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  • Chamem a polícia: sem contratos escritos, GNR entrega 13,6 milhões de euros sempre à mesma empresa de limpezas

    Chamem a polícia: sem contratos escritos, GNR entrega 13,6 milhões de euros sempre à mesma empresa de limpezas


    Por vezes, em serviços de limpezas, há contratos públicos. E bem chorudos. No Portal Base, consta um contrato da Guarda Nacional Republicana para serviços de limpezas no valor de 8.088.304,46 euros, que com IVA atinge quase os 11 milhões de euros. Assinado em Abril de 2021, foi ganho pela empresa Fine Facility Services, para limpar as cerca de meio milhar de instalações daquela força militarizada, por um período de 18 meses.

    Não foi apenas esse lote que a Fine Facility Services venceu. Neste concurso público foram a jogo mais sete lotes, incluindo serviços de limpeza da Polícia de Segurança Pública, da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil e do então Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. E tão apetecível era este concurso que 21 empresas de limpezas se mostraram interessadas, embora a Fine Facility Services tenha arrecadado seis dos oito lotes, sendo que os restantes (com montantes a rondar os 500 mil euros) foram ganhos pela KGS Services e pela Interessantequação. Até aqui tudo bem, como devia ser com dinheiros públicos: concurso aberto; que ganhe o melhor e com a melhor proposta.

    Terá ajudado à vitória da Fine Facility Services, no caso da GNR, a existência de uma relação anterior, por ajuste directo. Aliás, no trimestre anterior à entrada em vigor do contrato resultante do concurso público, a empresa de limpeza ‘sacara’ um ajuste directo por três meses no valor de 1,5 milhões de euros.

    Apesar deste forte sinal de concorrência – patente em 21 empresas concorrentes –, a GNR acabou por deixar passar os 18 meses, tendo o contrato com a Fine Facility Services expirado em finais de Setembro do ano passado. Acertos feitos, porque o preço acaba também por ser em função das horas de trabalho, a empresa de limpezas recebeu por esse contrato, resultante de concurso público, um total de cerca de 8,1 milhões de euros.

    Mas as ligações negociais entre a GNR e a Fine Facility Services mantiveram-se após essa data mas com todas as facilidades e arredando concorrência, burocracias e papeladas.

    Com efeito, de acordo com um levantamento do PÁGINA UM, desde o quarto trimestre de 2022 – portanto, em pouco mais de um ano –, o Comando-Geral da GNR celebrou oito ajustes directos com a Fine Facility Services cuja soma já ultrapassa os 11 milhões de euros, alcançando os 13,6 milhões de euros caso se inclua o IVA.

    Todos estes contratos têm em comum uma gritante falta de transparência, senão pior. O primeiro destes contratos por ajuste directo foi assinado em 21 de Outubro de 2022, com um prazo de execução de 92 dias, tendo ficado estipulado um montante de 1.513.128,89 euros. Como o contrato teve efeitos retroactivos ao início do mês de Outubro, deveria finalizar no último dia desse ano. Mas o contrato foi encerrado antecipadamente no meio do mês de Dezembro, com o pagamento praticamente integral do preço contratual, e a GNR decidiu celebrar novo ajuste directo apenas por 15 dias.

    Mas o contrato para a limpeza das instalações da GNR durante a segunda quinzena de Dezembro, no valor de 320.380,87 euros somente foi celebrado no último dia útil do ano de 2022, sexta-feira, dia 30. E diz-se celebrado, e não assinado, porque não houve sequer contrato escrito. E nem sequer se consegue compreender a razão deste contrato quinzenal, uma vez que o ajuste directo com duração de três meses já apresentava um valor médio mensal superior ao do contrato de 18 meses derivado do concurso público (500 mil euros vs. 450 mil euros).

    Em todo o caso, as contas do ajuste directo para a segunda quinzena de Dezembro de 2022 só foram concluídas em Maio deste ano, sabendo-se que a GNR pagou então quase 220 mil euros por limpezas neste curto período. Curiosamente, sobre este contrato, surge no Portal Base a referência a ter deixado de “existir situações de incumprimento ou quaisquer valores em falta por parte da prestadora de serviços”.

    Depois deste ajuste directo, a GNR tomou o gosto aos ajustes directos com a Fine Facility Services ao longo do ano de 2023, e sempre invocando a norma da “urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis”, que só se justificariam se os acontecimentos imprevisíveis fosse a sujidade das centenas de postos da GNR no país. O mesmo argumento da “urgência imperiosa” serviu, aliás, para que o Comando-Geral da GNR deixasse de se preocupar com papeladas de contratos. Com efeito, dos seis contratos celebrados em 2023 não há um sequer que tenha contrato escrito, mesmo se fosse simples copiar os anteriores, uma vez que, presume-se, o tipo de limpeza e os postos a limpar ter-se-ão mantido. Ou não. Nada se sabe.

    Apenas se sabe que os valores e a duração destes seis contratos de 2023 não seguem qualquer lógica, o que permite colocar o capricho como hipótese académica. Também as diferenças entre o preço contratual e o valor efectivamente pago não encontram uma lógica perceptível.

    Assim, a meio de Janeiro deste ano celebrou-se um ajuste no valor de um pouco mais de 345 mil euros com uma duração de 21 dias. Acabou por se pagar um pouco mais de 252 mil euros. Depois deste, saiu um novo ajuste de montante mais avantajado, com início a 1 de Fevereiro, que se terá sobreposto ao ajuste directo anterior. Assim, por um pouco mais de dois milhões de euros, a Fine Facility Services ‘sacou’ de mão-beijada, sem os engulhos da concorrência, novo contrato por mais 122 dias. Porquê 122 dias? Não se sabe.

    Tenente-General Rui Veloso, comandante-geral da GNR desde Setembro deste ano. Sucessão de ajustes directos para limpezas começaram antes da sua tomada de posse, mas não pararam.

    Sabe-se apenas que, terminando este ajuste em 3 de Junho, a Fine Facility Services teve direito a mais outro ajuste directo sem contrato. Tudo na base da confiança. E assim, ainda antes de ter terminado o outro ajuste directo, integralmente pago, a GNR fez novo ajuste directo em 31 de Maio, desta vez com a duração de 153 dias. Pode-se dizer que o facto de existirem dois contratos em vigor para o mesmo serviço por três dias é um pormenor. Será assim, de facto, para contratos de milhões, mas sempre se pode adiantar que cada dia de limpeza das instalações da GNR custa ao erário público quase 17 mil euros.

    Certo é que o contrato de 153 dias, celebrado pela GNR e a Fine Facility Services – e mais uma vez sem contrato escrito – terminou em 30 de Outubro e custou aos cofres do Estado mais 2.580.822,95 euros, atingindo quase 3,2 milhões de euros com IVA.

    Depois de dois contratos de mão-beijada superiores a dois milhões de euros, o Comando da GNR terá decidido ser mais comedido, e fez mais outro, sem ser escrito, por um pouco mais de 513 mil euros. Também aqui houve um período de três dias em que terá havido dois contratos em vigor – ou seja, em que a GNR pagou a dobrar –, porque a data de celebração foi o dia 27 de Outubro. Grão a grão se desbarata. E se ganha. Este contrato teve duração de 30 dias, o que significaria que deveria terminar a 25 de Novembro.

    Mas, talvez por motivos de acerto de contas, houve quase uma semana em que, desta vez, terá havido limpezas sem contrato, porque a GNR e a Fine Facility Services somente celebraram mais um novo ajuste directo no dia 1 de Dezembro. E, neste caso, por apenas 16 dias, pelo valor de 267.233,33 euros.

    Por fim, como certamente era uma canseira para o Comando-Geral da GNR, mesmo sem ter de se assinar contratos, celebrar ajustes directos de 15 dias, 21 dias, 30 dias, 122 dias e 155 dias, no passado dia 15 decidiu-se que melhor seria conceder mais um ajuste directo à empresa do costume por 197 dias, basicamente por seis meses e meio. Custo deste ajuste: 3.695.493,21 euros, ou seja, mais de 4,5 milhões de euros. Sem contrato escrito porque os supostos motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis terão implicado a necessidade de “dar imediata execução ao contrato”, conforme está registado no Portal Base.

    Uma vez até se acredita, por boa-fé, mas isto repetido oito vezes ao longo de menos de um ano, já necessita de outros esclarecimentos. Mas o departamento de comunicação da GNR, contactado pelo PÁGINA UM, comunicou por telefone que somente para a semana seria possível responder.   

    O mais recente contrato por ajuste directo entre a GNR e a Fine Facility Services integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 15 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


