Etiqueta: Destaque Opinião

  • O jornalismo ‘bonzinho’ não precisa de ser rigoroso, Car(v)alho?

    O jornalismo ‘bonzinho’ não precisa de ser rigoroso, Car(v)alho?


    Ainda serei acusado de usurpar funções, como recentemente sucedeu à Maria João Avillez, mas confesso que decidi fazer uma entrevista. Talvez devesse fazer uma entrevista ao Manuel Carvalho, distinto ex-director do jornal Público, e actual redactor e opinador, que hoje decidiu perorar uma esdrúxila tese: o jornalismo pode criar um viés se tiver como função “denunciar e combater Trump por tudo o que propõe em matéria de ameaças à democracia”, porque isso “é um legítimo esforço em defesa das liberdades”. Até porque, segundo o dito, o Carvalho, “numa disputa entre democracia e obscurantismo, o jornalismo livre não tem outras escolhas senão a da democracia”, sendo que não sei quem tem o estatuto para definir o que é democracia ou obscurantismo, para que “o bem” prevaleça e elimine, claro, o obscurantismo. Será o Carvalho? Será o Trump? Espero que nenhum dos dois.

    Aliás, o dito, o Carvalho, defende que os leitores esperam que o jornalismo “não poder ser neutro” – como, por exemplo, um folheto paroquial –, e assim mesmo “ficou provado com o cancelamento de mais de 200 mil assinaturas do The Washington Post quando [os leitores] souberam que o jornal não tomaria posição sobre as eleições à revelia dos seus editores”, e que, com isso, “decapitou os seus valores e diluiu-se na indiferença cúmplice”. Passando por cima da parte de um jornal decapitar os seus valores ao decidir não fazer dos seus leitores uns burrinhos, indicando-lhe expressamente em quem votar, fiquei particulamente interessado em confirmar a veracidade das tais 200 mil subcrições que tinham ido ao ar no Washington Post.

    Ora, como provavelmente Carvalho, o Manel, não entenderia as minhas perguntas, nem o seu alcance, até por já ter perdido a noção de rigor, e que um “bom” fim não deve usar “maus princípios”, ainda mais no jornalismo, que vive da credibilidade, fui diligentemente tirar ‘nabos da púcara’ ao ChatGPT, fazendo-lhe esta ‘entrevista’, que acabou por ser muito didáctica.

    Serafim: Confirma-se oficialmente que houve 200 mil cancelamentos de subscrições do Washington
    Post por causa do seu posicionamento nas eleições norte-americanas?

    ChatGPT: Sim, foi amplamente noticiado que o jornal norte-americano The Washington Post
    perdeu mais de 200 mil assinantes digitais após anunciar que não apoiaria nenhum candidato nas
    eleições presidenciais de 2024. Esta decisão, tomada pelo proprietário Jeff Bezos, gerou uma onda
    de cancelamentos de assinaturas e críticas por parte de leitores e funcionários do jornal.
    A perda de assinantes representa cerca de 8% da base total de assinantes do jornal, que contava
    com aproximadamente 2,5 milhões de leitores, incluindo assinantes impressos.
    Além disso, a decisão de não endossar nenhum candidato levou à demissão de alguns membros
    do conselho editorial e colunistas, que expressaram descontentamento com a postura adotada pelo
    jornal.
    Portanto, confirma-se que houve uma perda significativa de assinantes do The Washington Post
    devido ao seu posicionamento nas eleições norte-americanas de 2024.

    Serafim: Mas a administração do jornal confirmou? Há provas factuais?

    ChatGPT: Sim, a administração do The Washington Post confirmou oficialmente que houve mais
    de 200 mil cancelamentos de assinaturas após a decisão de não apoiar nenhum candidato nas
    eleições presidenciais de 2024. Esta informação foi divulgada por fontes internas do jornal e
    reportada por diversos meios de comunicação. Além disso, o próprio jornal reconheceu
    publicamente a perda significativa de assinantes, indicando que a decisão editorial teve um impacto
    direto na sua base de leitores. Portanto, existem provas factuais e confirmações oficiais sobre os
    cancelamentos de assinaturas decorrentes do posicionamento do jornal nas eleições
    norte-americanas de 2024.

    Serafim: Mas foi mesmo a administração que assumiu os números ou são fontes anónimas
    internas?

    ChatGPT: A informação sobre os 200 mil cancelamentos de assinaturas do The Washington Post tem sido principalmente atribuída a fontes anónimas internas e reportada por vários meios de
    comunicação. Até o momento, a administração do jornal não emitiu uma confirmação oficial e
    pública sobre esses números específicos de cancelamentos. Assim, os dados sobre o impacto das
    decisões editoriais nas assinaturas permanecem não confirmados oficialmente pela administração
    do The Washington Post, dependendo ainda de fontes internas não identificadas.

    Serafim a entrevistar o ChatGPT, que ‘tirou’ a fotografia.

    Serafim: Portanto, fontes anónimas constituem uma confirmação? Se eu, que sou jornalista,
    escrever que fontes anónimas internas do Washington Post me disseram que afinal houve um
    aumento de 30% nas subscrições depois da vitória do Trump é lícito eu escrever uma notícia sobre
    isso?

    ChatGPT: Do ponto de vista ético e jornalístico, basear uma notícia apenas em fontes anónimas
    apresenta riscos, especialmente quando a informação não pode ser corroborada por fontes oficiais
    ou por dados concretos. Embora fontes anónimas possam ser válidas em certas circunstâncias ?
    especialmente em casos onde há razões legítimas para o anonimato e o jornalista confia na
    credibilidade dessas fontes ?, a utilização exclusiva desse tipo de fonte para afirmar algo tão
    específico quanto um número de assinantes pode comprometer a solidez da reportagem.
    No exemplo que dás, escrever sobre um aumento de 30% nas subscrições baseado apenas em
    fontes anónimas, sem qualquer confirmação oficial ou dados concretos, poderia ser considerado
    especulativo. A prática jornalística ideal seria buscar confirmação com a administração do jornal ou
    com uma declaração pública que possa validar a informação. Em casos de grande impacto, muitos
    órgãos de comunicação mencionam que a informação é baseada em fontes anónimas e explicitam
    que tentaram, sem sucesso, obter uma resposta oficial.
    Portanto, enquanto é possível escrever a notícia com a devida contextualização (especificando a
    natureza da fonte e a tentativa de confirmação), o rigor ético exige que o jornalista forneça ao leitor
    uma visão completa, incluindo as limitações da informação. Em última análise, depender
    exclusivamente de fontes anónimas para dados quantitativos pode ser uma prática frágil, que abre
    margem para questionamentos sobre a integridade e a exatidão da reportagem.

    Serafim: E a outra notícia da redução de 20% já não é especulativa? E já pode ser vista como uma
    confirmação da veracidade do impacte negativo do não endossamento do Washington Post?

    ChatGPT:: Sim, a notícia da redução de 20% nas subscrições devido ao não endossamento de um
    candidato por parte do Washington Post também pode ser vista como especulativa se se baseia
    exclusivamente em fontes anónimas internas, sem confirmação oficial por parte da administração
    do jornal. Embora fontes internas possam ter credibilidade, especialmente quando relacionadas ao
    próprio funcionamento de uma instituição, isso não equivale a uma confirmação oficial e, portanto,
    não pode ser considerado prova conclusiva da veracidade do impacto negativo.
    Para uma confirmação sólida do impacto, seria ideal que o Washington Post divulgasse
    oficialmente esses números ou que fontes independentes de confiança (como relatórios financeiros
    auditados ou declarações oficiais da empresa) corroborassem os dados. O papel do jornalista,
    neste caso, seria tratar tais informações com prudência, deixando claro ao leitor que, embora
    relatado por fontes internas, a informação ainda carece de confirmação oficial.
    No jornalismo, é fundamental distinguir entre “relatado por fontes internas” e “confirmado
    oficialmente” para que os leitores entendam a natureza provisória de certas informações. A notícia
    sobre a perda de assinantes pode ser informativa, mas deve ser apresentada com transparência
    quanto às suas limitações, evitando-se uma leitura que trate essa informação como definitiva.

    Serafim: Então, queres reformular a resposta à pergunta: “Confirma-se oficialmente que houve 200
    mil cancelamentos de subscrições do Washington Post por causa do seu posicionamento nas
    eleições norte-americanas”?

    ChatGPT: Não, não se confirma oficialmente que houve 200 mil cancelamentos de subscrições do
    Washington Post devido ao seu posicionamento nas eleições norte-americanas. Esta informação
    foi amplamente reportada com base em fontes anónimas internas, mas não foi confirmada
    publicamente pela administração do jornal. Assim, até que haja uma declaração oficial ou dados
    concretos da própria administração, os números sobre os cancelamentos devem ser considerados
    especulativos.

    Conclusão: o jornalismo ‘bonzinho’ do Manuel Carvalho não precisa de ser rigoroso. Viva o jornalismo das fontes anónimas que, depois de saírem e se consolidarem, se transformam em verdades insofismáveis e garantia de comportantos, nunca torpes, porque são bem intencionados, claro.


    Serafim é o Mascot do PÁGINA UM, conveniente e legalmente identificado na Ficha Técnica e na parte da Direcção Editorial, possível pela douta interpretação da Entidade Reguladora para a Comunicação Social. Qualquer semelhança entre os assuntos relatados e a realidade é pura factualidade.


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  • O ‘dia da vergonha’ para a imprensa

    O ‘dia da vergonha’ para a imprensa


    Os norte-americanos deram um murro na mesa e elegeram Donald Trump para a Casa Branca. Será o 47º Presidente dos Estados Unidos. Mas a vitória de Trump não representa apenas a derrota de Kamala Harris, a candidata do Partido Democrata. Representa também a derrota da imprensa tradicional que, mais uma vez, nestas eleições, decidiu meter a ética jornalística debaixo do tapete. Na cobertura que fez da campanha de Trump nestas eleições, a generalidade da imprensa mainstream, incluindo a portuguesa, destilou ódio e desinformação em vez de fornecer ao público factos e rigor jornalístico.

    Essa cobertura enviesada criou uma opinião pública mal informada e com o ‘cérebro lavado’ de imagens de um Trump ‘fascista’ contra uma Harris ‘heroína’.

    Durante a campanha para a Casa Branca, a maioria dos jornalistas de grandes órgãos de comunicação social endeusou Harris, escolhendo as melhores fotografias, as poses mais favoráveis, as frases que ficavam mais ‘no ouvido’. E enterrou o passado de Harris, as frases comprometedoras, as gaffes, as gigantescas falhas.

    graffiti, trump, melbourne

    Em geral, os media, enterraram todos os ‘defeitos de Harris e exacerbaram os de Trump. Fingiram que Harris não tem sido número dois na administração Biden, sendo cúmplice das suas políticas, nomeadamente o envolvimento e apoio do país a conflitos armados e guerras. Fingiram que Harris não era a pró-censura e contra a liberdade de imprensa e de expressão. Fingiram que Harris era a democrata, a ‘boa’, e pintaram Trump como o ‘fascista’, o ‘mau’. E falharam. A imprensa escolheu um lado, violando o Jornalismo. E perdeu. Massivamente.

    O dia de hoje não foi apenas de vitória para Trump e para os republicanos. Foi um dia de despertar para muitos na imprensa, nomeadamente em Portugal. Falharam nas previsões. Falharam nas expectativas. Falharam, sobretudo, com o Jornalismo e com o público, os leitores, ouvintes e telespectadores. Mas ganharam no ódio, que é visível em algumas reacções ao resultado eleitoral na Internet.

    Ao mar de jornalistas e comentadores a destilar ódio e mentiras nos media, juntaram-se jornalistas e comentadores influencers a espumar raiva nas redes sociais. Dois exemplos, em Portugal, são casos como o de Mafalda Anjos e de Luís Ribeiro. A primeira foi directora da Visão até ao final do ano passado e actualmente é comentadora da CNN; o segundo continua a ser jornalista desta revista da Trust in News, desde 1999, e ainda comenta na SIC. Ambos lançam insultos recorrentes em publicações na rede X e alimentam assim uma rede de seguidores e ‘haters’ que sustentam a sua base de audiência e de ‘engagement’ naquela rede social (e isso pode trazer receita). Promovem o discurso de ódio constantemente e alimentam-se disso. São os vampiros desta era digital em que as redes sociais se tornaram um espelho do pior que pode haver nos seres humanos.

    Curiosamente, Mafalda e Luís são dois nomes associados a um grupo de media à beira da insolvência, a Trust in News. Não será coincidência. Ambos reflectem o pior que pode haver em ‘jornalistas’: proferem discurso de ódio contra os seus ‘alvos’; promovem uma cultura de polarização. Usam a sua posição como jornalistas e a sua carteira profissional para levar a cabo campanhas de raiva aproveitando para ganhar audiência com a polarização de seguidores e ‘haters‘.

    Estes dois influencers/jornalistas são exemplos do tipo de individualidades que vampirizam o ecossistema digital e que se alimentam do ódio e de um público polarizado, em parte, devido à actuação da imprensa  tradicional, que ao invés de informar, muitas vezes aposta na propaganda e na polarização.

    Estes influencers do ódio vivem das emoções das massas, manipulando-as; usam e abusam das mais básicas técnicas de bullying e assédio contra os seus ‘alvos’.  Muitas vezes, lendo algumas publicações, parecem ter sido escritas por adolescentes inseguros, com borbulhas e muito ódio aos pais, procurando desesperadamente a validação dos seus pares para se sentirem integrados e aceites num qualquer grupo.

    man in black suit jacket

    Curiosamente, a faixa etária que mais votou em Trump foi a dos adultos já mesmo adultos – entre os 45 e os 64 anos. E Trump conquistou também o voto popular. Na realidade, é o tipo de malta que não tem pachorra para tretas e merdas nem paciência para influencers digitais inseguros a espumar raiva e a debitar insultos.  

    Quando há adultos ‘na sala’, a opinião destes influencers/jornalistas vale menos que zero. Isto é válido para Portugal, com exemplos como o destes influencers/jornalistas, como nos Estados Unidos . E, na verdade, as notícias enviesadas e com discurso de ódio contra Trump até ajudaram à derrota de Harris.

    Com estas eleições, surge a visão de um mundo ocidental em que o Jornalismo se liberta desta imprensa tóxica que tem asfixiado o público e a verdade. Não admira que Jeff Bezos, dono da Amazon e do Washington Post, tenha apoiado a decisão do seu jornal de não recomendar o voto em nenhum dos candidatos à Casa Branca. O magnata assumiu, ele próprio, o declínio da credibilidade da imprensa mainstream. De resto, a perda de credibilidade tem crescido em paralelo com as campanhas de desinformação a que todos assistimos nos media, em temas como a pandemia, Ucrânia, inflação, Gaza, etc, etc..

    Estas eleições são um sinal de que a era destes vampiros/influencers do ódio tem os seus dias contados e que a sua popularidade está agora restrita a um nicho ‘dark’ e depressivo do ecossistema digital que vive da raiva e dos insultos. Uma minoria raivosa a espumar e a atirar pedras entre si.  

    Com estas eleições, pelo menos nos Estados Unidos, floresce a visão de uma Internet em que há liberdade de imprensa e de expressão, em que é aceite diversidade de opiniões. Enquanto isso, no resto do mundo ocidental paira a nuvem da censura e do fim da liberdade de imprensa e de expressão, designadamente na Europa e em países como o Brasil.

    Não duvido que estas eleições norte-americanas são também a pedra que marca agora a sepultura onde jaz a credibilidade da imprensa tradicional.

    Trump tem muitos defeitos. Bezos também. Mas ambos sabem quando um ‘produto’ está morto. E o motor da imprensa é a sua credibilidade. Sem ela, não há ‘produto’. A morte em definitivo do motor, da credibilidade da imprensa mainstream, dá esperança de que haja um futuro para o Jornalismo. Um futuro em que uma nova imprensa, com um novo motor, com credibilidade, se apresenta ao público para cumprir a sua missão de informar com rigor e seriedade. Porque esta imprensa tóxica, que tem alimentado mentiras e a polarização, defendido a censura digital e apoiado a indústria de guerra, se morrer, traz outra esperança: a de que há um futuro para a Democracia no mundo ocidental. E para a Paz.


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  • A vitória de Trump e a derrota dos órgãos de propaganda

    A vitória de Trump e a derrota dos órgãos de propaganda


    Esta madrugada, para espanto dos órgãos de propaganda – que, claro, apostaram todas as fichas no contrário –, Donald Trump não apenas venceu as eleições, mas fê-lo de forma contundente. Conquistou os 270 votos necessários no Colégio Eleitoral e, como se não bastasse, ainda venceu o voto popular, um feito que nenhum republicano alcançava desde 2004, com George W. Bush.

    Como se fosse pouco, os republicanos saíram triunfantes também nas disputas pela Câmara dos Representantes e pelo Senado, garantindo o controlo do poder executivo e legislativo. Uma vitória retumbante, para desespero de muitos.

    Como é de praxe em qualquer democracia moderna, a campanha foi um espectáculo de distracções: o acessório em primeiro plano, o essencial cuidadosamente guardado na sombra, para delírio dos órgãos de propaganda e dos seus inenarráveis comentadores de serviço.

    Quais distracções mereceram a sua atenção? Trump reencarnando Hitler, nada menos! Tudo porque o seu ex-chefe de gabinete, John Kelly, teve o infortúnio de soltar a pérola de que o líder nazi “fez algumas coisas boas”. A reacção? Instantânea: Trump foi prontamente elevado a fascista, tirano de primeira linha, sedento pelo poder absoluto.

    Tivemos também a curiosa acusação de senilidade, com Kamala Harris a informar-nos, num tom de genuína preocupação, que Trump estaria cada vez mais instável, um verdadeiro desequilibrado, inapto para cumprir um mandato sequer. Um diagnóstico curioso, especialmente vindo de quem, durante quatro anos, não demonstrou a mínima capacidade para perceber que o presidente Biden há muito estava xexé – ao ponto de ser quase impensável apresentá-lo às eleições, tamanha a debilidade evidenciada num debate com Trump.

    Não poderia faltar a ameaça à democracia, acusação perene de que Trump orquestrou o ataque ao Capitólio. Curioso, no entanto, que a única vítima mortal de um disparo naquele dia tenha sido Ashli Babbitt, apoiante de Trump, alvejada não por desordeiros ou manifestantes, mas pela própria polícia; tudo isto num país onde há mais armas que habitantes. Incitação à violência? Até hoje ninguém conseguiu encontrar a frase exacta em que Trump teria convocado o caos, na verdade, apenas realizou um apelo à manifestação, um direito que não parece tão absoluto quando o manifestante em questão não agrada aos guardiões da virtude.

    Como não poderia deixar de ser, assistimos às eternas acusações de racismo e misoginia, acompanhadas do ataque aos “direitos reprodutivos” – um eufemismo para descrever o acto de assassinar uma vida humana em gestação. O cenário, segundo os arautos do apocalipse, seria catastrófico: um país onde o aborto poderia ser restringido! Um golpe impensável contra a cultura de morte, agora tão apreciada pelo Ocidente em decadência.

    Não só Trump esteve na mira, os seus apoiantes também. Durante uma videoconferência com o grupo Voto Latino, Biden fez uma declaração que gerou polémica. Em resposta a uma piada racista, em que um comediante num comício de Trump chamou Porto Rico de “ilha flutuante de lixo”, Biden não titubeou: “O único lixo que vejo a circular por aí são os apoiantes de Trump.” Com o seu gosto característico pelo espectáculo, Trump aproveitou logo a deixa: apareceu no topo de um camião de recolha de lixo e realizou um comício devidamente vestido, reencarnando o “homem do lixo”. Enfim, uma lixeira absoluta e obviamente nauseabunda. 

