Mais vale tarde do que nunca. Mas no caso dos fogos rurais, há medidas que chegam tarde demais. Depois de um ano trágico de fogos rurais em Portugal, é no Outono que o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF)dá ordem de compra de meios terrestres e equipamento para prevenção e combate a incêndios.
No total, em quatro concursos públicos, o ICNF vai gastar até perto de 27,5 milhões de euros, sem IVA, para comprar viaturas ligeiras, tractores, uniformes e equipamento de protecção individual para equipas de sapadores de prevenção e combate aos fogos rurais.

O caso não é para menos. Afinal, segundo dados do Sistema de Gestão de Informação de Incêndios Florestais, citados pelo ICNF, arderam este ano 269.941 hectares, dos quais 46% relativos a área ardida de povoamentos florestais, 43% de matos e 11% de terrenos agrícolas. este ano foi o quarto pior de sempre, apenas atrás de 2017, 2003 e 2005. No total, até ao dia 22 de Outubro, registaram-se 8.458 ocorrências.
Paradoxalmente, o investimento na prevenção é feito em mais um ano de desastres, e numa altura em que o Orçamento do Estado até reduz em nove milhões as verbas públicas disponibilizadas, que passará para apenas 44,7 milhões de euros. Porém, o ICNF tem os bolsos cheios para ir às compras por via do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
No total, através deste pacote financeiro pós-covid, foram atribuídos a este Instituto 188 milhões de euros para gastar em 138 projectos aprovados no âmbito do PRR.

Perante as estatísticas, o ICNF “abriu os cordões à bolsa” — com financiamento do PRR — e lançou concursos para a compra de equipamento. Um dos concursos que está a decorrer envolve a compra “de 218 unidades de maquinaria pesada (tractores) e respectivas alfaias destinadas à prevenção e combate de fogos rurais”. O valor base do contrato é de 22.544.500 euros.
Este concurso é composto por dois lotes, um para a compra de 51 tractores florestais “de tipo 1 e respectivas alfaias” e outro relativo à aquisição de 167 tractores florestais “de tipo 2 e respectivas alfaias”.
Outro concurso que está a decorrer, também financiado pelo PRR, envolve “a aquisição de 55 veículos ligeiros de combate a incêndios para as equipas de sapadores florestais”. Neste caso, o valor base é de 4,4 milhões de euros, com o preço base unitário de 80 mil euros.

Também a decorrer está o concurso do ICNF para “aquisição de uniformes e de equipamentos de proteção individual para os operacionais na área da gestão de fogos rurais”, composto por três lotes distintos, e que envolve uma despesa de 320.513 euros. O contrato a adjudicar terá um prazo de execução de sete meses. Este procedimento é cofinanciado pelo PRR.
Já fechado está o concurso para “aquisição de serviços de operação de veículos no âmbito do DECIR (Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais) 2025” e que tem um valor base de 220 mil euros. Esta compra sai do bolso do ICNF, já que não menciona qualquer financiamento comunitário.
Mas estas medidas já chegam tarde para os que perderam tudo nos fogos deste ano, em Portugal.

O mesmo se aplica à campanha publicitária de prevenção de incêndios rurais que o ICNF aprovou em Maio e que só viu a luz do dia no final de Agosto, como o PÁGINA UM noticiou. Nessa campanha, o governo despejou, através dos cofres do ICNF, 725 mil euros em publicidade na comunicação social para a “difusão de publicidade institucional, no âmbito da campanha de sensibilização para a redução dos incêndios rurais”.
Agora, com a chuva de Outono à porta e temperaturas amenas, os meios de combate e prevenção de incêndios estão a ser encomendados pelo ICNF e a população está a ser informada. Para a floresta já ardida, já chegam tarde. Pelo menos, no próximo Verão o ICNF terá meios para evitar o pior.
