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  • Elon Musk em ‘pé de guerra’ contra a censura judicial no Brasil

    Elon Musk em ‘pé de guerra’ contra a censura judicial no Brasil

    Tantas foram as exigências de bloqueio de contas no X, que o ‘cântaro’ se quebrou. Depois de ontem a empresa proprietária do X (ex-Twitter) ter denunciado que as autoridades judiciais brasileiras, lideradas pelo juiz Alexandre de Moraes, nem sequer identificam os motivos para as ordens de bloqueio contas na rede social, Elon Musk prometeu hoje não acatar mais as ordens e exigiu mesmo a demissão der Alexandre de Moraes. No braço de ferro com a Justiça, que ameaça com multas à rede social, Musk garante que, por uma questão de princípio, não pode apoiar a censura e até admite já perder as receitas no mercado brasileiro.


    Elon Musk, o proprietário da rede social X (ex-Twitter), promete que não vai mais respeitar as exigências de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil, para bloquear contas de utilizadores, e acusa aquele magistrado de trair “descaradamente a Constituição” daquele país, acrescentando que “deveria renunciar ou ser demitido”. Musk diz ainda que, em breve, divulgará as exigências de Alexandre de Moraes, que no Brasil tem um poder que extravasa o ciclo judiciário.

    Ontem, de um modo formal, a X Corporation – a empresa dona da rede social – informou que “foi forçada por decisões judiciais a bloquear determinadas contas no Brasil”, mas que nem sequer sabem “os motivos pelos quais essas ordens de bloqueio foram emitidas” nem sequer “quais postagens [que] supostamente violaram a lei”. Além disso, a rede social está também proibida de informar “qual tribunal ou juiz [que] emitiu a ordem, ou em qual contexto”, e nem sequer podem listar publicamente as contas afectadas.

    Elon Musk abriu ‘guerra’ contra a Justiça brasileira por exigirem bloqueio contas sem sequer informar quais os posts que violaram as leis.

    A empresa diz ainda que foram ameaçados com multas diárias se não cumprirem as ordens. Apesar de prometer agir legalmente, por tais medidas judiciais serem contrárias ao Marco Civil da Internet e à Constituição do Brasil, hoje em diversos posts Elon Musk manifestou que não vai mais acatar ordens de Alexandre de Moraes que tem usado de forma arbitrária bloqueios de contas alegando que estas apoiam movimentos subversivos ou discurso de ódio. Mas, na verdade, acabam por ser casos de censura de opinião.

    Não acreditamos que tais ordens estejam de acordo com o Marco Civil da Internet ou com a Constituição Federal do Brasil e contestaremos legalmente as ordens no que for possível.

    Hoje, Musk denunciou a “censura agressiva [que] parece violar a lei e a vontade do povo do Brasil”, aproveitando para compartilhar publicações do jornalista norte-americano Michael Shellenberger. Tendo já escrito sobre os Twitter Files, relacionadas com práticas de censura durante a pandemia, este jornalista norte-americano é um conhecido activista climático, co-fundador do Breakthrough Institute e fundador da organização ambiental Environmental Progress, tendo sido foi nomeado um dos Heróis Ambientais pela revista Time e foi ainda vencedor do Green Book Award de 2008.

    Conhecedor da realidade brasileira, por ter vivido no Brasil nos anos 90, Shellenberger fez hoje um longo depoimento em português alertando que “não é um exagero dizer que o Brasil está à beira da ditadura nas mãos de um ministro totalitário do Supremo Tribunal Federal chamado Alexandre de Moraes”, acrescendo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa neste suposto “impulso em direção ao totalitarismo”. O jornalista acrescenta ainda que “o Brasil está envolvido num caso de ampla repressão da liberdade de expressão” liderada por Moraes.

    Ontem, num simples post, Elon Musk escreveu que “sem liberdade de expressão, nós somos apenas uns escravos na matrix”, e aparenta querer levar o braço de ferro até ao fim com as autoridades judiciais do Brasil, mesmo que tal implique a sua saída daquele país. A imprensa brasileira, apesar de estar em causa sobretudo questões de liberdade de expressão, tem dado forte destaque a esta polémica, mas dando um cunho ideológico, destacando os apoios de bolsonaristas à postura de Elon Musk.


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  • Google e YouTube no tribunal por censurarem candidato presidencial Robert F. Kennedy Jr.

    Google e YouTube no tribunal por censurarem candidato presidencial Robert F. Kennedy Jr.

    De respeitável e temido (pelas corporações) advogado de causas ambientais, Robert F. Kennedy Jr. não tem tido agora vida fácil nos Estados Unidos a defender os seus princípios, sobretudo desde que, durante a pandemia, começou a tecer críticas à narrativa oficial sobre a origem do SARS-CoV-2 e a segurança das vacinas contra a covid-19. Oriundo de uma das famílias com mais história na política norte-americana, Kennedy propôs-se enfrentar o actual presidente Joe Biden nas primárias democratas a iniciar em Fevereiro do próximo ano. E acusa agora o Google e o Youtube de o censurarem numa parceria com o Governo Federal. O caso está agora nos tribunais, num processo que promete: ali se determinará se é lícito que empresas tecnológicas definam o que é ou não desinformação e penalizem sem apelo quem foge da “linha”.


    O candidato presidencial Robert F. Kennedy Jr. apresentou ontem uma queixa no Tribunal do Distrito Norte da Califórnia contra o Google e a sua subsidiária YouTube. Em causa está, segundo político democrata, uma alegada colaboração entre o Google e o Governo Federal para desenvolver e aplicar regras sobre “desinformação” com o objectivo de censurar oponentes políticos da Administração Biden.

    Robert F. Kennedy Jr. – um advogado conceituado que se destacou, desde os anos 90, pela seu activismo em questões ambientais, muitas vezes contra corporações – tem sido, nos últimos anos, particularmente crítico sobre o uso de determinados produtos químicos tóxicos, questionando também a origem do SARS-CoV-2 e manifestando preocupações sobre a segurança das vacinas contra a covid-19.

    Robert F. Kennedy Jr., de respeitado advogado de causas ambientais até à censura pelas redes sociais. Sinal dos tempos modernos.

    O Google e o Youtube têm, sobretudo desde a apresentação da sua candidatura às primárias democratas, removido vídeos de Robert F. Kennedy Jr. por suposta “desinformação médica”, mesmo se,em muitos casos, nem sequer são abordados temas relacionados com a saúde pública. De acordo com um comunicado da campanha de Kennedy – sobrinho do assassinado presidente norte-americano John F. Kennedy –, o Google está a violar a Primeira Emenda, uma vez que a acção da empresa tecnológica, que controla o YouTube, se baseia numa parceria público-privada que depende de fontes governamentais.

    De acordo com um comunicado da campanha de Kennedy – que defrontará Biden nas primárias a partir de Fevereiro de 2024 –, embora o YouTube se tenha tornado “uma plataforma importante para o discurso político nos Estados Unidos, uma praça digital em que os eleitores confiam como um local para obter notícias e opiniões sobre questões do dia”, tem-se constatado que “o Google censurou inúmeros americanos por causa das suas opiniões críticas às narrativas do Governo norte-americano”. E diz ainda que “Kennedy é apenas a vítima mais proeminente dessa campanha de censura”, concluindo que “esse grau de censura de um importante candidato presidencial não tem precedentes na História americana”.

    Um dos exemplos mais paradigmáticos ocorreu em Março passado quando discursou no Instituto de Política de New Hampshire, onde Robert F. Kennedy Jr, salientou que “ uma das razões pelas quais estou pensando em concorrer à Presidência é superar a polarização tóxica que divide republicanos e democratas, permitindo que as elites capturem o nosso Governo e saqueiem o nosso país”. O vídeo foi censurado pelo Youtube, e está agora somente no Substack.

    “O Governo [norte-americano] não pode censurar seus críticos”, defende Scott Street, da JW Howard Attorneys, o advogado que lidera a acção judicial, citado pelo site da campanha de Kennedy. “O Governo não pode fazer isso directamente e não pode fazer isso autorizando entidades privadas como o Google a actuarem como censores. Esse princípio é fundamental para a democracia americana, especialmente quando se trata de discurso político; trata-se de preservar a liberdade dos eleitores para falar, ouvir e pensar por si mesmos.”

    Com esta acção, Robert F. Kennedy busca providência cautelar (injunction, em inglês) para proibir o Google de se basear nas suas políticas de alegado combate à “desinformação” para censurá-lo durante a sua campanha presidencial. O caso já foi atribuído ao juiz Nathanael Cousins.

    Apesar de ainda estar atrás de Joe Biden nas intenções de voto nas primárias do Partido Democrata, Kennedy tem conseguido granjear apoios, embora a maioria da imprensa mainstream lhe esteja a mover uma campanha de ataque reputacional. Esquecendo propositadamente o seu passado respeitável – por exemplo, foi considerado Heroe for the Planet pela Time Magazine e recebeu variadas distinções por lutas ambientais –, apelidando-o constantemente de anti-vaxxer, mesmo se ele nunca se manifestou contra as vacinas, mas sim sobre a sua segurança.