    A cereja no topo veio da pena de Paulo Baldaia, uma figura que há décadas desfila por vários órgãos de propaganda, uns falidos, outros a caminho de o ser, e que nos brindou com esta obra-prima: “Se é dono de um Tesla ou tem conta no X pode estar a ajudar Trump a ser eleito.” Pois é, a ameaça, pasme-se, esconde-se agora atrás do volante de um carro eléctrico ou, ainda pior, no simples acto de possuir uma conta no X (outrora Twitter, para os menos informados). A conspiração é tão intricada que carregar a bateria do carro ou publicar uma fotografia numa rede social parece agora o princípio do apocalipse. Quem diria que o fim da democracia chegaria com um like e com uma bateria de um carro eléctrico a carregar!?

    Os putativos jornalistas da nossa praça – na realidade meros activistas políticos – fariam melhor em concentrarem-se em factos e notícias, em vez de praticarem propaganda descarada a favor de um candidato. Afinal, lembremo-nos que nenhum português vota nas eleições norte-americanas. Podiam, no mínimo, ter-nos alertado para um pequeno detalhe: nenhum dos candidatos ousou sequer mencionar o Banco Central norte-americano, a venerável Reserva Federal. Quando uma figura ou instituição se torna imune à crítica, é fácil entender quem realmente manda.

    Foi o Banco Central quem emitiu o dinheiro que inundou os lares norte-americanos com cheques durante a pandemia inventada, gerando a explosiva subida de preços que agora diz combater! Foi o Banco Central com as suas taxas de juros a 0% que confiscou as poupanças dos cidadãos comuns para beneficiar especuladores e classes ricas, detentoras de activos reais – acções, criptomoedas e imóveis. Foi o Banco Central que criou dinheiro do nada para enviar “ajudas” à Ucrânia, pondo o povo a pagar guerras sem fim através do chamado imposto silencioso: a inflação. Ao que parece, criticar tal poder é tabu – mas eis a verdadeira mão invisível que poucos ousam mencionar.

    Pois, além de não nos terem alertado para esse detalhe essencial, os cronistas deveriam também ter mencionado a subida galopante da dívida pública norte-americana em nada menos que 40%, saltando de 20 para quase 28 biliões de dólares (sim, com doze zeros), tudo durante o mandato de Donald Trump e sob o beneplácito da impressora mágica da Reserva Federal. Foi também na sua presidência que se inauguraram as famosas “guerras comerciais”, impondo taxas sobre importações – um tributo disfarçado que recai directamente sobre o consumidor norte-americano, servindo apenas para o empobrecer com um toque patriótico.

    E não nos esqueçamos do confinamento pioneiro na luta contra o vírus invisível – uma manobra que nem os mais talentosos escritores distópicos poderiam ter antecipado. Por fim, no final do mesmo mandato, surgiu a audaciosa Operation Warp Speed, uma iniciativa lançada em Maio de 2020 com o propósito declarado de acelerar as vacinas para a Covid-19. Ou melhor, para lançar substâncias experimentais de forma indiscriminada sobre a população.

    No caso de Kamala Harris, em vez de nos venderem a ideia de que assistíamos ao retorno de Cristo à Terra, poderiam, talvez, ter-nos alertado para o seu silêncio quanto às aventuras bélicas de Joe Biden ou para sua conivência tácita enquanto vice de Barack Obama – aquele mesmo que, após o Nobel da Paz de 2009, decidiu bombardear ou lançar guerras nos mais variados destinos: Afeganistão, Paquistão, Iémen, Líbia, Síria e Somália. Um currículo notável, sem dúvida.

    Não nos esqueçamos, claro, do golpe de Estado na Ucrânia em 2014, patrocinado pela dupla Obama-Biden, que conseguiu instalar um regime simpático a ideais nazis, e que, com entusiasmo, se dedicou a bombardear e massacrar milhares de civis no Donbas. O regime fantoche na Ucrânia, por sua vez, prontamente desrespeitou os acordos de Minsk, enquanto se armava até aos dentes para participar, com toda a solenidade, numa guerra orquestrada pelos EUA, com o objectivo final de enfraquecer a Rússia e preservar a hegemonia do Dólar norte-americano.

    E quanto à população ucraniana? Bem, essa pouco importou – afinal, submetida a dois exércitos de bandidos, serviu apenas como carne para canhão nesta grandiosa guerra de interesses globais. Tudo Kamala Harris ignorou, inclusive o genocídio perpetrado pelo regime psicopata de Israel. Tal como Trump, também fez explodir a dívida pública para pagar estas aventuras, generosamente oferecida pela impressora de notas do Banco Central. Dívida pública, défices e impressão de dinheiro sem fim, a mesma receita de Trump.  

    Mas também se esqueceram dos infames mandatos de vacinas sob a administração Biden-Harris? Uns tempos de “plena liberdade”, em que os cidadãos eram cordialmente convidados a vacinarem-se com uma substância experimental – caso contrário, um “até logo” ao emprego! Um verdadeiro acto de fascismo na sua forma mais pura.

    Por cá, também fomos presenteados com uma boa dose de terrorismo de Estado durante a pandemia inventada. Era ver esses putativos jornalistas a pavoneavam as suas virtudes confortavelmente atrás de um computador, enquanto o povo era submetido a experiências em massa e via a sua vida e negócios serem destruídos.

    A reacção à vitória de Trump por parte desta gente ainda nos deixou mais perplexos, mas foi hilariante. Desde atestados de burrice ao povo norte-americano – esquecem-se que pertencem a um povo que há poucos anos ainda tinha 5% de analfabetos e elegeu em tempos o Eng. Sócrates –, à derrota da democracia – quando o povo não vota como eles gostam! –, ao aparecimento de uma tríade de chalupas – a mesma que em tempos perguntava, num claro discurso de ódio: E agora, o que fazer com os chalupas? –, aos abalos no estado de saúde, tudo foi possível nas cabeças desta gente. Há algo que ainda não se deram conta: ninguém lhes liga! Tivemos, assim, a vitória de Trump e a derrota destes imprestáveis.

    Luís Gomes é empresário


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.


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  • Rangel, esse ‘bipedum nequissimus’

    Rangel, esse ‘bipedum nequissimus’

    Correio Mercantil foi um periódico brasileiro do século XIX (1848-1868), onde o grande Machado de Assis deu os seus primeiros passos. o PÁGINA UM solicitou o registo da marca para Portugal ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), cujo longo processo foi já concluído. No contexto da actual mercantilização da imprensa portuguesa, ‘contratar’ o protagonista do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas para umas epístolas quinzenais pareceu-nos não somente conveniente como necessário. Para comemorar a aprovação do registo, o piparote de Brás Cubas, nesta já décima edição, vai para Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros, e a sua triste figura no aeródromo de Figo Maduro, com a ‘bênção’ de Cícero e Erasmo.


    Ah, meu caro leitor, a grandeza dos homens não se revela somente em batalhas épicas, sob os trovões da guerra ou por cima dos temporais sacudindo impérios. Não! A verdadeira magnificência da intrepidez e da sublimidade na alma humana, além do assombro do seu valor, brilham, ademais das vezes, nos momentos mais prosaicos, em horas de calmaria, no aconchego de um rooftop, quando o sol se põe, em preguiça, no horizonte, e o vento sopra em suave brisa, como quem sussurra à Terra que o dia já se foi, pelo lusco-fusco, mas que há-de vir igual pela aurora sem precisar de toque de alvorada.

    Imaginai, por exemplo, um grande estadista, daqueles que surgem esculpidos em enciclopédias ou moldados em estátuas de calcário, mesmo se, depois, pichadas de grafitos e corroídas pela caca de pombo. Nem sempre vereis relatos, necessariamente, deles a brandir uma espada à Alexandre [o Grande, não o Évora], nem a bradar com a voz de trovão de um Napoleão à beira do campo de batalha. Não, donzelas e cavalheiros, a grandeza de muitos grandes homens, ou mulheres, ou dos géneros que agora dizem existir com letras do alfabeto, pode manifestar-se numa aveludada palavra, por um olhar ponderado, através de um aperto de mão no momento certo. Sem ser na fúria dos eventos, mas sim no silêncio de ponderadas escolhas. Na verdade, quase sempre – ó, paradoxos da vida! –, é no gesto mais simples, no acto mais banal, que se revela a estatura daqueles que se elevam, e levam, para a eternidade.

    Paulo Rangel

    Pensai comigo: é fácil, e até trivial, brilhar quando o mundo exige o clamor dos heróis. Qualquer medíocre, na sorte de uma desventura, se inflado pela urgência do momento, se faz notar no caos. Mas o que dizer daquele que, num dia qualquer, num clima morno e sossegado, diante de uma situação de nada, manifesta uma sabedoria que escapa aos olhos menos atentos? É aqui, senhores, que a verdadeira grandeza se destaca. Não no fragor da tormenta, mas na paciência da brisa; não no ecoar dos canhões, mas no suspiro sereno da paz.

    Mas se assim é, também poderá suceder que seja no presumível bucólico goûter, no previsível fleumático afternoon tea, na esperada serenidade do Kaffeestunde ou na expectável plácida recepção de repatriados no aeródromo de Figo Maduro que se alce um daqueles desprezíveis homúnculos sem qualidades, desprovido de méritos, mas carregado de pretensões.

    Ah, Lisboa, e foi numa dessas tardes, em pleno Outono do ano da graça de dois mil e vinte e quatro depois do Cristo Redentor, que se viu o plenipotenciário Paulo Rangel, vestido e investido de ministro dos Negócios Estrangeiros da República Portuguesa, exibindo-se não como o gigante, que julga ser, apesar da estatura, mas como figura menor que a História tratará de lembrar não pelos feitos mas pelos defeitos.

    Dizia Cícero, que Erasmo fez questão de perpetuar: nem todos os bípedes se revelam dignos, e há homens que, ao ascenderem, se mostram tão mesquinhos que até os quadrúpedes lhes podem ser superiores. O nosso Rangel, meus caros, encaixa-se perfeitamente nessa descrição.

    Afinal, como bem sabemos, nem todos os ministros válidos têm valor, e o nosso Paulo, ajudante do primeiro-ministro não pelo mérito, mas por ser valido, mesmo se deslavado, acabou por confundir a elevação do cargo com o ser grandioso. E assim, como Icarus que ousou aproximar-se do Sol e se saiu mal, também Rangel, em pleno voo de galanterias e ofensas, derreteu as suas frágeis asas de cera no confronto com a púrpura incandescente da sua narcísica altivez, e assim o vi se despenhar, desalado, no chão da insignificância, de onde jamais deveria ter tentado sair.

    Aeródromo de Figo Maduro

    Vejam só, aterrou ele no aeródromo de Figo Maduro, vindo em voo raso do Palácio das Necessidades, como quem se prepara para uma parada triunfal, e algo não lhe caiu no goto. Indignou-se, o bípede, urrando contra uns supostos quadrúpedes, burros e camelos, que o impediram de se pavonear pelo asfalto. E como Xerxes, o grande imperador persa que, numa explosão de vaidade, ordenou que o mar fosse açoitado por afundar a sua ponte, Rangel julgou estarem aquelas alimárias a cometer afronta digna de punição por crime de lesa-majestade. E assim, ofendido no seu pundonor, por meras formalidades protocolares, desatou a gritar ao chefe do Estado-Maior da Força Aérea, o general Cartaxo Alves, como se este fosse um simplório centurião defronte de um César de toga erguida. Ah, a vaidade dos pequenos homens do século XXI.

    Dizem as crónicas que o general manteve a calma dos estóicos, daqueles que já viram o suficiente para saberem que há inimigos muito mais perigosos do que um ministro com ímpetos e altura de Napoleão. Consta que, com a sobriedade que só a experiência concede, limitou-se a observar o espectáculo com aquele olhar de quem compreende a situação melhor do que o próprio protagonista.

    Eis aqui a tragédia do vosso Paulo de Portus Cale: tão ávido em se mostrar gigante, revelou-se mais pequeno do que os seus cinco pés e duas polegadas de altura. Como tantos que se julgam superiores aos demais, ele não perceberá jamais que o poder não reside nos gritos, mas na capacidade de manter a dignidade, mesmo até nas mais corriqueiras situações. Cartaxo Alves, tal como o mar açoitado por Xerxes, não se moveu um milímetro diante das ofensas, porque sabia que quem ofende sem razão já perdeu a batalha.

    Mas a estória, meus amigos, não termina aqui. Não se contentando com uma única cena ridícula, ele precisou de mais. E assim, ao lhe ser apresentada a mão cordial do coronel Abel Oliveira, comandante do aeródromo, resolveu Paulo ‘Calígula’ Rangel, ranger dentes, e em gesto de suprema arrogância, virar-lhe as costas. Não havia ali um inimigo ou uma ameaça, apenas um gesto de cortesia, como tantos outros que sucedem em ocasiões de formalidade, mas o altivo pequeno plenipotenciário assim castigou os afrontosos.

    Tal como Cícero execrou Públio Clódio Pulcro, deveríamos nós proscrever Paulo Rangel chamando-lhe, apropriadamente, bipedum nequissimus, porque se um ministro de Estado chama camelos e burros a militares, mostra não perceber não ser a posição que faz o homem, mas o homem a conferir valor à posição. Por isso, ladeando-te desse ministro, te aviso Luís Montenegro, parafraseando o falecido Marco, não o Paulo, mas o Túlio: “Tu, com este proscrito, com este conselheiro, com este serviçal, que é o pior, não só entre todos os bípedes, mas também entre os quadrúpedes, arruinarás o Estado!”

    Sem este bipedum nequissimus, vaticino, Luís, que também em ruínas deixarás o poleiro; mas poderás, entretanto, escolher se os escombros do teu Governo serão como Roma, ainda glorificada, ou antes como Palmira, absolutamente devastada.

    Até breve, e um piparote.

    Brás Cubas


    N.D. O título Correio Mercantil é uma marca nacional do PÁGINA UM registado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial. O autor desta crónica, Brás Cubas, é obviamente um pseudónimo usado em exclusivo por Pedro Almeida Vieira, constituindo não uma homenagem ao fidalgo e explorador portuense do século XVI, que fundou a vila brasileira de Santos, mas sim a Machado de Assis e ao personagem de um dos seus mais famosos romances. Tal não deve ser interpretado como sinal de menor rigor na análise crítica que aqui se apresenta, independentemente do carácter jocoso, irónico ou, claro, sarcástico.


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  • Equidistância eleitoral, esse crime do jornalismo

    Equidistância eleitoral, esse crime do jornalismo


    Equidistância eleitoral, esse crime do jornalismo

    Anda por aí um frenesi por causa do cancelamento de subscrições do Washington Post após a administração do jornal norte-americano depois de o seu novo proprietário Jeff Bezos, também ‘dono’ da Amazon ter decidido não dar o apoio a Kamala Harris nem a Donald Trum – e, já agora, aos outros candidatos nunca mencionados, onde se incluem um libertário e uma socialista. O Público levantou as mãos ao Céu porque, enfim, o jornal norte-americano Washington Post optou, pela primeira vez em 36 anos, por uma postura de neutralidade editorial face às eleições presidenciais do próximo dia 5 de Novembro, abstendo-se de apoiar um candidato específico.

    Compreende-se o cinfrim nos States. Em matéria de imprensa, onde tudo lá se bipolariza, mas ao ler o artigo do jornalista do Público, António Saraiva Lima, sobre este assunto – dando um enfoque exclusivo às críticas negativas da decisão da administração do Washington Post –, quase se poderia imaginar que a prática do jornalismo imparcial, em que as opiniões editoriais se mantêm à margem das preferências políticas, seja, afinal, algo de revolucionário, escandaloso ou criminoso.

    white and brown concrete building

    O Público, de tanto escrever sobre as eleições norte-americanas nos últimos meses, já deve pensar ser a edição em língua portuguesa de um jornal norte-americano com o habitual e explícito viés ideológico, para um lado ou para o outro. Não pode haver meio termo.

    Era o que faltava, não é, Lima?, querer-se equidistância.

    Era o que faltava, não é, Lima?, querer-se equilibrar visões e factos, dando ao leitor o poder de formar as suas próprias opiniões.

    Era o que faltava, não é, Lima?, confiar na capacidade dos leitores de um jornal para analisarem criticamente a informação e tirarem as suas conclusões.

    Era o que faltava, não é, Lima?, a imprensa ficar impedida de se imiscuir, como actor activos, em eleições democráticas sob o pretexto de bom samaritano.

    Era o que faltava, não é, Lima?, um regresso aos valores clássicos do jornalismo.

    Há quem acredite que a missão de um jornalismo livre implica uma certa dose de paternalismo, de guiar os leitores e quase lhes dizer como pensar – e, presumo, que o Público queira agora transferir essa idiossincrasia norte-americana.

    Mas se calhar, numa sociedade que valoriza a informação e a liberdade de escolha, confiar no discernimento dos leitores para formar a sua própria opinião é o maior voto de confiança que um jornal pode fazer. Se calhar, em Portugal, andam muitos a quererem esquecer-se disso.


    RTP, a ‘pobre’ empresa pública que dá lucro porque recebe 190 milhões de euros dos contribuintes

    Não deixa de ser maravilhoso onde, grassando a iliteracia financeira, basta alguém ter olho, mesmo que visgarolho, para se ser rei. Isto a pretexto de Nicolau Santos, presidente do Conselho de Administração da RTP, antigo jornalista especialista em assuntos económicos e formado nas cadeiras do Instituto Superior de Economia e Gestão, ter avisado os deputados de que as contas da empresa pública podem deixar de dar lucro, passando para o vermelho (prejuízos), se lhe tirarem a publicidade e os contribuintes não derem mais esmola.

    É, no mínimo, extraordinário que o presidente de uma empresa pública que tem como melhor cliente pagante os contribuintes – que vendo ou não vendo a RTP lhe entregaram no ano passado 190 milhões de euros – estar receoso de poder dar prejuízo se lhe cortarem 23 milhões de euros de publicidade. É, no mínimo, uma falácia dizer que a RTP lucrou 2,5 milhões de euros, quando isso se deve ao desvio da contribuição audiovisual, que não é mais do que um subsídio à exploração para não haver ‘buracos’ colossais a serem tapados posteriormente pelo accionista Estado através de impostos dos contribuintes. Na verdade, a RTP é uma empresa tão economicamente sustentável como um adolescente a quem os pais dão uma mesada.

    Audição do Conselho de Administração da RTP na Assembleia da Republica sobre o Plano de Acção para a Comunicação Social.

    Mas Nicolau Santos, mais do que desejar ser gestor, quer ser um verdadeiro pintor de quadros financeiros. Numa jogada magistral na Assembleia da República, transformou a RTP numa espécie de “mártir” do serviço público de televisão, a quem até podem tirar tudo, mesmo a publicidade, mas com um se: “se, como a RTVE [Espanha], tivermos 1.100 milhões de euros de apoios públicos”.

    Nicolau fez o que muitos génios das finanças fazem: aproveita-se da iliteracia financeira do público e da falta de paciência para detalhes. Afinal, quem tem tempo para fazer contas?

    Primeiro, Nicolau esquece de mencionar um detalhe crucial: a RTVE, que recebe os tais 1.100 milhões de euros do Estado espanhol – ou seja, quase seis vezes mais do que a RTP em termos absolutos –, já não tem publicidade nenhuma. Zero. Nada. Já a RTP, além do apoio estatal, conta ainda os tais 23 milhões de euros provenientes dos anunciantes. Portanto, somemos isto (e há outros ‘pós’), e as receitas por via do Estado e anunciantes valeram no ano passado cerca de 113 milhões de euros.

    Pegando no PIB de Portugal, que foi no ano passado de 267,4 mil milhões de euros, e no PIB de Espanha, que foi de 1.498,3 mil milhões, podemos fazer uma comparação proporcional. A RTVE recebe 1.100 milhões de euros, o que corresponde a 0,073% do PIB espanhol. Já a nossa RTP, com os 213 milhões (apoio estatal mais publicidade), recebeu 0,080% do PIB português. Sim, leu bem: em termos relativos, a RTP já recebe bem mais do que a RTVE – e apresenta-nos ainda o Preço Certo e oferece-nos o piscar de olho do José Rodrigues dos Santos. Isto não encaixa bem na narrativa da vítima, pois não?

