Vivemos num mundo de contradições: a Educação é universal, as sociedades nunca estiveram tão bem preparadas, o Ensino Superior “democratizou-se”, mas, no entanto, as falácias e os sofismas prosperam.
A desinformação sobre temas económicos e de mercados financeiros nunca foi tão gritante. Aos nossos olhos, uma elite de banqueiros centrais, burocratas e políticos vendem, todos os dias, patranhas sem qualquer contraditório. A sociedade acredita acriticamente em tudo o que lhe dizem, como se fossem dogmas; eles são os novos presbíteros que nos conduzem à salvação.
Os bancos deixaram de ser bancos. Em lugar de entidades que procuram atrair as nossas poupanças, protegendo ao mesmo tempo a nossa privacidade, são agora gigantescas máquinas de burocratas, directamente ligadas à autoridade tributária. A maioria das suas receitas provém da especulação com títulos de dívida dos Governos, em lugar da tradicional intermediação financeira.
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Enquanto isso, dizem eles, por exemplo, que as Criptomoedas apenas servem para lavar dinheiro e consomem muita energia. Mas “esquecem”, ao mesmo tempo, de esclarecer que, afinal, com as Criptomoedas todas as transacções são rastreáveis – ao contrário do dinheiro físico – e que o consumo de energia é essencial para um processo de mineração sério, em lugar de um simples apertar do “botão”, que é como os bancos centrais produzem dinheiro.
Recordemos o charlatão Alves dos Reis, que imprimia notas iguais às do Banco de Portugal, tendo levado, durante algum tempo, uma vida de luxo em Lisboa. Após ter sido descoberto, foi condenado a 20 anos de prisão, dos quais 12 em degredo.
Contudo, agora, os bancos centrais imprimem moeda sem limites – como se viu, em particular, nos anos de 2020 e 2021 –, algo não possível com o Bitcoin. Mas a “culpa” da inflação, dizem, é da guerra na Ucrânia.
Dizem-nos também que estão a combater a inflação com juros próximos de 0% e subidas de 0,5%. E com isto, enfim, a inflação já se aproxima dos dois dígitos – ou está mesmo acima em alguns países da União Europeia. Em paralelo, diabolizam as StableCoins – exigindo que sejam ainda mais reguladas –, quando se sabe que estas são usadas em projectos DeFi (finanças descentralizadas) remunerando acima da taxa de inflação.
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Há dois anos, os “peritos económicos” informavam-nos que a deflação era algo diabólico, trágico mesmo.
Que argumentos eram utilizados para tal conclusão? As pessoas, quando tal acontece, atrasam o seu consumo, esperando por preços se tornem ainda mais baixos no futuro. Caso tal aconteça, a contracção económica está ao virar da esquina. Funestíssimo! A razão para a loucura monetária que estamos a viver.
Há muitos anos, quando os computadores não paravam de descer de preço, algum consumidor foi tentado a não comprar algo que necessitava de imediato? Alguém no seu perfeito juízo deixa de comprar um bem ou um serviço porque agora custa 100 e daqui a um ano 95?
Não será isto, afinal, beneficiar os pobres e desfavorecidos, pois o poder aquisitivo da moeda que têm no bolso incrementa? Não é a subida da produtividade, fruto da acumulação e inovação capitalista, que pode fazer resultar em preços mais baixos para todos? Verdades que desapareceram!
Na Constituição Portuguesa diz-se também que “a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte”. Isto é verdade?
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Vejamos. Os bancos podem utilizar de forma impune o sistema de reservas fraccionadas – ou seja, concedem crédito a particulares e empresas a partir da emissão de moeda a partir do “nada”, diminuindo, desta forma, o poder aquisitivo do dinheiro que temos no bolso.
Isto é uma óbvia agressão à propriedade privada.
Não obstante, esta prática está perfeitamente legalizada e é responsável pelas crises financeiras que atravessamos, cada vez mais acentuadas.
Segundo consta, o fenómeno da inflação resulta da evolução de um índice de preços definido por uma agência governamental:
Será mesmo assim? Não deveria ser a evolução da massa monetária?
Se imaginássemos que o Alves dos Reis, com as suas fantásticas notas falsas, decidia comprar maçãs no mercado de Lisboa sem qualquer preocupação em relação preço, o que iria acontecer? Correcto: o preço subia!
Os vendedores sabiam que Alves dos Reis as compraria mesmo que subissem o preço. E com isto levava que a propriedade privada das outras pessoas fosse afectada, atendendo que, com a mesma quantidade de dinheiro, passariam a comprar cada vez menos maçãs.
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Na prática, é isto o que está a acontecer com toda a massa monetária emitida nos últimos dois anos pelos Bancos Centrais. Já todos repararam, certamente, na subida do custo de vida dos últimos dois anos: comida, preços das casas. E até nos activos financeiros – excepto as acções dos bancos –, incluindo as Criptomoedas, subiram expressivamente e sem cessar.
Não será isso uma “prova” de que massa monetária, emitida do ar, “correu” para esses bens, provocando subidas exponenciais do seu preço?
A título ilustrativo, o Ethereum subiu 1.349% e o Bitcoin 340%. Qualquer cidadão se apercebe que os preços sobem, de forma inexorável com o aumento da massa monetária; mas, todavia, segundo a versão oficial, a inflação é algo temporário e desaparecerá em breve.
Sabemos ser um consenso que consumir agora é preferível a consumir no futuro. Mas conceder um crédito significa que alguém realiza um sacrifício no presente para consumir no futuro; e por isso exige um preço, por exemplo, de 5% ao ano. Porém, agora só o podem fazer no mundo das Criptomoedas, através de projectos DeFi.
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Porque na Economia dos Bancos Centrais temos taxas de juro reais negativas – que significa taxas de juro nos bancos inferiores à inflação –, e este é um fenómeno de mercado que veio para ficar, uma nova verdade.
Ora, não será evidente que esta situação resulta da compra de títulos de dívida, a partir de moeda emitida do “ar”, provocando a descida da rendibilidade desses títulos, inclusive para um valor negativo?
Mas isto também se passa, em certa medida, com a Segurança Social. Em breve explicarei como…
Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário
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