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  • Índice de Elogio Servil: jornalismo ou propaganda no Público

    Índice de Elogio Servil: jornalismo ou propaganda no Público

    As evidências eram tão patentes que o próprio Provedor do Leitor do jornal Público se viu ‘obrigado’ a questionar o uso e abuso da aceitação de convites por parte de jornalistas do suplemento Fugas, que tornam supostas reportagens em panegíricos. O PÁGINA UM, recorrendo à inteligência artificial, usando métodos de processamento de linguagem natural (NLP) e análise quantitativa, concebeu o Índice de Elogio Servil (IES), que passa a ser assim uma ferramenta de análise crítica do jornalismo. Para testar a sua ‘eficácia’, passou-se a ‘pente fino’ uma dezena de reportagens do Público. Os resultados não são nada abonatórios.


    Nas duas mais recentes edições sabatinas do jornal Público, o ‘elefante’ foi mostrado no meio da sala. Nas crónicas de José Alberto Lemos, provedor do leitor do jornal da Sonae, abordou o mal-estar de leitores sobre os conteúdos do suplemento Fugas, que por regra publica artigos de viagens e lazer, sobre automóveis e vinhos, sempre escritos por jornalistas, bem como textos de não-jornalistas a relatarem as suas viagens.

    A celeuma centrava-se sobretudo no facto de, por via de viagens e convites pagos por empresas e entidades, esses conteúdos jornalísticos, porque assinados por jornalistas, se aproximarem mais de publicidade encapotada do que de jornalismo imparcial.

    Na primeira crónica, José Alberto Lemos, além de recolher opiniões de leitores, apresentava a ‘contestação’ da editora do suplemento, Sandra Silva Costa, que salientava que apenas entre 10% e 20% dos convites eram aceites, seleccionados com base na relevância para os leitores, adiantando ainda que os jornalistas tinham total liberdade editorial. Contudo, nada dizia sobre os critérios da escolha nem se artigos similares, e igualmente elogiosos, mas sem referência a convite eram executados mesmo sem convite. E se assim eram, qual seria então a razão para não serem todos.

    Na segunda crónica do Provedor do Leitor, foi apresentada a versão do director do próprio jornal, David Pontes, que reforçava que a transparência sobre os convites, assinalados no final dos textos, asseguraria o cumprimento de princípios éticos. E defendia também que o suplemento Fugas, mesmo sendo uma parte integrada da linha editorial do Público, tinha especificidades, focando-se em “sugestões positivas”. De acordo com David Pontes, “a selecção editorial [do suplemento Fugas] reflecte que o foco está na apresentação de experiências positivas, o que não nos isenta de dar nota crítica quando tal não se verifica. Com uma equipa experiente e conhecedora é natural que, antes de ir para o terreno, seja possível fazer uma triagem criteriosa do que podem ser as melhores propostas para os leitores. Que o resultado seja quase sempre o pretendido – apresentar boas experiências – nada tem que ver com o facto de fazermos muitas dessas experiências por convite, antes advém desta escolha editorial.” E concluía: “num mundo ideal, os jornais nunca precisariam de convites para fazer o seu trabalho”.

    O Provedor do Leitor discordava, apontando para a existência de jornais internacionais onde não são aceites convites e existem “códigos muitos rígidos na matéria, quer para os seus jornalistas, quer para os colaboradores pontuais”, de modo a evitar “equívocos e desconfianças”.

    Se este tipo de debates é, em teoria, bastante interessante, na prática a leitura (e análise) da generalidade deste tipo de artigos do suplemento Fugas – muitos catalogados de “reportagem”, o que inferiria ainda uma maior independência e subjectividade de análise do jornalista – causa uma certa estupefacção. Pela abordagem, pelo tom, pela adjectivação e, em especial, por ser evidente que as reportagens são mais do que guiadas.

    Nessa linha, o PÁGINA UM – que assumidamente é contrário a parcerias comerciais, ainda mais desta índole, que claramente influencia a prática jornalística e mina a percepção de credibilidade de toda a imprensa – decidiu elaborar, com recurso à inteligência artificial, o Índice de Elogio Servil (IES), uma ferramenta de análise crítica do jornalismo usando métodos de processamento de linguagem natural (NLP) e análise quantitativa para atribuir pontuações de forma objectiva e crítica.

    O IES é assim um instrumento criado para avaliar a imparcialidade de reportagens jornalísticas, especialmente em contextos em que há uma relação explícita ou implícita entre o jornalista e a entidade que beneficia da cobertura. O objectivo deste índice é quantificar a subserviência do texto, permitindo uma análise objetiva e crítica.

    O índice é composto por cinco critérios avaliados numa escala de 0 a 100 pontos, com pontuações específicas para cada indicador:

    1. Proporção de Elogios em Relação a Críticas (0-25 pontos):
      Avalia se a reportagem apresenta uma cobertura equilibrada ou se está inclinada a destacar apenas os aspectos positivos.
    2. Uso de Linguagem Enaltecedora (0-25 pontos):
      Mede o grau de entusiasmo nas palavras utilizadas, incluindo superlativos ou descrições idealizadas que podem indicar um tom promocional.
    3. Dependência de Fontes Comprometidas (0-20 pontos):
      Analisa se as fontes principais têm ligações diretas com a entidade ou evento em foco, sem espaço para contrapontos ou opiniões independentes.
    4. Menção ao Contexto do Convite (0-15 pontos):
      Examina a transparência do artigo ao revelar o contexto do convite ou da relação entre o jornalista e a entidade destacada.
    5. Presença de Publicidade Oculta ou Disfarçada (0-15 pontos):
      Verifica se a reportagem funciona implicitamente como uma peça promocional, exaltando serviços ou produtos de forma desproporcional.

    A pontuação total vai de 0 a 100, com as seguintes classificações:

    • 81-100 pontos: Elogio Servil Total – Reportagem essencialmente promocional.
    • 61-80 pontos: Elogio Parcial – Subserviência moderada, mas ainda notória.
    • 31-60 pontos: Tendência Neutra – Cobertura mista, com viés ocasional.
    • 0-30 pontos: Jornalismo Crítico – Cobertura equilibrada e rigorosa.

    O IES foi concebido como uma ferramenta com um cunho experimental, mas fundamentado, para analisar criticamente o jornalismo que se desenvolve em contextos patrocinados, como reportagens de viagens, gastronomia ou eventos. Ao aplicar o índice, busca-se identificar se a reportagem mantém a sua independência editorial ou se cede ao tom promocional ou propagandístico em benefício da entidade patrocinadora. Aqui pode consultar como foram atribuídas as classificações em cada um dos cinco critérios.

    brown wooden boat moving towards the mountain

    Para esta breve e (apenas) exemplar avaliação, foram seleccionados os últimos dez textos publicados no suplemento Fugas, na versão digital do Público, que identificavam explicitamente uma entidade responsável por endereçar o convite ao jornal.

    Ficaram de fora da análise várias áreas editoriais que também recebem patrocínios, mas onde não se explicita um convite directo que tenha beneficiado o jornalista. Exemplo disso é a rubrica Terroir, dedicada à análise de vinhos, financiada pelas 14 regiões vitivinícolas portuguesas, pelo Instituto da Vinha e do Vinho e pela ANDOVI. O jornal defende que “a sua produção editorial é completamente independente destes apoios”.

    Adicionalmente, não foram incluídos conteúdos da revista Singular, um produto editorial do Público apoiado pela Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, nem os conteúdos da revista Solo, que resulta de uma parceria com a Comissão Vitivinícola Regional da Península de Setúbal. Ambos os produtos mantêm uma linha editorial dedicada ao sector vinícola e são desenvolvidos com apoio directo de entidades promotoras.

    Esta exclusão visa manter o foco na análise de reportagens da Fugas explicitamente ligadas a convites de entidades externas, evitando diluir os critérios específicos da avaliação. Contudo, a presença generalizada de patrocínios no suplemento e em outros produtos editoriais do Público levanta questões pertinentes sobre a efectiva independência editorial e a percepção pública da imparcialidade jornalística, sobretudo num contexto onde os leitores esperam clareza e transparência no financiamento dos conteúdos.

    Por uma razão de simplificação, apresenta-se apenas uma síntese da avaliação, apresentando-se em anexo a avaliação completa. Saliente-se que este trabalho recorreu, de forma extensivamente, aos recursos tecnológicos da inteligência artificial, através do ChatGPT versão profissional. Esta análise não é, nem pretender ser, um estudo científico ou académico.

    Reportagem 1

    A reportagem Um barco, um rio, uma floresta imensa: somos minúsculos no gigantismo da Amazónia, de Sandra Silva Costa, publicada a 4 de Janeiro de 2025, descreve uma viagem pelo rio Negro, na Amazónia, com foco na riqueza natural, nas comunidades indígenas e na experiência turística organizada pela Amazonastur e TAP, que financiaram a viagem. O texto destaca o “gigantismo” da paisagem e episódios como visitas a aldeias indígenas, danças tribais e passeios de barco, sempre com linguagem poética e elogiosa.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 94 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Uso excessivo de linguagem enaltecedora (25/25 pontos), com termos como “inesquecível” e “único” a dominar a narrativa.
    • Proporção de elogios sem críticas (25/25 pontos), focando apenas nos aspectos positivos da experiência.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20 pontos), com destaque para representantes da Amazonastur.
    • Menção superficial ao contexto do convite (12/15 pontos), só abordado no final.
    • Tons promocionais implícitos (14/15 pontos), exaltando os serviços turísticos.

    Conclui-se que a peça funciona mais como uma peça promocional disfarçada de reportagem, reflectindo uma clara subserviência ao contexto do convite.

    Ler avaliação completa aqui.

    reflection on trees on clear body of water during sunset

    Reportagem 2

    A reportagem Comer (e beber) a Amazónia em Manaus, de Sandra Silva Costa, publicada a 4 de Janeiro de 2025, explora a gastronomia amazónica através de visitas a restaurantes icónicos, como o Caxiri e o Fitz Carraldo, e ao projeto Da Cruz Destilados. Com foco nos ingredientes locais e na criatividade dos chefs, o texto apresenta pratos como piranha grelhada, sobremesas de tucupi negro e bebidas como a caipirinha amazónica, destacando o exotismo e a autenticidade da cozinha regional.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 95 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Proporção de elogios sem críticas (25/25), com a narrativa a destacar apenas os aspectos positivos, utilizando expressões como “sobremesa inesquecível” e “uma das melhores saladas que já provámos”.
    • Uso de linguagem enaltecedora (24/25), com termos exaltantes que reforçam o tom promocional.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), baseando-se exclusivamente em declarações de chefs e produtores ligados aos negócios promovidos.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas no final, sem reflexão crítica.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), com detalhes que promovem os estabelecimentos.

    Conclui-se que a peça funciona mais como um guia turístico do que como reportagem imparcial, reflectindo subserviência ao contexto do convite.

    Ler avaliação completa aqui.

    green trees beside body of water during daytime

    Reportagem 3

    A reportagem Fortaleza do Guincho quer parecer-se mais com uma casa do que com um castelo, de Inês Duarte Freitas, publicada a 23 de dezembro de 2024, descreve a transformação da Fortaleza do Guincho para se tornar mais acolhedora e menos austera. O texto foca-se nas recentes remodelações, nos serviços do hotel e na experiência gastronómica, com destaque para a liderança do chef Gil Fernandes e a visão da diretora Petra Sauer. A narrativa apresenta a Fortaleza como um refúgio de conforto, onde a gastronomia e a renovação arquitetónica se complementam para oferecer uma experiência de luxo.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 95 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), concentrando-se exclusivamente em elogios às qualidades do estabelecimento.
    • Uso de linguagem enaltecedora (24/25), com termos que reforçam o tom promocional.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), limitando-se a declarações de responsáveis do espaço, sem contrapontos externos.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas no final do texto.
    • Presença de publicidade implícita (14/15), com descrições detalhadas que promovem os serviços.

