É o segundo processo de intimação ganho nos últimos 10 dias pelo PÁGINA UM. A Ordem dos Médicos recusava desde Outubro do ano passado a revelar todos os pareceres técnicos dos seus órgãos colegiais, alegando que alguns continham matéria reservada. Tem agora 10 dias para os entregar. No âmbito deste processo, o bastonário Miguel Guimarães também acusou o director do PÁGINA UM de litigância de má-fé. Também aqui perdeu. Os processos do PÁGINA UM têm sido apoiadas pelo seu FUNDO JURÍDICO, suportado pelos leitores.
A Ordem dos Médicos foi sentenciada hoje pelo Tribunal Administrativo de Lisboa a disponibilizar ao director do PÁGINA UM, no prazo de 10 dias, “o acesso à totalidade dos pareceres técnicos concedidos ao longo de 2020 e 2021, emitidos pelos seus Colégios, Secções dos Colégios e demais órgãos técnicos e consultivos, homologados pelo Conselho Nacional em processo administrativo, expurgados da informação relativa à matéria reservada”.
A associação profissional que tem funções públicas, liderada pelo urologista Miguel Guimarães, foi também condenada a pagar as custas processuais.
Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, queria ver o director do PÁGINA UM condenado por “litigância de má-fé”.
O processo pode ainda ter recurso para o Tribunal Central Administrativo do Sul, com efeitos suspensivos, mas cai já por terra a pretensão da Ordem dos Médicos que pagou a um gabinete de advogados para tentar convencer o Tribunal Administrativo a condenar o director do PÁGINA UM por “litigância de má-fé”, tendo mesmo solicitado que este fosse “condenado em multa e indemnização”.
Em causa está um pedido feito em 29 de Outubro do ano passado – quando o PÁGINA UM estava a preparar o seu arranque – para que a Ordem dos Médicos concedesse o acesso aos pareceres emitidos durante a pandemia, uma vez que existiam informações de o bastonário não estar a revelar todos aqueles que iam sendo elaborados e aprovados.
A Ordem dos Médicos recusou revelar aqueles que, segundo os seus serviços, continham “dados nominativos”, mas nunca se disponibilizou a identificar quantos e quais eram esses pareceres nem a expurgar as partes que contivessem matéria reservada, i.e., identificação concreta de pessoas, o que pode ser feita através de uma simples rasura.
Primeira página da sentença que condena a Ordem dos Médicos a entregar pareceres escondidos.
Mesmo após um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) em 20 de Janeiro passado, a Ordem dos Médicos manteve-se irredutível em disponibilizar os pareceres, apenas reagindo após um novo requerimento do PÁGINA UM em 27 de Abril passado.
Apesar de o gabinete de Miguel Guimarães ter então, finalmente, enviado uma lista de várias dezenas de pareceres, mas nem todos, confessando que existiam pareceres que não divulgava por estarem sob reserva.
Contudo, não esclarecia quantos nem sobre o que versavam esses pareceres sob reserva nem quais os motivos para não serem expurgadas essas partes para posterior disponibilização.
O juiz do Tribunal Administrativo de Lisboa que analisou o processo de intimação veio agora dar razão ao PÁGINA UM, defendendo que “para a recusa de acesso a documento (…) não basta a mera alegação, vaga e genérica, desprovida de qualquer concretização factual, mas antes sendo exigido que a entidade sujeita ao dever de informação concretize, de modo fundamentado, que os documentos contêm segredos comerciais, industriais e dados internos da vida da empresa, visto estar em causa a restrição a um direito com assento constitucional”.
A sentença refere ainda que a Ordem dos Médicos apenas poderia recusar o acesso, caso a caso, de alguns dos pareceres se os identificasse e justificasse “os concretos motivos” pelos quais continham matéria reservada, algo que o gabinete de Miguel Guimarães nunca fez. O juiz do Tribunal Administrativo de Lisboa diz mesmo que agir como a Ordem dos Médicos fez é “de uma opacidade que não se mostra compaginável com o princípio da administração aberta constitucionalmente plasmado.”
E, em consequência, determinou também a “correlativa improcedência do pedido de condenação do Requerente [director do PÁGINA UM] por litigância de má-fé”, frustrando assim os intentos de Miguel Guimarães em ver punida a liberdade de investigação jornalística num país democrático.
Recorde-se que corre ainda outro processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa contra a Ordem dos Médicos, e que envolve também a Ordem dos Farmacêuticos, por denegação do acesso ao PÁGINA UM dos documentos operacionais e contabilísticos da campanha “Todos por Quem Cuida”.
N.D. – Os custos e taxas dos processos desencadeados pelo PÁGINA UM são exclusivamente suportados pelo FUNDO JURÍDICO financiado pelos seus leitores. Rui Amores é o advogado do PÁGINA UM neste e nos outros processos administrativos em curso.
Pela primeira vez, um jornalista não acatou um “capricho” do poderoso Conselho Superior da Magistratura (CSM) – que recusou disponibilizar documentação pública – e foi irredutível na defesa de uma imprensa independente. Como réu, no Tribunal Administrativo de Lisboa, o CSM acaba de ser intimado para, em 10 dias, facultar ao PÁGINA UM o acesso ao inquérito às alegadas irregularidades na distribuição da Operação Marquês em 2014. Dia histórico para a imprensa na luta pelo acesso à informação. Consulte a sentença.
A sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, anunciada hoje é clara: “Em face do que antecede, julgo a presente acção intentada por Pedro Almeida Vieira [director do PÁGINA UM] procedente e, em consequência, intimo o Conselho Superior da Magistratura [CSM] a, no prazo de 10 dias, facultar-lhe o acesso aos documentos por aquele solicitados através do seu requerimento de 2 de Dezembro de 2021”.
Este é o corolário de sete meses de legítima pressão do PÁGINA UM – consubstanciada na Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e da Lei da Imprensa – sobre o CSM para a obtenção do célebre inquérito à distribuição do processo da Operação Marquês em 2014 – então entregue sem sorteio ao juiz Carlos Alexandre, e que culminaria então com a detenção do ex-primeiro-ministro, José Sócrates.
Conselho Superior da Magistratura quis sempre manter secretismo sobre os meandros da Operação Marquês.
O CSM andava sistematicamente a recusar à imprensa a divulgação daquele inquérito que eventualmente traz luz sobre as irregularidades praticadas aquando da entrega daquele processo judicial ao juiz Carlos Alexandre.
Numa primeira fase, o CSM recusou essa pretensão ao PÁGINA UM – como já fizera inicialmente com Sócrates. Em 21 de Dezembro passado, a juíza Ana Sofia Wengorovius – adjunta do CSM – emitiu um parecer alegando que o acesso por um jornalista àqueles documentos violaria ou afectaria “os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”, salientando que, para alguém poder consultar o inquérito, teria obrigatoriamente de invocar um “interesse atendível ou legítimo”.
Primeira das 21 páginas da sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa contra o Conselho Superior da Magistratura
Face à intransigência do CSM, o PÁGINA UM recorreu à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), presidida pelo juiz conselheiro Alberto Oliveira, que viria a dar razão ao PÁGINA UM em 17 de Fevereiro.
Mas nem assim o CSM se disponibilizou a ceder os documentos do inquérito, advogando que o parecer da CADA não era vinculativo – e, de facto, deveria ser, para ser consequente –, acabando por “convidar” o PÁGINA UM a recorrer para o Tribunal Administrativo de Lisboa. O órgão superior de gestão e disciplina dos juízes dos tribunais judiciais portugueses considerou, através da juíza Ana Cristina Chambel Matias que “o Requerente [director do PÁGINA UM] não invocou, nem demonstrou que o acesso aos documentos constantes do processo de averiguações em causa são necessários para a tutela de um qualquer seu direito ou interesse legalmente protegido para que lhe seja conferido o direito a esse acesso”, acrescentando que “apesar de notificado por mais de uma vez pelo CSM, não concretizou cabalmente os elementos pretendidos dentro das condicionantes próprias do procedimento e não esclareceu qual a finalidade do acesso e da recolha de tais documentos”.