    Assim, se tivermos a audácia de converter a realidade portuguesa para o contexto espanhol, vemos que se a RTVE recebesse 0,080% do PIB de Espanha por não ter publicidade, então deveria encaixar 1.200 milhões de euros, e não ‘apenas’ 1.100 milhões. Mas, o que são 100 milhões?

    Nicolau Santos, presidente do Conselho de Administração da RTP

    Por outro lado, se retirarmos toda a publicidade à RTP, a contribuição audiovisual representa 0,071% do PIB português, pelo que, contas feitas, bastaria um reforço de cerca de 5 milhões de euros à empresa pública para compensar a perda de 23 milhões de euros de publicidade, de modo a ficar equivalente ao modelo espanhol.

    Enfim, mas aquilo que importa é fazer parecer que a RTP está ao abandono, desamparada num oceano de desigualdade face aos seus pares europeus, quase a desfalecer. Na verdade, o que muitos não querem é que o fim da publicidade mexa nos beneficiários dos subcontratos (58,7 milhões de euros em 2023), nos cachets e avenças (mais 7,5 milhões de euros em 2023), nas rendas e alugueres (11,5 milhões de euros em 2023), nos trabalhos especializados (5,6 milhões de euros em 2023) e de muitas outras coisas necessárias à boa gestão de uma empresa que tem de pagar ainda, claro, os salários dos 1809 funcionários que encaixam um salário líquido médio de 2.900 euros em 14 ‘tranches’ por ano.  

    Isso, sim, são coisas importantes a serem preservadas…


    A inflação, essa minudência para o tudólogo Daniel Oliveira

    Integrante da selecta casta mediática dos tudólogos, Daniel Oliveira tem uma particularidade: vive sob a esfera do Grupo Impresa, desmultiplicando-se em aparições e mais aparições, em diversos formatos e subformatos, ora como cronista, ora como anfitrião de podcasts, ora como analista a solo e em dueto, ora como membro de um programa semanal de comentário político.

    E foi exactamente neste último formato, o Eixo do Mal – em que se perpetua e, envelhecendo, se mostra cada vez mais parecido com Herberto Helder, mas sem similar artéria poética – que Daniel Oliveira confirma o calcanhar de Aquiles dos tudólogos: de tanto falarem, pouco tempo têm para aprender. E assim sendo, amiúde, saem disparates.

    Perfil do X de Daniel Oliveira, onde surge um cão que pode ser bem capaz de comer gatos…

    Foi o que aconteceu no mais recente programa Eixo do Mal, onde se ficou a saber que Daniel Oliveira, um ex-comunista e ex-bloquista, mas sempre um homem de esquerda, não só ganha mais do que 2.000 euros mensais desde que abandonou as funções de assessor de imprensa do Bloco de Esquerda, no início do século, como também não saberá o que é inflação. “Eu até aos 35 anos nunca ganhei 2.000 euros”, clamou Daniel Oliveira, enquanto a sua colega Clara Ferreira Alves se insurgia contra os baixos salários dos jovens.

    Confesso que não aprecio a figura de Daniel Oliveira, sobretudo porque, embora tenha recentemente apelado para que não se comam nem gatos nem cães, eu sei que ele tem um cão, e nada me garante que o seu cão não come gatos. Porém, independentemente disso, chamou-me a atenção ele considerar que um jovem de hoje é abastado se ganhar 2.000 euros, até porque, segundo ele, só começou a ganhar isso a partir dos 35 anos.

    Vejo que existem duas hipóteses, nenhuma lhe sendo favorável à imagem, para esta boutade de Daniel Oliveira: ou ele, homem de esquerda, ganha tão bem como um capitalista imune à subida de preços, ou então nunca sequer percebeu como  a inflação (ainda mais nos últimos anos) ‘come’ os salários reais, sobretudo por causa da ‘impressora’ do Banco Central Europeu andar a financiar as dívidas públicas e os desmandos da União Europeia.

    [Já agora, diz-me o meu dono que os políticos descobriram que mais vale fazer ‘nascer do céu’ dinheiro, causando inflação, do que aplicar mais impostos. Com impostos ou com inflação, o resultado é o mesmo – salários reais valem menos –, mas na inflação pode culpar-se a Rússia, e num aumento de impostos não.]

    Enfim, estou tentado a optar pela segunda opção, ou seja, Daniel Oliveira não sabe o que é inflação, e como esse ‘pormenor’ esquecido torna ridícula aquela sua frase.

    Daniel Oliveira, dixit.

    De facto, tendo nascido em Julho de 1969, quando Daniel Oliveira fez 35 anos, estávamos em 2004. Há 20 anos, portanto. E assim, portanto, um salário de 2.000 euros em Julho de 2004 equivaleria, contas feita com os dados do INE com o índice de preços ao consumidor (IPC), a um salário de 1.402 euros em Agosto de 2024. Ou seja, apenas com a inflação, os 2.000 euros perderam cerca de 30% do seu valor em 20 anos, pelo que se mostra ridícula a comparação. Na verdade, para ter o mesmo poder de compra de um jovem de 2004 que ganhasse 2.000 euros, o jovem de 2024 teria de ganhar um pouco mais de 2.860 euros.

    Mas exigir que o Daniel Oliveira entenda as ‘minudências’ da inflação – ele, um tudólogo com o 12º ano de escolaridade como formação académica, e sem tempo para desperdiçar em ser auto-didacta sobre assuntos económicos, que já lhe basta ter de passear o cão –, talvez seja demasiado. Afinal, que seria do Mundo se ele, em vez de comentar todos os dias, andasse a estudar os assuntos de que fala com tanta sapiência? [sapiência é sinónimo de burrice, não é?]


    A revolução copernicana do Polígrafo: uma partilha basta para ser ‘bastante partilhado’

    Quantidade! Há sempre um mistério e uma nobreza nessa entidade que guia desde os primórdios da civilização – dizem-me. Desde os tempos do grego Pitágoras, o da hipotenusa, que disse que “tudo é número” – o que, em franqueza e sem fraqueza, deve ter sido uma conversa monótona para quem preferisse falar de amor ou de um bom prato de ração Royal Canin Urinary S/O –, até aos dias hodiernos, se anda em busca do verdadeiro significado de “quantidade”.

    Para vós, meros humanos mortais, quantidades como “um” sempre parecerão, assim, singelas, unidimensionais, irrelevantes. Como a vossa vida, única – ao contrário da dos gatos, que usufruem, como se sabe, de sete. Mas não, isso não se aplica na cosmologia do Polígrafo, onde a transcendência filosófica do conceito de quantidade e de partilha arrasta-nos para debates necessariamente mais profundos. Será o “um”, o elemento único, uma expressão metafísica do “bastante”?

    Vejamos. Platão, no seu mundo das ideias, provavelmente teria reservado um trono especial para este número absoluto. A Alegoria da Caverna nunca fez tanto sentido. O “um” partilhado é a projeção da Verdade Última, e nós, os infelizes espectadores, ficamos confinados às sombras do plural – pelo menos quando lemos, e ‘verificamos’, as análises do Polígrafo.

    E quanto à Teologia? Sabe-se, dizem, que Deus é Um, e isso é bastante para bastantes. Quem ousa questionar tal aritmética celestial? “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome…”, assim rezam as Escrituras. Mas, no Polígrafo, a fé moderna parece ser ainda mais minimalista: onde um estiver reunido nas redes sociais, aí estará o glorioso termo “bastante”. Milagres digitais, diria um novo evangelista brasileiro, provavelmente com acesso ao X através de VPN.

    Por esse motivo, o lusitano Polígrafo estará sempre correcto quando, por exemplo e por motivos que N’Gunu Tiny lá saberá, se debruça sobre uma questiúncula do Partido Humanista de Angola para nos afiançar que um despacho foi “bastante partilhado nas redes sociais”, embora o “bastante” tenha sido somente a pessoa do senhor Osvaldo Humberto, um suposto (e discreto) funcionário da empresa National Oilwell Varco, e amigo, entre outros, da Mariazinha Monteiro, do Smith Adebayo Chicoty, do Nadilson Paim e do João Qui Pa Dias, apesar de não se confirmar se estes, ou outros, sequer viram a tal singular partilha, que não vingou por ter tido um ‘epidemiológico’ número de reprodução, o famoso R0, igual a zero.

    O post ‘acusado’ pelo Polígrafo de ter sido “bastante partilhado”. Mais de um mês depois, tem uma partilha.

    O Polígrafo, esse bastião do rigor, teve, enfim, uma epifania matemática que constitui mesmo, arrisco, uma revolução copernicana: o centro do universo da partilha passou a ser um único ponto, um ponto de vista solitário – quiçá, daqui a nada, o do próprio autor que assim se expõe ao Universo num singelo acto de altruísmo ou ainda por um isolado desespero digital.


    Marques, o tudólogo conveniente

    O ‘tudólogo’ é uma figura curiosa do discurso moderno, caracterizado por sua “superciliosa empáfia” – expressão já com direitos reservados – e um ímpeto irresistível de expor as suas vastas (ainda que sempre superficiais) erudições em qualquer tema que venha à tona ou que seja pescada em águas profundas.

    Para um tudólogo não há campo do saber que escape à sua verborragia iluminada, versando com similar desenvoltura sobre astrofísica e filosofia antiga, discorrendo com aparente autoridade sobre as subtilezas da metafísica e dos segredos da alta gastronomia – e quem diz gastronomia, diz intrincados dilemas da política global.

     Para o tudólogo, cada conversa é uma oportunidade de exibir a sua suposta omnisciência, até porque, quanto à omnipresença, a todos já está patente, porque está em todo o lado a falar sobre tudo. Na verdade, um tudólogo é um bitudólogo.

    Pedro Marques, um tudólogo em todo o lado.

    Um bitudólogo é, na essência, um guardião das verdades inabaláveis, mesmo ou sobretudo daquela que ele mesmo inventou.

    Um dos expoentes do tudologismo é Pedro Lopes Marques que, para se armar aos cucos, se apresenta com um currículo extenso e variado, incluindo funções tão díspares como cauteleiro e consultor, além de licenciado em Direito, embora desconfie que tenha sido por linhas tortas que chegou a opinador de tudo o que é imprensa escrita, radiofónica e televisiva.

    Na semana passada, descobri que Marques defende a censura estatal como um meio legítimo de proteger a sociedade, enquanto escreve para uma revista que, curiosamente, passa pelos pingos da chuva, apesar de dever milhões ao Estado. É aqui que o véu da hipocrisia começa a rasgar. O bitudólogo Marques, que com tanta veemência discorre sobre a necessidade de regulação e controlo por parte do Estado para evitar abusos no discurso público, faz tudo isso debaixo do tecto de uma publicação que, por si só, é um monumento à falta de regulação da comunicação social e da fiscalidade – e daí à falta de impunidade.

    A revista Visão, um dos inúmeros ‘locais’ onde Marques publica as suas ‘tudiotices’, deve cerca de 15 milhões de euros ao Estado e acumula dívidas que totalizam 30 milhões de euros, mas o bitudólogo acha que, por exemplo, o Elon Musk deve ser culpado por aquilo que alguns escrevem na sua rede social. Nessa linha, também poderemos ficar descansados: se o Luís Delgado, dono da falida Trust in News e da revista Visão, não pagar as dívidas, Pedro Lopes Marques avança com o seu guito.

    O facto de Marques fechar os olhos a esta contradição é revelador da sua (in)coerência: pregar sobre a necessidade de censura e controlo quando se está num púlpito seguro, especialmente quando esse púlpito é mantido por uma entidade que parece gozar de uma imunidade surpreendente face às suas obrigações fiscais e judiciais. Seria de esperar que alguém tão zeloso na defesa da “verdade” e da “civilidade” também fosse igualmente rigoroso em exigir que o seu próprio veículo de comunicação fosse um exemplo de ética e cumprimento das suas responsabilidades.

    Um Estado é perfeito para censurar ‘inimigos’, mas também bom para permitir calotes aos ‘amigos’…

    Nanja. Para Marques Lopes, a censura é necessária e legítima – desde que, aparentemente, não interfira com as dívidas do seu empregador. O tudólogo Marques é daquele jaez de que se fazem os tudólogos: passaria a defender Musk se Musk comprasse a Trust in News. Mas como a única salvação da Trust in News é o Estado, do Estado só coisas boas… por agora.

    No seu mais recente artigo na Visão, Marques quer que o Estado seja um “paizinho”, que vigie e regule o que todos dizem nas redes sociais, mas parece perfeitamente confortável a trabalhar para uma revista que deve milhões ao mesmo Estado. Fala de responsabilidade e da importância de um Estado forte para controlar os excessos das grandes empresas tecnológicas, enquanto colabora com uma publicação que está atolada em problemas financeiros e que, paradoxalmente, não enfrenta o mesmo rigor que ele deseja para os outros.

    Pedro Marques Lopes coloca-se como um defensor da moralidade pública, mas está ligado a uma instituição que se esquiva das suas obrigações para com o próprio Estado, que ele quer ver fortalecido. É uma hipocrisia tão densa que até os algoritmos de que ele desconfia teriam dificuldade em processá-la. Ele denuncia os perigos da concentração de poder nas mãos de poucos homens, referindo-se a figuras como Elon Musk e Mark Zuckerberg, mas não parece ter problemas em que a Visão continue a funcionar como se estivesse acima da lei.

    No fundo, aquilo que Pedro Marques Lopes parece defender não é a democracia, mas um sistema onde as regras se aplicam selectivamente. Ele quer um Estado forte, mas apenas quando isso serve aos seus próprios interesses e aos interesses daqueles que lhe dão voz. Esta dissonância cognitiva é desconcertante: o tudólogo Marques ergue a bandeira da censura como uma ferramenta de justiça, mas fecha os olhos às injustiças que se desenrolam debaixo do seu próprio nariz. Afinal, talvez o seu conceito de censura seja apenas mais uma arma selectiva, usada para abater os adversários – denominada ‘extrema-direita’, uma espécie de albergue espanhol onde tudo cabe –, enquanto protege os seus aliados. Por agora, porque amanhã pode ser outro dia.


    Obama & ‘Monedas’, ou o provincianismo pacóvio

    Barack Obama, apesar do seu estatuto de reformado, é homem ocupado, como todos saberão. Apesar de as horas de um dia lhe passarem como aos demais, os seus minutos são escassos: daí que ouvir Carminho a despachar o fado ‘O Quarto’ em 1 minuto e 16 segundos no filme ‘Pobres criaturas’ lhe pareceu bastante para a integrar na sua playlist estival no Spotify, em vez de sugerir a versão integral de 3 minutos e 20 segundos.

    Pormenores. Afinal, um ex-presidente dos Estados Unidos, democrata como convém nos tempos de hoje, ir ao cinema e ficar deliciado com uma voz exótica que lhe deve soar vagamente ao espanhol de Porto Rico, é mais do que motivo para o Expresso ir a correr ‘gritar hossanas nas alturas’, que Deus seja glorificado para todo o sempre. Ou melhor, que Carminho seja glorificada nas páginas do semanário de Balsemão na secção “Altos”, e por bênção de Barack Hussein Obama II, e só por isso – e nem sequer por ter editado o álbum onde se insere aquela canção já no longínquo Março de 2023 em Portugal e em Novembro seguinte nos Estados Unidos.

    Portanto, esclarecidos fiquemos sobre o conceito de validação cultural: Barack Obama e a sua playlist de Verão ‘sacada’ de uma sala de cinema.

    Talvez exagere. Os portugueses sempre apreciaram que, do estrangeiro, gostem deles. E, portanto, se nos próximos tempos, a distinta fadista cair nas graças de Trump lá teremos mais um altar erguido em honra de Carminho nas páginas do Expresso, certo? E se for Bolsonaro? Ou Lula? Ou se for Putin? Ou se for Zelensky? Ou Kim Jong-un, que em jovem até teve passaporte brasileiro? Infindáveis possibilidades que auguram uma secção própria, e adequada, para solenizar os encómios estrangeiros à nossa cultura.

    Mas o desmesurado orgulho ao que vem do estrangeiro – que quase se confunde com provincianismo pacóvio – atingiu o zénite no passado sábado com o alcaide de Lisboa Carlos Monedas.

    Perdão, falo de Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, que pensava eu ser capital da República Portuguesa, mas que, pelo entusiasmo com ele esteve a promover a etapa inicial da Vuelta a España, mais me pareceu que recuáramos ao Verão de 1640, aos tempos de Miguel de Vasconcelos.

    De Gira em punho – e teve muita sorte de estar a funcionar –, lá vimos ‘Monedas’ glorificar a La Vuelta, orgulhoso por se iniciar na ‘província’ mais oeste de Madrid. E isto quando não me recordo de o ter visto na chamada Volta a Portugal, que somente passou fugaz e discretamente por Lisboa, em 26 de Julho, porque o presidente de uma junta, a de Marvila, achou por bem ‘despachar’ 90 mil euros para a organização da triste prova lusitana meter Lisboa no mapa, em vez de os direccionar em desnecessárias melhorias dos seus fregueses.

    Foi ver onde parou Moedas nesse dia, em que não teve tempo para dar um saltinha à chegada da Vuelta a Portugal no município que preside. Tarefa fácil, porque a agenda do nosso alcaide está agora sempre bem patente e presente no X: esteve a ‘inaugurar’ o plantio de 20o árvores em Sete Rios, na Praça Marechal Humberto Delgado, assassinado pela PIDE em Espanha. Olé!


    Carta de amor de Valentina ao Valentão

    Nem ao leitor mais desatento terá passada desapercebida uma certa dedicada e carinhosa prosa, que o tempo e a História tratará de fazer ombrear com as missivas de Mariana Alcoforado ao militar francês Noël Bouton, Marquês de Chamilly. Não foi em formato de carta secreta, é certo, embora a condição de ‘notícia’ num jornal que vende mil exemplares a coloque num grau de sigilo quase similar, além de em nada retirar o merecido e enternecedor mérito à paixão.

    Publicada no dia 20 de Julho no Diário de Notícias, não tivemos aqui uma pena de uma freira do Convento da Nossa Senhora da Conceição, na alentejana cidade de Beja, mas sim o teclado de uma jornalista de não menor fervor e afeição pelo seu amado: Valentina Marcelino, uma jornalista já considerada a maior especialista mundial em ‘Gouveia e Melo’, conseguiu transformar um simples relato sobre a alocução de um militar a convivas de uma jantarada de oníricos elogios em visceral fogo que incandesce a alma e sublima o espírito temperado com essências vibrantes que transcendem a mera existência. A bem-dizer, escreveu ela uma carta de amor.

    silhouette of person's hands forming heart

    Valentina mal escondeu, na sua notícia, os suspiros e os tremores que, por certo, espraiou no Clube Militar Naval ao ver o seu ‘Chamilly’ sem farda, mas podemos imaginá-los pela prosa enlevada e fascinada perante aquele militar de branca e rala barba, que me lembra sempre um senhor que promove um conhecido pescado que garante apenas uma espinha em cada 41.000 unidades, o que sempre me parece mais seguro do que as vacinas contra a covid-19.

    Enfim, certo é que na leitura, em menos de sete minutos, o leitor cruza-se com encantatórias palavras, sempre meigas, sempre elogiosas, sentindo-se sempre um aroma a maresia, um sabor a grandeza. No início vai logo à espinha, para logo seguir para o coração: “Descontraído, comunicativo e até com umas tiradas de humor, o almirante Gouveia e Melo escolheu o tema da liderança para falar a uma plateia de auditores de Defesa Nacional, militares e deputados, convidados de um jantar-palestra realizado no Clube Militar Naval, em Lisboa, na última quinta-feira.” Prossegue, e logo citando as palavras, sempre modestas, sempre humildes, de um Grande Líder, que menos do que Grande Almirante não poderia ser: “Um chefe militar tem de ter coragem. Ser honesto com o poder político e, quando necessário, vir a público dar a cara. É isso que faço. Se calhar, os chefes militares eram mais do tipo Português Suave, mas eu sou de um género nada suave”.

