Etiqueta: Saúde

  • Processo disciplinar: Manuel Pizarro segura Filipe Froes

    Processo disciplinar: Manuel Pizarro segura Filipe Froes

    Apesar de estar sob suspeita desde Setembro do ano passado, por causa das suas promíscuas ligações à indústria farmacêutica, Filipe Froes mantém, para já, a confiança do ministro da Saúde, mesmo com um processo disciplinar da Inspecção-Geral das Actividades de Saúde que se arrasta, de forma secreta, há 10 meses. Este ano, o pneumologista mantém os valores “habituais”: recebeu já cerca de 4.000 euros por mês do sector farmacêutico, com destaque para a norte-americana Merck Sharp & Dohme.


    Apesar de estar com um processo disciplinar, instaurado há 10 meses pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde, devido a alegadas ligações promíscuas com a indústria farmacêutica, Filipe Froes pode manter-se confiante nas suas funções de consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS). O ministro da Saúde, Manuel Pizarro, não lhe vai tirar o tapete, pelo menos até à conclusão de um longo processo disciplinar, sem fim à vista.

    Esta posição governamental permitirá assim ao pneumologista manter uma perna nos corredores da autoridade de saúde nacional (DGS), onde se decidem terapêuticas, enquanto mantém a outra perna, bem aberta, para satisfazer solicitações da indústria farmacêutica entre consultadorias, palestras e lobby.

    De acordo com nota do Ministério da Saúde enviada ao PÁGINA UM, Manuel Pizarro aguardará a conclusão do processo disciplinar “para se pronunciar”. Ou seja, uma carta branca para Froes manter a sua posição de consultor da DGS e as suas relações comerciais com as farmacêuticas. O pneumologista destacou-se também, durante a pandemia, por ser o líder do Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos, um órgão não-estatutário que inclusive serviu para perseguir médicos com opiniões distintas do bastonário Miguel Guimarães, como sucedeu com Jorge Amil Dias, presidente do Colégio de Pediatria.

    Filipe Froes, um dos médicos portugueses com mais ligações à indústria farmacêutica, mantém-se como consultor da DGS e com intenso palco mediático.

    Conforme noticiou o PÁGINA UM há uma semana, Filipe Froes está a ser alvo de um processo disciplinar, em consequência de um processo de averiguação aberto em Setembro de 2021, mas como está em fase de instrução, as razões da acusação estão inacessíveis pela “natureza secreta do inquérito”.

    A IGAS não adianta quais os motivos de tantos meses para a instrução deste processo disciplinar, mas informa que este deriva das averiguações iniciadas em Setembro do ano passado a que foi sujeito este conhecido consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS), presença assídua na imprensa como alegado perito independente durante os anos da pandemia.

    Em 4 de Janeiro passado, o PÁGINA UM tinha já escalpelizado as declarações de Filipe Froes no Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed e cruzado com os relatórios e contas dos últimos anos da sua empresa – a Terras & Froes –, detectando sinais de alguma “contabilidade criativa” para que não fosse ultrapassada a média anual (no último quinquénio) de 50 mil euros de recebimentos da indústria farmacêutica. Esta é a fasquia monetária a partir da qual Froes ficaria impedido de ser consultor da DGS.

    A Merck Sharpe & Dohme “perdeu” a corrida das vacinas, optando pelo desenvolvimento de anticorpos monoclonais. Froes elogiou o seu uso e integrou a sua introdução nas terapêuticas anti-covid.

    Apesar de trabalhar em exclusividade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), Filipe Froes é um dos médicos portugueses com maiores relações com as farmacêuticas, que aumentaram com a sua exposição pública no decurso da pandemia. Além de coordenar uma unidade de cuidados intensivos do Hospital Pulido Valente, este pneumologista também liderou o Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos para a Covid-19 e tem, nos últimos dois anos, como consultor da DGS, participado activamente na elaboração de normas técnicas relacionadas com a pandemia.

    De acordo com o Portal da Transparência e Publicidade, Froes estabeleceu, desde 2013, mais de 270 contratos comerciais, em seu nome ou na sua empresa Terras & Froes, com 22 farmacêuticas. O montante global já alcançado ultrapassa os 400 mil euros. Nos dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021), o pneumologista encaixou uma média mensal de 4.065 euros, valor superior ao que ganha como médico do SNS. Este ano, em 11 meses, vai com uma média mensal de 4.327 euros.

    Este ano, Filipe Froes tem dado especial atenção às solicitações da farmacêutica norte-americana Merck Sharp & Dohme (MSD) , contando já com oito colaborações que lhe renderam 21.083 euros. Mas teve relações com mais nove, entre as quais a AstraZeneca, Gilead e Sanofi. Estas relações não o coíbem, contudo, de integrar, por exemplo, a equipa de consultores da DGS que define as terapêuticas anti-covid, onde passaram a constar este ano os anticorpos monoclonais da MSD, o molnupiravir, comercializado sob a marca Lagevrio.

    Em diversas ocasiões, Froes tem promovido, de forma entusiástica, o uso dos anticorpos monoclonais (produzidos pela Pfizer e pela MSD) e a integração da vacina da covid e da gripe numa só dose (comercializada pela Sanofi).

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    Saliente-se, contudo, que estes rendimentos podem pecar por defeito, uma vez que cada vez se torna mais patente que o Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed apresenta falhas enormes, porque as farmacêuticas se “esquecem” de registar donativos e patrocínios a médicos e outras entidades, entre as quais os media mainstream, incumprindo o Estatuto do Medicamento.

    Recorde-se que, em Novembro passado, Filipe Froes lançou um pequeno livro com as crónicas que foi publicando no Diário de Notícias, em co-autoria com Patrícia Akester, e o patrocínio da Bial. A farmacêutica portuguesa – que tem como chairman António Horta Osório, que é simultaneamente administrador da Impresa (dona do Expresso e SIC) ainda não colocou o valor do apoio no portal do Infarmed nem sequer respondeu a questões colocadas pelo PÁGINA UM.

  • Conteúdo comercial ilegal: Público diz que só destacou Tabaqueira como “promotora de inovação tecnológica e do desenvolvimento sustentável”

    Conteúdo comercial ilegal: Público diz que só destacou Tabaqueira como “promotora de inovação tecnológica e do desenvolvimento sustentável”

    A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) concluiu que o jornal Público violou mesmo a lei que proíbe a publicidade ao tabaco, e arrisca um multa até 250 mil euros. Em causa estão conteúdos comerciais pagos pela Tabaqueira e publicados pelo jornal da Sonae no início de Outubro. A ERC também anunciou que vai informar a Direcção-Geral da Saúde sobre a ilegalidade cometida pelo jornal dirigido pelo jornalista Manuel Carlos Carvalho (CP 963), que se defendeu dizendo que o conteúdo comercial pretendeu apenas potenciar a Tabaqueira como “entidade promotora de inovação tecnológica e do desenvolvimento sustentável”.


    O Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) abriu um processo de contraordenação ao jornal Público por violação da lei que proíbe publicidade ao tabaco, depois de o jornal ter publicado, no início de Outubro, conteúdos comerciais da Tabaqueira.

    A informação surge numa deliberação da ERC, tomada em 16 de Novembro, no seguimento de um processo de averiguações suscitadas por um pedido de esclarecimento do PÁGINA UM (vd. nota da direcção no final do texto). O jornal do Grupo Sonae arrisca assim uma coima que pode ir até aos 250 mil euros. A ERC anuncia também, na sua deliberação, que vai informar a Direcção-Geral da Saúde da violação da lei por parte do Público, como manda a legislação.

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    Em causa está a violação da Lei 37/2007, mais concretamente o artigo 14º-E, referente a publicidade e patrocínio dos cigarros electrónicos e recargas, e o artigo 18º, relativo ao tema do patrocínio, que a ERC considera susceptível de constituir “uma contraordenação económica muito grave punível nos termos do Regime Jurídico das Contraordenações Económicas”.

    Como o PÁGINA UM noticiou no dia 14 de Outubro passado, o regulador abrira um “procedimento” para averiguar a eventual ilegalidade do Público por inserir um conteúdo comercial da Tabaqueira, que elogiava as tecnologias do tabaco aquecido e que coincidiu com um novo sistema daquela empresa.

    A divulgação da ilegalidade foi feita pelo PÁGINA UM, e não é caso único. Na mesma semana de Outubro em que a ERC indicou ao PÁGINA UM que tinha aberto um “procedimento” contra o Público, o regulador anunciou também a abertura de outro processo de contraordenação à Global Media pela inserção de quatro conteúdos patrocinados pela Tabaqueira: dois no Jornal de Notícias, um no Diário de Notícias e outro no Dinheiro Vivo, todos publicados este ano.

    Conteúdo comercial da Tabaqueira foi aceite pelo Público como “conteúdo comercial” três dias após o lançamento do IQOS Iluma. ERC diz ser publicidade ilegal a produtos de tabaco.

    A publicidade directa ou indirecta aos produtos de tabaco em toda a imprensa está proibida desde 2005. No caso das televisões e rádios, a proibição remonta a 1980. Foram, entretanto, sendo implementadas outras restrições em termos de divulgação de marcas, incluindo em provas desportivas.

    No caso concreto do conteúdo comercial pago pela Tabaqueira que foi publicado no Público, o texto termina mesmo com uma foto claramente de carácter publicitário, com a apresentação do novo sistema de tabaco aquecido por indução IQOS Iluma. Este equipamento é uma grande aposta comercial da Philip Morris neste sector, e que começara a ser comercializado três dias antes da inserção do conteúdo patrocinado no Público.

    Em resposta ao procedimento aberto pela ERC, que levou agora à instauração do processo de contraordenação, o jornal do Grupo Sonae defendeu que estes conteúdos, embora comerciais, “não traduz qualquer incentivo, publicidade ou mesmo promoção aos produtos de tabaco”.

    E diz mesmo que a intenção é mesmo a inversa, ou seja, que o conteúdo comercial, que coincidiu com o lançamento do IQOS Iluma, “teve por principal e único objetivo potenciar a notoriedade e posicionamento da marca ‘Tabaqueira’, enquanto entidade promotora de inovação tecnológica e do desenvolvimento sustentável, procurando o envolvimento da comunidade neste movimento transformacional, que visa promover soluções mais sustentáveis”.