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    Ontem, dia 27 de Dezembro, no Portal Base foram divulgados 1425 contratos públicos, com preços entre os 3,24 euros – para aquisição de fusíveis, pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, através de consulta prévia – e os 11.895.000,00 euros – para empreitada de construção da 2ª fase da Variante à cidade da Horta, pela Direcção Regional das Obras Públicas e Transportes Terrestres, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 21 contratos, dos quais nove por concurso público, oito ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 29 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Guarda Nacional Republicana (com a Fine Facility Services, no valor de 3.695.493,21 euros); Centro Social da Freguesia de Famalicão (com a Escalas e Espaços – Construções, no valor de 3.225.389,88 euros); Infraestruturas de Portugal (com a IP Telecom – Serviços de Telecomunicações, no valor de 1.888.092,60 euros); três do Centro Hospitalar Universitário de Santo António (um com a Sandoz, no valor de 511.210,00 euros, outro com a Jazz Pharmaceuticals France, no valor de 183.920,00 euros, e outro com a Baxter – Medico Farmacêutica, no valor de 115.842,60 euros); três da Unidade Local de Saúde do Alto Minho (um com a Janssen Cilag, no valor de 440.395,20 euros, outro com a Pharmakern Portugal, no valor de 137.046,00 euros, e outro com a Sanofi, no valor de 104.753,52 euros); Município de Mafra (com a Primavera Business Software Solutions, no valor de 374.019,65 euros); três da Polícia Judiciária (um com a Carl Zeiss Iberia, no valor de 270.199,20 euros, outro com a Soquímica, Lda., no valor de 252.292,79 euros, e outro com a Micotec – Electrónica, no valor de 106.625,00 euros); Estado Maior da Força Aérea (com a OGMA – Indústria Aeronáutica de Portugal, no valor de 211.735,00 euros); três da Universidade do Porto (um com a Elsevier, B.V., no valor de 209.406,21 euros, outro com a Strateq Master, Lda., no valor de 125.500,65 euros, e outro com a Servilimpe – Limpezas Técnicas Mecanizadas, no valor de 123.287,27 euros); quatro do Hospital de Braga (um com a Medtronic Portugal, no valor de 201.565,82 euros, outro com a B. Braun Medical, no valor de 156.863,11 euros, outro com a Alcon Portugal, Lda., no valor de 155.316,99 euros, e outro com a Johnson & Johnson, no valor de 134.155,44 euros); Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil (com a Cepheid Iberia, no valor de 145.000,00 euros); Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (com a Thermo Fisher Scientific, no valor de 129.228,93 euros); Fagar – Faro, Gestão de Águas e Resíduos (com a AQUASIS – Sistemas de Informação, no valor de 124.963,00 euros); Agência Nacional para a Gestão do Programa Erasmus+ Educação e Formação (com a Alfredo Real Estate Analytics – Serviços de Informação, no valor de 121.000,00 euros); Teatro Circo de Braga (com a Bildung – Sociedade Unipessoal, no valor de 120.000,00 euros); Autoridade Nacional de Comunicações (com a Hewlett-Packard Portugal, no valor de 110.963,84 euros); Município de Vila Nova de Gaia (com o ISPUP – Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, no valor de 104.000,00 euros); e o Hospital de Vila Franca de Xira (com a Hologic Iberica S.L., no valor de 100.966,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 27 de Dezembro

    1Empreitada de “Construção da 2ª fase da Variante à cidade da Horta, na Ilha do Faial”

    Adjudicante: Direcção Regional das Obras Públicas e Transportes Terrestres

    Adjudicatário: AFAVIAS – Engenharia e Construções Açores; Marques, S.A.; Tecnovia Açores – Sociedade de Empreitadas

    Preço contratual: 11.895.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Aquisição de serviços de manutenção global dos navios da frota da Soflusa

    Adjudicante: Soflusa – Sociedade Fluvial de Transportes

    Adjudicatário: NAVALTAGUS – Reparação e Construção Naval; S&C – Gestão de Navios e Tripulações

    Preço contratual: 7.498.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de serviços de limpeza para a 2ª quinzena de dezembro de 2023 e os primeiros seis meses de 2024

    Adjudicante: Guarda Nacional Republicana

    Adjudicatário: Fine Facility Services

    Preço contratual: 3.695.493,21 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    4Empreitada de construção de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas

    Adjudicante: Centro Social da Freguesia de Famalicão

    Adjudicatário: Escalas e Espaços – Construções   

    Preço contratual: 3.225.389,88 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    5Subscrição de licenças de software Microsoft e serviços de suporte para as empresas do Grupo AdP

    Adjudicante: EPAL – Empresa Portuguesa das Águas Livres

    Adjudicatário: Inetum España

    Preço contratual: 2.728.551,93 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 27 de Dezembro

    1Aquisição de serviços de limpeza para a 2ª quinzena de dezembro de 2023 e os primeiros seis meses de 2024

    Adjudicante: Guarda Nacional Republicana

    Adjudicatário: Fine Facility Services

    Preço contratual: 3.695.493,21 euros


    2Empreitada de construção de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas

    Adjudicante: Centro Social da Freguesia de Famalicão

    Adjudicatário: Escalas e Espaços – Construções   

    Preço contratual: 3.225.389,88 euros


    3Aquisição de serviços de tecnologias de informação incluindo rede de dados

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: IP Telecom – Serviços de Telecomunicações

    Preço contratual: 1.888.092,60 euros


    4Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Santo António

    Adjudicatário: Sandoz

    Preço contratual: 511.210,00 euros


    5Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde do Alto Minho

    Adjudicatário: Janssen Cilag

    Preço contratual: 440.395,20 euros


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  • ‘Oops! I did it again’: Autoridade Tributária e Aduaneira continua em estranhas ‘limpezas’ com franceses da Samsic

    ‘Oops! I did it again’: Autoridade Tributária e Aduaneira continua em estranhas ‘limpezas’ com franceses da Samsic


    Business as usual. A Autoridade Tributária e Aduaneira did it again, e com a maior das naturalidades. Melhor explicando: Nuno Roda Inácio, subdirector-geral responsável pela área de recursos financeiros e patrimoniais da entidade que escrupulosamente vela pelos deveres dos contribuintes assinou mais um contrato milionário por ajuste directo invocando “urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis“. Assim, desde 2017, para a Autoridade Tributária e Aduaneira limpar as suas instalações é uma “urgência imperiosa” que resulta da sujidade causada pelos seus funcionários e contribuintes, algo classificado como “acontecimentos imprevisíveis”. Com este esdrúxulo argumento tem-se justificado cerca de duas dezenas de contratos de ‘mão-beijada’ sempre à mesma empresa, a francesa Samsic.

    O mais recente contrato por ajuste directo foi celebrado na passada sexta-feira, pelo valor de 928.016,85  euros, que com IVA se transforma em 1.141.460,73 euros, e abrange serviços que começaram já em Outubro e se finalizam no próximo domingo. Ou seja, como em casos anteriores, a Autoridade Tributária e Aduaneira aceitou o início da prestação de serviços por uma empresa sem existir um contrato a suportá-lo, corrigindo a ilegalidade poucos dias antes do termo dessa aquisição.

    Helena Borges, directora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira.

    Esta situação recorrente da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao arrepio do espírito subjacente ao Código dos Contratos Públicos – que considera a livre concorrência e a transparência como pilares da contratação pela Administração Pública – tinha sido detectada já pelo PÁGINA UM no passado mês de Outubro. Nessa altura, num levantamento ao Portal Base, o PÁGINA UM contabilizara, nos últimos sete anos, um total de 17 contratos por ajuste directo que envolveram um montante de 20.965.651 euros. Com IVA, que é dedutível pela empresa francesa, a conta chegava próximo dos 26 milhões de euros. Com este novo contrato sobe para 27 milhões. Parece quase o mesmo: é “só” mais um milhão de euros.

    Tal como sucede com o mais recente contrato, e apesar de a limpeza de instalações ser um serviço perfeitamente programável – e onde os concursos públicos fazem todo o sentido, por uma questão do melhor preço e qualidade –, na generalidade dos casos, os contratos entre a Autoridade Tributária e a Samsic foram também assinados já no decurso do período de vigência. A entidade pública normalmente faz ajustes directos trimestrais, mas em outros casos abrangem outras durações sem se perceber os motivos.

    Com este contrato, contabilizam-se seis ajustes directos em que a assinatura do contrato pela Autoridade Tributária – na generalidade a cargo de Nuno Roda Inácio, o subdirector-geral responsável pela área de recursos financeiros e patrimoniais – tem sido feita nas duas últimas semanas de vigência. Este dirigente ocupa o cargo, que inclui, por subdelegação, o estabelecimento de contratos, desde 2015, tendo sido nomeado pela então ministra social-democrata Maria Luís Albuquerque. Antes, e desde 2009, Roda Inácio já ocupava funções de relevo na “máquina fiscal’.

    person holding yellow plastic spray bottle

    Todos estes contratos da Samsic foram assinados por Roda Inácio, embora em alguns o seu nome seja indevidamente rasurado alegando-se o Regulamento Geral da Protecção de Dados. Estão neste lote os dois últimos contratos: o ajuste directo abrangendo o período Abril a Setembro, e o ajuste directo do último trimestre deste ano. Nos elementos disponibilizados nunca são identificadas as instalações a limpar.

    O PÁGINA UM não detectou qualquer anúncio de concurso público no Portal Base para aquisição de serviços de limpeza por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que se deduz, pelo histórico, que se o deixarem o subdirector-geral Roda Inácio fará ‘rodar’ mais um ajuste directo milionário para a Samsic.

    A forma como os diversos contratos de limpeza têm sido celebrados entre a Autoridade Tributária e a Samsic deixam sérias dúvidas de legalidade, havendo mesmo dois casos onde se evidenciam fortes indícios de terem sido forjados. Em grande parte dos casos, para justificar a assinatura de contratos enquanto já decorriam os serviços a prestar, invoca-se a retroactividade.

    Nélson Roda Inácio, à esquerda (cumprimentando em 2016 o então presidente da autarquia de Pombal) foi nomeado subdirector-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira em 2015, tendo assinado todos os ajustes directos com a Samsic.

    Mas essa modalidade, que só pode ocorrer em situações excepcionais e devidamente justificadas – e não por norma, como sucede nestes contratos de limpeza –, só pode ser aplicada se não impedir, restringir ou falsear a concorrência prevista no Código dos Contratos Públicos. Ora, sistemáticos ajustes directos com eficácia retroactiva de contratos constituem restrições de concorrência, até porque não se vislumbra qualquer motivo razoável para que, desde 2017, não se consiga pôr em pé um concurso público e que opte por sistemáticos ajustes directos assinados ‘tarde a más horas’.

    Mas há dois casos particulares no lote de 18 ajustes directos que se revestem de ainda maior gravidade. Conforme em Outubro passado o PÁGINA UM revelara, no primeiro trimestre de 2018 – depois de três contratos em 2017, o último dos quais terminara em 31 de Dezembro –, a Autoridade Tributária e a Samsic decidiram assinar um novo contrato por ajuste directo por um prazo de 287 dias.

    Ministério das Finanças teve tempo em Outubro para apresentar o gato Faísca à imprensa, mas não teve tempo ainda, nos últimos três meses, para explicar os estranhos ajustes directos da Autoridade Tributária e Aduaneira para aquisição de serviços de limpeza

    A vigência desse contrato de 2018 iniciava-se no dia 19 de Março e terminava a 31 de Dezembro, mas existem evidências de os preços terem sido inflacionados para compensar a inexistência de suporte contratual entre 1 de Janeiro e 18 de Março. Com efeito, enquanto o preço médio diário das limpezas em 2017 foi de 6.626 euros, o contrato de 2018 (com 287 dias de duração) ficou por 8.837 euros por dia. Ou seja, um aumento de 33%. Se o contrato de 2018 tivesse sido estabelecido para os 365 dias do ano, o custo diário era de 6.949 euros, aproximando-se assim daquele que fora o do ano anterior.

