exigência da lei: tem dois mestrados, mas o de Ciências Jurídicas terá demorado pelo menos 11 anos a concluir. E nas provas do concurso para a magistratura foi excluída logo na primeira fase com um comprometedor “chumbo”, tendo ficado quase na cauda da tabela.
Oito mensagens electrónicas, cada uma com quatro perguntas, e nem uma resposta. Nenhum dos oito jornalistas eleitos para a Comissão da Carteira Profissional dos Jornalistas (CCPJ) – quatro por sufrágio da classe e os restantes indicados pelos operadores do sector – se disponibilizou durante uma semana inteira para dizer ao PÁGINA UM quem indicou a advogada-estagiária Licínia Girão para presidir àquela entidade.
Também nenhum destes oito jornalistas quis dizer se previamente houve análise curricular desta jornalista freelancer que, como jurista, está longe de ter pergaminhos relevantes, além de ter desenvolvido a sua actividade profissional quase em exclusivo na imprensa regional, mas sem grande regularidade nos últimos anos. Neste momento, o seu nome apenas se encontra na ficha técnica do Sinal Aberto, um projecto editorial que se apresenta como “um coletivo de Jornalismo de interesse público que recusa a informação apressada e procura a verdade, sabendo que nunca será neutro.”
A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista funciona no Palácio Foz, em Lisboa.
De acordo com a lei que regula o funcionamento da CCPJ, a sua presidência somente pode ser ocupada por “um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”, cooptado pelos outros oito membros. E é aqui que se colocam os aspectos centrais: quem, de entre os oito jornalistas (eleitos para a CCPJ), sugeriu para cooptação o nome de Licínia Girão, e como foi esta apresentada para ser reconhecida como “jurista de mérito”? E uma outra, também fulcral: podem os jornalistas, como profissionais que por inerência estão incumbidos de “fiscalizar” a sociedade ao serviço dois leitores, aceitar que se mantenham situações dúbias no seu próprio seio?
Estes aspectos são ainda mais pertinentes porque, ao contrário dos outros oito elementos da CCPJ, Licínia Girão não chegou ao cargo por qualquer eleição ou sufrágio, foi por cooptação, e por supostas razões de mérito.
Ora, a cooptação é um regime de escolha colegial – seguida em muitos casos, como sucede com alguns juízes do Tribunal Constitucional – em que são os membros já eleitos que seleccionam uma pessoa externa. Recentemente, a cooptação do juiz Almeida Costa esteve envolta em polémica, e ele acabou mesmo por não ser escolhido. Também em muitas universidades, a escolha de membros para o Conselho de Escola é realizada por esta via, existindo em todos os casos regras específicas que obrigam a uma análise prévia dos atributos dos candidatos.
Licínia Girão é advogada-estagiária em lugar que,por lei,exige “jurista de mérito”, ignorando-se quem a “recomendou”.
No caso da indicação de Licínia Girão para ser cooptada para a presidência da CCPJ, nenhum dos oito jornalistas da CCPJ quer agora assumir a “paternidade” pela colocação do seu nome para votação (e subsequente comprometedora eleição) como presidente.
No fim-de-semana passada, o PÁGINA UM endereçou a cada um dos oito jornalistas eleitos pelos pares e operadores do sector um conjunto de quatro perguntas.
Na primeira questionava-se se tinham “conhecimento de quem propôs /indicou o nome da Dra. Licínia Girão para a presidência da CCPJ”. Na segunda se tinham existido “outros nomes em análise (e votação) aquando da escolha”; e se sim, “qual ou quais os candidatos propostos”. Na terceira questão pretendia-se saber se antes da eleição, tiveram todos acesso ao currículo e actividades profissionais de Licínia Girão. E na última se consideravam que o currículo e actividades da actual presidente da CCPJ se enquadravam no perfil exigido por lei: “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”.
Apesar de ter sido confirmada a recepção dos oito e-mails na segunda-feira passada, nem Jacinto Godinho (CP 772), nem Anabela Natário (CP 326) nem Miguel Alexandre Ganhão (CP 1552) nem Isabel Magalhães (CP 1024) nem Cláudia Maia (CP 2578) nem Paulo Ribeiro (CP 1027) nem Luís Mendonça (CP 1407) nem Pedro Pinheiro (CP1440) responderam a qualquer daquelas questões. Saliente-se que, apesar das insistências, o PÁGINA UM não conseguiu que Licínia Girão esclarecesse aspectos fundamentais da sua vida profissional e da sua cooptação para a presidência da CCPJ.
Adensa-se assim um inexplicável mistério entre a classe jornalística, apesar de estarmos perante um organismo formado por jornalistas que supostamente lutam pelo acesso à informação e à transparência.
Recorde-se que, como divulgou o PÁGINA UM com provas documentais, Licínia Girão encontra-se a realizar, aos 57 anos, um estágio de advocacia não-presencial num escritório de Santo Tirso (vivendo em Coimbra).
O seu nome continua sem constar no site da Rodrigues Braga & Associdos, e um contacto prévio do PÁGINA UM revelou que será uma estagiária-fantasma.
Além disso, o seu percurso académico tem pouco de distinto, mesmo se esforçado: terá demorado pelo menos 11 anos a concluir um mestrado em Ciências Jurídicas pela Universidade de Coimbra, uma vez que já aí era aluna em 2011 e apresentou a tese no ano passado. Possui também, desde 2019, um mestrado em Comunicação e Jornalismo com 16 valores.
De acordo com a investigação do PÁGINA UM, Licínia Girão candidatou-se este ano ao 39º curso de ingresso de formação de magistrados no Centro de Estudos Judiciários, mas os resultados foram desastrosos, chumbando na primeira fase a duas das três provas, tendo sido logo assim excluída. Num total de 269 candidatos, ficou apenas na posição 230, destacando-se os 5,05 valores (em 20) em Direito Penal e mesmo os 8,50 valores (em 20) numa prova de cultura geral em que se solicitava uma breve dissertação em redor de notícias do jornal Público e da revista Gerador.
Licínia Girão também se candidatou a mediadora de conflitos dos julgados da paz do agrupamento de concelhos da Batalha, Leiria, Marinha Grande, Pombal e Porto de Mós, e do agrupamento de concelhos de Alvaiázere, Ansião, Figueiró dos Vinhos, Pedrógão Grande e Porto de Mós, não se conhecem os resultados.
Licínia Girão, presidente da CCPJ, ostentando em Junho do ano passado o diploma da Menção Honrosa na categoria Ensaio/Prosa no âmbito dos 13º Jogos Florais da Junta de Freguesia de São Domingos de Rana.
Além disso, a actual presidente da CCPJ assume-se ainda como “coordenadora da comunicação interna do Instituto de Certificação e Formação de Mediadores Lusófonos (ICFML)”, uma tarefa que poderá ser considerada incompatível face ao estabelecido no Estatuto do Jornalista. De acordo com a alínea b) do nº 1 deste diploma legal são incompatíveis com a actividade jornalística as “funções de marketing, relações públicas, assessoria de imprensa e consultoria em comunicação ou imagem, bem como de planificação, orientação e execução de estratégias comerciais”.
No entanto, apesar do PÁGINA UM ter conhecimento que a CCPJ se tem mostrado particularmente activa na análise do cumprimento de requisitos profissionais, esta questão sensível não deverá ser, certamente, alvo de análise por aquela entidade reguladora e de desciplina. Até porque Licínia Girão acumula, com Jacinto Godinho, o Secretariado da CCPJ, que constitui o primeiro “crivo” para a instauração de processos disciplinares ou contra-ordenacionais, que depois são decididos em Plenário.