    Porém, para a ERC, não existem dúvidas de que “o texto é inequivocamente promocional, sendo inclusivamente patrocinado por uma empresa que tem como atividade principal a venda e distribuição de produtos de tabaco, com ou sem combustão.

    O regulador deita por terra todos os argumentos utilizados pelo Público, o que pode, desde já, induzir à “condenação” no processo de contraordenação. Segundo a ERC, é completamente diferente escrever-se um artigo sobre os benefícios para a saúde da disponibilização de dispositivos de combustão sem nicotina patrocinada por entidades para fins de prevenção do consumo de tabaco e promoção de saúde. Ainda mais quando os conteúdos em questão são patrocinados por uma empresa de venda de produtos de tabaco.

    Assim, para a ERC, “estes conteúdos visam um posicionamento das marcas e dos produtos, através de uma prática social encapotada, que não revela os malefícios dos produtos”, assentando “numa mensagem claramente promocional, onde se reforça a imagem de uma empresa socialmente consciente e atenta aos potenciais consumidores”.

    Sede da ERC, em Lisboa.

    A ERC sustenta ainda que, apesar de não se tratar de publicidade tradicional, o conteúdo veiculado não deixa de ser patrocinado por uma empresa sob a qual é proibida a publicidade directa e indirecta, concluído que no conteúdo comercial do Público “existe a finalidade de promover uma marca, uma imagem, e, consequentemente, os produtos/ serviços por esta distribuídos, promovendo o engagement do leitor com a marca”.

    Por fim, o regulador também esclarece que, apesar de os conteúdos editoriais estarem separados dos comerciais, o Público “não pode desvincular-se da propriedade do espaço em que os mesmos se encontram publicados”.


    N.D. A deliberação da ERC refere que “em 12 de Setembro [na verdade, foi a 12 de Outubro] de 2022, com registo nº 2022/7327, deu entrada na ERC, um pedido de esclarecimento da publicação Página Um relativo à publicação periódica Público, nomeadamente à alegada publicidade/ patrocínio a uma tecnologia de cigarros electrónicos (…). Deve esclarecer-se que o PÁGINA UM pediu apenas um “comentário” à ERC sobre a situação detectada, pelo que se lamenta que, numa deliberação, a ERC deixe ficar a ideia de que o PÁGINA UM faz uma queixa contra o Público ou contra outro qualquer jornal. Aliás, acresce que o PÁGINA UM apenas contactou a ERC, para a obtenção do desejado comentário, após a indicação da Direcção-Geral do Consumidor, que tinha sido questionada pelo nosso jornal no dia 10 de Outubro.

  • Relatório Rápido 52: Original do “esboço embrionário” do Instituto Superior Técnico só há em versão digital

    Relatório Rápido 52: Original do “esboço embrionário” do Instituto Superior Técnico só há em versão digital

    Mais um episódio no processo de intimação do Instituto Superior Técnico (IST) que luta para não ceder o relatório supostamente científico que causou alarme no Verão passado: afinal, não há uma versão em papel do Relatório Rápido 52, mas apenas uma versão “digital”. Fica-se na dúvida se a ausência de versão original em papel se deve à falta de recursos (papel, impressora e/ou toner) no IST ou à falta de conhecimentos técnicos dos investigadores do IST para ordenar a impressão em papel timbrado de um ficheiro informático.


    Novos desenvolvimentos sobre o último relatório do Instituto Superior Técnico (IST), o número 52, considerado por esta instituição universitária como “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”, uma denominação esdrúxula para evitar que o Tribunal Administrativo de Lisboa autorize, por sentença, o seu acesso pelo PÁGINA UM.

    De acordo com os autos do processo de intimação, o IST já terá entregado anteontem, em mão, a versão digital daquele que será o “original” exigido pela juíza Telma Nogueira. Recorde-se que a magistrada responsável pelo processo exigiu ter acesso ao documento original sem quaisquer “anotações manuscritas a lápis” em que o IST estimou, de forma surpreendentemente alarmista, o impacte das festividades populares de Junho passado na incidência e mortalidade da covid-19.

    Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico, enviou cópia manipulada ao Tribunal Administrativo. Foi agora obrigado a enviar original sem qualquer anotação, mas resolveu dizer que só há original em versão digital..

    Tendo em consideração as dúvidas científicas que se colocam em função da evolução epidemiológica naquele mês, o PÁGINA UM pretende conhecer em detalhe se houve rigor ou uma fraude científica por parte dos investigadores, coordenados pelo próprio presidente do IST, o catedrático Rogério Colaço. Como o PÁGINA UM já destacou, naquele período observou uma tendência de redução significativa de casos positivos, pelo que surgiam assim dúvidas sobre o rigor científico daquele relatório feito por uma das mais prestigiadas faculdades públicas portuguesas em articulação com a Ordem dos Médicos.

    Em finais de Julho, a Lusa divulgou as conclusões daquilo que disse ser um “estudo” do IST, ao qual garantiu ao PÁGINA UM existir mermo, tanto mais que coloca sete citações, e que viria a “viralizar” na imprensa mainstream.

    A entrega desta versão digital do original – que, na verdade, se transformará numa versão original em papel se houver uma ordem de computador ligado a uma impressora com toner para imprimir – será, em princípio, o último passo para a decisão de um inaudito processo de intimação que decorre naquele tribunal, por iniciativa do PÁGINA UM.

    Ofício do IST que acompanhou a versão original do “esboço do documento”.

    A decisão de levar este casos para tribunal surgiu após a recusa do presidente do IST, Rogério Colaço, em disponibilizar os dados estatísticos e o relatório escrito que serviram para a Lusa divulgar, em 28 de Julho passado, a ocorrência da “morte de 790 pessoas com covid-19 devido ao levantamento das restrições e às festividades, dos quais 330 associados [sic] às festas populares de junho”.

    Em todo o caso, existindo agora, e de forma assumida pelo IST, uma versão original, a juíza sempre poderá tomar diligências suplementares, do ponto de vista informático, para apurar se houve, e quando houve, alterações no ficheiro informático, e se estas foram posteriores à data da divulgação da notícia da Lusa.

    Saliente-se também que ao longo dos últimos quatro meses o IST tem mantido uma inquietante postura obscurantista, nada habitual em instituições universitárias públicas, recusando divulgar os dados em bruto e um relatório com impacte relevante. Além disso, mesmo se se estivesse em finais de Julho em face de um alegado “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”, quatro meses já deveria ter sido tempo suficiente para o transformar um “relatório”, ou então assumir o erro, algo que é aceitável (e recomendável) em Ciência.

    Independentemente da análise do Tribunal Administrativo de Lisboa sobre o enquadramento semântico do Relatório Rápido nº 52 (se é um relatório ou um esboço), saliente-se que o PÁGINA UM requereu ao IST, estando também para decisão do Tribunal Administrativo, os relatórios anteriores, elaborados em colaboração com a Ordem dos Médicos desde Junho de 2021.

    Como o IST não alegou, para nenhum dos outros 51, que se estava perante situações de “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”, tudo indica que pelo menos 51 relatórios serão disponibilizados, através de sentença, para uma avaliação independente da qualidade e rigor científico do IST durante a pandemia.   


    Citações (entre aspas) do Relatório Rápido nº 52 do Instituto Superior Técnico transcritas pela Lusa no take de 28 de Julho passado, que comprovam a existência de um relatório escrito, ou então estaremos perante uma “fraude” (transcrição de citações de um estudo inexistente). A Lusa recusou mostrar prova da existência do relatório, mas garante que existe. O PÁGINA UM apresenta as citações retiradas do artigo publicado pelo Diário de Noticias de 28 de Julho que transcreve o take da Lusa.

    1 – “Se juntarmos os casos não reportados oficialmente atinge-se o número de 340 mil

    2 – “não teriam impacto económico

    3 – “os seus efeitos seriam cumulativamente menores e a descida seria mais cedo e mais rápida

    4 – “O efeito aqui é mais lento e menor do que o efeito das medidas gerais, pois afeta diretamente população mais jovem, mas leva a contágios em cascata que acabam por vitimar os mais suscetíveis a doença grave

    5 – “uma possível correlação com vagas de calor

    6 – “com tendência de atingirmos os valores mais baixos de 2022

    7 – “ter excesso de confiança é o risco que Portugal corre


    N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. O PÁGINA UM considera que os processos, quer sejam favoráveis quer desfavoráveis, servem de barómetro à Democracia (e à transparência da Administração Pública) e ao cabal acesso à informação pelos cidadãos, em geral, e pelos jornalistas em particular, atendíveis os direitos expressamente consagrados na Constituição e na Lei da Imprensa.

  • Filipe Froes está mesmo com um processo disciplinar à perna… mas a “marinar” desde Fevereiro

    Filipe Froes está mesmo com um processo disciplinar à perna… mas a “marinar” desde Fevereiro

    Estrela mediática durante a pandemia, Filipe Froes manteve-se como consultor da Direcção-Geral da Saúde, enquanto acumulava funções de consultor e palestrante de farmacêuticas com fortes interesses no negócio da covid-19. Assumia-se sempre como um perito independente sem conflitos de interesses, apesar de mais de uma vintena de farmacêuticas que, desde 2013, se mostraram interessadas nos seus préstimos. A Inspecção-Geral das Actividades de Saúde, depois de um processo de averiguações, abriu-lhe mesmo um processo disciplinar… que marca passo há mais de nove meses. Já nasceram as crianças que foram concebidas no mesmo dia em que o inspector-geral determinou a instauração deste processo.


    A Inspecção-Geral das Actvidades em Saúde confirmou hoje ao PÁGINA UM que o pneumologista Filipe Froes está mesmo a ser alvo de um processo disciplinar devido às suas ligações à indústria farmacêutica, mas o seu processo arrasta-se desde Fevereiro deste ano. A IGAS acrescenta que o processo disciplinar se encontra ainda em fase de instrução e, nessa medida, inacessível pela “natureza secreta do inquérito”.

    A IGAS não adianta quais os motivos de tantos meses para a instrução deste processo disciplinar, mas informa que este deriva das averiguações iniciadas em Setembro do ano passado a que foi sujeito este conhecido consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS), presença assídua na imprensa como alegado perito independente durante os anos da pandemia.

    Filipe Froes, um dos médicos portugueses com mais ligações à indústria farmacêutica, mantém-se como consultor da DGS e com intenso palco mediático.