    Como não se deslumbrar com alguém que se anuncia como sendo o oposto do Português Suave. Até eu acho que o nosso Almirante está, efectivamente, longe do Português Suave; ele é mais Kentucky, o famoso ‘mata-ratos’… Ou será mata-velhos? Não sei. Acho que isso era mais os quadriciclos

    Não nos desviemos. A prosa flui, a partir daqui, dando eco ao lamento do putativo aspirante a ocupar o lugar de Marcelo, por “a Defesa ter estado praticamente fora dos debates da campanha para as Eleições Europeias, apesar da guerra na Europa com impacto em todos países, incluindo Portugal”. E recorda uma entrevista DN-TSF, onde o almirante “chamou a atenção” para a necessidade de “preparar os jovens” para serem, um dia, carne enviada por políticos para enfrentarem canhões em cenários de guerra (perfeitos para lavar dinheiro).

    No parágrafo seguinte, Valentina já não aguenta: “vestido à civil o Chefe de Estado-Maior da Armada (CEMA) aproveitou a oportunidade para partilhar das dificuldades no recrutamento para a Marinha”.

    E, claro, não podia faltar, no texto de uma amante – no sentido de admiradora, não sejam más-línguas – doces palavras de saudades à pandemia do ‘vai ficar tudo bem’: “A task force da vacinação e a sua estratégia como coordenador, era o foco da sua intervenção, em que frisou que a coragem, ter valores, assumir a responsabilidade e honestidade são algumas das qualidades que, no seu entender, devem fazer parte de um líder”. Tanta modéstia.

    Ficámos a saber, pela querida ‘almirantenete’ que Gouveia e Melo não é de ferro nem de pedra, tem sentimentos, é um homem que teme os desafios que somente os gestores de logística dos frescos do Modelo Continente, e outros perecíveis, enfrentam: “confessou não ter dormido “toda a noite” quando foi convidado para liderar o processo de vacinação”.  E, escreve ainda Valentina, que um dos motivos por que passou a andar sempre de camuflado, não foi para fazer suspirar as ‘almirantenetes, apesar da justificação oficial de ser “a farda partilhada pelos três ramos” que integravam a task force, foi sobretudo para evidenciar a “guerra contra um vírus”. Ah, e era mesmo guerra, porque nisto não havia lugar para pacifistas, medricas, refugiados, deslocados ou desertores. “As pessoas tinham de escolher um lado. Quem estava contra tinha de se vacinar”, disse o nosso Almirante, e assim redigiu a nossa Valentina. Para quê seguir a Ciência quando se pode antes seguir as palavras de um especialista em faróis e submarinos, ainda por cima humilde, modesto, imbuído de bom-senso, como fica patente no mui ‘patenteado’ Gouveia e Melo?

    Assim sendo, não surpreende que todo o restante texto seja escrito, e descreva, sempre envolto em elegância e admiração, para enaltecer as qualidades de alguém destronou, com grande facilidade, um Diogo Cão, um Bartolomeu Dias, um Pedro Álvares Cabral, um Vasco da Gama, um Afonso de Albuquerque, um Fernão de Magalhães… esse não, que se ofereceu a Castela.

    Embevecida, Valentina recorda, aliás, um outro artigo que escreveu sobre o seu ídolo com o singelo e muy imparcial título: “O que vai ficar para a história da liderança de Gouveia e Melo”. Neste artigo, “alguns dos mais importantes especialistas em liderança elogiaram as opções do almirante”, escreveu Valentina. Nem faltou a opinião de um especialista para meter o nosso Almirante na gávea de proa desta navio chamado Portugal, destacando a sua “genuinidade”, que transmitiu “calma, confiança no trabalho da sua equipa”, ou a de outro que lhe viu “visão estratégica clara”. Aos jornais ainda lhes falta meter na tinta música de violino.

    No panegírico de Valentina ao seu Valentão, não faltou menção à “mesa do CEMA” neste jantar “com lotação esgotada”, onde pontificava Miguel Guimarães, deputado do PSD e ex-bastonário da Ordem dos Médicos, envolvido na polémica das ilegalidades cometidas numa campanha de solidariedade financiada quase exclusivamente por grandes farmacêuticas. Curiosamente, nessa mesma campanha de solidariedade foram desviadas vacinas para médicos não-prioritários, mas isso não interessa nada, Provavelmente, Noël Bouton também tinha os seus pecados e pecadilhos, e a sua Mariana Alcoforado também se calou. O amor é sempre lindo, talvez por ser cego.



    SEMANA 30/2024

    Marrar na parede? Não: é mesmo cair no abismo

    O Francisco Balsemão, não o José (pai) nem o Maria (meio-irmão), mas o Pedro, é o CEO da Impresa, outrora grupo de media que trabalhava para o (e tinha foco no) bem dos leitores e telespectadores. Com esse antigo serviço, credível e atraente, vinha o brinde: as empresas punham-se em fila para publicitar nas ‘plataformas’ da Impresa os seus produtos para serem comprados e usufruídos pelos consumidores que eram atraídos pela informação credível e pelos conteúdos comunicacionais de qualidade. E como era filão apetecível, e não havia espaço para todos, pagava-se bem para anunciar. Ganhavam então todos: leitores / telespectadores, os anunciantes e a própria Impresa.

    Mas isso é coisa do passado. Os produtos (notícias e conteúdos comunicacionais) descredibilizaram-se, e já nem se consegue distinguir o jornalismo da promoção e do marketing empresarial – ao ponto de o próprio CEO da Impresa andar a fazer ‘entrevistas’ numa mixórdia de funções – e como as audiências por tudo isto descambaram, abriu-se a possibilidade às maiores promiscuidades numa fuga para a frente, para onde não há sequer uma parede para marrar mas somente um abismo para cair.

    Post no LinkedIn do CEO da Impresa

    Assim sendo, nem sequer deveria surpreender muito que na apresentação de mais um resultados semestrais desastrosos – 4 milhões de euros de prejuízo, sobretudo pelo agravamento do serviço da dívida por via do endividamento completamente absurdo -, o Pedro (para que se consiga distinguir dos outros dois Francisco Balsemão) continue alegremente a dizer que “vamos continuar a trazer mais valor para anunciantes e agências, reforçando a nossa posição enquanto grupo de media português com mais investimento publicitário”.

    Nem uma palavra para os leitores e telespectadores. Nem uma palavra para o jornalismo. Nada. A Impresa hoje só quer dar “mais valor” aos anunciantes, apresentando cada vez menor qualidade nas ‘plataformas’, e às agências (deduzo que também de comunicação), que querem passar comunicação empresarial como se fosse notícias.

    Deve ser giro um CEO de uma empresa fazer um podcast para o jornal como se fosse mesmo um jornalista…

    Presumo que a estratégia para o desastre vai continuar quando o nosso Pedro acrescenta que “adicionalmente, vamos manter a nossa estratégia de expansão digital e diversificação de fontes de receitas, nomeadamente através da concretização de apostas já anunciadas como a realização do Tribeca Festival em Lisboa e a nossa nova parceria na área da bilhética online com a BOL”. Diversificar significa aqui, presumo, arranjar mais umas ideias para fazer de conta que na Impresa ainda se faz jornalismo e comunicação social.



    SEMANA 29/2024

    Paxlovid!, dizem os democratas. Ivermectina!, dizem os republicanos

    Se considerarmos que o primeiro ano de vida de um gato é aproximadamente igual a 15 anos humanos, que o segundo é igual a 9 anos humanos e que cada ano adicional é igual a 4 anos humanos, então o Biden é um ano mais velho do que eu, sabendo-se – e se não souberem, sabem agora – ter eu nascido no dia 13 de Junho de 2008. Estamos ambos idosos, mas ainda me lembro do que sucedeu há dois anos, talvez porque, nessa altura, contava 72 e não 80 anos.

    Posto isto, mesmo sabendo que Joe Biden está mesmo desmemoriado, e já nem saiba o que lhe dão, acho que, a existir uma cabala nos Estados Unidos, esta não é contra o Trump, mas sim contra o actual Presidente. Não é que logo no dia em que ele coloca a hipótese de sair da corrida eleitoral se houvesse decisão médica, surge com um teste positivo à covid-19? E que lhe fazem? Dão-lhe o mesmíssimo medicamento – o Paxlovid, da Pfizer – que ficou conhecido por ser como o Melhoral (não faz bem, nem faz mal) com a agravante de causar recaídas, como lhe sucedeu em 2022. Lembram-se? Ele, se calhar, não.

    Notícia de Julho de 2022: Biden teve uma recaída depois de lhe ser administrado Paxlovid. Dois anos depois, dão-lhe novamente Paxlovid.

    Enfim, já estou a imaginar nos próximos tempos uma titânica luta ideológica, que nada tem a ver com simpatias terapêuticas: os democratas a quererem à força que Biden tome Paxlovid, para ter recaídas até abandonar a candidatura (e se não resultar, às tantas ainda lhe darão lixívia…), enquanto os republicanos a querem se ele recupere rápido, dando-lhe vitamina D e ivermectina, de sorte a ele se manter na corrida a colecionar gaffes até Novembro. Tempos interessantes, sem dúvida.


    SEMANA 28/2024

    Leonor de Todos los Santos de Borbón y Ortiz e o seu súbdito Marcelo

    A sinistra (é canhota) Alteza Real Leonor de Todos los Santos de Borbón y Ortiz, Princesa de Asturias, Princesa de Gerona, Princesa de Viana, Duquesa de Montblanch, Condessa de Cervera e Señora de Balaguer, visitou aos 18 anos um rectângulo na Península Ibérica que, para mal dos pecados do Senhor do Morgado de Fonte Boa (um tal Miguel, de Brito, da parte do pai, e Vasconcelos, da parte da mãe), continua a falar a língua de Camões, e não a língua de Cervantes.

    E muito bem fez a jovem herdeira do trono de Espanha em, pisada esta terra, se pôr a discursar em castelhano na sua visita a Belém, onde muito bem teceu, e se entendeu, uns belíssimos considerandos sobre Portugal, apenas usando, para dar mais ‘salero’, uma palavra na língua de Pessoa – ‘saudade’ – para destacar os nobres sentimentos de seus pais sobre o país vizinho.

    Já Marcelo Rebelo de Sousa – ou será Marcelo Revelo de Sosa? – fez o que um súbdito deve fazer perante a (sua futura) rainha: brindou em castelhano, embora com tão terrível pronúncia que, vos garanto, o Cervantes, lá no sepulcro do Convento de las Trinitarias Descalzas de San Ildefonso, deu ‘erizado’ umas quantas acrobacias, apenas não uns saltos mortais, porque defunto já ele está. Em todo o caso, em resposta ao brinde de Marcelo (ou Marcelo, em castelhano), o Rocinante relinchou ‘iiirrrrí‘ e o Rucio zurrou ‘inhóóó inhóóó‘.


    SEMANA 28/2024

    Salomé e a cabeça da Verdade numa bandeja

    Há agora um novo desporto nos media mainstream: malhar em Lucília Gago e zurzir na Procuradoria-Geral da República, esse malévolo ente que ia dando cabo da vida do nosso querido Costa, o nosso ai Jesus que agora dará mais alegrias ao povo português do que o Ronaldo, já anda a pensar em pousar chuteiras, tornando-se o mais mais inteligente presidente do Conselho Europeu, PNS dixit.

    Ora, na recente entrevista à RTP, Lucília Gago disse que não se sentia responsável pela queda do Governo em Novembro passado, que fora uma decisão pessoal de António Costa, que “poderia continuar a exercer as suas funções” como, exemplificou, aconteceu com Ursula von der Leyen e com Pedro Sánchez. “Não é automático que a instauração de uma investigação tenha como consequência uma demissão”, defendeu.

    Que foi ela dizer, caramba! Caiu logo nas malhas do Polígrafo, o arguto fact-checker com uma impressionante densidade de under-30 na sua redacção, e que agora até já ‘contrata’ under-20, o que, convenhamos, poupa dinheiro em salários, mas mostra-se arriscado porque, geralmente, a memória destas gentes, tal como a idade, é curta.

    Portanto, assentando nisto, lá tivemos o Polígrafo com a jornalista Salomé Leal a pôr a Dona Lucília Gago em ordem, dando-lhe um raspanete, porque, segundo esta veneranda (nada veterana) fact checker, não é comparável a situação de Ursula von der Leyen com a de António Costa, porque, havendo um caso de alegada “interferência em funções públicas, destruição de SMS, corrupção e conflito de interesses” nas negociações de vacinas entre a presidente da Comissão Europeia e o CEO da Pfizer, a senhora alemã “não ponderou em momento algum abandonar o cargo apesar da investigação, mas também não foi, ainda, acusada da prática de qualquer crime”.

    Pintura exposta no Museu Nacional de Arte Antiga da autoria de Lucas Cranach, o Velho.

    Isto é uma chatice quando se anda a fazer fact-checking como se fosse gente grande, e depois, vai-se a ver, e entrou-se no jornalismo em 2020. E, portanto, que interessa a Salomé Leal tudo o que sucedeu antes desse prodigioso ano, incluindo, portanto, as acusações (e investigações) que ainda pendiam sobre von der Leyen em 2019 como ministra alemã da Defesa, quando então foi escolhida para a presidência da Comissão Europeia? E não seriam essas situações passadas sobre as quais Lucília Gago se estaria a referir?

    Nanja! Nada!

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    Para Salomé Leal, só se deve ver, com antolhos, para a frente de 2020. Para Salomé Leal, só há Político a partir de 2020 (e em particular, para apanhar o ‘erro’ de Lucília Gago, através da notícia do Político de 1 de Abril de 2024, que ela refere como ‘prova’); não há Político antes de 2020, nem existência, nem mundo, nem memória, somente o vazio a.S.L. (ante Salomé Leal).

    Dona Lucília Gago, para a próxima se precaveja: não queira, matusamelicamente, confundir as mentes juvenis, invocando o passada da nossa Ursula von de Leyen antes do Pfizergate; não queira relembrar casos, ‘casinhos’ e ‘casões’ que teve como ministra alemã da Defesa entre 2013 e 2019, como, hélas, se pode ver no período pré-histórico do Político (aqui, aqui, aqui e aqui).

    Enfim, a ignorância é muito atrevida, diz-se – mas numa fact checker armada em paladina da verdade, a ignorância torna-se apenas lamentável. A culpa, parece-me, nem é da Salomé, mas certo é que, com estes fact checkings, a Verdade nos surge assim decepada numa bandeja.


    SEMANA 26/2024

    Gouveia e Melo apanha Putin no cimo do ‘caralho’ (calma: é termo náutico)

    Na Teoria do Caos diz-se que pequenas alterações nas condições iniciais de um sistema complexo podem resultar em grandes e imprevisíveis eventos futuros. Conhecido por Efeito Borboleta, este conceito foi popularizado pelo meteorologista Edward Lorenz nos anos 1960, e é frequentemente ilustrada com a metáfora de que o bater de asas de uma borboleta na Amazónia poderia desencadear uma tempestade no Pacífico.

    Em Portugal, desde que o submarinista Gouveia e Melo se meteu na ‘cesta de gávea’ (também conhecida, em tempos antigos, por ‘caralho‘), a mandar postas de pescada como Chefe do Estado-Maior da Armada, sabemos por isso que, quando uma qualquer embarcação da Rússia levanta âncora de um qualquer porto e cruza águas portuguesas, nos arriscamos a ter a III Guerra Mundial. E por isso, temos de combater o ‘Efeito Borboleta’ com o ‘Efeito Gouveia e Melo’.

    Não tenham dúvidas sobre o ‘Efeito Gouveia e Melo’ para a paz mundial. A III Guerra não sucedeu ainda porque, claro, a Marinha Portuguesa ‘almirantada’ pelo mestre-da-logística-vacineira, putativo candidato a Presidente da República, coloca sempre toda a ‘infantaria náutica’, que ainda flutua, a postos para controlar os malvados espiões russo. Apenas por causa de Gouveia e Melo os russos não sabem ainda como podem sair vitoriosos de um conflito global, porque jamais conseguem vasculhar em descanso o fundo do mar português. São corridos.

    Que o Putin deixe de se armar em carapau de corrida, e tire as mãos da sardinha – com Gouveia e Melo não há cá caldeiradas. Que o Putin se entretenha com o esturjão, que se contente com o caviar. Se não se portar bem, às tantas, leva é uma solha do nosso Almirante… ou uns douraditos da Iglo (passe a publicidade).

    Por tudo isto, celebremos Gouveia e Melo. Celebremos a Marinha Portuguesa que bem viu que o ‘General Skobelev’ não era um banal petroleiro russo com destino a Kalinenegrado, nem que o ‘Akademik Ioffe’ não era um corriqueiro navio russo de passageiros com destino à Libéria, nem o ‘Nikolav Chiker’ um singelo quebra-gelo saído do porto de Mariel em Cuba, onde sabemos que nem há neve. Eram sim uns malvados “navios-espiões russos”, como noticia o Correio da Manhã depois de um comunicado do gabinete de imprensa do nosso Almirante, que só não deram início à III Guerra Mundial porque a nossa bendita Marinha cometeu uma heróica “missão de 90 horas”.

    Imagens retiradas hoje do Marine Traffic com a localização de embarcações, bem como a localização actual do Akademik Ioffe que segue para a Libéria. Cada triângulo representa a localização de uma embarcação de grande porte.

    Feito isto – e que grande feito de Gouveia e Melo comparado com os vulgares ‘passeios’ de Diogo Cão, de Bartolomeu Dias, de Vasco da Gama, de Afonso de Albuquerque e do ‘traidor’ Fernão de Magalhães –, somente se me coloca uma dúvida: será que o Putin não deveria mudar de estratégia, e em vez de mandar navios-espiões com bandeira russa, não deveria antes alugar um embarcação de outro qualquer país para espiolharem as nossas águas territoriais ou a nossa Zona Económica e Exclusiva (ZEE)?

    É que assim isto não tem muita piada! São sempre apanhados pelo olho do Gouveia e Melo, que no cima do ‘caralho’ nada deixa escapar. Dá-lhe, camarada Putin, pelo menos algum trabalho, enquanto ele não segue para Belém: há centenas de navios a cruzarem os mares portugueses, como podes ver ali em cima nas imagens retiradas do Marine Traffic. Escolhe um, para que Gouveia e Melo apanhe todos. Se o homem até já venceu um vírus


    SEMANA 25/2024

    Força Aérea: um zero à esquerda a meter dois zeros à direita

    Na aviação, um número conta muito. Por exemplo, em 1989, um voo da Varig, caiu sem combustível na floresta amazónica, só por por causa de o piloto ter inserido a direcção 027 graus, em vez de 270 graus. Um zero mal metido. Mas esse lamentável caso foi na aviação civil; na Força Aérea, como se viu desde pelo menos o Top Gun, não se brinca em serviço. Um número é um número. Rigor absoluto.

    E daí que se começou a salivar aqui no PÁGINA UM, que muito já viu em contratação pública, quando se detectou, no início desta semana, um ajuste directo celebrado há quase dois anos, mas somente agora publicitado no Portal Base, pelo Estado-Maior da Força Aérea para aquisição de apoio de engenharia relativo a um sistema de comunicações. Valor da ‘coisa’: 7.326.000 euros, ou seja, um ajuste directo de mais de 7,3 milhões de euros, montante que, com IVA, ultrapassaria os 9 milhões de euros. Ainda por cima, sem sequer existir contrato escrito, invocando uma norma inadequada para estes casos.

    man driving helicopter

    Já se imaginava as parangonas – mas vieram as relações públicas estragar a ‘cacha’, confessando um erro, corrigido depois do contacto do PÁGINA UM. Afinal, o contabilista da Força Aérea, talvez um zero à esquerda, tinha inserido dois zeros à direita, a mais. Ou seja, onde antes se lia 7.326.000 euros, passou a ler-se 73.260 euros. E lá se foi a ‘cacha’.