Na verdade, o PÁGINA UM sempre alegou que o estatuto de jornalista era suficiente, tendo sim recusado justificar se a consulta se consubstanciaria em notícia ou não.
Certo é que o juiz do Tribunal Administrativo que analisou o processo de intimação intentado pelo PÁGINA UM em Abril – o primeiro a dar entrada através do FUNDO JURÍDICO constituído por donativos dos leitores –, não foi sensível aos argumentos do CSM. Na verdade, em sede de contestação, o CSM insistiu na tese da existência de “dados nominativos” nos documentos do inquérito. Porém, em vez de acreditar piamente no CSM, o juiz Pedro Almeida Moreira exigiu-lhes que enviassem “em envelope selado, cópia dos documentos a que o Requerente [director do PÁGINA UM] pretende aceder, de molde a permitir a este Tribunal aquilatar se os mesmos contêm ou não ‘múltiplos dados pessoais’ e, ‘se a isso se chegar, tecer um juízo de proporcionalidade concernente aos interesses que aqui se encontram concretamente em jogo’”.
A sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa acabou assim por comprovar que o CSM, desde o início, estava a alegar com argumentos muito distantes da verdade factual.
Com efeito, na sua sentença, o juiz Pedro Almeida Moreira salienta que afinal o inquérito à distribuição da Operação Marquês “não configura um documento nominativo, em sentido próprio”, uma vez que “em causa estão unicamente dados atinentes aos intervenientes no procedimento de distribuição processual, atuando no exercício das funções públicas que lhes estão por lei cometidas, não abrangendo qualquer informação relativa à dimensão da vida privada”.
A Operação Marquês, envolvendo o antigo primeiro-ministro José Sócrates, transformou-se numa “novela” tenebrosa que mancha a Justiça de um país democrático.
O juiz do Tribunal Administrativo de Lisboa acaba mesmo por tecer duras críticas às alegações do CSM: “a vingar a interpretação que aqui é propugnada pelo Requerido [CSM], isso significaria que o mero nome de um funcionário público que tenha intervindo num qualquer procedimento administrativo apenas poderia ser tornado acessível aos interessados após a ponderação dos interesses em jogo no âmbito de um juízo de proporcionalidade, o que não se mostra aceitável em face das exigências de transparência que impendem sobre a Administração, nos termos constitucional e infraconstitucionalmente consagrados.
O CSM pode ainda recusar acatar esta sentença, recorrendo para o tribunal superior, mas arrisca-se a sofrer uma terceira derrota, depois de ver a CADA – presidida por um juiz conselheiro – e o Tribunal Administrativo de Lisboa a indicarem-lhe o caminho: a transparência, que deveria ser apanágio de um órgão da sua natureza, sobretudo se estiver, como se julga estar, inserido num Estado Democrático.
N.D. – Os custos e taxas dos processos desencadeados pelo PÁGINA UM são exclusivamente suportados pelo FUNDO JURÍDICO financiado pelos seus leitores. Rui Amores foi o advogado do PÁGINA UM neste e nos outros processos administrativos em curso.
Desde 1993 há uma lei, cheia de boas intenções, para promover a abertura dos arquivos da Administração Pública aos cidadãos, mas na prática, três décadas depois da sua criação, a cultura de secretismo e de obscurantismo continua bem enraizada. As queixas à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) sucedem-se, mas muitas caem em “saco roto”, até porque cada vez mais entidades públicas nem se dão ao trabalho de justificarem os seus actos. A lei até diz que os funcionários públicos têm o dever de colaboração com a CADA, sob pena de responsabilidade disciplinar, mas ninguém se importa. Eis o obscurantismo em todo o seu esplendor no Portugal democrático do século XXI.
Quatro em cada 10 entidades que não satisfizeram pedido de consulta de documentos públicos nem sequer colaboram com a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) quando esta entidade elaborou os seus pareceres após a recepção de queixas. Esta situação é bem reveladora de uma postura de obscurantismo da Administração Pública, que se tem vindo a agravar, como o PÁGINA UM tem revelado.
De acordo com um levantamento exaustivo aos 304 pareceres resultantes de queixas decididas em 2021 pela CADA – a entidade responsável pela regulação do direito dos cidadãos a acederem a documentos da Administração Pública e outras entidades com funções similares –, houve 121 que ficaram sem resposta à solicitação para serem apresentadas justificações para a recusa.
Saliente-se que a legislação, criada em 1993, estipula que “todos os dirigentes, funcionários e agentes dos órgãos e entidades a quem (…) têm o dever de cooperação com a CADA, sob pena de responsabilidade disciplinar ou de outra natureza”.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), tuteladas pelo Ministério do Ambiente e da Acção Climática, encabeçam a lista das entidades públicas ou equiparadas que mais ignoraram a CADA, que é presidida pelo juiz conselheiro Alberto Oliveira.
A APA, presidida por Nuno Lacasta, esteve envolvida em nove queixas, por recusa de acesso a documentos, e apenas respondeu a três ofícios da CADA. Já Nuno Banza, presidente do ICNF, teve pior desempenho: em sete queixas, deu zero respostas à CADA.
Na lista compilada pelo PÁGINA UM destacam-se ainda o Instituto da Segurança Social (com cinco queixas não respondidas), a Câmara Municipal de Grândola e o Agrupamento de Escolas dos Templários de Tomar (ambas com quatro queixas, respectivamente), e a Câmara Municipal do Porto (com três queixas). Nestes processos, a vasta maioria dos requerentes são cidadãos.
Nuno Banza (primeiro à direita), presidente do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas. Esta entidade teve sete queixas por recusar o acesso a documentos públicos em 2021. Em nenhum caso apresentou sequer justificação à CADA.
Uma parte substancial destas queixas foi intentada por organizações não-governamentais, sobretudo associações ambientalistas, como é o caso da Zero. No ano passado, esta associação solicitou informação por três vezes à APA e por sete vezes ao ICNF, mas só com a intervenção da CADA conseguiu a informação pretendida.
Francisco Ferreira, presidente da Zero, lamenta esta situação: “Compreendemos que possa existir dificuldades em responder com celeridade em alguns casos, mas não é aceitável que não haja sequer uma resposta onde se proponha uma data para satisfação pedidos”. Para este ambientalista,“tem de ser implementada uma cultura na Administração Pública que permita uma maior transparência na divulgação da informação”.
Questionado o Ministério do Ambiente sobre a postura dos seus dirigentes, o gabinete de Duarte Cordeiro diz que, no futuro, “tudo fará para obstar a que estas situações se repitam com entidades que tutela e com elas procurará estabelecer mecanismos para ultrapassar essas dificuldades”, acrescentando que o ministro é “um defensor do acesso à informação por parte dos cidadãos e de uma administração transparente”.
Quanto à CADA – cujos pareceres são não-vinculativos, ou seja, mesmo se favorável aos queixosos a entidade requerida pode continuar a recusa, obrigando a um processo de intimação no Tribunal Administrativo –, não aparenta grande incomodidade por ser ignorada por muitas entidades da Administração Pública, dizendo que “corresponder ao convite é uma opção da entidade demandada”.