    De acordo com a entidade fiscalizadora, o processo disciplinar a Filipe Froes vem no seguimento da “informação de avaliação n.º 149/2022”, que mereceu um despacho em 19 de Fevereiro passado do inspector-geral das Actividades em Saúde, Carlos Carapeto, que deu instruções para ser iniciado um processo disciplinar, ignorando-se o “castigo” eventualmente a aplicar.

    A decisão de instauração de um processo disciplinar a Filipe Froes após um processo formal de averiguações – revelado em Novembro do ano passado pelos semanários O Novo e Expresso – mostra já, em todo o caso, a existência de fortes indícios de irregularidades e/ ou ilegalidades. De facto, o processo de averiguações só avançaria para uma fase posterior se se tivesse apurado matéria suficiente para uma “condenação” em processo disciplinar, o que não surpreenderá, tendo em conta o que se foi tornando público.

    Em 4 de Janeiro passado, o PÁGINA UM tinha já escalpelizado as declarações de Filipe Froes no Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed e cruzado com os relatórios e contas dos últimos anos da sua empresa – a Terra & Froes –, detectando sinais de alguma “contabilidade criativa” para que não fosse ultrapassada a média anual (no último quinquénio) de 50 mil euros de recebimentos da indústria farmacêutica. Esta é a fasquia monetária a partir da qual Froes ficaria impedido de ser consultor da DGS.

    Antologia de crónicas de Filipe Froes no Diário de Notícias teve o patrocínio (ainda não declarado) da farmacêutica Bial.

    Apesar de trabalhar em exclusividade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), Filipe Froes é um dos médicos portugueses com maiores relações com as farmacêuticas, que aumentaram com a sua exposição pública no decurso da pandemia. Além de coordenar uma unidade de cuidados intensivos do Hospital Pulido Valente, este pneumologista também liderou o Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos para a Covid-19 e tem, nos últimos dois anos, como consultor da DGS, participado activamente na elaboração de normas técnicas relacionadas com a pandemia.

    De acordo com o Portal da Transparência e Publicidade, Froes estabeleceu, desde 2013, mais de 270 contratos comerciais, em seu nome ou na sua empresa Terras & Froes, com 22 farmacêuticas. O montante global já alcançado ultrapassa os 400 mil euros. Nos dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021), o pneumologista encaixou uma média mensal de 4.065 euros, valor superior ao que ganha como médico do SNS. Este ano, em 11 meses, vai com uma média mensal de 4.327 euros.

    O processo da IGAS pode assim vir a colocar em causa a manutenção de Froes como consultor da DGS e também manchar a sua credibilidade numa fase crucial das eleições para a Ordem dos Médicos. Com efeito, Filipe Froes é mandatário da candidatura de Carlos Cortes a bastonário.

    Filipe Froes (ao centro), entregou como mandatário, no dia 21 de Novembro, a candidatura de Carlos Cortes (quarto à esquerda) a bastonário da Ordem dos Médicos.

    Por outro lado, uma eventual “condenação” confirmaria ainda mais o seu papel de lobista, acusação que o tem constantemente perseguido. Por exemplo, Froes tem sido um defensor do uso do polémico remdesivir, dentro da equipa de consultores que define as terapêuticas anti-covid, e é, em simultâneo, consultor da farmacêutica (Gilead) especificamente para aquele medicamento. Froes também é um acérrimo defensor da vacinação contra a covid-19 em crianças e adolescentes – cujas vacinas são exclusivamente da Pfizer, farmacêutica para a qual este pneumologista tem passado muitas facturas para cobrar colaborações.

    Já este ano, em diversas ocasiões, Froes tem promovido, de forma entusiástica, o uso dos anticorpos monoclonais (produzidos pela Pfizer e pela Merck Sharpe & Dohme) e a integração da vacina da covid e da gripe numa só dose (comercializada pela Sanofi). Saliente-se que só este ano a Merck Sharpe & Dohme e a Sanofi já entregaram oficialmente a Froes um total de 22.261 e 13.583 euros, respectivamente. No total, o pneumologista terá já amealhado 47.602 euros ao longo de 2022.

    Saliente-se, contudo, que estes rendimentos podem pecar por defeito, uma vez que cada vez se torna mais patente que o Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed apresenta falhas enormes, porque as farmacêuticas se “esquecem” de registar donativos e patrocínios a médicos e outras entidades, entre as quais os media mainstream, incumprindo o Estatuto do Medicamento.

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    Por exemplo, ainda este mês, Filipe Froes lançou um pequeno livro com as crónicas que foi publicando no Diário de Notícias, em co-autoria com Patrícia Akester, e o patrocínio da Bial. A farmacêutica portuguesa – que tem como chairman António Horta Osório, que é simultaneamente administrador da Impresa (dona do Expressso e SIC) ainda não colocou o valor do apoio no portal do Infarmed nem sequer respondeu a questões colocadas pelo PÁGINA UM.

    Recorde-se que o PÁGINA UM teve acesso, este mês, no decurso de uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, a cerca de três dezenas de processos levantados pela IGAS, incluindo ao presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, António Morais, também por incompatibilidades relacionadas com farmacêuticas.

    Por estranhar que não se encontrava no lote o processo de Filipe Froes, o PÁGINA UM insistiu para que este fosse disponibilizado, o que não se mostra legalmente possível por se encontrar em fase de instrução. Contudo, se o processo disciplinar, agora em curso, não estiver concluído até 19 de Fevereiro do próximo ano, a IGAS terá, contudo, de disponibilizar pelo menos o processo de averiguação a Filipe Froes.

  • Nova sentença histórica: Governo esconde, mas Tribunal “desbloqueia” base de dados hospitalar com todos os doentes internados

    Nova sentença histórica: Governo esconde, mas Tribunal “desbloqueia” base de dados hospitalar com todos os doentes internados

    A base de dados dos grupos de diagnósticos homogéneos (BD-GDH) é, porventura, o mais importante sistema de informação sobre saúde em Portugal, com um potencial que permitirá avaliar o impacte real da pandemia a partir de 2020 e, sobretudo, detectar quais as causas do excesso de mortalidade em Portugal nos últimos meses. A análise dessa informação, de forma independente, tem capacidade para reescrever o que se passou nos últimos três anos. Não por acaso, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) andou nos últimos quatro meses a lutar no Tribunal Administrativo de Lisboa para evitar ceder o acesso dessa base de dados ao PÁGINA UM. Valeu tudo; até mentiras sobre a impossibilidade de anonimização de dados nominativos. Perdeu…


    É a maior vitória em prol da transparência por parte do PÁGINA UM desde o seu nascimento. Uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, da passada sexta-feira, determinou que a Administração Central de Sistema de Saúde (ACSS) – um dos organismos centrais da gestão dos serviços hospitalares – tem de “facultar (…) o acesso ou cópia digital da base de dados do GDH [Grupos de Diagnósticos Homogéneos], expurgada dos dados pessoais que nela constem”.

    Esta base de dados (BD-GDH), gerida sem influência governamental, integra todos os doentes internados nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, identificando o diagnóstico principal (aquele que, após o estudo do doente, revelou ser o responsável pela sua admissão no hospital), os diagnósticos secundários (todos os restantes diagnósticos associados à condição clínica do doente, podendo gerar a existência de complicações ou de comorbilidades), os procedimentos realizados, destino após a alta (transferido, saído contra parecer médico, falecido) e, no caso de recém-nascidos, o peso à nascença. Contém também dados de identificação (nome, idade e sexo), mas como em qualquer base de dados modernas, o expurgo de dados nominativos, neste caso o nome do doente, é uma opção prevista na concepção dos perfis de acesso, tornando assim os dados anonimizados e susceptíveis de todo o tipo de tratamento estatístico.

    Marta Temido (ex-ministra da Saúde) e Victor Herdeiro (presidente da ACSS), terceiro e quarto a contar da esquerda, juntos na sessão de apresentação dos novos Estatutos do SNS no passado dia 7 de Julho. A antiga governante e o dirigente da ACSS foram companheiros durante três mandatos na Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares.

    Além de esclarecer, de forma clara, o efectivo impacte da pandemia e da covid-19 desde 2020, a BD-GDH possibilitará, à falta de outras bases de dados que o Ministério da Saúde continua a recusar disponibilizar – e que ainda se encontram em análise em outros processos no Tribunal Administrativo –, obter indicadores sobre as principais afecções e doenças que poderão estar a contribuir para o contínuo excesso de mortalidade, numa fase em que a covid-19 se encontra já em fase endémica.

    Esta vitória histórica do PÁGINA UM – que se sucede a outras sentenças favoráveis – surge no decurso de um longo processo de obstaculização por parte do presidente da ACSS, Victor Herdeiro – amigo de longa data da ex-ministra Marta Temido –, que começou, em meados de Maio passado, por expurgar do Portal da Transparência do SNS uma base de dados pública sobre morbilidade e mortalidade hospitalar, uma versão manipulada e mais simplista da BD-GDH.

    A decisão de Victor Herdeiro – justificada pela necessidade nunca provada de “análise interna” – foi uma reacção política ao conjunto de artigos de investigação do PÁGINA UM sobre o desempenho hospitalar desde 2020, e não apenas relacionado com a covid-19.

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    Mesmo sendo uma simplificação da BD-GDH, essa base de dados que estava no Portal da Transparência permitira, através de análise estatística feita pelo PÁGINA UM, revelar que, até Janeiro deste ano, houvera menos 51 mil hospitalizações de crianças durante a pandemia por todas as doenças; apurar que a variante Ómicron tinha indicadores de letalidade inferiores aos da gripe; identificar problemas graves (com aumento de taxas de letalidade mesmo em alas não-covid); determinar que a taxa de mortalidade da covid-19 foi evoluindo ao longo da pandemia e em função dos hospitais, sendo 30% superior à das doenças respiratórias; desmistificar a alegada elevada pressão durante a pandemia, até porque houve menos 280 mil doentes por outras causas não-covid; e também identificar estranhas descidas na mortalidade por cancros e outras doenças, bem como colocar dúvidas sobre a mortalidade por covid-19 nos hospitais.