  • Jacinda Ardern deixa Nova Zelândia em crise económica e com excesso de mortalidade

    Jacinda Ardern deixa Nova Zelândia em crise económica e com excesso de mortalidade

    No auge, a sua popularidade nacional e internacional chegou a ser apelidada de “Jacindamania”. Nas eleições de Outubro de 2020, em plena pandemia, Jacinda Arden obteve 50,01% dos votos, um resultado histórico, assegurando 65 dos 120 lugares na Câmara dos Representantes. Mas a aprovação popular da estratégia fortemente restritiva e até segregacionista da primeira-ministra da Nova Zelândia foi-se esfumando, sobretudo quando a Ómicron “varreu” a ilha da Oceânia a partir do início do ano passado, e a inflação e as tensões sociais aumentaram. Para piorar, a Nova Zelândia apresenta, desde 2022, um inusitado excesso de mortalidade, confirmada por uma análise do PÁGINA UM recorrendo a dados estatísticos oficiais.


    Heroína ou ditadora. Amor e ódio. Agradecimento e desprezo. Assim foram os sentimentos antagónicos em reacção ao anúncio da recente demissão de Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia. Não deixou ninguém indiferente. Nos antípodas do continente europeu, com uma população a rondar os 5,1 milhões de habitantes, nunca um Governo daquela ilha da Oceânia foi tão falado.

    Até em Portugal, onde o interesse sobre a Nova Zelândia, antes da pandemia, era tão abundante como os cangurus naquela ilha: zero. A primeira-ministra da pequena ilha ao largo da Austrália tornou-se tudo menos consensual nos últimos três anos.

    Jacinda Ardern com António Guterres.

    Mulher, jovem e comunicativa, Jacinda Ardern revelou-se ao Mundo pela forma empática como lidou com o atentado contra a mesquita de Christchurch em Março de 2019, mas depois transformou-se numa “dama de ferro” pela forma como impôs uma estratégia de restrições durante a pandemia, com lockdowns draconianos – que proibiam mesmo “recuperar uma bola de críquete perdida no quintal do vizinho”, como recordava ontem uma notícia do The New York Times.

    Além disso, apesar de inicialmente assegurar que as vacinas seriam voluntárias, impôs a sua administração obrigatória para determinadas profissões, como agentes fronteiriços, polícias, militares, profissionais do sector da Educação, da saúde e serviços policiais, além de empregados do sector da restauração. O seu discurso tornou-se, por vezes, incrivelmente segregacionista, defendendo a punição e discriminação de quem não se vacinasse ou realizasse testes. O bordão do governo trabalhista de Ardern não podia ser mais incisivo: “no jab, no job” [sem vacina, sem trabalho].

    Com o surgimento das vacinas em finais de 2020, o objectivo de Jacinda Arden passou a ser alcançar rapidamente os 90% da população vacinada. Os fins desejados pela primeira ministra justificaram os meios por si impostos – e isso conseguiu Jacinda Ardern.

    Jessica Ardern impôs a vacinação obrigatória em determinados grupos profissionais.

    Os dados mais recentes do Ministério da Saúde neozelandês indicam que 90,2% dos maiores de 12 anos tinham completado a primeira fase da vacinação. Porém, a adesão ao primeiro reforço, para os maiores de 18 anos, já foi menor (73,3%), e ainda se reduziu mais para o segundo reforço. Neste momento, apenas 47,3% dos neozelandeses optaram por tomar o denominado segundo booster, mostrando uma tendência de desinteresse que também atinge Portugal.

    Mas se a estratégia de Jacinda Ardern – que chegava a ser similar à chinesa, apontando para a covid zero – parecia estar a resultar nos primeiros dois anos da pandemia, em pouco mais de dois meses colapsou.

    Com efeito, até ao final de Janeiro de 2022 a Nova Zelândia contava apenas 16.620 casos positivos de covid-19 desde o início da pandemia, contabilizando 63 óbitos. Como termo de comparação, Portugal – com o dobro da população – tinha, nessa altura, cerca de 20 mil mortes atribuídas ao SARS-CoV-2 e mais de 2,8 milhões de casos positivos.

    Vacinada em Junho de 2021, Jacinda Ardern testou positivo em Maio do ano passado. Usou fortemente as redes sociais para comunicar questões relacionadas com a covid-19.

    Apesar de contar com uma população fortemente vacinada, a variante Ómicron “varreu” literalmente a ilha de Jacinda Ardern – e também a sua estratégia de covid, apesar de continuar a receber os louros de uma política segregacionista e pouco democrática. Na segunda semana de Maio do ano passado, a Nova Zelândia superava já um milhão de casos e, nesse mesmo mês, ultrapassou os 1.000 óbitos.

    Actualmente, segundo os dados do Worldometers, este país da Oceânia regista mais de 2,1 milhões de casos – uma incidência que já ultrapassou a da Suécia –, embora conte somente com 3.676 óbitos, ou seja, uma taxa de letalidade de 0,17%, o que se explica pela menor agressividade da variante Ómicron.

    À medida que o suposto sucesso da estratégia de Jacinda Ardern no combate à pandemia se esfumava com a Ómicron, aumentava a contestação interna à sua política segregacionista. Em Agosto do ano passado, manifestações em Wellington mostravam já uma estrela cadente em queda livre. Os índices de popularidade do Partido Trabalhista de Ardern tinha então despencado para os 33% de aprovação, quando no final de 2021 era ainda de 41%. No mês seguinte, Jacinda Arden viu-se obrigada a deixar cair as máscaras e os mandatos de vacinação, enquanto já defendia então ser necessário “virar a página”.

    Manifestações contra os mandatos de vacinação atingiram o seu auge em Agosto do ano passado.

    Mas já era tarde para recuperar a popularidade interna perdida. Hoje, o jornal Stuff noticia que uma pesquisa (Taxpayers’ Union – Curia Poll), realizada pouco antes do anúncio da sua renúncia, apurara que que 40% dos inquiridos tinham uma posição favorável à primeira-ministra neozelandesa contra 41% com opinião desfavorável. É a primeira vez, desde que o balanço de Jacinda Ardern se mostrava negativo. Por outro lado, o índice de popularidade do Partido Trabalhista desceu para os 31,7%, estando já bastante abaixo do Partido Nacional, de centro-direita, que conta com 37,2% das intenções de voto.

    Recuperar a popularidade do Partido Trabalhista para as eleições marcadas para o próximo mês de Outubro será ainda mais complexo pela evolução económica e financeira, a par de uma situação de saúde pública marcada por um forte recrudescimento da mortalidade total.

    De facto, a taxa de inflação na Nova Zelândia, que era de 1,5% em Março de 2021, estava já em 7,2% no terceiro trimestre ano passado, de acordo com dados oficiais. Este é o valor mais elevado desde Setembro de 1990. Embora a taxa de desemprego esteja em apenas 3,3% – o valor mais baixo dos últimos 15 anos –, existem receios forte de uma recessão económica.

    Evolução da taxa de inflação anual (%) por trimestre na Nova Zelândia de Janeiro de 1990 a Setembro de 2022. Fonte: Stats NZ.

    Em todo o caso, com um produto interno bruto per capital de cerca do dobro de Portugal, a situação económica não se augura demasiado dramática no futuro da Nova Zelândia.

    Mais dramática mostra ser a evolução da mortalidade total da Nova Zelândia. Com efeito, se os dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021) pareciam mostrar que a estratégia restritiva draconiana defendida por Jacinda Ardern era uma aposta vencedora, agora afigura-se terrível.

    Uma análise detalhada aos dados oficiais do Stats NZ – a agência neozelandesa de Estatística – entre Janeiro de 2010 e Setembro do ano passado – uma tendência crescente da mortalidade total, depois de uma redução ao longo de 2020 e 2021. Considerando a média móvel de 12 meses – para atenuar completamente o efeito das variações sazonais –, observa-se um crescimento ininterrupto a partir de Novembro de 2020, quando então as medidas não-farmacológicas e os lockdowns reduziam o risco de vida para grande parte das doenças.

    Evolução da mortalidade total na Nova Zelândia entre 2010 e 2019, e estimativa do excesso ou défice de mortalidade entre 2019 e 2022 (em todos os anos apenas para os primeiros nove meses) em função do número expectável e registado. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    A tendência de incremento da mortalidade total passou a ser preocupante quando em Novembro de 2021 se ultrapassaram os valores de Março de 2020. A mortalidade total em Setembro do ano passado – último período com dados – já se situou em 6.438 óbitos (média de 12 meses), que contrastava com os 5.786 óbitos no mês homólogo imediatamente anterior à pandemia (Setembro de 2019). Significa isto um desvio de 11%.

    Fazendo uma análise comparativa, por agora, dos nove primeiros meses de cada ano (Janeiro a Setembro), desde 2010 até 2022, e considerando também a tendência crescente de mortalidade (por envelhecimento populacional), chega-se à conclusão que ao pretenso sucesso das políticas de saúde de Jessica Ardern em 2020 e 2021 sucedeu um desastre em 2022.

    Sobretudo em 2020, a mortalidade total nos primeiros nove meses ficou bastante abaixo dos valores expectáveis: seria de aguardar, sem pandemia, um registo de 53.086 óbitos, mas afinal houve menos 3.592 mortes. Ou seja, com o Mundo então a sofrer uma pandemia, a Nova Zelândia apresentava até uma descida da mortalidade por todas as causas.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) na Nova Zelândia entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Em 2021, manteve-se esse saldo favorável, embora já não tão evidente. Seria expectável o registo de 54.018 óbitos, tendo-se contabilizado menos 624.