    No ano seguinte, em 2019, repetiu-se o expediente para compensar mais ‘acertos’ em limpezas sem contrato, mas com sinais de fraude ainda muitíssimo mais evidentes. Nos primeiros dois meses e meio não se encontra qualquer contrato de limpeza que tenha estado em vigor, mas em 19 de Março desse ano, a Autoridade Tributária decidiu fazer mais um muito suspeitoso ajuste directo beneficiando a Samsic.

    Com uma duração de apenas 13 dias, porque só foi assinado no dia 19 e expirava a 31 de Março, envolveu um pagamento de 648.402 euros, significando assim que, formalmente, em cada um dos poucos dias deste contrato de limpeza a Autoridade Tributária pagou 49.877 euros à Samsic. No mês seguinte, em Abril, entraria em vigor um novo contrato por ajuste directo, que durou 275 dias, até ao final do ano. Como teve um preço contratual de 1.984.242,74 euros, significa que por dia custou 7.215 euros, bem demonstrativo de que o contrato de Março de 2019 foi forjado para ter um preço médio mais de sete vezes superior.

    Ajuste directo de Março de 2019 só vigorou por 13 dias a um preço diário exorbitante e terá sido o segundo contrato suspeito de ter sido ‘forjado’. Generalidade dos contratos foram assinados quando o prazo de vigência estava a decorrer; em alguns casos quase a terminar.

    Para confirmar as fortíssimas suspeitas de contrato forjado em Março de 2019 acrescente-se que os contratos de limpeza a partir de 2020 apresentam um preço médio diário a rondar os 10.000 euros por dia.

    Saliente-se também que, desde 2017, os seis maiores contratos por ajuste directo assinados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, qualquer um deles acima de um milhão de euros, foram sempre no sector da limpeza e todos a beneficiar a Samsic.

    Em Outubro, o PÁGINA UM insistiu várias vezes junto do Ministério das Finanças para comentar estes ajustes directos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, mas, mantendo-se válidas as perguntas não respondidas, decidiu-se não renovar as questões.

    O mais recente contrato entre a Samsic e Autoridade Tributária e Aduaneira integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 22 e 25 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


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    Nos últimos quatro dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 1.096 contratos públicos, com preços entre os 1,30 euros – para aquisição de sal, pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, através de consulta prévia – e os 10.068.125,17 euros – para fornecimento de combustíveis rodoviários, pela Guarda Nacional Republicana, ao abrigo de acordo-quadro.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 26 contratos, dos quais 13 por concurso público, nove ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 18 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: dois da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros (um com a Siemens, S.A., no valor de 999.346,83 euros, e outro com a Intergaup, no valor de 760.885,00 euros); Autoridade Tributária e Aduaneira (com a Samsic – Facility Services, no valor de 928.016,85 euros); Município de Lisboa (com a Vítor Lança – Construções, no valor de 674.170,87 euros); dois do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (um com a Derichebourg Facility Services, no valor de 458.324,51 euros, e outro com CSL Behring, no valor de 196.900,00 euros); Município de Oeiras (com a Associação Informática da Região Centro, no valor de 423.345,00 euros); C. E. C. D. Mira Sintra – Centro de Educação para o Cidadão Deficiente (com a Mercedes-Benz Retail, no valor de 274.320,00 euros); dois do Centro Hospitalar Universitário de Santo António (um com a ITAU – Instituto Técnico de Alimentação Humana, no valor de 255.965,29 euros, e outro com a Sanofi, no valor de 251.878,50 euros); Município de Vila Franca de Xira (com a Medidata.Net – Sistemas de Informação para Autarquias, no valor de 235.356,14 euros); Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (com a Novo Nordisk, no valor de 216.702,60 euros); Município de Viana do Alentejo (com a Inovbuild, Construção, no valor de 185.399,84 euros); Universidade de Coimbra (com a The Mathworks, SL, no valor de 158.113,64 euros); Universidade do Porto (com a Headhunter Systems Limited, no valor de  124.128,04 euros); Polícia Judiciária (com a Life Technologies Europe B.V., no valor de 117.906,40 euros); Município de Gondomar (com a Construções Pardais – Irmãos Monteiros, no valor de 106.368,00 euros); e o Instituto Politécnico do Porto (com a Paralab – Equipamentos Industriais e de Laboratório, no valor de 100.650,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 22 a 25 de Dezembro

    1Fornecimento de combustíveis rodoviários em Portugal Continental  

    Adjudicante: Guarda Nacional Republicana

    Adjudicatário: Petróleos de Portugal – Petrogal

    Preço contratual: 10.068.125,17 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    2Fornecimento de electricidade em regime de mercado livre para Portugal Continental

    Adjudicante: Guarda Nacional Republicana

    Adjudicatário: Endesa Energia

    Preço contratual: 5.539.305,74 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    3Empreitada para construção da Escola de Pós-Graduação no Campus Politécnico de Portalegre, no âmbito do PRR

    Adjudicante: Instituto Politécnico de Portalegre

    Adjudicatário: Nova Gente – Empreitadas

    Preço contratual: 3.534.931,64 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de energia eléctrica 100% proveniente de fontes de energia renovável

    Adjudicante: CMPEAE – Empresa de Águas e Energia do Município do Porto

    Adjudicatário: Endesa Energia

    Preço contratual: 2.556.826,02 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Empreitada para recuperação do edifício da antiga Escola EB1/JI da Portela

    Adjudicante: Associação de Apoio à Juventude Deficiente

    Adjudicatário: Cálculos & Títulos – Construções

    Preço contratual: 2.410.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 22 a 25 de Dezembro

    1 Empreitada de concepção de construção de alteração de instalações especiais      

    Adjudicante: Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros

    Adjudicatário: Siemens S.A. 

    Preço contratual: 999.346,83 euros


    2Aquisição de serviços de limpeza para o 4º trimestre do ano de 2023

    Adjudicante: Autoridade Tributária e Aduaneira

    Adjudicatário: Samsic Portugal – Facility Services

    Preço contratual: 928.016,85 euros


    3Aquisição de serviços de elaboração do projecto de arquitectura e coordenação de especialidades

    Adjudicante: Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros

    Adjudicatário: Intergaup – Gabinete de Arquitectura, Urbanização e Planeamento          

    Preço contratual: 760.885,00 euros


    4Intervenção urgente para a criação de medidas de segurança nos edifícios norte e poente do Complexo da Boa Vista, na freguesia da Misericórdia

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Vitor Lança – Construções

    Preço contratual: 674.170,87 euros


    5Prestação de serviços de higiene e limpeza para o mês de Dezembro de 2023

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte

    Adjudicatário: Derichebourg Facility Services

    Preço contratual: 458.324,51 euros


    MAP

  • À conta do BES, Banco de Portugal mete sucessivas ‘prendas no sapatinho’ da Vieira de Almeida

    À conta do BES, Banco de Portugal mete sucessivas ‘prendas no sapatinho’ da Vieira de Almeida


    Na semana passada saiu mais uma ‘prenda’ para a sociedade de advogados Vieira de Almeida: um ajuste directo, entregue de mão-beijada pelo Banco de Portugal, para ainda tratar da resolução do BES. Sobretudo a partir de 2018, a conta desta sociedade de advogados tem aumentado, com mais seis contratos a ultrapassarem os 22 milhões de euros, sempre sem concorrência, porque o regulador liderado por Mário Centeno alega que não há mais ninguém capaz de fazer o mesmo (ou melhor). Mas os contratos e as peças procedimentais nem sequer explicitam em concreto o objecto dos sucessivos ajustes directos. O Banco de Portugal disse ao PÁGINA UM que a manutenção da Vieira de Almeida se justifica por “interesse público”e que a aplicação das regras deontológicas e eventuais conflitos de interesses, “atento o tipo de litigância em causa, reduz em termos muitíssimo substanciais o universo de possíveis adjudicatários.” Mas não apresenta provas de que esses critérios levem à completa ausência de concorrência, o que pode implicar a ilegitimidade na invocação da norma para afastar concorrentes.


    Não há 12 sem 13. A sociedade de advogados Vieira de Almeida garantiu na semana passada o 13º ajuste directo do Banco de Portugal desde 2011, desta vez no valor de 4,6 milhões de euros, IVA incluído, mas as receitas tem estado a aumentar de forma espantosa desde há cinco anos.

    De acordo com o Portal Base, os contratos de mão-beijada entre a instituição liderada por Mário Centeno e esta conhecida sociedade de advogados tem ganhado contornos de grande intimidade desde 2018, não tanto pelo número de contratos mas pelos elevados montantes envolvidos sem que haja qualquer concorrência. Com efeito, se o número de contratos entre 2011 e 2017 até são superiores ao do período a partir de 2018 (sete vs. seis), as verbas envolvidas passaram a atingir verbas astronómicas para simples aquisição de serviços que, em abono da verdade, constitui trabalho intelectual sob a forma de trabalho jurídico.

    Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.

    Somando os sete contratos entre 2011 e 2017 (sete anos), a Vieira de Almeida facturou ao Banco de Portugal um total de 7,38 milhões de euros (IVA incluído), enquanto os contratos a partir de 2018 (seis anos) já ascendem aos 22,33 milhões de euros (IVA incluído). De entre os contratos a partir de 2018 destacam-se cinco contratos de valor (sem IVA) igual ou superior a 2,5 milhões de euros: o primeiro assinado em Junho de 2018 (4,85 milhões de euros), o segundo em Fevereiro de 2020 (quase 4,37 milhões de euros), o terceiro em Novembro do mesmo ano (2,5 milhões de euros), o quarto e o quinto em Outubro e Dezembro de 2023, respectivamente de 1,8 milhões e 3,75 milhões de euros.

    A divisão dos contratos de mão-beijada entregues pelo Banco de Portugal antes e depois de 2017 não se deve apenas à diferença de montantes. Também o alegado fundamento para o ajuste directo se alterou. Antes de 2017, o Banco de Portugal justificou a não abertura de concurso público e a adjudicação directa à Vieira de Almeida invocando uma excepção no Código dos Contratos Públicos em que, com jeitinho, cabe tudo.