    Após várias tentativas para “convencer” o Ministério da Saúde – que nunca quis rectificar a conduta de Victor Herdeiro –, o PÁGINA UM apresentou em 19 de Agosto passado uma intimação junto do Tribunal Administrativo de Lisboa contra a ACSS, mas já não apenas para a reposição da versão original da base de dados da mortalidade e morbilidade – que fora entretanto reposta mas completamente “mutilada”. Com efeito, foi também solicitado o acesso à BD-GDH, por se ter considerado ser uma base de dados mais completa e muito mais “imune” a intervenções políticas.

    No dossier “Investigação SNS”, publicado entre 13 de Maio e 1 de Junho, o PÁGINA UM usou uma base de dados que esteve, durante um período, suspensa. A BD-GDH tem um potencial informativo muito superior.

    Desde logo, a ACSS – através do escritório de advogados BAS, que tem vencido uma quantidade significativa de contratos por ajuste directo de entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde – mostrou que não estava interessada em abrir mão à “secreta” BD-GDH. Alegando que já repusera a base de dados original da morbilidade e mortalidade hospitalar – o que, de facto, terá sucedido em meados de Agosto –, a ACSS começou por tentar iludir a juíza do processo, Ilda Maria Côco, fazendo crer ter já satisfeito o pedido integral do PÁGINA UM, e solicitou assim que a intimação fosse “totalmente julgada improcedente e indeferida, tudo com legais consequências”.

    Somente após um requerimento do advogado do PÁGINA UM, Rui Amores, provando que estava sobretudo em causa a continuada recusa do acesso à BD-GDH, a ACSS veio pronunciar-se sobre este assunto – ou seja, foi obrigada a justificar a recusa. Mas recorrendo à mentira.

    Com efeito, através da mesma sociedade de advogados, a ACSS defendeu que a BD-GDH continha “dados pessoais” e que “as funcionalidades dos sistemas de informação nos quais se encontram localizadas não permitem tecnicamente a respetiva consulta sem acesso aos dados pessoais em causa”, acrescentando que “reprodução (digital) da informação da base de dados com expurgo dos dados pessoais implicaria a criação ou adaptação da base de dados com um esforço desproporcionado que ultrapassa a simples manipulação”. E concluiu que, “associado à extensão dos dados em causa e à própria arquitetura dos sistemas de informação em que se suportam as bases de dados”, obrigar a anonimização “acarretaria para ACSS uma atuação administrativa, com gestão dos recursos disponíveis para a prossecução das respetivas atribuições legais em desvio dos princípios aplicáveis e pelos quais se deve reger a atividade administrativa, nomeadamente, os princípios do interesse público, da boa administração, da proporcionalidade e da razoabilidade”.

    Este arrazoado tinha, porém, apenas um fito: continuar a esconder a BD-GDH do escrutínio público, tentando convencer a juíza do processo de que a anonimização de uma base de dados deste género não é um processo corriqueiro, nem que basta seleccionar as variáveis que se pretenda e, nessa linha, excluir aquelas que não se pretendem. Destaque-se que o PÁGINA UM jamais teve a pretensão de revelar dados pessoais de doentes, sobretudo por não ser ético, mas também por ser de interesse nulo para quaisquer diagnósticos em saúde pública.

    Mas tinha também este arrazoado jurídico uma perna curta. De facto, a anonimização da BD-GDH é um procedimento tão corriqueiro e bem conhecido da ACSS, tanto assim que esse expediente administrativo costuma estar expressamente delegado num dos vice-presidentes para conceder acessos a investigadores. Por exemplo, no presente conselho directivo da ACSS, Victor Herdeiro delegou na sua vice-presidente Sandra Brás a competência “para autorizar o fornecimento de dados anonimizados provenientes da Base de Dados Nacional de Grupos de Diagnósticos Homogéneos (BD-GDH)”, conforme a Deliberação 835/2021 publicado em Diário da República em 9 de Agosto do ano passado.

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    Perante esta evidência, acabou por ser com naturalidade que a juíza Ilda Côco deu razão ao PÁGINA UM. De acordo com a magistrada, como a ACSS apenas se limitou a “alegar, de forma conclusiva, que o expurgo de dados pessoais implicaria a criação ou adaptação da base de dados com um esforço desproporcionado (…), mas sem que alegue quaisquer factos concretos que permitam concluir no sentido por si pretendido”, terá assim 10 dias para facultar o acesso à base de dados… carregando no teclado e/ ou no rato do computador para expurgar os dados nominativos.

    A ACSS poderá ainda recorrer desta sentença, o que a observar-se constituirá mais um sinal de obscurantismo no sentido de evitar uma avaliação independente das políticas de saúde nos últimos anos. O PÁGINA UM enviou a sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa ao Ministério da Saúde para saber se o ministro Manuel Pizarro tomará alguma diligência junto da ACSS para libertar a BD-GDH ou para que recorra para o Tribunal Central Administrativo Sul. Sem resposta até agora, o que era uma situação habitual nos tempos de Marta Temido, e que não se modificou com a entrada em funções governamentais do médico Manuel Pizarro.


    N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. O PÁGINA UM considera que os processos, quer sejam favoráveis quer desfavoráveis, servem de barómetro à Democracia (e à transparência da Administração Pública) e ao cabal acesso à informação pelos cidadãos, em geral, e pelos jornalistas em particular, atendíveis os direitos expressamente consagrados na Constituição e na Lei da Imprensa.

  • Relatório Rápido 52: Instituto Superior Técnico manipulou documentos enviados ao Tribunal Administrativo

    Relatório Rápido 52: Instituto Superior Técnico manipulou documentos enviados ao Tribunal Administrativo

    Mais um episódio caricato no processo de intimação do Instituto Superior Técnico que luta para não ceder relatório supostamente científico que causou alarme no Verão: a juíza fez hoje despacho para que seja enviado o original e não uma cópia com anotações a lápis. A manipulação do IST visaria convencer o tribunal de que se está perante um esboço, e não um relatório científico, mesmo se de duvidosa qualidade. Uma novidade deste despacho é que, finalmente, se sabe quantos relatórios o IST terá feito em articulação com a Ordem dos Médicos: 52. Se a sentença for inteiramente favorável ao PÁGINA UM, todos serão tornados públicos.


    A juíza do Tribunal Administrativo de Lisboa, Telma Nogueira, ordenou hoje que o Instituto Superior Técnico lhe enviasse o relatório original sobre o impacte das festividades populares de Junho passado na incidência e mortalidade da covid-19 – cujas conclusões foram divulgadas pela Lusa e “viralizaram” na imprensa mainstream –, e não uma cópia manipulada com “anotações manuscritas a lápis”. 

    Este é o mais recente episódio de um inaudito processo de intimação que decorre naquele tribunal, por iniciativa do PÁGINA UM, após a recusa do presidente do IST, Rogério Colaço, em disponibilizar os dados estatísticos e o relatório escrito que serviram para a Lusa divulgar, em 28 de Julho passado, a ocorrência da “morte de 790 pessoas com covid-19 devido ao levantamento das restrições e às festividades, dos quais 330 associados [sic] às festas populares de junho”.

    Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico, enviou cópia manipulada ao Tribunal Administrativo. Foi hoje obrigado a enviar original sem qualquer anotação.

    Na verdade, como o PÁGINA UM destacou, naquele período observou uma tendência de redução significativa de casos positivos, pelo que surgiam assim dúvidas sobre o rigor científico daquele relatório feito por uma das mais prestigiadas faculdades públicas portuguesas em articulação com a Ordem dos Médicos.

    Em sede de processo em Tribunal Administrativo, o IST começou por afirmar que não divulgara qualquer relatório, e que apenas concebera um “esboço embrionário, consubstanciado num mero ensaio para um eventual relatório”. Com este expediente, Rogério Colaço e os outros investigadores daquela instituição universitária tentaram que juíza Telma Nogueira não concedesse direito de acesso ao PÁGINA UM, dado que a lei determina que um “esboço” não é considerado um documento administrativo.

    Além disso, o IST argumentava ainda que “não se vislumbra também qual a utilidade que um documento incompleto, ou seja, por concluir, possa ter para o requerente [PÁGINA UM], pois tratando-se de um ensaio de projeção/ estimativa, pode não conter informações exatas e precisas, para que o requerente como jornalista possa depois difundir, podendo até sugestionar interpretações contrárias à verdadeira pretensão.”

    Neste envelope, lacrado, o Instituto Superior Técnico enviou ao Tribunal Administrativo uma cópia do Relatório Rápido nº 52, mas com anotações a lápis, para dar a ideia que não estava concluído e que era um esboço. Juíza do processo exige agora envio do original.

    Porém, a juíza do processo de intimação decidiu analisar, pessoalmente, o conteúdo dos documentos em causa, o que foi feito esta semana pelo envelope lacrado com a classificação de confidencial.

    Através da leitura do despacho da juíza Telma Nogueira, denota-se que o IST tentou influenciar a decisão fazendo acrescentos à mão no documento enviado ao Tribunal Administrativo, para dar a ideia de que a versão impressa não era a final, e que se estaria perante um esboço.

    Com efeito, no seu despacho de hoje, a juíza ordena que se “notifique a Entidade demandada [IST] para, em cinco dias, juntar aos autos o original do Relatório Rápido nº 52 sem anotações manuscritas a lápis, em envelope lacrado, a entregar em mão no Tribunal dentro de outro envelope fechado ou a enviar via correio postal dentro de outro envelope fechado e a título confidencial”.

    Além dos sinais evidentes, independente do rigor científico, de se estar perante um verdadeiro relatório – daí a denominação Relatório Rápido n.º 52, pela primeira vez assumido pelo IST –, o despacho da juíza não deixa de ser revelador de uma certa incredulidade em redor deste processo, onde estão sobretudo em causa questões de semântica, nomeadamente sobre o que é um estudo, o que é um esboço e, agora, o que é o “Relatório Rápido nº 52”. Até porque a existência do relatório do IST foi confirmada pela direcção da agência noticiosa Lusa, e a notícia o cita, entre aspas, por sete vezes.

    Em todo o caso, mostra-se cada vez mais inquietante a postura do IST, como instituição universitária pública, por se manter firme numa postura obscurantista, recusando divulgar os dados em bruto e um relatório com impacte relevante – e que no Verão foi usado pela imprensa mainstream para criar alarme injustificado e eventualmente falso –, e tentando levar a crer que, em Julho passado, aquele não estava concluído, e que era apenas um esboço.