N.D.O PÁGINA UM criticou recentemente, com veemência, uma inaudita recomendação da CCPJ, sem enquadramento legal, que visou “censurar” um trabalho de investigação sobre a Sociedade Portuguesa de Pneumologia. Tem também o PÁGINA UM colocado diversas questões à CCPJ, algumas ainda no tempo de Leonete Botelho como presidente. E vai colocar mais, até porque se justificam. Os artigos do PÁGINA UM sobre Licínia Girão, a actual presidente da CCPJ, são de indiscutível relevância e interesse público, e sustentam-se exclusivamente em factos, tendo-se sempre dado primazia ao contraditório. Na nossa opinião, a existência de discórdias, e mesmo de processos que a CCPJ ou outras entidades venham a colocar ao director ou a jornalistas e colaboradores do PÁGINA UM, jamais serão redutoras da nossa liberdade editorial. Será assim absurdo considerar-se que existem motivações extra-editoriais na base destes artigos. Aliás, mal seria se se usasse a regra de “não noticiar” sobre entidades com quem existam conflitos, porquanto abriria porta para uma solução simples: qualquer entidade incomodada por um jornal independente apresentaria uma queixa-crime e, desse modo, accionaria uma espécie de “protecção”. Ora, o PÁGINA UM não acolhe essa lógica. Pelo contrário: quem ataca a imprensa livre merece ser ainda mais escrutinado.
A Lei da Transparência dos Media, que obriga as empresas a declararem quem são os seus proprietários e os fluxos económicos e financeiros, tem uma escapatória: através de requerimentos à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), pode ser solicitado um regime de excepção. O PÁGINA UM quis saber quem pediu essas excepções, quais as decisões da ERC, e sob que critérios. O silêncio foi a resposta. Um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa para obrigar a ERC a ser transparente foi a contra-resposta do PÁGINA UM, através do seu FUNDO JURÍDICO.
[Recorde-se que, no passado dia 9 de Agosto, a ERC acusou o autor desta notícia de andar “a insultar os membros do Conselho Regulador e a exercer coação sobre os funcionários que o atendem”]
Por esconder a identidade das empresas de comunicação social que pediram confidencialidade na divulgação de dados económicos e financeiros, bem como a respectiva decisão administrativa aos requerimentos, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) é ré desde ontem no Tribunal Administrativo de Lisboa.
O processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões – já identificado com o número 2589/22.4BELSB e distribuído à juíza Maria Carolina da Silva Duarte – foi intentado pelo PÁGINA UM no último dia do prazo. O PÁGINA UM tinha feito um requerimento à ERC no dia 21 de Julho, que teria 10 dias úteis para responder. Para intentar um processo judicial, o PÁGINA UM teria um prazo de mais 20 dias seguidos. Como a ERC continuou a recusar satisfazer um legítimo pedido, o processo de intimação foi concretizado. Este é o 10º processo de intimação do PÁGINA UM levado a cabo desde Abril, sempre em virtude da recusa em facultar a consulta a processos, documentos e bases de dados.
No pedido sobre a Lei da Transparência dos Media, o PÁGINA UM solicitou ao juiz conselheiro Sebastião Póvoas, que preside à ERC desde Dezembro de 2017, “o acesso a cópia digital ou analógica de todos os requerimentos – desde 2017 até à data – das empresas de comunicação social que solicita[ram] confidencialidade dos principais fluxos financeiros e identificação das pessoas singulares ou colectivas que representam mais de 10% dos rendimentos totais e mais de 10% do montante total de passivos no balanço e dos passivos contingentes.”
De igual modo, requereu-se a consulta dos “documentos administrativos da ERC que contenham a eventual análise e decisão para cada um dos referidos pedidos de confidencialidade”, bem como dos “critérios ou normas de orientação para que que haja deferimento ou indeferimento dos pedidos.”
A ERC preferiu nem reagir, estando focada, nas últimas semanas, em fabricar inopinados incidentes envolvendo o PÁGINA UM, que culminaram num comunicado no passado dia 9 de Agosto em que acusava explicitamente o seu director [autor da presente notícia] de andar “a insultar os membros do Conselho Regulador e a exercer coação sobre os funcionários que o atendem” a pretexto da consulta de outros processos naquela entidade reguladora.
TVI – Televisão Independente tentou que os dados financeiros de 2021 ficassem ocultos no Portal da Transparência. Com a divulgação pública, a ERC indeferiu pedido, mas não quer identificar as outras 21 empresas que solicitaram o mesmo, e qual a decisão.
A promoção da transparência da titularidade, da gestão e dos meios de financiamento das entidades que prosseguem atividades de comunicação social tem sido uma das matérias mais sensíveis nos últimos anos no sector da comunicação social. Em 2015, uma lei aprovada na Assembleia da República estipulou que as empresas detentoras de órgãos de comunicação social disponibilizassem, no denominado Portal da Transparência dos Media, a relação de titulares e de detentores, discriminando as percentagens de participação social e identificando toda a cadeia de entidades a quem uma participação de pelo menos 5% pudesse ser imputada.
Por outro lado, ficou também estipulada a obrigatoriedade de comunicar à ERC a informação relativa aos principais fluxos financeiros daquelas entidades (com contabilidade organizada). Esta obrigação deveria, por lei, incluir “a relação das pessoas individuais ou coletivas que tenham, por qualquer meio, individualmente contribuído em, pelo menos, mais de 10 % para os rendimentos apurados nas contas de cada uma daquelas entidades ou que sejam titulares de créditos suscetíveis de lhes atribuir uma influência relevante sobre a empresa”, mas em “termos a definir no regulamento da ERC”.
Efectivamente, a ERC criaria um regulamento em Outubro de 2020, onde, além de estabelecer a obrigação do envio do relatório anual de governo societário (RGS), concedia excepções arbitrárias que, na prática, destruíam o princípio da transparência. Com efeito, no artigo 8º do regulamento – que não teve que passar pela Assembleia da República – refere-se que “atendendo à sensibilidade e ao caráter sigiloso de alguns dados solicitados, as entidades poderão solicitar à ERC a aplicação do regime de exceção”.
Sebastião Póvoas, presidente da ERC e juiz conselheiro.
Em 6 de Julho passado, no decurso de um pedido de confidencialidade da TVI S.A. – empresa detentora da TVI e da CNN Portugal –, que o PÁGINA UM noticiou em primeira mão, a ERC não quis identificar quais as outras empresas que solicitaram igual tratamento.
O regulador adiantou apenas que “os pedidos podem incidir sobre informação muito específica ou cumulativamente sobre vários elementos comunicados em cumprimento das obrigações legais da transparência”, acrescentando ainda que “os requerentes invocam, genericamente, (…) a sensibilidade dos dados e antecipam impactos negativos resultantes da sua divulgação, relacionados com estratégias de negócio, estruturas de receitas e a sustentabilidade económico-financeira do meio, em particular em mercados locais.”
A ERC também não indicava o número absoluto de pedidos entre 2017 e 2021, dando somente dados relativos. Segundo o regulador, naquele quinquénio, mais de três quartos dos pedidos de confidencialidade (77%) tinham sido indeferidos pelo Conselho Regulador, “que entendeu que os argumentos apresentados não justificavam a não disponibilização da informação”.
Perto de 12% dos pedidos foram deferidos, “salientando-se que uma parte incidia sobre uma informação muito específica, como a percentagem que representa um cliente relevante”. Em perto de 11% das situações o Conselho Regulador concedeu deferimento parcial. No entanto, não sabe o número absoluto que esses 23% representam nem que dados ficaram assim escondidos e porquê.
Já quanto ao presente ano, no início de Julho a ERC informava que recebera 22 pedidos de confidencialidade submetidos por entidades de comunicação social, que incluía o da TVI S.A., que veio entretanto a ser indeferido. No entanto, desconhece-se a identidade das outras 21 empresas, e quais foram as decisões da ERC.
Embora o argumento do segredo comercial seja, de facto, o mais utilizado, o PÁGINA UM sabe que as maiores empresas de media procuram, com o regime de excepção, também esconder a dependência elevada de determinados clientes, bem como de detentores de passivo, que podem englobar bancos, fundos ou mesmo o Estado, por via de dívidas fiscais.
O pedido de confidencialidade dos detentores de um montante acima de 10% do passivo pode também impedir a identidade de entidades ou pessoas que, como obrigacionistas ou credores, acabam por ter um controlo na gestão da empresa, acabando assim por “manobrar” na sombra.