    Com efeito, no artigo invocado refere-se que se pode escolher o ajuste directo se “a natureza das respectivas prestações, nomeadamente as inerentes a serviços de natureza intelectual ou a serviços financeiros indicados na categoria 6 do anexo II-A da Directiva n.º 2004/18/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, não permita a elaboração de especificações contratuais suficientemente precisas para que sejam qualitativamente definidos atributos das propostas necessários à fixação de um critério de adjudicação nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º, e desde que a definição quantitativa, no âmbito de um procedimento de concurso, de outros atributos das propostas seja desadequada a essa fixação tendo em conta os objectivos da aquisição pretendida”.

    Sociedade Vieira de Almeida tem ‘coleccionado’ ajustes directos com o Banco de Portugal sem o incómodo da concorrência.

    Portanto, quando não se quer lançar um concurso público em aquisição de serviços, esta norma mais do que vaga serve a contento. Mas com o aumento dos montantes, com contratos acima de 2,5 milhões ou até acima de 4 milhões de euros, o Banco de Portugal terá achado ser abusivo manter a mesma desculpa. E arranjou outra, que tem o condão de ser ainda pior, porque, enquanto entrega de mão-beijada milhões à Vieira de Almeida, passa um autêntico atestado de incompetência à generalidade das outras sociedades de advogados, e a todos os advogados em geral.

    De facto, em todos os seis últimos contratos entre estas duas entidades invoca-se a norma que possibilita uma excepção ao concurso público (ou a outros procedimentos em que há concorrência) se “o objeto do contrato só possam ser confiadas a determinada entidade” no caso concreto em que “não exista concorrência por motivos técnicos”. Ou seja, o ajuste directo justificar-se-á por mais nenhuma sociedade de advogados nem outro qualquer advogado em Portugal (ou no estrangeiro) se mostram capazes de fazer o trabalho da Vieira de Almeida para o Banco Portugal.

    Não se consegue saber como o Banco de Portugal conseguiu saber isso, porque jamais houve sequer um concurso público anterior ou sequer uma consulta prévia, nem tão-pouco se conhecem declarações públicas de outras sociedades de advogados a proclamarem ser incapazes de fazer aquilo que a Vieira de Almeida faz sobre os assuntos jurídicos a prestar.

    Ricardo Salgado e o antigo BES continuam a custar dinheiro aos contribuintes portugueses. Resolução do banco tem sido um maná para a Vieira de Almeida.

    Até porque, na verdade, através dos contratos, e algumas peças procedimentais, constantes no Portal Base nem sequer se descortina quais são os serviços jurídicos em concreto que a Vieira de Almeida prestou ou vai prestar ao Banco de Portugal. Por exemplo, no mais recente ajuste directo, o contrato assinado no passado dia 18, diz apenas que, no objecto do contrato, com um prazo de três anos, que “o segundo outorgante [Vieira de Almeida] obriga-se perante o primeiro outorgante [Banco de Portugal],a prestar serviços de assessoria jurídica e de patrocínio judiciário, nos termos e condições definidos nos cadernos de encargos e na proposta adjudicada, que constituem, respectivamente, os anexos I e II do presente contrato, e que dele fazem parte integrante”.

    Mas nas peças do procedimento no Portal Base não consta nada da proposta adjudicada, enquanto o caderno de encargos é completamente omisso em detalhes sobre os serviços a desempenhar nem sequer estipula preços por hora. Mais opaco seria difícil.

    O contrato assinado em Outubro passado também sofre de similar falta de transparência, mas com a agravante de ter uma cláusula de retroactividade. Ou seja, a Vieira de Almeida começou a trabalhar primeiro antes de facturar. Tudo facilitismos com dinheiros públicos. Aliás, este contrato de Outubro de 2023 – que terá terminado em Novembro – previa a possibilidade de renovações até dois anos. Mas o Banco de Portugal terá optado por fazer outro contrato por mais três anos.

    Banco de Portugal invoca falta de concorrência e invoca “interesse público” para ajustes directos com a Vieira de Almeida. Nunca explicou como surgiu a ideia de escolher esta sociedade de advogados no primeiro contrato nem prova que efectivamente há ausência de concorrência, porque todos os contratos foram celebrados por ajuste directo.

    Contactado pelo PÁGINA UM, o Banco de Portugal diz que “os elementos publicitados no Portal Base correspondem ao que é legalmente exigido e, bem assim, ao que decorre das regras e dos termos de funcionamento desse Portal”. Convém referir que tal não corresponde à verdade, patente no próprio articulado do contrato onde se salienta que, por exemplo, a proposta de adjudicação faz parte integrante do contrato. Ao optar deliberadamente por omitir a proposta de adjudicação – único elemento que detalhará os serviços a prestar –, o Banco de Portugal estará a colocar um contrato “mutilado” no Portal Base.

    Apesar disso, o departamento da instituição liderada por Mário Centeno diz que “observa escrupulosamente, no âmbito dos procedimentos aquisitivos impostos pela prossecução das suas atribuições, o disposto nas normas legais aplicáveis e, em particular, no Código dos Contratos Públicos”, incluindo-se a “contratação de serviços jurídicos, em várias vertentes (especialmente, no que concerne ao apoio à representação do Banco de Portugal em juízo, em Portugal e noutras jurisdições).

    A mesma fonte do Banco de Portugal acrescenta ainda que na escolha do tipo de procedimento, se “tem em consideração o disposto no CCP [Código dos Contratos Públicos] e a jurisprudência nacional e europeia nomeadamente no que respeita aos princípios e requisitos de legalidade aplicáveis”, defendendo que “o ajuste direto é um tipo de procedimento aquisitivo que encontra previsão normativa no nosso ordenamento jurídico, quer por via do critério do valor, permitindo celebrar contratos até ao limite previsto (…), quer por via de critérios materiais, como sucede no caso vertente, permitindo celebrar contratos de qualquer valor quando se verificam circunstâncias materialmente relevantes que justificam o afastamento da concorrência”.

    100 banknote lot

    Só a partir do ponto 3 dos seus esclarecimentos enviados ao PÁGINA UM, o Banco de Portugal acaba por revelar que tipo de serviços a Vieira de Almeida tem estado a desenvolver para obter tantos ajustes directos nos últimos anos, apesar de nada constar nos elementos disponibilizados no Portal Base,

    “Trata-se, fundamentalmente, de assegurar a continuação da prestação de serviços de representação do Banco de Portugal em juízo”, diz o departamento de comunicação do regulador bancário e financeiro, salientando que “estão em causa processos judiciais associados à resolução de uma instituição bancária [que mais adiante identifica como sendo o BES], com a inerente excecionalidade e imprevisibilidade, e que, como é sabido, se prolongam por um extenso período de tempo”, e que “a prossecução do interesse público postula, nestes casos, a manutenção dos serviços de representação em juízo por quem tem o domínio dos concretos processos e tem assegurado a sua condução até ao momento”.

    Saliente-se, contudo, que nada existe em concreto na lei, e muito menos no Código dos Contratos Públicos, que postule esta alegação do Banco de Portugal, excepto se estiver em causa a continuação de serviços ou empreitadas que tenham sido alvo de anterior concurso público. Ora, o Banco de Portugal nunca fez um concurso público para a escolha de sociedade de advogados que o assessoraria na resolução do BES. Além disso, o Banco de Portugal – repita-se – alega sistematicamente a ausência de concorrentes por motivos técnicos, e não por um não provado “interesse público”.

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    Com ‘jeitinho’, o princípio da concorrência prevista no Código dos Contratos Públicos pode sempre transformar-se em sistemáticos ajustes directos, escolhendo adjudicatários a dedo, e abrindo a porta a eventuais actos de má gestão de dinheiros públicos e até à corrupção. Basta que o Tribunal de Contas tape os olhos a invocações sem fundamento ou a alegações infundadas.

    Mas sobre a questão de ausência de concorrência para justificar a contínua contratação da Vieira de Almeida, o Banco de Portugal dá também uma justificação sui generis, sabendo-se que existem centenas e centenas de sociedades de advogados em Portugal. “Ao mesmo tempo, a prossecução do interesse público e as próprias regras deontológicas de exercício de advocacia exigem que se assegure a inexistência de conflitos de interesses, o que, atento o tipo de litigância em causa, reduz em termos muitíssimo substanciais o universo de possíveis adjudicatários”.

    De facto, a ser isto verdade, a redução “em termos muitíssimo substanciais [d]o universo de possíveis adjudicatários” a apenas um [a sociedade Vieira de Almeida] só poderia ser confirmada, salvo melhor opinião, através de concurso público, algo que o Banco de Portugal nunca quis fazer.

    O Banco de Portugal diz também que, mesmo se a fundamentação feita através de critérios materiais aparenta ser falaciosa (e eventualmente ilegal), não se aplica os limites impostos para sucessivos contratos à mesma entidade.


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  • Promoção de Natal: Câmara de Gaia até já paga à Global Media antes do serviço feito

    Promoção de Natal: Câmara de Gaia até já paga à Global Media antes do serviço feito


    Invocando falaciosos argumentos para não lançar concursos públicos, a Gaiurb, uma empresa do município de Vila Nova de Gaia, contrata sistematicamente a Global Media para promover e divulgar as festividades natalícias, e até paga antes do prazo de execução. Em Maio, as relações promíscuas entre a autarquia liderada pelo socialista Eduardo Vítor Rodrigues e o grupo de media que detém o JN, DN e TSF até foram alvo de buscas pelo Ministério Público e de comprometedoras suspeitas, mas tudo continua igual. Afinal, é Natal e ninguém leva a mal, sobretudo se for num país que parece um carnaval a gerir dinheiros públicos. Desde 2020, já fizeram ‘boa viagem’ dos cofres da autarquia para a Global Media mais de um milhão de euros. Sempre em contratos sem concorrência.


