Nos últimos quatro anos, a Parque Escolar – escolhida agora para dinamizar a habitação pública – não mostrava contas e nem se incomodava com críticas dos partidos da oposição nem com notícias da imprensa. O PÁGINA UM meteu um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa no passado dia 8. Esta semana, os Ministérios das Finanças e da Educação apressaram-se a aprovar os relatórios de 2019, 2020 e 2021. E prometem para breve o de 2022. Para já, ficou-se a saber que a dívida total ascende aos 1.213 milhões de euros, e há ainda um conjunto de anomalias contabilísticas detectadas pelo auditor.
A Parque Escolar – a empresa estatal que, em breve, ficará com a função de construção pública, mudando mesmo de denominação – colocou esta tarde os relatórios e contas de 2019, 2020 e 2021 no seu site. Esta decisão vem no seguimento de uma intimação apresentada no mês passado pelo PÁGINA UM no Tribunal Administrativo de Lisboa.
A administração desta empresa – que passará a denominar-se Construção Pública, tendo o diploma da sua reestruturação sido promulgado pelo Presidente da República na semana passada – remeteu também ao PÁGINA UM os ofícios enviados à tutela com as contas dos exercícios a partir de 2019, para aprovação, mas que estavam “engavetados”.
De acordo com as datas desses ofícios, agora na posse do PÁGINA UM, o relatório de 2019 estava na posse da Secretaria de Estado do Tesouro e do Ministério da Educação desde Novembro de 2020, o relatório de 2020 desde Maio de 2021 e o relatório de 2021 desde Maio de 2022.
No que diz respeito ao relatório e contas do ano passado, em ofício enviado esta tarde ao PÁGINA UM, a secretária-geral da Parque Escolar, Alexandra Viana Ribeiro, diz que “ainda não se encontra concluído, designadamente por aguardar o parecer do conselho fiscal (…) e a respetiva aprovação pelas tutelas”, prometendo o seu envio posteriormente.
Este é, para já, o corolário de mais uma vitória do PÁGINA UM em prol da transparência da Administração Pública, uma vez que a Parque Escolar, que passará a assumir funções de promoção de habitação pública, tinha o ano de 2018 como o último com contas aprovadas e disponibilizadas.
João Costa, ministro da Educação, em Maio do ano passado prometeu que divulgaria as contas de 2019, 2020 e 2021 da Parque Escolar “brevemente”. Só com a intimação do PÁGINA UM se apressou, com Fernando Medina, a aprová-las e divulgar no site da empresa pública.
E, mesmo assim, este relatório de 2018, bem como os dos anos de 2016 e 2017, apenas foram publicados em Março do ano passado, o que suscitou então questões da Iniciativa Liberal junto do Ministério das Finanças, que tutela a empresa pública. Segundo informações avançadas na altura pelo Jornal de Negócios, a dívida da empresa em 2021 seria de 981,7 milhões de euros.
Contudo, na verdade, e de acordo com análise rápida do PÁGINA UM, a dívida é bem superior. O passivo corrente – com previsão de pagamento em menos de 12 meses – era então de 151,7 milhões de euros, mas o passivo não corrente ascendia aos 1.061,4 milhões de euros. No total, o passivo total situava-se nos 1.214,1 milhões de euros, um pouco mais de 232 milhões do que o valor apontado pelo Jornal de Negócios.
O aumento da dívida acaba por relativizar os resultados líquidos positivos, até porque os activos da Parque Escolar beneficiaram bastante pelo aumento de capital estatutário no valor de cerca de 342,5 milhões de euros por incorporação de 138 escolas e por conversão de um empréstimo da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, após dação em cumprimento do Palácio Valadares, no Largo do Carmo, em Lisboa.
Um dos aspectos mais relevantes dos relatórios e contas, agora disponibilizados e que estará na base do atraso de anos na sua divulgação, prende-se com as reservas feitas pelo auditor das demonstrações financeiras, a cargo da Grant Thornton.