    Conclui-se que a peça funciona mais como uma divulgação institucional do que como uma análise crítica independente.

    Ler avaliação completa aqui.

    Reportagem 4

    A reportagem A Désalpe é uma festa no cantão suíço de Friburgo, de Sandra Silva Costa, publicada a 21 de Dezembro de 2024, descreve a tradicional descida das vacas alpinas para os vales, celebrada anualmente na Suíça. O texto apresenta a festa como um evento cultural autêntico, marcado por trajes típicos, orquestras de chocalhos e uma rica experiência gastronómica, com destaque para a “sopa de chalet” e as “tartelettes au vin cuit”. A narrativa foca-se na beleza do evento e na ligação dos habitantes locais à tradição, com declarações de participantes como Gabriel Castella e Theo Castella, que reforçam o tom positivo.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), com destaque exclusivo para os aspectos positivos.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com expressões como “elas passam, bonitas e bem arranjadas” e descrições idealizadas.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), baseando-se em declarações de participantes ligados ao evento.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas na última frase.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), sugerindo que a peça funciona mais como uma promoção turística do que como uma análise jornalística independente.

    Conclui-se que a reportagem reflecte um tom exaltante e promocional, comprometendo a imparcialidade.

    Ler avaliação completa aqui.

    Reportagem 5

    A reportagem Dois vareiros entram num café de Friburgo e conversam sobre chocolate, de Sandra Silva Costa, publicada a 21 de Dezembro de 2024, retrata a história de Jorge Cardoso, um chocolatier português que se destacou em Friburgo, na Suíça. O texto exalta a criatividade e qualidade das suas criações, como bombons e esculturas, incluindo uma de Cristiano Ronaldo, e apresenta detalhes sobre a sua loja e trajetória profissional. A narrativa foca-se exclusivamente nos aspectos positivos, utilizando linguagem entusiasta e descritiva para enaltecer o trabalho do chocolatier.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), com destaque exclusivo para os sucessos e qualidades do trabalho de Jorge Cardoso.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com expressões como “criações artísticas” e descrições detalhadas dos produtos.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), baseando-se apenas nas declarações do chocolatier, sem contrapontos.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas no final do texto.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), sugerindo que a peça serve mais como uma divulgação do trabalho do chocolatier do que como uma análise jornalística imparcial.

    Conclui-se que a reportagem reflecte um tom exaltante, comprometendo a imparcialidade.

    Ler avaliação completa aqui.

    a piece of chocolate with nuts scattered around it

    Reportagem 6

    A reportagem Dolinas: um hotel dedicado à escalada entre a serra de Aire e a vila de Porto de Mós, de Paula Sofia Luz, publicada a 18 de dezembro de 2024, explora as características do Dolinas Climbing Hotel, um espaço projetado para amantes da escalada. O texto destaca as instalações modernas, como quartos com “decoração requintada”, “conforto térmico e acústico” e a “piscina aquecida com tratamento a sal”, além das atividades disponíveis, incluindo “mais de 80 mil percursos” de escalada. A narrativa elogia também a integração do hotel com a serra de Aire, descrita como uma “experiência única”, e realça o trabalho das diretoras Cidália Patrício e Cátia Campos.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), com foco exclusivo nos aspectos positivos das instalações e serviços.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com descrições entusiastas e detalhadas.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), limitando-se às declarações de responsáveis do hotel.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas no final do texto, sem contextualização.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), com a narrativa a destacar continuamente os aspectos positivos.

    Conclui-se que a reportagem reflecte um tom promocional, comprometendo a imparcialidade jornalística.

    Ler avaliação completa aqui.

    Reportagem 7

    A reportagem LxFactory tem uma nova residente italiana. Chama-se Sophia e trouxe pizzas, de Inês Duarte Freitas, publicada a 17 de Dezembro de 2024, apresenta o Sophia Pizzoteca&Bar, um restaurante recente na LxFactory. O texto destaca o ambiente do espaço como “vibrante e colorido”, a sua decoração, com “um padrão dominado por flores desenhadas à mão”, e a oferta gastronómica, descrita como “uma carta de pizzas criativas, onde a italiana tradicional dá lugar à contemporânea”. São ainda referidas inovações como o portafoglio, uma pizza dobrada descrita como “uma das maiores surpresas da carta”, e o bar de prosecco, que se apresenta como “o primeiro bar de prosecco em Lisboa”. A narrativa foca-se exclusivamente nos aspectos positivos do restaurante.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), destacando apenas os aspectos positivos.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com descrições detalhadas e entusiasmo evidente.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), limitando-se às declarações de Ana Arié, do grupo Capricciosa.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas na última frase.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), evidenciados pelas descrições detalhadas do espaço e do menu.

    Conclui-se que a reportagem compromete a imparcialidade, funcionando como uma peça promocional do restaurante.

    Ler avaliação completa aqui.

    Reportagem 8

    A reportagem Budapeste é muito mais do que mercados de Natal, de Bárbara Wong, publicada a 14 de Dezembro de 2024, explora a riqueza cultural e histórica de Budapeste, destacando o ambiente natalício e as experiências proporcionadas pelo hotel Aurea Ana Palace, que acolheu a jornalista. O texto elogia os mercados de Natal com um “toque de magia” e enfatiza a localização e reabilitação do hotel, descrito como um espaço de “decoração requintada” e “reabilitação cuidadosa”. A narrativa apresenta uma visão idílica da cidade, com foco nos monumentos e tradições, além de promover o hotel como uma parte essencial da experiência.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 93 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), concentrando-se apenas nos aspectos positivos.
    • Uso de linguagem enaltecedora (22/25), com descrições como “vista deslumbrante sobre Budapeste”.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), limitando-se às declarações do diretor do hotel, Peter Szogi.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas na última frase, sem contextualização.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), evidentes nas descrições exaltantes do hotel e dos mercados.

    Conclui-se que a reportagem reflecte um tom promocional, comprometendo a imparcialidade jornalística.

    Ler avaliação completa aqui.

    aerial photography of lighted concrete bridge

    Reportagem 9

    A reportagem Cinco dias pela doce Suíça das vinhas e dos vinhos, de Pedro Garcias, publicada a 30 de Novembro de 2024, descreve uma viagem pelas vinhas suíças, destacando paisagens, gastronomia e vinhos locais. O texto foca-se na beleza das regiões visitadas, com passagens como “vinhas-jardins”, e descreve experiências nos produtores, incluindo a “Cave Guillod”, onde se degustaram vinhos como o tinto Fuoco, descrito como “o grande vinho da casa”. A narrativa apresenta a Suíça como um destino encantador para os amantes de vinho, com referências à qualidade dos produtos e à hospitalidade local.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), destacando apenas aspectos positivos das vinhas e dos vinhos.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com descrições poéticas como “uma beleza que nem a chuva ofusca”.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), centrando-se em informações de produtores e guias ligados ao Turismo da Suíça.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas na última frase, sem contextualização adicional.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), com foco em descrições detalhadas e entusiastas dos vinhos e paisagens.

    Conclui-se que a reportagem reflecte um tom promocional, comprometendo a imparcialidade jornalística.

    Ler avaliação completa aqui.

    Reportagem 10

    A reportagem A noite em que o Barca Velha fez prova entre as estrelas, de Manuel Carvalho, publicada a 27 de Novembro de 2024, descreve a participação da Casa Ferreirinha no evento Golden Vines, em Florença, com destaque para o vinho Barca Velha. O texto exalta a sofisticação do evento, referindo-se a ele como um “verdadeiro espectáculo” e elogia o vinho como “claramente ao nível do que aquele tipo de público conhecedor espera”. A narrativa foca-se na qualidade do vinho, na sua “profundidade e complexidade”, e no impacto da participação da marca portuguesa entre um público internacional.

    A análise pelo Índice de Elogio Servil (IES) classificou a reportagem como Elogio Servil Total, com 96 pontos em 100. Os motivos incluem:

    • Ausência de críticas (25/25), com foco exclusivo nos aspectos positivos do evento e do vinho.
    • Uso de linguagem enaltecedora (25/25), com descrições como “uma pequena multidão elegante” e “luxo, requinte e possibilidade de experimentar algumas das criações mais reconhecidas e valorizadas do planeta”.
    • Dependência de fontes comprometidas (18/20), limitando-se a declarações de representantes ligados à Casa Ferreirinha e ao evento.
    • Menção superficial ao convite (14/15), feita apenas na última linha, sem reflexão adicional.
    • Tons promocionais implícitos (14/15), evidentes nas descrições detalhadas e exaltantes do vinho e do evento.

    Conclui-se que a reportagem funciona como uma peça promocional, comprometendo a imparcialidade jornalística.

    Ler avaliação completa aqui.


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  • CMVM ‘fecha os olhos’ ao acordo milionário entre SIC e Cristina Ferreira

    CMVM ‘fecha os olhos’ ao acordo milionário entre SIC e Cristina Ferreira

    Ao contrário do que sucede quando, por exemplo, uma sociedade anónima desportiva (SAD) tem de pagar ou receber uma indemnização, a Impresa – o grupo de media que controla o Expresso e a SIC – não revelou os montantes do acordo milionário firmado este mês com a apresentadora Cristina Ferreira. Os investidores também desconhecem qual o impacto que o encaixe milionário terá nas contas anuais da SIC e da Impresa, apesar de a lei exigir que as empresas com acções ou obrigações emitidas no mercado de capitais divulguem informação relevante, incluindo eventos com impacto contabilístico. O ‘polícia’ da Bolsa portuguesa, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) não quis explicar a razão de o valor da indemnização ‘choruda’ estar ainda no ‘segredo dos deuses’. Além disso, a CMVM também está a ‘fechar os olhos’ ao impacto da insolvência da Trust in News nas contas do grupo fundado por Pinto Balsemão. Nos últimos cinco anos, esta é a terceira vez, pelo menos, que a Impresa não divulga informação clara e transparente ao mercado.


    Nem ‘ai’ nem ‘ui’. Apesar de a lei obrigar as empresas cotadas em Bolsa a divulgar informação relevante, os investidores continuam sem ser informados sobre o valor da indemnização que a SIC, estação de televisão da Impresa, acordou com Cristina Ferreira, uma verba que deverá ter impacto nos resultados da Impresa, o grupo liderado por Francisco Pedro Balsemão.

    Em causa está a indemnização milionária que a apresentadora acordou pagar à SIC pela sua saída intempestiva da estação. Um comunicado-conjunto de Cristina Ferreira, da empresa da apresentadora, Amor Ponto, e da SIC, enviado à imprensa no dia 11 de Dezembro, apenas mencionou a existência do acordo entre as partes. O comunicado, que foi citado pela generalidade dos media portugueses, não inclui detalhes do acordo.

    “A SIC, a Amor Ponto e Cristina Ferreira informam que chegaram a um acordo mútuo no âmbito do litígio que opunha a primeira às segundas”, informava o comunicado citado pela Impresa. nota. Adiantava que o “acordo, alcançado após negociações construtivas, põe termo ao litígio existente entre as partes” e que “ambos os lados expressam satisfação com a resolução encontrada”.

    Foto: D.R.

    Recorde-se que, em Junho passado, o Tribunal de Sintra condenou a Amor Ponto a pagar mais de 3,3 milhões de euros à SIC por quebra do contrato com a apresentadora, mas assinado pela empresa. Cristina Ferreira recorreu da sentença, mas não pediu efeitos suspensivos da decisão. Entretanto, o PÁGINA UM noticiou a 11 de Junho que a actual apresentadora da TVI estava a descapitalizar a empresa e a sociedade também não tinha constituído uma provisão para fazer face ao pagamento da indemnização, o que espoletou a SIC a agir. Assim, no passado mês de Novembro, o Tribunal acabou por executar bens da Amor Ponto num montante até 4,7 milhões de euros, segundo noticiou a agência Lusa.