N.D. – Os custos e taxas dos processos desencadeados pelo PÁGINA UM no Tribunal Administrativo são exclusivamente suportados pelo FUNDO JURÍDICO financiado pelos seus leitores. Rui Amores é o advogado do PÁGINA UM neste e nos outros processos administrativos em curso. Até ao momento, estão em curso 10 processos administrativos e mais dois em preparação, além de uma providência cautelar. Dois dos processos foram ganhos pelo PÁGINA UM em primeira instância, mas as duas entidades (Ordem dos Médicos e Conselho Superior da Magistratura) recorreram. Apenas em taxas de justiça, o PÁGINA UM já gastou 4.131 euros. Este valor não inclui honorários e outros gastos na preparação dos processos.
A lei obriga à escolha de um jurista de mérito, mas o currículo de Licínia Girão para presidir à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) está longe de ser excepcional. Advogada-estagiária aos 57 anos, concorreu nesta Primavera ao concurso para formação de magistrados, e os resultados dificilmente poderiam ser piores. Ninguém quis assumir ao PÁGINA UM como chegou ela à presidência do órgão que regula e disciplina os jornalistas.
Reprovada sem apelo nem agravo. Eleita em Maio passado para a presidência da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) por alegadamente ser uma “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”, como determina a lei, Licínia Girão – a jornalista freelancer e advogada-estagiária de 57 anos – foi chumbada logo na primeira fase deste ano do concurso para formação de magistrados. E com um desempenho que, no mínimo, se pode considerar muito sofrível.
De acordo com as pautas consultadas hoje pelo PÁGINA UM no Centro de Estudos Judiciários em Coimbra, onde realizou as provas, o sonho de Licínia Girão em se tornar magistrada ficou adiado, pelo menos por um ano. E nem esteve próxima dessa meta.
Licínia Girão preside à CCPJ por ser considerada “jurista de mérito reconhecido”, Nas provas do concurso deste ano para o curso de magistrados do CEJ foi das piores candidatas.
Com efeito, atendendo às suas notas nas três provas escritas – Direito Civil, Direito Penal e Desenvolvimento de Temas Culturais, Sociais ou Económicos –, certo ficou que não lhe bastará ser considerada, entre alguns dos seus pares, uma “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social” para ser aceite nos cursos de formação de juízes e delegados do Ministério Público. Vai ter muito que estudar.
Sendo exigido aos candidatos – para passar à segunda fase do concurso que escolherá, este ano, 104 alunos – a obtenção de notas positivas em todas as três provas (pelo menos 10, em 20), o melhor que Licínia Girão conseguiu foi, contudo, um 10,50 em Direito Civil. Mesmo assim, foi apenas a 96ª melhor classificação entre 269 candidatos.
No caso de Direito Penal, “apanhou” um 5,05 (em 20). Houve 249 candidatos com melhor nota.
Já bastaria, por si só, o “chumbo” a Direito Penal para Licínia Girão ser excluída, mas ainda teve direito a um duplo carimbo por força da negativa (8,75) à prova de Desenvolvimento de Temas Culturais, Sociais ou Económicos.
Nesta última prova, seria expectável um melhor resultado por parte de uma jornalista, porquanto foram colocadas aos examinados, para dissertar, duas questões de cultura geral – sobre capacidade de carga turística e sobre o impacto da digitalização na transformação das práticas culturais dos portugueses – a partir de trechos de notícias do Público e do Gerador. Licínia Girão não conseguiu os mínimos, isto é, uma nota de 10 ou superior. Só foi melhor do que 16 candidatos.
Apesar de ser irrelevante na passagem para a fase seguinte – provas orais e análise curricular –, uma vez que para a exclusão bastava uma negativa, Licínia Girão obteve, no cômputo geral das três provas, um total de 24,30 valores (num total de 60 possíveis), colocando-a assim no lugar 230 em 269 candidatos.
Saliente-se que passaram para a segunda fase, 119 candidatos (por esta via académica), ou seja, a taxa de aprovação foi de 44%. Nos 10 melhores classificados, constam sete mulheres.
A este desempenho de Licínia Girão nas provas para o curso de formação de magistrados do CEJ – que colocam em causa o seu estatuto de “jurista de mérito” –, acresce ainda, como já noticiou o PÁGINA UM, o facto de ser advogada-estagiária num escritório em Santo Tirso, apesar de morar em Coimbra, e de se assumir como “coordenadora da comunicação interna do Instituto de Certificação e Formação de Mediadores Lusófonos (ICFML)”, uma tarefa que poderá ser considerada incompatível face ao estabelecido no Estatuto do Jornalista.
Porém, o seu fraco currículo não a impediu de ser escolhida para a presidência do órgão regulador e disciplinar dos jornalistas. Criada em 1995, a CCPJ foi sempre presidida por magistrados durante duas décadas: Eduardo Lobo (entre 1995 e 2001; juiz de direito à data); Eurico dos Reis (entre 2001 e 2005; juiz desembargador à data); Pedro Mourão (entre 2005 e 2014; juiz desembargador à data).
Depois, foi escolhido em 2015 o advogado Henrique Pires Teixeira, que exercia aquela profissão desde 1982 e ocupara também o cargo de director de um jornal regional (A Comarca). Antes de Licínia Girão, o cargo de presidente da CCPJ foi ocupado por Leonete Botelho, advogada desde 1992, de acordo com os registos da Ordem dos Advogados, e jornalista do Público desde os anos 90, sendo actualmente grande repórter, depois de já ter sido editora das secções Política (2009-2016) e de Sociedade (2003-2006).
Sobre a indicação de Licínia Girão para o cargo de presidente da CCPJ, o PÁGINA UM não conseguiu saber como o seu nome surgiu para o cargo. A própria não quis esclarecer esta questão.
O PÁGINA UM também quis saber junto dos oito jornalistas membros da CCPJ – que elegeram Licínia Girão – quem (pessoa ou entidade) a indicou para o cargo, se tinham visto o seu currículo e se houvera outros candidatos para o cargo. Contudo, nenhum destes jornalistas – Jacinto Godinho, Anabela Natário, Miguel Alexandre Ganhão, Isabel Magalhães (nomeados pelos jornalistas), e Cláudia Maia, Paulo Ribeiro, Luís Mendonça e Pedro Pinheiro (nomeados pelos operadores do sector) – respondeu às questões do PÁGINA UM nem prestou qualquer esclarecimento até agora.
N.D.No passado dia 12 de Agosto, o PÁGINA UM criticou, com veemência, uma inaudita recomendação da CCPJ, sem enquadramento legal, que visou “censurar” um trabalho de investigação sobre a Sociedade Portuguesa de Pneumologia. Tem também o PÁGINA UM colocado diversas questões à CCPJ, algumas ainda no tempo de Leonete Botelho como presidente. Em alguns casos sem resposta. Os artigos do PÁGINA UM sobre Licínia Girão, a actual presidente da CCPJ, são de indiscutível relevância e interesse público, e sustentam-se exclusivamente em factos, tendo-se sempre dado primazia ao contraditório. Na nossa opinião, a existência de discórdias não pode condicionar a linha editorial do PÁGINA UM. Se assim fosse, tendo em conta que o PÁGINA UM tem até processos de intimação em tribunal contra o Ministério da Saúde, tal significaria, por absurdo, que teríamos de deixar de noticiar temas sobre Saúde ou sobre Marta Temido.
Criado em 1995, o órgão de regulação e de disciplina dos jornalistas foi, durante duas décadas, presidido por magistrados. Os últimos dois presidentes, incluindo a primeira mulher (a jornalista Leonete Botelho), eram advogados registados na respectiva Ordem há mais de 25 anos. A razão era simples: exigia-se no topo “um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação”. A recém eleita presidente é, porém, uma jornalista freelancer com currículo na imprensa regional, e está agora a realizar um estágio “fantasma” num escritório de advogados em Santo Tirso, apesar de viver em Coimbra. E também faz comunicação interna de um instituto de mediação de conflitos. Ninguém esclareceu ao PÁGINA UM a razão da escolha de Licínia Girão para a CCPJ. Nem a própria.