Por exemplo, no relatório de 2019 – que somente agora vê a luz do dia, após a intervenção do PÁGINA UM –, o auditor critica a forma de cálculos das depreciações das propriedades de investimento (que incluem escolas), que além do mais, em diversas obras em curso, não tiveram ainda os terrenos transmitidos para a empresa pública, nem foram “objecto de avaliação por peritos independentes”.
Também é considerado que os cerca de 37 milhões de euros de provisões – devidos a processos judiciais em curso – podem não ser suficientes.
Requerimento do advogado da Parque Escolar onde elenca a cronologia da aprovação das contas pela tutela após a intimação do PÁGINA UM.
Mais grave ainda é o alerta transmitido pelo auditor de que “na realização de diversos concursos públicos, verificou-se que houve concertação de preços entre as empresas fornecedoras de monoblocos, no que respeita ao preço de transporte, montagem, aluguer e desmontagem dos mesmos, durante as várias fases de realização das obras”.
A Grant Thornton escreveu então que “esta situação originou gastos adicionais (…), cujo montante total não foi, ainda, possível de quantificar.”
Outra situação irregular passa-se com o mobiliário escolar e sobretudo com o equipamento informático. O auditor salienta que “não foram objecto de inventariação física”, acrescentando que, desse modo, “não podemos concluir, na presente data, sobre a existência de todos os bens e, consequentemente, do respectivo valor registado no balanço”.
Os alertas de desconformidades mantiveram-se no relatório de 2020 e 2021, praticamente nos mesmos moldes.
Saliente-se que depois de se recusar tacitamente a disponibilizar os documentos solicitados, a Parque Escolar acabou por optar por satisfazer o pedido antes de ser obrigado por sentença judicial.
Em requerimento hoje apresentado no Tribunal Administativo de Lisboa, o advogado da empresa pública diz que “nada disse [ao PÁGINA Um], apenas e só, porque alguns documentos solicitados (…) não estavam finalizados (…), porquanto faltava a aprovação dos relatórios e contas pela tutela para concluir os processos.”
Na verdade, ao juiz do processo a Parque Escolar admite mesmo que o relatório e contas de 2019 foi apenas aprovado pela tutela na passada segunda-feira, enquanto os relativos a 2020 e 2021 acabaram sendo aprovados hoje, dia 25 de Maio.
Apesar deste contra-relógio, a Parque Escolar deverá vir a ser condenada pelo tribunal ao pagamento das custas, uma vez que não respondeu favoravelmente antes da entrada da intimação do PÁGINA UM. O montante das custas gastas pelo PÁGINA UM serão aplicadas em similares processos de intimação por não divulgação de documentos públicos, através do seu FUNDO JURÍDICO.
N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Neste momento, por força de 18 processos em curso, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras.
Pedro Almeida Vieira e Luís Gomes reencontram-se no 17º episódio de Os economistas do diabo. Em cima da mesa, além de muitos assuntos paralelos, as “bolhas” das farmacêuticas no mercado de capitais, seguindo-se os últimos acontecimentos (violentos) em redor da TAP e, por fim, o regresso de Cavaco Silva à cena política.
Na rubrica Memórias de elefante, recordamos os tanques Leopard e que há uns meses supostamente iriam ter um contributo relevante no conflito da Ucrânia, enquanto agora se apresentam os aviões F-16 como o novo trunfo para a guerra.
As manifestações globais começam a viralizar, mas também são alvo de ataques na imprensa mainstream, que acusa os seus promotores de serem o “braço” popular de grupos de direita conservadora e mesmo de extrema-direita, congregando também anti-vacinas e teóricos da conspiração. Será assim? O PÁGINA UM apresenta os perfis dos 11 principais promotores do Reignite Freedom, um dos movimentos mais dinâmicos, e que organizou este sábado uma manifestação em Lisboa por causa da reunião do Clube de Bilderberg.
“We are many, we are united, we are ready” [nós somos muitos, nós estamos unidos; nós estamos prontos] – este é o lema da manifestação de protesto do movimento Reignite Freedom que hoje se realiza em Lisboa, integrado num movimento mais alargado, o Global Walkout, nascido no ano passado protagonizado pela activista australiana Monica Smit.
