Eram dois os processos disciplinares em curso contra a psicóloga Laura Sanches, que durante a pandemia, se destacou como uma voz em defesa das crianças e de medidas baseadas na evidência. O segundo processo baseava-se numa denúncia anónima falsa, ou seja, Laura Sanches nunca afirmara ou escrevera aquilo que constava na acusação. O outro processo foi-lhe aberto porque a Ordem entendeu que a psicóloga não podia integrar um grupo de médicos que contestava a gestão política da pandemia. A comunicação dos arquivamentos surge menos de um mês após uma entrevista de Laura Sanches ao PÁGINA UM, onde este tema esteve em foco. Leia também aqui o editorial de Pedro Almeida Vieira sobre a postura da Ordem dos Psicólogos.
A Ordem dos Psicólogos arquivou os dois polémicos processos que tinha em curso contra a psicóloga Laura Sanches, tendo a psicóloga já sido notificada da decisão.
Em causa estavam dois processos que a Ordem abriu contra a psicóloga durante a pandemia. Num deles, a Ordem entendeu que Laura Sanches não podia integrar um grupo de médicos em defesa da Medicina baseada na evidência. O outro processo foi aberto com base numa denúncia anónima falsa, que indicou que a psicóloga fez afirmações nas redes sociais, que Laura Sanches não fez.
A psicóloga chegou a ser chamada pela Ordem dos Psicólogos para prestar esclarecimentos numa longa sessão.
Além de ter abertos os dois processos, na sua convocatória para ouvir Laura Sanches, a Ordem proibiu a psicóloga de falar sobre os mesmos publicamente, sob a ameaça de ser alvo de um terceiro processo.
A decisão da Ordem de arquivar os polémicos processos surge, por coincidência, depois de o PÁGINA UM ter entrevistado Laura Sanches, a qual detalhou os procedimentos levados a cabo pela Ordem dos Psicólogos.
A actuação da Ordem dos Psicólogos neste caso esteve envolta em polémica, por aparentar tratar-se de uma eventual perseguição a Laura Sanches e a todos os psicólogos que deram a sua opinião publicamente sobre alguns temas relacionados com a pandemia.
Laura Sanches, fotografada por André Carvalho, para a entrevista ao PÁGINA UM.
Laura Sanches foi uma das vozes mais activas durante a pandemia em defesa das crianças e da aplicação de medidas baseadas na evidência. A psicóloga manifestou publicamente que estava contra algumas das restrições impostas na pandemia, nomeadamente o encerramento das escolas e a imposição do uso de máscara a crianças e jovens.
Até ao momento, ainda não foi possível confirmar se outros processos que a Ordem dos Psicólogios abriu a profissionais do sector, relacionados com a partilha pública das respectivas opiniões, já foram ou não também arquivados.
Em todo o caso, a Ordem dos Médicos, durante o mandato de Miguel Guimarães, foi muito mais activa na aplicação indiscriminada de processos disciplinares aos profissionais que tivessem uma postura distinta da defendida pelo Governo. Nesse lote encontra-se ainda, por exemplo, o fundador da AMI e ex-candidato à Presidência da República Fernando Nobre.
Fonte de receita importante para a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa – que regressou no ano passado aos lucros, depois de somar prejuízos acumulados de 72 milhões de euros em 2020 e 2021 –, as polémicas “raspadinhas” têm os dias contados aos balcões dos CTT, onde os funcionários tinham instruções para as “impingir” aos clientes. Os impactes sociais para adição a este jogo, sobretudo “praticado” por pessoas em vulnerabilidade económica, são a principal causa para esta medida.
Nova promessa, desta vez com prazo. Agora, são os próprios CTT que garantem que até finais de Junho as polémicas “raspadinhas” deixarão de ser vendidas nos seus balcões.
O anúncio, feito ao PÁGINA UM por fonte oficial da empresa, surge mais de dois meses depois de o ministro das Infraestruturas, João Galamba, ter anunciado na Assembleia da República a intenção do Governo em cessar com a comercialização daquele jogo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que tem vindo a ser acusado de criar adição junto de grupos sociais economicamente vulneráveis.
Em declarações ao PÁGINA UM, os CTT diz que, “tendo em conta os contratos em curso com o parceiro deste produto [SCML], prevê-se que a venda de Lotaria Instantânea (Raspadinhas) nas Lojas seja descontinuada até ao final do primeiro semestre de 2023”, acrescentando que “o processo está a decorrer com normalidade”.
Esta informação não foi confirmada ainda pelo Ministério das Infraestruturas nem pela SCML, sendo certo que o corte nos postos de venda terá um impacte significativo nas receitas da mais poderosa instituição de solidariedade social, historicamente controlada pelo Estado, e que continua num clima de instabilidade financeira.
As contas da SCML de 2021 – com um prejuízo de 20,1 milhões de euros, depois de perdas de 52 milhões de euros no ano anterior – continuam sem ser homologadas pelo Governo. No ano passado, a instituição terá regressado aos lucros (10,9 milhões), estando previsto no próximo mês a entrada em funções, como provedora, da ex-ministra socialista da Saúde, Ana Jorge.
Segundo dados da própria SCML, divulgados há dois anos, quase 80% das pessoas que jogavam raspadinhas integravam as classes baixa e média-baixa. Em média, ao longo do ano de 2020, os portugueses gastaram uma média diária de 4,7 milhões de euros para riscar os cartões deste jogo que representa um pouco mais de metade da facturação no sector dos jogos da SCML.
Entretanto, no mês passado, o Jornal de Notícias dava conta que ”os portugueses gastaram 1.515,2 milhões de euros em raspadinhas durante o ano de 2021, o que dá uma média de 4,1 milhões de euros por dia”. Desde Maio do ano passado, promovido pelo Conselho Económico e Social, tem estado em curso um estudo sobre a adição à raspadinha, por força de um protocolo com a Universidade do Minho, responsável pela investigação, a Apifarma, a Fundação Mestre Casais, a Fundação Manuel António da Mota e a Fundação Social Bancária.
Nos últimos meses, tanto o Bloco de Esquerda como o Livre vinham pressionando o Executivo a proibir os CTT de continuarem o comércio deste jogo.
O deputado único deste segundo partido apresentou mesmo um projecto-de-lei que visava proibir a “venda de bilhetes de lotarias e de lotaria instantânea nas estações e postos de correio”. Nessa proposta Tavares salientava que “o gasto médio por pessoa nestes jogos é de 160 euros por ano”.
Em resposta, no passado dia 10 de Fevereiro, João Galamba já anunciara na Assembleia da República que os CTT apenas se iriam “dedicar precisamente àquilo que o senhor deputado Rui Tavares disse que gostava que os CTT fizessem, que o Governo também gostaria que fizessem e a boa notícia é que a actual administração dos CTT tem a mesma visão”.
Os dois primeiros meses deste ano confirmam uma tendência do crescimento da procura dos aeroportos portugueses acima dos níveis pré-pandemia. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, que divulgou hoje dados referentes a Fevereiro deste ano, já se contam cinco meses (desde Outubro de 2022) com afluência de passageiros superior aos meses homólogos no período anterior à pandemia. Depois de uma valente queda provocada pelas restrições às viagens aéreas, que causou um descalabro sem precedentes na aviação comercial, o sector está agora com novas “asas”.
Já não há “vestígios” da pandemia nos aeroportos portugueses, e isso vê-se pelos números de passageiros que passaram pelos aeroportos nacionais no último semestre. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), a afluência total ao longo de Fevereiro deste ano confirma mais uma vez, pelo sexto mês consecutivo, mais do que uma recuperação: um crescimento sustentado.
Nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro do ano passado, os números dos passageiros aerotransportados já tinham sido superiores aos dos meses homólogos de 2019. Agora, os dois primeiros meses de 2023 também apresentam valores acima de Janeiro e Fevereiro de 2020, antes do início das fortes restrições politicamente impostas às viagens aéreas por causa da pandemia.
Nos dados divulgados hoje pelo INE ficou-se a saber que em Fevereiro passado passaram pelos aeroportos nacionais 4.042.000 de passageiros, representando um acréscimo de cerca de 8% face ao período homólogo de 2020. Em comparação com Fevereiro de 2022, quando ainda se aplicava a obrigatoriedade de certificado digital e/ ou de testes à covid-19, o crescimento é de 55,6%.
Recorde-se que, em Fevereiro de 2022, o Governo decretou o fim da exigência de um teste negativo para a entrada em Portugal, mas ainda vigorava a obrigatoriedade de apresentação do certificado digital covid-19, ou seja, que atestasse a vacinação ou a recuperação (por um período de seis meses). Só em Julho de 2022 é que a Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) anunciou o fim da imposição de teste ou certificado nas fronteiras portuguesas.