Sobre a possibilidade de tornar vinculativos os pareceres, Alberto Oliveira refere que “a opção legislativa, desde a primeira Lei [em 1993] (…) tem sido a de contemplar a CADA como uma figura próxima da do Ombudsman, também sem poderes vinculativos.” E acrescenta ainda que “uma característica específica da CADA, face à figura genérica do provedor de justiça, é a de que, diferentemente do que com este acontece, a apresentação tempestiva de queixa à CADA interrompe o prazo para propositura de intimação contenciosa”.
Uma vantagem que, diga-se, constitui uma vantagem irrelevante ou até contraproducente, porque se as entidades públicas recusarem o pedido do requerente e depois não cumprirem o parecer não-vinculativo da CADA, resta apenas então o recurso ao Tribunal Administrativo. Ou seja, na prática, mesmo que a Justiça dê razão ao requerente, perde-se apenas meses de forma inglória e gasta-se dinheiro, não havendo qualquer punição do dirigente da Administração Pública que recusou indevidamente um direito dos cidadãos.
Aliás, tem sido para acelerar o processo de acesso que o PÁGINA UM decidiu, em alguns casos, nem sequer recorrer à CADA: opta antes por fazer logo entrar no Tribunal Administrativo um processo de intimação, como aliás sucederá com a recusa da ministra Marta Temido em abrir os arquivos do Ministério da Saúde desde 2020.
Sobre a norma que estipula que “todos os dirigentes, funcionários e agentes dos órgãos e entidades a quem (…) têm o dever de cooperação com a CADA, sob pena de responsabilidade disciplinar ou de outra natureza”, o presidente daquela instituição nada refere. A impunidade é absoluta.
O PÁGINA UM solicitou acesso aos documentos administrativos na posse do gabinete da ministra Marta Temido desde Janeiro de 2020. Resposta: o pedido é “manifestamente excessivo, abusivo e, logo, inexequível”. O caso seguirá agora para Tribunal Administrativo, através do FUNDO JURÍDICO do PÁGINA UM, mas desde já fica claro que o Ministério da Saúde não aprecia que se veja in loco a sua acção política ao longo dos últimos dois anos e meio.
A Secretaria-Geral do Ministério da Saúde considera que o pedido do PÁGINA UM para aceder aos ofícios, pareceres, relatórios e outros documentos administrativos na posse do Gabinete de Marta Temido desde 2020 é “manifestamente excessivo, abusivo e, logo, inexequível”, acrescentando que assim “não nos é possível satisfazer o solicitado”.
Esta é a resposta ontem enviada ao PÁGINA UM no decurso de um pedido expresso, ao abrigo da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), onde se solicitava “o acesso a cópia digital ou em papel, ou outro qualquer formato, de (…) correspondência oficial, pareceres, relatórios e outros documentos escritos ou em formato audiovisual, na posse do Ministério da Saúde (e respectivas Secretarias de Estado), por si elaborados ou elaborados por outras entidades públicas e privadas, ou mesmo por particulares (incluindo assessores e consultores), produzidos desde Janeiro de 2020 até à data.”
Marta Temido, ministra da Saúde.
No seu pedido, o PÁGINA UM discriminou uma lista exaustiva de mais de duas dezenas de entidades nacionais e internacionais que tivessem sido destinatárias ou remetentes dos documentos em posse do Ministério de Marta Temido, entre as quais a Direcção-Geral da Saúde, o Infarmed, as Administrações Regionais de Saúde, o Conselho Nacional de Saúde, o Gabinete do Primeiro-Ministro, a Presidência de Conselhos de Ministros, a Assembleia da República, a Presidência da República, a Ordem dos Médicos, os Conselhos de Administração das unidades de saúde do SNS e do sector privado, a APIFARMA, as empresas farmacêuticas, a Agência Europeia dos Medicamentos, a Comissão Europeia e diversas instituições da União Europeia.
Apesar desse detalhe, e ignorando na resposta ser este pedido feito por um órgão de comunicação social – cujos direitos de acesso estão consagrados na Constituição da República Portuguesa, na Lei da Imprensa e no Estatuto do Jornalista –, o Ministério da Saúde defende que “as entidades não estão obrigadas a satisfazer pedidos que, face ao seu carácter repetitivo ou sistemático ou ao número de documentos requeridos sejam manifestamente abusivos, sem prejuízo do direito de queixa do requerente”.
Recorde-se, porém, que a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos não estipula a partir de que “número de documentos requeridos” se considera os pedidos “manifestamente abusivos”, sendo certo que, se tal for feito de forma arbitrária, significaria a denegação do direito de informação incompatível num Estado democrático. Ainda mais sendo feito por um órgão de comunicação social num processo de investigação jornalística.
Na verdade, a LADA prevê sim que, nos casos da existência de muitos documentos para consulta, a entidade pública requerida possa ter mais tempo – até dois meses, em vez de 10 dias – para os disponibilizar, por fases, mas sempre fundamentando previamente.
No seu ofício, embora negando desde já permissão de acesso ao seu arquivo sem condicionalismos nem restrições – que permitiria conhecer em detalhe todas as orientações da sua política nos últimos dois anos e meio –, o Ministério da Saúde ainda sugere que o director do PÁGINA UM esclareça “qual a informação que pretende aceder, em termos claros e precisos”, deduzindo-se que Marta Temido queira que o jornalista indique os números dos ofícios ou os títulos dos relatórios ou os autores dos pareceres que só o seu gabinete conhece na íntegra.
Na verdade, o PÁGINA UM – e qualquer cidadão – poderia escolher os documentos produzidos e à guarda do Ministério da Saúde se o gabinete cumprisse o estabelecido na LADA. Com efeito, a alínea a) do nº 1 do artigo 10º deste diploma legal – existentes desde 1993 para promover a transparência na Administração Pública – estabelece que “os órgãos e entidades a quem se aplica a presente lei publicitam nos seus sítios na Internet, de forma periódica e atualizada, no mínimo semestralmente, os documentos administrativos, dados ou listas que os inventariem que entendam disponibilizar livremente para acesso e reutilização nos termos da presente lei, sem prejuízo do regime legal de proteção de dados pessoais”.
Isto é, o Ministério da Saúde ostensivamente não divulga a lista dos documentos que produz e só mostra eventualmente disposição em os divulgar se um jornalista adivinhar a sua referência administrativa interna em detalhe.
O PÁGINA UM irá recorrer ao Tribunal Administrativo de Lisboa com um processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos e passagem de certidões contra o Ministério da Saúde. Esta iniciativa utilizará, como habitualmente, o seu FUNDO JURÍDICO.
A pandemia da covid-19 e a invasão da Ucrânia pela Rússia foram dois autênticos “terramotos” na vida do Velho Continente, com a União Europeia a assumir um protagonismo nunca anteriormente visto sobre os países-membros e os seus cidadãos. Conseguirá a democracia sobreviver neste processo?
Num debate organizado pela Cidadania XXI, na passada terça-feira, o advogado José Luís da Cruz Vilaça e a jurista Maria Vieira da Silva discutiram (e discordaram) sobre a actuação da União Europeia (UE) na salvaguarda das liberdades e garantias dos cidadãos. As decisões tomadas durante a pandemia, como a criação do certificado digital, estiveram “sob escrutínio”.
Especializada em Direito da UE, Maria Vieira da Silva lançou duras críticas à Comissão Europeia e ao Conselho Europeu, e a algumas das suas últimas directivas, comparando mesmo muitas das decisões das instituições comunitárias com as do Partido Comunista Chinês. “Não reconheço a actual UE e é doloroso dizê-lo”, afirmou a jurista, acrescentando que “quando falamos em democracia falamos em separação de poderes, e na UE já não existe essa separação”.
Debate colocou em confronto as opiniões de José Luís da Cruz Vilaça e Maria Vieira da Silva, em debate moderado por Carlos Gomes.