    Mas, mesmo que assim fosse, passaram entretanto quatro meses, entre Julho e Novembro. Quatro meses que seriam tempo mais do que suficiente para transformar esse alegado “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório” num verdadeiro e conclusivo relatório. Quatro meses que, contudo, aparentemente, foram insuficientes para a equipa de cinco investigadores do IST, supervisionado pelo seu presidente, o catedrático Rogério Colaço.

    Lusa noticiou as conclusões de um estudo do Instituto Superior Técnico sobre o impacte das festividades em Junho na transmissão e mortes por covid-19. Instituição universitária, que faz Ciência, quer convencer o Tribunal que aquilo que fez não foi um estudo, mas apenas “um esboço embrionário”. Ou uma “mera abordagem embrionária”, como mais tarde esclareceu.

    Independentemente da análise do Tribunal Administrativo de Lisboa sobre o enquadramento semântico do Relatório Rápido nº 52 (se é um relatório ou um esboço), saliente-se que o PÁGINA UM requereu ao IST, estando também para decisão do Tribunal Administrativo, os relatórios anteriores, elaborados em colaboração com a Ordem dos Médicos desde Junho de 2021.

    Como o IST não alegou, para nenhum dos outros 51, que se estava perante situações de “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”, tudo indica que pelo menos 51 relatórios serão disponibilizados, através de sentença, para uma avaliação independente da qualidade e rigor científico do IST durante a pandemia.   


    Citações (entre aspas) do Relatório Rápido nº 52 do Instituto Superior Técnico transcritas pela Lusa no take de 28 de Julho passado, que comprovam a existência de um relatório escrito, ou então estaremos perante uma “fraude” (transcrição de citações de um estudo inexistente). A Lusa recusou mostrar prova da existência do relatório, mas garante que existe. O PÁGINA UM apresenta as citações retiradas do artigo publicado pelo Diário de Noticias de 28 de Julho que transcreve o take da Lusa.

    1 – “Se juntarmos os casos não reportados oficialmente atinge-se o número de 340 mil

    2 – “não teriam impacto económico

    3 – “os seus efeitos seriam cumulativamente menores e a descida seria mais cedo e mais rápida

    4 – “O efeito aqui é mais lento e menor do que o efeito das medidas gerais, pois afeta diretamente população mais jovem, mas leva a contágios em cascata que acabam por vitimar os mais suscetíveis a doença grave

    5 – “uma possível correlação com vagas de calor

    6 – “com tendência de atingirmos os valores mais baixos de 2022

    7 – “ter excesso de confiança é o risco que Portugal corre


    N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. O PÁGINA UM considera que os processos, quer sejam favoráveis quer desfavoráveis, servem de barómetro à Democracia (e à transparência da Administração Pública) e ao cabal acesso à informação pelos cidadãos, em geral, e pelos jornalistas em particular, atendíveis os direitos expressamente consagrados na Constituição e na Lei da Imprensa.

  • Ruas e debates civis tornam-se agora os (únicos) palcos na defesa dos direitos humanos

    Ruas e debates civis tornam-se agora os (únicos) palcos na defesa dos direitos humanos

    No espaço de 10 dias, Lisboa viu três concentrações e manifestações nas ruas em defesa dos direitos humanos, direitos civis e da democracia. Contestação contra as propostas de revisão constitucional levou a plataforma cívica Cidadania XXI a mobilizar-se em duas concentrações na capital, juntando mais de uma centena de pessoas. Já este Sábado, Lisboa juntou-se a muitas outras cidades do mundo numa Manifestação Mundial para os Direitos Humanos e Liberdade, com a presença de cerca de mais de uma centena e meia de pessoas.


    Estamos em plena Europa do século XXI, mais propriamente em 2022, mas não parece. A sociedade civil está a ter necessidade de regressar às ruas dos países ocidentais, em manifestações, para defesa dos direitos cívicos. Na Europa, berço da Democracia, incluindo Portugal. Duas concentrações em Lisboa, nas últimas duas semanas, são disso exemplo: uma contra as propostas de revisão constitucional; a outra, integrada na Manifestação Mundial pelos Direitos Humanos e a Liberdade (World Freedom Rally 2022). Ambas trouxeram às ruas não mais de duas centenas de pessoas; ainda poucas, por agora, mas as duas com muitas palavras de ordem em defesa dos direitos, liberdades e garantias, sempre com a democracia em pano de fundo.

    Mas além da manifestação e das concentrações, a sociedade civil mexe-se por outras vias. A plataforma cívica Cidadania XXI tem estado particularmente activa, tendo já feito chegar aos líderes dos dois maiores partidos políticos portugueses (PS e PSD) um manifesto/ petição intitulado Em Defesa da Liberdade da Constituição.

    Joana Amaral Dias, psicóloga, ex-deputada e activista, a discursar no dia 10 de Novembro numa concentração contra a revisão constitucional.

    Esta plataforma cívica é um movimento de cariz cívico que nasceu em 2020 e se notabilizou por diversas iniciativas de amplitude, sobretudo os debates denonimados Tertúlias da Junqueira, que reuniram notáveis da vida académica, médica, científica, jurídica e dos media para debater a censura e as muitas medidas ilegais e anticientíficas que foram adoptadas durante a pandemia. Além disso, organizaram uma grande manifestação no dia 25 de Abril de 2021 que desceu a Avenida da Liberdade, em plena pandemia.

    Na petição entregue a António Costa e Luís Montenegro, esta plataforma cívica manifesta “preocupação [com] o processo de Revisão Constitucional em curso e em particular a proposta que o Governo enviou à Assembleia da República do dia 9 de Novembro”.

    Salienta-se que, de entre as alterações propostas pelos dois principais partidos (que constituem maioria qualificada, ou seja, mais de dois terços dos deputados), está a possibilidade de detenção de um cidadão sem mandato judicial, algo que a Cidadania XXI considera uma “perigosa intenção” por “ficar aberta a possibilidade de um qualquer Governo prender um cidadão, com base em regras estipuladas por si, retirando a legitimidade e a autonomia fundamental dos Tribunais para decidir sobre os Direitos, Liberdades e Garantias”.

    António Jorge Nogueira, fundador e presidente da Plataforma Cívica – Cidadania XXI (à direita), entregou um manifesto contra a proposta de revisão constitucional ao primeiro-ministro, António Costa.

    Segundo esta plataforma cívica, com uma Constituição nos termos propostos, “estaremos perante um regime constitucional em que o Governo poderá exercer sobre os cidadãos o mesmo tipo de autoritarismo totalitário que actualmente vigora no regime chinês”.

    A possibilidade de detenção de cidadãos sem mandato judicial, apenas por ordem das autoridades sanitárias, surge após ter sido considerado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional os confinamentos forçados de cidadãos, a coberto de alegados riscos, durante a pandemia da covid-19. Visto que as detenções sem mandato judicial violaram a Constituição, o Governo decidiu assim aproveitar para propor uma alteração à Lei Fundamental do país.

    Vários juristas têm vindo, contudo, a alertar para os perigos desta revisão constitucional. O próprio bastonário da Ordem dos Advogados, Luís Menezes Leitão, denunciou que, caso PS e PSD avancem com a aprovação desta revisão, “está em causa a supressão de direitos, de liberdades e de garantias”.

    Uma das concentrações contra a proposta de revisão da Constituição, em que participou a Cidadania XXI, juntou mais de uma centena de pessoas, durante a noite do passado dia 10 de Novembro, junto ao Hotel Epic Sana Marquês, onde decorreu o Conselho Nacional Extraordinário do PSD. A Cidadania XXI entregou a sua petição a alertar para os perigos levantados pelas propostas de revisão constitucional ao presidente do PSD, Luís Montenegro.

    António Jorge Nogueira, presidente da Cidadania XXI (à esquerda), entregou um manifesto contra as propostas de revisão constitucional ao presidente do PSD, Luís Montenegro.

    A plataforma cívica deslocou-se também à sede do PS, no Largo do Rato, entregando o mesmo documento ao primeiro-ministro e secretário-geral do PS, António Costa, e ao presidente do partido que sustenta o Governo, Carlos César. Este documento também será entregue ao Presidente da Assembleia da República, aos Grupos Parlamentares, ao Presidente da República, à Ordem dos Advogados, ao Conselho Superior da Magistratura “e a diversas outras instituições da sociedade portuguesa”, segundo António Jorge Nogueira.

    “Não nos podemos esquecer que durante dois anos o Presidente da República, o Governo e diversas instituições actuaram conscientemente e sistematicamente contra a Constituição, conforme já declarado 23 vezes por juízes do Tribunal Constitucional”, afirmou António Jorge Nogueira ao PÁGINA UM. Com este projecto de revisão da Constituição, “já não estamos em modo democrático”, lamentou.

    No âmbito destas iniciativas, a Cidadania XXI vai organizar ainda outros eventos públicos, onde se incluirá um novo ciclo de Tertúlias da Junqueira em torno do tema da defesa dos direitos, liberdades e garantias. A plataforma pretende também reunir com os diferentes grupos com assento parlamentar.

    Joana Amaral Dias, antiga deputada, psicóloga e activista, que marcou presença nas concentrações e na manifestação de sábado, tem sido uma acérrima crítica das posições de PS e PSD. “Repare-se que em nenhuma circunstância, mesmo que se reúnam dois terços dos deputados ou a totalidade dos parlamentares, é permitido alterar ou abolir esses mesmos direitos”, escreveu esta psicóloga em artigo de opinião no semanário O Novo. “O artigo 288.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) constitui uma barreira intransponível, bloqueia em absoluto qualquer tentativa de os adulterar”, adiantou, frisando: “a razão é simples: mexer-lhes, alterar o contemplado no artigo 24.º, é atacar o magma da democracia” e que “sem esses direitos não há Estado de direito e, por isso, o tal 288 não o permite em circunstância alguma”.

    Manifestação Mundial levou para as ruas cidadãos em diversas cidades do mundo, no passado Sábado.
    (Fotos em cima: Manifestação em Lisboa. Foto em baixo: Manifestação em Toronto, no Canadá)

    A ex-deputada do Bloco de Esquerda foi, aliás, uma das individualidades que subiu ao palco para discursar no âmbito da Manifestação Mundial pelos Direitos Humanos e a Liberdade (World Freedom Rally 2022) no passado sábado, a par da médica Margarida Oliveira, que foi alvo de processo pela Ordem dos Médicos, por delito de opinião, apesar de defender medidas com base na evidência científica.