O INE revelou ainda que em Fevereiro passado registou-se uma média diária de 73,6 mil viajantes a aterrar em Portugal – um aumento de 54,1% face ao mesmo mês de 2022, e de 13,1% em relação ao período homólogo de 2020. Nessa altura, os efeitos da pandemia, que não tinha sido ainda identificada em Portugal, não se faziam sentir no tráfego aéreo. No entanto, foi precisamente a partir de Fevereiro de 2020 que o movimento de passageiros caiu a pique e “tombou” entre Abril e Junho. Aumentou posteriormente, mas mantendo-se baixo durante os restantes meses do ano.
Número de passageiros nos aeroportos portugueses entre Janeiro de 2019 e Fevereiro de 2023. Unidade: milhares. Fonte: INE.
Saliente-se que já desde Abril de 2022 que se verificava uma recuperação significativa no sector da aviação comercial, com o número de voos a aproximar-se bastante do registado em 2019.
Os dados do INE também revelam que no segundo mês deste ano foram mais os que entraram em solo nacional do que aqueles que o abandonaram. Porém, em ambos os casos, as deslocações tiveram lugar maioritariamente dentro da Europa, perfazendo estas cerca de 68% nos voos internacionais.
A França foi, em simultâneo, o principal país de chegada e de partida dos voos. Entre os que embarcaram, para além da França, a maioria rumou ao Reino Unido, a Espanha, a Alemanha e a Itália. O ranking foi semelhante para os desembarcados, com apenas uma diferença assinalável: o Brasil foi o quinto país de onde chegaram mais passageiros, e não a Itália.
A seguir à Europa, o continente americano foi a região mundial mais representada no tráfego internacional, tanto no destino como em origem.
O aeroporto de Lisboa manteve a sua primazia como origem e destino dos passageiros no sector da aviação comercial. Nos primeiros dois meses deste ano concentrou 56,3% do total a nível nacional, o que significou um aumento de 4,5% face ao período homólogo de 2020.
No Porto, o aeroporto Francisco Sá Carneiro, também movimentou mais passageiros do que no primeiro ano da pandemia, com um incremento na ordem dos 3%, tendo ficado em segundo lugar no ranking, com 22,8% do total de passageiros transportados. Entretanto, o aeroporto da Madeira “destronou” do pódio o de Faro, registando a terceira maior afluência, com 636 mil passageiros.
No transporte aéreo de mercadorias, porém, o cenário contrasta com o de passageiros. O movimento de carga e correio sofreu um decréscimo de 3,5% face a Fevereiro de 2020, e de 2,2% comparativamente com o mesmo mês do de 2022. Tendo registado uma quebra assinalável ao longo de 2020 e nos primeiros meses de 2021, na segunda metade daquele ano este tráfego já denotava um regresso à normalidade, e em 2022 ultrapassava até, em grande medida, os valores de 2019.
No comunicado de divulgação destes dados, o INE destaca que o tráfego aéreo de passageiros é “tipicamente influenciado por flutuações sazonais e de ciclo semanal, e foi significativamente afectado pelo impacto da pandemia”.
No entanto, os dados dos últimos cinco meses confirmam a tendência de retoma da normalidade com um apreciável crescimento, augurando assim uma época estival até acima da registada no Verão do ano passado, já próxima dos níveis anteriores à pandemia.
A homenagem a António Guterres em Vizela, sob a forma de escultura, é apenas mais um dos casos em que a arte pública está conotada ao mundo dos amiguismos ou do marketing pessoal dos artistas plásticos. O PÁGINA UM foi dar uma “vista de olhos” nas esculturas encomendadas desde 2022 por autarquias, universidades e outras entidades públicas. E se a diversidade de preços é grande, quase todas têm uma característica comum: não houve concorrência; paga-se para ver em definitivo, porque os contratos são por ajuste directo. De entre os mais beneficiados está a nova coqueluche da arte urbana: Bordalo II já facturou, nos últimos cinco anos, mais de 650 mil euros em ajustes directos.
Há de tudo um pouco no mundo da arte pública. Desde obras que orçam nem seis mil euros até valores que se aproximam dos 200 mil euros, mas todos com um ponto em comum: ajustes directos, o que, em termos práticos, significa que o adjudicante escolheu literalmente a dedo quem, com as mãos, lhe haveria de fazer esculturas.
Num momento em que ecoam críticas à beleza e ao custo da escultura de António Guterres em Vizela – encomendada pela autarquia por 89.980 euros para homenagear o primeiro-ministro que elevou aquela vila a sede de concelho, em 1998 –, este caso revela apenas os meandros do pequeno mundo da arte escultórica em Portugal, onde mais do que o aprumo no cinzel ou as noções estéticas do escultor jogam mais as suas ligações ou o marketing pessoal.
Estátua de António Guterres custou quase 90 mil euros.
Com efeito, de acordo com uma análise do PÁGINA UM, de entre os 49 contratos relacionados com esculturas registados no Portal Base desde Janeiro de 2022, apenas um foi por concurso público, aberto pelo município do Porto e ganho por Gelimar da Silva Trillo, que teve de “derrotar” cinco concorrentes. O valor, porém, é dos mais baixos que se detectam. No total, os 48 contratos por ajuste directo desde 2022 totalizam mais de 1,3 milhões de euros.
No topo da lista de contratos por ajuste directo está uma escultura em homenagem ao cavaleiro Joaquim Bastinhas, falecido em 2018, que a autarquia de Elvas encomendou ao escultor espanhol José Antonio Navarro Arteaga, conhecido em Portugal por ser o autor do busto de 60 quilogramas de bronze de Cristiano Ronaldo que se encontra no museu do Real Madrid.
Para a escultura do toureiro português, a Câmara de Elvas, presidido pelo “dinossauro” Rondão Almeida, nem pestanejou em pagar 177 mil euros em Julho do ano passado, sendo, por agora, conhecida uma réplica em pequeno tamanho.
Escultor espanhol que fez busto de Cristiano Ronaldo para o museu do Real Madrid recebeu 177 mil euros da autarquia de Elvas para homenagear o cavaleiro Joaquim Bastinhas.
O segundo maior contrato por ajuste directo desde 2022 foi estabelecido pela Fundação Marques da Silva, ligada à Universidade do Porto. Por duas peças escultóricas, a encomenda foi entregue directamente ao arquitecto Álvaro Siza Vieira por 175 mil euros, em Abril do ano passado. A ausência de concurso público ter-se-á devido ao facto de um dos mais famosos arquitectos portugueses ser já o autor do edifício do novo centro de documentação desta instituição.
Já a Câmara Municipal de Trofa fez o terceiro contrato mais elevado, decidindo, também por ajuste directo, comprar uma escultura e dois conjuntos de desenhos do artista plástico Alberto Carneiro, já falecido, em 2017.
O contrato, neste caso, beneficiou uma galeria de arte lisboeta (Galeria 3 + 1), que detinha estas obras de arte, tendo a aquisição uma justificação até bastante plausível: Alberto Carneiro, cuja obra premiada está exposta em vários importantes museus, nascera em 1937 naquele concelho, mais precisamente em São Mamede do Coronado.
Uma parte substancial das esculturas são de preço abaixo dos 10 mil euros (20 contratos), havendo apenas seis acima dos 50 mil.
Neste segundo grupo conta-se a a escultura promovida por Miguel Guimarães, ex-bastonário da Ordem dos Médicos, que gastou 57 mil euros para que Rogério Abreu fizesse duas cabeças de metal oco mascaradas a glorificar os “heróis da pandemia”. Por ajuste directo, claro.
Quem, de entre os vivos, também não se pode queixar da concorrência é o escultor Bordalo II, transformado nos últimos anos na nova coqueluche das artes plásticas. Através da sua empresa Mundofrenético, Artur Bordalo arrecadou dois contratos por ajuste directo nas últimas cinco semanas: no dia 15 deste mês a Lipor – a empresa de gestão de lixos do Grande Porto – pagou-lhe 18.860 euros por uma escultura, e o Instituto Superior Técnico encomendou-lhe também uma escultura por 57.500 euros, em 20 de Fevereiro.
Estas duas esculturas vão juntar-se a mais 23 contratos por ajuste directo que Bordalo II já conseguiu de entidades públicas, tendo facturado, em apenas cinco anos, um total de 652.329 euros. Em todo o caso, Bordalo II nunca facturou mais do que 72 mil euros por uma peça – valor que fica assim aquém da escultura de António Guterres em Vizela.
Sendo as autarquias um dos principais clientes destes artistas, não surpreende assim que se estabeleçam laços que vão além da arte. Um desses exemplos ocorre no município de Loulé, onde a Origami, pertencente ao artista plástico Filipe Feijão, conseguiu três ajustes directos para a execução de esculturas no valor total de 48 mil euros.