    O director do PÁGINA UM ainda anda a matutar se não deveria ter perguntado por comprovativos que demonstrem que nunca erros deste quilate quando se digitam números nas ordens de transferência. Às tantas, ainda se descobria, no contrato de 2021 (que só foi publicitado este ano) para fornecimento de combustíveis, que o Estado-Maior da Força Aérea em vez de ter pagado 57.276.950,99 euros à Petrogal, afinal enviou-lhe, vá lá, apenas 57,27 euros – ou, para arredondar, 57,27 euros. Erros acontecem: quem não…


    SEMANA 24/2024

    Carlos, o Papa Moedas

    Carlos Moedas já nos habituou a falar na primeira pessoa do plural sempre que, em bicos de pés, quer falar da obra que julga ser só sua: “entregámos chaves de casa”; “homenageámos fulano de tal”; “visitámos a estrada da Beira e a beira da estrada”; “distribuímos isto e aquilo”, “condecorámos sicrano e beltrano”, e hoje [sic, neste caso] “Casámos os noivos de Santo António”.

    Mas, calma, não se pense que nesta função casamenteira, o presidente da Câmara de Lisboa tenha exercido o ministério de sacristão ou de diaconato – que ofensa seria! E, para quem é, nunca aceitável seria o múnus do presbiterado, que isto de ser pároco, cónego, vigário-geral ou monsenhor é coisa de pobre. Merecia Carlos Moedas não menos do que a função, ou título, de bispo, de arcebispo, de cardeal ou de patriarca. Mas como isto seria sempre pouco, acho mesmo que este, hélas, nosso edil deveria estar mesmo no topo da hierarquia, até para fazer jus à função que melhor desempenha com o dinheiro dos contribuintes para se promover: Papa – o nosso Papa Moedas.


    SEMANA 22/2024

    Costa, o Ricardo, sem tempo para ler sobre prémio das estantes IKEA

    O jornalista Ricardo Costa tem quatro relevantes pecularidades biográficas: é cumulativamente director de informação da SIC e director-geral de informação do Grupo Impresa (dona do Expresso); é primo em segundo grau de José Alberto Castelo Branco da Silva Vieira; é irmão de António Luís Santos da Costa; e tem raízes orientais, o que, garantidamente, na douta e constitucionalíssima tese do nosso actual Presidente da República, o tornará “lento”. Só a segunda é irrelevante para a minha ‘arranhadela’.

    Sendo “lento”, ‘marceloscamente’ falando, e tendo tão elevadas funções na direcção de tantos órgãos de comunicação social, compreende-se que Ricardo Costa só leia as ‘gordas’ e que os seus olhos não comam mais do que o primeiro ‘linguado‘, porquanto, como sabe, a partir daí tudo é palha para encher chouriços.

    Por esse motivo, compreende-se que Ricardo Costa tenha vindo a correr dar uma alfinetada no Governo Montenegro por ter eliminado um rectângulo verde, um círculo amarelo e um quadrado vermelho como logótipo da Nação, uma vez que a ‘obra’ acabou de ganhar um prémio de design.

    Confirma-se, assim que Costa, o Ricardo, nem sequer leu a curta notícia da SIC, televisão do qual é director de informação, a qual destaca no seu tweet no X, para criticar “as guerras culturais [quando] chegam ao design”. Se assim não fosse, teria visto que o Grande Prémio CCP 2024, e que deveria ter merecido o máximo destaque, foi entregue à não menos famosa publicidade da estante IKEA: “Boa para guardar livros. Ou 75.800€“, alusiva ao dinheiro encontrado no gabinete de Vítor Escária, chefe de gabinete do Costa, o seu António, e que tanto frisson causou às sensibilidades políticas do PS.

    Já agora, bem vistas as coisas, às tantas os 75.800 euros do Escária eram legais: serviriam para pagar ao designer os 74.000 euros do logótipo, e o resto seria para cerveja e tremoços, que para gambas já não daria.


    SEMANA 21/2024

    Mais um frete do Polígrafo; mais um prego no caixão do jornalismo

    A vida anda difícil para todos, e até também para o Polígrafo, apesar dos mais de 400 mil euros por ano que encaixa do Facebook para fazer de cão-de-fila pelas redes sociais. E se quando esteve desempregado, o seu director, Fernando Esteves, fez uma perninha em final de 2018 para sacar quase 20 mil euros num centro hospitalar de Lisboa (sem haver sinal de ter feito ‘coisa’ alguma), mais facilmente pode o Polígrafo fazer fretes – desde que, claro, receba dinheiro. Pregar pregois no caixão do jornalismo, isso é um pormenor…

    Como se sabe, o Polígrafo orgulha-se de ser um órgão de comunicação social exclusivamente de fact-checking, que teve o seu período de ouro na pandemia, com uma função mui útil para consolidar ‘narrativas’, metendo no mesmo saco gente destemperada e racional (desde que ambos os grupos não aceitassem as ‘narrativas’, em versão low cost, porquanto metia estagiários geralmente de Comunicação Social a mandar postas de pescadas sobre complexas questões de Epidemiologia e outras ciências, muitas vezes com especialistas em migrações de sardinhas ou peritos em hidrogeografia que andaram a lançar búzios com modelos matemáticos de vão-de-escada.

    Mas estamos em 2024, e embora haja muita mentira a ser desvendada em campanhas eleitorais, a safra deve andar fraca – e, portanto, o que vier à rede é peixe. E esta semana saiu assim no Polígrafo uma notícia ‘normal’, mas nada habitual num ‘fact checker’, sobre um banal “encontro com jornalistas, esta terça-feira, em Lisboa”, onde Elisa Ferreira, a comissária portuguesa ns Comissão von der Leyen, notou que quando existe “um alargamento da União Europeia há normalmente um impulso brutal da economia” dos países que acabam de aderir ao bloco europeu”. Toda a notícia soa a pé de microfone: a comissária diz, a jornalista anota.

    E, acrescenta ainda a jornalista Ema Gil Pires, com um curioso número de carteira profissional – 7999, que, por ser nova, nem sequer deve saber o que é a cláusula de consciência, que a livra de fazer fretes a mando do ‘patrão’ –, que Elisa Ferreira notou, assim, a “grande oportunidade” que tal seria para o “processo de reconstrução da própria Ucrânia”, numa altura em que se perspectiva “uma eventual inclusão de Kiev no leque de Estados-membros”. E blá blá até ao fim.

    E é bem no fim que se vê o seguinte texto, que deve ser lido ao som de violinos, ou de marcha fúnebre em memória do jornalismo: “Este artigo foi desenvolvido pelo Polígrafo no âmbito do projeto ‘EUROPA’. O projeto foi cofinanciado pela União Europeia no âmbito do programa de subvenções do Parlamento Europeu no domínio da comunicação. O Parlamento Europeu não foi associado à sua preparação e não é de modo algum responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projeto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade dos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, às pessoas entrevistadas, aos editores ou aos difusores do programa. O Parlamento Europeu não pode, além disso, ser considerado responsável pelos prejuízos, diretos ou indiretos, que a realização do projeto possa causar“.


    SEMANA 20/2024

    As reuniões do Grande Líder Moedas

    Carlos Moedas, o Presidente da Câmara de Lisboa – ou, antes disso, como salienta na sua conta do X, é “Mayor of Lisbon” e, além disso, também “Maire de Lisbonne” (e direi eu, de igual modo, que será লিছবন চহৰ পৰিষদৰ সভাপতি, em língua assamesa), é um líder. Perdão: é um Líder. Penitência: um Grande Líder. Misericórdia (não a freguesia onde nasci no longínquo ano de 2008): O GRANDE LÍDER!

    O único! Mas nunca sozinho.

    Moedas surge, feito vedeta, a oferecer casas, a acompanhar obras, a distribuir subsídios, a condecorar o periquito, mas nunca o faz sozinho. Usa sempre o plural: oferecemos, acompanhamos, distribuímos, condecoramos. E nós pagamos.

    São pormenores: afinal, o Grande – metonímia para Grande Líder Moedas – liderará sempre COM as pessoas, como titula a sua ‘magnum opus’, dirão os seus empolgados idólatras. E o Macron, que diz de Moedas o que o Maomé dizia de Meca: que “servirá para encorajar e até formar as próximas gerações de cidadãos que queiram fazer viver os seus ideais”.

    Mas calma. Nem sempre o Grande – o Grande Líder Moedas – lidera com as pessoas. Tem de se ter estatuto para se estar COM o Líder. Até em reuniões que, na verdade, servirão para ele – leia-se, Ele – expor a sua liderança. Por exemplo, Moedas reúne COM o presidente da Câmara Municipal do Porto, mas já reúne OS presidentes das autarquias que integram a Área Metropolitana de Lisboa. Mesmo quando se está na mesma sala do Grande não significa que se esteja ao mesmo nível – que assim conste in saecula saeculorum.


    SEMANA 20/2024

    Das invasões do colonialismo às invasões do doutor Nuno Rebelo de Sousa

    Se os filhos vivos têm de pagar pelas invasões cometidas pelos pais mortos, conforme defende o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, parece-me bastante lógico que os pais vivos possam também pagar por invasões dos filhos vivos. E isso pode ser visto ao nível de uma geração ou de dezenas de gerações.

    Assim, enquanto andarmos então a contabilizar, por invasões desde o século XV pelos nossos antepassados, quanto deveremos pagar ao Brasil, à Angola, a Moçambique e a tantos outros territórios dos quatro cantos do Mundo que os nossos pais (no sentido lato do termo) palmilharam, também não nos devemos esquecer de apurar a quem endereçar as facturas pelas invasões ao nosso território ‘perpetradas’ pelos fenícios, pelos gregos, pelos cartagineses, pelos romanos, pelos visigodos, pelos suevos, pelos mouros, pelos espanhóis (sessenta anos) e até pelos franceses (e até dos ingleses que nos vieram ajudar por causa do Napoleão, e não quiseram ir embora facilmente).

    Já agora, talvez fosse boa ideia incluirmos as invasões das nossas antigas colónias – que tínhamos tomado a outros – pelos espanhóis, pelos ingleses, pelos holandeses, pelos alemães, etc.. Talvez não fosse má ideia pedir-lhes indemnizações agora. Ou, pelo menos, reverter péssimos acordos de paz, como aquele em Haia, no ano de 1661, onde se concordou em compensar com 63 toneladas de ouro a República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos pelas mais-valias por eles criadas no Nordeste brasileiro, apesar de os termos derrotado no campo da batalha. Ainda lhe entregámos o Ceilão (Sri Lanka).

    Bem mais fácil, na verdade, será obrigar os pais a pagarem pelas invasões dos filhos. Por exemplo, o Doutor Nuno, vindo do Brasil, invadiu Portugal, dirigiu-se ao Serviço Nacional de Saúde e, com isto, desapareceram perto de quatro milhões de euros. O Doutor Marcelo Rebelo de Sousa deveria indemnizar o país por isto, não acham?


    SEMANA 14/2024

    (Ainda) Rosália Amorim & outras histórias (com acentos graves)

    Se a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) demorou quase dois meses a retirar a referência da Rosália Amorim na sua base de dados, depois desta ‘sair do armário’ e se assumir como uma marketeer, também eu posso, atendendo à minha felídea idade, preguiçar e nada escrever. E assim por isso, assim ficou o nome da Rosália Amorim, para escarmento, aqui pespegado nesta rubrica por três semanas.

    Enfim, agora vai ficar mais uns dias, porque não achei suficientemente apelativo para justificar um título em destaque a façanha dos ‘jornalistas do oráculo’ da RTP, que titularam, no rescaldo do Sporting-Benfica das meias-finais da Taça de Portugal, sobre os titulares das equipas mas com acento no I; mesmo tendo sido agudo. E nem foi uma vez – que sempre daria para conceder o benefício da dúvida de se tratar de um ‘corvacho’ – mas logo duas, e se calhar até foram três para ser como a conta que Deus fez.

    Enfim, também poderia brincar – não gozar, porque este é um senhor muito distinto e respeitável – com o Professor Jorge Miranda que no Público, à força de querer defender o estapafúrdio Acordo Ortográfico que mete o Pacto de Varsóvia ao nível do Pato à Pequim, acaba a escrever heróico com acento à moda antiga. Mas já nem vale a pena porque o nosso colunista Manuel Monteiro, também ali na concorrência, já lhe disse das muito boas, além de aproveitar para contar deliciosas histórias em redor das palavras como a do menino italiano que ‘inventou’ o petaloso.

    De resto, podia sempre gozar com a Filomena Martins, a meteorojornalista – não é só James Joyce que funde palavras, ó Manel – de serviço do Observador que, desde a minha última arranhadela, já escreveu sobre “chuva de lama“, sobre a depressão Nélson que diz ser “a primeira do rosário de tempestades até à Páscoa” passada, sobre mais poeiras e calor, e sobre a “tempestade Olívia” que vai trazer mais uma “enorme massa de poeira que pode chegar à Suécia“. Ou não. E isto já sem incluir os dois sismos, porque se é para mostrar que o Mundo literalmente está em convulsões, não há melhor mesmo do que a Filomena Martins.


    SEMANA 11/2024

    Rosália Amorim, uma potencial grevista na Ernst & Young?

    Desde que a minha taça com Royal Canin esteja bem apetrechada, sou solidário com todos, incluindo jornalistas em greve, mesmo nos jornais que pensam que uma greve deve servir “para mostrar à sociedade a importância de uma comunicação social livre, actuante e sustentável” (direcção do Público dixit), como se a sociedade não o soubesse, e não para protestar contra a existência de empresários ‘pato bravo’ como aqueles que orquestram despedimentos canalhas, do qual o último exemplo (mas não derradeiro) sucedeu ainda ontem à direcção editorial e a vários jornalistas do DN, mas este episódio lamentável foi já visto, desta vez, com ‘mais classe’ (e sem alarido), porque uma coisa é um despedimento feito pelo ‘chefe do galinheiro’, outra é se a coisa se congemina por um papalvo fundo das Bahamas.

    Mas, verdadeiramente, mais do que saber qual o grau de adesão à greve dos jornalistas ou os efeitos da dita (que vai ser nenhum, excepção ao alívio das consciências, um alívio semelhante a uma mijadela na caixa de areia), a minha felina curiosidade centra-se apenas no comportamento de uma pessoa: será que a actual directora de marketing e marcas da Ernst & Young (EY), Rosália Amorim – que foi orgulhosamente enterrando o DN, quando directora, com as suas parcerias comerciais e fretes que tais -, também vai hoje fazer greve?

    É certo que ela não consta da lista dos ‘238 magníficos jornalistas’ que decidiram mostrar à História, através de uma carta aberta fechada aos outros cinco mil camaradas, que a profissão está ‘sem papel’, mas a nossa magnífica Rosália Amorim mantém incólumes, por falta de vergonha, todos os seus direitos, isto é, a sua bela carteira profissional de jornalista número 1788, porque ainda está activa na CCPJ. Activíssima ainda hoje (pelo menos até às 12h19), 28 esplêndidos dias após ter assumido que anda agora a vender marcas na EY, contratada que foi pela sua excelsa experiência em funções similares no DN e TSF.


    SEMANA 10/2024

    Meteorologia & eu, o gato de Pavlov

    Um felídeo não costuma ser tão estúpido como um canídeo, mas confesso que perante um qualquer anúncio de banal ‘anomalia meteorológica’, que pode ser só sol ou chuva, funciona em mim como a sineta nos cães do russo Ivan Pavlov.

    Quer dizer, não me ponho a salivar, mas vou a correr ao site do Observador, em busca dos textos da Filomena Martins. Nunca falha!

    Por isso, quando hoje li um texto no Público de uns três mil caracteres da Marta Leite Ferreira – que vem da escola do Observador – a anunciar que o “tempo vai piorar nas próximas horas“, vi-me impelido, por forças que jamais controlarei, a ir em busca das previsões da directora-adjunta do Observador. Nunca desilude! Encontrei aquilo que nunca se esconde: nesta segunda-feira houvera escrito meteorológico.

    Êxtase absoluto. Tudo ali é irresistível. Empolgante. Anteontem, Filomena Martins até evocou (ou invocou, já nem sei) tempos e terras de vikings, fazendo-nos, logo no lead, vislumbrar um “bloqueio na Escandinávia [que] abre um corredor para as tempestades chegarem à Península Ibérica”.

    Calma! – ou melhor, não vai haver calma atmosférica alguma. Isto é só a pele. A ‘carnicha’ encontra-se no meio do artigo, aí se revelando que ficará aberto “um enorme e largo corredor para entrarem várias frentes chuvosas e frias pela Península Ibérica adentro: a maior, que se deve transformar numa tempestade de forte impacto, [e que] chega esta quinta, [e] mantém-se sexta, e arrasta mais uma massa de ar polar frio, cujos efeitos se prolongam até ao fim de semana eleitoral”.

    a long boat with two people in it on a lake

    Vai ser uma semana de montanha russa meteorológica. Perdão: repito, para meter aspas, porque a frase anterior é da autoria de Filomena Martins e não quero ser acusado de plágio: “Vai ser uma semana de montanha russa meteorológica.” Até porque parece que o tal corredor vai ficar aberto – “quer na horizontal (para as frentes vindas do lado da Gronelândia, com massas de ar polar), quer até quase na vertical (para as frentes que se formam já junto às ilhas britânicas)” –, assim “permitindo [a negrito no original] comboios de tempestades que entram de forma contínua na Península, umas vezes muito juntas, outras a espaços“.

    Eu acho que isto é mais um carrossel do que uma montanha russa, mas, enfim, deixemos a Filomena Martins meter mais água.


    SEMANA 09/2024

    O farnel dos lagartos deve ter pouco tabaco

    Foi jogo emocionante, o de ontem, no Estádio de Alvalade, onde se defrontou o Sporting e o Benfica, mas mais interessante, por certo, teria sido assistir à cobertura realizada pelos repórteres do jornal Record, que agora têm o Cristiano Ronaldo como o ‘patrão’ principal, com 30% da Medialivre.

    Oficialmente, houve três golos: ao minuto 9 marcou o sportinguista Pedro Gonçalves, depois ao minuto 54 o sportinguista Viktor Gyökeres e, por fim, ao minuto 68 o benfiquista Fredrik Aursnes. De permeio, houve ainda um golo anulado ao benfiquista Di Maria ao minuto 71 (que daria o 2-2) e outro ao sportinguista Nuno Santos ao terceiro minuto de compensação (que daria o 3-1).

    Porém, talvez embalados pelo farnel que, por certo, o Sporting também ofertará aos jornalistas – tal como sucede na Varanda da Luz –, mas com ingredientes especiais, os jornalistas do Record foram ‘relatando’ um ‘desenrolar do marcador’ muito peculiar.

    Ao minuto 55, estava afinal 4-0 para o Sporting.

    Ao minuto 68, o Record fez com que o o golo do Aursnes valesse por dois, colocando um empate na ‘coisa’, porque, para além do golo do norueguês ter valido por dois, acabou também por ‘sacar’ dois golos aos quatro do Sporting. Portanto, 2-2.

    Mas não satisfeito com um empate, os jornalistas concederam no minuto 74, um terceiro golo ao Benfica, colocando o marcador em 2-3 favorável ao Benfica.

    Pena esta vantagem benfiquista ter sido ‘noite de pouca dura’, porque, ao fim de quatro minutitos, houve alguém, talvez o VAR, que retirou dois golos ao Benfica, estabelecendo o resultado final, coincidente com o real.