Considerando ainda que no seio da UE apenas já se usa a “liberdade como um slogan”, e que se vende os “direitos fundamentais como meras mercadorias a empresas privadas” – citando o exemplo do Facebook –, Maria Vieira da Silva questionou “onde fica a liberdade de expressão” aludindo, como exemplo, à Lei dos Serviços Digitais.
Recorde-se que esta legislação delega aos proprietários das redes sociais a capacidade de determinar os conteúdos que podem ou não ser publicados. Ou seja, é uma “autoridade extra-judicial, que tem a tarefa de estabelecer o que é falso ou verdadeiro, legal ou ilegal”, destacou Maria Vieira da Silva.
Posição distinta neste debate teve José Luís da Cruz Vilaça, advogado e antigo juiz do Tribunal de Justiça da UE, que disse não ter “uma visão apocalíptica do estado de direito“ na principal instituição do Velho Continente. “Não existe um problema sistémico de proteção dos direitos”, defendeu, tendo destacado a importância do Tribunal de Justiça da UE na definição jurisprudencial dos direitos fundamentais dos cidadãos europeus.
No que diz respeito à polémica regulamentação do espaço digital, José Luís da Cruz Vilaça disse que “o problema tem sido o de conciliar os vários direitos fundamentais”, podendo, neste processo, “haver direitos que entrem em confronto“, como a liberdade de expressão e a segurança dos utilizadores. O advogado ressaltou ainda que se “devem aplicar aos meios digitais os mesmos princípios que se aplicam fora desses meios“.
Neste debate houve, também, espaço para questionar a integridade da UE, aspecto em que Maria Vieira da Silva acusou a instituição de se deixar corromper pela influência do lobbying: “existem cerca de 30 mil lobistas activos em Bruxelas que exercem mais influência sobre as instituições comunitárias do que todos os eurodeputados”. Para esta jurista, a “UE foi concebida segundo os direitos democráticos, mas foi privada da capacidade de lhes dar resposta”.
As decisões da UE em reacção à invasão da Ucrânia pela Rússia também estiveram em discussão, merecendo, de igual modo, a reprovação de Maria Vieira da Silva. “Achei escandaloso o facto de a Comissão Europeia suspender os canais russos, só porque Van der Leyen achou que manipulam a verdade dos factos”, considerou.
Defendendo a liberdade de expressão como necessária às sociedades democráticas e o artigo 11 da Carta dos Direitos Fundamentais, a jurista manifestou ainda preocupação com “o risco de deitarmos fora os valores ocidentais”.
Por sua vez, José Luís da Cruz Vilaça optou por fazer a apologia de que ”somos todos mais fortes com a UE”, defendendo que essa “cidadania [comunitária] acrescenta muitos mais direitos do que deveres às cidadanias nacionais”. O antigo juiz do Tribunal de Justiça da UE admitiu, porém, que “a guerra veio alterar um pouco” o panorama jurídico europeu.
Num ponto houve consenso. Cruz Vilaça e Maria Vieira da Silva posicionaram-se contra o silenciamento mediático daqueles que, por criticarem a gestão da pandemia, foram rotulados com o epíteto de “negacionistas”. Nesse aspecto, o advogado considerou “lamentável que nem todas as pessoas possam exprimir-se da mesma forma”.
Depois de tentar convencer, sem sucesso, a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos para não dar razão ao PÁGINA UM, e manter escondidos dados sensíveis para proteger farmacêuticas, o Infarmed terá agora de convencer o Tribunal Administrativo de Lisboa de que o secretismo da Administração Pública é a melhor forma de se viver numa sociedade democrática.
O PÁGINA UM deu esta tarde entrada no Tribunal Administrativo de Lisboa com um processo de intimação contra o Infarmed, a agência reguladora do medicamento em Portugal. O processo, considerado urgente, com o número 980/22.5BELSB, deverá ser amanhã distribuído a um juiz, o que implicará que o Infarmed seja constituído réu e imediatamente citado para responder no prazo de 10 dias.
Em causa está a recusa desta entidade, presidida por Rui dos Santos Ivo – que ocupou, entre 2008 e 2011, o cargo de director executivo da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA) –, em acatar um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) para disponibilizar o acesso ao PÁGINA UM dos dados brutos relativos aos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19 e também do anti-viral remdesivir, um polémico fármaco da Gilead.
Este processo de intimação insere-se na campanha do PÁGINA UM em prol da defesa da informação científica e da transparência, sendo integralmente financiada pelo FUNDO JURÍDICO, através de donativos dos leitores na plataforma MIGHTYCAUSE, tendo como patrono o advogado Rui Amores, especialista em Direito Administrativo.
A acção de intimação do PÁGINA UM pretende contrariar a posição de obscurantismo do Infarmed que defende que devem ser apenas disponibilizados ao público “os dados constantes da base de dados EudraVigilance”, mesmo sabendo que estes são apresentados em formato agregado, não sendo possível grande detalhe informativo.
Na sua deliberação de 1 de Abril passado, onde recusa o acesso de informação a um órgão de comunicação social – violando assim a Lei da Imprensa –, a direcção do Infarmed conclui que, “face ao parecer emitido [pela CADA] e no quadro dos regimes legislativos e regulamentares supra expostos, é [nosso] entendimento (…) que os dados solicitados devem ser obtidos por consulta à base de dados” da Agência Europeia do Medicamento.
Recorde-se que, em carta enviada à CADA, onde tentou convencer aquela entidade a não conceder opinião favorável ao PÁGINA UM, Rui dos Santos Ivo defende que os jornalistas são “não-especialistas” com “um elevado potencial para criar alarme social totalmente desnecessário e infundado”.
Pagamento de custas do processo de intimação contra o Infarmed
O director do PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira, tem formação académica multidisciplinar e é mesmo sócio da Associação Portuguesa de Epidemiologia.
Opinião contrária teve a CADA, presidido pelo juiz conselheiro Alberto Oliveira, ao considerar num seu parecer de 16 de Março passado que “a informação solicitada” ao Infarmed constitui mesmo “documentos administrativos” não-nominativos – ou seja, sem possibilidades de identificar pessoas.
Por outro lado, esta entidade salientava que “o interesse público no conhecimento de elementos que possam informar quanto à segurança da vacina [contra a covid-19] é, por conseguinte, manifesto”.
E relembrava ainda ao Infarmed um aspecto óbvio em democracia: “as entidades não podem limitar o acesso com base no receio de alguma deturpação que possa ser feita”.
Este é o segundo processo de intimação intentado pelo PÁGINA UM este mês, após ter também colocado no banco dos réus o Conselho Superior de Magistratura por recusar ceder documentos administrativos relacionados com a inspecção à distribuição do Operação Marquês ao juiz Carlos Alexandre.
O FUNDO JURÍDICO DO PÁGINA UM pode ser apoiado através da plataforma do MIGHTYCAUSE ou pedindo informações complementares pelo correio electrónico geral@paginaum.pt.
Primeira acção de intimação do PÁGINA UM, utilizando o seu FUNDO JURÍDICO, pretende obrigar o Conselho Superior da Magistratura a ceder documentos administrativos sobre a Operação Marquês. A entidade de cúpula do sistema judiciário já foi mesmo hoje citada pelo Tribunal Administrativo de Lisboa para responder em 10 dias. Visando aumentar a transparência e abertura da Administração Pública, nas próximas semanas o PÁGINA UM intentará processos similares contra o Infarmed, a Direcção-Geral da Saúde e a Ordem dos Médicos.
O PÁGINA UM apresentou ontem uma acção de intimação no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM).
Em causa está a recusa desta entidade de cúpula do sistema judiciário português em facultar o acesso aos documentos de inspecção à distribuição do processo da Operação Marquês em 2014 – onde o ex-primeiro-ministro José Sócrates é o principal arguido –, contrariando mesmo um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA).