    Porém, o ano de 2022 “estragou a festa” – e nem se pode dizer que tenha sido por causa da covid-19, porque entre Janeiro e Setembro morreram pouco mais de 2.900 neozelandeses por esta doença. Com efeito, o excesso na mortalidade total neste período foi de 4.856 óbitos, um valor que suplanta em muito o “défice” favorável de 2020 e 2021.

    O grupo etário que apresentou um maior agravamento foi o dos muito idosos (maiores de 90 anos), que estão com valores cerca de 17% acima do período imediatamente anterior à pandemia, e numa tendência que não parece ter encontrado o topo. Essa “razia” dos super-idosos pode ter uma razão simples: a vida não dura sempre e o sacrifício de os proteger contra a covid-19 descurou outras afecções que agora manifestam os seus efeitos, através de um aumento dos desfechos fatais.

    Essa evidência também se afigura no grupo etário dos 85 anos 89 anos, onde se observa uma redução da mortalidade expectável nos primeiros dois anos da pandemia, sucedendo depois um crescimento acentuado ao longo dos meses de 2022.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022 nos grupos etários dos maiores de 60 anos. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Já sem atenuação da mortalidade durante 2020 e 2021, a evolução dos desfechos fatais para os idosos entre os 80 e 84 anos apresenta também sinais preocupantes. Tanto antes como nos dois primeiros anos da pandemia, o número de óbitos por mês (média móvel de 12 anos) rondava valores entre os 800 e os 850, mas o valor de Setembro do ano passado situou-se nos 987 óbitos.

    Tendência recente preocupante abrange também o grupo etário dos 75 aos 79 anos, com o número de óbitos em Setembro passado (média móvel de 12 meses) a aproximar-se dos 800, quando antes e durante os primeiros dois anos da pandemia andou entre os 650 e os 700 óbitos. Ou seja, os valores mais recentes representam um agravamento superior a 10% face ao normal.

    Similar efeito, embora atenuado, se mostra nos diversos grupos etários dos 60 aos 74 anos, embora em termos relativos se esteja sempre perante acréscimo da ordem dos 10%.

    Nas populações adultas entre os 40 e os 59 anos, o efeito da pandemia foi nulo. Quer antes da pandemia, quer antes do surgimento da vacina quer depois quer ainda nos meses de 2022, as flutuações são mínimas e dentro daquilo que estaticamente se pode considerar norma. O mesmo se aplica nos menores de 40 anos, tanto nos jovens adultos como nos adolescentes, crianças e recém-nascidos.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022 nos grupos etários dos menores de 60 anos. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Ou seja, tal como em muitos outros países – incluindo Portugal –, quando se olha para o impacte da pandemia nos menores de 50 anos, nada aconteceu. Sem vacina ou com vacina, o perfil da mortalidade total é similar àquilo que era antes de 2020.

    Porém, o caso muda de figura para os mais idosos. Na Nova Zelândia, se a política de Jacinda Ardern foi de salvar idosos, de facto conseguiu-o, mas com um trágico desfecho: alguns idosos tiveram “direito” a uns quantos meses de vida suplementar, é certo, mas em absoluta reclusão e medo da covid-19.

    E depois desses meses acabaram muitos desses – e outros mais, em excesso – por perecer. Sem glória. E a trágica procissão pode ainda estar no adro. Na Nova Zelândia, Jacinda Ardern já não estará no Governo para assumir responsabilidades; ao invés, sai com aura de heroína internacional, sobretudo para quem não olha para os números, para a realidade.

  • Esquecidos estavam, esquecidos continuam

    Esquecidos estavam, esquecidos continuam

    O PÁGINA UM desafiou Joaquim Magalhães de Castro, jornalista em Macau e autor de um vasto conjunto de obras de viagens e sobre o passado dos portugueses na Ásia, a escrever sobre a perseguição de luso-descendentes em Myanmar, antiga Birmânia. Os bayingyis são uma comunidade que está a ser massacrada nos últimos meses perante a passividade das autoridades portuguesas e da imprensa mainstream. Com excepção da primeira, todas as fotografias foram tiradas por habitantes locais das aldeias de Chaung Yoe e Chan-tha-ywa, a norte de Mandalay, após ataques perpetrados por militares birmaneses em Fevereiro e Maio deste ano. A veracidade das fotos foi confirmada ao PÁGINA UM por Joaquim Magalhães de Castro.


    Enquanto a guerra na Ucrânia domina as atenções dos media e das organizações internacionais, prossegue impune a repressão da Junta Militar do Myanmar em relação a todos os que se opõem ao seu tirânico regime.

    Entre eles estão os membros de uma comunidade luso-descendente com quase 450 anos de existência, gente rural, conhecidos localmente como bayingyis.

    Várias das suas aldeias foram já inteiramente queimadas, os seus bens destruídos e houve até quem fosse assassinado a sangue-frio. Aterrorizados pela acção da soldadesca e dos tiros da artilharia, os aldeões fugiram e encontram-se agora refugiados nas instalações da diocese em Mandalay, a segunda cidade do país.

    Rosto de um habitante da comunidade bayingyi, que mantém um apelido bem luso (Abreu). Foto: ©Joaquim Magalhães de Castro

    Desabafo de um dos seus residentes, chamemos-lhe Paulo: “temos imenso orgulho das nossas raízes portuguesas, mas Portugal não quer saber de nós!”. Diz isto, pois desde o final do ano passado tem estado em contacto comigo fornecendo-me provas das atrocidades cometidas, provas essas que em vão tentei fazer chegar a alguns dos principais órgãos de comunicação social.

    Não demonstraram qualquer interesse pela matéria até há umas semanas, quando lhes fiz chegar a mensagem que recebera do Paulo, logo pela manhã: “Ontem, um contingente militar de 150 soldados entrou em Chan-thar-ywa, uma grande aldeia bayingyi na região de Sagaing, disparando mais de três tiros de artilharia. Às 15 horas começaram a queimar a aldeia. A minha casa e muitas outras foram incendiadas… O pároco, as religiosas e os aldeões estão agora em fuga, deixando para trás todos os seus bens. Avistamos muito fumo do local onde nos escondemos”.

    Dias depois, já na capital Yangon, Paulo informava-me que a Junta Militar cortara a Internet e as comunicações de rede móvel na região onde se situam as aldeias dos luso-descendentes. Ou seja, a partir de então essa gente ficou ainda mais isolada.

    As imagens que o Paulo me fez chegar mexeram comigo, tocaram-me no fundo da alma, entristeceram-me profundamente.

    Conheci bem aquelas aldeias, dormi naquelas casas de teca e recebi da gente que as habitava toda a hospitalidade do mundo e arredores. Eu representava o Portugal mítico que, durante séculos, os bayingyis transportaram (e transportam ainda) consigo, apesar da maior parte deles ser incapaz de indicar num mapa onde fica Portugal.

    O Paulo era miúdo ainda quando pela primeira vez visitei essas aldeias, em 1993… Mais tarde, teve oportunidade de viajar e, numa passagem por Macau, veio à minha procura. “Lembro-me bem de si. Era criança ainda”, disse ele quando nos sentámos para beber um café e evocar recordações antigas.

    Na verdade, ando desde meados da década de 1990 a falar da comunidade bayingyi, a mais reputada das comunidades luso-descendentes do Myanmar. Dei a conhecer a sua existência e os seus anseios com artigos nos jornais e revistas, exposições fotográficas, dois livros, um documentário, depoimentos nas rádios e televisões e nas inúmeras conversas com amigos e desconhecidos.

    Em Macau, Portugal e onde foi possível chegar no Mundo. Mesmo assim, ainda há quem teime em ignorar a sua existência e as suas justas reivindicações históricas. É o caso da maioria dos media (sobretudo das televisões) e das nossas autoridades, ao mais alto nível, todas elas ao corrente da situação. Presidência da República, Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), Assembleia da República: um ensurdecedor silêncio; prova provada de que Portugal abdicou da sua política externa.

    Depois de registar o meu testemunho sobre o processo em curso, que visa, no mínimo, a desagregação e desenraizamento dessa comunidade orgulhosamente distinta das restantes (ou até, porventura, a sua aniquilação completa), uma jornalista da Lusa foi ouvir o que tinha a dizer o nosso MNE: “Questionado pela agência Lusa, o Ministério dos Negócios Estrangeiros recordou que, desde o primeiro instante, Portugal condenou o golpe militar de 1 de Fevereiro de 2021, praticado pelas autoridades militares do Myanmar, uma violação flagrante da vontade da população, expressa nas eleições gerais de 8 de Novembro de 2020”.

    E prossegue a nota do Palácio das Necessidades: “A violência por motivos étnico-religiosos ou a violação da liberdade religiosa é injustificável e inaceitável, em todas as suas formas. Myanmar está no topo da agenda da União Europeia e Portugal continuará a participar activamente no esforço colectivo da comunidade internacional para pôr termo a este conflito e auxiliar as populações vulneráveis”.

    Ou seja, sobre a comunidade bayingyi – que mantém a chama da portugalidade há mais de 400 anos, e que agora perdeu tudo o que tinha (casas, bens, animais, colheitas e, alguns, familiares também) – nem uma palavra!

    E tudo indica que razão desse silêncio se deve a rumores que nas Necessidades disseminaram a disparatada ideia de que a assumida origem lusitana dos bayingyis não tinha razão de ser e que tudo não passava de uma invenção de “alguns oportunistas”, daí que os nossos governantes optassem por não individualizar a questão, preferindo diluí-la no protesto comum da União Europeia pela continuada repressão às minorias éticas.