    Contudo, consultado o site da CMVM, onde as empresas cotadas e todos os emitentes do mercado divulgam informação relevante, não se encontra nenhum comunicado da Impresa ou da SIC referente a esta matéria. No caso da SIC, a última informação divulgada ao mercado é um comunicado divulgado no dia 9 de Dezembro referente à assembleia dos titulares das obrigações ‘Obrigações SIC 2021-2025’ que estava agendada para aquela data e que não teve lugar por falta de quórum, tendo sido convocada numa reunião de obrigacionistas para o dia 27 de dezembro de 2024.

    Ora, o Código dos Valores Mobiliários (CVM), que rege o mercado financeiro português, estabelece no artigo 7º que “a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às actividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita”. Tanto a SIC como a Impresa são ‘emitentes’.

    Foto: PÁGINA UM

    Segundo o número 1 do artigo 389.º do mesmo Código, “constitui contra-ordenação muito grave: a) a comunicação ou divulgação, por qualquer pessoa ou entidade, e através de qualquer meio, de informação que não seja completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita”. Também é considerada uma contra-ordenação muito grave “a falta de envio de informação para o sistema de difusão de informação organizado pela CMVM” bem como toda a “a prestação de informação à CMVM que não seja completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita ou a omissão dessa prestação”. As coimas referentes a contra-ordenações muito graves oscilam entre os 25 mil euros e os 5,0 milhões de euros.

    Claramente, os investidores não têm informação completa, verdadeira, actual, clara e objectiva sobre a SIC e a casa-mãe, Impresa. Do mesmo modo, não se sabe qual o impacto que a indemnização, cujo valor a CMVM e o mercado desconhecem, terá nas contas da SIC e da Impresa em 2024.

    Mas a CMVM não diz se vai ou não obrigar a Impresa e a SIC a divulgarem informação clara e objectiva sobre a indemnização e o seu impacto nos resultados das duas empresas. Uma porta-voz do ‘polícia’ da Bolsa justificou que “a CMVM encontra-se vinculada por deveres legais de sigilo profissional que a impedem de se pronunciar sobre casos concretos”. Disse ainda que “compete aos emitentes [neste caso, a SIC e a Impresa], em primeira linha, aferir os factos que, em função das características próprias do emitente, constituem informação privilegiada”. E garantiu que “a CMVM mantém uma supervisão contínua sobre as entidades emitentes sujeitas à sua supervisão, nomeadamente sobre o cumprimento dos deveres de divulgação de informação ao público”, citando assim o artigo 362º do CVM.

    Contudo, cabe à CMVM, nomeadamente, garantir a “protecção dos investidores” e fazer o “controlo da informação”, como estabelece o artigo 358º do mesmo Código, relativo aos princípios da supervisão do mercado financeiro. Um dos procedimentos de supervisão atribuídos à CMVM pelo artigo 360º do CVM é “acompanhar a a[c]tividade das entidades sujeitas à sua supervisão” e “fiscalizar o cumprimento da lei e dos regulamentos”.

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    A condenação de Cristina Ferreira ao pagamento de uma indemnização de 3,3 milhões de euros à SIC ocorreu em Junho deste ano, mas a apresentadora recorreu da sentença, tendo agora chegado a acordo para pagar uma indemnização secreta à estação de TV da Impresa.

    Cabe também à CMVM, segundo o CVM, organizar “um sistema informático de difusão de informação acessível ao público que pode integrar, entre outros aspetos, elementos constantes dos seus registos, decisões com interesse público e outra informação que lhe seja comunicada ou por si aprovada, designadamente, informação privilegiada, participações qualificadas, documentos de prestação de contas e prospetos”.

    Tanto a SIC como a Impresa, bem como a empresa de Cristina Ferreira, estão na posse de informação privilegiada, que pode ter impacto na avaliação das empresas, bem como das acções ou obrigações emitidas no mercado . O CVM define informação privilegiada no número 4 do artigo 378º “toda a informação não tornada pública que, sendo precisa e dizendo respeito, direta ou indiretamente, a qualquer emitente ou a valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, seria idónea, se lhe fosse dada publicidade, para influenciar de maneira sensível o seu preço no mercado”. É caso do registo de perdas ou ganhos que influenciem os resultados de uma empresa cotada.

    Por sua vez, o Regulamento da CMVM n.º 4/2023 sobre ‘os meios de cumprimento dos deveres de informação dos emitentes’ estipula no número 1 do artigo 2º que “os emitentes divulgam as informações legalmente requeridas, no sistema de difusão de informação da CMVM, mediante envio das mesmas à CMVM”.

    Ou seja, tudo aponta que os investidores vão continuar sem saber, ao certo, o valor da indemnização e os contornos do acordo firmado entre a ‘emitente’ de obrigações SIC, da empresa cotada Impresa.

    Luís Delgado (à esquerda) e Francisco Pedro Balsemão na assinatura do acordo de venda do portfólio tóxico das revistas da Impresa à Trust in News, em 2018. O anúncio da venda das revistas, nomeadamente a Visão e a Exame, por 10,2 milhões de euros, foi anunciado pela Impresa no site da CMVM. Mas, desde então, tem sido o silêncio sobre a dimensão do calote de Delgado a Balsemão. / Foto: D.R.

    Em todo o caso, esta não é a única situação na Impresa sobre a qual a Bolsa está ‘às escuras’. O grupo de media é um dos principais credores da Trust in News, empresa unipessoal de Luís Delgado à qual a Impresa vendeu, em 2018, o seu portfólio tóxico de revistas, numa altura em que se encontrava em sérias dificuldades financeiras, com o mercado de crédito ‘fechado’ e após ter falhado uma emissão de obrigações. Ora, a Trust in News está a meio de um processo de insolvência. Contudo, os investidores também não têm acesso a informação clara sobre os impactos previstos deste ‘calote’ nas contas e da Impresa.

    A Impresa chegou a reconhecer um ‘calote’ parcial de Delgado nas suas contas de 2023, como o PÁGINA UM noticiou. Contudo, mais uma vez, os investidores não têm sobre o desenrolar deste negócio a informação completa, clara, verdadeira e objectiva, como manda a lei. Certo é que o anúncio do negócio de venda das revistas, incluindo a Visão e a Exame, foi publicado no site da CMVM, com a divulgação de um encaixe de 10,2 milhões de euros. Desde então, nunca mais houve um comunicado ao mercado sobre o andamento do negócio. Mas é assumido que a insolvência da Trust in News terá impacto nas contas do grupo que é dono do Expresso e da SIC e que já não irá ‘ver a cor do dinheiro’ anunciado no comunicado feito ao mercado em 2018.

    Mas, nos últimos cinco anos, houve, pelo menos, uma outra ocasião em que a informação prestada pela Impresa ao mercado não foi clara nem objectiva: o negócio de recompra do seu edifício-sede ao Novo Banco. Também neste caso, a venda do edifício situado em Paço D’ Arcos foi anunciada através de um comunicado divulgado no site da CMVM. A venda rendeu 24,2 milhões de euros à Impresa e ajudava a ‘tapar’ o buraco que o grupo não tinha conseguido tapar com a emissão de obrigações que falhou. o Novo Banco ‘investiu’ no imóvel, apesar de estar a receber injecções estatais, do Fundo de Resolução, e numa altura em que a ‘ordem’ na banca era para os bancos se desfazerem de imobiliário e de créditos tóxicos. O Novo Banco não só comprou o edifício à Impresa, como financiou Luís Delgado na compra das revistas ao grupo de Balsemão. No caso do imóvel, a Impresa recomprou o edifício, no final de 2022, pagando menos do que o valor pelo qual o vendeu, como o PÁGINA UM noticiou. O negócio foi feito em surdina e sem direito a comunicado ao mercado.


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  • Despesismo e opacidade na CCPJ são alvos de intimação no Tribunal Administrativo

    Despesismo e opacidade na CCPJ são alvos de intimação no Tribunal Administrativo

    Contra o obscurantismo, a Justiça. O PÁGINA UM apresentou uma intimação junto do Tribunal Administrativo de Lisboa contra a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), exigindo acesso a processos disciplinares arquivados por amnistia e às actas do Secretariado e do Plenário. Os documentos, cuja divulgação tem sido recusada pela presidente da CCPJ, Licínia Girão, incluem discussões sobre despesismo e irregularidades administrativas. Licínia Girão invoca o “direito ao esquecimento” e o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD), argumentos que o PÁGINA UM contesta, uma vez que são contrários à jurisprudência e à Lei do Acesso aos Documentos Administrativos.


    A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) vai ter de explicar ao Tribunal Administrativo de Lisboa as razões para manter secretos os processos disciplinares contra jornalistas arquivados no âmbito da amnistia papal, bem como as actas do Secretariado e do Plenário, onde se terá discutido questões relacionadas com o despesismo da sua presidente, Licínia Girão. Numa dessas actas terá havido pressões dos outros membros para que a Licínia Girão devolvesse seis mil euros que esta entidade pública terá suportado para pagar advogados que patrocinaram queixas contra o director do PÁGINA UM.

    A intimação do PÁGINA UM, apresentada na semana passada, visa exigir o acesso aqueles documentos administrativos, após recusas formais da CCPJ. No caso dos processos disciplinares arquivados, Licínia Girão insistir na recusa mesmo após a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) ter dado um parecer que concedia esse direito, embora com alguns expurgos.

    Licínia Girão, presidente da CCPJ.

    Este novo conflito, justificado por mais um acto de falta de transparência da CCPJ, constituída por nove jornalistas, remonta a Setembro passado, quando o PÁGINA UM solicitou acesso a 15 processos disciplinares encerrados ao abrigo da Lei nº 38-A/2023, que concedeu amnistia no âmbito da visita do Papa Francisco. A CCPJ alegou que esses documentos estão protegidos pelo “direito ao esquecimento”, impedindo a sua divulgação.

    Contudo, o PÁGINA UM sustenta que, uma vez arquivados, os processos passam a ter natureza administrativa, sendo de acesso público nos termos da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos (LADA). O parecer da CADA reforçou esta interpretação, ao considerar que o acesso poderia ser concedido com expurgo de dados pessoais sensíveis. No entanto, Licínia Girão recusou acatar a recomendação, argumentando que a divulgação causaria danos irreversíveis a interesses patrimoniais, sem especificar quais.

    Paralelamente, o PÁGINA UM requereu, em finais de Novembro, as actas de reuniões do Plenário e do Secretariado da CCPJ realizadas entre Junho de 2023 e Dezembro de 2024. A presidente da CCPJ admitiu, em resposta formal, no início deste mês, que o Secretariado, composto por três membros, nem sequer elabora atas, uma situação em flagrante violação do Código do Procedimento Administrativo (CPA). Com efeito, este diploma legal estipula que todas as reuniões de órgãos colegiais devem ser registadas, incluindo a ordem de trabalhos, as deliberações tomadas e os resultados das votações. A ausência de actas compromete a validade das decisões do Secretariado da CCPJ, tornando-as juridicamente nulas e expondo os responsáveis a potenciais responsabilidades financeiras, disciplinares e penais.

    Presidente da CCPJ assume com naturalidade que tem funcionado sem actas no funcionamento do Secretariado, um órgão colegial, em flagrante violação do Código do Procedimento Administrativo, pelo que as decisões são nulas e passíveis de responsabilidade financeira, disciplinar e penal.

    A actuação da CCPJ, e particularmente da sua presidente, tem sido alvo de críticas crescentes, especialmente depois da renúncia de três membros do Plenário, em Outubro passado. Miguel Alexandre Ganhão, Anabela Natário e Isabel Magalhães abandonaram os seus cargos, denunciando práticas de centralismo e despesismo por parte de Licínia Girão.