Extracto da citação ao Conselho Superior de Magistratura hoje feita pelo Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa.
Inicialmente, o CSM exigia que o director do PÁGINA UM PÁGINA UM esclarecesse “qual a finalidade do acesso e da recolha” dos documentos solicitados, embora a juíza Ana Sofia Wengorovius, encarregada da protecção de dados daquela entidade defendesse, desde já, num longo parecer de sete páginas, o secretismo deste inquérito, que na verdade se trata da “averiguação sumária nº 2018-346/AV”.
Mais tarde, após o parecer favorável da CADA, o CSM reiterou a recusa, recordando que os pareceres daquela entidade “não são vinculativos”, e desafiava “o requerente [director do PÁGINA UM] querendo, intentar respetiva acção especial de acesso a documento administrativo”.
Esta inédita acção de intimação do PÁGINA UM contra o CSM – é a primeira vez que uma acção deste género é intentada por um órgão de comunicação social contra este organismo para “prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões” – já foi hoje distribuída ao juiz Pedro de Almeida Moreira, tendo o processo recebido o número 894/22.9BELSB.
O processo intentado pelo PÁGINA UM tem como patrono o advogado Rui Amores, e o valor da causa é de 30.000,01 euros para permitir a possibilidade de recurso ao Supremo Tribunal Administrativo em caso de o juiz Pedro de Almeida Moreira considerar que o CSM tem o direito, 48 anos após a instauração da democracia em Portugal, de manter escondido documentos que exemplificam o funcionamento do sistema judiciário do país.
Pagamento de custas do processo de intimação contra o Conselho Superior da Magistratura
Os custos processuais – incluindo a taxa de 306 euros, já pagos – serão integralmente pagos pelo FUNDO JURÍDICO do PÁGINA UM, criado no passado dia 1 de Abril através de donativos dos leitores. Actualmente, este fundo conta com o apoio de cerca de 150 pessoas e um montante arrecadado já acima dos 4.000 euros.
Este FUNDO JURÍDICO servirá para suportar encargos similares aos do processo contra o Conselho Superior de Magistratura, nomeadamente envolvendo, para já, o Infarmed (cuja intimação será entregue na próxima semana), a Direcção-Geral da Saúde e Ordem dos Médicos.
Hoje mesmo o Conselho Superior da Magistratura, como réu, foi já “devidamente citado, para no prazo de 10 dias, responder, querendo ao requerido pelo requerente [Pedro Almeida Vieira, director do PÁGINA UM], nos autos de intimação”.
Se outras diligências não forem consideradas necessárias, o juiz Pedro de Almeida Moreira terá de decidir ao fim de cinco dias, arquivando o processo ou obrigando o CSM a facultar a documentação ao PÁGINA UM, aplicando uma sanção pecuniária por cada dia de atraso.
No entanto, apesar de serem processos urgentes, existem mecanismos de dilação que podem fazer estes prazos escorregarem por alguns meses. Em todo o caso, a decisão final deste processo constitui sobretudo (mais) um teste à maturidade da democracia portuguesa.
O FUNDO JURÍDICO DO PÁGINA UM pode ser apoiado através da plataforma do MIGHTYCAUSE ou pedindo informações complementares pelo correio electrónico geral@paginaum.pt.
Como estavam ambos os países, como Estados de direito, e os seus cidadãos, antes do dia 24 de Fevereiro? O PÁGINA UM foi analisar o que diz um dos mais conceituados índices mundiais sobre esta matéria. Como vem a talho de foice, apresentamos a situação portuguesa e o melhor e pior para cada um dos indicadores do World Justice Project. Há umas quantas surpresas. Confira.
No estilo maniqueísta como muitos observam a invasão russa à Ucrânia, Vladimir Putin é um tirano sanguinário, manipulador, um ditador que oprime tanto o seu povo como os demais. Apontam-no como o novo Hitler.
Do outro lado, Volodymyr Zelensky é olhado como um patriota, fiel ao seu povo, que luta sem tréguas contra o seu opressor. Apontam-no como o novo Churchill.
Que Putin, numa Rússia sem a glória passada, continua a ser personalidade pouco recomendável, envolta em corrupção, oligarquias e pouca liberdade individual, já há muito – tempo demais – se sabia. Não foi um acaso que o mais recente Prémio Nobel da Paz foi entregue a um jornalista russo Dmitry Muratov, o fundador e editor-chefe do jornal Novaya Gazeta, que viu já vários colaboradores serem assassinados em guerras ou por causa de investigações.
Mas, e Zelensky? E a Ucrânia, tão desconhecida, tanto que tanta gente ignora até os conflitos dos últimos oito anos no Donbass? Será o antigo humorista um líder impoluto de um país moderno e próximo das democracias ocidentais, em completa oposição do modelo russo. Será a Ucrânia um bastião do Leste ao nível da liberdade, da justiça, da luta contra a corrupção e do nepotismo e em prol do bem comum?
Como estavam ambos os países, como Estados de direito, antes do dia 24 de Fevereiro?
O PÁGINA UM decidiu confrontar a Rússia e a Ucrânia pela “lupa” do Índice do Estado de Direito do World Justice Project, uma organização internacional fundada por dois reconhecidos advogados norte-americanos associada à American Bar Association (Ordem dos Advogados dos Estados Unidos).
Avaliando todos os anos 139 países, este índice é constituído por oito factores (ou subíndices), que integram 44 indicadores, com avaliações que se baseiam em pesquisas nacionais de mais de 138 mil famílias e 4.200 profissionais e especialistas jurídicos.
Para se ter uma ideia mais detalhada, e com referências, além do Índice do Estado do Direito em 2021, apresentamos também a posição da Ucrânia e da Rússia em cada um dos factores e indicadores – e respectivas pontuações de 0 a 1. Colocamos também Portugal em comparação, e mostramos o melhor e o pior país.
E deixamos o leitor retirar as suas conclusões.
FACTOR 1 Restrições aos poderes do Governo
Este factor mede o nível de vínculo do Governo face às leis. Compreende os meios, tanto constitucionais quanto institucionais, pelos quais os poderes do Governo e dos seus funcionários e agentes são limitados e responsabilizados perante as normas legais. Também inclui as verificações não-governamentais sobre o poder do Governo, como uma imprensa livre e independente.
1.1 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados pelo poder legislativo
1 – Noruega (0,95)
8 – Portugal (0,83)
80 – UCRÂNIA (0,55)
133 – RÚSSIA (0,34)
139 – Egipto (0,08)
1.2 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados pelo poder judiciário
1 – Noruega (0,96)
17 – Portugal (0,75)
125 – RÚSSIA (0,32)
126 – UCRÂNIA (0,32)
139 – Venezuela (0,12)
1.3 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados por auditorias e revisão independentes
1 – Suécia (0,97)
17 – Portugal (0,76)
92 – UCRÂNIA (0,43)
114 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,07)
1.4 – Os funcionários do Governo são punidos se agirem com má conduta
1 – Dinamarca (0,94)
26 – Portugal (0,64)
115 – RÚSSIA (0,33)
127 – UCRÂNIA (0,28)
139 – Venezuela (0,10)
1.5 – Os poderes do Governo estão sujeitos a verificações não-governamentais
1 – Dinamarca (0,96)
13 – Portugal (0,80)
121 – RÚSSIA (0,37)
127 – UCRÂNIA (0,28)
139 – Egipto (0,06)
1.6 – A transição de poder está sujeita à lei
1 – Finlândia (0,98)
15 – Portugal (0,91)
67 – UCRÂNIA (0,64)
121 – RÚSSIA (0,37)
139 – Venezuela (0,19)
Avaliação global do Factor 1: Restrições aos poderes do Governo
1 – Dinamarca (0,94)
16 – Portugal (0,78)
94 – UCRÂNIA (0,47)
129 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,17)
FACTOR 2 Ausência de corrupção
Este factor mede a ausência de corrupção no Governo, considerando três tipos: suborno, influência indevida de interesses públicos ou privados e apropriação indevida de fundos públicos ou outros recursos. Essas três formas de corrupção são avaliadas para os funcionários do Governo no poder executivo, judiciário, militar, policial e legislativo.