    Face a este delírio, só me ocorre dizer o seguinte: ou estamos perante alguém com uma enorme má-fé (inclino-me para esta hipótese) ou então com sérios problemas cognitivos.

    É sabido que a gente mesquinha e torpe, por norma não lê, não estuda, não conhece, e tem raiva de quem lê, estuda e conhece. Daí a sua tendência para a má-língua e a difamação. Pois bem, a origem portuguesa dos bayingyis (e de outras comunidades luso-descendentes do Myanmar, nomeadamente a de Arracão, que também conheço bem) está mais do que comprovada.

    Basta ler, por exemplo, alguns dos capítulos da Peregrinação de Fernão Mendes Pinto ou a nossa contemporânea investigadora Maria Ana Marques Guedes, especialista da relação histórica entre Portugal e a Birmânia. Está lá tudo explicadinho.

    Entretanto, e para os mais preguiçosos, deixo aqui, em jeito de introito histórico, uma breve resenha que, espero, ajudará a contextualizar sobre quem são exactamente os bayingyis. E como surgiram.

    A Ilha dos Portugueses

    – Se vai ao meu país, não se esqueça de visitar a ilha dos portugueses. – Foi com estas palavras que se despediu de mim o jovem secretário da embaixada de Myanmar em Pequim quando, no início da década de 1990, aí fui solicitar um visto de turista.

    Dessa vez, não chegaria a utilizá-lo, mas aquilo da “ilha dos portugueses” ficou-me na ideia durante algum tempo.

    Quando, poucos anos depois, visitei pela primeira vez essa nação que já se chamou Birmânia, e que um punhado de generais teimava em considerar feudo seu, levava a lição minimamente estudada, graças à informação que em Macau me fora fornecida por um amigo entusiasta dessas coisas das miscigenações.

    Quem primeiro nos relata o pioneirismo dos portugueses na Birmânia é o cronista Duarte Barbosa, que em 1501 ruma à Índia com uma frota de várias dezenas de navios, só regressando a Portugal quinze anos depois.

    No decorrer da sua viagem pelo subcontinente e pelo Sudeste asiático refere-se, por diversas ocasiões, ao reino da Birmânia, com “os seus habitantes de pele escura que andam nus da cintura para cima”, e aos «mouros e pagãos» (entre estes últimos estavam incluídos os chineses), os grandes comerciantes da época, rivais dos portugueses.

    Barbosa é, provavelmente, o primeiro europeu a mencionar a existência da Birmânia, na altura, o nome dado ao principado de Tangu, que, juntamente com Ava, Pegu e Arracão, era um dos mais importantes reinos da região que hoje constitui o estado de Myanmar.

    Em 1511, os mon (uma das muitas etnias da região) estabeleceriam um tratado comercial e de amizade com Afonso de Albuquerque, que lhes enviou um mensageiro chamado Rui Nunes, procurando, com isso, o apoio dos gentios contra o inimigo comum: os muçulmanos. Pegu, reino budista, era um aliado precioso.

    Em Agosto de 1512, Pêro Pais e Jorge Álvares rumam ao Pegu a bordo do junco São João. Estava assim iniciada uma prática corrente de compra de juncos para Malaca, que daria origem a uma rota de duas semanas, com escala, para carregamento de pimenta no porto de Pacém, ilha de Samatra.

    Passaram a ser construídas em Martavão, a partir de então, inúmeras dessas embarcações que seriam escoadas para Malaca, de maneira que esta pudesse responder de forma eficiente às intensas relações marítimas que mantinha com vários portos da Ásia e da Insulíndia. Por vezes, eram os malaqueiros que rumavam a Pegu em busca de juncos; outras, eram os pegus que se dirigiam para Malaca, onde os vendiam depois de saldado o trato.

    Na sua Peregrinação, Fernão Mendes Pinto refere-nos as riquezas da Birmânia, chamariz para mercadores portugueses, que ali demandavam a partir de Malaca, em busca das afamadas madeiras, cereais, laca e pedras preciosas, como os rubis ou as safiras, entre tantos outros produtos, e visitavam no processo o arquipélago de Mergui, as cidades de Tavoy, Sirião, Cosmim, Akyab, tornando-se aliados do rei de Pegu. Chegaram acompanhados pelos respectivos capelões, e assim se foi instalando o cristianismo na região.

    Estabelecido em Martavão, o feitor português Duarte Peçanha de Alenquer acabaria por bater em retirada, após escaramuças com a população local e os portugueses aí residentes. Eram as primeiras manifestações do poder dos lançados ou homiziados, que em toda aquela região comerciavam por conta própria e que desde sempre ofereceram resistência à tentativa monopolizadora do Estado da Índia.

    Fossem eles mercadores ou soldados, teriam um papel fundamental na formação política da Birmânia, nomeadamente na conquista de Pegu, em 1598, pelas forças aliadas birmanesas dos reinos de Tangu e de Arracão.

    Em 1519, na sequência de um novo tratado de paz e comércio, assinado por António Correia, representante do rei português, e o soberano de Pegu, as trocas intensificar-se-iam ainda mais. De acordo com os relatos de Faria de Sousa, na sua Ásia Portuguesa, as relações comerciais entre Portugal e os reinos de Ava e Pegu expandiram-se de tal maneira que, por volta de 1556, se encontravam já “ao serviço do rei Bayinnaung mais de um milhar de soldados e marinheiros portugueses sob as ordens de António Ferreira de Braganza”.

    Em alguns dos capítulos da Peregrinação, Mendes Pinto relata-nos vários episódios envolvendo estes mercenários e cita até o nome de muitos deles. Ele próprio exercia na altura a função de mercenário e, ao chegar ao porto de Cosmim, após uma atribulada travessia do país, deparou com uma pequena colónia de católicos, precisamente o resultado dos casamentos inter-raciais, entretanto efectuados pelos soldados e mercadores portugueses ali estabelecidos.

    Curiosamente, o primeiro religioso a pregar entre os birmaneses era um franciscano francês, Pierre Bonfer, capelão dos marinheiros e comerciantes lusos, de 1554 a 1557, em Sirião, à época, o principal porto da região. Escusado será dizer que as pioneiras tentativas de missionação caíram em saco roto.

    Esse porto, na embocadura do rio Irrauadi, frente a Yangon, ficaria para sempre ligado ao nome de Portugal e dos portugueses, graças ao controverso desempenho de um aventureiro chamado Filipe de Brito, que, de 1600 a 1613, fez o que muito bem lhe apeteceu em Sirião e na vizinha zona costeira. Brito tinha absoluto poder sobre a região e seus habitantes, tendo sido sob a sua protecção e auspícios que os capelões jesuítas puderam dar início ao processo de “evangelização entre os gentios”, como se dizia então.

    Filipe de Brito não foi o único, mas tratou-se seguramente do mais famoso dos lusos aventureiros que pululavam naquela e noutras regiões da Ásia.

    Os descendentes desses soldados portugueses, que na época de seiscentos lutaram ao lado dos soberanos de Ava e do Pegu, ou que faziam parte do pequeno exército de Filipe de Brito, ou do seu companheiro de armas, Salvador Ribeiro de Sousa, senhores feudais em terras do Oriente, ambos empossados com o título de «rei do Pegu», são hoje conhecidos em Myanmar como bayingyis.

    O legado de Filipe de Brito

    Gerir os destinos da feitoria do Sirião foi a recompensa obtida pela participação de Brito (ao serviço do soberano de Arracão, reino situado na costa do golfo de Bengala) na conquista do Pegu, facto histórico que viria a ser retratado num mural de um relicário contíguo ao templo Ananda, na cidade de Bagan, e que nos mostra Brito e companheiros a bordo de juncos.

    No entanto, o militar português, insatisfeito com o seu quinhão, da feitoria fez fortaleza – “começando no ano de 1599 por uma tranqueira de madeira, no ano de 1602 o fez de pedra e com muita artilharia e munições a pôs em estado para se poder defender de todos os inimigos”, como escreve o cronista Bocarro – e, em revolta aberta contra Arracão, não só se assenhorou da zona do delta e da sua população, como tentou apoderar-se dos portos de mar de Cosmim e Martavão, locais onde projectara erguer fortalezas.

    Assegurar a posse dessa zona estratégica equivalia à possibilidade de controlar toda a região, como, de facto, o fizeram os portugueses. Filipe de Brito soube conquistar também a simpatia dos soberanos de etnia mon; preocupando-se em povoar as terras ermas, ofereceu-as depois, isentas de impostos, aos habitantes.

    Assim, em redor da fortaleza foi crescendo a povoação. Em Outubro de 1602, haveria no Sirião, sob guarida portuguesa, entre catorze a quinze mil pessoas.

    Originários de uma região que se estende ao longo do golfo de Martavão, delimitada a leste por uma cadeia montanhosa, os mon acabariam, ao longo da sua história, por ser absorvidos pelos povos vizinhos, fossem eles birmanes ou siameses.

    Porém, curiosamente, não só a cultura mon sobreviveria a toda essa absorção, como acabaria por moldar a dos povos invasores. Foi de Thaton, antiga capital mon, que partiu o budismo para, em Bagan, se tornar a religião do império.

    Fiel a uma estratégia previamente delineada, e uma vez assegurada a aliança com os mon, Filipe de Brito de Nicote tratou logo de estabelecer parceria com Nat shin Naung, rei do Tangu, familiar e rival do de Ava, pois pretendia utilizar esse reino como trampolim para o interior, de onde sabia virem as riquezas que se comerciavam nos portos do Pegu, em Arracão e na costa sul.