    Em todo o caso, atenção: não vai haver, afinal, segundo o Record, é mentira que haja um segundo jogo marcado na Luz no início de Abril. Na verdade, ainda sob a influência do ‘farnel dos lagartos’, os jornalistas do Record indicaram que, depois do 2-1 do Sporting, o resultado agregado (das duas mãos) ficou já estabelecido: 5-0 a favor do Benfica.


    A dorsal anticiclónica do Observador

    Somos, por aqui, adeptos incondicionais da jornalista Filomena Martins que, sendo director-adjunta do Observador, desunha-se em fazer jus ao título: observa meticulosamente o tempo, neste caso não numa perspectiva filosófica, mas somente meteorológica, presenteando-nos sempre um Armagedão à primeira lufada ou ao segundo chovisco.

    Em todo o caso, confessamos a nossa desilusão sobre o texto de hoje em que ela anuncia, para a próxima sexta-feira, a denominada Primavera meteorológica, pois nada nos mostra a jornalista-meteorologista mais famosa do país e os seus terríveis rios atmosféricos, nem as tenebrosas ciclogéneses explosivas nem os temíveis ciclones bomba nem os tétricos comboios de tempestades. Só frio, chuva, três massas de ar polar e uma dorsal anticiclónica. Muito pouco. Assim, nunca mais chega o Fim do Mundo!


    SEMANA 08/2024

    Testículos & pénis

    O Correio da Manhã (CM) perde, com este nosso texto, o monopólio de meter genitálias em títulos, mas não poderíamos perder a oportunidade de felicitar a sorte danada dos editores deste jornal de referência (e o mais lido do país) por o método de coacção de um auxiliar de acção médica do Hospital Garcia de Orta consistir em meter a mão numa componente da genitália masculina da vítima de dimensão mais curta – mais curta no sentido do número de letras.

    De facto, por agora, sabíamos, através do nosso CM, que ataques às genitálias masculinas se faziam, por regra, segurando o saco escrotal e apertando as gónadas. Além da dor, já deu títulos bombásticos em cenários nada agradáveis só de imaginar.

    Por exemplo, em 29 de Junho de 2017, “Morre depois da nora lhe esmagar os testículos com as mãos”.

    Também em 28 de Abril de 2016, “Evita morte ao apertar testículos de agressor”.

    Ou, mais recentemente, em 26 de Abril de 2023, “Mulher arranca testículos de vizinho que atacou filha em Angola

    Na verdade, testículos em títulos é um must, garantia de voyeurismo baboso. Como não ler a notícia “Doente internado no Hospital Amadora-Sintra arranca o próprio testículo”? Ou esta: “Homem atira-se à mulher errada e cortam-lhe os testículos com faca enferrujada”? Ou mais esta ainda: “Arranca testículo do ‘ex’ com os dentes por ter negado sexo a três”?

    Mas não há bela sem senão. Jornalisticamente falando, os testículos têm um problema: são grandes demais, ocupam um grande volume num título. São 10 letrinhas monstruosas, não dá jeito nenhum em determinadas situações.

    Por exemplo, imaginem se o tal auxiliar do Hospital Garcia de Orta tivesse apertado os testículos a um idoso para lhe “sacar o código do cartão multibanco”, e comprar depois “bens de elevado valor, como relógios, TV, perfumes, e outros como azeite”. Não cabia. Por sorte, apertou-lhe o pénis, que tem apenas cinco letrinhas, fica pela metade. Cabe na perfeição no desenho da página. Concluindo, apertar um pénis em vez dos testículos é não apenas menos doloroso como muito mais cómodo para a difícil arte de titular um jornal. É um dois em um.


    Ribeiro de bocas, em enxurrada

    Dia 19 de Fevereiro

    Descobrimos ontem para que serve meter uma dezena de candidatos de pequenos partidos numa ‘linha’ a fazer de conta que a televisão pública é muito democrática e dá voz a todos.

    Aquilo serve para, como nas feiras, se mandar uns tirinhos nos bonecos. Sobretudo se se é jornalista. E sobretudo se se é um jornalista do quilate do Luís Ribeiro, que já foi apontado pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social de ser um ‘jornalista comercial’ por fazer trabalhos de prestação de serviços a empresas externas (parceiros) numa revista (Visão) que integra uma empresa unipessoal de 10 mil euros que tem 10 milhões de euros de dívida ao Estado. Divertiu-se muito ontem, o Ribeiro, em enxurrada de bocas no X. Hoje, divirto-me.


    ‘todOs’ é menor que ‘todEs’

    Afinal, para o jornal Público, o ‘todes’ não é um símbolo de linguagem inclusiva, mas sim um termo para unir, colocando em pé de igualdade, os partidos com representação parlamentar com aqueles que, coitados, ainda não têm (e alguns nunca terão, pelo andar democrático da carruagem) assento parlamentar.

    Assim, está a jornalista Sofia Neves, hoje no Público, a ser rigorosíssima quando nos garante que “todOs os partidos defendem não existir uma só solução para a crise da habitação”, e depois acaba a listar somente as propostas da Aliança Democrática (PSD, CDS e PPM), Bloco de Esquerda, Chega, Iniciativa Liberal, Livre, PAN, Partido Comunista Português (sem PEV, apesar de coligados) e Partido Socialista.

    Já se tivesse escrito que “todEs os partidos defendem não existir uma só solução para a crise da habitação”, então aí teria mais trabalho, porque se fossem mesmo ‘todEs’ (e não apenas ‘todos’) teria ela que listar as propostas não apenas do grupo do ‘todOs’ mas também as propostas do PCTP/MRPP, do Alternativa Democrática Nacional (ADN), do Volt Portugal, do Juntos pelo Povo (JPP), do Partido Ecologista Os Verdes (esquecido na CDU), do Ergue-te, do Nós, Cidadãos, do Reagir Incluir Reciclar (RIR), da Nova Direita, do Alternativa 21 (Partido da Terra e Aliança) e do Partido Trabalhista Português (PTP).

    Donde se conclui que se mostra muito conveniente, a partir de agora, usar o ‘todOs’ mesmo quando não se trata da ‘totalidade’ (e vejam que termina com E) sem se ser acusado de falta de rigor, porque ‘todOs’ é, assim nos mostra o Público, inferior a ‘todES’. Pode sempre dizer-se que há uma discriminação, mas isso, em campanha para eleições democráticas, e quando são os órgãos de comunicação social a fazer, não conta.


    SEMANA 07/2024

    Dia 17 de Fevereiro

    Abrunhosa, o Senhor da Palavra, e o triste fim de um plagiador

    Esqueçam D. Dinis, o Rei Poeta.

    Reneguem Fernão de Oliveira, João de Barros, Pêro Magalhães de Gândavo e Duarte Nunes de Leão, Príncipes da Gramática.

    Olvidem Luís Vaz de Camões, o Vate de ‘Os Lusiédas’ (versão Porto Canal).

    Omitam Rafael Bluteau, na pena, e Padre António Vieira, na oratória, Imperadores da Língua.

    Menoscambem Camilo, Eça, Saramago e toda a catrefa de Escribas da Lusitânia.

    Posterguem Pedro José da Fonseca, Antonio de Moraes e Antonio Houaiss, Imperadores dos nossos dicionários.

    Não! Nanja. Nenhum destes merece o panteão nem sequer sob a forma de cenotáfio. Todas e quaisquer palavras e fonemas a um só Ente as devemos. Por exemplo:

    “Vamos” – foi ele que inventou.

    “Fazer” – também.

    “O” – com e sem som de U, idem.

    “Que” – de igual modo.

    “Ainda” – claro.

    ”Não” – sim, foi ele.

    ”Foi” – obviamente, foi ele.

    ”Feito” – por ele, e com grande precisão.

    Claro está que este Singular Ser só se deu em ajuntar estas palavras (quer dizer, as que coloquei entre aspas), nesta concreta e sábia sequência, no ano da graça de 2010 (que, no futuro, será conhecido, por bula Inter gravíssimas, como 50 Anno Abrunhosi), através da letra de uma música cantada à cana rachada, pelo que faz todo o sentido o Bloco de Esquerda ser agora condenado por blasfémia não apenas por usar algumas (que digo!, todas) mas sobretudo por deturpar as Palavras do Senhor.

    O filósofo e pedagogo brasileiro Paulo Freire atreveu-se a usar em 1982 as palavras do título de uma música de Pedro Abrunhosa de 2010. Sabem o que lhe sucedeu?

    ”Fazer o que nunca foi feito”? Ó Mariana Mortágua! Que foste tu e o teu partido fazer. Atiçaste as Fúrias! Ainda por cima uma blasfémia em que, com a mudança no tempo verbal, especificamente do pretérito perfeito composto do indicativo para o pretérito perfeito simples do indicativo, alteras o foco temporal da frase, indicas que o Senhor (Pedro Abrunhosa) foi impreciso na temporalidade do acto jamais feito.

    Tu já viste no que te meteste? Sabes as consequências?

    Olha, Mariana Mortágua, o filósofo e pedagogo brasileiro Paulo Freire atreveu-se em 1982, num texto sobre política educativa, a usar as exactas palavras que o Pedro Abrunhosa deu ao título da sua música em 2010 (“Fazer o que ainda não foi feito”), e sabes o que lhe aconteceu? Está morto! E desde 1997, uns 13 anos antes da música do Pedro Abrunhosa. Assim, incréus, se alcança o poder do Senhor.

    E consta que outros intentaram, nos anos 80 do século passado, escrever também “fazer o que ainda não foi feito” no número 10 da revista Educação em Debate, sem autorização do Senhor Pedro Abrunhosa, e hoje, 17 de Fevereiro de 2024, se mortos não estão, de muito boa saúde não estarão.


    Dia 13 de Fevereiro de 2024

    Ruir ou não roer, that is the question

    Tem mais de quatro séculos o famoso solilóquio de Hamlet, reflectindo sobre a natureza da existência e os dilemas perante o sofrimento da vida e o seu fim no vazio da morte. “To be, or not to be, that is the question“.

    De facto, os ingleses (ou anglófonos) devem ser mais dados do que nós, latinos, às perplexidades, porquanto nunca sabem bem quando são ou quando estão. Mas não pensem que os portugueses não têm também suas dubiedades, nem que seja no acto da escrita.

    Por exemplo, no Correio da Manhã, ou pelo menos o jornalista Rui Pando Gomes, quando se decidiu escrever sobre a final do Super Bowl, teve um dilema: “ruir, ou não roer, that is the question“. De facto, o que poderia acontecer às unhas da Taylor Swift enquanto via o seu namorado, Travis Kelce, tight end do Kansas City Chiefs, bater os San Francisco 49ers? Serem roídas ou ruírem-se?

    Obviamente, o resultado literal de roer unhas – julgo que tal acto implica necessariamente o uso de dentes, pelo que será redundante acrescentar “com os dentes” – é ficar-se com as “unhas roídas”, mas não menos verdade sucede, por extensão de sentido, que roídas em demasia, as unhas podem ficar em perigo de ruir, o que, com algum esforço e vontade, pode dar origem a “unhas ruídas”.

    Portanto, perante o dilema “unhas ruídas, ou unhas roídas, that’s the question“, o jornalista e os editores do Correio da Manhã acharam por bem decidir a favor das “unhas ruídas”. Opção legítima, claro.


    SEMANA 06/2024

    Dia 10 de Fevereiro de 2024

    Isso não se faz! Então não é que hoje, bem no topo da primeira página, logo abaixo do seu nome, e no lado esquerdo de uma menina de lingerie vermelha, o Correio da Manhã (CM) titula: “Comboio Alfa da CP usado em filme pornográfico“, levando, imagino, uma percentagem superior a 0% dos leitores (reparem no nosso extremo rigor, jamais nos podem chamar de exagerados) a correr à página 29, nem sequer reparando, à primeira vista, que a cabeça do Ricardo Salgado (que dizem não estar já ‘bom’ da cabeça) quase tapa o ‘porn’ do pornográfico.

    E depois, olhem: ‘ejaculação precoce’. Afinal, não foi nada daquilo que, naquelas fracções de segundo pela busca sôfrega da página 29, pensariam as pecaminosas e babosas mentes perversas. Na verdade, aquilo que sucedeu foi que “um filme pornográfico com cerca de uma hora tem partes da sua ação filmada dentro da carruagem de comboios da CP”, mas, desgraça, “as cenas mais ‘hardcore’ não se passam dentro da carruagem”. Só temos “a protagonista da película filmada a percorrer [a] composição de um Alfa Pendular”.

    Ora bolas! Pólvora seca. Nadinha mais! Apenas uma senhora vestida de vermelho a passear-se na carruagem, e ao contrário da outra menina que surge na capa do CM (já agora, é a Lusinha Oliveira) nem sequer mostra qualquer lingerie vermelha. Ou de outra cor. Está sempre completamente vestida.

    Em todo o caso, o autor desta ‘linda peça’ de non sense noticioso, o jornalista Miguel Alexandre Ganhão – editor do CM e membro da Comissão da Carteira Profissional do Jornalista – ainda escreve que “não deixa de ser curioso que a empresa pública apareça associada a este tipo de obra cinematográfica”.

    Aqui, já estamos a imaginar a ilimitada possibilidade de títulos ‘bombásticos’ que este estilo de jornalismo proporciona, se surgirem imagens (não autorizadas, presume-se) de protagonistas de “obra cinematográfica” do estilo hardcore a passearem por locais ou zonas públicas ou privadas antes de, em local mais recatado, mostrarem ‘acção mais concreta’. Eis alguns exemplos:

    Torre Eiffel usada em filme pornográfico

    Mercado da Ribeira usado em filme pornográfico

    Marquês de Pombal usado em filme pornográfico

    Correio da Manhã usado em filme pornográfico

    Bom, se calhar estamos a exagerar. No Correio da Manhã seria impossível. No Correio da Manhã, jamais: é um ‘santificado’ jornal, onde nunca nos passaria pela cabeça associar a ‘badalhoquices’, mesmo se de forma involuntária, não é? Claro que não, caramba! Mesmo que haja por aí imagens que metem classificados com a marca CM, onde surge a divulgar os seus atributos uma “mulata meiga”, uma “bomboca sensual”, uma “loura fogosa” ou uma “gostosa quentinha”. Tudo isto só pode ser uma montagem! E o site no canto superior direito destes classificados (que se calhar o Polígrafo até concluirá ser falso) nem sequer, às tantas, funciona! Tudo fake.


    Dia 6 de Fevereiro de 2024

    Ontem, foi um dia feliz para a imprensa portuguesa com o justo e desejado anúncio da promoção de Rosália Amorim para directora de marketing e comunicação da Ernst & Young (EY), uma consultora que muito trabalhinho tem feito para entidades públicas: contamos no Portal Base 356 contratos de 19,7 milhões de euros.

    Somos apreciadores das qualidades, inatas, de Rosália Amorim na promoção de marcas. Viu-se isso enquanto esteve como directora do Dinheiro Vivo, do Diário de Notícias e na TSF, e também na sua breve passagem na administração da Global Media.

    Na verdade, promover marcas foi o que ela melhor fez nestes cargos de direcção editorial, sobretudo através da sua presença na concretização de parcerias comerciais, mas também na subtileza de algumas notícias ou entrevistas, de tal sorte que nem sempre se conseguia perceber quais eram as que tinham sido pagas ou não. Só não conseguiu promover bem uma marca – ou melhor, conseguiu promovê-la, mas mal: os órgãos de comunicação social da Global Media, e por acrescento o Jornalismo. Aliás, não sou eu, Serafim, que o diz: ainda em Setembro passado, o Conselho de Redacção da TSF se opôs à sua nomeação para a direcção editorial desta rádio, dizendo, preto no branco (como as cores do meu pêlo), que “levanta[va] legítimas dúvidas quanto à sua real capacidade de manutenção de uma política editorial independente”. E ela, mesmo assim, aceitou.

    Por isso, embora haja sempre o ‘risco’ de um qualquer canal televisivo a contratar como ‘comentarista isentíssima’, a sua ida para a EY como directora de marketing e comunicação de uma consultora, além de um justo prémio para uma verdadeira marketeer que vivia no sufoco de ter de parecer jornalista, acaba por ser uma ‘clarificação’ de funções, e sobretudo ‘areja’ o ambiente.

    Ah, e já agora, até para que a notícia do Jornal Económico fique correcta (identifica Rosália Amorim como “ex-jornalista), convém que ela suspenda mesmo a carteira na Comissão da Carteira Profissional de Jornalista: às 16h18 de hoje ainda estava activa. Não se esqueça, que já vai tarde.


    Dia 5 de Fevereiro de 2024

    De repente, todos estão preocupados com o estado da imprensa, sobre a crise da imprensa, os males da imprensa, e mais não sei o quê da imprensa. E assim sendo, por que não haveria o Centro de Arbitragem Administrativa de encaixar numa sua conferência – dedicada à política da Justiça e ao mediatismo dos casos judiciais – um tempinho para contribuir para uma reposta à magna questão: “Para onde vai o jornalismo?

    Ora, poupem o vosso tempo. Não é preciso ir assistir, porque o programa dá já a resposta, quer no formato, quer nos intervenientes: em meia hora, “Para onde vai o jornalismo” é, basicamente, uma entrevista (como é apresentado) feita por André Macedo a Nuno Santos.

    Sucede que André Macedo – que andou a cirandar, não se sabe por que méritos, pelas direcções do Diário de Notícias e da própria RTP, entre outros lugares de topo em redacções – já nem sequer é jornalista, sendo consultor de empresas de comunicação (sobretudo de apetecíveis farmacêuticas que se fartam de fazer parcerias comerciais), apesar de quando em vez surgir a comentar assuntos na imprensa (de certeza absoluta de forma isentíssima). Eis o futuro do jornalismo: alguém que fez pela vida aproveitando-se do jornalismo, acaba numa empresa de consultadoria de imprensa a entrevistar um jornalista, neste caso Nuno Santos, director da CNN Portugal.

    André Macedo, no canto inferior direito de um painel de comentadores da CNN Portugal, onde Nuno Santos é director editorial.

    Quer dizer: Nuno Santos é, na verdade, um jornalista, mas desde 2011 só ‘de vez em quando’. Na última década, tem sido mais executivo e produtor de conteúdos do que propriamente jornalista – e isso também mostra “para onde vai o jornalismo”.

    Esteve na África do Sul entre 2013 e 2016 como director de conteúdos de um conglomerado de media – onde “a sua paixão e os seus conhecimentos sobre o mundo das telenovelas e do futebol” foram muito elogiados –  e depois seguiu para Espanha para fazer as mesmas tarefas por mais uns anos. Está agora, depois de ter ido montar o Canal 11 da Federação Portuguesa de Futebol e de ser director-geral da TVI (um cargo não-jornalístico), como director editorial da CNN Portugal. Tanto é assim que só muito recentemente Nuno Santos recuperou a sua carteira profissional de jornalista, tendo agora uma numeração (7185) próxima dos ex-estagiários.

    Portanto, sem dúvida, muito oportuno e esclarecedor este evento do Centro de Arbitragem Administrativa: André Macedo e Nuno Santos foram bem escolhidos, embora provavelmente fosse mais adequado que a ‘rubrica’ se intitulasse: “Olhem para onde levámos o jornalismo”.


    SEMANA 05/2024

    Dia 3 de Fevereiro de 2024

    Dizem-me que em antanho, quer dizer em tempos passados, havia a chuva, o sol, o Anthímio de Azevedo, as nuvens, mais as altas e baixas pressões, mais o Costa Alves, mais o anticiclone dos Açores, mais as tempestades e furacões, mais o Costa Malheiro, mais os aguaceiros e as geadas, mais a Sofia Cerveira para algegrar as vistas nos anos 90, e antes a Teresa Abrantes, mais ondulações e mar alterado, mais o José Figueiras, e mais relâmpagos e trovoadas, e mais um sem número de simples fenómenos meteorológicos, que, no passado, nos orientavam, com muita probabilidade de erro, sobre se se deveria levar ou não chapéu de chuva, ou mais ou menos agasalho, também consoante os doutos conselhos das mãezinhas.