A Origami foi responsável pelos corsos dos Carnavais daquele concelho algarvio entre 1999 e 2014. Esta empresa – que tem sede nas Caldas da Rainha – tem, aliás, no município de Loulé um extraordinário cliente, sempre por ajustes directos: desde 2017 soma 11 contratos por ajuste directo no valor total de 201.750 euros.
A influência dos artistas na arte de obtenção de contratos por ajuste directo tem, de facto, em muitas situações, um padrão regional. Será, por exemplo, o caso de Francisco Lucena – que, desde 2020, conseguiu três contratos com autarquias.
Na verdade, Lucena é um especialista em conseguir contratos para o mais variado tipo de esculturas públicas contratadas por ajuste directo por autarcas. No seu portefólio contam-se 26 contratos para esculturas urbanas, pagas por autarquias, quase todas do interior norte e centro, das quais apenas em dois casos teve consulta prévia.
Aos 36 anos, Bordalo II acumula cada vez mais contratos por ajuste directo: em cinco anos foram já mais de 650 mil euros facturados.
Este escultor tem alguns clientes habituais, o que é bem representativo da cultura destes negócios: dos 18 municípios a quem já entregou arte pública, há quatro repetentes: Vila Pouca de Aguiar (quatro contratos), Trancoso e Sernancelhe (três, cada) Vila Pouca de Aguiar (dois). Francisco Lucena amealhou, desde 2010, um total de 700.819 euros apenas de câmaras municipais.
Apesar destas ligações promíscuas, que impedem a livre concorrência e estímulo criativo para novos artistas, o silêncio é a alma do negócio. De uma forma aberta, não há, na verdade, quem critique abertamente a forma como os contratos por ajuste directo se executam ao longo do país para obras desta natureza.
A empresa pública Infraestruturas de Portugal divulgou no Portal Base, nos primeiros quatro dias de Setembro, sete contratos públicos. Destes, apenas um, no valor de 143.597 euros, foi por concurso público. Os restantes seis, no montante global de 1.784.334,41 euros, foram celebrados por ajuste directo, beneficiando as empresas privadas Mota Engil, Indara Sistemas Portugal, Critical Software, ToInovate Consulting, Espaço Mecânico e Carvisouto. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo. O Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos analisa os contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura), com excepção da edição de segunda-feira que inclui os registos colocados entre a sexta-feira e o domingo.
Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 18 contratos, dos quais 10 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro, um por consulta prévia e cinco por ajuste directo.
Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 18 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (com a Neogames, no valor de 2.129.325 euros); Infraestruturas de Portugal (três, um com a Mota Engil, no valor de 899.974,00 euros, outro com a Indra Sistemas Portugal, no valor de 420.000 euros; e ainda outro com Critical Software, no valor de 329.000 euros); Hospital Garcia de Orta (com a Strong Charon – Soluções de Segurança, no valor de 787.694,28 euros); Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (com a Vision Box Soluções , no valor de 744.776,20 euros); Município do Seixal (com a Alves Ribeiro, S.A., no valor de 501.732,99 euros); Feira Viva – Cultura e Desporto (com a PlenoEnergia, no valor de 356.246,05 euros); Município de Albufeira (com a Algeco – Construções Pré-Fabricadas, no valor de 276.837 euros); CENTITVC – Centro de Nanotecnologia e Materiais Técnicos, Funcionais e Inteligentes (três com a Fuste: um no valor de 213.705,44 euros; outro no valor de 211.472,75 euros e outro ainda de 171.461,55 euros); Hospital de Braga (com a Cepheid Iberia, no valor de 180.000 euros); Hospital de Loures (dois; um com a DH HPS Portugal, no valor de 168.286,60 euros, e outro com a SNL Ibérica,no valor de 110.298,75 euros); Município de Vale de Cambra (com a Unilself, no valor de 138.815,60 euros); Centro Hospitalar de São João (com a Sanofi, no valor de 117.543,30 euros); Município de Santa Cruz (com a Medidata.Net – Sistemas de Informação para Autarquias, no valor de 113.160,55 euros).
TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 4 de Setembro
Ainda sem data para estrear em Portugal, nos cinemas nos Estados Unidos o filme independente “Sound of Freedom” ultrapassou, em apenas três semanas, os 100 milhões de dólares de receita nas bilheteiras. Inspirado em acontecimentos reais, sobre o resgate de crianças vítimas de redes de tráfico sexual de menores, o filme foi bem recebido pela crítica e em vendas de bilhetes tem estado sempre no Top 3 dos mais vistos nos cinemas norte-americanos em Julho, rivalizando com filmes como a última sequela de “Indiana Jones”. O sucesso do filme contrasta com notícias negativas publicadas por alguma imprensa mainstream que, ainda assim, não travam este verdadeiro blockbuster de Verão. Sérgio Saruga, da distribuidora Pris Audiovisuais, diz que “há filmes mais polémicos na Netflix” e não exclui que pode vir a conseguir ter o filme em exibição em Portugal. Paulo Trancoso, presidente da Academia Portuguesa de Cinema, apela a que o filme seja visto como um filme, “despido” de polémicas.
Concluído em 2018, o filme foi colocado na prateleira pela Walt Disney Studios e acabou por ser comprado pela Angel Studios, uma distribuidora de filmes independente e plataforma de streaming que é orientada para conteúdos baseados na fé. Viu a luz do dia no dia 4 de Julho, data em que estreou no grande ecrã nos Estados Unidos.
Apesar do seu orçamento de 14,5 milhões de dólares, o filme tem estado sempre no Top 3 dos filmes mais vistos nas salas de cinema do país rivalizando com filmes como a mais recente sequela de “Indiana Jones“, dos estúdios Disney.
Uma cena do filme “Sound of Freedom”, com o actor Jim Caviezel como principal protagonista.
O filme chegou a 3.285 salas de cinema, menos do que as 4.600 em que é exibido “Indiana Jones e o marcador do destino”. Mas, ao contrário do novo filme da saga “Indiana Jones”, o filme “Sound of Freedom” ainda não pode ser visto no grande ecrã em Portugal.
A distribuidora Angel Studios adquiriu os direitos mundiais do filme e é provável que vá disponibilizar “Sound of Freedom” na sua plataforma de streaming.
Em Portugal, a NOS indicou ao PÁGINA UM que não vai ter o filme em exibição nas suas salas. Segundo uma porta-voz da NOS, o filme não consta na sua lista de estreias, “para já até ao final do ano”. Também a UCI não tem agendada a exibição do filme nas salas em Portugal.
Cartaz a anunciar o filme que estreou no dia 4 de Julho nos cinemas nos Estados Unidos.
Mas ainda há esperança para os cinéfilos portugueses que desejam assistir ao filme no grande ecrã. Um dos distribuidores de filmes em Portugal, a Pris Audiovisuais, não desistiu de trazer “Sound of Freedom” para ser exibido no país.
Segundo Sérgio Saruga, da Pris Audiovisuais, as negociações para trazer o filme para Portugal ainda podem chegar a bom porto. Saruga indicou ao PÁGINA UM que “o filme ainda não tem distribuidor em Portugal mas os seus resultados nos Estados Unidos são bastante bons”, admitindo a possibilidade de vir a distribuir a película no país.
Realizado e co-escrito por Alejandro Monteverde, “Sound of Freedom” relata a história verídica do agente Tim Ballard, que fundou a organização de combate ao tráfico sexual Operation Underground Railroad.
O filme pertencia à 20th Century Fox mas esta foi comprada pela Disney, que acabou por colocar o filme na prateleira.
Monteverde afirmou em entrevista que o adiamento até foi uma benção. “Para mim, este é o timing perfeito”, disse à Bounding Into Comics. “Eu acredito que se este filme saísse mais cedo, eu não acho que o público estava pronto. Neste momento, infelizmente, há publicidade para este filme, mas do lado errado. Todos os dias há estas atrocidades a acontecer nos noticiários por todo o lado. Crianças traficadas. Abusaram sexualmente de crianças por todo o lado.”
Paulo Trancoso, presidente da Academia Portuguesa de Cinema, realçou que o filme “criou alguma expectativa”. “O filme vem bem classificado pela crítica e no IMDb tem uma classificação de 80%, o que é muitíssima qualidade, thriller bem feito”.
A actriz Mira Sorvino numa cena do filme.
Apesar de ter muito boas críticas e do sucesso de bilheteira, “Sound of Freedom” tem sido alvo de notícias negativas em alguma imprensa mainstream, como o The Guardian, que têm tentado colar o filme à direita e aos conservadores norte-americanos e ao fenómeno conspirativo QAnon – ligado a seguidores do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump. Entre os argumentos lidos em notícias negativas estão declarações públicas controversas de Caviezel.
As notícias negativas surgem num contexto crescente da grande divisão que se assiste nos Estados Unidos, a que a imprensa mainstream não escapa, em que a generalidade dos temas são “arrumados” em “esquerda-direita”, “democratas-conservadores”.