A lei que regula o funcionamento do órgão regulador e disciplinador dos jornalistas – a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) – é taxativa: a sua presidência somente pode ser ocupada por “um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”, cooptado pelos outros oito membros.
Mas na recente eleição, em Maio passado, o ambíguo conceito de “jurista de reconhecido mérito” acabou por ser encaixado no perfil de Licínia Girão, uma jornalista freelancer (desde início do século) com percurso profissional consolidado sobretudo em trabalhos avulso na imprensa regional, e que se encontra a realizar actualmente um estágio de advocacia num escritório de Santo Tirso, Rodrigues Braga & Associados, apesar de viver em Coimbra.
Licínia Girão preside à CCPJ por ser considerada “jurista de mérito reconhecido”, apesar de ser advogada-estagiária num escritório em Santo Tirso, e apesar de viver em Coimbra.
Nascida em 1965, Licínia Girão apenas recentemente se dedicou aos estudos universitários, após ter concluído uma licenciatura em Direito já este século. No Registo Nacional de Teses e Dissertações constam agora dois mestrados concluídos em Outubro de 2019 e em Março de 2021: o primeiro em Jornalismo e Comunicação; e o segundo em Ciências Jurídico-Forenses.
Além destas duas recentes provas académicas de nível intermédio, não consta outro qualquer registo consultável de obra académica ou de natureza relevante do ponto de vista profissional que possa atribuir a Licínia Girão um estatuto de “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”.
Criada em 1995, a CCPJ foi sempre presidida por magistrados durante duas décadas: Eduardo Lobo (entre 1995 e 2001; juiz de direito à data); Eurico dos Reis (entre 2001 e 2005; juiz desembargador à data); Pedro Mourão (entre 2005 e 2014; juiz desembargador à data).
Em 2015 foi escolhido o advogado Henrique Pires Teixeira, que exercia aquela profissão desde 1982 e ocupara também o cargo de director de um jornal regional (A Comarca). Este advogado é, actualmente, presidente da Assembleia Geral da Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação (APCT).
Em 2018 seria eleita a primeira mulher para este cargo, Leonete Botelho. Advogada desde 1992, de acordo com os registos da Ordem dos Advogados, Leonete Botelho é jornalista do Público desde a sua fundação, naquele mesmo ano, sendo actualmente grande repórter, depois de já ter sido editora das secções Política (2009-2016) e de Sociedade (2003-2006).
Quanto a Licínia Girão, além do parco currículo jurídico e jornalístico, subsistem dúvidas sobre a sua efectiva actividade profissional, a começar pela forma como está a desenvolver o seu estágio obrigatório de dois anos.
O PÁGINA UM contactou esta tarde, por telefone, a sociedade Rodrigues Braga & Associados – cujos contactos correspondem ao local de estágio de Licínia Girão no registo da Ordem dos Advogados –, perguntando como poderia contactar com a advogada-estagiária, tendo sido informado por uma secretária que não era do seu conhecimento estar lá a trabalhar alguém com o nome da actual presidente da CCPJ.
Registo de Licínia Girão na Ordem dos Advogados como estagiária, indicando um endereço que corresponde ao da sociedade Rodrigues Braga & Associados, onde não é conhecida pela secretária que atendeu o jornalista do PÁGINA UM.
[Este contacto telefónico foi gravado, sem autorização, e, apesar de o jornalista se ter identificado pelo nome verdadeiro, não se identificou como jornalista. O ponto 4 do Código Deontológico dos Jornalistas salienta que “o jornalista deve utilizar meios leais para obter informações, imagens ou documentos e proibir-se de abusar da boa-fé de quem quer que seja. A identificação como jornalista é a regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestável interesse público e depois de verificada a impossibilidade de obtenção de informação relevante pelos processos normais.” O PÁGINA UM defende o método usado por se estar perante um incontestável interesse público, estando convicto de que a sua identificação prévia como jornalista resultaria num eventual enviesamento da verdade.]
No site da Rodrigues Braga & Associados, consultado no dia 14 de Agosto e hoje, também não surge Licínia Girão como integrando a equipa, quer de advogados seniores, quer de advogados-estagiários. Na base de dados da Ordem dos Advogados, a presidente da CCPJ tem registo de estágio naquela sociedade desde 22 de Fevereiro do ano passado.
Além do seu estágio aparentemente “fantasma”, Licínia Girão acumula as suas tarefas de presidente da CCPJ – que não obriga a qualquer exclusividade – com uma intensa actividade de busca de novos horizontes profissionais.
No site da Rodrigues, Braga & Associados constam três advogadas-estagiárias (Inês Curval, Ana Sofia Ferreira e Diana Silveira). Não consta o de Licínia Girão nem o seu nome é conhecido pela secretária deste escritório de advogados de Santo Tirso.
De acordo com a investigação do PÁGINA UM, Licínia Girão candidatou-se este ano ao 39º curso de ingresso de formação de magistrados no Centro de Estudos Judiciários, desconhecendo-se se foi aprovada. E também se candidatou a mediadora de conflitos dos julgados da paz do agrupamento de concelhos da Batalha, Leiria, Marinha Grande, Pombal e Porto de Mós, e do agrupamento de concelhos de Alvaiázere, Ansião, Figueiró dos Vinhos, Pedrógão Grande e Porto de Mós, não se conhecendo também os resultados.
Licínia Girão assume-se também como “coordenadora da comunicação interna do Instituto de Certificação e Formação de Mediadores Lusófonos (ICFML)”, uma tarefa que poderá ser considerada incompatível face ao estabelecido no Estatuto do Jornalista. De acordo com a alínea b) do nº 1 deste diploma legal são incompatíveis com a actividade jornalística as “funções de marketing, relações públicas, assessoria de imprensa e consultoria em comunicação ou imagem, bem como de planificação, orientação e execução de estratégias comerciais”.
Aliás, muitos aspectos do percurso formativo e profissional (incluindo jurídico) de Licínia Girão mantêm-se sombrios – a começar por quem lhe dirigiu em concreto o convite para a presidência da CCPJ –, porque esta não os quis esclarecer quando questionada pelo PÁGINA UM (ver troca de mensagens em anexo).
Além de referências generalistas às funções da CCPJ, na resposta ao PÁGINA UM, Licínia Girão preferiu destacar, na terceira pessoa, que “pela segunda vez na história da Comissão uma jornalista / jurista com formação superior pós-graduada em Direito da Comunicação, se comprometeu honrar na defesa do jornalismo e acompanhamento dos jornalistas”. E faz ainda referência ao “decretado no nº 2 do já citado artigo 20º do Decreto-Lei nº 70/2008, de 15 de Abril”, ou seja, à independência do cargo consagrada na lei.
A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista funciona no Palácio Foz, em Lisboa.
O PÁGINA UM ainda reiterou anteontem o pedido de comentário e informações a Licínia Girão, salientando que a sua missiva “não respondeu nem esclareceu qualquer dos pontos referidos [nas questões colocadas], designadamente ano de início e conclusão do curso de Direito, em que moldes se encontra a realizar o estágio num escritório de Santo Tirso (vivendo em Coimbra), e não existindo referência no site da referida Sociedade, de quem recebeu o convite para a presidência da CCPJ (não tendo, pelo que sei, integrado a lista nem dos jornalistas nem dos operadores do sector) e se se considera uma ‘jurista de mérito reconhecido’, de acordo com o referido na lei.”
O PÁGINA UM também explicitou, nessa missiva, não ser a “questão do género que aqui está em causa, como parece a todos óbvio, mas sim se a legislação foi aplicada com rigor na escolha em concreto” da nova presidente da CCPJ.
Esta missiva não obteve resposta. Um conjunto de questões colocadas pelo PÁGINA UM a Jacinto Godinho, membro da CCPJ desde 2015, jornalista da RTP e professor da Universidade Nova de Lisboa, também não obteve qualquer reacção.