    Situado na zona limítrofe entre a Baixa e a Alta Birmânia, o reino de Tangu constituía um empecilho aos desejos de domínio do rei de Ava, que tencionava avançar também sobre o Sirião. A relação de Brito com Nat Shin Naung era de tal forma próxima que, alegadamente, este ter-se-ia convertido ao cristianismo, chegando mesmo a receber o baptismo.

    Uns consideravam-nos “irmãos de sangue”; outros, simples cunhados, pois Brito de Nicote viria a casar-se com a irmã do birmanês, que, depois de convertida, adoptaria o nome de dona Maria de Saldanha.

    Verdadeiro “lançado”, senhor do seu destino, Filipe de Brito sonhava com a criação de um estado equivalente ao Estado da Índia, mas no Sudeste asiático. O reino de Ava, porém, antecipou-se, ocupando Tangu em 1609.

    Por solicitação do cunhado destronado, Brito marchou sobre a cidade, resgatou Nat Shin Naung, fez o devido saque e refugiou-se em Sirião. Furibundo, Anauk-hpet-lung, rei de Ava, retaliaria, conquistando, após prolongado cerco, o estabelecimento português em 1613 e pondo assim fim ao reinado do capitão.

    Acusados de corruptores da religião, os dois amigos morreriam por ordem de Anauk-hpet-lung nesse mesmo ano. A Nat Shin Naung, abriram-lhe o peito; ao português coube a cruel morte por empalação, tendo passado “três dias em agonia antes de perecer”, como relatam as crónicas da época.

    Faria de Sousa conta-nos que não era intenção inicial do monarca avanês poupar a vida aos habitantes de sirião, mas que, “depois de acalmado, decidiu enviá-los para norte, para Ava, como escravos”. Um trajecto de mais de setecentos quilómetros, percorrido a pé pelos seguidores de Filipe de Brito, que, nas palavras do cronista, “eram constituídos por portugueses, euro-asiáticos, negros e malabares”. Totalizavam alguns milhares, entre os quais apenas quatrocentos seriam inteiramente portugueses.

    Este quantitativo é, no entanto, fortemente contestado por quem se debruça com mais atenção sobre o tema em causa. Ao que consta, o número de portugueses seria bem mais elevado, sendo que, nessa sua penosa jornada, tiveram o apoio moral e a companhia dos franciscanos Gonçalo Machado e Manuel da Fonseca. este último terá enviado uma carta, datada de 26 de Dezembro de 1616, ao vice-rei de Goa, relatando as dificuldades pelas quais passaram os prisioneiros nessa jornada.

    Em 1635, partiria para Ava o dominicano e lisboeta Agostinho de Jesus, ao saber que ali se encontravam quatro mil cativos, desprovidos de qualquer assistência espiritual.

    A esse respeito, relatam as crónicas o seguinte: “Se pôs a caminho daquela cidade, em que gastou três meses pela Ganga acima, sujeitando-se ao rigor da mesma prisão por acompanhar os cristãos nos seus trabalhos, administrar-lhes a consolação de que careciam, e com eles esteve cumprindo no mesmo trabalho muitos anos, nos que ia também tirou da sua cegueira a muitos gentios, e conseguida a liberdade passou aos reinos de Bengala.”

    A comunidade cristã ter-se-ia, entretanto, multiplicado. Para prevenir uma proliferação excessiva, o rei Tahlun Min, irmão de Anauk-hpet-lung, entretanto assassinado pelo próprio filho, seleccionara os mais dotados na arte bélica e integrara-os na sua guarda pessoal, exilando os restantes para a povoação de Preinma, na margem leste do rio Chindwin, afluente do Irrauadi.

    Daí, seriam enviados para o vale do Mu, onde fundaram oito aldeias, sendo autorizados a praticar livremente o seu culto. Trabalhavam as terras livres de impostos, sendo requisitados para o exército em tempo de guerra.

    O cronista António Bocarro refere, a propósito, que “ficaram cativos d’el rei e foram postos em aldeias ou espalhados pelo reino. Como cativos eram invioláveis, padecendo o único mal de não poderem sair do país”. Incorporados em unidades militares hereditárias de elite, constituíram até ao fim do século XVII a base da artilharia do II império Tangu.

    Mas Agostinho de Jesus e Gonçalo Machado foram excepção à regra, pois o Estado da Índia ignorou sempre os insistentes apelos no sentido de serem enviados padres para o interior, ficando a comunidade irremediavelmente abandonada à sua sorte durante quase meio século.

    Seriam os padres barnabitas italianos quem colmataria a lacuna e estruturaria o catolicismo, fundando escolas, onde se ensinava, para além do português, o latim e o italiano. No processo, criaram tipografias, onde eram impressas gramáticas, compêndios de história e dicionários, entre os quais um dicionário de latim-português-birmanês, ao mesmo tempo que faziam constantes pedidos para que da Europa lhes enviassem livros em português.

    Graças aos barnabitas, a nossa língua foi uma realidade na Birmânia até ao final do século XIX, tendo, a partir de então, caído no total esquecimento. Sabe-se também que os portugueses continuaram a gozar de um estatuto privilegiado junto da corte de Ava, graças a relatos de enviados europeus, que, por exemplo, mencionavam a presença do armador Simão de Vargas, “que falava fluentemente o birmanês e o siamês”, e de António Camarata, chefe da guarda-real, que “tinha autorização para andar armado na presença do rei”.

    Fruto do trabalho dos barnabitas, são recordados ainda hoje ilustres filhos da terra, como Ambrósio de Rosário, que em Roma foi cirurgião reputado; ou o padre George d’Cruz, responsável pela construção de um colégio e uma tipografia em Cosmim; ou ainda Inácio de Brito, o primeiro barnabita birmanês, poliglota, médico, escritor e, sobretudo, músico. Foram inúmeros os hinos religiosos que compôs e que até muito recentemente se cantavam, em português, nas igrejas de todo o país.

    Figura quase mítica, Filipe de Brito passaria para os anais portugueses e birmaneses (onde surge sob a designação Nga Zinga ou Kala), ora como herói, ora como traidor. O retrato pela negativa deve-se, quase sempre, ao seu procedimento hostil em relação ao culto oficial do império birmane.

    No pagode de Maha Kalyani, na cidade de Bago (antiga Pegu), por exemplo, existe ainda uma sala de ordenação construída em 1476 e que, em 1599, durante o ataque à cidade, o capitão português mandou queimar. Esta foi a primeira de outras quatro centenas de salas de ordenação similares disseminadas por todo o país, com base em cópias de plantas trazidas do Ceilão.

    Se era conflituosa a relação de Brito com a hierarquia budista, com a cristã revelou-se cordialíssima, representada aqui pela Companhia de Jesus, junto da qual o renegado gozava de grande prestígio, pois dera aos religiosos terra numa das ilhas do delta. Chegariam posteriormente dominicanos, agostinhos e franciscanos.

    O comportamento de ambas as partes – capitão e missionários – interferiria irremediavelmente na vida da região, do país e até na política seguida pelo Estado da Índia, de modo que este não só reconheceu os feitos do capitão, como encorajou pobres, renegados e aventureiros a procurarem refúgio em sirião.

    Nesse contexto, Filipe de Brito mandou erguer no interior da fortaleza a igreja de Nossa Senhora do Monte, acerca da qual existem raros registos, mas que se sabe ter sido incendiada pelos exércitos conjuntos de Arracão e de Tangu, a 11 de Abril de 1607.

    Com a derrocada do feudo do português, o catolicismo sofreu um enorme revés, tendo a perpetuação do culto ficado entregue a religiosos goeses, que não sabiam birmanês e apenas pregavam em português-patuá, facto que só os hostilizava junto da população.

    Os primeiros missionários europeus que regressaram ao Sirião – dois franceses, em 1689 – ainda chegaram a abrir um dispensário, mas, acusados de espionagem, foram afogados no Irrauadi. A imagem dos representantes do clero que entretanto ali se mantinham, sob a supervisão da diocese de Madras, na Índia, não era a melhor, pelo menos se dermos credibilidade a relatos como o que se segue, feito por um navegador inglês do início do século XVIII eivado do puritanismo que caracterizava esse povo: “Há aqui cristãos de origem portuguesa e alguns arménios. Os portugueses possuem uma igreja, mas as vidas escandalosas que os padres levam tornam-nos desprezíveis aos olhos do povo.”

    Conclusão

    Os bayingyis de hoje constituem uma das várias comunidades católicas minoritárias (a maioria delas de origem portuguesa) que podemos encontrar do norte ao sul, do leste ao oeste desse enorme país maioritariamente budista que é o Myanmar, a antiga Birmânia.

    Os bayingyis habitam treze aldeias no norte do país, disseminadas por uma vasta planície entre os rios Chindwin e Mu, e subsistem sobretudo da agricultura. Distinguem-se dos restantes birmaneses pelos seus óbvios traços caucasianos – narizes proeminentes, olhos claros e profundos, maior pelugem no corpo, etc. –, muito embora o português tenha caído em desuso e os seus nomes e apelidos foram esquecidos (subsistem, estes últimos, nas placas funerárias e nos registos paroquiais).

    A prática do catolicismo é, sem dúvida, o traço mais distintivo dos bayingyis. Seguem o calendário litúrgico, praticam muitas das nossas tradições e mantêm aceso um enorme orgulho das suas raízes portuguesas.  