2.1 – Funcionários do Governo no poder executivo não usam cargos públicos para ganho privado
1 – Dinamarca (0,93)
26 – Portugal (0,65)
89 – RÚSSIA (0,40)
127 – UCRÂNIA (0,31)
139 – República Democrática do Congo (0,23)
2.2 – Funcionários do Governo no poder judiciário não usam cargos públicos para ganho privado
1 – Dinamarca (0,99)
31 – Portugal (0,87)
74 – RÚSSIA (0,54)
88 – UCRÂNIA (0,48)
139 – Camboja (0,14)
2.3 – Funcionários do Governo na polícia e nas forças armadas não usam cargos públicos para ganho privado
1 – Dinamarca (0,98)
19 – Portugal (0,87)
82 – RÚSSIA (0,52)
106 – UCRÂNIA (0,43)
139 – República Democrática do Congo (0,19)
2.4 – Funcionários do Governo no poder legislativo não usam cargos públicos para ganho privado
1 – Dinamarca (0,91)
29 – Portugal (0,49)
104 – RÚSSIA (0,23)
136 – UCRÂNIA (0,08)
139 – Guatemala (0,05)
Avaliação global do Factor 2: Ausência de corrupção
1 – Dinamarca (0.95)
24 – Portugal (0,72)
88 – RÚSSIA (0,42)
115 – UCRÂNIA (0,33)
139 – República Democrática do Congo (0,16)
FACTOR 3 Governo aberto
Este factor mede a abertura e transparência do governo definida pela forma como compartilha informações, capacita as pessoas com ferramentas de controlo da acção governativa e promove a participação dos cidadãos nas deliberações de políticas públicas. Avalia assim também se as leis básicas e informações sobre direitos legais são divulgadas, bem como a qualidade das informações publicadas pelo Governo.
3.1 – Leis divulgadas e dados governamentais
1 – Finlândia (0,91)
37 – UCRÂNIA (0,61)
41 – RÚSSIA (0,57)
46 – Portugal (0,55)
139 – Serra Leoa (0,09)
3.2 – Direito à informação
1 – Suécia (0,92)
33 – Portugal (0,60)
64 – UCRÂNIA (0,51)
102 – RÚSSIA (0,41)
139 – Egipto (0,10)
3.3 – Participação cívica
1 – Dinamarca (0,94)
18 – Portugal (0,76)
68 – UCRÂNIA (0,58)
122 – RÚSSIA (0,37)
139 – Egipto (0,16)
3.4 – Mecanismos de reclamação
1 – Holanda (0,92)
30 – Portugal (0,72)
66 – RÚSSIA (0,59)
76 – UCRÂNIA (0,57)
139 – Mauritânia (0,25)
Avaliação global do Factor 3: Governo aberto
1 – Noruega (0,89)
29 – Portugal (0,66)
51 – UCRÂNIA (0,57)
78 – RÚSSIA (0,49)
139 – Egipto (0,22)
FACTOR 4 Direitos fundamentais
Este factor mede o sistema do Estado de direito dos países, concentrando-se porém num menu relativamente modesto de direitos estabelecidos sob a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
4.1 – Igualdade de tratamento e ausência de discriminação
1 – Finlândia (0,85)
31 – Portugal (0,68)
35 – UCRÂNIA (0,67)
67 – RÚSSIA (0,58)
139 – Sudão (0,32)
4.2 – O direito à vida e à segurança da pessoa é efectivamente garantido
1 – Dinamarca (0,99)
29 – Portugal (0,85)
59 – UCRÂNIA (0,66)
93 – RÚSSIA (0,45)
139 – Venezuela (0,05)
4.3 – Processo legal correcto e com direitos do acusado
1 – Suécia (0,91)
32 – Portugal (0,64)
72 – UCRÂNIA (0,45)
112 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,17)
4.4 – A liberdade de opinião e expressão é efectivamente garantida
1 – Dinamarca (0,96)
13 – Portugal – 0,80
62 – UCRÂNIA (0,61)
121 – RÚSSIA (0,37)
139 – Egipto (0,06)
4.5 – A liberdade de crença e religião é efectivamente garantida
1 – Noruega (0,89)
15 – Portugal (0,82)
34 – UCRÂNIA (0,75)
118 – RÚSSIA (0,49)
139 – Irão (0,03)
4.6 – Ausência de interferência arbitrária na privacidade é efetivamente garantida
1 – Dinamarca (0,99)
16 – Portugal (0,83)
75 – UCRÂNIA (0,43)
124 – RÚSSIA (0,18)
139 – Venezuela (0,02)
4.7 – A liberdade de reunião e associação é efectivamente garantida
1 – Dinamarca (0,98)
11 – Portugal (0,86)
66 – UCRÂNIA (0,64)
121 – RÚSSIA (0,39)
139 – China (0,11)
4.8 – Os direitos fundamentais do trabalho são efectivamente garantidos
1 – Dinamarca (0,95)
31 – Portugal (0,69)
44 – UCRÂNIA (0,65)
63 – RÚSSIA (0,59)
139 – Irão (0,24)
Avaliação global do indicador do Factor 4: Direitos fundamentais
1 – Dinamarca (0,92)
21 – Portugal (0,77)
55 – UCRÂNIA (0,61)
114 – RÚSSIA (0,42)
139 – Irão (0,22)
FACTOR 5 Ordem e segurança
Este factor mede o nível de segurança de pessoas e propriedades garantida pelo Estado e pela sociedade.
5.1 – O crime é efectivamente controlado
1 – Singapura (0,98)
18 – Portugal (0,91)
71 – RÚSSIA (0,77)
82 – UCRÂNIA (0,75)
139 – Venezuela (0,32)
5.2 – Os conflitos civis são efectivamente limitados
Existem 105 países, incluindo Portugal, com a pontuação máxima (1,0)
107 – RÚSSIA (0,94)
108 – UCRÂNIA (0,94)
139 – Afeganistão (0,04)
5.3 – As pessoas não recorrem à violência para reparar queixas pessoais
1 – Irlanda (0,92)
41 – UCRÂNIA (0,51)
71 – Portugal (0,45)
99 – RÚSSIA (0,38)
139 – Suriname (0,18)
Avaliação global do indicador do Factor 5: Ordem e segurança
1 – Irlanda (0,94)
41 – Portugal (0,79)
63 – UCRÂNIA (0,75)
84 – RÚSSIA (0,70)
139 – Afeganistão (0,30)
FACTOR 6 Aplicação regulatória
Este factor mede até que ponto os regulamentos são implementados e aplicados de forma justa e eficaz, embora sem analisar as actividades reguladas nem a sua adequação.