Não é um acaso o momento e local desta manifestação na capital portuguesa por parte daqueles que alertam para os perigos da globalização e da concentração de poder em elites políticas e financeiras, e que considerando mesmo que o The Great Reset, defendido em 2020 pelo World Economic Forum, tem propósitos malévolos.
Hotel Pestana, em Lisboa, onde se reúne este fim-de-semana o Clube de Bildeberg.
Nos próximos três dias, o Hotel Pestana Palace, em Lisboa, será o palco da reunião anual do Clube de Bilderberg, uma espécie de fórum (mais ou menos) secreto e agendas de similar calibre, e que constitui um alvo sempre apetecível dos movimentos anti-globalização.
Embora os objectivos formais do Reignite Freedom sejam apenas ideologicamente anti-globalização – no sentido de considerarem a sua missão como de “reacção global unificada e estratégica contra a agenda globalista, garantindo que mantém a liberdade individual e colectiva”, conforme consta no seu site –, a imprensa mainstream não tem sido favorável às manifestações antiglobalização.
Na generalidade, surgem coladas às ideologias de extrema-direita, de negacionistas da pandemia e mesmo a teóricos da conspiração. E isto quando não simplesmente ignoradas, com a completa ausência de cobertura.
Por isso, sobre o movimento Reignite Freedom, o PÁGINA UM decidiu traçar o perfil das 11 personalidades que constituem a sua “equipa de lançamento”, onde desponta como figura maior o advogado John F. Kennedy, durante anos um destacado e reconhecido activista ambiental, e agora candidato nas primárias do Partido Democrata às eleições norte-americanas, mas que caiu em desgraça na imprensa mainstream durante a pandemia.
ROBERT F. KENNEDY JR
Sobrinho do antigo presidente norte-americano John F. Kennedy, o agora candidato pelo Partido Democrata às presidenciais norte-americanas de 2024 tem um longo historial como activista ambiental, destacando-se como advogado do poderoso National Resources Defense Council, uma organização não-governamenal ecologista com cerca de 2,5 milhões de membros.
Defensor da “liberdade de escolha médica”, Robert F. Kennedy fundou a Children’s Health Defense (CHD), uma organização sem fins-lucrativos que se destacou pela contestação ao uso de timesoral (contendo mercúrio) em vacinas por alegadamente estar associado a autismo, doença de Alzheimer e esclerose múltipla, entre outras doenças. Apesar de garantir a segurança dessa substância, as autoridades norte-americanas retiraram o seu uso na generalidade das vacinas. No entanto, estas posições justificaram-lhe o rótulo de anti-vacinas, sobretudo quando colocou questões sobre a segurança das vacinas contra a covid-19.
Aliás, no passado dia 24 de Março, Kennedy, juntamente com a Children’s Health Defense, avançou com uma “acção legal colectiva” contra o presidente norte-americano Joe Biden, o virologista Anthony Fauci e outros responsáveis de topo da actual Administração, acusando-os de encetar uma “campanha concertada para que as três principais redes sociais nacionais censurassem discurso protegido constitucionalmente”.
Candidato às primárias do Partido Democrata para as eleições para a Presidência dos Estados Unidos em 2024, Robert Kennedy Jr não tem tido a vida facilitada nas redes sociais: em Agosto do ano passado as suas contas de Instagram e de Facebook foram eliminadas por ter alegadas violações às regras “da política de desinformação” sobre a covid-19.
Porém, mantém-se bastante activo no Twitter, rede onde conta mais de 1,3 milhões de seguidores.
Quando o movimento organizador do protesto de sábado foi lançado, o sobrinho do antigo presidente norte-americano John F. Kennedy foi, desde logo, uma das principais figuras a dar a cara pelo projecto, e está prevista a leitura de uma sua mensagem.
MONICA SMIT
Líder do movimento “Reignite Freedom”, a activista australiana de 34 anos surge como o rosto mais activo e está presente na manifestação em Lisboa.