Sérgio Saruga, da Pris Audiovisuais, que assistiu a “Sound of Freedom”, “em Cannes, num circuito paralelo” disse que “há filmes bem mais polémicos na Netflix”. “Vejo que o filme pode ser mais polémico em outros países do que em Portugal”, adiantou.
Paulo Trancoso destacou que, nos Estados Unidos, “estamos a falar de um país e uma sociedade divididos ao meio, em termos políticos”. Neste caso, disse, essa divisão acaba por “ajudar à notoriedade do filme”. Mas Paulo Trancoso defendeu que “o filme deve ser despido para ser visto como um filme de entretenimento”. “Tem que ser visto como um filme”, frisou.
Certo é que, o público tem recebido bem o filme e, apesar das notícias negativas de alguma imprensa mainstream, as receitas deste blockbuster de Verão não param de crescer.
E, numa sociedade norte-americana profundamente dividida ideologicamente, este filme independente arrisca não só acumular mais ganhos financeiros, como também tornar-se um exemplo de quão profunda se tornou a divisão na sociedade norte-americana, quando até um filme anti-tráfico sexual de crianças é visto como apenas mais um alimento para reforçar essa divisão.
Falta apenas um mês para o pneumologista Filipe Froes se livrar de um castigo pelas suas ligações alegadamente à margem da lei com as farmacêuticas. Apesar de todas as evidências e proveitos mensais acima dos 4.000 euros, um dos “rostos da pandemia” está quase a ver o seu processo disciplinar arquivado por prescrição, sob a forma de “veto de gaveta”. A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) começou por investigar Froes em Setembro de 2021, e decidiu em Fevereiro do ano passado instaurar-lhe um procedimento disciplinar. Mas, aparentemente, tudo serviu afinal para colocar um manto de esquecimento e segredo. Ao fim de 17 meses, nem sequer se concluiu a fase de instrução, e a prescrição está a caminho. Sem castigo. O inspector-geral da IGAS não dá explicações, mas o PÁGINA UM continua a lutar nos tribunais para conhecer os meandros desta (muito) provável prescrição.
A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) não concluiu ainda sequer a fase de instrução do procedimento disciplinar contra o pneumologista Filipe Froes, que se iniciou em 19 de Fevereiro do ano passado, e que, por isso, deverá manter-se secreto, incluindo o relatório de averiguações que o antecedeu. Esta é a decisão de uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa à intimação colocada pelo PÁGINA UM para a aceder, pelo menos, ao relatório de averiguações que decorreu entre Setembro de 2021 e Fevereiro de 2022.
A consequência imediata será a prescrição no próximo dia 19 de Agosto deste processo, e o respectivo arquivamento sem qualquer penalização para um dos “rostos públicos” da luta contra a covid-19, mas também um dos médicos com maiores e mais promíscuas ligações comerciais com as farmacêuticas, muitas das quais com chorudos negócios associados à pandemia.
Filipe Froes (ao centro) foi mandatário da candidatura de Carlos Cortes (quarto à esquerda), actual bastonário da Ordem dos Médicos.
Na base da instauração de um processo disciplinar a Filipe Froes estiveram, e estão, as suas relações com a indústria farmacêutica, que mereceram em Setembro de 2021 um processo formal de averiguações por parte da IGAS, então revelado pelos semanários O Novo e Expresso, por fortes indícios de irregularidades e/ ou ilegalidades nas parcerias entre farmacêuticas e aquele pneumologista.
Apesar de trabalhar em exclusividade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), Filipe Froes é um dos médicos portugueses com maiores relações com as farmacêuticas, que aumentaram com a sua exposição pública no decurso da pandemia.
Além de coordenar uma unidade de cuidados intensivos do Hospital Pulido Valente, este pneumologista também liderou o Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos para a Covid-19 e é ainda consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS), participado activamente na elaboração de normas técnicas relacionadas com a pandemia. Foi também mandatário da lista de Carlos Cortes, o actual bastonário da Ordem dos Médicos.
Froes foi também um grande promotor do uso e da compra pelo Estado de antivirais e anticorpos monoclonais, como o molnupiravir, da Merck Sharp & Dohme, recentemente retirado do mercado por se ter confirmado que afinal era completamente ineficaz.
Carlos Carapeto, inspector-geral das Actividades em Saúde, instarou um processo disciplinar depois de um relatório que detectou ilegalidades contra Filipe Froes. Mas aparentemente “engavetou” o processo, porque ao fim de 17 meses nem sequer se concluiu a fase de instrução. Tudo prescreve daqui a um mês.
Este ano, também se soube que Filipe Froes recebeu 750 euros da farmacêutica da AstraZeneca apenas por ter participado na sessão de lançamento do Evusheld, um fármaco constituído por anticorpos monoclonais que até foram suspensos pela Food and Drug Administration (FDA).
De acordo com o Portal da Transparência e Publicidade, Froes estabeleceu, desde 2013, mais de 270 contratos comerciais, em seu nome ou na sua empresa Terras & Froes, com 22 farmacêuticas. O montante global já ultrapassou largamente os 400 mil euros. Nos dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021), o pneumologista encaixou uma média mensal de 4.065 euros, valor superior ao que ganha como médico do SNS. No ano passado também ultrapassou a fasquia dos 4.000 euros por mês.
Este ano, Froes continua a facturar. Em consulta ao Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed verifica-se que foram contabilizados 25.194 euros de apoios e honorários na sua conta bancária ou na da sua empresa (Terras & Froes) provenientes de quatro farmacêuticas, com destaque para a Merck Sharp & Dohme (12.341 euros) e a AstraZeneca (10.475 euros). Ou seja, uma média mensal também superior a 4.000 euros.
Sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, deste mês, considera que processo disciplinar contra Filipe Froes, e o processo de averiguações, são documentos administrativos mas que se mantêm secretos até á conclusão ou arquivamento. Prescrição ocorre daqui a um mês.
Convém salientar que o Infarmed não faz, por rotina, qualquer tipo de fiscalização destes registos, pelo que se mostra fácil receber dinheiro e outras ofertas de farmacêuticas sem declaração no Portal da Transparência, como aliás fez o antigo bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães.
Sabendo-se que o processo de averiguações só avançaria para uma fase posterior se se tivesse apurado matéria suficiente para uma “condenação” em processo disciplinar, o PÁGINA UM requereu à IGAS a consulta de um vasto conjunto de processos disciplinares ainda em 2022, o que foi inicialmente recusado.
Em finais de Outubro do ano passado, o PÁGINA UM chegou a obter uma sentença favorável do Tribunal Administrativo de Lisboa para aceder a várias dezenas de processos intentados nos últimos anos pelo IGAS, mas, ao contrário do expectável, não estava ainda incluído qualquer documento referente a Filipe Froes.
Mais tarde, em finais de Novembro, a IGAS acabou por revelar ao PÁGINA UM que o processo de averiguações sobre Filipe Froes, que fora conhecido desde Setembro de 2021, tinha resultado num processo disciplinar em 19 de Fevereiro de 2022, por determinação do inspector-geral Carlos Carapeto.
Quando se concluiu um ano desde a conclusão do processo de averiguações, o PÁGINA UM solicitou uma cópia, mas a IGAS informou que estaria integrado no processo disciplinar, dando-se assim uma aura de secretismo. Mas, a ser verdade, esse secretismo só se manteria, de acordo com a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos, até à conclusão da fase de instrução.
Na sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, conhecida este mês, o juiz Nuno Domingues considera que, embora “a informação em causa tem natureza administrativa, todavia, resulta dos autos que essa mesma informação ocorre em momento prévio à instauração do Proc. N.º 1/2022-INQ e afigura-se ao tribunal que está em conexão com a posterior instauração do procedimento disciplinar, na medida em que a informação reporta-se a processo de esclarecimento que tem clara repercussão e conexão na instauração do procedimento disciplinar”.
Nessa medida, adianta o magistrado que “não podendo os dois procedimentos ser indissociáveis” e que “ainda não foi proferido despacho de acusação (ou de arquivamento)”, conclui que o PÁGINA UM não tem ainda direito de consulta.
O juiz, porém, nem sequer estranhou que ao fim de quase 17 meses não houvesse sequer despacho de acusação ou de arquivamento – o que tornaria públicos os documentos –, sabendo-se que o Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas determina a prescrição ao fim de 18 meses.
Contudo, o juiz que analisou a intimação do PÁGINA UM nem sequer pediu um comprovativo da veracidade das declarações do Ministério da Saúde nem sequer determinou a obrigatoriedade de ser disponibilizada a totalidade da documentação relativa ao processo de Filipe Froes a partir de 19 de Agosto, data em que tudo prescreverá ou terá de estar concluído.
Defesa da Inspecção-Geral das Actividades em Saúde, que mantém o processo disciplinar contra Filipe Froes até à prescrição, foi assumida pelo Ministério da Saúde.