Troca de mensagens (integral) entre o PÁGINA UM e a Presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista
Exma. Senhora Dra. Licínia Girão,
O regime de organização e funcionamento da CCPJ, no nº 1 do artigo 20º do Decreto-Lei n.º 70/2008 de 15 de Abril, refere que esta “é composta por oito elementos com um mínimo de 10 anos de exercício da profissão de jornalista e detentores de carteira profissional ou título equiparado válido, designados igualitariamente pelos jornalistas profissionais e pelos operadores do sector, e por um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social, cooptado por aqueles, que preside.”
De acordo com a investigação que tomei a cargo, constato que, efectivamente, é licenciada em Direito pela Universidade de Coimbra (agradecia que me esclarecesse em que ano foi a primeira inscrição e o ano de conclusão), tendo ainda dois recentes mestrados ambos na Universidade de Coimbra: Jornalismo e Comunicação (2019) e Ciências Jurídico-Forenses (2021).
Também tenho conhecimento que se encontra a realizar o estágio de advocacia desde 2020 num escritório de advocacia em Santo Tirso, apesar de ter conhecimento de viver em Coimbra (agradecia confirmação), embora o seu nome não conste na equipa do referido escritório (https://archive.ph/too8Q). Aliás, agradecia que me informasse em que moldes se encontra a realizar esse estágio.
Tenho também conhecimento de que estará em provas para admissão no CEJ.
Não tenho conhecimento de quaisquer estudos, análises e actividades profissionais no meio juridico (além da tese de mestrado) em que se possa destacar o seu papel de “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social”, pelo menos atendendo ao histórico de todos os seus antecessores.
Considerando, repito, que a legislação destaca a necessidade de o/a presidente da CCPJ ser “um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social” – e, para todos os efeitos, sem demérito, estamos perante uma mestre em Direito e em Jornalismo e uma advogada-estagiária, gostaria de ter a sua opinião, para efeitos de elaboração de notícia, se se considera enquadrada nessa exigência da lei. Ou seja, se pessoalmente se considera uma “jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social” e porquê.
Por outro lado, e tendo em consideração que se reveste de relevância pública, e uma vez que não foi eleita nas listas dos jornalistas nem aparentemente na lista indicada pelos operadores do sector, gostaria de saber quem (pessoa ou pessoas) ou que entidade em concreto a convidou para a presidência da CCPJ.
Aguardando as suas respostas e esclarecimentos, e manifestando, desde já, a minha garantia de rigor, que me advém de funções jornalísticas desde 1995 (com passagens, entre outros, pelo Expresso e Grande Reportagem), e de uso de princípios deontológicos (recordo a minha passagem pelo Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas e a ausência de qualquer “condenação” por infringir tais regras), fico à sua disposição, aguardando por uma resposta até terça-feira.
Cumprimentos.
Pedro Almeida Vieira
14 de Agosto de 2022
Exmo. Senhor Pedro Almeida Vieira
Na sequência do seu contacto, cumpre responder-lhe o seguinte:
Tal como referido no artigo 20.º, 1 do Decreto-Lei nº 70/2008 de 15 de Abril “a CCPJ é composta por oito elementos com um mínimo de 10 anos de exercício da profissão de jornalista e detentores de carteira profissional ou título equiparado válido, designados igualitariamente pelos jornalistas profissionais e pelos operadores do sector, e por um jurista de reconhecido mérito e experiência na área da comunicação social, cooptado por aqueles, que preside”.
A atual composição da direção da CCPJ submeteu-se ao escrutínio dos seus pares, nos termos estatuídos por lei, e a sua presidente, tal como prevê o já mencionado instituto, foi cooptada, unanimemente, pelos jornalistas que elegeram os membros para integrarem a CCPJ e, ainda, pelos que foram nomeados pelos operadores do setor.
É criterioso propósito da CCPJ, desde a sua criação em 1996, cumprir com os deveres que lhe têm vindo, sucessivamente, a ser consignados. Obrigações, que a sua atual presidente, que à semelhança da anterior é pela segunda vez na história da Comissão uma jornalista / jurista com formação superior pós-graduada em Direito da Comunicação, se comprometeu honrar na defesa do jornalismo e acompanhamento dos jornalistas. Não perdendo de vista o decretado no nº 2 do já citado artigo 20.º do Decreto-Lei nº 70/2008, de 15 de Abril.
De referir, por último, que a lei não exige que o exercício das funções de presidente da CCPJ seja exercido em regime de exclusividade.
Atentamente
Licínia Girão
16 de Agosto de 2022
Exma. Senhora Dra. Licínia Girão:
Na posse da sua resposta, que muito agradeço, quero em todo o caso salientar que não respondeu nem esclareceu qualquer dos pontos referidos na minha carta, designadamente ano de início e conclusão do curso de Direito, em que moldes se encontra a realizar o estágio num escritório de Santo Tirso (vivendo em Coimbra), e não existindo referência no site da referida Sociedade, de quem recebeu o convite para a presidência da CCPJ (não tendo, pelo que sei, integrado a lista nem dos jornalistas nem do operadores do sector) e se se considera Uma “jurista de mérito reconhecido”, de acordo com o referido na lei.
Desnecessário seria dizer, mas convém, que me congratulo com a ocupação, quer na CCPJ quer em qualquer outra entidade, de mulheres em cargos de prestígio e de responsabilidades (para os quais têm tanto ou até mais créditos). Não é, obviamente, a questão do género que aqui está em causa, como parece a todos óbvio, mas sim se a legislação foi aplicada com rigor na escolha em concreto.
Como vou escrever apenas amanhã este texto, deixo à sua consideração responder às questões. Em todo o caso, garantido está que, mesmo que à parte, transcreverei na íntegra as suas declarações.
Entidade Reguladora para a Comunicação Social – que tem poderes de supervisão sobre todos os media, podendo censurá-los com críticas e aplicar-lhes coimas – está a forçar a “fabricação” de incidentes contra o PÁGINA UM como manobra de diversão face às ilegalidades processuais numa queixa da Sociedade Portuguesa de Pneumologia e para encontrar argumentos para não ter de ceder informação sensível em matéria de transparência de grupos empresariais.
Em comunicado divulgado esta tarde, a Direcção do Sindicato dos Jornalistas criticou a postura do Conselho Regulador para a Comunicação Social pela forma como quis envolver toda a classe para, dessa forma, tentar “isolar” o director do PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira, que tem procurado legitimamente consultar processos administrativos e pressionado o regulador a disponibilizar documentos sobre a transparência media.
Aliás, sobre este segundo assunto, na próxima semana o PÁGINA UM irá apresentar um pedido de intimação junto do Tribunal Administrativo de Lisboa porque o presidente da ERC, o juiz conselheiro Sebastião Póvoas, nem sequer respondeu ao pedido de acesso aos requerimentos de um número indeterminado de grupos de media que solicitaram aos reguladores a confidencialidade de informação económica e financeira no Portal da Transparência, bem como às decisões.
Apenas em 2022 foram feitos 22 pedidos, cujas decisões não são conhecidas com excepção do da empresa gestora da TVI e CNN Portugal. Entre a informação confidencial poderá estar, por exemplo, montantes de dívida à Autoridade Tributária e Aduaneira, apurou já o PÁGINA UM. A ERC deveria, por lei, disponibilizar essa informação até ao passado dia 4 de Agosto. Não o fez até agora.
Sobre os conflitos entre a ERC e o PÁGINA UM – que desencadeou um inédito comunicado ad hominem do regulador na terça-feira passada –, a Direção do Sindicato dos Jornalistas refere, no seu comunicado, que “as generalizações, além de serem perigosas, são quase sempre desnecessárias”, manifestando surpresa que a ERC tenha escrito, referindo-se ao director do PÁGINA UM, como sendo um “cidadão [que] tenta legitimar comportamentos nos quais, consideramos, que a classe jornalística não se revê”.
Carta de 21 de Julho do PÁGINA UM à ERC. Os pedidos de acesso a documentos administrativos por um jornalista são olhados agora como acções de “coacção” pelo regulador.
O organismo presidido por Luís Simões avisa também a ERC de não ser incumbência do regulador “pressupor em que é que a classe dos jornalistas se revê ou deixa de rever”.