Durante a pandemia de covid-19, perante as duras restrições impostas pelo Governo australiano, Smit fundou a Reignite Democracy Australia (RDA), uma organização que, segundo consta na página oficial, “visa a manutenção da liberdade individual e colectiva”. Entre as suas reivindicações, está a “abolição da censura” e da “tirania médica”.
A cobertura mediática de Smit não lhe tem sido nada favorável: a propósito de um vídeo que a activista publicou esta semana nas redes sociais, no qual pedia donativos financeiros para a sua associação por estar alegadamente à beira da falência, foi ridicularizada por vários jornais, incluindo o britânico Daily Mail.
Apelidada habitual e insistentemente como “anti-vacinas”, Monica Smit está já habituada a um tratamento hostil. No Verão de 2021 foi alvo de acusações criminais – que lhe seriam retiradas em Julho do ano passado – por ter promovido manifestações contra o confinamento, e chegou mesmo a ser detida durante 22 dias.
A activista foi novamente acusada por incumprimento das ordens da autoridade de saúde de Melbourne em 2021, motivo que a levou novamente ao tribunal em Dezembro do ano passado. Smit contra-atacou, dizendo ser sua intenção processar as autoridades pela sua detenção.
De acordo com a sua página de LinkedIn, e antes de ter fundado a sua organização, Smit trabalhava como jornalista independente, desde Fevereiro de 2018, tendo viajado durante esse período para os Estados Unidos, Canadá, Equador, Honduras e Guatemala.
Sem qualquer indicação de formação académica nessa rede social, Monica Smit refere experiências profissionais anteriores no ramo imobiliário e de publicidade.
ROBERT MALONE
Conhecido virologista e imunologista norte-americano, devido ao seu papel pioneiro no desenvolvimento da tecnologia de mRNA, Robert Malone, agora com 63 anos, foi um dos nomes mais credíveis no mundo da Ciência a criticar a vacinação contra a covid-19.
A sua posição crítica valeu-lhe, por um lado, o respeito pelos grupos que contestavam aquelas vacinas, mas por outro uma imprensa hostil que se apressou a desvalorizar as suas investigações e a desmentir a ideia, que o próprio proclamava, de ser ele o “inventor das vacinas de mRNA”.
Em Portugal, jornais como a Visão, o Polígrafo e o Observador publicaram artigos que contradiziam as afirmações de Malone e negavam a suposição de que ele teria sido uma figura central na criação desta nova espécie de vacinas.
Robert Malone
Se houve ou não paternidade, certo é que os trabalhos de Robert Malone foram indesmentivelmente uma das primeiras peças do “puzzle” da tecnologia mRNA aplicada nas vacinas contra a covid-19 da Pfizer e da Moderna. Na década de 1990, em conjunto com outros colegas, publicou um artigo que demonstrava como a injecção de RNA nos músculos produzia proteínas.
No entanto, como reportou o jornal New York Times no ano passado, Malone não foi o único, nem o principal autor do artigo científico. Na verdade, como o PÁGINA UM confirmou, o artigo em causa publicado na Science em 23 de Março de 1990, tem sete autores, sendo que Malone é o segundo, atrás de Jon A. Wolff, um geneticista falecido em Abril de 2020.
Além disso, embora a descoberta tenha sido cabal para o desenvolvimento das actuais vacinas de mRNA mensageiro, foram ainda necessários “aprimoramentos” ao longo de vários anos, nos quais Robert Malone já não participou.
Em todo o caso, durante a pandemia, as suas afirmações mais contundentes incidiram sobre os possíveis efeitos secundários da vacinação e à “toxicidade” da proteína spike, à relativização da gravidade da doença e à defesa do uso de ivermectina e hidroxicloroquina como formas de tratamento contra a covid-19.
Robert Malone, em Lisboa, numa tertúlia em Setembro de 2021, dinamizada pela Cidadania XXI.