Por esse motivo, o PÁGINA UM recorreu hoje mesmo para o Tribunal Central Administrativo Sul para que considere nula a sentença do juiz Nuno Domingues. Independentemente da decisão do recurso, o PÁGINA UM não desistirá de conhecer os contornos de um processo disciplinar que, tudo indica, foi “engavetado” para manter sob segredo – e sem castigo algum – as relações comerciais entre farmacêuticas e Filipe Froes.
O PÁGINA UM pediu, na semana passada, esclarecimentos a Carlos Carapeto, inspector-geral da IGAS, sobre a iminência da prescrição, e dos motivos para tamanha demora na conclusão da fase de instrução. Foi também perguntado “se houve qualquer pressão governamental, política, empresarial ou de outra natureza (mesmo que válida e legal) para evitar o desenrolar normal do referido procedimento disciplinar até que fosse, como certamente sucederá, arquivado por prescrição” o procedimento disciplinar a Filipe Froes. Não se obteve qualquer reacção.
Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Saliente-se que o PÁGINA UM tem de garantir uma “provisão” para as situações em que possa ter sentenças desfavoráveis, o que acarretará o pagamentos de custas que podem ser elevadas por cada processo perdido.
De entre as diversas entidades que atribuem bolsas, algumas associadas ao Estado, outras a entidades privadas ou personalidades, o PÁGINA UM foi “visitar” algumas para perceber se a Associação Sara Carreira “inventou a roda” e, se não – ou seja, se há mais entidades a apoiarem o estudo a jovens carenciados –, saber se escondem também os valores do apoio aos bolseiros.
A Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), associada ao Estado, é porventura a entidade que mais apoios concede, mas não tendo como critério a situação económica do candidato. Abre anualmente concursos para bolsas “de diversas tipologias”, e em todas as áreas científicas, abrange bolsas de investigação para doutoramento; de doutoramento no âmbito de protocolos e parcerias; e bolsas de curta duração.
Segundo consta no “Aviso de Abertura de Concurso” de Janeiro de 2023, “o número de bolsas a atribuir é de 1.450, das quais um máximo de 400 serão alocadas à linha de candidatura específica para planos de trabalho em entidades não académicas”. Estes números são, no entanto, indicativos, “podendo ser revistos de acordo com a disponibilidade orçamental ou em função do número de candidaturas admitidas em cada linha de financiamento”. Os bolseiros também têm direito a um “seguro de acidentes pessoais relativamente às atividades de investigação, suportado pela entidade financiadora”.
Tal como estipula o Regulamento de Bolsas de Investigação da FCT, I. P., de 16 de Dezembro de 2019, os valores mínimos mensais previstos para bolsas em Portugal vão desde os 412 euros, para bolsas de iniciação à investigação, a 1.600 euros para bolsas de investigação pós-doutoral. A estes valores acrescem ainda subsídios para actividades de formação complementar; apresentação de trabalhos em reuniões científicas; inscrição, matrícula ou propinas; e subsídio de viagem ou de instalação, quando aplicável.
As candidaturas são abertas a “cidadãos nacionais, cidadãos de outros estados-membros da União Europeia, cidadãos de estados terceiros, apátridas ou cidadãos beneficiários do estatuto de refugiado político”. Entre as condições para a elegibilidade do candidato, constam a residência permanente e habitual em Portugal, não ter já obtido o grau de doutor, nem ter beneficiado já de uma bolsa da instituição.
Já o Instituto Camões tem diferentes tipos de bolsas: Bolsas da Cooperação, Bolsas da Língua e Cultura Portuguesas, Bolsas de Governos/ Instituições estrangeiras e Bolsas PROCULTURA PALOP-TL. Destas últimas, são atribuídas “48 bolsas de estudos internacionais para licenciatura e mestrado e, em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian, 60 bolsas para residências artísticas nas áreas da Música e das Artes Cénicas, entre 2019 e 2020, a cidadãos nacionais de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste e residentes nestes países”.
As Bolsas da Cooperação abrangem os graus de licenciatura, mestrado e doutoramento. Os valores são revelados, variando desde os 380 euros de subsídios de manutenção para licenciatura até aos 870 euros para doutoramento. Acresce um subsídio de instalação e outros pequenos apoios.
Em Portugal, a Comissão Fullbright também disponibiliza bolsas que possibilitam aos estudantes e professores portugueses prosseguir os estudos, investigação, ou leccionar nos Estados Unidos, e aos estudantes e professores norte-americanos fazer o mesmo em Portugal. A oferta é vasta – algumas resultam de parcerias com outras instituições –, tanto para candidatos portugueses como estrangeiros. Para os portugueses, a Bolsa Fullbright para Mestrado, por exemplo, concede um financiamento máximo de 30 mil dólares para o primeiro ano de estudos, além de um Plano complementar de saúde e acidentes durante o período da bolsa.
Por seu turno, os bolseiros da Bolsa Fullbright para Investigação, que tem a duração de 4 a 9 meses consecutivos, têm os seguintes benefícios: “Comparticipação financeira de $1.500 dólares americanos por mês de estadia, num total mínimo de $6.000 (4 meses) e máximo de $13.500 (9 meses); atribuição de um montante de €900 para apoio na aquisição de viagem de ida e volta entre Portugal e os EUA; plano complementar de saúde e acidentes durante o período da bolsa (ASPE).; emissão dos documentos necessários ao visto J-1, e isenção do pagamento do visto”.
Também com ares do outro lado do Atlântico, a Fundação Luso-Americana, em parceria com o Centro de Estudos Portugueses da Universidade da Califórnia, em Berkeley, “atribui uma bolsa para estudantes de doutoramento ou de mestrado que tenham sido aceites na Universidade da Califórnia, em Berkeley”, abrangendo todas as áreas científicas. Nesta edição de 2023, “a Bolsa será atribuída a um estudante de doutoramento”, com um financiamento de até 60 mil dólares, repartido ao longo dos cinco anos do doutoramento, “ou a um estudante de mestrado que vai receber até um total de 26 mil dólares durante os dois anos do seu programa de estudo”.
Já a Bolsa para Junior Visiting Researcher @UC Berkeley 2023/2024 destina-se a “doutorandos portugueses ou residentes em Portugal que queiram fazer investigação para desenvolver a sua tese de doutoramento na UC Berkeley”, e o valor da bolsa totaliza 10 mil dólares, sem incluir seguro de saúde. Metade da bolsa será disponibilizada directamente pela FLAD ao bolseiro; e a outra metade é paga directamente ao Centro de Estudos Portugueses/ Instituto de Estudos Europeus da Universidade da Califórnia, Berkeley, para “cobrir os encargos com o processo inicial para a obtenção de visto, acesso à estrutura académica e serviços da Universidade”.
A Fundação Orientedisponibiliza cinco tipos diferentes de bolsas – algumas de curta duração, outras para alunos provenientes do Oriente para aprender a língua e cultura portuguesas e vice-versa, e outras para doutoramento ou investigação. O objectivo dos programas é sempre “reforçar a relação entre Portugal e o Oriente”, apoiando directamente “a formação avançada de investigadores, artistas e estudantes nas mais diversas áreas”.
A Fundação estipula o pagamento de um valor mensal “e, nos casos em que se justifique, o pagamento de uma viagem de ida e volta do local de residência ao país de estudo”.
A Embaixada da República Federal da Alemanha tem um programa de incentivo de alunos estrangeiros ao estudo de alemão, existente em 84 nações, e inclui uma “estadia de quatro semanas na República Federal da Alemanha aos melhores alunos de alemão selecionados com base num processo de seleção específico”. Em Portugal, através de um concurso, serão escolhidos dois jovens, entre os 15 e os 17 anos para beneficiar deste programa em 2023. Os premiados terão direito a aulas de alemão; excursões a diversas cidades alemãs, como Berlim ou Hamburgo; participação em eventos para jovens e eventos desportivos, e visitas a universidades, museus, teatros e outros estabelecimentos culturais.
O Serviço Alemão de Intercâmbio Académico (DAAD) também tem um leque de programas que abrange diversas áreas académicas e científicas, e que inclui bolsas para mestrados, pós-graduações ou investigação em universidades alemãs. Dependendo do programa escolhido, as bolsas podem estender-se entre 10 a 24 meses de duração, e compreendem o pagamento de propinas mensais de 934 euros e de seguros de saúde e de viagem, existindo a possibilidade de o candidato obter benefícios adicionais, dependendo das circunstâncias específicas.
A Fundação Calouste Gulbenkian, por sua vez, também disponibiliza uma oferta variada de bolsas, incluindo para formação em Artes no estrangeiro, para estudantes arménios noutros países, e bolsas de “mérito” ou de “novos talentos”.