    De facto, como se comprova pelo cobarde silêncio que por aí paira, não os merecemos.

  • Iniciativa da Comissão Europeia causa maior polémica de sempre, mas em Portugal é ignorada pelos partidos e imprensa mainstream

    Iniciativa da Comissão Europeia causa maior polémica de sempre, mas em Portugal é ignorada pelos partidos e imprensa mainstream

    Consulta pública para renovar por mais um ano a vigência do certificado digital está a merecer uma contestação nunca vista. Em situações normais, regulamentos em dicussão recebem poucas dezenas ou centenas de comentários antes da sua aprovação, mas o prolongamento do documento que é a imagem da discriminação a quem recusa vacinar-se, em muitos casos por ter imunidade natural, já conta com mais de 136 mil comentários de cidadãos e entidades sobretudo da Itália, Holanda, Alemanha, Bélgica e Eslováquia. Em Portugal, porém, no pasa nada. A imprensa mainstream ignora o assunto. E de todos os partidos políticos, apenas o PCP quis falar ao PÁGINA UM.


    Manter ou não manter por mais um ano o certificado digital de vacinação como forma de discriminar os não-vacinados contra a covid-19 no controlo transfrointeiriço ou locais públicos e privados: eis a magna questão.

    Falta menos de uma semana para terminar a mais concorrida e polémica iniciativa legislativa da Comissão Europeia, e quase todos os principais partidos políticos portugueses ignoram este assunto. E nem se mostram interessados em o debater. A imprensa mainstream também nada noticia sobre a intenção da Comissão von der Leyen, que tomará uma decisão após a consulta pública que termina na próxima sexta-feira, dia 8.

    A fase de consulta pública do projecto de regulamentação da Comissão von der Leyen em prolongar a vigência do certificado digital até Junho de 2023 – declaradamente para incentivar a vacinação contra a covid-19 está a sofrer uma contestação nunca vista.

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    De acordo com os registos no site da Comissão Europeia foram contabilizadas, até às 19:30 horas de hoje, um total de 136.039 comentários e apreciações à proposta de uso do certificado digital, praticamente todas contra.

    Em pouco mais de um mês, os comentários mais do que duplicaram. Em 24 de Fevereiro, num levantamento do PÁGINA UM, estavam então registados 61.532 comentários.

    A Itália – país onde o uso do certificado digital para uso interno se aplicou de forma radical, condicionando mesmo o acesso ao emprego, transportes públicos e a bens essenciais – lidera as estatísticas, com 24.413 comentários de cidadãos e entidades.

    Segue-se a Holanda e a Alemanha a pouca distância uma da outra, com 22.631 e 22.592 comentários, respectivamente. A França conta já com 17.282, e Bélgica e Eslováquia contam, cada, com mais de cinco mil.

    Portugal é apenas o 13º país com mais comentários, com um total de 1.257,o que se deverá, em grande medida, à falta de eco sobre a consulta pública, quase um boicote, pela imprensa mainstream.

    Para obter uma reacção sobre a necessidade de prolongamento do certificado digital – que cientificamente não garante a não transmissibilidade da covid-19 nem tão-pouco de mecanismo de controlo da pandemia –, o PÁGINA UM contactou durante a passada semana todos os partidos políticos com assento na Assembleia da República e/ou no Parlamento Europeu sobre esta matéria, a saber: Partido Socialista, Partido Social Democrata, Chega, Iniciativa Liberal, CDS, PAN, Bloco de Esquerda e Partido Comunista Português (PCP).

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    Apesar de terem sido feitos dois contactos, apenas o PCP reagiu. Referindo que “quando da discussão e aprovação do ‘certificado digital’ no Parlamento Europeu”, discordou e repudiou “um regulamento que permitia aos Estados Membros imporem restrições à circulação de pessoas”, incluindo o acesso ao emprego, os comunistas dizem “não ver nenhuma razão para alterar a nossa posição”.

    E relembram ainda que “a Organização Mundial de Saúde, não só desaconselhou que tal decisão fosse tomada, como chamou a atenção para o facto de se estar a fazer tábua rasa do Regulamento Sanitário Internacional, subscrito por 196 países, que aponta soluções mais eficazes.”

    Para o PCP, que defende ser a vacinação eficaz no combate à covid-19, não é com o certificado digital, “com este tipo de imposições”, que se consegue convencer os mais reticentes, mas sim “através de outras medidas mais eficazes”. No entanto, para este partido político “não se justifica a introdução da obrigatoriedade.”

    O Governo português, por seu turno, aparenta querer manter a sua vigência, tanto mais que tomou a decisão deixar cair o prazo de validade dos certificados dos menores. Significa assim que os maiores de 18 anos terão de tomar reforços da vacina contra a covid-19 de 9 em 9 meses, independentemente do seu grau de imunidade, caso pretendam renovar o seu “passe sanitário administrativo”.

    Recorde-se que o regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, ainda em vigor, que criou, em Junho do ano passado, “um regime para a emissão, verificação e aceitação de certificados interoperáveis de vacinação, teste e recuperação da COVID-19 (Certificado Digital COVID da UE)” pretendia “facilitar a livre circulação de pessoas durante a pandemia”. Mas era temporário, com o prazo de um ano e apenas para controlo transfronteiriço.

    Porém, estes certificados foram depois abusivamente aproveitados por diversos Estados-membros, incluindo Portugal, para discriminarem não-vacinados (mesmo se recuperados há mais de seis meses) no acesso a determinados espaços.

    Em todo o caso, de acordo com um levantamento ontem apresentado pelo jornal ECO, há 15 países que já decidiram terminar com as restrições nas viagens para os cidadãos da União Europeia ou do Espaço Schengen, a saber: Dinamarca, Eslovénia, Finlândia, Hungria, Irlanda, Islândia, Lituânia, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, República Checa, Roménia, Suécia, Suíça e Liechtenstein.

  • Comissão Europeia ‘inundada’ de comentários sobre polémica extensão do certificado digital da covid-19

    Comissão Europeia ‘inundada’ de comentários sobre polémica extensão do certificado digital da covid-19

    Como habitualmente, antes da aprovação de regulamentos, a Comissão Europeia lança uma consulta pública aos cidadãos. Por regra, as iniciativas contam com nula ou escassa participação. Desta vez, com a intenção de manter os certificados digitais por mais um ano, os comentários multiplicam-se: são já 130 vezes mais do que os da segunda iniciativa com maior participação. E ainda faltam mais de 40 dias para a consulta terminar.


    A intenção da Comissão Europeia em prolongar a vigência do certificado digital da covid-19, neste momento em fase de consulta pública, está a sofrer uma contestação jamais vista. De acordo com os registos no site desta entidade, foram já registadas, até às 20 horas de hoje, um total de 61.532 comentários. A consulta pública foi iniciada no passado dia 3 e prolongar-se-á até 8 de Abril.

    Em causa está a alteração do regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que criou, em Junho do ano passado, “um regime para a emissão, regime para a emissão, verificação e aceitação de certificados interoperáveis de vacinação, teste e recuperação da COVID-19 (Certificado Digital COVID da UE)”, com o objectivo de “facilitar a livre circulação de pessoas durante a pandemia”.

    Estes certificados acabaram, contudo, por ser usados pelos diversos Estados-membros, incluindo Portugal, para sobretudo discriminar não-vacinados (mesmo se recuperados há mais de seis meses) no acesso a determinados espaços.

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    A Comissão von der Leyen assume na nova proposta, que visa prolongar por mais um ano este documento digital, que a sua existência contribuiu decididamente para o aumento das taxas de vacinação. Recorde-se que a União Europeia, em conjunto, já comprou vacinas às farmacêuticas até 2023.

    Tendo em conta que as vacinas afinal não evitam a infecção e a covid-19 se está a tornar endémica, sobretudo com o surgimento da variante Omicron, a proposta da Comissão Europeia está longe de ser pacífica.

    Logo na primeira semana de consulta pública, o site da Comissão Europeia recebeu cerca de 24 mil comentários, então com particular destaque dos italianos. Contudo, nas últimas duas semanas, a participação aumentou substancialmente e alargou-se o espectro geográfico. Neste momento, os comentários provenientes da Itália são já apenas 28% do total, tendo a França (23%), Holanda (21%), Alemanha (8%) e Bélgica (7%) ganhado relevância.

    A maioria dos comentários é de cidadãos da União Europeia, mas também já deram opinião mais de duas centenas de empresas, 53 universidades, 37 entidades públicas, 56 organizações não-governamentais, de consumidores e de ambiente, entre outras. A participação de portugueses ainda é pouco significativa: apenas 839 comentários (1,4% do total). No dia 15 deste mês eram 451.

    Embora seja praticamente impossível apresentar uma estatística detalhada, mostra-se notório um claro sentimento contrário às pretensões da Comissão Europeia, com quase todas as opiniões a centrarem-se no carácter anticonstitucional, segregacionista e ineficaz, como instrumento de controlo da pandemia, do certificado digital.

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    Contudo, o maior destaque desta consulta pública – que consubstancia a polémica que encerra – é a desmesurada participação pública.

    Com efeito, actualmente, a Comissão Europeia tem em curso 91 iniciativas legislativas que versam as mais variadas temáticas, nomeadamente finanças, economia, agricultura, alimentação, transportes, direitos humanos e igualdade, energia e ambiente.