No entanto, embora Malone tenha colaborado, ao longo da vida profissional, com a indústria farmacêutica, e estado até envolvido na pesquisa para a vacina do vírus Ébola e na terapêutica para o Zika, tem sido apelidado pela imprensa mainstream como anti-vacinas. Isto mesmo depois de Malone se ter vacinado em 2021, como assumiu num evento em Lisboa.
À boleia da covid-19, Robert Malone – que sempre garantiu não pertencer a nenhum partido político – começou a dar entrevistas em canais conservadores, sendo a sua aparição mais polémica ocorrido no conhecido podcast The Joe Rogan Experience, em Dezembro de 2021, episódio que acabaria por ser censurado pelo Youtube.
Tendo-se tornado num ‘activista’ assumido, soma mais de 300 mil seguidores na plataforma Substack, enquanto no Twitter está próximo de 1,1 milhões de seguidores.
MIKE YEADON
Em Março de 2021, a Reuters escreveu um artigo sobre Mike Yeadon intitulado “O ex-cientista da Pfizer que se tornou um herói anti-vacinas”. De facto, quando pesquisamos o seu nome no motor de busca do Google, a primeira página que aparece diz-nos que se trata de um “activista anti-vacinas britânico” e “farmacologista reformado”. Mas será mesmo assim?
Quando Michael Yeadon se pronunciou publicamente contra as medidas de contenção da pandemia, as suas declarações – na altura extremamente controversas – circularam na internet, dizendo-se que seriam do “vice-presidente da Pfizer”. No entanto, apesar de Yeadon ter, efectivamente, trabalhado durante vários anos naquela farmacêutica alemã, o cargo que alguns internautas lhe atribuíram nunca foi seu. Este cientista foi, na realidade, vice-presidente do departamento de investigação de alergias e doenças respiratórias daquela empresa entre 2006 e 2011.
Mike Yeadon
Fora da Pfizer, Michael Yeadon co-fundou e foi presidente da Ziarco, uma empresa de biotecnologia entretanto adquirida em 2017 pela farmacêutica suíça Novartis, num contrato inicialmente fechado por 325 milhões de dólares (cerca de 300 milhões de euros), mas que previa pagamentos suplementares em função de objectivos. O negócio acabou por ser um fiasco para a farmacêutica suíça, com um prejuízo de 485 milhões de dólares assumido em 2020, porque o fármaco desenvolvido pela Ziarco para o tratamento de eczema nunca obteve autorização de comercialização.
O prestígio de Yeadon foi também diminuindo, nos últimos três anos, por força da “classificação” pela imprensa mainstream de ser ele um “activista anti-vacinas”, após as suas críticas contra as medidas de combate à covid-19.
Em Outubro de 2020, este cientista chegou a defender que a pandemia no Reino Unido “tinha terminado” e que “não haveria uma segunda vaga de infecções”, pelo que as vacinas seriam desnecessárias. Estas declarações chegaram a ser alvo de uma análise do jornal português Polígrafo em Fevereiro de 2021, que lhe atribuiu a classificação de “pimenta na língua”.
Além de se pronunciar contra as máscaras e confinamentos, Yeadon pôs também em causa a segurança das vacinas contra a covid-19, alegando que poderiam provocar infertilidade nas mulheres.
PETER McCULLOUGH
Cardiologista norte-americano, aos 60 anos Peter McCullough tem um currículo extenso. Formado em 1984 em Ciência pela Universidade de Baylor, uma década depois completou um mestrado em Saúde Pública na Universidade do Michigan, onde estudou Epidemiologia.
Entre 2010 e 2013, McCullough ocupou cargos executivos no hospital St. John Providence, no Estado do Michigan, e, posteriormente, na especialidade de Medicina Interna do Centro Médico da Universidade de Baylor, no Texas, onde permaneceu até Fevereiro de 2021.
Depois, exerceu como cardiologista clínico na Heart Place, o maior grupo em prestação de cuidados cardiovasculares no norte do Texas. Desde Agosto passado, ocupa o cargo de director científico da The Wellness Company, sediada em Miami.