Por outro lado, o Sindicato dos Jornalistas relembra a ERC – que, aliás, tem no seu registo obrigatório Pedro Almeida Vieira como responsável editorial do PÁGINA UM – que “independentemente dos desentendimentos existentes, o cidadão Pedro Almeida Vieira é, de facto, jornalista, portador da Carteira Profissional de Jornalista número 1786, sendo também sócio do SJ, com o número 4556.”
Além disso, Pedro Almeida Vieira foi já também, no seio desta estrutura sindical, membro do Conselho Deontológico.
Defendendo não lhe caber fazer comentários sobre conflitos entre a ERC e o PÁGINA UM – incluindo se “alguma das partes cometeu ato ilícito” –, o Sindicato dos Jornalistas assegura que “como qualquer outro associado, Pedro Almeida Vieira tem direito, se assim o entender, a recorrer ao apoio do gabinete jurídico do Sindicato dos Jornalistas neste ou em qualquer outro processo.”
Entretanto, esta tarde, apesar de não mencionar o PÁGINA UM nem o seu director, a ERC divulgou novo comunicado referindo que a sua “Comissão de Trabalhadores (…) reuniu, esta quinta-feira, com o Senhor Presidente do Conselho Regulador, discutindo-se a perturbação que vem sendo sentida na ERC que coloca em causa o regular funcionamento da instituição e o seu bom nome, bem como a tranquilidade dos seus trabalhadores.”
O comunicado acrescenta ainda que esta comissão de trabalhadores “está solidária com os membros do Conselho Regulador e com todos os trabalhadores envolvidos.”
Sem apresentar publicamente uma justificação, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social indeferiu o pedido de confidencialidade dos dados económicos e financeiros em 2021 da empresa TVI – Televisão Independente, do universo da Media Capital. Nos últimos dois anos, os prejuízos ultrapassaram os 14 milhões e em apenas três anos quase dois terços do capital próprio esfumou-se.
A TVI – Televisão Independente S.A. – a empresa detentora da TVI e da CNN Portugal, que se encontra no universo da Media Capital – viu a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) recusar a confidencialidade dos seus indicadores financeiros do ano de 2021. Em consulta do PÁGINA UM ao Portal da Transparência dos Media, todos os dados financeiros do ano passado já aliconstam, sem excepção: activos, passivo, rendimentos, resultados líquidos e o peso dos principais clientes e dos detentores do passivo (credores).
No início de Julho, o PÁGINA UM revelara em primeira-mão que a TVI S.A. estava a tentar obter autorização para esconder toda a sua informação económica e financeira do ano passado. A ERC mantinha então, na Plataforma da Transparência, a indicação de estar a analisar o pedido.
José Eduardo Moniz consta como responsável editorial da TVI – Televisão Independente S.A. no Portal da Transparência da ERC.
Por a Media Capital nunca ter respondido ao PÁGINA UM, ignoram-se os motivos do pedido de confidencialidade, mas, de facto, não havia desempenhos assim tão lustrosos para mostrar.
Apesar de os rendimentos totais terem aumentado de 112,7 milhões de euros em 2020 para 130,8 milhões de euros em 2021, repetiu-se o “desastre” económico dos últimos anos: acumularam-se prejuízos.
Quase em linha com 2020 (resultados negativos de 7,28 milhões de euros), a TVI S.A. viu Dezembro de 2021 terminar com um prejuízo de 7,07 milhões de euros.
Confirma-se assim um ciclo negro da empresa responsável pela TVI e CNN Portugal, que em 2017 tivera um lucro de 21,15 milhões de euros e em 2018 um lucro de 19,49 milhões de euros. O ano de 2019 já tinha sido de recessão, quando foram apresentados resultados líquidos negativos na ordem dos 963 mil euros.
Em virtude desta má prestação económica, o capital próprio despencou: entre 2018 e 2021 passou de 52,9 milhões de euros para 18,1 milhões, uma queda de 66% em apenas três anos. Em oposição – ou em consequência –, o passivo aumentou fortemente: em 2018 estava nos 61,6 milhões de euros para os 89,8 milhões. E com uma agravante: em vez de instituições bancárias ou entidades externas, os principais credores da TVI S.A. são empresas do universo da própria Media Capital: a Meglo Media Global (35% do passivo) e Plural (13%), agregando um total de 19,6 milhões de euros.
Dados económicos e financeiros do ano passado da TVI – Televisão Independente S.A. estão agora disponíveis. ERC indeferiu integralmente pedido de confidencialidade.
Um outro aspecto das contas da TVI S.A. que acabou também por ser revelado foi o peso da MEO nos rendimentos desta empresa. De acordo com os dados do Portal da Transparência, a MEO é um “cliente relevante”, com 15% do total dos rendimentos. Contas feitas, a TVI S.A. recebeu da empresa de telecomunicações cerca de 20 milhões de euros ao longo do ano passado. Foi a primeira vez que a ERC não permitiu confidencialidade deste detalhe à TVI S.A.
Os dois canais televisivos acabaram assim por ser responsáveis pelas contas a vermelho da holding de Mário Ferreira. Em 2021, a Media Capital apresentou um prejuízo de 4,1 milhões de euros, a que se juntam os 11 milhões já registados ao longo de 2020.
Entretanto, o PÁGINA UM aguarda da ERC a satisfação de um pedido de acesso a todos os requerimentos de órgãos de comunicação social que pediram confidencialidade no (paradoxalmente) denominado Portal da Transparência.
De acordo com um diploma legal de Abril de 2016, as entidades que, sob forma societária, prossigam atividades de comunicação social devem enviar anualmente à ERC um relatório de governo societário, incluindo dados sobre o capital próprio, activo total, passivo total, resultados operacionais, resultados líquidos (lucro), rendimentos totais e passivos (totais e contingentes).
Nascida em 2021, a CNN Portugal não conseguiu qualquer milagre económico para a empresa TVI – Televisão Independente S.A.
Também deve constar a relação das pessoas singulares e/ ou colectivas que representem mais de 10% dos rendimentos totais e dos passivos, com as respectivas percentagens. A data-limite para o envio dessa informação à ERC, relativo ao exercício mais recente, é o dia 30 de Junho de cada ano.
No entanto, um regulamento prevê que, “atendendo à sensibilidade e ao caráter sigiloso de alguns dos dados solicitados” – que, na verdade são públicos, por outras vias –, “as entidades poderão solicitar à ERC a aplicação do regime de exceção”, ou seja, podem requerer sigilo, embora o regulador tenha o poder de “rejeitar o pedido (…), desde que por motivos devidamente fundamentados”. Porém, não são conhecidos os critérios para o deferimento, ou não, dos pedidos por parte do regulador.
Após um lamentável ataque em Dezembro do ano passado de grande parte da imprensa mainstream ao PÁGINA UM, acusando o jornal de ser “negacionista” e ter revelado ilegalmente dados clínicos de crianças, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) demorou sete meses a tomar todas as decisões. Entre recursos, atrasos, reclamações e muita “luta”, o regulador acabou por obrigar três órgãos de comunicação social (CNN Portugal, Público e Observador) a publicarem o direito de resposta do director do PÁGINA UM, mas em duas deliberações controversas (com voto contra do próprio presidente) “livrou” Lusa e Expresso de fazer o mesmo. Fica, nesta “novela”, um exemplo do tipo de jornalismo feito actualmente por certa imprensa e a arrogância de alguns directores. Nenhum destes jornais pediu sequer desculpa pelas falsas, difamantes e injustas notícias. Nem ao director do PÁGINA UM nem aos (seus, deles) leitores.
A Entidade Reguladora para a Comunicação Social determinou a abertura de um “procedimento oficioso” contra o jornal Público “por manter em linha comentários de leitores de natureza difamante” que atingem o director do PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira, numa notícia publicada naquele diário em 23 de Dezembro.
Em causa estão comentários da notícia “Dados clínicos de crianças internadas em cuidados com covid expostos nas redes sociais” que explicitamente acusam o director do PÁGINA UM de, entre outros epítetos, gerir uma “página negacionista”, de ser “um dos impostores das redes sociais” e de estar associado à “extrema-direita, sem um pingo de ética nem credibilidade”.