    Em Maio passado, o Ministério Público revelou as fortes suspeitas que pendiam sobre Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, de ter feito vários contratos com a Global Media para que os órgão de comunicação social deste grupo – que incluem o Jornal de Notícias, o Diário de Notícias e a TSF – fizessem notícias ou cobrissem conferências que o promovessem a si e à autarquia.   

    No mandado de buscas, então realizadas, ao qual o jornal Público terá tido acesso, o autarca socialista estava indiciado pelos crimes de prevaricação, corrupção ou recebimento indevido de vantagem.

    Sem concorrência: Global Media a ser ‘ajudada’ por dinheiros públicos para promover eventos natalícios em Vila Nova de Gaia através de ajustes directos.

    Para acrescentar mais umas linhas ao perfil do edil de Gaia, no mês passado Eduardo Vítor Rodrigues foi condenado em tribunal à perda de mandato e a multa pelo crime de peculato pelo uso de um carro eléctrico da empresa municipal Águas de Gaia. Recorreu para o Tribunal da Relação e mantém-se no cargo, e a ‘estimular’ mais procedimentos com dinheiros públicos que deixam a lei a gritar por ajuda.

    Com efeito, apesar de todos os indícios com a Global Media – que se encontra num polvoroso processo de despedimentos e em sérias dificuldades financeiras –, a autarquia de Gaia decidiu contratar à empresa de media pelo quarto ano consecutivo, através de um ajuste directo da empresa municipal Gaiurb, os serviços de promoção dos eventos natalícios naquela cidade nortenha.

    O mais recente contrato, assinado no passado dia 13 pelo CEO da Global Media, José Paulo Fafe, prevê a execução do serviço de promoção, cuja descrição nem sequer consta no Portal Base, e tem a inusitada particularidade de já estar pago.

    Suspeito de ‘comprar’ promoção à Global Media, e entretanto condenado (em primeira instância) por peculato de uso com perda de mandato, Eduardo Vítor Rodrigues continua a concordar com os ajustes directos celebrados com a empresa de media.

    Com efeito, apesar de ter um prazo de execução de 31 dias, e as autarquias serem conhecidas pelos atrasos nos pagamentos aos fornecedores, a Gaiurb decidiu pagar 40% dos 276.750 euros logo no dia da assinatura do contrato (13) e pagar o restante na passada quarta-feira, dia 20. Ou seja, no dia em que o contrato foi divulgado no Portal Base, todos os pagamentos estavam feitos, apesar dos serviços só ficarem concluídos no dia 14 de Janeiro do próximo ano.

    Mas este não é o único aspecto estranho nas relações entre a Câmara Municipal de Gaia e a Global Media. Na verdade, a forma como sistematicamente os eventos natalícios, desde 2020, estão a ser contratualizados entre as duas partes é de legalidade mais do que duvidosa, tendo em conta que os ajustes directos celebrados já totalizam 1.045.488 euros (IVA incluído). Este valor inclui, além dos quatro contratos para a promoção dos eventos, uma aquisição de serviços de comunicação de cerca de 20 mil euros em 2022.

    Ora, para justificar os sistemáticos ajustes directos – para assim poder conceder contratos de mão-beijada à entidade por si escolhida a dedo –, a Gaiurb tem recorrido a estranhos argumentos. Nos contratos de 2020, de 2021 e de 2023, a empresa municipal invoca a necessidade de se “proteger direitos, incluindo direitos de propriedade intelectual”. Custa alcançar que tipo de direitos de propriedade intelectual podem estar em causa para que uma outra qualquer empresa possa estar impedida legalmente de realizar eventos natalícios.

    Nos últimos quatro Natais, já mais de um milhão de euros fez uma ‘boa viagem’ dos cofres públicos para os da Global Media, sem passar pelos engulhos da concorrência.

    No caso do contrato de 2022, invoca-se a norma relativa à aquisição de peças de arte e de espectáculos. Contudo, no caso em concreto deste contrato, os serviços foram muito mais além da simples promoção de espectáculos, tendo mesmo incluído coordenação editorial, produção gráfica e até equipamentos de segurança contra incêndios, nomeadamente extintores.

    Evidenciando-se que a escolha do ajuste directo para a formação destes quatro contratos – evitando assim o lançamento de concurso público ou, pelo menos de consulta prévia a três empresas – não aparenta ser válido, em causa fica também a própria repetição do convite à Global Media, porque se excederia os valores previstos no artigo 113- do Código dos Contratos Públicos.

    Na verdade, muitas entidades públicas, para contornar as limitações dos ajustes directos – que assim, podem ultrapassar teoricamente a fasquia do milhão de euros – usam os mais estapafúrdios argumentos para se encaixarem nos critérios materiais, sendo que o mais comum, detectado pelo PÁGINA UM, tem sido a “urgência imperiosa”, mesmo quando se mostra patente que não existe o pressuposto do “acontecimento imprevisível”.

    António Miguel Castro, presidente da Gaiurb, que tem um passivo de cerca de 6,5 milhões de euros, mas à Global Media até paga antes de o serviço estar feito.

    O PÁGINA UM tentou obter comentário da Gaiurb sobre estes contratos com a Global Media, mas não obteve qualquer resposta.

    Recorde-se que em Maio passado, o PÁGINA UM fez um levantamento no Portal Base dos contratos celebrados desde 2020 entre o município liderado pelo socialista Eduardo Vítor Rodrigues, sobretudo através da Gaiurb – que tem a gestão do sector da habitação, do urbanismo e do planeamento, incluindo a revisão do Plano Director Municipal – e três grupos de media (Público, Global Media e Cofina, actual Medialivre) contabilizando oito.

  • Boletim P1 da contratação pública e ajustes directos: 25 Janeiro

    Boletim P1 da contratação pública e ajustes directos: 25 Janeiro


    Ontem, dia 25 de Janeiro, no Portal Base foram divulgados 792 contratos públicos, com preços entre os 22,72 euros – para aquisição de luvas cirúrgicas, pelo Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, ao abrigo de acordo-quadro – e os 5.292.980,00 euros – para construção de residência sénior, pela Fundação Padre Américo, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 20 contratos, dos quais 14 por concurso público e seis ao abrigo de acordo-quadro.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados sete contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: cinco do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (dois com a Merck Sharp and Dohme, um no valor de 495.000,00 euros, e outro no valor de 330.000,00 euros, dois com a Hologic Iberica S.L.,  ambos no valor de 139.860,00 euros, e um com a Gilead Sciences, no valor de 130.800,00 euros); Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (com a Fine Facility Services, no valor de 244.636,14 euros); e a Imprensa Nacional – Casa da Moeda (com a Atos It Solutions and Services, no valor de 180.720,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 25 de Janeiro

    1Construção de residência sénior

    Adjudicante: Fundação Padre Américo

    Adjudicatário: António Saraiva & Filhos, Lda.

    Preço contratual: 5.292.980,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Empreitada de “Requalificação da Casa dos Arcos – Centro Interpretativo do Vinho Verde”

    Adjudicante: Município de Marco de Canaveses    

    Adjudicatário: Arpecdouro, S.A.

    Preço contratual: 2.051.948,44 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aluguer operacional de veículos para a frota automóvel da AR

    Adjudicante: AR – Águas do Ribatejo

    Adjudicatário: Leasys Mobility Portugal

    Preço contratual: 1.449.504,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de serviços de recolha, transporte e encaminhamento para destino final de resíduos de ETAR e EEAR do Alentejo

    Adjudicante: Águas do Vale do Tejo

    Adjudicatário: BioSmart – Soluções Ambientais

    Preço contratual: 1.404.299,80 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Fornecimento de electricidade em regime de mercado livre para Portugal Continental

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de Matosinhos

    Adjudicatário: Iberdrola

    Preço contratual: 1.384.437,60 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 25 de Janeiro

    1 Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil

    Adjudicatário: Merck Sharp and Dohme

    Preço contratual: 495.000,00 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil

    Adjudicatário: Merck Sharp and Dohme

    Preço contratual: 330.000,00 euros


    3Aquisição de serviços de limpeza

    Adjudicante: Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil

    Adjudicatário: Fine Facility Services

    Preço contratual: 244.636,14 euros


    4Aquisição de serviços de testes automatizados para serviços web e portais da INCM

    Adjudicante: Imprensa Nacional – Casa da Moeda

    Adjudicatário: Atos It Solutions and Services

    Preço contratual: 180.720,00 euros


    5Aquisição de reagentes

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil

    Adjudicatário: Hologic Iberica S.L.

    Preço contratual: 139.860,00 euros


    MAP

  • Neve na Serra da Estrela: neste Inverno, para a Infraestruturas de Portugal, será um “acontecimento imprevisível”

    Neve na Serra da Estrela: neste Inverno, para a Infraestruturas de Portugal, será um “acontecimento imprevisível”


    O Inverno começou nesta sexta-feira, e já se sabe que, mais dia menos dia, haverá, como em todos os outros anos, neve na Serra da Estrela. E é por esse motivo que a Infraestruturas de Portugal tem há anos um centro de limpeza de neve, com mais de uma dezena de equipamentos de desobstrução das vias. Para operar nesta época do ano, tem optado, por regra, em lançar concursos públicos para contratar trabalhadores temporários, por seis meses, mas este ano algo sucedeu e foi feito um ajuste directo de 207 mil euros. Para encontrar uma justificação para este contrato de mão-beijada, a empresa pública invocou uma norma que se torna caricata: assume que a necessidade de limpar a neve no Maciço Central da Serra da Estrela será, este Inverno, uma “urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis”.


    Com ou sem aquecimento global, até agora é coisa infalível mesmo se o país continua abrangido pelo clima mediterrânico em grande parte do território: a Infraestruturas de Portugal tem de reforçar esforços de limpezas das vias rodoviárias na serra da Estrela por causa da neve. Quase sempre a partir de Dezembro, excepcionalmente um mês antes, e a desobstrução das estradas de acesso à Torre, a 1991 metros de altitude, e à estância de ski, prolonga-se pelo início da Primavera.

    Pelo sim, pelo não, nos últimos anos a Infraestruturas de Portugal tem decidido contratar trabalhadores temporários, em vez de manter um número elevado de funcionários próprios no seu centro de limpeza de neve durante todo os 12 meses do ano. E assim tem sido, a atender pelos registos do Portal Base, desde 2016. Até aqui, enfim, tudo bem, atendendo às opções de gestão que podem considerar mais adequado a opção pelo chamado outsourcing em serviços com variações sazonais.