    Num episódio particularmente controverso, as ex-membros revelaram que a presidente apresentou, em nome pessoal, queixas contra o diretor do PÁGINA UM junto do Conselho Deontológico e do Ministério Público, sem consultar o Plenário. Apesar de ter retirado as queixas, as condições que tentou impor foram rejeitadas pelos colegas, mas terá deixado uma factura de seis mil euros para ser paga.

    Para além dos conflitos internos, a CCPJ tem vindo a aplicar de forma enviesada o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD), utilizando-o como argumento para limitar o acesso de jornalistas a informações de interesse público. Esta posição contrasta com decisões judiciais anteriores, como um acórdão de 2021 do Tribunal Central Administrativo do Norte, que estabelece que dados pessoais só estão protegidos se envolverem informações sensíveis, como origem racial, saúde ou convicções religiosas. A jurisprudência confirma ainda que, no caso de pedidos feitos por jornalistas acreditados, a proteção de dados não pode prejudicar o direito à liberdade de expressão e de imprensa.

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    O PÁGINA UM, através da intimação apresentada ao Tribunal Administrativo, exige que a CCPJ disponibilize os documentos solicitados num prazo máximo de 10 dias, sob pena de sanção pecuniária diária de 82 euros em caso de incumprimento. O valor da causa foi fixado em 30.000 euros, refletindo a importância do caso para a transparência administrativa e o escrutínio público.

    Este caso representa mais um capítulo de um já longo historial de controvérsias envolvendo a CCPJ e a sua presidente, Licínia Girão, cuja actuação tem levantado dúvidas sobre a independência e integridade da entidade. A decisão do tribunal será crucial para definir os limites da transparência administrativa e o papel da CCPJ como garante da ética e da disciplina no jornalismo português. Se a intimação for bem-sucedida, poderá estabelecer um precedente importante para reforçar a liberdade de imprensa e o direito de acesso a documentos administrativos.

    Esta nova intimação do PÁGINA UM foi possível, tal como as outras duas dezenas que têm sido apresentadas desde 2022, com o apoio financeiro dos leitores, através do financiamento do FUNDO JURÍDICO.


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  • Administrador de insolvência da Trust in News diz estar a lutar para não ‘liquidar’ revistas

    Administrador de insolvência da Trust in News diz estar a lutar para não ‘liquidar’ revistas

    Em declarações ao PÁGINA UM, André Correia Pais, administrador de insolvência da Trust in News, diz que a sua máxima prioridade tem sido manter os títulos nas bancas, bem como os empregos dos trabalhadores, e garante ser falso estar a preparar uma liquidação, até por ser essa uma decisão dos credores. Para já, apesar da situação deficitária, o administrador judicial assegura estar a trabalhar para que não haja cortes de fornecimentos e assim manter a produção jornalística e promete que uma pequena parte do subsídio de Natal (1/12) será entregue aos trabalhadores, que acumulam já vários salários em atraso.


    O administrador de insolvência da Trust in News (TIN), dona da revista Visão e de mais 16 títulos de imprensa, diz estar “satisfeito” por Luís Delgado anunciar que tem um plano para a reestruturação do grupo de media, mas desmente algumas das afirmações que aquele ex-jornalista proferiu hoje na Assembleia da República. O sócio único da TIN, e também gerente da empresa, em audição na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, acusou o administrador da insolvência, André Correia Pais, nomeado pelo Tribunal no início deste mês, de não estar interessado em conhecer o seu plano de reestruturação.

    Delgado, que investiu 10 mil euros em 2018 para comprar um portofólio de revista à Impresa, mas que em sete ano acumulou um passivo de mais de 30 milhões de euros, incluindo um rasto de dívidas praticamente incobráveis, assegurou no Parlamento que um alegado “plano, com medidas directas específicas”, que promete vir a apresentar no próximo dia 27 de Dezembro junto do Tribunal de Sintra, “e, previamente a isso, junto do administrador de insolvência”. O ex-jornalista disse, no entanto, que o administrador de insolvência, nomeado pelo Tribunal, André Correia Pais, lhe terá dito que “não tem nenhum plano” para o futuro do grupo de media, insinuou que não estará muito interessado em conhecer o seu. “Mas ser-lhe-á mostrado na altura”, disse Delgado.

    Nomeado pelo Tribunal apenas a 4 de Dezembro, André Correia Pais garantiu ao PÁGINA UM serem falsas as afirmações de Delgado sobre o desinteresse em saber as ideias de Luís Delgado sobre o futuro da empresa de media. “Fico satisfeito por haver mais um plano de reestruturação [para a TIN], mas não é verdade que não queira conhecer o plano dele”, salienta.

    Luís Delgado na audição no Parlamento sobre a situação da Trust in News. / Foto: Imagem de vídeo da AR-TV.

    André Correia Pais frisou também que nos 14 dias em que está em funções como administrador de insolvência da TIN, a sua prioridade tem sido manter as publicações nas bancas e garantir os postos de trabalho, apesar da grave situação deficitária, com as despesas a serem muito superiores às receitas, sem grande liquidez. “O meu dia-a-dia tem sido convencer fornecedores e convencer clientes para manter a empresa em laboração e os títulos em banca”, referiu ao PÁGINA UM, sabendo-se que a opção mais fácil seria a simples insolvência imediata com a consequente liquidação. “Estou a fazer esse esforço correndo riscos a título pessoal, arriscando até o meu património perante a Autoridade Tributária e a Segurança Social”, afirmou.

    Apesar do ‘chumbo’ do Plano Especial de Revitalização (PER) já revelar uma situação insustentável – com um aumento das dívidas fiscais e à Segurança Social, bem como o agudizar dos salários em atraso -, Correia Pais diz ainda estar a analisar os dados financeiros mais recentes da empresa, somente lhe tendo chegado hoje a informação referente a Outubro. “Não tive ainda tempo de fazer um plano, a minha preocupação tem sido as publicações e os trabalhadores”, afirmou.

    O administrador judicial também desmentiu ao PÁGINA UM a afirmação de Delgado de que pretenderá enviar a empresa para liquidação, tanto mais que nem sequer tem competências para essa decisão. “Disse apenas aos trabalhadores [da TIN] que, se não conseguir pagar os salários de Dezembro até ao dia 31, nos primeiros dias de Janeiro terei de comunicar ao Tribunal que a empresa deverá entrar em liquidação, mas serão os credores a decidir”, afirmou, mas isso é uma imposição legal, uma vez que uma falha no pagamento de salários constitui um incumprimento legal da chamada ‘massa insolvente’.  

    Revista Visão (Foto: PÁGINA UM)

    O administrador diz ainda que “se quisesse, poderia ter declarado que a empresa entrava em liquidação logo no primeiro dia e avançava para despedimento colectivo”, mas defendeu, em declarações ao PÁGINA UM, que a simples suspensão imediata das publicações da TIN não seria uma boa solução, uma vez que os custos fixos referentes aos trabalhadores se manteriam. Ora, isso agravaria a situação da empresa, que está a laborar com “défice de exploração”, com as receitas a serem inferiores aos custos.

    Salientando que apanhou a empresa com uma situação de trabalhadores com “dois ou três meses de salários em atraso”, sendo que alguns já abandonaram a empresa, André Correia Pais adiantou ao PÁGINA UM que que esta quinta-feira os trabalhadores irão receber um doze avos [1/12] do subsídio de Natal. “É o possível neste momento”, lamenta.

    Recorde-se que esta audição de Luís Delgado no Parlamento surgiu no seguimento de requerimentos apresentados pelo Livre e pelo PS, após o ‘chumbo’ do PER pelos principais credores da TIN: Autoridade Tributária e Segurança Social. Durante os dois últimos governos socialistas, liderados por António Costa, a TIN de Luís Delgado acumulou dívidas superiores a 15 milhões de euros ao Estado, mas, apesar disso, a empresa nunca surgiu na lista de credores e a dívida gigantesca esteve escondida durante anos, até ser revelada pelo PÁGINA UM em Julho do ano passado.

    Luís Delgado e Francisco Pedro Balsemão, presidente-executivo da Impresa, na assinatura do acordo de venda do portefólio tóxico de revistas da Impresa Publishing, em 2018. O negócio salvou a Impresa, mas vai deixar os prejuízos nas mãos dos contribuintes. / Foto: D.R.

    Delgado descartou, hoje, na audição, responsabilidades na insolvência da TIN, culpando a Autoridade Tributária e a Segurança Social pelo ‘chumbo’ do PER iniciado em Maio. Ou seja, Luís Delgado não pagou aquilo que outras empresas cumpridoras têm pago, contribuindo para uma concorrência desleal, mas culpa o Estado, mesmo sendo evidente que, desde 2018, o Governo foi complacente com os ‘calotes’. Além disso, Luís Delgado tem ignorado que os três gerentes da TIN até já foram condenadas a pena de prisão de dois anos e meio, suspensa por cinco anos, por uma dívida ao Fisco relativa a 2018 e arriscam mais condenações por dívidas fiscais e à Segurança Social nos anos subsequentes

    Certo é que a cada dia que passa se agrava a situação para os credores da TIN, aos quais caberá a decisão última sobre o destino da empresa e dos 17 títulos, que incluem, além da Visão, a Exame e o Jornal de Letras. Para o administrador de insolvência, alguns títulos poderão ter viabilidade.

    Em todo o caso, este é mais um episódio de um dos mais estranhos negócios de media nos últimos anos, concretizado no início de 2018 quando Delgado comprou à Impresa um portefólio com ‘activos tóxicos’ da Impresa Publishing, por 10,2 milhões de euros. O grupo liderado por Francisco Pedro Balsemão estava em dificuldades financeiras, tinha falhado uma emissão de obrigações e estava com o mercado de crédito bloqueado. A salvação da Impresa foi a transferência para a TIN de um portefólio de revistas em dificuldades.

    Delgado assumiu, hoje, na audição, que poucos meses depois da compra percebeu que a TIN não seria rentável. “Quando é que percebi que tinha um grupo que não era rentável? Percebi um mês depois de ter comprado, dois meses, cinco anos depois, percebi sempre”, assumiu o ex-jornalista e comentador televisivo aos deputados.

    Garantido está já o facto de que os contribuintes serão lesados em milhões de euros, não apenas pelo ‘buraco’ de mais de 15 milhões de euros, como por um eventual apoio estatal que se estará a preparar no Governo Montenegro para salvar algumas revistas da TIN. Outros credores também dificilmente recuperarão os créditos, como é o caso do Novo Banco que fez empréstimos à TIN para a compra das revistas à Impresa. Foi, na verdade, mais um crédito ruinoso numa altura em que o ‘banco bom’ do colapso do BES estava a receber ajudas públicas para ‘tapar’ perdas herdadas do tempo de Ricardo Salgado.          


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  • Sem actas das reuniões do Secretariado, CCPJ é uma ‘Casa da Mãe Joana’

    Sem actas das reuniões do Secretariado, CCPJ é uma ‘Casa da Mãe Joana’

    A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), apesar do estatuto de entidade pública, funciona como uma ‘Casa da Mãe Joana’, atropelando códigos e leis, ao mesmo tempo que obstaculiza o acesso aos documentos administrativos. Numa decisão hoje tomada sozinha pela sua presidente, Licínia Girão, através de um órgão colegial (Secretariado) que assume não ter actas das suas reuniões, o PÁGINA UM viu recusado o acesso aos debates do Plenários desde meados de 2023. Neste lote de documentos administrativos estará a descrição de uma acesa discussão em Novembro do ano passado onde foi criticado o uso por Licínia Girão de 6.000 euros desta entidade para custear advogados contratados especificamente para processar o director do PÁGINA UM. A presidente em fim de mandato da CCPJ alega que os requerimentos do PÁGINA UM para aceder às actas são abusivos e entende que mesmo os jornalistas não devem consultar dados nominativos, uma enviesada interpretação que contraria a jurisprudência e que, além do mais, constitui um princípio pouco abonatório para uma entidade que regula a actividade desta classe profissional.