6.1 – Os regulamentos governamentais são efectivamente aplicados
1 – Dinamarca (0,87)
34 – Portugal (0,63)
58 – RÚSSIA (0,54)
112 – UCRÂNIA (0,42)
139 – Mauritânia (0,23)
6.2 – Os regulamentos governamentais são aplicados e executados sem influência imprópria
1 – Noruega (0,99)
29 – Portugal (0,80)
93 – RÚSSIA (0,54)
127 – UCRÂNIA (0,41)
139 – Camboja (0,25)
6.3 – Os processos administrativos são conduzidos sem demora injustificada
1 – Singapura (0,90)
25 – RÚSSIA (0,62)
35 – UCRÂNIA (0,57)
89 – Portugal (0,43)
139 – Venezuela (0,10)
6.4 – Os procedimentos legais adequados são respeitados em processos administrativos
1 – Finlândia (0,94)
49 – Portugal (0,51)
84 – UCRÂNIA (0,41)
105 – RÚSSIA (0,34)
139 – Camboja (0,13)
6.5 – O governo não expropria sem processo legal e compensação adequada
1 – Bélgica (0,93)
36 – Portugal (0,66)
117 – UCRÂNIA (0,41)
124 – RÚSSIA (0,38)
139 – Venezuela (0,14)
Avaliação global do indicador do Factor 6: Aplicação regulatória
1 – Dinamarca (0,89)
39 – Portugal (0,61)
81 – RÚSSIA (0,48)
102 – UCRÂNIA (0,44)
139 – Venezuela (0,19)
FACTOR 7 Justiça civil
Este factor mede o nível de resolução das queixas dos cidadãos de forma pacífica e eficaz por meio de um sistema de justiça civil, analisando também se são acessíveis e baratos, bem como livres de discriminação, corrupção e influência imprópria de funcionários públicos. De igual modo, examina se os processos judiciais são conduzidos sem atrasos injustificados e se as decisões são executadas de forma eficaz, incluindo também a acessibilidade, imparcialidade e eficácia dos mecanismos alternativos de resolução de disputas.
7.1 – As pessoas podem aceder e pagar a justiça civil
1 – Uruguai (0,80)
15 – Portugal (0,71)
38 – UCRÂNIA (0,63)
44 – RÚSSIA (0,63)
139 – Guatemala (0,34)
7.2 – A justiça civil é livre de discriminação
1 – Dinamarca (0,90)
21 – Portugal (0,72)
34 – UCRÂNIA (0,68)
72 – RÚSSIA (0,55)
139 – Afeganistão (0,14)
7.3 – A justiça civil está livre de corrupção
1 – Dinamarca (0,99)
31 – Portugal (0,77)
74 – RÚSSIA (0,51)
97 – UCRÂNIA (0,41)
139 – Camboja (0,12)
7.4 – A justiça civil está livre de influência imprópria do Governo
1 – Noruega (0,95)
24 – Portugal (0,76)
101 – UCRÂNIA (0,37)
124 – RÚSSIA (0,27)
139 – Venezuela (0,04)
7.5 – A justiça civil não está sujeita a atrasos injustificados
1 – Singapura (0,91)
9 – RÚSSIA (0,74)
38 – UCRÂNIA (0,53)
70 – Portugal (0,44)
139 – Venezuela (0,06)
7.6 – A justiça civil é efetivamente aplicada
1 – Singapura (0,92)
56 – Portugal (0,54)
75 – UCRÂNIA (0,49)
82 – RÚSSIA (0,42)
139 – Venezuela (0,17)
7.7 – Mecanismos alternativos de resolução de disputas são acessíveis, imparciais e eficazes
1 – Noruega (0,91)
17 – Portugal (0,80)
68 – UCRÂNIA (0,67)
116 – RÚSSIA (0,55)
139 – Camboja (0,41)
Avaliação global do indicador do Factor 7: Justiça civil
1 – Dinamarca (0,86)
25 – Portugal (0,68)
64 – UCRÂNIA (0,54)
70 – RÚSSIA (0,53)
139 – Camboja (0,25)
FACTOR 8 Justiça criminal
Este factor avalia o sistema de justiça criminal de um país, incluindo a actuação da polícia, advogados, promotores, juízes e agentes penitenciários.
8.1 – O sistema de investigação criminal é eficaz
1 – Singapura (0,83)
41 – Portugal (0,49)
118 – UCRÂNIA (0,28)
136 – RÚSSIA (0,19)
139 – Venezuela (0,11)
8.2 – O sistema criminal é justo, oportuno e eficaz
1 – Áustria (0,81)
75 – Portugal (0,44)
96 – UCRÂNIA (0,40)
115 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,12)
8.3 – O sistema correcional é eficaz na redução do comportamento criminoso
1 – Noruega (0,93)
45 – Portugal (0,49)
62 – UCRÂNIA (0,40)
78 – RÚSSIA (0,36)
139 – Venezuela (0,05)
8.4 – O sistema penal é imparcial
1 – Dinamarca (0,81)
66 – UCRÂNIA (0,48)
73 – Portugal (0,46)
101 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,12)
8.5 – O sistema criminal está livre de corrupção
1 – Dinamarca (0,98)
21 – Portugal (0,78)
84 – RÚSSIA (0,46)
123 – UCRÂNIA (0,32)
139 – Camboja (0,16)
8.6 – O sistema criminal está livre de influência imprópria do Governo
1 – Finlândia (0,98)
13 – Portugal (0,84)
106 – UCRÂNIA (0,28)
134 – RÚSSIA (0,11)
139 – Venezuela (0,01)
8.7 – O processo legal é adequado e com direitos do acusado
1 – Suécia (0,91)
32 – Portugal (0,64)
72 – UCRÂNIA (0,45)
112 – RÚSSIA (0,35)
139 – Venezuela (0,17)
Avaliação global do indicador do Factor 8: Justiça criminal
1 – Noruega (0,85)
33 – Portugal (0,59)
91 – UCRÂNIA (0,37)
121 – RÚSSIA (0,31)
139 – Venezuela (0,12)
ÍNDICE DO ESTADO DE DIREITO DO WORLD JUSTICE PROJECT
1 – Dinamarca (0,90)
2 – Noruega (0,90)
3 – Finlândia (0,88)
4 – Suécia (0,86)
5 – Alemanha (0,84)
6 – Holanda (0,83)
7 – Nova Zelândia (0,83)
8 – Luxemburgo (0,83)
9 – Áustria (0,81)
10 – Irlanda (0,81)
(…)
26 – Portugal (0,70)
Mapa mundial com Índice do Estado de Direito em 2021 do World Justice Project. Fonte: WJP.
O Conselho Superior da Magistratura quis saber qual o motivo para um jornalista querer ter acesso ao inquérito sobre a distribuição do juiz da Operação Marquês. O PÁGINA UM recusou aceitar essas condições anticonstitucionais e apresentou queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. O PÁGINA UM foi o único órgão de comunicação social que, ao longo deste processo, não aceitou um “não” do CSM.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) deve conceder ao PÁGINA UM acesso a todos os documentos do inquérito interno relativo à escolha inicial do juiz Carlos Alexandre para dirigir a Operação Marquês, iniciada em 2014, e que resultou na prisão preventiva do ex-primeiro-ministro José Sócrates.
Esta é a posição da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), através de um parecer solicitado pelo PÁGINA UM, no decurso da recusa do CSM de ceder essa documentação, e que foi aprovado nos últimos dias de Fevereiro passado.
Conselho Superior da Magistratura quis sempre manter secretismo sobre os meandros da Operação Marquês.
Recorde-se que o PÁGINA UM – que noticiou em primeira-mão que José Sócrates obtivera um parecer da CADA que lhe deu razão sobre o direito de acesso a esse inquérito – solicitou também o acesso em 2 de Novembro do ano passado.
Contudo, o CSM sempre recusou esse acesso ao PÁGINA UM, tendo mesmo a sua Encarregada da Protecção de Dados, Ana Sofia Wengorovius – após uma troca de e-mails, exigido que se esclarecesse “qual a finalidade do acesso e da recolha” dos documentos solicitados. Esta juíza, através de um longo parecer de sete páginas, defendia o secretismo deste inquérito, que na verdade se trata da “averiguação sumária nº 2018-346/AV”.