    Uma parte considerável (53 em 90) têm menos de uma dezena de comentários. Muitas nem sequer recebem ainda uma única opinião, mesmo se o tema é relevante. É o caso, por exemplo, da avaliação da Directiva Igualdade Racial ou da revisão das regras macroprudenciais para limitar o risco sistémico – ou seja, para reduzir uma nova crise financeira.

    De resto, apenas 10 iniciativas tiveram, até agora, mais de uma centena de comentários, grande parte das quais relacionadas com alimentação, energia e ambiente, que são historicamente temáticas com activa participação pública.

    Contudo, a distância é colossal face à participação pública sobre os certificados digitais.

    Com efeito, de acordo com os dados da Comissão Europeia, a revisão do regulamento de rotulagem de alimentos é a segunda iniciativa com maior número de comentários (472), seguindo-se um diploma sobre os processos de concessão de licenças e contratos de aquisição de energia renovável (341) e a revisão do regulamento REACH sobre substâncias tóxicas (325).

    Na verdade, a participação pública sobre a extensão dos certificados digitais é, neste momento, quase 60 vezes superior à de todas as outras 90 iniciativas juntas. E ainda faltam 43 dias para terminar a consulta. A Comissão Europeia refere que “todos os comentários recebidos serão resumidos (…) e apresentados ao Parlamento Europeu e ao Conselho a fim de contribuir para o debate legislativo”.

  • Ao vigésimo dia, lei de emergência não verga protestos

    Ao vigésimo dia, lei de emergência não verga protestos

    Com avanços e recuos, os apoiantes da Caravana da Liberdade precisam de ter cada vez mais jogo de cintura. Depois do primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, ter assumido poderes de emergência, aproxima-se mais um fim-de-semana de protestos aumentados.


    Ao vigésimo dia de protesto, os manifestantes do Freedom Convoy continuam empenhados em não dar tréguas, apesar de alguns bloqueios na fronteira do Canadá estarem a dissipar-se, após a ponte Ambassador – que liga Windsor, na província canadiana de Ontario, a Detroit, nos Estados Unidos – ter sido reaberta no passado domingo. A Polícia Montada Real do Canadá – mobilizada ao abrigo da Lei de Emergências decretada por Justin Trudeau – prevê também que o porto de entrada de Emerson seja evacuado ainda hoje.

    O primeiro-ministro canadiano decidiu entretanto utilizar a Lei de Emergência de Ordem Pública pela primeira vez desde a sua aprovação em 1988, dando-lhe poderes especiais durante 30 dias. No entanto, esta decisão mostra-se controversa.

    Os cenários previstos na Lei de Emergência de Ordem Pública englobam problemas de segurança associados a actos de espionagem ou sabotagem, actividades com ligações ao estrangeiro, ameaças ou instrumentalização de actos de violência com fins políticos, religiosos ou ideológicos, e acções ilegais com vista a enfraquecer ou derrubar o Governo.

    Nenhuma destas condições aparentemente se aplica a estas manifestações impulsionadas por camionistas, que têm sido sempre pacíficas.

    Embora Trudeau tenha o apoio do primeiro-ministro de Ontário, Doug Ford, outras vozes têm-se manifestado contra. Por exemplo, o homólogo do Quebec, François Legault, já disse não querer esta lei aplicada à sua província. Legault – que anunciou há cerca de uma semana o alívio de várias restrições anti-covid na sua província – acredita que esta medida é “deitar achas para a fogueira”.

    A Associação Canadiana para as Liberdades Civis, uma organização sem fins lucrativos fundada em 1984, também já expressou preocupação em se ver “deteriorar a democracia e os direitos civis” com a aplicação desta legislação especial.

    Em todo o caso, o Governo de Trudeau poderá agora ordenar o reboque de camiões que estejam a incorrer em bloqueios. Por sua vez, os bancos poderão ser obrigados a congelar temporariamente contas de pessoas singulares ou colectivas sem necessidade de autorização do Tribunal, bastando que haja suspeita de serem utilizadas para financiar os protestos. Aliás, a angariação de fundos na plataforma GiveSendGo esteve suspensa durante alguns dias, mas foi novamente reactivada, com apoios a totalizarem já valores próximos de 9,5 milhões de dólares americanos.

    Recorde-se que, há cerca de duas semanas, a maior plataforma mundial de crowdfunding, a GoFundMe, suspendeu a campanha e angariação de fundos do Freedom Convoy, por pressões do Governo canadiano, quando já estavam recolhidos 10 milhões de dólares canadianos, mas apenas libertado um milhão para os organizadores.

    Entretanto, começaram a surgir “baixas” entre as autoridades. Após ter sido alvo de críticas pela forma como lidou com os protestos, o chefe da polícia de Ottawa, Peter Sloly, apresentou ontem à noite a sua demissão. Através de uma publicação no Twitter, disse que o fazia “com um coração pesado”.

    Segundo a BBC, os residentes da capital preferiam que Sloly tivesse tido “mão pesada” contra os manifestantes, e consideraram a sua actuação demasiado branda.

    Alguns habitantes insatisfeitos de Ottawa relataram mesmo um clima de proximidade entre as autoridades e os participantes do Freedom Convoy, acusando que chegaram a ocorrer jogos amigáveis de fist-bumps entre membros da polícia e os manifestantes. Essas acusações acabam, contudo, por ser uma “arma” dos manifestantes, que têm defendido sempre e reivindincado uma contestação pacífica, apesar das tentativas do Governo e de alguma imprensa em os colar a linhas ideológicas de extrema-direita e de grupos de teorias da conspiração.

    Porém, as autoridades canadianas garantem que já efectuaram dezenas de detenções e emitiram milhares de coimas desde o início dos protestos. Ontem, a polícia canadiana revelou que quatro pessoas foram detidas e acusadas de planear o assassinato de oficiais. No entanto, continuam sem ser emitidas quaisquer imagens de desacatos ou movimentos considerados hostis por parte dos participantes.

    Também hoje, um juiz do Tribunal Superior de Ontario decidiu prolongar por mais 60 dias a ordem que impedia os camionistas de buzinar, emitida na semana passada.

    A Polícia de Ottawa lançou também, na manhã de hoje, um aviso a exigir que os manifestantes abandonem o centro da capital imediatamente, advertindo ainda que quem participar ou ajudar os bloqueios estará a cometer um crime. E nota-se agora uma presença mais musculada de polícias nas ruas, mas, por agora, sem quaisquer sinais de animosidade de ambos os lados.

    As reacções a esta ameaça têm sido feitas com bonomia e mesmo humor: muitas pessoas fizeram uma espécie de procissão munidas de jerry cans vazios, incluindo crianças e adolescentes.

    Texto editado por Pedro Almeida Vieira

    N.D. – O PÁGINA UM, conforme defendeu em editorial, decidiu suspender a sua angariação pontual de fundos através do GoFundMe, onde tinha angariado 13.884 euros (valor bruto, sem deduções de cerca de 10% em comissões), passando a optar pela plataforma MIGHTYCAUSE.

  • Comissão Europeia quer prolongar certificado que obriga à toma de até cinco doses da vacina contra a covid-19

    Comissão Europeia quer prolongar certificado que obriga à toma de até cinco doses da vacina contra a covid-19

    A Comissão Europeia quer manter a discriminação entre vacinados e não-vacinados, propondo o prolongamento do uso dos certificados digitais por mais um ano, até finais de Junho de 2023. E cita estudos que comprovam a “utilidade” das proibições de acesso como incentivo para a toma de mais doses da vacina. Caso seja aprovado o novo regulamento, além da manutenção de uma política segregacionista, com uma quarta dose serão vendidas pelo menos mais de 300 milhões de vacinas na União Europeia, um negócio superior a 6 mil milhões de euros para as farmacêuticas. E acrescem também custos operacionais de gestão dos certificados na ordem dos 10 mil milhões de euros.


    Em contraciclo com as decisões de alguns países europeus – como a Dinamarca, Finlândia, Noruega e Reino Unido – em cessar já a discriminação dos cidadãos em função do seu estado vacinal contra a covid-19, a Comissão Europeia quer estender por mais um ano a aplicação dos certificados digitais para condicionar ou proibir a circulação aérea e o acesso a certos lugares públicos por não-vacinados.

    Numa altura em que a pandemia se encontra já numa fase claramente endémica, a Comissão von der Leyen – adepta da imposição da vacinação obrigatória universal, incluindo a jovens e crianças – tem já pronta uma proposta de regulamento para prolongar até 30 Junho de 2023 o controlo de entradas através deste certificado, que apenas atesta a toma de vacinas ou a ocorrência de uma infecção recente.

    Como os certificados têm agora uma validade de nove meses, a implementação desta medida garante às farmacêuticas pelo menos mais um reforço vacinal. No limite, quem tomou a chamada “dose de reforço” até finais de Novembro do ano passado terá de receber uma quinta dose para não sofrer restrições de circulação até ao meio do próximo ano.

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    No texto que acompanha a sua proposta de regulamento, a Comissão Europeia mostra ser uma fervorosa adepta do uso do certificado digital para o condicionamento de acesso em espaços públicos no interior de cada país (por exemplo, em restaurantes, ginásios ou eventos culturais e desportivos) como instrumento de “incentivo” para a vacinação. E menciona expressamente dois estudos que provam que a implementação do certificado digital convenceu muitos a vacinarem-se.