    Mas exactamente pela previsibilidade na necessidade de reforço dos serviços de limpeza da neve na serra da Estrela já causa estranheza que os gestores da Infraestruturas de Portugal tenham decidido este ano contratar a empresa que sempre tem arrecadado a aquisição de serviços em anos anteriores (mas por concurso público), alegando desta vez “motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante”. Ou seja, a própria Infraestruturas de Portugal considerou que este ano a neve naquela região é um acontecimento imprevisível. E assim assinou um contrato por ajuste directo com a Multitrab no valor de mais de 207 mil euros.

    De acordo com as peças processuais deste ajuste directo feito pela Infraestruturas de Portugal à Multitrab, o procedimento só foi iniciado no passado dia 17 de Novembro, quando a empresa pública decidiu convidar exclusivamente aquela empresa de trabalho temporário a apresentar uma proposta para fornecimento de 11 trabalhadores durante seis meses. Menos de um mês depois, na passada sexta-feira, 15 de Dezembro, o contrato foi assinado pelas partes.

    Poder-se-ia dizer que alguém nas Infraestruturas de Portugal se esquecera, ao contrário dos outros anos, de dar início a um concurso público – que tem maiores burocracias e um processo de decisão mais longo do que um ajuste directo – e que, dessa forma, teve de se encontrar um expediente de última hora. Mas essa possibilidade não colhe, nem pela via legal. Por exemplo, no ano passado, a Infraestruturas de Portugal lançou um concurso público, com o mesmo objectivo e um preço base de 201.500 euros, apenas em 9 de Novembro, concedendo um prazo de apresentação de propostas de oito dias. Isso permitiu a assinatura do contrato em 10 de Janeiro deste ano, ou seja, em termos homólogos em data posterior do ajuste directo da semana passada.

    Infraestruturas de Portugal é presidida por Miguel Cruz, ex-secretário de Estado do Tesouro.

    Por outro lado, o Código dos Contratos Públicos limita o recurso ao ajuste directo por “urgência imperiosa”, mesmo que abusivamente muitas entidades públicas se borrifem para esses pormenores perante a generalizada passividade do Tribunal de Contas. Com efeito, o artigo invocado pela Infraestruturas de Portugal salienta expressamente que a escolha do ajuste directo para a formação de qualquer contrato “por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante”, só pode ser feita “na medida do estritamente necessário” e se não for possível cumprir “os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”.

    Mostra-se assim caricato que a Infraestruturas de Portugal, com o seu centro de limpeza de neves a funcionar todos os anos, invoque uma norma que a coloca na situação de considerar que não conseguiu prever que irá nevar no Inverno que começou hoje mesmo.

    Mas, por outro lado, a Infraestruturas de Portugal não podia jamais alegar um atraso nos procedimentos para dar início a um concurso público, porque a norma impede o ajuste directo se as circunstâncias invocadas forem “imputáveis à entidade adjudicante”. Além disso, mesmo que houvesse mesmo uma circunstância imprevisível – por exemplo, começar a nevar em Novembro, enquanto estava ainda a decorrer um concurso público para serviços a iniciar em Janeiro –, a Infraestruturas de Portugal só deveria apenas fazer um ajuste directo para os meses de Novembro e Dezembro – ou seja, “na medida do estritamente necessário –, mantendo os trâmites para a conclusão do concurso público.

    Apesar de tudo isto, fonte oficial da Infraestruturas de Portugal não vê nada de anormal no ajuste directo deste ano por “urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante”, ou seja, por nevar na Serra da Estrela neste Inverno que se inicia agora. “Em situações de caráter excecional e transitório, o recurso a este regime é considerado como a opção mais ajustada, aplicando os procedimentos contratuais adequados a cada situação, sempre no respeito pelas regras do CCP [Código dos Contratos Públicos], não existindo qualquer prevalência da modalidade do ajuste direto, tendo já sido celebrados contratos com diversas empresas”, disse fonte oficial da empresa pública ao PÁGINA UM.

    E acrescenta ainda que, ao longo dos anos, “os contratos celebrados com a mencionada empresa Multitrab decorreram, assim, quase exclusivamente de procedimentos por concurso público”, e que o recurso à modalidade do ajuste directo alegando “urgência imperiosa”, ocorreu apenas “a título excecional no presente ano”, não explicando, contudo, os motivos.

    O Centro de Limpeza de Neve da Infraestruturas actua no Maciço Central da Serra da Estrela, garantindo a segurança dos utentes das vias e de todos os turistas, contando com diversos equipamentos de desobstrução, entre os quais nove limpa-neves.

  • Boletim P1 da contratação pública e ajustes directos: 24 Janeiro

    Boletim P1 da contratação pública e ajustes directos: 24 Janeiro


    Ontem, dia 24 de Janeiro, no Portal Base foram divulgados 1108 contratos públicos, com preços entre os 9,60 euros – para aquisição de economato, pela Águas do Norte, S. A., ao abrigo de acordo-quadro – e os 11.198.500,00 euros – para empreitada de construção civil de remodelação e ampliação da subestação de Recarei, pela REN – Rede Eléctrica Nacional, através de concurso limitado por prévia qualificação.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 31 contratos, dos quais 18 por concurso público, 12 ao abrigo de acordo-quadro, e um por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 18 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Serviços Sociais da Administração Pública (com a Eurest Portugal, no valor de 529.200,00 euros); sete do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (um com a Damos Vida – Serviços de Saúde, no valor de 489.855,30 euros,  com a Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos,  no valor de 276.100,00 euros, dois com a Werfen Portugal, ambos no valor de 111.840,00 euros, um com a Bristol – Myers Squibb, no valor de 109.496,20 euros, e outro com a Roche Farmacêutica, no valor de 105.420,00 euros); Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (com a InovaPrime – Serviços em Tecnologias de Informação, no valor de 365.000,00 euros); Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (com a PLG – Pharma, no valor de 349.000,00 euros); Estado Maior da Força Aérea (com a Uavision – Engenharia de Sistemas, no valor de 259.680,00 euros); Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (com a Advanz Pharma, no valor de 231.058,00 euros); Instituto dos Registos e do Notariado (com a PDMFC – Projectos de Desenvolvimento, Manutenção, Formação e Consultadoria, no valor de 198.000,00 euros); Unidade Local de Saúde do Nordeste (com a Uniself – Sociedade de Restaurantes Públicos e Privados, no valor de 156.950,73 euros); Município da Nazaré (com a SU Electricidade, no valor de 149.500,00 euros); Centro Hospitalar Tondela-Viseu (com a Biogen Idec, no valor de 127.845,18 euros); Município de Sintra (com a Actuasys, Lda., no valor de 116.096,38 euros); e o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (com a Servier Portugal, no valor de 108.900,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 24 de Janeiro

    1Empreitada de construção civil da remodelação e ampliação da subestação de Recarei

    Adjudicante: REN – Rede Eléctrica Nacional

    Adjudicatário: Graviner Construções

    Preço contratual: 11.198.500,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso limitado por prévia qualificação


    2Fornecimento de electricidade em regime de mercado livre para Portugal Continental

    Adjudicante: Direcção-Geral da Administração da Justiça

    Adjudicatário: Endesa Energia

    Preço contratual: 5.025.857,19 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    3Fornecimento de electricidade em regime de mercado livre para Portugal Continental

    Adjudicante: Administração Regional de Saúde do Norte

    Adjudicatário: Endesa Energia

    Preço contratual: 4.493.352,34 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    4Gestão de resíduos do Sistema de Água Residual de Santo André

    Adjudicante: Águas de Santo André, S.A.

    Adjudicatário: Ecodeal – Gestão Integral de Resíduos Industriais

    Preço contratual: 3.369.936,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Fornecimento de lubrificantes para as centrais termoeléctricas da EDA

    Adjudicante: EDA – Electricidade dos Açores

    Adjudicatário: Galp Açores

    Preço contratual: 2.758.240,93 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 24 de Janeiro

    1 Fornecimento de refeições confeccionadas para o período de 24 de janeiro a 29 de março de 2024

    Adjudicante: Serviços Sociais da Administração Pública

    Adjudicatário: Eurest Portugal

    Preço contratual: 529.200,00 euros


    2Serviço de transporte não urgente de doentes

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil

    Adjudicatário: Damos Vida – Serviços de Saúde

    Preço contratual: 489.855,30 euros


    3Aquisição de serviços para desenvolvimento do Sistema de Informação para a Gestão e Monitorização das Atividades e Projetos do IGFEJ

    Adjudicante: Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça

    Adjudicatário: InovaPrime – Serviços em Tecnologias de Informação

    Preço contratual: 365.000,00 euros


    4Aquisição de máscaras de protecção com três camadas, no âmbito do plano de contingência da covid-19

    Adjudicante: Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca

    Adjudicatário: PLG Pharma

    Preço contratual: 349.000,00 euros


    5Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil

    Adjudicatário: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos

    Preço contratual: 276.100,00 euros


    MAP

  • CEO da Global Media deixou Tal&Qual em falência técnica e com processo de 250 mil euros às costas

    CEO da Global Media deixou Tal&Qual em falência técnica e com processo de 250 mil euros às costas


    José Paulo Fafe ‘refundou’ o semanário Tal & Qual em 2021, mas bastaram-lhe dois anos para deixar a empresa gestora em falência técnica e um passivo de 334 mil euros. Mas também não quis mostrar à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) as contas da empresa Parem as Máquinas, que criou para gerir o semanário, nem elaborou o obrigatório relatório do governo societário. O regulador ainda andou meses a tentar ‘ajudar’ a Parem as Máquinas, mas perante o “manifesto desinteresse no cumprimento das obrigações legais”, a paciência esgotou-se. A ERC deliberou assim abrir um processo de contra-ordenação que, pela elevada gravidade, pode atingir um máximo de 250 mil euros. A comunicação da ERC para a Parem as Máquinas seguiu para o mesmo endereço da Páginas Civilizadas, o accionista maioritário da Global Media, liderada por José Paulo Fafe. Fica tudo em casa.