    A presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), Licínia Girão, recusou hoje divulgar ao PÁGINA UM diversas actas de reuniões de plenário, que integram nove membros deste órgão regulador, entre as quais uma onde se discutiu o uso abusivo de dinheiros públicos.

    Na carta de renúncia de dois dos membros da CCPJ – Anabela Natário e Isabel Magalhães –, no final de Outubro passado, é explicitamente referido, alegadamente citando uma acta, que em reunião do Plenário de 15 de Novembro de 2023, Licínia Girão decidiu informar os seus colegas que tinha “apresentado uma queixa, em nome pessoal, contra o jornalista Pedro Almeida Vieira [director do PÁGINA UM] junto do Conselho Deontológico (…) e apresentado igualmente queixa junto do Ministério Público”. As duas ex-membros do Plenário da CCPJ salientam que “só depois de uma grande pressão, acabou [Licínia Girão] por retirar a queixa, querendo, no entanto, impor condições tão esquisitas que foram ‘chumbadas’”. E são as mesmas duas jornalistas que renunciaram, acusando Licínia Girão de despesismo e centralismo, que a presidente da CCPJ “não se comprometeu a devolver a quantia gasta indevidamente”.

    Licínia Girão, presidente da CCPJ.

    Embora essa seja uma das actas que requereu, o PÁGINA UM pretende consultar um período mais alargado, entre Junho de 2023 e o presente mês de Novembro, mas de qualquer modo Licínia Girão, em ofício remetido em nome do Secretariado – constituído por três membros, mas só por si assinado –, indeferiu o pedido.

    Na sua missiva, Licínia Girão – que tem um passado profissional sobretudo ligado à imprensa regional e não tem actividade jornalística conhecida nos últimos dois anos – alega que os pedidos do PÁGINA UM são abusivos, considerando que foram feitos pedidos similares há menos de dois anos, algo que é, de todo, falso.

    Além disso, Licínia Girão – que é a principal beneficiária de as actas se manterem secretas – alega que se aplica o Regulamento Geral de Protecção de Dados, considerando que “os próprios jornalistas têm o direito de ver protegida a devassa dos seus dados pessoais”, mesmo quando se está meramente perante informação relativa a actividade profissional regulada por lei.

    Esta interpretação da presidente da CCPJ contraria, aliás, a jurisprudência de forma gritante. Por exemplo, um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de Maio de 2021, que até foi publicado em Diário da República, salienta, num processo de intimação intentado pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, que mesmo que haja documentos “que contenham dados pessoais”, apenas ficam protegidos aqueles “que revelem a origem étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, dados genéticos, biométricos ou relativos à saúde, ou dados relativos à intimidade da vida privada, à vida sexual ou à orientação sexual de uma pessoa”.

    Funcionamento à margem da lei tem sido a regra na CCPJ.

    Similar entendimento teve uma sentença de Outubro de 2022 do Tribunal Administrativo de Lisboa, em benefício do PÁGINA UM, relativa a uma intimação contra a Ordem dos Farmacêuticos e a Ordem dos Médicos, então liderados pela actual ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e pelo actual deputado social-democrata Miguel Guimarães, respectivamente. Não consta, aliás, que nas reuniões do Plenário da CCPJ sejam debatidas as origens étnica ou as opiniões políticas, filosóficas e religiosas, nem tão-pouco questões de índole sexual.

    Por fim, Licínia Girão – na linha, aliás, de uma visão restritiva e enviesada do acesso dos jornalistas à informação – defende ainda que não se aplica a norma legal específica que concede direitos especiais aos jornalistas no acesso a dados abrangidos pelo RGPD, remetendo para uma alínea que pretende garantir que apenas profissionais legitimados pela legislação (ou seja, reconhecidos como jornalistas segundo as normas nacionais) possam justificar o tratamento de dados sensíveis com base em finalidades jornalísticas.

    Para terminar, Licínia Girão diz também que o Secretariado da CCPJ – o órgão colegial e permanente deste órgão regulador e disciplinador dos jornalistas – “não elabora, obviamente, actas relativas às reuniões que realiza”.  Esta é mais uma interpretação temerária de uma jornalista supostamente eleita por ser “jurista de mérito”.

    Presidente da CCPJ assume com naturalidade que tem funcionado sem actas no funcionamento do Secretariado, um órgão colegial, em flagrante violação do Código do Procedimento Administrativo, pelo que as decisões são nulas e passíveis de responsabilidade financeira, disciplinar e penal.

    Com efeito, de acordo com o Código do Procedimento Administrativo, sendo um órgão colegial, o Secretariado da CCPJ está obrigado por lei, em cada reunião, a lavrar uma acta, “que contém um resumo de tudo o que nela tenha ocorrido e seja relevante para o conhecimento e a apreciação da legalidade das deliberações tomadas, designadamente a data e o local da reunião, a ordem do dia, os membros presentes, os assuntos apreciados, as deliberações tomadas, a forma e o resultado das respetivas votações e as decisões do presidente”.

    E acrescenta ainda esta norma que “as deliberações dos órgãos colegiais só se tornam eficazes depois de aprovadas as respetivas actas ou depois de assinadas as minutas e a eficácia das deliberações constantes da minuta cessa se a acta da mesma reunião não as reproduzir”. Ou seja, todas as decisões tomadas por Licínia Girão estão feridas de nulidade, arriscando também responsabilidade financeira e disciplinar, ou mesmo responsabilidade penal, se houver prevaricação ou falsificação de documentos.


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  • Fim de linha: Luís Delgado afastado da gestão da Trust in News

    Fim de linha: Luís Delgado afastado da gestão da Trust in News

    Os gerentes da Trust in News (TIN), dona das revistas Visão e Exame, não vão ficar à frente do processo de insolvência do grupo de media, mas esta nem é uma má notícia para os trabalhadores do grupo de media pertencente ao ex-jornalista Luís Delgado. Pelo contrário, o seu afastamento, hoje decretado pelo Tribunal de Sintra, abre portas à possibilidade de venda de 16 títulos da imprensa portuguesa a outros investidores, com a ‘vantagem’ de poderem ser comprados sem quaisquer dívidas, embora com o poder de reajustamento das redacções. Este é mais um episódio de uma crise financeira num grupo de media, que começou a ser denunciada pelo PÁGINA UM em Julho do ano passado após detectar dívidas de milhões ao Fisco e à Segurança Social permitidas pelo Governo socialista. A Trust in News nunca esteve na lista de devedores do Estado mesmo se os ‘calotes’ se iniciaram logo após a compra em 2018 dos títulos à Impresa, do grupo de Francisco Pinto Balsemão, que se livrou de autênticos ‘activos tóxicos’. Luís Delgado arrisca agora, além de condenações por abuso de confiança fiscal, a ser processado por falência fraudulenta. E o Estado vai perder mais de 15 milhões de euros.


    À primeira vista, a declaração de insolvência da Trust in News (TIN) parece ser um acontecimento negativo, mas, na realidade, com a decisão de nomeação de um administrador judicial, hoje decretada pelo Tribunal de Sintra, esta situação será o melhor que podia ter acontecido, tanto para as revistas do grupo de media como para os trabalhadores, que já registam salários em atraso. Isto porque, sem Luís Delgado, o proprietário único da TIN e que levou ao colapso financeiro da empresa com dívidas colossais acumuladas, fica aberta a porta para a venda a terceiros das publicações, sem dívidas, permitindo a manutenção de, pelo menos, alguns dos postos de trabalho.

    Tal como o PÁGINA UM já tinha avançado, Luís Delgado, dono da TIN, e os dois outros gerentes da empresa unipessoal não tinham condições para ficar a gerir a insolvência do grupo. Além de não terem cumprido com pagamentos ao Fisco e à Segurança Social durante as negociações do Processo de Especial de Revitalização (PER) – que, por esse motivo, acabou ‘chumbado‘ -, os gerentes da TIN foram já condenados a pena de prisão de dois anos e meio de prisão na primeira instância, com a sentença confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa. Os gerentes da TIN ficaram com pena suspensa por cinco anos mas só se pagassem a dívida ao Fisco que levou à condenação, que era uma pequena parte (cerca de 850 mil euros) do total acumulado desde 2018. Recorde-se que o grupo apresenta dívidas de 30 milhões de euros, sendo que mais de metade são ao Fisco e à Segurança Social.

    A sentença de declaração de insolvência foi hoje anunciada publicamente pelo Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste – Sintra, estando disponível no Portal Citius. A juíza Diana Rute Campos Martins, nomeou de imediato André Fernando de Sá Correia Pais como administrador da insolvência, contrariando as pretensões de Luís Delgado, que desejava administrar o processo.

    Revista Visão (Foto: PÁGINA UM)

    Agora, em princípio será aprovado um Plano de Insolvência, com vista ao pagamento dos créditos, pressupondo a liquidação dos activos e a sua repartição pelos credores, que são muitos, sendo que o Estado tem a primazia. Este Plano pode ser apresentado pelo administrador da insolvência, pela gerência da TIN e por credores que representem um quinto do total dos créditos não subordinados reconhecidos. É mais do que certo de que muitos dos activos apresentados pela TIN nas suas contas não terão os valores contabilísticos atribuídos, como é o caso dos títulos (mais de 10 milhões de euros) e da rubrica ‘Outras contas a receber’ (mais de 14 milhões de euros). A juíza também agendou para o dia 29 de Janeiro, às 11:00 horas, a realização da reunião de assembleia de credores de apreciação do relatório. Os credores, designadamente trabalhadores do grupo de media, dispõem de 30 dias para apresentar uma reclamação de créditos junto do administrador da insolvência.

    No edital com a sentença, está explícito que “ficam advertidos os devedores do insolvente de que as prestações a que estejam obrigados, deverão ser feitas ao administrador da insolvência e não ao próprio insolvente”. Também “ficam advertidos os credores do insolvente de que devem comunicar de imediato ao administrador da insolvência a existência de quaisquer garantias reais de que beneficiem.

    A sentença que declarou a TIN insolvente pode ser ainda alvo de recurso, no prazo de 15 dias e/ou
    deduzidos embargos, no prazo de cinco dias, segundo o edital da decisão do Tribunal publicado hoje, dia em que os trabalhadores da TIN agendaram uma concentração, no Chiado, em Lisboa.

    Luís Delgado (à esquerda), dono da Trust in News e gerente do grupo de media, e Francisco Pedro Balsemão, presidente-executivo da Impresa na assinatura do acordo de venda do portfólio de revistas que incluía a Visão e a Exame, em Janeiro de 2018. / Foto: D.R.

    Recorde-se que os principais títulos do grupo de Luís Delgado encontram-se penhorados desde 2020, por dívidas acumuladas à Autoridade Tributária e à Segurança Social, como o PÁGINA UM noticiou. Ou seja, praticamente desde o primeiro ano de existência que a TIN, uma sociedade unipessoal do ex-jornalista e comentador Luís Delgado, com um capital social de apenas 10.000 euros, regista problemas financeiros e acumula dívidas.

    Na insolvência, também se vai poder analisar ao detalhe a evolução da contabilidade da TIN e das opções de gestão da gerência, para se apurar se houve uma falência fraudulenta. Além dos títulos de media, a TIN contabiliza cerca de 14 milhões de euros em activos que atribui a receitas de assinaturas futuras das revistas. Os montantes destes activos aumentaram significativamente nos últimos anos, num quadro de queda de vendas, e existem legítimas suspeitas de contabilidade criativa para ‘mascarar’ os resultados anuais, uma vez que só no ano passado a TIN apresentou prejuízos. Neste processo de insolvência ou na liquidação, irá tirar-se a ‘prova dos nove’ sobre o real valor destes ‘activos’ que têm sido incluídos nas contas da empresa de Luís Delgado ou apurar-se se não passou de um caso de finanças criativas. Luís Delgado e os outros gerentes, além de poderem ser condenados a prisão efectiva por abuso de confiança fiscal agravada, correm o risco de um processo por falência fraudulenta.

