A família Balsemão está a pressionar os accionistas minoritários da Impreger – a empresa que, detendo 50,31% das acções, controla a Impresa – a venderem-lhe as suas participações antes da entrada da MediaForEurope (MFE), o grupo italiano ligado à família Berlusconi que pretende dominar a SIC e o Expresso até ao final do ano.
Numa ‘ofensiva’ que envolve antigos aliados e amigos de Pinto Balsemão – entre os quais a famílias Boullosa (11,98% da Impreger) e quatro ramos da família Ruela Ramos (herdeiros do antigo director do Diário de Lisboa, que no conjunto detêm 14,98%) e até António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, que mantém uma pequena participação (0,07%) –, o argumento apresentado pelo actual CEO da Impresa, Francisco Pedro Balsemão, é o da “salvação do grupo” e permitir algo retorno ao investimento numa altura aflitiva. A ideia transmitida é de que só uma posição accionista unificada da Impreger permitirá concluir com sucesso as negociações em curso com a MFE.

Contudo, apurou o PÁGINA UM, o verdadeiro objectivo poderá não ser apenas viabilizar a entrada da MFE, mas sim garantir que a família Balsemão ainda permaneça na estrutura accionista da Impresa – ainda que numa posição minoritária – mesmo depois da entrada do grupo italiano.
Na prática, a compra das participações dos minoritários serviria para a família Balsemão reconcentrar o capital da Impreger na esfera da Balseger – a holding familiar de Francisco Pinto Balsemão que controla, actualmente, 71,41% da Impreger e, por essa via, domina (ainda) a Impresa. Tal permitiria aos Balsemão negociar uma venda parcial à MFE, mas dando-lhe mais de dois terços do controlo da Impreger, para não só tomar o domínio da Impresa (e da SIC e Expresso) como também ter a capacidade de alterar o contrato social.
A confirmar-se, este movimento, a solução mostrar-se-ia uma saída ‘honrosa’ da família Balsemão do controlo da Impresa. Mas seria também mais uma ‘facada nas costas’ da segunda geração da família Balsemão aos accionistas minoritários da Impreger, que desde a entrada da Impresa em bolsa jamais obtiveram quaisquer dividendos, nem sequer a possibilidade de integrarem o Conselho de Administração da empresa.

Conforme o PÁGINA UM revelou há três semanas, só nos últimos 10 anos a família Balsemão arrecadou 6,6 milhões de euros em salários e pensões. Todos os outros accionistas da Impreger – que, em conjunto, detêm 28,59% do capital, equivalentes a 14,38% da Impresa – nunca receberam um tostão.
Os conflitos entre a família Balsemão e os sócios minoritários da Impresa nunca correram bem para os segundos. O caso mais conhecido opôs Nuno Vasconcellos, da Ongoing, a Francisco Pinto Balsemão, culminando com a saída do primeiro da Impresa, após vender em 2014 a sua participação de 23,13% por 51 milhões de euros. Nessa altura, a venda foi concretizada a 1,3 euros por acção; na passada sexta-feira, a cotação fechou em apenas 0,126 euros.
Há 11 anos, Pinto Balsemão afirmou que “esta saída [da Ongoing] coloca um ponto final numa estratégia hostil de tentativa de controlo de um grupo de comunicação livre e independente”. Na verdade, a família Balsemão nunca apreciou dividir a gestão com outros accionistas, conseguindo mandar no grupo de media como se tivesse 100%, apesar de deter 35,93% das acçoes da Impresa.

Mas, neste momento, no contexto do negócio com a MFE, as conversações entre a família Balsemão e os restantes accionistas minoritários da Impreger não estão a ser fáceis. Desde o afastamento do chairman Francisco Pinto Balsemão, por motivos de saúde, a gestão do grupo pelo seu filho, Francisco Pedro, tem sido duramente criticada – e mais ainda a sua postura. O PÁGINA UM soube que alguns accionistas da Impreger apenas tomaram conhecimento das conversações com a MFE através das notícias publicadas na imprensa.
A desconfiança é profunda – algo que já se revelara na Assembleia-Geral da Impreger realizada em Maio passado. De acordo com a acta a que o PÁGINA UM teve acesso, os accionistas minoritários abstiveram-se no voto de louvor à administração, algo inédito, confirmando o clima de tensão. O representante da família Boullosa lamentou mesmo que “a relação próxima de outrora entre os accionistas, quase como irmãos, tenha dado lugar a uma maior dispersão”. Apesar das manifestações de vontade em melhorar a comunicação, a família Balsemão boicotou nessa assembleia – bastante tensa – a inclusão de quaisquer representantes dos accionistas minoritários, tanto na Impreger como na Impresa.
Numa análise estratégica, esta tentativa da família Balsemão em afastar de imediato os seus parceiros minoritários na Impreger, denuncia, em certa medida, a intenção de manter um pé na Impresa. Com efeito, caso o propósito da família Balsemão fosse apenas ceder o controlo (e as dívidas) da Impresa à MFE, bastaria vender-lhes directamente a Balseger, que, com 71,4% da Impreger, já garantiria aos italianos a maioria efectiva da Impresa.

E depois ficaria ao critério da MFE a aquisição das participações dos restantes 28,59% da Impreger dos accionistas maioritários. Mas existem vantagens da família Balsemão em ‘passar a perna’ aos antigos parceiros da Impreger, porque, mantendo ou não uma posição com a entrada do grupo italiano, sempre conseguirão, desse modo, melhores condições.
Uma outra hipótese que se coloca é a Balseger entregar a totalidade da Impreger à MFE mas com uma cláusula que, depois da OPA à Impresa, permitisse a separação da Impresa Publishing, a empresa que gere o Expresso e o Blitz, e a sua entrega em exclusivo à família Balsemão. Ao contrário da holding Impresa, que está em situação aflitiva, a subsidiária Impresa Publishing está de boa saúde: no ano passado registou 1,46 milhões de euros de lucro e contabiliza resultados positivos no mais recente quinquénio de cerca de 8,8 milhões de euros. Essa hipótese mostra-se mais plausível atendendo que o ‘core business’ da MFE não é a imprensa escrita.
Em todo o caso, conforme apurou o PÁGINA UM, a Balseger já terá proposto às famílias dos sócios minoritários da Impreger um preço próximo da actual cotação bolsista da Impresa, ou seja, apenas 0,126 euros por acção, o que avalia o conjunto das participações em cerca de três milhões de euros. O valor nominal de cada acção é, porém, de 0,50 euros, o que corresponderia a um valor teórico de 12 milhões. Embora o valor nominal seja apenas uma referência contabilística, sobretudo numa empresa fortemente endividada, a discrepância evidencia a baixa valorização atribuída às participações minoritárias – ainda mais tendo em conta o interesse manifestado pela MFE.

Embora não tenha sido possível conhecer a posição dos minoritários da Impreger, a opção poderá ser a de negociar directamente com o grupo italiano, que estará interessado num clean deal (ou seja, numa operação simplificada e sem conflitos societários), ou, no limite, manter a posição, embora isso implique abdicar de qualquer controlo e sujeitar-se a alterações nas políticas de dividendos, retenção de lucros ou fusões que diluam ainda mais a sua influência.
Certo é que, se os minoritários venderem directamente à MFE, receberão um preço justo, e eventualmente com um prémio; se venderem à Balseger, poderão estar apenas a financiar a permanência da família Balsemão na empresa ou conseguir que fique com o jornal Expresso, que é a ‘menina dos olhos’ de Pinto Balsemão.