    Recorde-se que a Ordem dos Médicos e o seu bastonário, Miguel Guimarães, tiveram, durante a pandemia, um papel de relevo na tentativa de silenciar e punir médicos que se mostraram contra medidas e recomendações do Governo e da Direcção-Geral da Saúde.

    Desde 2020, que cidadãos em diversos países têm participado em manifestações e marchas em defesa dos direitos humanos e civis, perante as medidas drásticas e ilegais que foram adotadas por Governos alegadamente para combater a pandemia de covid-19, incluindo a política de segregação criada com a introdução do chamado “certificado digital” ou “passaporte covid-19” e vacinação obrigatória em diversos setores.

    A Suécia, um país que geriu com sucesso a pandemia, foi a excepção, tendo recusado aderir a confinamentos e máscaras faciais, em geral, nem impôs medidas drásticas como a maioria dos restantes países, registando menos óbitos com covid-19, menores impactos económicos e menos mortes em excesso, comparando com pares na Europa.

    Manifestação em Lisboa no âmbito do World Wide Rally for Freedom

    Hoje, sabe-se, com base em dados e em estudos científicos, que os confinamentos tiveram um impacto devastador na saúde e na economia, tendo sido uma política errada a seguir, como cientistas tinham avisado logo em março de 2020.

    Por outro lado, os dados revelam ainda haver em 2022 milhares de mortes em excesso sem explicação em vários países, como Portugal, faltando investigações independentes ao tema. Enquanto isso, diversos países começam a recuar na vacinação de certas camadas e faixas etárias da população, enquanto mais estudos e dados mostram que riscos de reacções adversas aconselham cautela na vacinação com as novas vacinas, sobretudo em determinados grupos de pessoas, como homens e crianças e jovens.

    Mas, apesar das medidas erradas adoptadas, os direitos humanos e civis que foram amputados desde 2020 não foram repostos na maioria dos países, e teme-se que possam mesmo ser definitivamente abolidos em países como Portugal, com as propostas de revisão constitucional. Por outro lado, também há receios de que a onda de medidas totalitárias seja reforçada agora para gerir a crise ambiental que se anuncia.


    N.D.: A jornalista e cronista do PÁGINA UM Elisabete Tavares é membro fundador da Plataforma Cívica – Cidadania XXI, embora não exerça papel activo nesta associação desde Outubro de 2021.

  • Nos últimos três anos, morreram a mais 102 jovens, mesmo com menor letalidade das doenças respiratórias

    Nos últimos três anos, morreram a mais 102 jovens, mesmo com menor letalidade das doenças respiratórias

    Ao terceiro ano da pandemia, mostra-se cada vez mais evidente que a mortalidade total em Portugal apenas se agravou nas faixas etárias acima dos 55 anos, embora somente com relevância estatística na população em idade de reforma e, nesta, sobretudo nos maiores de 85 anos. Mas há uma gritante excepção, apesar do ensurdecedor silêncio do Governo e dos “peritos da pandemia”: no grupo dos adolescentes e jovens adultos, entre os 15 e os 24 anos, há um inexplicável e surpreendente incremento da mortalidade. Apesar de apenas se terem registado, neste grupo, cinco mortes por covid-19 e as doenças respiratórias até terem sido menos letais durante a pandemia, no somatório dos 10 primeiros meses do triénio 2020-2022 contabilizam-se mais 102 óbitos em comparação com o período homólogo anterior à pandemia. Em todos os outros grupos etários abaixo dos 55 anos, ao invés, observam-se reduções na mortalidade total.


    Mantém-se o silêncio oficial, continua o excesso de mortalidade. Os óbitos registados nos dez primeiros meses deste ano continuam a surpreender no grupo etário dos 15 aos 24 anos, e mostram a contínua “sangria” nos mais idosos, sobretudo dos maiores de 85 anos.

    De acordo com (mais) uma análise do PÁGINA UM, a mortalidade nos adolescentes e jovens adultos (entre os 15 e os 24 anos), que desde 2014 – ano a partir do qual existe informação diária fornecida pelo Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos (SICO) – nunca excedera até Outubro os 290 óbitos, atingiu este ano os 321 óbitos. Parecendo uma subida absoluta pequena, a sua dimensão é extremamente relevante.

    three women sitting wooden bench by the tulip flower field

    Com efeito, a mortalidade neste grupo etário – que, nos tempos modernos, e por razões compreensíveis, era inferior a uma morte por dia – está este ano a atingir dimensões surpreendentes. E não podem ser imputadas directamente ao SARS-CoV-2, uma vez que os dados da morbilidade e mortalidade hospitalar, que constam no Portal da Transparência do SNS, indicam apenas cinco óbitos por covid-19 entre os 15 e os 24 anos até Setembro passado. Globalmente, tendo em conta os 866 óbitos por todas as causas neste período, a covid-19 representou 0,6% do total.

    Convém referir, contudo, que a mortalidade por doenças do aparelho respiratório nesta faixa etária diminuiu bastante durante a pandemia. Entre Março de 2020 e Setembro deste ano, a base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar aponta para a ocorrência de 31 óbitos, menos 25 dos que aqueles contabilizados no período homólogo imediatamente anterior à pandemia (Março de 2017 a Setembro de 2019).

    Daí que o baixo contributo da covid-19 e até a situação mais “benigna” das doenças do aparelho respiratório mais adensam o “mistério”, que não parece do interesse do Governo ver desvendado, não apenas porque o Ministério da Saúde tem procrastinado uma análise independente como também porque recusa disponibilizar publicamente os dados anonimizados em bruto do SICO.

    Mortalidade total por grupo etário (idades) nos primeiros 10 meses de cada ano (Janeiro a Outubro) entre 2014 e 2022. Fonte: SICO

    Certo é que algo de estranho se passa neste grupo etário desde o início da pandemia – e não é, efectivamente, por culpa da covid-19. A mortalidade já tinha sido elevada em 2020 em comparação com os anos anteriores, tendo sempre como referência o período de Janeiro a Outubro. No primeiro ano da pandemia registaram-se 289 mortes neste grupo jovem, que confrontava com uma média de 256 mortes no quinquénio anterior (2015-2019). Em 2021 os valores regressaram para níveis “normais” (256), mas voltaram a disparar, e muito, em 2022.

    Caso se junte os três anos mais recentes (2020-2022), os 10 primeiros meses totalizam 866 mortes, enquanto no triénio anterior homólogo (2017-2019) se contabilizaram 764 mortes, ou seja, verifica-se um acréscimo de 102 mortes.

    Este fenómeno não se explica sequer por via do envelhecimento populacional – que justifica uma parte do aumento absoluto dos óbitos na faixa dos mais idosos, porque estão, efectivamente, a crescer nas últimas décadas, em virtude da melhoria da esperança de vida. Na verdade, como tem ocorrido uma redução nos nascimentos nas últimas décadas – e especialmente desde o início do presente século –, seria até expectável uma muito ligeira redução na mortalidade absoluta de jovens, mesmo se a taxa de mortalidade se mantivesse estável.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde.

    Além disso, a mortalidade no grupo dos 15 aos 24 anos surpreende por não encontrar correspondência nas faixas etárias adjacentes. Com efeito, confrontando os 10 primeiros meses deste ano com os períodos de 2017-2021 (incluindo assim os dois primeiros anos da pandemia) e de 2015-2019 (quinquénio anterior à pandemia), os menores de 15 anos registam uma redução nos óbitos contabilizados por todas as causas. No caso dos bebés com menos de um ano, mesmo se a mortalidade deste ano está acima da registada em 2020 e 2021, os valores são bastante mais baixos face ao período pré-pandémico (-11,8%).

    No grupo imediatamente superior – dos 25 aos 34 anos –, a mortalidade total em 2022 pode considerar-se dentro de uma certa normalidade, tanto em relação aos dois primeiros anos da pandemia como ao período pré-pandémico.

    Para aumentar a estranheza dos números registados entre os 15 e os 24 anos, também nos grupos etários dos 35 aos 44 anos e dos 45 aos 54 anos se observa uma significativa redução na mortalidade total ao longo dos primeiros 10 meses deste ano. Face ao período pré-pandémico, a redução no primeiro grupo etário é de 11,3% e do segundo de 5,9%.

    Comparação (variação percentual) nos grupos etários (idades) entre a mortalidade nos 10 primeiros meses de 2022 face à média dos quinquénios 2017-2021 e 2015-2019 e entre a mortalidade nos triénios de 2020-2022 e 2017-2019. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM

    Apenas a partir dos 55 anos se observa novamente um incremento da mortalidade face ao período pré-pandémico, embora com especificidades. Com efeito, embora o número de óbitos ainda esteja fora da normalidade face ao período anterior a 2020, entre os 55 e os 84 anos já se observam este ano valores mais baixos de mortalidade total do que em 2021.

    No confronto entre 2022 e 2021 nos primeiros 10 meses, para o grupo dos 55 aos 64 anos registaram-se menos 252 mortes, no grupo subsequente (65-74 anos) menos 517 e no grupo dos 75 aos 84 anos houve menos 951 óbitos. Em todo o caso, os valores de 2022 ainda continuam a ser bastante mais elevados do que antes da pandemia.

    Apenas no grupo dos maiores de 85 anos – aquele que, paradoxalmente, mais vacinado foi contra a covid-19 –, as mortes continuam a bater recordes. Nos 10 primeiros meses deste ano morreram mais 781 idosos desta faixa etária do que em 2021. Nos três anos da pandemia (2020-2022), no período de Janeiro a Outubro foram contabilizados 132.077 óbitos, que contrasta com as 114.552 mortes no triénio imediatamente anterior à pandemia (2017-2019). Ou seja, um incremento de 15,3%.

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    Em termos relativos, este aumento foi muito próximo do registado para o grupo dos 15 aos 24 anos (13,4%), com a agravante de que todos os outros grupos etários abaixo dos 55 anos tiveram mesmo quedas na mortalidade total durante a pandemia.  

    O PÁGINA UM contactou o Ministério da Saúde, no passado dia 4, para comentar estes valores, e também para saber se o estudo anunciado em Agosto pela ex-ministra Marta Temido sobre o excesso de mortalidade estava mesmo em curso, qual era a equipa (nomes) e qual o período previsto de conclusão. Não houve resposta, o que se mostra um “clássico de reacção” deste organismo governamental, que não se modificou com a entrada em funções de Manuel Pizarro.