    Ao que o PÁGINA UM apurou, só mediante certas condições é que os principais credores, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e a Segurança Social, aprovariam um plano de insolvência da TIN. Recorde-se que, como noticiou o PÁGINA UM no mês passado, tanto a AT como a Segurança Social votaram contra a aprovação do PER da TIN argumentando, designadamente, que a empresa nem sequer estava a cumprir com as suas obrigações, pagando impostos e contribuições, enquanto decorria o PER.

    woman in dress holding sword figurine

    O PER da TIN foi ‘chumbado’ com os votos tanto da AT (24,7% do crédito original) e da Segurança Social (27,3%), como de outras entidades, como os CTT (6,1% dos créditos) e mesmo jornalistas. No total, o PER foi chumbado por 61,16% dos credores, havendo a registar 10,1% de abstenções ou ausência de declaração de voto. Entre os credores que queriam viabilizar o PER estiveram a Impresa (13,5% do total dos créditos), que vendeu as suas revistas à TIN em 2018 –, o Novo Banco (10,8%) e o Banco Comercial Português (2,2%). No total, apenas 28,7% do volume de créditos quis salvar a gerência de Luís Delgado, estando neste lote também a agência de notícias Lusa, a Vodafone e a QDF, sendo que esta última empresa é o ‘senhorio’ da Trust in News, no Taguspark, a quem Luís Delgado devia 83 mil euros em Maio passado.

    Será também a possibilidade de desvendar os estranhos contornos de um processo iniciado em 2018, quando a Impresa vendeu a Luís Delgado o seu ‘portfólio tóxico’ de revistas, salvando contabilisticamente a Impresa Publishing e o próprio grupo dono do Expresso e da SIC, que enfrentava dificuldades financeiras após o falhanço de uma emissão de obrigações. Agora, seis anos depois, mais de 30 milhões de euros em dívidas, o antigo negócio que era da Impresa deverá passar para um dono ou vários donos – quem sabe, a própria Impresa –, mas agora limpo das dívidas, as quais ficarão, na sua maioria, nas mãos dos contribuintes.

    Conhecido o destino das revistas da TIN, ficará, no entanto, por explicar como foi possível uma empresa com um capital social de apenas 10 mil euros ter conseguido acumular milhões de euros em dívidas sem nunca ter ido parar à lista de devedores ao Fisco e à Segurança Social durante os governos socialistas de António Costa.


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  • Cristina Ferreira: de 112 mil revistas vendidas a menos de três mil em 10 anos

    Cristina Ferreira: de 112 mil revistas vendidas a menos de três mil em 10 anos

    Os tempos mudaram, e a revista da apresentadora da TVI, que em Janeiro de 2020 confiava vir a ter hipóteses de um dia se candidatar à Presidência da República, está em vias de fechar as portas. O PÁGINA UM analisou as contas da empresa de Cristina Ferreira que gere a sua revista, a Treze7, e não há outra solução se não fechar portas. Há pelo menos uma boa notícia: ao contrário de outros grupos de media, a empresa não tem dívidas ao Estado. Pelo menos até ao final de 2023.


    Na edição deste mês da revista ‘Cristina’, a taróloga Joana Dias anunciava um artigo sugestivamente intitulado “Como sobreviver ao mês de Novembro!” Por ironia, ou sinais dos tempos, será a própria revista fundada pela apresentadora Cristina Ferreira que não vai sobreviver ao final do ano. O anúncio ainda não é oficial, mas tem sido especulado o fim da revista de uma das apresentadoras mais mediáticas do país, que ainda há cerca de cinco anos colocava a hipótese de se candidatar à Presidência da República, mas que agora aparente ser uma estrela cadente em declínio.

    Seja como for, a análise da situação financeira feita pelo PÁGINA UM aos últimos anos à empresa Treze7, detida pela apresentadora da TVI, não deixa margem de manobra: 2024 deverá terminar em falência técnica, ou seja, com capitais próprios negativos. Se quisesse continuar, teria de haver uma forte injecção de capitais.

    Mesmo apesar da publicidade feita em plenos programas da TVI, a revista. Foto: DR

    Recorde-se que Cristina Ferreira é ainda sócia maioritária da empresa Amor Ponto, envolvida num litígio com a SIC, e que viu há uma semana o Tribunal de Sintra penhorar as suas contas. A decisão decorreu após uma iniciativa do Grupo Impresa após uma notícia do PÁGINA UM em Junho passado que revelou que a apresentadora da TVI andava a descapitalizar a empresa, tendo desviado 2,2 milhões de euros em dividendos porque não constituíra uma provisão para assegurar o pagamento da indemnização à SIC caso perdesse, como perdeu, o caso em tribunal.

    Ora, a situação financeira da empresa Treze7 é distinta, e deve-se exclusivamente à perda de élan da revista em consequência de um menor brilho da imagem da apresentadora. Criada em Março de 2015, a revista mensal Cristina tinha Oprah Winfrey como modelo, e de facto, à escala portuguesa, registou número de vendas muitíssimo interessantes. O primeiro número atingiu, de acordo com os dados da Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação (APCT), uns impressionantes 112.058 exemplares vendidos. Nos meses seguintes, os números decaíram, mas mesmo assim no quarto trimestre a revista atingiu vendas médias de mais de 53 mil exemplares. As vendas no ano seguinte foram variando, por trimestre, com números médios entre os 35 mil e os 55 mil exemplares. Neste período, Cristina Ferreira tinha uma produtora, a Masemba, que editava a sua revista, mas as relações negociais deterioraram-se e acabaram em tribunal.

    E foi em Janeiro de 2017 que Cristina Ferreira criaria a sua própria editora, concedendo uma quota simbólica de 1% à sua mãe, Maria Filomena Jorge. Apesar de ter deixado de auditar as vendas na APCT, os primeiros três anos da Treze7 não correm demasiado mal, com receitas totais sempre acima de um milhão de euros, mas com resultados líquidos, embora positivos, sempre a descer: em 2017 ainda foram de quase 184 mil euros, desceram para os cerca de 164 mil euros no ano seguintes, e quedaram-se nos 70.820 euros em 2019.

    Foto: DR

    No primeiro ano da pandemia, em 2020, as receitas quebraram 34% face ao ano anterior, mas mesmo assim as contas ainda ficaram no ‘verde’ com um lucro de um pouco mais de 35 mil euros. Porém, a partir daí somaram-se prejuízos consideráveis para a dimensão da empresa com as vendas da revista e a publicidade (e outras prestações de serviços) a despencarem. De acordo com as demonstrações de resultados analisados pelo PÁGINA UM ao último triénio da Treze7, mostra-se expectável que 2024 esgote o capital próprio positivo de quase 470 mil euros que Cristina Ferreira ainda detinha nesta sua empresa em 2020.

    Com efeito, em 2021, as receitas da Treze7 nem sequer chegaram ao meio milhão de euros, resultando assim no primeiro ano de prejuízos de quase 230 mil euros. Embora não existam indicações de números de exemplares da revista Cristina adquiridos por leitores, o montante das vendas rondou apenas 267 mil euros ao longo de todo o ano, o que significa, ao preço de capa, cerca de seis mil exemplares em média por edição mensal.

    Os números do ano seguinte não foram melhores; pelo contrário. O ano de 2022 contabilizou mais 273.676 euros de prejuízo, apesar de no Portal da Transparência dos Media este valor surgir, equivocadamente, positivo. Não se poderia esperar outra coisa com rendimentos totais de cerca de 465 mil euros, dos quais um pouco menos de 208 mil euros de vendas de revistas. Com o preço de venda ao público (PVP) de 3,70 euros, a revista Cristina terá vendido, em média, apenas cerca de 5.600 exemplares por mês.

    O ano de 2023 ainda viu os rendimentos totais subirem para os 665 mil euros, mas não trouxeram melhorias nos resultados líquidos. Pelo terceiro anos consecutivo, a Treze7 contabilizou prejuízos, sendo que no ano passado ficaram na casa dos 265 mil euros. Ou seja, em apenas um triénio, os prejuízos acumulados atingiram a cifra de quase 770 mi euros. Pior ainda, as vendas das revistas anunciavam números deploráveis, com receitas de apenas 129.339 euros, sendo que a parte restante dos rendimentos referiram-se a prestações de serviços. Deste modo, a revista Cristina terá vendido menos de 2.800 exemplares por mês ao longo do ano passado.

    Revista serviu como âncora de diversos projectos de marketing de Cristina Ferreira.

    Os números deste ano não estão apurados, nem Cristina Ferreira deu qualquer esclarecimento ao PÁGINA UM, mas não será de surpreendente se os 214.803 euros que ainda restavam de capital próprio no final de 2023 tenham sido ‘comidos’ completamente por mais prejuízos. Isto significa que a revista terá dado um prejuízo acumulado em quatro anos de cerca de um milhão de euros, apesar das contas, até 2023, estarem ainda sustentáveis. Ou seja, Cristina Ferreira não tinha dívidas bancárias nem devia valores relevantes ao Estado.

    Ontem, o Correio da Manhã adiantou que em Dezembro sairá, previsivelmente, a última revista Cristina, havendo ainda uma edição especial em Janeiro, com destaque para as capas, protagonistas e entrevistas. E acrescenta ainda a hipótese de se manter a versão digital. Apesar de Cristina Ferreira ter chegado, em Março deste ano, que trabalhavam diariamente 20 pessoas na produção da revista, na verdade os relatórios da Infomação Empresarial Simplificada (IES) apontam apenas sete trabalhadores com salários médios líquidos de um pouco mais de 2.000 euros.


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  • Pivot da CNN comprado por agência de comunicação para evento da Direcção-Geral da Saúde

    Pivot da CNN comprado por agência de comunicação para evento da Direcção-Geral da Saúde

    Desconfianças há muitas sobre a promiscuidade entre jornalistas, agências de comunicação e entidades públicas, mas raramente existem provas. Mas, desta vez, existem. João Póvoa Marinheiro, jornalista e conhecido pivot da CNN Portugal, que ainda na semana passada entrevistou António José Seguro, foi contratado em Outubro pela agência LPM para apresentar a cerimónia dos 125 anos da Direcção-Geral da Saúde (DGS) com a presença da ministra da Saúde e ‘aparições virtuais’ do primeiro-ministro e do Presidente da República. A entidade pública pagou à LPM mais de 77 mil euros pela organização deste evento de apenas três horas e por um vídeo de menos de dois minutos, e impôs ainda uma condição expressa no caderno de encargos: para a apresentação deveria ser contratada uma “figura pública”. João Póvoa Marinheiro predispôs-se assim a ‘mercadejar’ o seu estatuto de jornalista, disponibilizando-se a prestar serviços de ‘mestre de cerimónias’ à LPM, a conhecida agência de comunicação fundada por Luís Paixão Martins. A Comissão da Carteira Profissional de Jornalista promete intervir, e o pivot da CNN Portugal arrisca a cassação do seu título.


    A agência de comunicação LPM, fundada por Luís Paixão Martins e actualmente gerida por um filho, contratou o jornalista João Póvoa Marinheiro (CP 6766), um dos mais conhecidos pivots da CNN Portugal, para apresentar, sob a forma de prestação de serviços, o evento comemorativo do 125º aniversário da Direcção-Geral da Saúde (DGS), que se realizou no mês passado.

    A garantia de contratação do jornalista para um serviço de marketing e de relações públicas – absolutamente incompatível com o Estatuto do Jornalista e susceptível de cassação da carteira profissional – consta do caderno de encargo de um contrato entre a DGS e a LPM no valor de 62.820 euros, recentemente colocado no Portal Base. Com IVA, tudo ficou em 77.269 euros.

