Sem papel, mas com cada vez mais ‘papel’ a escorrer dos cofres públicos. Enquanto em diversos países se começa a repensar o modelo de ensino para regressar às origens, como sucede na Suécia e na Finlândia, em Portugal a adopção de manuais digitais está em incremento. E o vencedor é o do costume: novo ano lectivo, novo Euromilhões nos “bolsos” da Porto Editora.
A conhecida casa editorial, que sempre teve uma forte presença no livro escolar, detém um quase monopólio no sector dos manuais digitais e só este ano já facturou 11,3 milhões de euros em 71 contratos públicos. Grande partes destes contratos foi por ajuste directo, mas abrangendo tanto licenças de software como material informático,

Mas a factura será porventura maior, à semelhança de anos anteriores, uma vez que alguns contratos adjudicados podem ainda não ser públicos e não constarem do Portal Base, onde ficam registados os contratos feitos por entidades públicas.
Este ano, o contrato de valor mais elevado foi adjudicado pela Escola Secundária Francisco Franco, no Funchal. O contrato foi assinado no dia 12 de Junho na sequência de um concurso público e custou aos contribuintes o valor de 1.129.313,60 euros.
Este contrato abrange não só a contratação de licenças de manuais digitais para o ensino secundário, mas também 700 computadores portáteis e respectivas bolsas de protecção para serem entregues aos alunos que irão frequentar o 10.º ano este ano lectivo. O custo por aluno, entre portáteis e licenças, fica em 907,52 euros.
Para os alunos do 11º ano, o custo unitário, apenas pela aquisição de licenças de manuais digitais, de software e de acesso a uma plataforma de conteúdos educativos sai por 416,64 euros. Para o 12º ano, o valor sobe para 514,54 euros, para o mesmo tipo de produtos.

Mas a editora, controlada e presidida por Rosalia Fernandes Teixeira, ainda deverá facturar mais este ano, à semelhança do que sucedeu em anos anteriores.
Em 2023, a Porto Editora facturou 12.465.505 euros em 115 contratos públicos. No ano passado, apesar de ter efectuado menos dois contratos — 113 — facturou 15.452.192 euros, segundo uma análise do PÁGINA UM aos contratos publicados no Portal Base.
No total, nos últimos três anos, a editora obteve receitas de 39,2 milhões de euros na venda de manuais digitais, computadores portáteis e licenças de software a escolas públicas.

O que é certo é que a empresa detém um quase monopólio neste tipo de contratos públicos. Numa breve pesquisa no Portal Base com as palavras “manuais escolares digitais”, todos os contratos que se encontram foram adjudicados à Porto Editora.
Dos 71 contratos públicos efectuados com a editora este ano, mais de metade — 44 — foram adjudicados por ajuste directo.
Não se sabe este é um negócio com futuro já que há uma crescente contestação ao uso de manuais escolares digitais e alguns países têm mesmo vindo a recuar na adopção desta ferramenta de ensino.

Até agora, pelo menos nos contratos adjudicados por escolas públicas à Porto Editora, não se observa um recuo na utilização dos manuais digitais, ainda que como complemento aos manuais em papel.
Por outro lado, já se perspectiva a eventual entrada de inteligência artificial no ensino, e estudantes já recorrem a este tipo de ferramenta, pelo que travar o avanço da digitalização de conteúdos educativos poderá ser um objectivo desafiante. Mas irão sempre ser necessários computadores, pelo que, mesmo que os manuais digitais “vão à vida”, a Porto Editora terá sempre licenças de software e portáteis para vender às escolas públicas.