    O actual CEO da Global Media, José Paulo Fafe, não foi homem para deixar apenas a empresa Parem as Máquinas, detentora do semanário Tal & Qual – das quais foi gerente até Maio passado e director, respectivamente –, com dívidas de mais de 334 mil euros e em falência técnica ao fim de dois anos de existência. Deixou-lhe também um ‘legado’: um processo de contra-ordenação por violação reiterada das regras da Lei da Transparência dos Media. A coima a aplicar pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social pode chegar aos 250 mil euros, sendo que a sanção mínima é de 50 mil.

    A deliberação do regulador foi hoje divulgada, tendo sido aprovada no passado dia 6, e relata as pacientes diligências na tentativa de levar José Paulo Fafe, então gerente, a enviar os elementos financeiros da empresa do Tal & Qual, ‘refundado’ em 2021, bem como os relatórios do governo societário.

    José Paulo Fafe, ex-jornalista, ex-gerente da Parem as Máquinas e actual CEO da Global Media, que anunciou rescisões de até 200 colaboradores.

    De acordo com a deliberação, a Unidade de Transparência dos Media (UTM) da ERC começou por contactar a Parem as Máquinas no início de Abril deste ano quando foi detectada ausência completa de informação financeira relevante e o relatório do governo societário desde a sua inscrição. E adianta-se, em seguida, que após uma troca de mensagens electrónicas, “a Regulada [ou seja, José Paulo Fafe, que era então o seu representante legal] entrou em contacto com a ERC, por via telefónica”, acrescentando-se que “demonstrou falta de conhecimento e manifesto desinteresse no cumprimento das obrigações legais da transparência dos media”.

    Mesmo assim a UTM da ERC prestou-se a colaborar com José Paulo Fafe, enviando-lhe em 23 de Maio “uma minuta de Relatório de Governo Societário para auxílio da entidade [Parem as Máquinas] na respetiva elaboração”. Mas os meses foram passando, e nada.

    “À presente data, os serviços da UTM verificaram que a Regulada não tomou qualquer ação para sanar as faltas, de forma completa, nem apresentou qualquer fundamento para essas faltas, mantendo-se em incumprimento relativamente ao reporte dos elementos obrigatórios”, salienta-se na deliberação da ERC, concretizando que se verifica “a falta do reporte legalmente obrigatório dos indicadores financeiros de 2021 e de 2022, nos termos do artigo 5º da Lei da Transparência e do artigo 3º do Regulamento, e encontram-se em falta os elementos indicados no quadro 6 dos Relatórios de Governo Societário relativos aos anos de 2021 e 2022, nos termos do artigo 16º da Lei da Transparência, e, por remissão do nº 2, do artigo 5º, nº 1 a 7, do Regulamento.” E diz ainda que “falta igualmente identificar o Responsável pela Orientação Editorial da Publicação Periódica Tal&Qual e atualizar a estrutura do capital social em conformidade com o Registo Comercial”.

    Tal & Qual, ‘refundado’ em 2021 quis mostrar irreverência, enquanto, em simultâneo, nunca quis mostrar as contas exigidas pela Lei da Transparência dos Media.

    De facto, grande parte da parca informação que actualmente consta no Portal da Transparência dos Media encontra-se errada ou desactualizada, constando no registo sócios que já saíram da empresa há meses, e mesmo José Paulo Fafe surge ainda como gerente da Parem as Máquinas, apesar de já ter renunciado e deixado mesmo de ser sócio desde Outubro. Aliás, neste momento, nos registos da ERC nem sequer aparece qualquer responsável editorial do Tal & Qual, apesar de na ficha técnica deste semanário surgir o nome de Jorge Lemos Peixoto.  

    Nessa medida, não restou outra alternativa à ERC, agora liderada por Helena Sousa, do que instaurar um processo de contra-ordenação, que será agora conduzido pela Unidade de Contraordenações para a fixação da coima por uma mais que evidente violação da Lei da Transparência dos Media. Como a falta, ainda mais reiterada, e nem sequer por negligência, é considerada “muito grave”, a coima mínima prevista é de 50 mil euros, podem ir até aos 250 mil euros. A fixação da sanção dependerá também do preenchimento ou não dos elementos em falta, que são de preenchimento fácil se a Parem as Máquinas estiver para aí virada.

    Saliente-se que, apesar da formalização da sua saída da empresa Parem as Máquinas (e do Tal&Qual) em finais de Maio, e a sua subsequente entrada em Junho na gerência da Páginas Civilizadas (dominada pelo fundo das Bahamas), José Paulo Fafe nunca se desligou da realidade do Tal & Qual. Na verdade, apesar de ser gerida pela Parem as Máquinas, o título deste semanário está registado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) como pertencente à Global Media. E além disso, actualmente a Páginas Civilizadas compartilha a mesma sede, no Tagus Park, da Parem as Máquinas e do semanário Tal&Qual. Ou seja, ‘tudo em casa’.

    O francês Clement Ducasse é o beneficiário efectivo do World Opportunity Fund que controla agora a Global Media. A ERC quer que o grupo de media identifique os investidores ‘dentro’ do fundo, mas José Paulo Fafe já veio dizer que é “uma coisa de doidos”.

    Recorde-se que José Paulo Fafe deixou o semanário Tal & Qual e a Parem as Máquinas para assumir recentemente o cargo de presidente executivo da Global Media por indicação de um fundo sedeado nas Bahamas (World Opportunity Fund), que possui indirectamente a maioria do capital social do grupo que detém, entre outros, o Diário do Notícias, o Jornal de Notícias, O Jogo, o Dinheiro Vivo e a TSF, além de uma participação relevante na Lusa.

    Embora se conheça já o beneficiário efectivo do fundo bahamiano – o especulador financeiro globetrotter francês Clement Ducasse –, revelado em primeira mão pelo PÁGINA UM, a ERC tem estado a exigir à Global Media a identificação de pessoas ou entidades que tenham suficientes participações no World Opportunity Fund que impliquem direitos superiores a 5% naquele grupo de media. Na semana passada, José Paulo Fafe considerou, em entrevista ao Eco, ser “uma coisa de doidos”, a ERC exigir à Global Media “a identificação dos detentores de unidades de participação” do World Opportunity Fund, admitindo que nem ele sabe quantos depositantes tem. O azar de Fafe é que, apreciando ou não a transparência nos investimentos nos media, a lei lhe exige saber e indicar quem tem mais de 5% dos direitos de voto.

  • Ordem dos Médicos de Carlos Cortes vai a tribunal por não mostrar pareceres comprometedores escondidos por Miguel Guimarães

    Ordem dos Médicos de Carlos Cortes vai a tribunal por não mostrar pareceres comprometedores escondidos por Miguel Guimarães


    Afinal, mudam os tempos, mas mantêm-se as más vontades. O actual bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, decidiu divulgar em Setembro passado um parecer do Colégio de Pediatria, onde se desaconselhava a vacinação de jovens contra a covid-19 e criticava mesmo as pressões da indústria farmacêutica, mas continua a recusar mostrar dois pareceres de 2021 que foram ‘engavetados’ por ordem de Miguel Guimarães. Este anterior bastonário liderou uma campanha de ‘perseguição’ sobre os médicos que questionaram critérios de segurança e chegou mesmo a abrir um processo disciplinar contra o presidente do Colégio de Pediatria, Jorge Amil Dias. Em resultado desta recusa, o PÁGINA UM apresentou agora uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, através do seu FUNDO JURÍDICO.


    A Ordem dos Médicos, agora liderada por Carlos Cortes, recusa divulgar dois pareceres emitidos pelo seu Colégio de Pediatria em Julho e Outubro de 2021, no auge do polémico programa de vacinação de crianças e adolescentes contra a covid-19, que foram ‘engavetados’ pelo então bastonário Miguel Guimarães.

    Em resultado dessa recusa, o PÁGINA UM fez entrar ontem um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, que também requer a consulta de uma auditoria prometida no ano passado à campanha Todos por Quem Cuida.

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    A existência dos dois pareceres do Colégio de Pediatria, presidido pelo médico Jorge Amil Dias, escondidos em 2021, foi apenas conhecida através do texto do terceiro parecer sobre esta matéria, que o agora bastonário Carlos Cortes permitiu divulgar.

    Nesse terceiro parecer, com data de 13 de Setembro de 2023, além de se criticar as “manifestações públicas sobre o assunto, geralmente veiculadas ou patrocinadas pela indústria com directo interesse financeiro”, fazia-se desde logo referências aos outros dois pareceres, que aquele Colégio, “oportunamente submeteu” a Miguel Guimarães, que nunca se mostrou interessado em os divulgar, pelo contrário.

    Na verdade, embora o teor desses dois pareceres, relacionados com as vacinação de adolescentes e de crianças, não seja conhecido, Miguel Guimarães e o então Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos, presidido pelo pneumologista Filipe Froes, trataram de criar uma campanha pública de perseguição e ostracismo aos profissionais de saúde que colocavam dúvidas sobre a necessidade e a segurança da vacinação de menores.

    Filipe Froes (ao centro), com fortes ligações à indústria farmacêutica, foi mandatário da candidatura de Carlos Cortes (quarto à esquerda), actual bastonário da Ordem dos Médicos.

    O próprio presidente do Colégio de Pediatria, Amil Dias, seria mesmo alvo de um processo disciplinar por via de uma queixa assinada por, entre outros, Filipe Froes, Luís Varandas e Carlos Robalo Cordeiro, todos médicos com fortíssimas relações comerciais com a indústria farmacêutica, incluindo a Pfizer, que vendeu as vacinas para os menores. O processo seria arquivado apenas em Novembro do ano passado, mas durante meses conseguiu-se criar uma aura de censura contra os médicos que desaconselhavam a vacinação generalizada para jovens.

    O acesso aos dois pareceres escondidos, que agora o PÁGINA UM requereu que o Tribunal Administrativo de Lisboa obrigue a Ordem dos Médicos a mostrar, fará luz a um dos episódios mais amorais da Medicina moderna, em que autoridades de Saúde, médicos e a generalidade da imprensa criaram na segunda metade de 2021 um ambiente de pressão psicológica para pais levarem os filhos menores a vacinarem-se para supostamente se protegerem contra uma doença que se mostrava inofensiva para jovens saudáveis, e sobre a qual não existiam estudos aprofundados sobre os efeitos adversos.