    Mas agora, que há todos os satélite e computadores, potentíssimos, já não temos apenas chuva ou sol, vento ou acalmia. Agora temos também a Filomena Martins, directora-adjunta do Observador que é, sem dúvida, a grande jornalista especializada em assuntos meteorológicos, na variante “rio atmosférico”.

    silhouette of trees and purple lightning

    De facto, não sei como ainda sobrevivemos a este ‘novi-clima’ com tanto “rio atmosférico” anunciado pela ‘meteojornalista’ Filomena Martins. Ou, na verdade, não sei como sobreviver à própria Filomena Martins.

    No seu currículo noticioso mais recente, encontro seis notícias a titular o famigerado “rio atmosférico”, sempre num estilo mui peculiar: “Portugal vai ser regado por um rio atmosférico. Vem aí muita chuva já esta terça-feira e deve ficar até meio da próxima semana” (17/10/2022); “Oscar: vem aí uma tempestade rara para esta altura do ano. E pode trazer um ‘rio atmosférico’ na quarta-feira” (4/6/2023); “Uma frente Atlântica, duas tempestades e a hipótese de um rio atmosférico. A chuva volta esta sexta-feira, 13” (11/10/2023); “Rio atmosférico atravessa centro do país. Avisos da proteção civil para chuva e vento: sete distritos sob aviso laranja” (25/10/2023); “Quinta-feira chega um rio atmosférico. E a partir de sexta-feira, dezembro entra gelado” (29/10/2023); “Vem aí mais um rio atmosférico esta quinta (há três distritos sob aviso laranja e cinco a amarelo). Mas o frio vai embora” (5/12/2023); “Um rio atmosférico no final da semana. E um Carnaval molhado e já com frio” (2/2/2024).

    E não são apenas os “rios atmosféricos” que a ‘nossa’ Filomena Martins nos concede para nos assustar.Há tudo, menos uns aguaceiros, ou um frio de rachar; já nem temos direito a um calor de ananases, nem tão-pouco a uma saraivada de partir janelas. Nos textos da Filomena Martins, temos sim, além dos rios atmosféricos, as ciclogéneses explosivas, os ciclones bomba e até os comboios de tempestades. Tudo pavoroso. Um Armagedom.

    painting of man walking down a road holding umbrella

    Mudemos, portanto, a protectora do mau tempo, a Santa Bárbara, certamente incapaz de nos precaver contras os malefícios de tamanhas mudanças meteorológicas. Elejamos, em segura alternativa, a Santa Filomena, e oremos a preceito:

    Ó Santa Filomena, que sois mais forte que as torres das fortalezas e a violência dos rios atmosféricos, fazei com que as ciclogéneses explosivas não me atinjam, os ciclones bomba não me assustem e o comboio de tempestades não me abalem a coragem e a bravura“.


    Dia 1 de Fevereiro de 2024

    Os números! Ai os números, esses malvados que interagem com uma coisa chamada Matemática que serve apenas para infernizar a vida de muitos jovens que, fugindo deles (números) e dela (Matemática), escolhem Letras, e em seguida, em estudos superiores (upa! upa!), acabam por se sentar em Comunicação Social, e daí a nada estão a escrever em jornais onde o 8 e o 80, para eles, são iguais. E quem diz 8 e 80, também pode dizer um e mil.

    Ora, é exactamente um erro de 1.000 que, em catadupa, a nossa imprensa cometeu quando ontem quis falar das exportações de canábis medicinal. Ainda no passado mês de Outubro, o Jornal de Notícias tinha falado sobre o tema, com dados do Infarmed, onde se destacou “os 9271 quilos exportados no ano passado [2022]”, acrescentando-se ainda que os números mostravam não haver “sinais de abrandamento”.

    Ora, a nossa Agência Lusa decidiu actualizar a notícia, com dados finais de 2023, e vai daí, pimba: escolheu alguém que mete pouco tabaco na ‘coisa’, e saiu-lhe porcaria, transformando Portugal numa espécie de Afeganistão de outros tempos. Com efeito, o jornalista da Lusa, certamente por uma névoa nos seus neurónios, não achou estranho que, de repente, se andasse a produzir em Portugal 26.000 toneladas de canábis medicinal. Atenção: notem: 26.000 toneladas. Aqui por casa não se fuma, mas 26.000 toneladas são 26.000.000 quilogramas (26 milhões de quilos) ou 26.000.000.000 gramas (26 mil milhões de gramas). Isto dava para muitas trips, presumo.

    Presumo, não: vamos a contas, mas sem a ajuda do jornalista da Lusa. Como um douto acórdão ensina, um ‘cigarrinho’ feito a preceito leva 0,5 gramas; assim, a produção cá do burgo daria para 52 mil milhões de ganzas, mais de seis ganzas por cada alminha desta Terra. E ainda dá para meia, compartilhada com um parceiro, para se ser preciso. E isto, hélas, incluindo crianças e velhos.

    Nenhuma alminha – leia-se, editor da Lusa – reparou neste disparate, e pior: ao belo estilo do churnalism vai daí e acaba tudo publicado, sem ninguém mais reparar, em tudo o que é jornal da praça (Diário de Notícias, Observador, Expresso, Eco, etc.) como se fosse verdade que Portugal exportou 26.000 toneladas, quando, na verdade, foram apenas 26 toneladas (ou seja, 26.000 quilogramas). Mais tabaco, por favor!


    Dia 31 de Janeiro de 2024

    Se achavam que a Nelma Serpa Pinto, a ‘cara bonita’ da SIC Notícias, atingira o zénite na famosa entrevista em que encalacrou Pedro Nuno Santos, desenganem-se. Muitos e elevados voos se lhe auguram. Ou agoiram, acho eu.

    Um deles foi ontem, como moderadora de um ‘estranho’ debate, em prime time da SIC Notícias, sobre longevidade, que é tema agora mui querido da estação e do jornal (Expresso) da família Balsemão. Nelma brilhou como sempre, colocando em discussão a situação dos pobres velhos sem médico de família, daqueles que caíram que nem tordos no início deste Inverno, os lares inumanos e tantos outros temas candentes da Terceira Idade… Nah! Nanja. Foi um debate fofinho. Tinha de ser um debate fofinho. Até porque àquela hora ainda havia crianças levantadas.

    Avise-se. Aquele debate em tom fofinho de prime time na SIC Notícias (com uma jornalista em espaço informativo), ou ainda as dezenas de artigos sobre longevidade no Expresso nos últimos tempos, nada tem a ver com a existência de uns desinteressados ‘parceiros de projecto’ que dão pelo nome de Novartis (farmacêutica) e Fidelidade (seguradora).

    Certamente, que sem este ‘apoiozito’ (misturado com uns cobres) teríamos visto à mesma a Nelma a moderar aquele debate fofinho com aquelas sumidades, onde se destacavam a ex-ministra da Saúde e candidata a deputada pelo PS, mais um coordenador de um projecto governamental, mais uma demógrafa com ligações à DGS.

    Acho que daqui a umas semanitas, a Nelma sobe ainda mais alto, e irá moderar mais um debate na SIC Notícias, sempre em prime time, e em espaço informativo, com a bênção do ‘mano’ Costa (distinto jornalista), desta vez sobre a pesca do bacalhau… com o apoio da Riberalves, da Oliveira da Serra, do Zêzerovo, da Cooperativa Agrícola de Alhos Vedros e da Casa Ermelinda Freitas…


    Dia 30 de Janeiro de 2024

    Dizem-me que o presidente do Sindicato dos Jornalistas escreve n’A Bola, mas não consegui apurar se se dedica mais a desportos de pés ou de mãos. Pouco interessa. O mais relevante é dizer que está em crise. Neste caso, “o mais relevante é dizer que está em crise” tem três leituras possíveis: pode-se aplicar ao presidente do Sindicato dos Jornalistas, ao próprio Sindicato (por metonímia) e ao jornal A Bola. E todas são verdadeiras.

    Já quanto ao sentido de um comunicado de imprensa do Sindicato dos Jornalistas sobre a violência contra estes profissionais, hoje divulgado, onde se fala de um deles que foi “agarrado pelas pernas e pelos braços”, para se ser claro, será obrigatório dizer que tamanha falta de clareza (se involuntária) se deveu ao facto de ter sido escrito com os pés. Senão, atendamos à seguinte frase desta ‘peça’:

    A agressão a um jornalista do ‘Expresso’, que foi retirado à força, agarrado pelas pernas e pelos braços, de uma conferência na Universidade Católica, em Lisboa, com a participação de André Ventura, e a agressão a uma equipa de reportagem do Porto Canal, à porta de uma fábrica em São João da Madeira, são os dois exemplos mais recentes das ameaças físicas à segurança dos profissionais da Comunicação Social, comunicadas no âmbito do programa sobre a segurança dos jornalistas da OSCE.

    De facto, há aqui duas hipóteses sobre a participação de André Ventura, a saber:

    1) “A agressão a um jornalista do ‘Expresso’, que foi retirado à força, agarrado pelas pernas e pelos braços, de uma conferência na Universidade Católica, em Lisboa, com a participação de André Ventura […]”

    2) ou simplesmente “[n]uma conferência na Universidade Católica, em Lisboa, com a participação de André Ventura […]”, onde, causado por outras pessoas, entre as quais um militante da Iniciativa Liberal, ocorreu “a agressão a um jornalista do ‘Expresso’, que foi retirado à força, agarrado pelas pernas e pelos braços […]”

    No primeiro caso, o André Ventura é um cúmplice.

    No segundo caso, o André Ventura é um azarado.

    E o jornalismo, assim escrito, é um desastre, independentemente de o visado ser o dono da malograda Acácia, ainda mais quando sai da pena do Sindicato dos Jornalistas, que deveria dar o exemplo de rigor, de clareza, de objectividade e de isenção. O jornalista que escreveu este comunicado merecia, metaforicamente falando, ser “agarrado pelas pernas e pelos braços” e arrastado para longe. Com doçura, claro.


    Dia 29 de Janeiro de 2024

    Uma simpatia, a Cristina Freitas. Empática também. Parece que esteve para ser obstetra e depois veterinária. Acabou jornalista, na SIC Porto, com a carteira profissional 5393, predicados suficientes para hoje estar a ser mestre-de-cerimónias do Encontro Fora da Caixa, um evento que serve para a Caixa Geral de Depósitos também ‘financiar’ de forma completamente descomprometida a nossa independente imprensa. Bem esteve, por isso, a nossa empática e simpática Cristina Freitas quando, ao chamar Paulo Moita de Macedo, o CEO da benemérita CGD, vislumbrou uma plateia indiferente e lhe deu, pois bem, um raspanete a preceito: “uma salva de palmas, por favor!” É assim mesmo. A Imprensa e o Jornalismo nasceram para isto: para bater palmas a quem merece!


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  • Aprende Zelensky, que o Ricardo Salgado não está para durar

    Aprende Zelensky, que o Ricardo Salgado não está para durar


    Volodymyr Zelensky apresentou esta semana o seu ‘Plano de Paz’, também conhecido como ‘Plano de Vitória’. Vemo-lo, de papel na mão, a visitar as cidades dos principais aliados para discutir os detalhes, deixando a generalidade dos comuns, com alguma curiosidade.

    Quando digo curiosidade é, convenhamos, algo mais do que isso. Não se trata da curiosidade face a um acidente na faixa do lado ou a um arrufo no apartamento de cima. A invasão da Ucrânia tem sido pau para toda a obra nas justificações que vão servindo à classe média europeia, enquanto nos vão extorquindo cada euro.

    Se aumenta o combustível que nos chega da Nigéria, a culpa é do que sucede na Ucrânia. Se o leite que vem dos Açores dispara, pois bem, foi da Ucrânia. Se a prestação da casa subiu, a Lagarde avisa que se deve à Ucrânia. Se a EDP aumenta a tarifa – adivinharam! –, é porque o gerador está em Kiev. Até aquela camisolinha da Zara, feita com trabalho infantil no Bangladesh, já sofre com a ‘taxa Donbass’. Antes da guerra, a Ucrânia era o “celeiro da Europa”, depois da invasão passou a ser a loja do chinês de Bruxelas. Aparentemente tudo nos chegava daqueles lados.

    Dizem-me, economistas encartados, que o mercado se aproveitou na crise, em um ou dois sectores, e cavalgou a onda, subindo tudo o que mexia. Adoro mercados. E até economistas – tenho amigos que são, e tudo o mais.

    Isto tudo para dizer que este ‘Plano de Paz-Vitória’ era algo que eu esperava com alguma ansiedade. Depois de o ler, enfim, fiquei com aquela sensação que qualquer benfiquista tinha em todos os Agostos entre 1995 e 2003: a expectativa inicial era grande, na pré-época, mas depois tínhamos de ir para a luta com Marcelos, Nelos, Thomas e Bossios. Ora, este plano do camarada Zelensky foi um pouco esse balão, que rapidamente perdeu o ar.

    Se bem percebi, Zelensky quer convencer a Rússia, e os aliados, a rejeitar qualquer cedência de território e, portanto, nada de ‘congelar’ a linha da frente.

    Do ponto de vista ucraniano, faz algum sentido: Zelensky não quer perder um palmo de terra, e é exactamente isso que deve dizer ao seu povo.

    Neste plano há também uma linha dedicada a forçar a Rússia a ir para a mesa das negociações, depois de a Ucrânia fazer mais avanços no terreno. Como? Muito simples: Zelensky pede à União Europeia e aos Estados Unidos que levantem todas as restrições ao uso de armas de longo alcance.

    Numa parte secreta deste caderno aparece outra linha para introduzir um novo e mais original pedido aos aliados: instalação de medidas estratégicas não-nucleares, em solo ucraniano, para dissuadir os russos. Ao jeito daquele porta-aviões que os americanos deixaram “acampado” no Mar Vermelho para os israelitas poderem arrasar Gaza.

    Aqui também vejo alguma coerência na estratégia ucraniana. Se ao Netanyahu dão tudo, o que é que custa tentar? Até vejo alguma benevolência na adenda. Por mim tirava o “não” em “não-nuclear”. Se é para pedir, que se avance sem medo!

    Ainda assim, parece-me, é nesta parte do plano que deixamos cair definitivamente a parte a ‘paz’ e nos focamos na ‘vitória’. Tudo bem espremido, aquilo que temos neste plano de vitória, que em momento algum é de paz, é uma revisão da matéria dada. É Zelensky a resumir num caderninho aquilo que anda a dizer há dois anos e meio, a saber:

    1 – Mais armas;

    2 – Nem um centímetro cedido à Rússia;

    3 – A Ucrânia vai vencer a guerra;

    4 – Continuem a mandar dinheiro.

    Qual é então o problema nesta história?

    A realidade. Essencialmente isso.

    Há, em regra, duas saídas clássicas para uma guerra: um dos lados perde e aceita aquilo que o vencedor ditar (os alemães tiveram duas experiências mais ou menos recentes e estão bem documentadas); ou, em alternativa, cansam-se os beligerantes de morrer e declaram um empate mediado por alguém que finge ser neutro, e discutem-se as condições.

    A Ucrânia não está em nenhuma dessas situações, mas quer ditar as condições. É uma originalidade, mas enfim, aprecio a criatividade. A Rússia está com o mesmo território ocupado, mais aldeia menos aldeia, desde Maio de 2022. Portanto, gritar que não se cede um palmo de terreno, como condição para o fim da guerra, é de facto meritório para o lado ucraniano. E só falta convencer os russos disso.

    E quem diz os russos pode acrescentar os americanos, os ingleses e os amigões da NATO, que foram tão peremptórios em Fevereiro de 2022, mas que hoje já vão dizendo a Zelensky que é preciso jogar ao monopólio no Donbass.

    Zelensky também sugeriu, neste ‘Plano de Vitória’, que entrar para a NATO era uma boa ideia. Como não? Era o mínimo que podia fazer…

    Tenho uma teoria para esta alucinação que Zelensky andou a passear por Washington e pelas principais capitais europeias. Elevar a fasquia para negociar em alta e ir baixando sem parecer que está em perda. Partindo do princípio de que nenhum aliado se vai enterrar mais neste conflito, muito menos com tropas no terreno, e que a Ucrânia já serviu o seu propósito aos interesses ocidentais, restará a Zelensky trocar umas aldeias russas por qualquer coisa na Ucrânia, receber uns milhões para a reconstrução e aceitar uma zona-tampão no Donbass, que ficará com a Rússia e os Capacetes Azuis nos próximos 20 anos. Depois, quem vier a seguir que feche a porta.

    Infelizmente para a Ucrânia, e para as famílias dos soldados que morreram, o plano de Zelensky não é de paz e muito menos de vitória. É um grito desesperado de um morto, um bluff sem cartas na mão. O Ocidente está, de momento, mais preocupado em defender outro invasor ali para os lados do Médio Oriente. Por outro lado, o alinhamento geoestratégico dos países está a tomar forma enquanto se morre em Gaza, Beirute e Donetsk. A Turquia, a China, o Irão, a Índia e os países da Ásia Central e da África estão do lado russo. Lembram-se de se insistir nos “isolados russos” de 2022?

    Ricardo Salgado, ex-CEO do Banco Espírito Santo, esta semana no início do julgamento no Campus de Justiça, em Lisboa. Foto: captura de imagem a partir de vídeo da SIC Notícias

    Não há saída para o caderno de intenções de Zelensky. Ninguém se vai atravessar, para lá de dinheiro e algumas armas, pelas vidas ucranianas contra o bloco que se formou do lado de lá. Os equilíbrios estão perfeitamente definidos e os ucranianos andam a morrer, tal como os russos, há dois anos, para nada.

    Na verdade, um ‘Plano de Vitória a sério foi aquele feito em Lisboa por Ricardo Salgado. Várias décadas a controlar e delapidar o Estado Português na bela soma de 12 mil milhões de euros. Depois de ser apanhado, enrola o processo com todos os truques permitidos no Código de Processo Penal enquanto vive dos lucros. Dez anos depois, chega finalmente ao tribunal, mas já em estado de saúde debilitado. O antigo banqueiro que tinha ministros no bolso, e a quem toda a elite dizia que sim, aparece sem memória, com uma camisola discreta de velhinho, a dar passos de 10 centímetros, seguro pela mão de uma cuidadora, para não cair. Não se lembra de nada, não sabe de nada, não se consegue defender. Isto, 10 anos depois de ser apanhado e um ano depois de escrever um livro de memórias.

    Isto é que é um ‘Plano de Vitória’, Volodymyr. Aprende, que o Ricardo não parece estar para durar.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


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  • Um roubo de mais de oito mil milhões de euros

    Um roubo de mais de oito mil milhões de euros


    Foi com grande alarde que o tão esperado Orçamento do Estado finalmente viu a luz do dia, após meses de uma discussão incessante sobre um documento que até então ninguém havia lido. Surpreendente, não? Afinal, é sempre uma façanha discutir o desconhecido com tal fervor.

    Promessas não faltaram: IRS jovem, redução do IRC, um alívio generalizado da carga fiscal…enfim, uma epopeia de bênçãos prestes a ser derramada sobre o cidadão comum. Todos esperávamos presenciar o Estado finalmente aliviar a mão que há tanto tempo nos rouba o bolso. Mas, qual não foi o espanto, ao descobrirmos que, longe de uma redenção fiscal, fomos brindados com um assalto ainda maior: 8 mil milhões de Euros a mais. Sim, podemos ver o verdadeiro roubo em grande escala que nos aguarda.