As bolsas de mérito são atribuídas a candidatos pela primeira vez ao ensino superior, e com escassos recursos financeiros, que tenham tido uma nota de candidatura à universidade igual ou superior a 170 pontos. O financiamento é de 2.000 euros por ano lectivo, e “inclui um apoio adicional único para a realização de um período de mobilidade internacional, Erasmus ou outro programa similar oferecido por cada instituição de ensino”, também no valor de 2.000 euros.
As bolsas de “novos talentos” destinam-se, por sua vez, a estudantes de universidades portuguesas com uma média igual ou superior a 17 valores. O valor anual da bolsa varia entre os mil e os 3 mil euros, consoante diversos factores.
A Fundação Cidade de Lisboa não organizou, excepcionalmente, bolsas no último ano. No entanto, de acordo com o regulamento de 2019/2020, as bolsas são concedidas por concurso, com vista ao acesso garantido a uma universidade de Lisboa, pelo que os candidatos devem ter o 12º ano. A bolsa tem a duração de 12 meses, e o valor mensal é fixado anualmente pela Fundação.
Também a Associação Duarte Tarré atribui bolsas sociais, individualmente, “a estudantes do Ensino Superior que apresentem dificuldade financeira para prosseguir o seu percurso de formação académica. Abrangendo todo o território nacional, este programa atribui, no minímo, 25 bolsas sociais anualmente. Ativo desde 2012, este apoio aos estudantes já beneficiou mais de 150 pessoas”.
De acordo com o regulamento, “o valor mínimo das bolsas a atribuir, a alunos de licenciatura, mestrado ou doutoramento, será de 1.200 euros”, e faz-se de forma faseada. A atribuição das bolsas “não é incompatível com a atribuição de outras bolsas ou prémios de mérito de outras instituições, mas terão de ser comunicadas à associação, sob pena de cancelamento.
Também a ANA – Aeroportos de Portugal concedeu bolsas para o Ensino Superior, destinadas a alunos do 12º ano, com até 20 anos de idade, “que tenham tido bom aproveitamento (média igual ou superior a 14 valores) e que residam, e frequentem uma escola pública, num concelho limítrofe de um aeroporto” desta empresa. Além disso, o rendimento per capita do respetivo agregado familiar não deve ser superior ao salário mínimo nacional.
O Programa Bolsas de Estudo ANA Solidária foi criado em 2012 para atribuir 12 bolsas, no valor de 3000 euros anuais, pagos em 10 prestações mensais.
A Fundação da Caixa Agrícola do Vale do Távora e do Douro atribui Bolsas de Estudo, por mérito e por carência económica, aos estudantes universitários dos concelhos do seu âmbito de acção. Nas bolsas atribuídas por carência económica, o valor das propinas é integralmente coberto. Por sua vez, as bolsas de mérito – para os alunos com média igual ou superior a 15 valores –, compreendem um prémio habitualmente no valor de 600 euros.
Ainda de acordo com o seu regulamento, “compete ao Conselho de Administração da Fundação da Caixa Agrícola proceder à selecção dos candidatos a quem será atribuída a bolsa, de acordo com critérios objectivos e no respeito dos requisitos fixados”.
A Fundação António Aleixo concede Bolsas de Estudo a alunos carenciados, que preencham os seguintes requisitos: “não ter idade superior a 25 anos à data da 1.ª candidatura para Licenciaturas, Mestrados e Mestrados Integrados; ser residente há mais de 5 anos no concelho de Loulé; ser natural do concelho de Loulé, ou filho de naturais do concelho de Loulé, residindo fora deste há menos de 3 anos”.
O número e o valor das bolsas a atribuir é fixado anualmente pela Direcção da Associação Poeta Aleixo, e existem três modalidades, nomeadamente os escalões A, B e C, consoante variam os montantes.
De acordo com o seu regulamento, a Fundação Millennium BCP atribui, anualmente, bolsas de estudos para mestrados, “a cidadãos provenientes de países africanos de expressão portuguesa e Timor, com os quais a Fundação e as entidades ligadas ao Grupo Banco Comercial Português (Millennium bcp) estabeleçam especiais relações de cooperação”.
Os bolseiros têm direito ao reembolso de uma determinada quantia das propinas, mas o apoio financeiro definido nunca poderá “ser superior ao vencimento base de funcionário bancário de nível 1”.
A Fundação Eugénio de Almeida atribui bolsas em vários programas diferentes, incluindo de Alojamento, as bolsas “Eugénio Almeida”, e de Mérito. As Bolsas Eugénio Almeida custeiam “as propinas de alunos da Universidade de Évora (UE) de baixo rendimento económico e com aproveitamento escolar”. As Bolsas de Alojamento, por exemplo, têm como objectivo ajudar “a suportar o custo das despesas de alojamento de estudantes do Ensino Superior, nos diferentes ciclos, a estudar em qualquer instituição de ensino pública ou privada, em território nacional”, e os destinatários são os “estudantes do ensino superior, com residência oficial na região do Alentejo (Alentejo Central, Alto Alentejo, Baixo Alentejo e Alentejo Litoral)”
A Fundação Rotária Portuguesa atribui bolsas de estudo sobretudo a jovens com dificuldades financeiras, privilegiando “estudantes do ensino secundário com bom aproveitamento escolar ou estudantes do ensino técnico-profissional se as aptidões o aconselharem”.
As bolsas “resultam de donativos efectuados à Fundação por empresas, instituições ou pessoas singulares com essa finalidade”, e têm o valor de 500 euros para o ensino secundário, e 750 euros para o ensino superior.
A Fundação Caixa Agrícola do Noroeste atribuiu, em 2016, bolsas de estudo “no valor de 1000 euros, a alunos do distrito de Viana do Castelo e do concelho de Barcelos”. As bolsas foram entregues por mérito ou carência económica a alunos com uma média igual ou superior a 15 valores.
Por fim, a Fundação José Nevestem em curso um ambicioso programa de bolsas de estudos “baseado no modelo Income Share Agreement”, ou seja, consiste sobretudo num sistema de empréstimo para estudar, incluindo o pagamento de propinas, sendo que o reembolso do valor investido apenas será reembolsado quando o rendimento do bolseiro ficar acima de um determinado patamar. É, por isso, um modelo ideal para estudantes carenciados.
Ainda é tudo muito recente, mas Rabo de Peixe (ou Turn of the tide, em inglês) fez disparar a notoriedade da vila situada na ilha de São Miguel, nos Açores. O sucesso da série da Netflix colocou a vila piscatória, mais conhecida pela sua pobreza, debaixo dos holofotes mediáticos tanto na imprensa nacional como internacional. A onda de publicidade em torno da região fez nascer perspectivas de atracção de mais turistas e investidores, nomeadamente para o mercado imobiliário. Por agora, os efeitos não são ainda visíveis. Mas as expectativas, agora que se anunciou a segunda temporada, são grandes, aproveitando o estrelato mediático da região. Talvez Rabo de Peixe se venha a tornar tão icónico como qualquer um dos 12 antigos cenários de filmes que o PÁGINA UM recorda.
Ainda não deu à costa, mas o mercado imobiliário na vila de Rabo de Peixe, nos Açores, agora famosa internacionalmente devido à série portuguesa que faz sensação na plataforma Netflix, espera uma mudança de maré, e que seja alta.
Para já, à tona há muitas expectativas e a esperança de um aumento na procura turística e também na venda de imóveis nesta vila piscatória de São Miguel, uma das mais pobres do país. Em 2015 era a freguesia portuguesa com mais pessoas a receber Rendimento Social de Inserção (RSI).
O sucesso da série “Rabo de Peixe” (Turn of the tide, em inglês) não é apenas nacional. A cobertura mediática também tem sido internacional, por via das boas classificações em sites da especialidade.
Com os holofotes colocados na freguesia onde residem cerca de 8.800 habitantes, é natural que as expectativas de que a série possa atrair turistas e investidores para a ilha seja vista como natural.
Para já, na procura turística por alojamento local, mantém-se a situação prévia à estreia da série. O Verão está lotado em praticamente todos os alojamentos contactados pelo PÁGINA UM na plataforma Airbnb, mas não é nada surpreendente: a esmagadora maioria das reservas já estavam asseguradas antes mesmo do lançamento da série. Para o Outono, ainda há muitos alojamentos disponíveis, mas os preços rondam os valores praticados em Lisboa.
Em termos do mercado imobiliário, a situação é ainda de normalidade. “A procura [por casas] tem sido relativamente a mesma, não houve um pico acentuado”, diz João Lima, agente imobiliário da Remax naquela vila piscatória, que alberga o maior porto de pesca da ilha de São Miguel.
Também uma porta-voz na imobiliária ERA apontou ao PÁGINA UM no mesmo sentido: “não temos dados, de momento, que sustentem uma maior procura de casas nos Açores que possamos atribuir à série da Netflix”.
Mas há muitas expectativas.