  • “Nós, os Humanos”, e mais a interferência dos políticos na Medicina

    “Nós, os Humanos”, e mais a interferência dos políticos na Medicina

    A apresentação de uma reflexão sobre a Humanidade, escrita pelo vice-presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia, Jacinto Gonçalves, acabou por ser o mote para um debate sobre a gestão da covid-19. Nós, os Humanos, foi apresentado este sábado na sede da Ordem dos Médicos, é uma obra que constitui uma síntese da História da Humanidade e também um alerta para a necessidade da defesa do Planeta. No debate de apresentação do livro, no auditório da Ordem dos Médicos, falou-se da pandemia, da liberdade de expressão e de opinião, das farmacêuticas e também da ingerência dos políticos em questões de Medicina.


    Com o subtítulo “Quem somos, de onde vimos, para onde vamos?”, o novo livro de Jacinto Gonçalves, Nós, os Humanos, apresentado no sábado passado, é sobretudo uma “reflexão sobre a História da Humanidade e sobre os momentos marcantes da nossa evolução”, explicou o autor ao PÁGINA UM.

    “Precisamos mudar de rumo no respeito pela vida e pelos valores humanos em que acreditamos”, defende o autor. Sobre a influência da sua longa carreira como médico e professor na criação do livro, Jacinto Gonçalves diz que o livro constitui o resultado de 23 anos de ensino e de falar em público. “Temos de tornar as noções complexas em noções simples que sejam facilmente transmitidas e captadas”, diz.

    Jacinto Gonçalves na sessão de autógrafos do lançamento do seu livro Nós, os Humanos. Foto: ©Tozé Canaveira

    Uma das preocupações mostradas por Jacinto Gonçalves, em jeito de conclusão no seu livro, prende-se com a Revolução Industrial, que está a “provocar uma destruição maciça de ecossistemas e redução da biodiversidade”. Para o autor, o livro constitui um alerta para “a necessidade de as pessoas terem uma intervenção, se for possível, política, para defenderem o planeta”.

    António Pedro Machado, um dos convidados na apresentação desta obra, considera que o livro de Jacinto Gonçalves revela “a metodologia de um pedagogo e a escrita de um homem muito culto, que dedicou a vida não só à Medicina e aos doentes como também à Cultura, o que é próprio da sua geração”.

    Para este especialista em Medicina Interna, Nós, os Humanos é um livro que faz a cronologia dos acontecimentos, “mas que volta-e-meia faz-nos mergulhar naquilo que eu chamo um poço onde descemos milhares, por vezes, milhões de anos e depois faz-nos subir”. E acrescenta que “à medida que subimos no tempo, vamos relacionando fenómenos onde vamos percebendo melhor a evolução das coisas”.

    A apresentação do livro contou também com a presença da psicóloga Joana Amaral Dias, que aproveitou para revelar uma “inconfidência” sobre como conheceu o médico Jacinto Gonçalves. “Foi num período bastante crítico na minha vida no que diz respeito à minha consideração, confiança e respeito pela classe médica.”

    A psicóloga relembra que “no meio da crise de gestão da covid-19, fiquei perplexa porque apareceu-me um médico já de alguma idade, mas que era extremamente jovem, no sentido mais completo da palavra”. Joana Amaral Dias diz que foi graças a Jacinto Gonçalves e a outros médicos que restabeleceu essa confiança.

    Sobre a abordagem ao livro e ao seu autor, Joana Amaral Dias considerou que “não é a cultura, não é o conhecimento, não é o dinheiro que faz de nós humanos; é o serviço à Humanidade”.  E explicou que “a ética da Medicina, mostrada por Jacinto Gonçalves, e que me fez restaurar a consideração pela classe médica, é por revelar que essa Medicina não está ao serviço do dinheiro”. E concluiu: “A Medicina é, por vezes, uma serva, uma sabuja de grandes poderes económicos”.

    Embora o livro aborde uma temática global sobre o percurso da Humanidade, a pandemia acabou por interferir de uma forma indirecta, concedendo a Jacinto Gonçalves mais tempo para a escrita. Mas também para a reflexão sobre a gestão da crise sanitária, que considera ter “amputado liberdades e garantias”.

    Para este cardiologista, que exerce há mais de meio século, diz manter as suas posições críticas à forma como o SARS-CoV-2 se tornou omnipresente nas nossas vidas. “Daqui a seis meses, a covid-19 já passou, e já arranjaram outra coisa para nos entreter”, salienta, para acrescentar que, na sua opinião, foi “um meio, tal como sucederá com as alterações climáticas, para procurar controlar as pessoas”.

    Num auditório para mais de meia centena de assistentes, Jacinto Gonçalves garantiu ser “um homem para todas as estações. Não mudo de opinião na Primavera”, lamentando ainda que os médicos se tenham “acomodado excessivamente ao poder político”, como sucedeu durante a pandemia. “Houve erros na gestão, principalmente na parte pré-hospitalar, porque se apostou numa única forma de combater a doença, que é a vacina”.

    O lançamento do livro contou com a presença, da esquerda para a direita, de Joana Amaral Dias, Jacinto Gonçalves, Alexandre Loureço (Ordem dos Médicos) e António Pedro Machado. Foto: ©Tozé Canaveira

    E confessando ter levado as duas primeiras doses da vacina contra a covid-19, o também vice-presidente da Fundação de Cardiologia diz agora que, com este tipo de vacinas, não está “disponível para continuar a levar reforços de seis em seis meses.” E critica também “a atitude impensável de juntar a vacina da gripe, com a qual eu concordo plenamente, com um reforço da covid-19”, assegurando que “se anda a brincar aos feiticeiros”.

    Sobre a liberdade de expressão, que foi coarctada durante a pandemia, Jacinto Gonçalves lamenta que muitas opiniões válidas tenham sido “ocultadas ou impedidas de serem divulgadas”, e que poderiam ter sido implementadas. E exemplifica: “o primeiro grande erro foi o da prevenção, ao não utilizar-se medicamentos que são baratos e seguros, como é o caso da ivermectina. E depois foi o erro na fase pré-hospitalar, pois se um doente fosse testado positivo era mandado para casa com paracetamol; eu acho que isso foi criminoso”.

    Sobre a indústria farmacêutica, Jacinto Gonçalves considera também que “houve ganhos que foram pouco honestos sobre a promoção excessiva de um único meio”, exemplificando como a vacina rendeu milhões. “As acções da Pfizer aumentaram cinco vezes”, destaca. Contudo, o médico não pretende contribuir para diabolizar esta indústria “tantas vezes denegrida”, relembrando o seu papel extraordinário na melhoria das condições de saúde.

    Carlos Alberto Gomes à conversa com Jacinto Gonçalves sobre o livro Nós, os Humanos. Foto: ©Tozé Canaveira

    Para o cardiologista, “houve uma enorme evolução dos anos 50 para os anos 90; em cada década aparecia uma nova classe de medicamentos”, graças às farmacêuticas, defende Jacinto Gonçalves. “Não foram os organismos estatais que conseguiram essa evolução, mas sim as empresas farmacêuticas, que, obviamente têm de dar lucro”, acrescenta.

    Mas quanto aos políticos Jacinto Gonçalves não poupa críticas: “Lavam sempre as mãos como Pôncio Pilatos”, mostrando a sua preocupação por “a emergência sanitária estar a ser empurrada pelos poderes políticos, não só nacionais, como supranacionais”.

    “Os direitos, liberdades e garantias que estão salvaguardados na Constituição desaparecem quando uns senhores quaisquer da Assembleia da República determinarem que há uma emergência sanitária. E isso não pode suceder”, adverte.

  • Pandemia: media mainstream tiveram ‘um papel central’ na perseguição de cientistas

    Pandemia: media mainstream tiveram ‘um papel central’ na perseguição de cientistas

    É um cenário de terror, aquele que é descrito por um estudo feito por cinco investigadores de universidades de Israel e da Austrália. Os investigadores entrevistaram cientistas e médicos de renome a nível mundial que contestaram as políticas seguidas na gestão da pandemia de covid-19 e apresentaram outras soluções. O que descobriram é perturbador: foram usadas tácticas de censura “extremas e sem precedentes” contra aqueles reputados cientistas e médicos. Além da supressão e censura das suas publicações e declarações públicas, outras tácticas foram usadas, como a difamação e perseguição de várias formas, incluindo pelos media mainstream, e a eliminação das suas contas em redes sociais. O estudo conclui que os grupos de comunicação social tiveram aliás um “papel central” na perseguição de ‘opositores’ às políticas que foram seguidas, com as tecnológicas, como Facebook, Google, Twitter e LinkedIn, a terem um papel especial. Conclui também que entidades públicas e farmacêuticas estiveram envolvidas na censura que foi levada a cabo. Mas, as tácticas extremas de censura usadas e a falta de transparência têm tido o efeito oposto do pretendido, levando a população a desconfiar das autoridades de saúde e das políticas seguidas.


    Tácticas de censura “extremas e sem precedentes” foram utilizadas para calar cientistas e médicos de topo a nível mundial que manifestaram posições discordantes das medidas políticas de gestão da pandemia da covid-19. Os media mainstream tiveram um papel central na perseguição das vozes ‘dissidentes’, a par das tecnológicas, como Facebook e Google, estando Governos e farmacêuticas envolvidos em actos de censura.

    Estas são algumas das conclusões de um estudo publicado na prestigiada revista científica Minerva uma publicação especializada em estudos sociológicos do grupo Springer por cinco investigadores de universidades de Israel e da Austrália. O estudo detalha como cientistas e médicos de topo a nível mundial foram visados por acções difamatórias, de censura e perseguição em larga escala.

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    Os investigadores Yaffa Shir-RazEty ElishaBrian MartinNatti Ronel e Josh Guetzkow, destacam no seu artigo intitulado Censorship and Suppression of Covid-19 Heterodoxy: Tactics and Counter-Tactics, que os métodos e tácticas usadas na pandemia foram anti-científicos e podem colocar em risco a vida de pessoas e a saúde pública, constituindo também uma ameaça à liberdade individual e liberdade de expressão. E avisam que a censura acabou por ter um efeito contrário, aumentando a desconfiança pública nas políticas seguidas.