Na mesma deliberação, o regulador decidiu rectificar uma sua decisão anterior, concedendo legitimidade no direito de resposta do director do PÁGINA UM – recusada pelo jornal dirigido por Manuel Carvalho. No entanto, estranhamente, não ordenou de imediato a publicação do direito de resposta, tendo sim determinado que “sejam apreciados pelo [seu] Departamento Jurídico os demais requisitos legais para o exercício do direito de resposta na situação em apreço”.
Esta notícia do Público foi espoletada pela publicação de um artigo do então jornalista-estagiário Henrique Magalhães Claudino na CNN Portugal que acusava – sem citar mas com detalhes suficientemente claros para uma fácil identificação – o PÁGINA UM de ser uma “página anti-vacinas no Facebook”, apresentando críticas acintosas de um conjunto de médicos.
Na verdade, em causa estava um dos primeiros trabalhos de investigação jornalística do PÁGINA UM que revelava, com dados oficiais convenientemente anonimizados, o impacte factual da covid-19 nas crianças – praticamente irrelevante – numa altura em que existiam pressões para os pais vacinarem os seus pequenos filhos.
Notícia do Público de 23 de Dezembro passado, além de falsa, manteve em linha comentários difamatórios.
A CNN Portugal viria a ser condenada pela ERC a publicar o texto integral do direito de resposta do director do PÁGINA UM, mas demorou mais de um mês a fazê-lo. Em consequência, a ERC aplicou uma sanção pecuniária de 16.500 euros e abriu um processo de contra-ordenação que pode resultar numa coima máxima de 250 mil euros.
Noutra deliberação sobre uma similar notícia do Observador – que consistia também num “decalque” da notícia da CNN Portugal –, a ERC decidiu dar razão ao PÁGINA UM, embora tenha demorado (sem qualquer justificação) mais de seis meses a apreciar a queixa sobre denegação do direito de resposta daquele jornal digital dirigido por Miguel Pinheiro.
A “cacha” do PÁGINA UM, uma investigação jornalística com recurso a uma base de dados anonimizada, foi difamada primeiro pela CNN Portugal e, logo no mesmo dia, pelo Público, Observador, Lusa e Expresso. Todos negaram direito de resposta ao director do PÁGINA UM e nenhum pediu jamais desculpas. Um ataque concertado sem precedentes na História do Jornalismo português.
De acordo com a deliberação da ERC, o Observador ainda alegou que “o direito de resposta não foi enviado por e-mail, mas apenas, somente, por carta”, e que “o Requerente [director do PÁGINA UM não indicou o seu endereço ‘quer na missiva, quer no envelope”, algo que não corresponde à verdade.
De facto, o e-mail foi enviado para o denominado publisher (termo inglês que não encontra sequer enquadramento na Lei da Imprensa) do Observador, José Manuel Fernandes (o primeiro nome que surge na ficha técnica que identifica todos os membros da direcção editorial), que até respondeu no próprio dia, afirmando não ser ele o responsável editorial.
Na troca de mensagens, José Manuel Fernandes seria informado que, nessas circunstâncias, apesar de ele estar formalmente informado, seria enviada carta registada a Miguel Pinheiro, classificado como director executivo (e não editorial), o que seria feito no dia seguinte.
Certo é que esse pormenor foi considerado irrelevante pela ERC, que acabou por concluir pela existência de elementos identificadores suficientemente relevantes, incluindo a ligação para a notícia original da CNN Portugal, e obrigou o Observador a publicar o direito de resposta (sete meses depois de solicitado) no prazo de dois dias. O Observador já publicou ontem o direito de resposta do director do PÁGINA UM.
Quanto à autora da notícia do Observador, Ana Kotowicz, a ERC decidiu enviar o processo para a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista para eventual levantamento de processo disciplinar.
A par destes dois processos, a ERC também se debruçou sobre duas reclamações acerca de anteriores deliberações – similares às do Público – visando denegação do direito de resposta por parte da Lusa e do Expresso. Nestes casos, porém, e de forma surpreendente, o Conselho Regulador da ERC manteve a posição de não obrigar estes dois órgãos de comunicação social a concederem o direito de resposta, argumentando que, ao contrário do Público e do Observador, não embeberam o link da notícia da CNN Portugal, embora tenham citado profusamente o conteúdo da notícia da CNN Portugal.
Sete meses depois, e mesmo com mentiras do Observador durante o processo, a ERC obrigou o jornal digital a publicar o direito de resposta do director do PÁGINA UM.
Tanto na deliberação sobre a Lusa como naquela sobre o Expresso, a ERC continua a defender inexistente “aquele elemento caracterizador suficientemente preciso para que o Reclamante, mesmo que não mencionado directamente pudesse ser reconhecido – ainda que pelo círculo de pessoas do seu relacionamento profissional ou pessoal”. E diz isto apesar de o PÁGINA UM ter apresentado na reclamação à ERC uma lista de 84 pessoas (identificadas com nome completo, número de cartão de cidadão e contacto de e-mail) para serem auscultadas sobre esta matéria. O regulador não ouviu uma única, nem fundamentou por que razão não as ouviu.
O PÁGINA UM pondera recorrer ao Tribunal Administrativo para reverter esta decisão, uma vez que uma instância judicial pode obrigar a ERC a modificar as suas decisões se estas forem ilegítimas ou contrárias à lei e jurisprudência.
Até porque estas duas inauditas deliberações da ERC não foram aprovadas por unanimidade, e tiveram mesmo a oposição do seu próprio presidente, Sebastião Póvoas, que é um juiz conselheiro.
Declaração de voto (vencido) do presidente da ERC nas deliberações sobre Lusa e Expresso.
Considerando que deveria ser concedido o direito de resposta – tal como sucedera com os casos da CNN, Público e Observador –, nas suas duas declarações de voto (similares no texto), o juiz conselheiro acaba por dar aos seus colegas uma lição de lógica, de raciocínio, de Direito e de bom senso.
Afirmando que “mau grado não ter sido aposto um ‘link’ ao texto [das notícias da Lusa e do Expresso]”, Sebastião Póvoas começa por constatar que isso “foi feito pelos jornais Público e Observador, como é reconhecido nas deliberações ora votadas, e tal foi a razão para o provimento dos recursos, [pelo que] é lícito extrair uma conclusão natural – facto da experiência comum – que quer o Expresso, quer a Lusa como órgãos presuntivamente atentos a tudo o que se publica também tenham tido acesso à mesma fonte”.
Sebastião Póvoas continua, dizendo: “Ora, tal representa uma presunção judicial. Trata-se do ‘id quo plerumque accidit’, consistente no extrair uma conclusão óbvia de um facto da experiência comum”.
E conclui: “É a prova ‘prima facie’ baseada no ‘simples raciocínio de quem julga’, ‘nas máximas da experiência, nos juízos de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos dados da intuição humana. (…) E o uso dessas presunções simples é geralmente admitido como conclusões logicamente necessárias por já compreendidas nas premissas em termos de normalidade de vida e do conhecimento geral e do senso comum”.
Capacidades simples e singelas que, aparentemente – e extraindo-se das duas declarações de voto do presidente da ERC –, não estarão ao alcance dos outros três membros do Conselho Regulador: Francisco Azevedo e Silva, Fátima Resende e João Pedro Figueiredo, apesar da importância deste órgão pressupor elevados padrões cognitivos aos seus dirigentes.
Por recusar publicar um direito de resposta da Igreja Universal do Reino de Deus em 2017, por um conjunto de investigações jornalísticas de rigor questionável, a TVI vai ter de abrir os cordões à bolsa. É a primeira vez que um tribunal judicial aplica este tipo de sanção a um órgão de comunicação social de âmbito nacional..
A TVI e o seu antigo director de informação, Sérgio Figueiredo, foram condenados a indemnizar a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) em quase 70 mil euros, numa decisão inédita nos tribunais portugueses. O desfecho resulta de um longo processo que teve início há mais de quatro anos, após a estação televisiva do Grupo Media Capital – também detentora da CNN Portugal – ter recusado transmitir o direito de resposta da IURD sobre uma série de 17 reportagens intitulada O segredo dos deuses, transmitida entre Dezembro de 2017 e Junho de 2018.