“De momento, está tudo dentro da normalidade, mas ainda é muito recente, e acredito que nos próximos meses a série irá contribuir para uma maior procura, não só em Rabo de Peixe, mas na Ilha de São Miguel”, lançou João Lima.
De facto, a procissão ainda vai no adro. A série estreou há cerca de um mês, 26 de Maio, tem sido a mais vista na Netflix em Portugal. A nível mundial, chegou ao Top 10 do ranking de visualizações da plataforma de streaming, atingindo a sétima posição das séries mais vistas em língua não-inglesa. Além disso, atingiu o Top 10 em 15 países de quatro continentes.
A promoção internacional do nome da pequena vila enfrenta, porém, uma corrente que tem levado a um arrefecimento do mercado imobiliário a nível nacional.
O mercado ainda continua “quente”, com os preços em níveis historicamente elevados, mas tem-se observado um abrandamento, tanto na subida dos preços, como no número de casas vendidas e créditos à habitação concedidos.
Na avaliação que os bancos fazem das casas no âmbito da concessão de crédito à habitação, registou-se em Abril uma queda de 34,3% no número de avaliações efectuadas, comparando com o mesmo mês do ano passado, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE).
O valor mediano de avaliação bancária na habitação subiu oito euros face a Março, para o valor mais alto desde pelo menos 2011: nos 1.491 euros por metro quadrado. O aumento em média mensal foi de 0,5% enquanto a subida homóloga foi de 10%, a mais baixa do último ano. Foi na região autónoma dos Açores que se registou a menor subida homóloga: 1,9%.
De facto, ainda segundo o INE, os preços das casas desaceleraram nos primeiros três meses deste ano, com o índice de preços na habitação a aumentar 8,7% em termos homólogos, 2,6 pontos percentuais abaixo do registado no trimestre anterior.
A venda de casas sofreu uma queda trimestral de 16% e, em termos homólogos, a descida chegou aos 20,8%. Nos Açores, a queda na venda de casas foi de 23% no primeiro trimestre de 17% em comparação com igual período de 2022. Em todo o arquipélago, no primeiro trimestre, foram vendidas 599 casas num montante de 87 milhões de euros. Estes valores representam, respectivamente, 1,7% e 1,3% das vendas efectuadas em todo o país.
Actualmente, na plataforma de promoção de imóveis Idealista, surgem à venda 44 casas em Rabo de Peixe. O preço médio em todo o concelho da Ribeira Grande ascende aos 1.031 euros por metro quadrado, o que representa um aumento de 13% face ao valor registado há um ano na mesma plataforma. Em Lisboa, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE) o valor médio das casas era de 3.872 euros por metro quadrado, no final de 2022.
Série no topo
Criada pelo açoreano Augusto Fraga, Rabo de Peixe foi rodada em diversos locais, incluindo na freguesia que dá o nome à série.
O enredo baseia-se num caso real que remonta a 2001, quando deram à costa daquela vila piscatória fardos de cocaína, na sequência de um naufrágio de uma embarcação que se dirigia para Espanha transportando meia tonelada daquele estupefaciente.
Produzida pela Ukbar Filmes, a série, além de ser líder em visualizações na Netflix em Portugal, Rabo de Peixe chegou a série mais vista em muitos outros países. A plataforma anunciou, entretanto, que vai haver segunda temporada.
Também tem recebido excelentes classificações, nomeadamente no site IMDb, onde tem um rating de 7,7 em 10. No Rotten Tomatoes, a série portuguesa cativou uma classificação de 4.5 em 5. A crítica do PÁGINA UM pode ser lida aqui.
Com tão boa recepção e impacto mediático, e com segunda temporada à vista, antecipam-se possíveis mudanças na região, tanto em termos turísticos como ao nível da atracção de investidores. E a bela vila, outrora conhecida como uma das zonas mais pobres da Europa, ganhou agora uma fama mais glamorosa. Como num conto de fadas, a “abóbora” transformou-se numa linda carruagem. A expectativa é que a maré traga mais visitantes (e dinheiro) à (naturalmente) bela região.
A série “Rabo de Peixe”, disponível na plataforma Netflix, trouxe a vila piscatória da Ilha de São Miguel, nos Açores, para o estrelato. Os diversos locais de filmagem da popular série portuguesa arriscam agora a tornar-se famosos. Não será caso único. Em todo o Mundo, vários locais de filmagem de filmes e séries saltaram para a fama e hoje constituem um ponto de atracção turística, mesmo passado décadas de os holofotes do set se terem apagado. O PÁGINA UM mostra-lhe 12 cenários construídos ou já existentes que se tornaram locais de peregrinação.
O cinema e a televisão são poderosos e influentes veículos de conteúdos. Prova disso é a capacidade que têm de suscitar nos espectadores uma curiosidade acerca de locais até então absolutamente desconhecidos ou pouco falados. A nova série portuguesa da Netflix, “Rabo de Peixe”, é agora mais uma evidência disso: com um retumbante sucesso que a colocou no topo do ranking daquela plafatorma de streaming, conseguiu pôr a pequena e pacata vila piscatória açoreana “debaixo dos holofotes”.
No entanto, para além desta produção gravada na Ilha de São Miguel, muitos são os exemplos deste fenómeno em que localidades são subitamente catapultadas para o centro das atenções por servirem de cenário a filmes ou séries televisivas.
Por vezes, algumas até se transformam em pontos turísticos “imperdíveis”, atraindo milhares de estrangeiros oriundos de todo o mundo. Alguns, que já tinham uma considerável afluência de turistas, viram a quantidade de visitantes aumentar ainda mais. Outros ainda, obrigaram à construção de sets que ainda hoje, passados anos do seu lançamento, recebem ‘enchentes’ de turistas. Aconteceu com O Popeye, A guerra das estrelas, Harry Potter, e até os Monty Phyton.
O PÁGINA UM destaca 12 desses locais (agora ainda mais) turísticos.
Matamata, Nova Zelândia
A verdejante Nova Zelândia não precisaria de incentivos adicionais ao turismo, mas a popularidade que a trilogia O Senhor dos Anéis alcançou fez engrossar a percentagem de turistas que se deslocavam àquele ponto do globo. Em 2012 – mais de uma década após o fim da trilogia –, um responsável da Tourism New Zealand, uma empresa que promove o turismo naquele país, revelou à Forbes que se tinha registado um aumento de 50% de visitantes desde o lançamento do primeiro filme, em 2001. Com efeito, esta sequela foi pioneira no fenómeno da corrida aos locais e regiões que servem de palco para produções televisivas.
Hobbiton constitui uma das principais atracções, e esta vila dos icónicos hobbits situa-se, na vida real, na cidade de Matamata. É lá que se encontra o Hobbiton Movie Set, que serviu de palco para as gravações de ambas as trilogias cujo “pai” foi o escritor J. R. R. Tolkien: O Senhor dos Anéis e Hobbit. Ainda em Dezembro passado, em comemoração do décimo aniversário de Hobbit: Uma viagem inesperada, a plataforma Airbnb anunciou que os visitantes passariam a ter também a possibilidade de pernoitar nas pequenas casas que serviram de cenário às filmagens.
Castelo de Alnwick, Inglaterra
É impossível falar de sequelas de sucesso sem mencionar Harry Potter, e o impacto do seu sucesso colossal no número de visitantes que rumaram a Inglaterra ou à Escócia para conhecer os locais de filmagem também foi significativo. Entre castelos, estações de comboios e catedrais, são vários os ‘cenários’ que através do grande ecrã ficaram na memória dos fãs e espectadores em todo o mundo, e que todos os anos continuam a percorrer os principais locais onde se protagonizaram vários takes da saga.
A aldeia fictícia de Hogsmeade – que na sequela, é a única exclusivamente habitada por feiticeiros – é um destes pontos, recriada nos estúdios de filmagem da Warner Bros, em Leavesden, 20 quilómetros a norte de Londres, onde se pode visitar a Studio Tour London – The Making of Harry Potter.
Por seu turno, a plataforma 9¾ da estação de King’s Cross, em Londres, é uma paragem obrigatória para quem visita a cidade pela primeira vez. Na mítica plataforma, os turistas podem reproduzir as cenas onde os aprendizes de feiticeiros desapareciam ao atravessar as paredes do terminal com os seus carrinhos-de-mão. Também o viaduto de Glenfinnan, na Escócia, é outro conhecido cenário emblemático da famosa saga, que ainda faz as delícias de muitos turistas e fãs de Harry Potter.
O castelo de Alnwick, em Inglaterra, também teve um “papel” importante na longa história de Harry Potter, tendo aparecido nos primeiros dois filmes da sequela. Foi lá que, em A pedra filosofal, os aspirantes a feiticeiros, “montados” nas suas vassouras mágicas, aprenderam a voar pela primeira vez. O castelo serviu também para as gravações da conhecida série britânica Downton Abbey.