    “Criar um falso consenso, censurando informação e impedindo debates científicos, pode levar os cientistas, e, portanto, também os decisores políticos, a afundarem-se no paradigma dominante, fazendo com que ignorem outras opções mais eficazes para lidar com a crise ou talvez até a impeçam”, alertam.

    Além da censura, que se tornou “a norma” na pandemia, os cientistas e médicos que apresentaram soluções alternativas às oficiais para gerir a pandemia foram alvo de técnicas de difamação e perseguição.

    A metodologia dos investigadores, para a prossecução desta análise, incluiu entrevistas a “13 médicos e cientistas bem estabelecidos [12 homens e 1 mulher], de diferentes países do mundo (nomeadamente, Austrália, Canadá, República Checa, Alemanha, Israel, Reino Unido e Estados Unidos]”.

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    Os media mainstream, a par das tecnológicas, executaram campanhas de perseguição a médicos e cientistas, incluindo classificando as suas pesquisas como “desinformação”, não os entrevistando, e eliminando as suas contas nas redes sociais.

    Destes médicos e cientistas, destacam os investigadores, “11 têm formação médica formal de diversas áreas [por exemplo, epidemiologia, radiologia, oncologia, cardiologia, pediatria, ginecologia, gestão das urgências] e dois são cientistas de investigação sem diplomas médicos [nas áreas da gestão de riscos e psicologia]”. Aqueles especialistas, frisam, “têm um mestrado ou doutoramento, e quatro têm ambos”, sendo que a maioria deles “é bem conhecida nas suas áreas, com um acervo de investigação comprovado que inclui muitas publicações académicas”.

    Os investigadores utilizaram “um método de amostragem propositado, ou seja, uma amostragem não probabilística, segundo a qual é feita uma seleção deliberada de indivíduos que nos podem ensinar sobre o fenómeno em estudo” e, “para preservar o anonimato dos inquiridos, são omitidos detalhes que podem levar à sua identificação”.

    À semelhança de situações anteriores em que houve censura e perseguição de cientistas e médicos, também na pandemia de covid-19 “os resultados de investigação indicam um envolvimento significativo dos meios de comunicação social e do establishment médico na censura e supressão de dissidentes”.

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    Mas salientam que houve “três grandes diferenças” que ocorreram na perseguição e censura de cientistas e médicos durante a pandemia de covid-19.

    Segundo o estudo, “em primeiro lugar, no que diz respeito ao conhecimento relacionado com a covid-19, as tácticas de censura utilizadas contra dissidentes foram extremas e sem precedentes na sua intensidade e extensividade, com revistas científicas e instituições académicas e médicas a participarem na censura de vozes críticas”.

    Por exemplo, um dos participantes do estudo referiu que “até páginas de publicação de estudos ainda não revistos por pares e sites de colaboração académica censuraram artigos e estudos científicos que não estavam alinhados com a narrativa mainstream“, acrescentando que se foi observando”, e isto parece ser “uma tendência crescente”.

    Os investigadores citam também um exemplo recente que ocorreu com um estudo que analisou um inquérito de mais de 300 mil pessoas em 175 países que decidiram não tomar as vacinas contra a covid-19. O estudo “foi removido da página ResearchGate.net nove dias depois de ter sido publicado, citando quebra dos seus termos e condições”.

    Mas o estudo publicado na Minerva apresenta mais preocupantes casos: “o que os nossos inquiridos descrevem vai muito além da censura, e inclui um vasto leque de métodos de supressão destinados a destruir a sua reputação e carreira, apenas porque se atreveram a tomar uma posição diferente da ditada pelo establishment médico”.

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    Os media mainstream também ajudaram a espalhar o medo pela população durante a pandemia,
    criando um clima de desespero e mesmo de pânico, em algumas situações.

    Em segundo lugar, outra diferença face a outras situações de censura, é que “embora estudos anteriores também tenham isolado casos em que investigadores e médicos com currículos impecáveis e até mesmo estatuto académico ou médico sénior foram censurados quando se atreveram a expressar opiniões divergentes, o estudo actual mostra que, no caso da covid-19, censurar médicos e investigadores de estatura tornou-se um fenómeno regular”.

    Os autores do estudo fazem ainda um alerta: “os participantes no nosso estudo, bem como os mencionados na introdução e muitos outros não incluídos na nossa amostra, não são cientistas à margem”. Isto porque, “a maioria são figuras de destaque: investigadores e médicos que antes da era covid-19 tinham um estatuto respeitável, com muitas publicações na literatura científica, algumas delas com livros e centenas de publicações, alguns a liderar departamentos académicos ou médicos, alguns deles editores de revistas médicas, e alguns tinham ganho prémios significativos”.

    A terceira diferença “proeminente”, destacada no artigo da Minerva, “é o papel significativo desempenhado pelas organizações de media durante a pandemia da covid-19, e especialmente as empresas de informação tecnológica, na censura de posições contrárias”. São estas organizações comunicação social e donas de redes sociais que “a nível prático”, detêm o poder, “têm maior capacidade e oportunidades para controlar o conhecimento e a divulgação de informação, e através disso, definir e controlar a agenda”.

    Os investigadores apontam que “documentos recentemente divulgados de processos judiciais indicam que pelo menos parte desta censura é orquestrada por funcionários do Governo”. “As nossas conclusões também apontam indirectamente para outras partes interessadas envolvidas no fenómeno da censura evidente na atual crise, especialmente as empresas farmacêuticas”, revelam.

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    Apesar deste estudo não se ter debruçado especificamente sobre o envolvimento de partes interessadas na censura, diversos relatórios, “tanto antes da era covid-19, como mais recentemente, (…) indicam o envolvimento extensivo de empresas farmacêuticas e de tecnologias de informação em silenciar informações e estudos que podem ser desfavoráveis para eles”.

    Para os investigadores, “dado o papel central destas empresas ao lado dos decisores políticos nas autoridades de saúde e nos governos a nível global, uma grande preocupação é que interesses substanciais, incluindo financeiros e políticos, bem como interesses relacionados com a reputação e a carreira, possam estar por detrás dos esforços de repressão”.

    E salientam ainda que “o interesse das empresas farmacêuticas em controlar o discurso em relação ao covid-19 é evidente”. Por exemplo, foram impostas “medidas altamente incomuns” para impedir que médicos pudessem utilizar medicamentos já existentes no mercado na fase inicial de infecção pelo SARS-CoV-2. Recorde-se que a utilização de medicamentos existentes inviabilizaria a aprovação para uso de emergência de outros fármacos, como é o caso das actuais vacinas.

    Citando um outro estudo publicado este ano, os investidores destacam que a proibição de um debate inicial poderá ter tido consequências económicas [luz verde para vacinas e novos fármacos sob autorização de uso de emergência], financeiras [lucros enormes para grandes empresas] e políticas [restrições globais de liberdades individuais]”.

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    Segundo este estudo, as tecnológicas “também têm fortes interesses em controlar o discurso sobre a pandemia covid-19” e os autores citam um caso exemplar: “em Junho de 2021, foi revelado que a Google, que foi acusada de silenciar a teoria que o vírus SARS-CoV-2 teve origem no Instituto Wuhan de Virologia, financiou, durante mais de uma década, pesquisas de vírus levadas a cabo por um cientista ligado a Wuhan, Peter Daszak, através do seu ‘braço’ de caridade, Google.org”. Além disso, a Google também “investiu um milhão de dólares numa empresa que usa epidemiologistas e análises de big data para prever e rastrear surtos de doenças”, referem os autores.

    Por outro lado, também o British Medical Journal revelou que o processo de fact-checking do Facebook e do YouTube [da Google] assenta em parcerias com verificadores de factos de terceiros, reunidas sob a égide da International Fact-Checking Network. Acontece que “esta organização é gerida pelo Poynter Institute for Media Studies, uma escola de jornalismo sem fins lucrativos cujos principais apoiantes financeiros incluem a Google e o Facebook”. Saliente-se que todos os fact-checkers portugueses, com destaque para o Polígrafo, mas também as rubricas do Público e do Observador, estão associados ao Poynter Institute.

    Quanto aos interesses pessoais dos decisores políticos, o estudo revela que “um grupo de observadores do Governo dos Estados Unidos tem vindo a exigir dados-chave sobre a história financeira e profissional do Dr. Anthony Fauci”, alegando que “durante a pandemia, o Dr. Fauci tem beneficiado generosamente do seu emprego federal, royalties, regalias de viagem e ganhos de investimento”.

    Mas a informação sobre qual foi o seu salário durante os últimos dois anos nunca se tornou pública, tal como as acções e títulos que comprou e vendeu em 2020 e 2021 no mercado financeiro, apesar de Fauci ter influenciado as políticas da covid-19. Também não se sabe o que recebeu — ou não recebeu — em royalties.

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    Aquilo que se sabe, na sequência de um pedido de acesso a informação [FOIA], nos Estados Unidos, é que “Fauci foi instruído por Francis Collins, então chefe do NIH (National Institutes of Health), para desacreditar a Great Barrington Declaration e desvalorizar os seus autores”.

    Mas o artigo da Minerva cita ainda outros casos de conflitos de interesses, incluindo de médicos que assumiram publicamente posições em linha com a narrativa. Em Portugal, um dos casos mais gravosos é o de Filipe Froes, que ganhou largas somas de farmacêuticas, e continua frequentemente a ser citado e destacado pelos media mainstream, nunca sendo referida a sua posição como consultor de empresas farmacêuticas, mas ao invés é destacado o seu papel como consultor da Direcção-Geral da Saúde.

    Os investigadores israelitas e australianos revelam também que, com este estudo, pretenderam “sensibilizar para o uso crescente de práticas de censura e tácticas agressivas de supressão, visando até figuras de relevo que se atrevem a criticar ou duvidar do ‘consenso’ que é imposto”. E avisam: “a censura e as práticas de silenciamento podem ter consequências de grande alcance, manifestadas na violação da liberdade de expressão e dos princípios éticos, prejudicando a ciência e potencialmente arriscando a saúde e segurança públicas”.

    Os investigadores recomendam, por fim, que sejam realizados mais estudos sobre as implicações da censura e tácticas de perseguição de cientistas e médicos durante a pandemia, concluindo que “a censura e o dogma não fazem parte da verdadeira Ciência e têm de ser abandonados e substituídos por um debate justo e aberto”.