No seu parecer, Ana Sofia Wengovorius argumenta que o inquérito, mesmo se arquivado, se mantinha “confidencial”, porque se deveria ter “em vista assegurar a defesa dos direitos fundamentais de personalidade como o direito ao bom nome e à reputação”, invocando a Constituição. E que a divulgação por parte de um jornalista poderia violar ou afectar “os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”. Nessa medida, esta responsável do CSM dizia que o jornalista deveria obrigatoriamente de invocar um “interesse atendível ou legítimo”.
Ora, como o PÁGINA UM invocara de forma implícita esse interesse atendível (porque o pedido foi feito por um jornalista) e explicitamente (repetindo, por palavras, quais as funções de um jornalista), seguiu uma queixa para a CADA.
Primeira página do parecer do CADA que dá razão ao PÁGINA UM.
No parecer da CADA, presidida pelo juiz-conselheiro Alberto Oliveira, e que deu razão às pretensões do PÁGINA UM, destaca-se ser “doutrina (…) que o processo de inquérito e o processo de averiguações concluídos são livremente acessíveis (…), respeitando mesmo a matéria funcional”, o que incluiu mesmo “os depoimentos prestados, os quais são determinantes para compreender a globalidade do processo e a razão por que a administração decidiu num determinado sentido”. A CADA defende apenas que devem ser “expurgados”, ou seja, rasurados a negro, os dados “irrelevantes para a concreta decisão administrativa, designadamente, moradas, números de telefone, números de identificação civil e fiscal dos intervenientes”.
Em suma, a existência desses dados nos documentos originais não implica que aqueles possam manter-se secretos. Além disso, devem manter-se os nomes e mesmo as funções das pessoas envolvidas.
A atribuição do processo ao juiz Carlos Alexandre terá sido executada por uma funcionária judicial sem a presença de Ivo Rosa, o outro juiz que então integrava o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). Segundo o jornal ECO, a defesa de Sócrates alega que esta funcionária que fez a distribuição “já vinha a trabalhar com Carlos Alexandre há anos” em outro tribunal, e que “não era ela que estava para ser nomeada escrivã do TCIC” em Setembro de 2014.
De acordo com o Diário de Notícias, o juiz Carlos Alexandre terá sido entretanto constituído arguido no mês passado, depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter aceitado o requerimento de abertura de instrução apresentado por José Sócrates. Fonte judiciária adiantou também à Agência Lusa que por despacho do juiz desembargador Jorge Antunes foi ainda declarada aberta a instrução pedida por José Sócrates. O juiz Carlos Alexandre e a escrivã Maria Teresa Santos assumiram a qualidade formal de arguidos nesse processo.
O gabinete de Matos Fernandes, ministro do Ambiente, exigiu aos jornalistas que apresentassem “certificado de vacinação” para aceder a uma conferência de imprensa sobre seca. Agora disse ao PÁGINA UM que foi um “equívoco”, e que deveria ter apenas sido pedido certificado digital ou teste. No entanto, nem isso pode ser exigido, segundo as normas de um Conselho de Ministros: em edifícios governamentais, só máscara; e nada mais.
Apesar das medidas de controlo da pandemia terem sido decretadas pelo Governo através de uma Resolução do Conselho de Ministros, o Ministério do Ambiente e da Acção Climática decidiu, na semana passada, convocar uma conferência de imprensa com uma exigência inédita: a obrigatoriedade de apresentação de um certificado de vacinação para aceder a uma sala do edifício ministerial, na Rua do Século, em Lisboa.
A nota de imprensa do gabinete do ministro Matos Fernandes – que esteve presente numa conferência de imprensa no passado dia 1, terça-feira, para abordar o problema da seca e dos baixos níveis de armazenamento das albufeiras – informou previamente os jornalistas que “dada a situação pandémica, é obrigatório o uso de máscara e será necessário a apresentação de certificado de vacinação”.
Texto integral da convocatória do Ministério do Ambiente e da Acção Climática.
A exigência do Ministério do Ambiente excede em muito aquilo que constituem as normas sanitárias. Na verdade, o acesso a um edifício ministerial deverá ser livre – não sendo sequer necessário exibir um teste negativo, e muito menos um certificado digital de vacinação ou de recuperação –, sendo apenas exigível, como em todos os espaços interiores, o uso de máscara facial.
Contactado o Ministério do Ambiente pelo PÁGINA UM – que não esteve presente na conferência de imprensa por razões meramente editoriais –, o assessor de imprensa Paulo Chitas justifica que o texto da convocatória foi um “equívoco”, salientando mesmo que a “formulação não foi a mais feliz”. E adiantou ainda que aquilo que “é necessário aos jornalistas é apresentarem um certificado de vacinação, de recuperação ou um teste negativo para aceder às instalações [do Ministério do Ambiente], como é comum em espaços onde se concentra um grande número de pessoas.”
Isso não é verdade, tal como facilmente se constata pela leitura da Resolução do Conselho de Ministros, ou, de forma mais fácil, em cafés, supermercados, lojas e em qualquer transporte público – que é, aliás, sector tutelado por Matos Fernandes.
Com efeito, a realização de teste com resultado negativo é, actualmente, exigível no acesso “a estabelecimentos turísticos ou de alojamento local, a estabelecimentos de restauração e similares, a estabelecimentos de jogos de fortuna ou azar, casinos, bingos ou similares, a bares, a outros estabelecimentos de bebidas sem espectáculo e a estabelecimentos com espaço de dança, a determinados eventos e, ainda, a ginásios e academias”.
Matos Fernandes, ministro do Ambiente.
No entanto, em caso de apresentação de prova de vacinação há pelo menos 14 dias, é dispensado o teste para acesso “a bares e discotecas, a determinados eventos, a estruturas residenciais para idosos, unidades de cuidados continuados integrados da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e a outras estruturas e respostas residenciais”.
Ora, em nenhuma destas situações se encaixa, mesmo com interpretação muito lata, as instalações ocupadas pelo ministro Matos Fernandes. E mesmo se assim fosse – ou seja, se o Ministério do Ambiente fosse comparado, por exemplo, a um casino, a uma discoteca, a um lar de idosos ou a uma unidade de cuidados continuados –, nem a convocatória da conferência de imprensa jamais poderia exigir exclusivamente o “certificado de vacinação”, porquanto os recuperados também possuem certificado digital.
O PÁGINA UM questionou de novo o Ministério do Ambiente sobre a sua justificação, e perguntou ainda se os assessores e demais funcionários foram obrigados a vacinarem-se para continuar em funções, ou se Matos Fernandes exige “certificado de vacinação” para receber pessoas em audiência. O gabinete de imprensa disse apenas que “nada mais temos a acrescentar”.
Oficialmente, o Ministério do Ambiente não informou o PÁGINA UM se algum jornalista foi impedido de entrar naquela conferência de imprensa, ou se, no futuro, será vedado o acesso a um evento similar, ou mesmo conversar com o ministro Matos Fernandes, se não apresentar certificado digital (de vacinação ou de recuperação) ou um teste negativo.
Saliente-se que o teste negativo – que constitui apenas um “retrato” no momento da sua realização – e muito menos o certificado digital – que apenas atesta a toma de vacinas ou a existência prévia de infecção, ou seja, a presença individual de imunidade vacinal e natural, respectivamente – não constituem uma garantia de ausência de infecção.
Ou seja, na conferência de 1 de Fevereiro deste ano, Matos Fernandes ou outra qualquer pessoa no interior do palacete da Rua do Século poderia ter sido infectado por um dos jornalistas ordeiramente munidos de certificado de vacinação com dose tripla. Até porque qualquer um deles, mesmo vacinado, poderia estar infectado, e infectar um terceiro.