    Evolução das receitas do Estado entre 1999, início do Euro, e 2025; Unidade: milhares de milhões de Euros; Fonte: Banco de Portugal e Orçamento do Estado (2025)

    É com uma dose de generosidade que o nosso estimado Estado nos concede o privilégio de assistir à invasão de uma horda de terceiro mundo, empurrando a população residente para os 10,6 milhões, após anos de estabilidade em torno dos 10,3 milhões. O que isso significa para 2025? Ora, segundo o brilhante plano deste Orçamento, o leviatã estatal irá extorquir cerca de 12,5 mil euros a cada alma residente em solo luso, o que, numa família de quatro pessoas, soma a módica quantia de 50 mil euros por ano!

    Eis o tão aclamado Estado Social em todo o seu esplendor, que, para funcionar, exige um generoso tributo de 45,5% do que produzimos, ou seja, 134 mil milhões de euros retirados de um PIB de 294 mil milhões Euros – valor do PIB para 2025, segundo o Orçamento do Estado.

    Notem bem, desde 1999, o assalto ao nosso bolso aumentou uns estonteantes 183%; enquanto isso, a nossa carteira, personificada pelo PIB (2025: 294 mil milhões € vs. 1999: 120 mil milhões €), cresceu apenas uns módicos 146%. Para piorar, em 1999, as “receitas” do Estado representavam 39,5% do PIB (47 mil milhões de euros vs. 120 mil milhões de euros), mas em 2025 saltarão para 45,5%, um incremento de 6 pontos percentuais! Este “simpático” aumento roubará nada menos que 1.600 euros do bolso de cada português, gentilmente extorquidos pelo Estado!

    Vamos lá dissecar como se processará o assalto ao nosso bolso em 2025, conforme ditado pelo Orçamento do Estado. Uns simpáticos 73 mil milhões de euros serão extorquidos via tributação, seja através de impostos directos (IRS, IRC, etc.) ou indirectos (IVA, ISP, etc.). Comparado com 2024, teremos um crescimento de 3,3% (72,6 vs. 70,3 mil milhões), o que equivale a uns módicos 6.900 euros por cada residente em Portugal!

    Desagregação das receitas do Estado em 2025, segundo o Orçamento do Estado; Unidade: milhares de milhões de Euros; Fonte: Orçamento de Estado (2025)

    Em segundo lugar, temos as “contribuições sociais”, uns míseros 38 mil milhões de euros, extorquidos sob o pretexto dos tão famigerados “descontos” para o esquema piramidal conhecido como Segurança Social, que, ironicamente, é mantido à tona pelos trabalhadores e pelas entidades empregadoras.

    Mesmo assim, vejam só, não chegam para sustentar o insaciável monstro do Estado Social. Então, o que se faz? Transferem-se mais uns módicos 11 mil milhões de euros em impostos (página 132 do Orçamento do Estado, para os mais curiosos) e, claro, uns simpáticos dois mil milhões vindos dos fundos europeus – cortesia da impressora mágica do BCE. Porque, sejamos francos, sem estas injecções milagrosas, o dito “sistema de solidariedade” já se teria desmoronado há tempos, como o castelo de cartas que sempre foi.

    Em terceiro lugar, temos as “Vendas”, que somam uns modestos nove mil milhões de euros. Estas “receitas” são, naturalmente, obtidas sob o confortável regime de monopólio — algo que, curiosamente, é anátema no sector privado. Mas quando o Estado põe a mão, tudo é permitido; certo?

    money, banknotes, euro

    A interminável lista de bens e serviços públicos à “venda” é quase infindável: desde a alienação de propriedades “públicas” até à extorsão em forma de taxas administrativas (quem nunca pagou para renovar o cartão de cidadão ou obter uma simples licença de construção?), sem esquecer as célebres propinas das universidades “públicas”, as insuportáveis taxas moderadoras e até os passes de transportes públicos.

    Em quarto lugar, temos as “receitas” de capital, uns modestos seis mil milhões de euros, porque, afinal, o nosso querido Estado também veste o chapéu de capitalista. Essas “receitas” podem vir de várias fontes: desde a venda de participações em empresas, até à emissão de dívida pública, sem esquecer, claro, os fundos europeus, generosamente impressos pelo BCE. Tudo isso, como sempre, com fins absolutamente nobres: construção de estradas, hospitais, escolas, etc. Curiosamente, podíamos contratar tudo isto directamente, mas preferimos entregar ao grande parasita, para que os ilustres bandidos e amigos que o comandam façam essas contratações a entidades privadas, igualmente amigas do poder.

    Finalmente, chegamos às “Outras Receitas”, uns meros oito mil milhões de euros, fruto de multas, coimas e penalidades — porque, convenhamos, usar as estradas neste país é um assalto a céu aberto! —, além dos rendimentos de propriedade (concessões, dividendos de participações, arrendamento de imóveis…), doações e legados, receitas de lotarias e jogos, rendimentos bancários (juros de depósitos, garantias…) e até de propriedade intelectual (patentes, marcas, etc.). Ou seja, a criatividade na extorsão é verdadeiramente inesgotável e multifacetada!

    wallet, empty, poverty

    Os salteadores organizados em partidos, divididos em dois grandes grupos mafiosos, iguais na sua natureza, controlam há 50 anos esta colossal máquina de extorsão. Utilizam este gigantesco saque para doutrinar a população através da “escola pública” e “universidades públicas”, e, claro, manipulá-la com a mais insidiosa propaganda.

    Recentemente, vimos os “lucros” proporcionados pela invasão de terceiro mundo, que tem lugar há anos. Os seus “descontos” para o esquema em pirâmide, conhecido por Segurança Social, não vão para um simpático porquinho que um dia lhes pagará a reforma, mas sim para os bandidos que mantêm artificialmente a Dona Branca do Estado, aquela que lhes compra precisamente os votos dos idosos. Caso seja necessário, entram mais uns milhões para salvarem o esquema em pirâmide que lhes garante a reeleição.

    Também contamos com uma série de eufemismos elegantes para suavizar a ideia de roubo, conferindo-lhe o título pomposo de “custo” ou “favorecimento”: “IVA da electricidade custa 110 milhões de euros”, “Novo IRS Jovem…favorece salários de 2.000 euros”, “Residentes não habituais custaram 1.360 milhões…”. Seria hilariante se não tivéssemos a falar de uma extorsão com recurso à mais vil propaganda, recheada de mentiras e manipulações.

    Lembram-se daquela célebre pérola proferida por estes parasitas há décadas: “se todos pagassem, todos pagariam menos”? Pois bem, agora que a máquina de extorsão não permite fugas, note-se como a expressão “evasão fiscal” — eufemismo para descrever a resistência a um assalto — desapareceu do discurso destes senhores.

    Em 2025, preparam-se para nos arrancar mais oito mil milhões de euros — porque, claro, o roubo é sempre para mais, nunca para menos. Esta será a terceira maior subida, perdendo apenas para 2023 (um espectacular aumento de 15,4 mil milhões de euros e para 2022 (mais 10,4 mil milhões de euros) — graças à inflação patrocinada pelo BCE e à pandemia inventada.

    Esses foram os anos em que, recordemos, nos trancaram em casa, obrigaram-nos a andar com uma fralda facial e ainda nos coagiram a tomar uma substância experimental, tudo em nome do “bem comum”; enquanto isso, o BCE imprimia dinheiro como se o amanhã fosse uma lenda, garantindo que os diferentes estados europeus arrecadassem como nunca antes tinham arrecadado.

    Por fim, atentemos ao último golpe: com um grão de areia desse colossal bolo de 133 mil milhões de euros — cerca de 55 milhões de euros —, estes salteadores mantêm os órgãos de propaganda absolutamente controlados e manietados, tratando-os com o mais absoluto desdém e prepotência. Notem bem, com uns míseros tostões, conseguem manipular toda a população. Para os mais difíceis, aqueles que não se deixam assaltar por este perverso Leviatã, mais conhecido como Estado, há sempre a ameaça de prisão e ruína financeira.

    Demos vivas à Democracia e ao Estado Social!

    Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário


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  • As ‘amantes’ dos Governos precisam de ‘apoios’

    As ‘amantes’ dos Governos precisam de ‘apoios’


    Alterações Mediáticas, o podcast da jornalista Elisabete Tavares sobre os estranhos comportamentos e fenómenos que afectam o ‘mundo’ anteriormente conhecido como Jornalismo. No novo episódio, analisa-se o fenómeno dos ‘subsídios’ encapotados que já têm sido dados por Governos a grandes empresas de media, ao permitir, por exemplo, que alguns acumulem dívidas de milhões de euros ao Fisco e à Segurança Social ao longo de anos e anos, distorcendo assim o mercado, lesando os contribuintes e colocando em perigo a independência jornalística.

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  • O saldo das eleições municipais e o desafio político brasileiro

    O saldo das eleições municipais e o desafio político brasileiro


    Tratar das eleições municipais no Brasil pode parecer, para o leitor português, franca atitude de desperdício de tempo. A uma, porque o sistema brasileiro difere em grau e em forma do sistema político-eleitoral lusitano. A duas, porque, salvo raríssimas exceções (caso da eleição do ano 2000), não é possível inferir das eleições locais qualquer repercussão na eleição federal, que se passa dois anos depois. Apenas para exemplificar o quão estatisticamente desprezível é projectar o resultado das eleições gerais com base no das eleições municipais, basta dizer que, em 2020, o PT não conseguiu eleger um candidato seu em nenhuma prefeitura em capitais, feito inédito desde a redemocratização. Um biênio depois, Lula recebia do povo seu terceiro mandato como Presidente da República.

    Se a estatística não favorece a projecção de tendências do eleitorado, observar a fundo as particularidades de cada pleito, ao revés, pode ao menos oferecer pistas de para onde caminha o país. E este pleito de 2024 está cheio delas.

    landscape photography of mountains

    À partida, tem-se o óbvio: a esquerda perdeu, e perdeu feio. Somados, todos os partidos da ala jacobina do espectro político não alcançaram sequer 1/5 dos votos depositados nas urnas. Trata-se do mais baixo patamar da história. Enquanto isso, partidos da direita e do chamado “Centrão” (que também é maioritariamente de direita) alcançaram mais de 80% dos votos. Esse percentual é superior, por exemplo, aos melhores dias da Arena (Aliança Renovadora Nacional), o fantoche partidário de apoio à ditadura militar, que se autointitulava na altura “o maior partido do Ocidente”.

    O Brasil, pois, virou à direita?

    Não exactamente.

    Na verdade, desde sempre a população brasileira inclina-se para o conservadorismo. Em toda a República, nunca um governo de esquerda foi eleito à Presidência. João Goulart, o mais próximo que se pode chegar disso, somente ascendeu ao posto máximo da Nação após a renúncia de Jânio Quadros (1961), numa época em que Presidente e Vice concorriam em chapas separadas. Mesmo assim, Jango somente assumiu depois de uma crise militar contra sua posse redundar na chamada “solução parlamentarista”, um arremedo de emenda constitucional que transmudou o sistema de governo para um regime com primeiro-ministro. Quando um plebiscito dois anos depois devolveu-lhe as prerrogativas de Presidente (1963), os militares golpearam-no no ano subsequente (1964).

    A excepção, claro, atende pelo nome de Luiz Inácio Lula da Silva. Forjado no sindicalismo metalúrgico, Lula gradualmente abandonou sua condição de “radical de esquerda” para aninhar-se numa centro-esquerda de viés social-democrata. O desastre económico do segundo governo Fernando Henrique Cardoso, causado em grande parte por uma política cambial insana, certamente ajudou na conjunção astral. Com o país sedento por mudanças, os planetas alinharam-se e o barbudo ex-operário do ABC paulista era eleito presidente.

    Lula da Silva, presidente do Brasil.

    Com a vitória de 2002, Lula deu início a um ciclo de hegemonia política sem precedentes em nossa história democrática. Reeleito em 2006, Lula ganharia ainda outras duas vezes (2010 e 2014) por interposta pessoa (Dilma Rousseff). Preso em 2018, o ex-líder sindical saiu do cárcere para ganhar em nome próprio, pela terceira vez, a Presidência da República. Nenhum outro político brasileiro mandou tanto e por tanto tempo.

    Os anos de sucesso, porém, ficaram no passado. Depois de atingir o auge da expressão no pleito de 2012, quando ganhou até a municipalidade paulistana com Fernando Haddad, o PT tem experimentado um processo de acentuado declínio no eleitorado nacional. Como nenhum outro partido conseguiu desafiar a sua hegemonia nesse lado do espectro, ficamos, pois, numa situação em que “ser de esquerda” praticamente virou sinónimo de “ser petista”. E o fardo desses anos todos de domínio eleitoral parece ter-se tornado demasiado pesado para o partido da estrela vermelha. Daí o desastre eleitoral de 2020, visto como reprise agora, em 2024.

    A direita, contudo, não desempenhou melhor papel. Como o PSDB não quisesse abraçar abertamente as pautas ditas “conservadoras”, o eleitor furibundo com o PT foi paulatinamente jogado para o extremo do espectro político. Quando Jair Bolsonaro lançou-se candidato em 2018 e permitiu à direita “sair do armário”, subitamente foi transformado no estuário de todas as deceções do eleitorado. O eleitor conservador tinha, enfim, um “líder” para chamar de seu.

    Todavia, esse fenómeno foi mal ou pouco compreendido pela imprensa especializada. Não é que Bolsonaro tornara-se o “Lula da Direita”. Ele apenas passou a ocupar o posto de “anti-Lula” de ocasião. Só isso explica como uma personagem caricatural, que jamais concorrera a nenhum cargo maioritário (por absoluta falta de votos), pudesse eleger-se Presidente da República justamente na primeira eleição que disputara. Querer transformar essa triste figura do baixíssimo clero congressual em um líder “popular” e “carismático” foi um dos pratos mais grotescos que o mainstream mediático quis empurrar goela abaixo dos brasileiros.

    gray concrete building under blue sky during daytime

    É essa constatação, aliás, que torna possível explicar – ao menos parcialmente – o fenómeno Pablo Marçal. Autodeclarado “coach”, o sujeito fez fama e fortuna a vender ilusões para o público incauto. Lançando-se praticamente sozinho à prefeitura do maior município do país (São Paulo), Marçal rapidamente conquistou corações e mentes e, por um momento, pareceu comandar uma onda que varreria a eleição e o conduziria à vitória no primeiro turno. Não fosse a bizarra cadeirada que levou de José Luiz Datena em um debate televisivo e a divulgação do infame laudo médico segundo o qual Guilherme Boulos teria sido internado por abuso de cocaína, talvez Marçal tivesse conseguido cavar uma vaga na segunda ronda da capital paulista.

    Bolsonaro, que apoiava o actual prefeito, Ricardo Nunes, quis fazer-lhe frente, mas foi violentamente devolvido à toca pelos mesmos extremistas das redes sociais que ele pensava comandar. Uma vez que, no entender desse eleitorado, Marçal representava “os verdadeiros valores do conservadorismo”, apoiar Nunes seria o mesmo que converter-se ao “comunismo” ou algo do género. Evidenciando a covardia típica de sua acção política, Bolsonaro colocou um pé em cada canoa (Nunes e Marçal) e deixou tudo como estava, para ver como é que ficava.

    Conseguiu, assim, a suprema façanha de sair desprezado por Marçal (que exigiu um pedido público de desculpas para reatar relações) e sem poder comemorar a passagem de Ricardo Nunes ao segundo turno, mesmo tendo indicado o vice de sua chapa. Se essa assombração denominada Pablo Marçal serviu para algo, foi para demonstrar que o eleitorado extremista não tem dono e está pronto a abraçar qualquer alternativa dita “conservadora” que se mostre eleitoralmente viável.

    Pablo Marçal

    O Brasil sai dessa eleição, portanto, com fracturas à esquerda e à direita. À esquerda, porque, com cada vez menos votos, depende cada vez mais de Lula, um septuagenário que, na melhor das hipóteses, disputará apenas mais uma eleição. E à direita porque, com Bolsonaro inelegível e em vias de ser preso, não surgiu ainda outra figura com consistência ideológica que lhe permita afastar-se de seus Marçais e quetais.

    Em resumo, o desafio brasileiro passa pela construção do pós-Lula e do pós-Bolsonaro. Quem melhor souber manejar suas forças de maneira a atrair o eleitorado flutuante do centro ditará os rumos da política brasileira pelos próximos anos.

    Arthur Maximus é advogado no Brasil e doutorado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa


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  • Omnipanoptismo

    Omnipanoptismo


    Há muitos estudos hoje que comprovam os benefícios da rede de imagens, quer na aplicação de multas quer no reconhecimento facial, que permite a identificação do prevaricador e a sua detenção em tempos record. O desenvolvimento do sistema de videovigilância pública em Bruxelas, Keersmaecker e Debailleul (2016) foi apresentado num magnífico trabalho, o qual recomendo.

    Logo na introdução, define-se circuito fechado de televisão (CCTV) como “um sistema de TV no qual os sinais não são distribuídos publicamente, mas são monitorados, principalmente para fins de vigilância e segurança”.

    A polémica associada ao CCTV surge das questões muito associadas a um discurso das esquerdas do Maio de 60, que privilegiam a protecção da privacidade. Uma série, que muito me agradou, ‘Sob suspeita’, abordava este tema de modo fascinante, pela acção, pelo suspense, e pelas inúmeras questões associadas ao tema. Lançado em 2013, mostrava então como o reconhecimento facial e a inteligência artificial permitiam antecipar alguns gestos desaconselhados. A ideia de reduzir o erro humano, definindo algoritmos que respondem com aprendizagem por máquinas, que interferem na decisão pessoal, é pelo menos polémica.

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    O conceito de panoptimo participativo vem do conceito de panóptico, uma estrutura arquitectónica idealizada pelo filósofo e jurista Jeremy Bentham (1748 -1832), que consistia num dispositivo polivalente da vigilância, permitindo que um único observador conseguisse monitorar várias pessoas simultaneamente. 

    O panoptismo tornou-se uma forma de disciplina e vigilância que tem sido aplicada em várias “instituições de sequestro”, como a fábrica, a escola, o hospital, o quartel e a prisão. Aconselho a leitura de umas reflexões sobre os efeitos da vigilância constante, pelos investigadores brasileiros Rafael Matias de Souza e Edu Silvestre de Albuquerque, em Janeiro de 2024, na revista Contradição – Revista Interdisciplinar de Ciências Humanas e Sociais, onde se levantam questões da monitorização criminal e da sensação subjetiva de segurança nas favelas, onde o crime observa a polícia com seus mecanismos de vídeo, móveis e fixos.

    Para Foucault, o panoptismo é uma forma de poder que se baseia na vigilância constante, que por sua vez induz a conformidade. O poder não é exercido apenas por um indivíduo, mas por toda uma rede de instituições que monitoram e controlam a vida das pessoas.

    Tiago Veloso Nabais escreveu em 2023 para o Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna o artigo ‘Proteção de Espaços Públicos: Sistemas de Videovigilância Inteligentes’ onde refere que “numa era em que cada vez mais a noção de privacidade atinge novas dimensões, ao colaborar-se para a difusão de uma cultura de vigilância, as não cedências de privacidade no âmbito securitário afiguram-se revestir de uma forma de hipocrisia”.

    eye, watch, paper

    O tema debruça-se sobre esta contradição da privacidade com a importância da segurança. Na realidade há um processo “omnipanótico participativo” quando os cidadãos colocam as suas câmaras ao serviço da vigilância sem restrições, quando todos desejamos descobrir o criminoso em curto espaço de tempo, e quando podemos antecipar o crime.

    Há uma contradição entre leis de defesa da privacidade, leis fomentadas pelo discurso psiquiátrico em voga, que legitimam toda a diferença e fomentam toda a inclusão, e a realidade dos crimes que podíamos ter impedido se a segurança se sobrepusesse à liberdade.

    Este é um dos temas essenciais do século XXI a que não podemos estar indiferentes, de que não nos devemos afastar.  

    Diogo Cabrita é médico


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.