    Jornalista e pivot da CNN Portugal foi apresentador de evento da Direcção-Geral da Saúde, depois de ser contratado pela LPM, uma agência de comunicação fundada por Luís Paixão Martins.

    De acordo com esse documento, além da concepção de um vídeo sobre a DGS “até 10 minutos” – mas que foi ‘despachado’ em 1 minuto e 45 segundos –, a LPM comprometeu-se a realizar a “gestão, organização e coordenação do evento de aniversário dos 125 anos, para até 400 pessoas, a realizar a 4 de Outubro de 2024”, e que deveria obrigatoriamente incluir “a contratação de figura pública para apresentação do evento”, além da realização de assessoria de imprensa e actividades de logística.

    João Póvoa Marinheiro foi assim a “figura pública” paga para fazer de ‘mestre de cerimónia’ de todo o evento que decorreu durante a manhã desse dia, dando as boas-vindas, de introdução e prestação de agradecimento aos convidados – que incluiu presencialmente a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e em vídeo do primeiro-ministro e do Presidente da República –, de anúncio do ‘coffee break’ e de despedidas. Foi uma dezena de aparições do jornalista João Póvoa Marinheiro ao melhor estilo de apresentador de uma qualquer ‘Miss Portugal’. O pivot é jornalista acreditado desde 2017.

    A contratação, a troco de uma compensação financeira, por parte de uma empresa de consultadoria e de comunicação de um jornalista é uma prática que viola claramente o Estatuto do Jornalista, ainda mais grave por se tratar do pivot da CNN Portugal com uma intervenção pública relevante no canal da Media Capital. Por exemplo, ainda no dia 22, João Póvoa Marinheiro co-entrevistou, ao lado de Nuno Santos, director da CNN Portugal, o ex-secretário-geral do PS José António Seguro, putativo candidato às presidenciais.

    Ao lado de Nuno Santos, director da CNN Portugal, João Póvoa Marinheiro entrevistou na semana passada uma entrevista a António José Seguro. Pelo Estatuto do Jornalista, o pivot teria de estar sem exercer jornalismo por um prazo mínimo de três meses após a incompatibilidade.

    Fazer apresentações públicas usando-se da credibilidade da profissão é considerado, no Estatuto do Jornalista, uma grave incompatibilidade. Esta lei de 1999 considera impeditivo que um jornalista exerça funções de marketing e relações públicas, que se enquadram em eventos da natureza do aniversário da DGS, onde João Póvoa Marinheiro se prestou a ser um mero ‘mestre de cerimónias’, vendendo a cara e a voz. Na verdade, o pivot da CNN fez mesmo actos de publicidade, uma vez que uma norma do Estatuto do Jornalista determina que se deve considerar “actividade publicitária incompatível com o exercício do jornalismo a participação em iniciativas que visem divulgar produtos, serviços ou entidades através da notoriedade pessoal ou institucional do jornalista, quando aquelas não sejam determinadas por critérios exclusivamente editoriais”.

    De acordo com a mesma lei, se o pivot da CNN quisesse mesmo assim receber o dinheiro pago pela LPM teria então de entregar previamente o título profissional, antes da realização do evento, à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, mas ficaria depois sujeito um ‘período de nojo’. Ou seja, estaria impedido, devido a essa incompatibilidade, de exercer actividade jornalística “por um período mínimo de três meses”.

    Além disso, findo o período dessa incompatibilidade, continuaria impedido, “por um período de seis meses, de exercer a sua actividade em áreas editoriais relacionadas com a função que desempenhou, como tais reconhecidas pelo conselho de redacção” da CNN Portugal. Nada disso sucedeu.

    João Póvoa Marinheiro a apresentar a ministra do Saúde durante o evento.

    João Póvoa Marinheiro não é, porém, ‘virgem’ as andanças de cometer violações ao Estatuto do Jornalista. No seu site pessoal, que funciona também como de promoção, o pivot da CNN Portugal lista as suas prestações como ‘host’ de eventos pagos, que iniciou em 2021. Nos últimos dois anos, se incluirmos o evento da DGS (que ainda lá não está), contabilizam-se seis participações desta natureza.

    O PÁGINA UM pediu esclarecimentos tanto à LPM, através do seu administrador João Paixão, como ao jornalista João Póvoa Marinheiro. Nenhum respondeu. Contactada pelo PÁGINA UM, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) diz não haver nenhum registo de depósito da carteira profissional do jornalista João Póvoa Marinheiro, confirmando-se assim que agiu na apresentação do evento enquanto tinha título activo, e acrescenta que “qualquer situação que possa configurar uma violação do regime de incompatibilidades” será “devidamente investigada, o que acontecerá no caso vertente, e, se for o caso, serão desencadeados os procedimentos previstos na lei”.


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  • CCPJ ‘manda às malvas’ lei que permite aos jornalistas acesso privilegiado a dados pessoais

    CCPJ ‘manda às malvas’ lei que permite aos jornalistas acesso privilegiado a dados pessoais

    Em fim de mandato, e com ‘ferida’ com três renúnicas, a presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), Licínia Girão, recusa revelar quaisquer documentos dos processos que levaram à amnistia de 15 jornalistas alegadamente beneficiários da Lei da Amnistia decorrente da visita papal do ano passado. A lei diz taxativamente que a protecção de dados pessoais “não prejudica o exercício da liberdade de expressão, informação e imprensa”, mas nem assim a entidade de acreditação de jornalistas, constituída apenas por jornalistas, se demove. Licínia Girão reiterou a recusa esta semana, mesmo depois de um parecer não vinculativo da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) considerar que, pelo menos, deveriam ser disponibilizada documentos expurgados de dados nominativos. O caso vai continuar no Tribunal Administrativo, porque este caso abre um precedente que pode vir a ser aproveitado por outras entidades públicas.


    O diploma legal de protecção de dados pessoais, de 2019, é taxativo no caso de pedidos feitos por jornalistas acreditados: “ a protecção de dados pessoais, nos termos do RGPD [Regulamento Geral da Protecção de Dados] e da presente lei, não prejudica o exercício da liberdade de expressão, informação e imprensa, incluindo o tratamento de dados para fins jornalísticos e para fins de expressão académica, artística ou literária”, salientando apenas que “ o exercício da liberdade de expressão não legitima a divulgação de dados pessoais como moradas e contactos, à exceção daqueles que sejam de conhecimento generalizado”.

    Porém, em casa de ferreiro, espeto de pau. Na passada segunda-feira, a presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), Licínia Girão, reiterou a recusa do PÁGINA UM para aceder a documentos administrativos relacionados com processos disciplinares extintos por amnistia papal a 15 jornalistas. Mesmo com a extinção desses processos – antes de se apurar eventuais sanções, pelo que foram arquivados antes da decisão –, o PÁGINA UM considerava serem documentos de acção administrativa e pretendia assim, entre outros aspectos, analisar o modus operandi da CCPJ na análise de queixas contra jornalistas. Com isso, possibilitava aferir assim, por exemplo, se antes da amnistia existiam processo em ‘banho maria’ a aguardar prescrição ou se estavam mesmo abrangidos pela Lei da Amnistia.

    Licínia Girão, presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista.

    A posição de Licínia Girão – que assume ser do Secretariado da CCPJ, constituída por três elementos, embora somente ela assine – surge após um parecer não vinculativo da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), e sustenta-se numa interpretação enviesada do RGPD e da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e Ambientais (LADA).

    Apesar de na origem dos processos disciplinares estarem, em princípios, actos relacionados somente com a actividade profissional dos jornalistas visados, a CCPJ recusou uma primeira vez, no início de Outubro passado, referindo que “a amnistia respeita às infracções abstractamente consideradas, ‘apagando’ a natureza criminal do facto”, pelo que, segundo esta entidade que é dirigida por jornalistas, “se extintos os processos a que se refere, por via da Lei n.º 38-A/2023, estes estão abrangidos pelo ‘direito ao esquecimento’, logo todo e qualquer procedimento se ainda não do conhecimento público, também já não o poderá ser”. E acrescentava a CCPJ que a divulgação dos nomes e dos processos que envolveram jornalistas que beneficiaram da amnistia – que tem de merecer a sua concordância – “poderia causar danos graves e dificilmente reversíveis a bens e interesses patrimoniais”. Contudo, não explicitava de que forma havia bens que pudessem ser afectados.

    No início deste mês, a CADA estabeleceu o entendimento, em parecer, de que a amnistia prejudicava, sem basear em qualquer jurisprudência, o acesso ao nome dos jornalistas amnistiados, mas reforçava que tal “não implica que se considere apagado ou inexistente o processo, desde logo porque a decisão de considerar extintos os processos disciplinares por parte da entidade requerida pressupõe que, relativamente às infrações, estivessem preenchidas as condições previstas” na Lei da Amnistia, “isto é, que as infrações tenham sido praticadas até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023 e não constitu[íssem] simultaneamente ilícitos penais não amnistiados pela referida lei e cuja sanção aplicável não seja superior à suspensão”.

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    Visita do Papa Francisco deu origem a uma Lei da Amnistia. A CCPJ nem sequer quer permitir se aplicou bem a lei e se houve beneficiários ilegítimos, escondendo informação que diplomas legais permitem aos jornalistas ter acesso.

    E a CADA considerou que “essa decisão de extinção, bem como a actuação da entidade requerida no decurso dos processos disciplinares, deve poder ser sindicada, expurgados que sejam os elementos de identificação e/ou que tornem identificáveis os jornalistas objecto dos processos disciplinares, designadamente o órgão de comunicação social onde exercem funções, bem como o expurgo de dados pessoais de terceiros que a documentação possa conter”, recomendando que a CCPJ facultasse “o acesso aos referidos processos disciplinares com expurgo dos referidos elementos”.

    Porém, nem isto Licínia Girão quis acatar, reiterando que se estão perante “dados sensíveis”. Saliente-se que, de entre todos os pedidos formulados pelo PÁGINA UM à CCPJ nunca esta entidade se mostrou disponível para aceder a documentos administrativos, estando ainda a decorrer um processo no Tribunal Central Administrativo do Sul relacionado com o acesso a actas e outros processos relacionados com a intervenção deste órgão de acreditação e de disciplina dos jornalistas.

    A CCPJ tem estado, nos tempos mais recentes, envolvida em casos polémicos, sobretudo a sua presidente, Licínia Girão, que viu três dos seus colegas, que a haviam cooptado há três anos (como suposta “jurista de mérito”), pedido a renúncia dos cargos a poucos meses de novas eleições. De entre as críticas, constavam atitudes de centralismo e de despesismo, que estavam a causar um rombo a esta entidade pública.  

    Para Eduardo Cintra Torres, jornalista e professor universitário, “a CCPJ continua a prestar o pior dos serviços ao jornalismo português, impedindo o conhecimento de factos verificados, administrativamente registados, a respeito da actividade jornalística, deste modo convidando todas as instituições e indivíduos noutras actividades a negarem-se a fornecer informações”. No contexto das práticas jornalísticas e democráticas, Cintra Torres diz que a entidade ainda presidida por Licínia Girão “parece comportar-se, neste caso, como porta-voz de putativos malfeitores e não como porta-voz de putativos benfeitores que foram amnistiados”. E pergunta: “se foram amnistiados, porque se esconde, ao contrário do que sucede com condenados que o Estado amnistia em certas ocasiões”, como no Ano Novo ou durante visitas papais.

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    A CCPJ tem sido, irónica e lamentavelmente, uma das entidades públicas mais fechadas relativamente ao acesso a documentos administrativos.