Baía de Wallilabou, São Vicente e Granadinas (Caraíbas)
O filme Pirata das Caraíbas: A Maldição do Pérola Negra, que em 2003 eternizou a personagem do pirata Jack Sparrow, interpretado por Johnny Depp, também deu visibilidade a algumas localidades de areia branca e águas azuis cristalinas por onde o inigualável personagem se aventurou. Uma delas é a baía de Wallilabou, onde se construiu a cidade-cenário Port Royal, para as filmagens da famosa saga.
Port Royal é uma cidade real situada na Jamaica, que constituiu historicamente um dos mais importantes pontos comerciais da Marinha Real Britânica, até um sismo em 1692 ter afundado grande parte do território. Conhecida até por ser, no século XVII, “a cidade mais malvada do mundo”, tornou-se, de facto, um efervescente centro de prostituição, piratas e “malfeitores”. No entanto, para efeitos das gravações de Piratas das Caraíbas, o país escolhido não foi a Jamaica, mas São Vicente e Granadinas.
Aldeia do Popeye, Malta
O carismático marinheiro Popeye – cujo centenário se celebrará em 2029 –, embora seja um cartoon ficcional que habita sobretudo o imaginário colectivo, teve uma versão em “carne e osso” através do musical homónimo, de 1980, em que o actor Robin Williams deu vida ao personagem.
Malta foi o país escolhido para as gravações da produção cinematográfica, onde se criou, na baía Anchor, o cenário denominado Popeye Village: uma aldeia pitoresca repleta de casinhas de madeira. Ainda hoje uma pujante atracção turística, os visitantes que por lá passam podem usufruir de passeios de barco, espectáculos e ainda ‘conhecer’ as personagens do filme.
Escadarias Bronx, Nova Iorque
O Joker, lançado em 2019 e interpretado por Joaquin Phoenix – e pelo qual o actor viria a ganhar o Óscar de Melhor Actor em 2020 –, foi um sucesso de bilheteiras. Não será, por isso, surpreendente que uma singela escadaria, na confluência da West Street 167 com a Anderson Avenue, localizada no conhecido bairro do Bronx, em Nova Iorque, tenha registado um elevado acréscimo de curiosos a querer pisar os mesmos degraus que o temível vilão usou na célebre “dança” vitoriosa. O cenário que, aliás, também deu origem a muitos ‘memes’, é hoje um ponto de atracção para fotografias.
Dubrovnik, Croácia
A Guerra dos Tronos, transmitida na plataforma HBO, tem certamente um lugar de destaque na história das séries televisivas. E o seu estrondoso sucesso faz com que conste na lista de produções audiovisuais que mobilizaram os espectadores a conhecer os locais de filmagem com os seus próprios olhos.
Desde 2011 até 2019, as suas temporadas foram gravadas em diferentes localidades e países, nomeadamente a Irlanda, Croácia, Malta, Islândia e Espanha. Muitos dos fãs da série rumaram a estas regiões, aumentando consideravelmente a sua afluência turística – por vezes, de forma “dramática”. Vários destinos se poderiam destacar, mas um dos que mais turistas atraiu foi Dubrovnik, a cidade mais visitada na Croácia, e que ainda hoje faz manchetes pela quantidade de turistas que recebe, e que se deslocam até à chamada “Pérola do Adriático” para ver por si mesmos o verdadeiro cenário de “King’s Landing”.
Maya Bay, Tailândia
Lançado no início de 2000, o filme A Praia, protagonizado por Leonardo DiCaprio, fez aumentar a procura pelas paradisíacas paisagens tailandesas. Em particular, por Maya Bay, a praia que serviu de palco às filmagens, e que se tornou desde então uma das atracções turísticas mais proeminentes na Tailândia. E, de facto, a projecção mundial que este destino adquiriu com o filme não esmoreceu com o passar dos anos.
Na verdade, o número de turistas atingiu proporções tais – chegou a atingir os 5 mil por dia, a par com 200 barcos –, que o local teve que “fechar as portas” em 2018 devido aos danos ambientais causados pelo excesso de visitantes. Na altura, as autoridades tailandesas anunciaram que a Maya Bay, localizada na ilha Ko Phi Phi Leh, fecharia por tempo indeterminado para que pudesse recuperar do impacto cumulativo. Apenas em Janeiro do ano passado é que a famosa praia voltou a reabrir, mas, por um curto período, voltou a fechar novamente entre Julho e Setembro.
Ilha de Skellig Michael, Irlanda
A íngreme e rochosa ilha de Skellig Michael, na Irlanda, foi classificada pela UNESCO Património Mundial em 1996, mas a saga A Guerra das Estrelas elevou o seu protagonismo a um novo patamar ao escolhê-la como cenário para as gravações.
Com um impressionante mosteiro que se acredita datar do século VI, a montanhosa ilha irlandesa, cujas condições de acesso e permanência são bastante inóspitas – só pode, inclusivamente, ser visitada durante os meses de Verão – serviu de cenário para a sétima e a oitava parte da sequela: O despertar da força e O último Jedi. Em A Guerra das Estrelas, o remoto lugar representou o planeta Ahch-To.
Senoia, Georgia (Estados Unidos)
Em The Walking Dead, a cidade ficcional Woodbury, existe na vida real, mas não foi, no entanto, na Woodbury “verdadeira” o local onde se filmaram muitos takes da famosa série, mas sim Senoia, uma pequena cidade que fica também no estado da Georgia – o que causou um aumento vertiginoso de turistas na zona.
Esta localidade já serviu de cenário para outras produções audiovisuais, mas ganhou um enorme protagonismo com esta sequela sobre os assustadores zombies, e é graças a ela que recebe muitos turistas, que lá visitam os mais conhecidos sets de filmagem que viram no ecrã.
Hotel Park Hyatt, Tóquio (Japão)
Também a visibilidade de alguns edifícios e hotéis de luxo atingiu os píncaros, depois de lá se terem filmado êxitos cinematográficos. Foi esse o impacto que o filme O amor é um lugar estranho, (Lost in translation, no original), de 2003, teve no hotel Park Hyatt Tokyo, localizado na capital nipónica. A realizadora Sofia Coppola escolheu-o para cenário para as gravações, depois de ter ficado impressionada com a estrutura.
A marcante cena em que os protagonistas, Bill Murray e Scarlett Johansson, se conhecem, foi filmada no “New York Bar”, que, com uma vista panorâmica e privilegiada sobre a cidade de Tóquio, fica no último piso do hotel. Uma das suas suítes também “apareceu” neste filme, que chegou até a receber o Óscar de Melhor Argumento Original.
O hotel, que fica no cimo da “metálica” infraestrutura Shinjuku Park Tower, assumiu, de facto, uma importância comparável ao de uma personagem. Coppola descobriu o local em 1999, após uma deslocação que fez para promover o filme As Virgens suicidas.
Hotel Del Coronado, Califórnia (Estados Unidos)
Outro hotel que ganhou destaque graças à Sétima Arte foi o Hotel Del Coronado, situado no Sul da Califórnia. Neste caso, a “culpa” foi da comédia Some Like It Hot, de 1959, com uma das loiras mais icónicas do Mundo, a actriz Marilyn Monroe. O filme obteve seis nomeações pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, mas ganhou apenas o Óscar de Melhor Guarda-Roupa. De qualquer maneira, certamente que as vestimentas dos personagens foram realçadas pelo “pano de fundo” representado por este hotel de San Diego.
A acção desenrolava-se em 1929, e talvez por isso a estética de Del Coronado, e a sua “arquitectura victoriana”, tenha servido na perfeição para dar vida ao argumento. Contudo, apenas o frontispício do hotel apareceu nas filmagens, apesar de os cenários utilizados pela produção para os takes gravados em interior serem extremamente semelhantes ao Del Coronado. Segundo o site oficial do hotel, quem o visita, mostra-se incrédulo quando descobre que apenas a parte externa do charmoso hotel foi usada para o filme.
Castelo de Doune, Escócia
Os britânicos Monty Python têm muitos méritos, e o humor e boa disposição que trouxeram a muitos espectadores é com certeza um deles. No entanto, entre gargalhadas, o filme Monty Python e o Cálice Sagrado, de 1975, teve ainda um outro efeito: tornou o Castelo de Doune, situado no coração da Escócia, um alvo de atenção e curiosidade.
Embora os castelos de Stalker e Kidwelly também apareçam no filme, que satiriza a lenda da busca do Rei Artur pelo Santo Graal, as gravações utilizaram sobretudo o Doune, aproveitando os seus diferentes ângulos.
Anos mais tarde, Terry Jones, um dos actores principais, chegou a revelar que inicialmente a ideia era filmar também noutros castelos escoceses, mas a produção não conseguiu obter a autorização do Departamento do Ambiente do país. Para além de Monty Python, este castelo escocês que data do século XIV “participou” ainda nas filmagens de A Guerra dos Tronos e da série Outlander.