    Num desses estudos, ainda em fase de working paper, investigadores belgas e franceses defendem que durante o Verão do ano passado os “certificados covid” contribuíram para um aumento substancial na aceitação de vacinas: mais 13,0 pontos percentuais (pp) na França, mais 6,2 na Alemanha e mais 9,7 na Itália. Ou seja, na verdade, assumem que as pessoas não se vacinaram por acreditar no poder de protecção da vacina; quiseram, sim, apenas continuar a movimentar-se livremente.

    Mas os investigadores também garantem que o certificado salvou vidas, embora através de uma mera análise contrafactual – ou seja, fazendo estimativas sobre eventuais mortes que teriam ocorrido se não houvesse aquele aumento de vacinação. Na sua opinião, sem esse reforço de vacinação teriam morrido mais 3.979 pessoas por covid-19 na França, 1.133 na Alemanha e 1.331 na Itália, além de avultadas perdas económicas.

    white and black plastic bottle

    Saliente-se, contudo, que nestes três países – tal como, aliás, em Portugal – morreram mais pessoas por covid-19 no Verão de 2021 (com vacina) do que no Verão de 2020 (ainda sem vacina).

    Noutro estudo (sem peer review), também mencionado pela Comissão Europeia, e que aborda igualmente a realidade do Canadá, aponta-se para uma subida semanal superior a 60% na primeira toma da vacina após a decisão das autoridades em impor o uso de certificado digital como forma de discriminação dos cidadãos não-vacinados.

    Recorde-se que, na União Europeia, onde já se emitiram mais de mil milhões de certificados, a vacina contra os efeitos do SARS-CoV-2 só passou a ser obrigatória na Áustria, e para certas profissões em outros Estados-membros, como a Grécia e Hungria (para profissionais de saúde), na França (profissionais de saúde e forças de segurança) e na Itália (para as duas anteriores classes, e também para professores e trabalhadores de lares).

    Estas decisões são polémicas, tanto mais que, por norma, nem os Estados nem as farmacêuticas assumem responsabilidades em caso de efeitos adversos. Em todo o caso, o Governo italiano já reservou 150 milhões de euros com vista a compensar eventuais reacções adversas da vacinação.

    Face à relutância de uma franja importante da população em tomar a dose de reforço, a manutenção do certificado digital constitui assim uma forma de coerção e incentivo. Caso 80% da população europeia “vacinável” adira a um reforço, serão vendidas mais de 300 milhões de doses, o que representará um negócio de 6 mil milhões de euros para as farmacêuticas. Além disto, os custos operacionais previstos pela própria Comissão Europeia para o prolongamento do certificado digital podem ascender aos 10 mil milhões de euros.

    A proposta da Comissão von der Leyen, apresentada no seu site em 23 línguas, está agora em consulta pública até ao próximo dia 8 de Abril, e a merecer já forte contestação, com uma elevada participação. Ontem, pelas 19 horas, o PÁGINA UM contabilizou 24.182 comentários, quase todos criticando o carácter desumano e discriminatório do certificado, até porque, como instrumento de controlo da doença, este papel não constitui nem garantia de não-infecção nem de não-transmissão da covid-19.

    man sitting on gang chair with feet on luggage looking at airplane

    Hoje, pelas 16 horas, o número de comentários já ultrapassava os 28.000, sendo que 53% provinham da Itália, 9% da Alemanha e 8% da França e também da Holanda. Com 451 comentários, Portugal encontrava-se na nona posição (2% do total). Além das opiniões de cidadãos, a proposta de regulamento incluía já comentários de 106 empresas ou associações empresariais, 23 universidades, 18 entidades públicas, 22 organizações de consumidores ou não-governamentais, cinco sindicatos e outras tantas associações de defesa do ambiente.

    A Comissão Europeia promete que “todos os comentários recebidos serão resumidos e apresentados ao Parlamento Europeu e ao Conselho a fim de contribuir para o debate legislativo”.

    Nota: Para leitura integral da proposta da Comissão Europeia, e para elaborar comentários, pode aceder AQUI.

  • Ontário anuncia fim do certificado de vacinação para desbloquear capital do Canadá

    Ontário anuncia fim do certificado de vacinação para desbloquear capital do Canadá


    O primeiro-ministro de Ontário, Doug Ford, acabou de anunciar o fim do certificado de vacinas naquela província canadiana a partir de 1 de Março, anunciou o National Post.

    A decisão surge após duas semanas de intensas manifestações pacíficas sobretudo na capital do Canadá e em outras cidades, apesar de todas as tentativas do primeiro-ministro Justin Trudeau em associar os protestos a movimentos violentos, de extrema-direita e com influências de ideólogos radicais. As autoridades judiciais tinham entretanto bloqueado neste fim-de-semana a angariação de fundos da segunda plataforma de angariação (a GiveSendGo), que já amealhara 9 milhões de dólares, situação que estava a criar ainda mais críticas à forma como os Governos democráticos estão a começar a lidar com os movimentos sociais espontâneos, como é o caso do Freedom Convoy.

    Ford disse aos jornalistas que “o anúncio de hoje não é por causa do que está acontecendo em Ottawa ou Windsor, mas apesar disso”, assumindo implicitamente que houve uma cedência para protestos que se estavam a tornar insustentáveis social e politicamente.

    Na próxima quinta-feira serão já alteradas algumas restrições, entre as quais os limites de reuniões sociais, que aumentarão para 50 pessoas em ambientes fechados e de 100 pessoas ao ar livre, enquanto outros limites de capacidade serão removidos em locais como restaurantes, bares, ginásios e cinemas. O limite de pessoas em mercearias, farmácias e estabelecimentos de comércio a retalho será entretanto definida.

  • Ordem judicial obriga desbloqueio de ponte mas manifestantes ganham alento com 9 milhões de dólares

    Ordem judicial obriga desbloqueio de ponte mas manifestantes ganham alento com 9 milhões de dólares

    O terceiro fim-de-semana do Comboio da Liberdade aproxima-se e as posições de ambos os lados continuam irredutíveis, mas civilizadas. Trudeau não aceita negociar; os manifestantes não arredam pé de Ottawa, apesar de se sucederem ordens judiciais. Entretanto, a GoFundMe já é passado; em uma semana, os organizadores conseguiram arrecadar mais do que aquilo que perderam com a decisão da semana passada daquela plataforma de crowdfunding.


    O Tribunal Superior de Justiça de Ontário ordenou o fim do bloqueio da Ambassador Bridge, que liga Windsor a Detroit, e que constitui uma das principais ligações comerciais entre o Canadá e os Estados Unidos.

    A ponte tem estado bloqueada há cinco dias por camionistas integrados no Freedom Convoy, e abre assim mais uma frente de conflito com a aproximação do terceiro fim-de-semana de protestos na capital Ottawa contra as restrições e mandatos impostos pelo Governo de Justin Trudeau.

    A decisão foi tomada em audiência nesta sexta-feira e as especificidades ainda estão a ser finalizadas, de acordo com a CBC News. Com esta medida, a polícia passa a ter uma base legal mais forte para uma intervenção mais musculada, uma vez que os incumprimentos passam a ser crime.

    Contudo, ao longo desta semana, apesar do “estado de emergência” decretado anteontem pelo mayor de Ottawa, Jim Wilson, e da decisão judicial de proibição de buzinadelas dos camionistas, o braço-de-ferro entre o Governo de Justin Trudeau e os manifestantes do Comboio da Liberdade (Freedom Convoy) mantém-se forte. E nenhuma das partes parece desejar ceder.

    Porém, nos últimos dias, outras províncias canadianas têm mostrado sinais de cedência. Na terça-feira passada, foram levantadas várias restrições na província de Saskatchewan, entre as quais o uso de máscara e a proibição de entrada em restaurantes dos não-vacinados. As províncias de Alberta e Quebec também estabeleceram um plano programado de levantamento das restrições até Março.

    Mas na capital as autoridades provinciais e federais têm tido uma postura diferente, tentando eliminar simplesmente os protestos. Na última semana têm procurado “sabotar” o fornecimento de bens aos manifestantes, e sobretudo o financiamento. Recorde-se que, há uma semana, a plataforma de crowdfunding GoFundMe cedeu às pressões do Governo de Justin Trudeau, e bloqueou nove dos 10 milhões de dólares canadianos (cerca de 6,3 milhões de euros), provocando uma fúria dos internautas que colocaram a credibilidade daquele empresa em nível muito baixo.

    Justin Trudeau, primeiro-ministro do Canadá.

    No entanto, para os manifestantes esse revés transformou-se num novo alento: através de uma plataforma similar, a GiveSendGo, foi atingida em apenas uma semana a fasquia dos 9 milhões de dólares americanos, equivalente a quase 8 milhões de euros.

    Esta verba é já superior ao montante “congelado” pelo GoFundMe, que entretanto foi pressionado a devolver integral e automaticamente todas as verbas doadas.

    Porém, as autoridades têm tentado a via judicial para que essas verbas não cheguem ao destino. Se essa é uma possibilidade, o mesmo não sucederá com as bitcoins arrecadadas numa outra campanha de apoio aos manifestantes.

    Na Tallycoin foram já angariadas criptomoedas no valor de mais de 800 mil euros. Por se basear num sistema monetário descentralizado e completamente anonimizado está imune a qualquer interferência judicial e política.

    N.D. – O PÁGINA UM, conforme defendeu em editorial, decidiu suspender a sua angariação pontual de fundos através do GoFundMe, onde tinha angariado 13.884 euros (valor bruto, sem deduções de cerca de 10% em comissões), passando a optar pela plataforma MIGHTYCAUSE.