    Com efeito, saliente-se que, numa rápida pesquisa na Internet, conseguem-se identificar pessoas em concreto, até já condenadas ou com sanções já em aplicação, que beneficiaram da Lei da Amnistia proveniente da visita do Papa Francisco a Portugal em Agosto do ano passado. São os casos, por exemplo, de Rui Pinto, que beneficiou de amnistia em 79 crimes, de João Carreira, o jovem que planeou um ataque à Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa em Fevereiro de 2022, e até o jogador de futebol Paulinho, do Sporting, viu um castigo de dois jogos de suspensão e uma multa de 2.555 euros ‘desaparecerem’  por intercessão indirecta do papa.

    Perante mais este caso, Cintra Torres defende que “o mal que a CCPJ tem feito ao jornalismo português e à saúde da democracia é difícil de permitir nos tempos mais próximos a recuperação da dignidade e da ética profissionais dos jornalistas”, lamentando por fim que esta entidade, “em vez de servir o conhecimento da verdade, parece servir a ocultação de factos e, portanto, da verdade”. E conclui: “que isto aconteça com outras corporações profissionais não se aceita, mas compreende-se. Que aconteça com o jornalismo é uma tragédia nacional da profissão, das suas instituições e a democracia”.

    O PÁGINA UM vai apresentar uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa contra a CCPJ, através do seu FUNDO JURÍDICO, financiado pelos leitores.


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  • 14 milhões: Cristiano Ronaldo é fiador de empréstimo milionário e ‘arrisca’ ser dono absoluto do Correio da Manhã

    14 milhões: Cristiano Ronaldo é fiador de empréstimo milionário e ‘arrisca’ ser dono absoluto do Correio da Manhã

    Um acordo parassocial entre os accionistas da Expressão Livre, a ‘holding’ que controla o Correio da Manhã e a CMTV – escondido inicialmente pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) –, ao qual o PÁGINA UM teve acesso, revela um elaborado esquema de investimento que aparenta ser extremamente desfavorável (e atípico no mundo dos negócios) para Cristiano Ronaldo, mas que pode, afinal, ser uma forma ‘encapotada’ de lhe entregar a prazo o domínio absoluto do grupo de comunicação social. Através da sua CR7, Cristiano Ronaldo não apenas se comprometeu a investir, sem retorno, cerca de 13 milhões de euros como se assumiu como o único fiador de um empréstimo de 14 milhões de euros da ‘holding’ de comunicação social, que comprou a Cofina Media, junto do Banco Santander Totta, desonerando os outros accionistas. Mas se tiver de pagar parte ou a totalidade desse empréstimo, então será recompensado através do reforço no capital social da Expressão Livre. Contas feitas, e atendendo à sua actual posição, Cristiano Ronaldo só precisará de suportar o peso de ser fiador em 40.001 euros para, com esse simples expediente, passar a deter mais de 50% do capital social da proprietária do jornal que, em tempos, odiou.


    Cristiano Ronaldo arrisca ficar proprietário praticamente exclusivo da Medialivre – o grupo de media que controla o Correio da Manhã e dos canais televisivos CMTV e Now –, de acordo com cláusulas do acordo parassocial entre accionistas da holding Expressão Livre, entregue na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) no final do ano passado, a que o PÁGINA UM teve acesso após parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. Numa primeira fase, depois de uma deliberação onde decidira não publicitar o acordo parassocial, o regulador recusou inicialmente o acesso. Em todo o caso, a ERC mantém secreto o plano de negócio da Expressão Livre, a holding da Medialivre que é detida pela Sorolla (32%), CR7 (30%), Livrefluxo (32%), Actium Capital (10%) e Caderno Azul (10%).

    O acordo entre os accionistas da Expressão Livre, assinado no final de 2023, revela uma série de compromissos financeiros e operacionais que colocam a empresa de Cristiano Ronaldo, a CR7, numa posição singular dentro dos accionistas que controlam a Medialivre. Além de deter uma participação significativa de 30% no capital social da holding, o actual jogador do Al-Nassr aceitou, através da sua sociedade, um papel de fiador de um empréstimo bancário de 14 milhões de euros, contraído junto do Banco Santander Totta. Este papel de fiador, definido em cláusulas específicas do acordo, implica que a empresa de Cristiano Ronaldo será responsável por cobrir eventuais incumprimentos no pagamento da dívida ao banco.

    Mas é, nesse ponto, que a CR7 pode passar a assumir o controlo absoluto do único grande grupo de media em situação financeira saudável, e que tem vindo a investir no último ano, com a fundação do canal Now e de estações de rádio. Caso a administração da Expressão Livre (e os outros accionistas) não cumpram – ou não queiram cumprir – as suas obrigações junto do Santander, a empresa de Cristiano Ronaldo será obrigada a cobrir os montantes em falta, incluindo juros e despesas adicionais, numa clara assunção de responsabilidade financeira.

    Porém, nesta situação, sendo Cristiano Ronaldo forçado a efectuar esses pagamentos junto do Santander, a CR7 terá então, como compensação, um aumento da sua participação no capital social, através de um mecanismo de diluição da posição dos outros accionistas. Ora, como o capital social da Expressão Livre é, actualmente, de apenas 100 mil euros, basta a Cristiano Ronaldo pagar, por ser fiador, 40.001 euros para ficar como sócio mairitário, ou seja, mais de 50% do capital social. Se tiver de pagar um milhão de euros ao banco, fica automaticamente com 93,6%, em vez dos actuais 30%. Se tiver de pagar os 14 milhões de euros, ficaria então com 99,5% do capital social da Expressão, ou seja, ‘dono absoluto’ da Medialivre, uma empresa que detinha, no final do ano passado, activos de 93,4 milhões de euros e capital próprio de quase 33 milhões de euros. E, aliás, concedeu um lucro superior a 7,2 milhões de euros.

    Este mecanismo permite que Cristiano Ronaldo possa transformar facilmente em accionista maioritário e até proprietário praticamente exclusivo da Medialivre. Na prática, esta cláusula funciona como uma ‘recompensa’ por Cristiano Ronaldo não apenas assumir o risco deste empréstimo de 14 milhões de euros, mas também por lhe ter sido exigido um maior esforço de investimento inicial, também estabelecido no acordo parassocial.

    Expressão Livre é a holding da Medialivre, que edita, entre outros títulos, na imprensa escrita, o Correio da Manhã, o Record e a revista Sábado, detendo também os canais CMTV e Now, bem como um grupo de rádios. Foto: PÁGINA UM

    Com efeito, também ficou estabelecido neste acordo – que, em condições normais, num outro sector de actividade, seria considerado confidencial, havendo mesmo impedimentos dos accionistas de o publicitarem –, que o envolvimento de Cristiano Ronaldo no sector dos media não é apenas financeiro, mas também estratégico. Através deste acordo, o mais internacional jogador futebol do Mundo comprometeu-se com um investimento significativo, através de um valor extra, denominado ágio, que não terá retorno em termos de dividendos.

    Nesse aspecto, tendo uma participação de 30%– que se aplica à distribuição de dividendos e de atribuição de cargos de gestão –, Cristiano Ronaldo assumiu a entrega, a título de ágio, de 13,095 milhões de euros, num total de 34,9 milhões de euros de investimento por todos os accionsitas. Ou seja, para um capital social de 30%, a CR7 vai ter de investir 37,52% do total, o que confronta com o caso da Sorolla que, tendo 32% do capital social da Expressão Livre, apenas terá de investir 14,95%.

    Em termos convencionais, seria esperado que a percentagem de investimento fosse proporcional à participação accionista, mas neste caso a empresa de Cristiano Ronaldo não teve pejo em assumir um investimento significativamente superior à sua actual quota de capital social, uma vez que o ágio constitui um investimento que não tem retorno, como sucede com as acções, as prestações suplementares ou os empréstimos feitos pelos accionistas.

    As relações complicadas entre Cristiano Roinaldo e o grupo Correio da Manhã foram não lançadas ao lago mas sim enterradas. O mais famoso futebolista português detém agora 30% da Medialivre, sendo já o principal accionista individual, mas pode facilmente dominar a Expressão Livre, holding desta empresa de comunicação social.

    Esta configuração pode indiciar que Cristiano Ronaldo reconhece o valor estratégico do controlo accionista, e está disposto a investir acima da média para garantir uma posição de relevância, ou então espera que o ‘efeito fiador’ venha a reforçar a sua futura posição na holding da Medialivre.

    A potencial transformação de Cristiano Ronaldo em accionista dominante na Expressão Livre – que, controla, ‘em cascata’, a Medialivre –, através deste acordo parassocial, pode também ser alterado no decurso dos nove anos do seu prazo de validade. Os accionistas concordaram em manter-se na estrutura societária durante três anos, mesmo se com eventuais alterações do peso no capital social, mas caso haja, no futuro, o desejo de accionistas com mais de 75% de venderem a empresa a terceiros, os outros têm de disponibilizar a ‘cedência’, caso o comprador queira ficar com tudo.

    Certo é que este empenho de Cristiano Ronaldo em disponibilizar milhões mostra como enterradas estão as picardias entre o Correio da Manhã e o futebolista, que tiveram o auge no arremesso de um microfone em 2016 a um lago. Na altura, o Correio da Manhã, que fez da situação um ‘caso de polícia‘, até chegou a apurar o dano pela perda do microfone: 292 euros, por ser da Sennheiser, “uma conceituada marca do ramo“. O microfone acabou por ser recuperado no fundo de um lago de Lyon, e o Correio da Manhã até fez uma acção com mais uma alfinetada: leiloou o objecto e encaminhou o dinheiro para uma instituição de apoio a crianças carenciadas na Madeira, a terra de Cristiano Ronaldo.


    N.D. A Lei da Transparência dos Media determina que as empresas de media enviem à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) os acordos parassociais, tal como os accionistas da Expressão Livre e Medialivre fizeram. Mas o regulador cedeu ao pedido de confidencialidade, alegando, em deliberação de 8 de Maio passado, que “a divulgação pública do teor do Acordo Parassocial não contribui para melhor concretizar os objetivos prosseguidos pela Lei da Transparência e respetiva regulamentação, nomeadamente, a transparência da titularidade, da gestão e dos meios de financiamento das entidades que prosseguem atividades de comunicação social, tendo em vista a promoção da liberdade e do pluralismo de expressão e a salvaguarda da sua independência editorial perante os poderes
    político e económico”.

    Como a notícia do PÁGINA UM evidencia, existe matéria relevante no acordo parassocial da Expressão Livre que é de de interesse público, até para se perceber como um grupo de media se financia e pode facilmente mudar de mãos. Como a não divulgação pública não significa que o acesso fosse vedado, ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos, o PÁGINA UM fez um pedido de consulta do acordo parassocial à ERC, que viria a ser inicialmente recusado. Somente após a intervenção da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), através de um parecer do passado dia 18 de Setembro, o regulador se predispôs a revelar uma parte do acordo social, mas mantendo secreta a parte respeitante ao plano de negócios.

    A vontade do PÁGINA UM em recorrer desta decisão para o Tribunal Aministrativo de Lisboa é significativa, pela atitude de obscurantismo patenteada pela ERC (como habitualmente), mas seria um esforço demasiado moroso para uma questão que somente se resolveria daqui a muitos meses ou mesmo mais de um ano. Assim, basta o opróbio de mais um caso do regulador que disciplina a transparência dos media, mas que acaba por ser o principal fautor da obscuridão, esquecendo que a transparência se mostra fundamental para a credibildiade deste sector em crise. Aliás, convém relembrar que o Conselho Regulador da ERC pretende uma alteração legislativa que lhe permita, através de uma lei especial, impedir aquilo que o PÁGINA UM (ainda) conseguiu: consultar um acordo parassocial e decidir se existe matéria noticiosa – algo que, para o regulador criado pela Constituição para garantir a liberdade de imprensa, é uma chatice.

    Pedro Almeida Vieira

    Director do PÁGINA UM


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