A investigação jornalística de Alexandra Borges e Judite França, denunciava uma suposta rede internacional de adopções ilegais e rapto de crianças alegadamente montada por aquela instituição religiosa. Num dos referidos episódios, o então director Sérgio Figueiredo chegou mesmo a apelidar a IURD como uma “associação de malfeitores e criminosos”.
Reportagem da TVI acusava o fundador da IURD no Brasil de estar envolvido em esquemas de adopção ilegal, algo que acabou por não ficar provado.
Por danos não patrimoniais, os réus foram condenados pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste ao pagamento de 50 mil euros, satisfazendo o pedido da IURD, tendo o juiz Miguel Raposo determinado ainda uma indemnização de 18.500 euros a título de danos patrimoniais. Inicialmente, a lesada requerera um total de 99.105 euros, tendo esse valor sido depois ampliado para 125.673. Respeitante a danos patrimoniais, foram alegadas despesas com assessoria jurídica e também os custos do texto de resposta (pagando) em outros meios de informação.
Recorde-se que o impacte da transmissão destas reportagens foi então muito significativo, tendo mesmo suscitado intervenções do Ministério Público e até petições para o encerramento das actividade da IURD em Portugal. Fundada em 1977 no Brasil, a IURD chegou a Portugal em 1989.
A sentença do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, datada de 12 de Julho passada, destaca que a TVI nunca quis reconhecer o direito de resposta, argumentando “falta de legitimidade para o exercício do direito, intempestividade e ausência de relação directa e útil entre as referências feitas nas reportagens e grande parte do afirmado nos textos de resposta”.
Sérgio Figueiredo tem “saltitado” entre o mundo empresarial e a liderança de redacções de jornalistas. Depois de ser director do Diário Económico, no início do século, passou a seguir pela administração de empresas do Grupo EDP, tendo depois seguido para a direcção da TVI entre 2015 e 2021. Apresenta-se agora como consultor de sustentabilidade freelance.
Curiosamente, apesar de ter sempre refutado as acusações e caracterizado a reportagem como “manifestamente falsa”, à IURD foi inicialmente negado o direito de resposta pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) em 2018. Mas, em Fevereiro de 2020, após uma intimação favorável à queixosa, o regulador foi obrigado a alterar a sua deliberação inicial. Porém, a estação televisiva só acatou a decisão em Julho daquele ano, um “capricho” que lhe custou uma sanção pecuniária no valor de 500 euros por cada dia de atraso, conforme o previsto nos Estatutos da ERC para crimes de desobediência.
Embora a TVI e Sérgio Figueiredo possam ainda recorrer da sentença, esta terá sido a primeira vez que um Tribunal condena um órgão de comunicação social a pagar uma indemnização no seguimento da recusa da emissão do direito de resposta.
Domingos de Andrade é director-editorial do Jornal de Notícias e da TSF, mas também administrador da Global Media e gerente de, pelo menos, mais cinco empresas do grupo empresarial liderado por Marco Galinha, acumulando ainda responsabilidade de edição em outros órgãos de comunicação social. Após a investigação do PÁGINA UM sobre as promiscuidades nos media, iniciada em Dezembro passado, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas (CCPJ) recusou renovar-lhe o título por incompatibilidades. Será o primeiro de mais casos?
A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) não quer renovar a carteira profissional de jornalista a Domingos de Andrade, diretor-geral editorial do Diário de Notícias, e Jornal de Notícias e ainda diretor da radio TSF.
A notícia foi ontem avançada pelo Correio da Manhã, que salienta que o também administrador da Global Media – proprietária destes órgãos de comunicação social – terá impugnado a decisão da CCPJ.
Em todo o caso, o PÁGINA UM confirmou que não consta actualmente no registo daquela entidade o nome de Domingos de Andrade nem como jornalista nem como “equiparado a jornalista”, neste último caso a opção escolhida geralmente para quem se mantém em cargos de direcção editorial sem o estatuto de jornalista acreditado. Domingos de Andrade usava o número 1723 na sua carteira profissional, o que indicia que terá começado a sua profissão em meados dos anos 90.
Domingos de Andrade tem assinado contratos comerciais de legalidade duvidosa, no contexto da Lei da Imprensa, enquanto lidera redacções de órgãos de comunicação social da Global Media.
A posição da CCPJ foi tomada somente no seguimento das investigações jornalísticas do PÁGINA UM, em Dezembro passado, que revelaram que Domingos de Andrade era signatário de dois contratos comerciais, como administrador da Global Media, com entidades públicas. Um desses contratos, assinado em 28 de Julho do ano passado, com a Câmara Municipal de Valongo contratualizava a produção de “52 (cinquenta e duas) reportagens anuais”, a inserir no Canal JN Directo, e ainda “12 (doze) páginas anuais” em suplementos.
Aquele contrato, com o prazo de 24 meses, surgia no seguimento de um outro assinado no início de 2019, tendo como objecto do contrato a “aquisição de serviços de promoção das marcas identitárias e tecido económico local do Município de Valongo”. Ambos com um preço contratual de 74.000 euros.
No entanto, estes contratos serão apenas a “ponta do icebergue”, porque os contratos comerciais entre órgãos de comunicação social e empresas privadas não são, geralmente, do domínio público, ao contrário daqueles que envolvem entidades da Administração Pública ou equiparadas, que constam do Portal Base.
Investigação do PÁGINA UM a revelar as promiscuidades na imprensa começaram em Dezembro do ano passado.
A contratação de produção de reportagens pagas – e, portanto, dependendo de critérios não editoriais – é uma das questões mais sensíveis na imprensa portuguesa e mesmo mundial.
A Lei da Imprensa destaca que o exercício da profissão de jornalista é incompatível com o desempenho de “funções de angariação, concepção ou apresentação, através de texto, voz ou imagem, de mensagens publicitárias” e ainda de “funções de marketing, relações públicas, assessoria de imprensa e consultoria em comunicação ou imagem, bem como de planificação, orientação e execução de estratégias comerciais”.
No entanto, apesar de então a CCPJ ter revelado, em 22 de Dezembro passado, que abrira um “processo de questionamento” a Domingos de Andrade – e também a outros responsáveis editoriais do Público e do universo da Global Media, dos quais se desconhece o resultado –, aquele gestor acabou por assinar novo contrato no final daquele mesmo mês.
Com efeito, Domingos de Andrade assinou um contrato comercial com a Comissão da Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte no valor de 19.990 euros para a prestação de serviços “de produção radiofónica” na TSF, a estação onde ele é director desde Novembro de 2020.
A intervenção de Domingos de Andrade em tarefas de gestão comercial no seio da Global Media são por demais evidentes. Além de administrador da holding – sendo o braço direito executivo do chairman Marco Galinha –, de acordo com o Portal da Transparência é ainda gerente da TSF – Rádio Jornal Lisboa, da TSF – Cooperativa Rádio Jornal do Algarve, da Difusão de Ideias – Sociedade de Radiodifusão, da Pense Positivo – Radiodifusão e ainda vogal do conselho de administração executivo da Rádio Notícias – Produções e Publicidade. E assume, em todas estas empresas, a função de responsável editorial.
Independentemente da resolução deste processo, certo é que Domingos de Andrade está agora a exercer a sua actividade como director-editorial – constando o seu nome na primeira página do Jornal de Notícias de hoje e na ficha técnica da TSF – sem carteira profissional, o que coloca outro problema legal.
Com efeito, possuir carteira profissional válida é uma “condição indispensável ao exercício da profissão de jornalista” – uma situação análoga à carta de condução para a condução de automóveis. O Estatuto do Jornalista refere taxativamente, no seu artigo 4º, que “nenhuma empresa com actividade no domínio da comunicação social pode admitir ou manter ao seu serviço, como jornalista profissional, indivíduo que não se mostre habilitado (…), salvo se tiver requerido o título de habilitação e se encontrar a aguardar decisão”.
O PÁGINA UM pediu esclarecimentos a Domingos de Andrade, mas ainda não obteve qualquer resposta.