    Em Portugal, entre Setembro e Novembro de 2021 foram vacinadas com pelo menos uma dose, mais de 560 mil jovens entre os 12 e os 17 anos. No caso das crianças entre os 5 e os 11 anos, cuja campanha de vacinação decorreu a partir do final de 2021 acabaram por ser inoculadas mais de 335 mil. Saliente-se que, antes da vacinação, não se registou qualquer vítima mortal causada pelo SARS-CoV-2 nestas faixas etárias.

    Miguel Guimarães e Ana Paula Martins foram, respectivamente, bastonários das Ordens dos Médicos e dos Farmacêuticos durante grande parte da pandemia.

    Recorde-se ainda que a mais recente norma da Direcção-Geral da Saúde, de Setembro passado, apenas passou a eleger para vacinação sazonal os profissionais e residentes em lares, os prestadores de serviços e cuidadores de saúde, os maiores de 60 anos e as pessoas com graves comorbilidades.

    O PÁGINA UM também requereu ao Tribunal Administrativo de Lisboa que obrigue a Ordem dos Médicos a mostrar uma suposta auditoria à campanha Todos por Quem Cuida, que durante a pandemia arrecadou mais 1,4 milhões de euros, sobretudo proveniente de farmacêuticas, e que permitiu condições para criar um “saco azul” de mais de 968 mil euros na Ordem dos Médicos, uma vez que foram usadas facturas falsas e outros esquemas de muito duvidosa legalidade. Esta campanha foi dirigida pelas Ordens dos Médicos e dos Farmacêuticos, e aquando de uma outra intimação (ganha pelo PÁGINA UM em 2022) aquelas entidades declararam ao Tribunal Administrativo de Lisboa que estavam a realizar uma auditoria à campanha, mas nunca a divulgaram.


    N.D. Os processos de intimação do PÁGINA UM só são possíveis com o apoio dos leitores. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados através do FUNDO JURÍDICO. Cada processo de intimação tem um custo mínimo inicial de 500 euros, que pode ser menor ou (muito) maior em função dos eventuais recursos ou do seu desfecho (favorável ou desfavorável). Neste momento, por força de duas dezenas de processos que intentámos nos últimos 20 meses, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras. Apoie esta iniciativa de um jornal independente que não teme lutar pelo acesso à informação.

  • Lusa usa e abusa de ajustes directos com a Altice

    Lusa usa e abusa de ajustes directos com a Altice


    A administração da Lusa – Agência de Notícias de Portugal é adepta dos contratos por ajuste directo. Só na passada sexta-feira, dia 15 de Dezembro, publicou na plataforma de registo das compras públicas (Portal Base) um total de cinco contratos adjudicados sem concurso. Um deles, foi efectuado com a Meo, da Altice, no valor de 259.797,72 euros e assinado a 6 de Abril deste ano, mas só agora divulgado.

    Mas esta não foi a única vez que a Lusa contratou serviços à Altice sem concurso. Desde 2015, altura em que a Altice passou a deter a Meo, a Lusa pagou, no total, mais de 4,6 milhões de euros na contratação de serviços à empresa. Dos 15 contratos efectuados entre a Lusa e a Meo, que constam do Portal Base, nove foram feitos por ajuste directo.

    A maior parte dos contratos, num total de 10, foram efectuados nos últimos cinco anos, envolvendo uma verba superior a 3,4 milhões de euros. Destes, seis foram realizados sem concurso.

    Para justificar a realização dos diversos contratos por ajuste directo, a agência noticiosa, que é detida maioritariamente pelo Estado, tem invocado diferentes artigos do Código dos Contratos Públicos. No caso do mais recente ajuste directo feito com o Meo, a Lusa invoca o artigo que refere que o ajuste directo pode ser feito quando “se trate de novos serviços que consistam na repetição de serviços similares que tenham sido objeto de contrato anteriormente celebrado pela mesma entidade adjudicante com o mesmo adjudicatário”.

    O anterior contrato da Lusa feito com a Meo no dia 29 de Abril de 2022, mas só publicado a 6 de Fevereiro deste ano, no valor de 112.977,51 euros, foi efectuado por concurso público. Nos contratos anteriores, observam-se vários que foram realizados sucessivamente por ajuste directo, nomeadamente em 2022 e 2018.

    Além dos contratos feitos com a Meo, a Lusa ainda pagou à Altice mais de 16 mil euros em três ajustes directos efectuados com o data center que o grupo detém na Covilhã.

    (Foto: D.R.)

    Não é só com a Meo que a Lusa dá primazia aos ajustes directos. Dos cinco contratos que a agência noticiosa fez sem concurso, publicados no dia 15 de Dezembro, três dizem respeito a serviços de aluguer de viaturas. Foram adjudicados a três entidades diferentes e somam a verba de quase 40 mil euros. Nestes casos, por exemplo, a justificação invocada pela Lusa, citando a lei, para o ajuste directo com a Leaseplan, no valor de 20.519,64 euros, para o “aluguer operacional de 6 viaturas” é de que é “necessário proteger direitos exclusivos, incluindo direitos de propriedade intelectual”. Também este contrato foi agora publicado com atraso, já que a data de assinatura é de 3 de Julho.

    Além de ser adepta da contratação sem concurso, a Lusa também demora meses a divulgar no Portal Base os contratos que faz.

    Questionada, ao início da tarde de hoje, sobre o número de ajustes directos que tem realizado, em particular com a Meo, a Lusa não respondeu às perguntas do PÁGINA UM, até à hora de publicação desta notícia.

    O contrato entre a Lusa e a Meo, da Altice, integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados no dia 15 de Dezembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    ET/MAP


    Nos últimos três dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 1082 contratos públicos, com preços entre os 12,05 euros – para aquisição de medicamentos, pela Administração Regional de Saúde do Algarve, ao abrigo de acordo-quadro – e os 7.674.279,89 euros – para empreitada de beneficiação, requalificação e ampliação do Hospital da Horta, pela Direcção Regional das Obras Públicas e Transportes Terrestres, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 13 contratos, dos quais 12 por concurso público e um por consulta prévia.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 14 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Associação de Solidariedade Social Recreio do Caramulo (com a Viseton – Engenharia e Construção, no valor de 274.544,90 euros); Lusa – Agência de Notícias de Portugal (com a MEO, no valor de 259.797,72 euros); Município de Vidigueira (com a António Saraiva & Filhos, Lda., no valor de 225.771,13 euros); Câmara Municipal de Mafra (com a Leaseplan Portugal, no valor de 177.417,68 euros); Município do Seixal (com a Bewg (Pt), no valor de 167.990,00 euros); dois do Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira (um com a Amgen – Biofarmacêutica, no valor de 154.728,00 euros, e outro com a Vertex Pharmaceuticals, no valor de 117.830,16 euros); Município de Espinho (com a IPAV – Instituto Padre António Vieira, no valor de 151.725,00 euros); Escola Básica e Secundária Professor Doutor Francisco de Freitas Branco (com a Porto Editora, no valor de 124.152,05 euros); Ministério da Defesa Nacional – Marinha (com a Thales Edisoft Portugal, no valor de 123.626,30 euros); Secretaria-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros (com a Fujitsu Technology Solutions, no valor de 121.367,60 euros); Município de Peniche (com a Medidata.Net – Sistemas de Informação para Autarquias, no valor de 115.859,16 euros); e o Município de Sintra  (com a Mind – Software Multimédia e Industrial, no valor de  102.464,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 15 a 17 de Dezembro

    1 Empreitada de beneficiação, requalificação e ampliação do Hospital da Horta

    Adjudicante: Direção Regional das Obras Públicas e Transportes Terrestres

    Adjudicatário: AFAVIAS – Engenharia e Construções; AFAVIAS – Engenharia e Construções Açores    

    Preço contratual: 7.674.279,89 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Requalificação de Escola Básica de 2º e 3º Ciclos

    Adjudicante: Município de Leiria

    Adjudicatário: Nova Gente – Empreitadas

    Preço contratual: 7.137.008,48 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público    


    3Aquisição de serviços de viagens, transportes aéreos e alojamento para 2023-2026

    Adjudicante: Secretaria-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros

    Adjudicatário: Escalatur – Viagens e Turismo

    Preço contratual: 5.573.170,73 euros

    Tipo de procedimento: Concurso limitado por prévia qualificação


    4Construção de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas em Lousada

    Adjudicante: Ave – Cooperativa de Intervenção Psico-Social

    Adjudicatário: NVE Engenharias

    Preço contratual: 4.788.634,18 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Construção de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas

    Adjudicante: Centro Social da Paróquia de Curvos

    Adjudicatário: Monte & Monte S.A.  

    Preço contratual: 3.094.185,63 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 15 a 17 de Dezembro

    1 Empreitada de alteração e ampliação de edifício destinado a creche

    Adjudicante: Associação de Solidariedade Social Recreio do Caramulo

    Adjudicatário: Viseton – Engenharia e Construção

    Preço contratual: 274.544,90 euros


    2Aquisição de serviços de comunicações electrónicas e outsourcing de infraestruturas de tecnologias de informação

    Adjudicante: Lusa – Agência de Notícias de Portugal

    Adjudicatário: MEO   

    Preço contratual: 259.797,72 euros


    3Reabilitação do Parque Urbano Verde de Vidigueira – Trabalhos complementares

    Adjudicante: Município de Vidigueira

    Adjudicatário: António Saraiva & Filhos, Lda.         

    Preço contratual: 225.771,13 euros 


    4Fornecimento de 15 viaturas usadas, dos tipos ligeiro de mercadorias e ligeiro de passageiros

    Adjudicante: Câmara Municipal de Mafra

    Adjudicatário: Leaseplan Portugal

    Preço contratual: 177.417,68 euros


    5Aquisição de serviços de recolha de resíduos sólidos urbanos pelo período de 204 dias

    Adjudicante: Município do Seixal

    Adjudicatário: Bewg (Pt)

    Preço contratual: 167.990,00 euros


    MAP