Peter McCullough
Tal como sucedeu com Robert Malone, devido às suas posições contrárias à gestão da pandemia, o cardiologista teve a sua conta do Twitter suspensa antes da compra por Elon Musk. Com a nova administração da rede social, a sua conta foi reactivada e McCullough tem já mais de 800 mil seguidores.
McCullough, que tem no seu perfil uma imagem onde se lê “Corageous Discourse [Discurso Corajoso]” não se tem, de facto, coibido, seja em entrevistas, conferências ou nas redes sociais, de manifestar as suas opiniões controversas em relação à vacinação contra a covid-19.
No início deste ano, esteve no programa (recentemente suspenso) de Tucker Carlson, no canal conservador Fox News, para falar do misterioso aumento de problemas do foro cardíaco entre jovens atletas. Foi, também entrevistado por Joe Rogan para o seu podcast, em Dezembro de 2021, e até pelo polémico Steve Bannon em Julho do ano passado.
O médico já esteve em Portugal, onde participou no Congresso Internacional sobre Gestão de Pandemias que ocorreu em Fátima em Outubro passado.
Conotado com o “populismo de extrema-direita”, o partido, do qual Anderson faz parte desde a sua fundação, há 10 anos, segue a linha habitualmente associada a este espectro ideológico: tendencialmente nacionalista, crítico da União Europeia, e apologista de restrições mais apertadas à imigração.
Em Dezembro de 2021, Anderson foi uma entre seis eurodeputados a sofrerem sanções do Parlamento Europeu (PE), por se ter recusado mostrar o certificado de vacinação contra a covid-19 para entrar na sede desta instituição. A penalização de Anderson não foi, contudo, das mais pesadas: apenas perdeu as regalias de parlamentar por dois dias.
Christine Anderson
Outro momento em que a conduta da eurodeputada destoou ocorreu em Novembro do ano passado, quando se recusou a denominar o regime de Vladimir Putin como “terrorista”. A resolução, considerada sobretudo um gesto simbólico, teve a aprovação da esmagadora maioria (um total 494), mas Anderson, ao lado de 57 outros eurodeputados, rejeitou atribuir aquela designação à Rússia, e votou contra. A eurodeputada e mais seis membros do seu partido foram os únicos políticos alemães a assumir esta posição.
No seu país, Anderson é figura polémica, somando controvérsias e sendo acusada de ser simpatizante do PEGIDA – sigla para “Patriotic Europeans Against the Islamization of the West” –, um movimento político conhecido pela sua hostilidade ao islamismo e à forte rejeição de refugiados e imigrantes.
Em Fevereiro deste ano, Christine Anderson chegou a ser, de forma indirecta, alvo de um comentário condenatório do primeiro-ministro canadiano Justin Trudeau, que considerou que o Partido Conservador do Canadá “devia explicações” depois de três dos seus membros terem aparecido ao lado da eurodeputada alemã numa fotografia, que se tornaria viral.
JIMMY LEVY
Cantor norte-americano, inicialmente de gospel, agora com 25 anos, Jimmy Levy já era um influencer antes da sua participação na 18ª edição do programa American Idol, estreado em Fevereiro de 2020, lhe conferir maior visibilidade.
Depois da sua breve passagem pelo concurso televisivo, Jimmy Levy lançou duas músicas com uma forte mensagem de contestação, em parceria com o rapper Hi-Rez, intituladas “This is a War” e “Welcome to the Revolution”, esta última com uma evidente mensagem de alerta para a segurança das vacinas contra a covid-19. Juntas, as duas músicas somam mais de seis milhões de visualizações no Youtube.
Contudo, o Instagram é a rede social onde Levy tem um maior número de seguidores, totalizando mais de um milhão.
Jimmy Levy
Nas suas plataformas digitais, o jovem artista partilha frequentemente opiniões de cariz político, tendo já criticado, em várias ocasiões, a vacinação contra a covid-19, bem como outras medidas “progressistas”, como a sexualização das crianças.
Durante as eleições presidenciais do Brasil no início deste ano, Levy declarou-se um devoto apoiante de Jair Bolsonaro e condenou o tratamento que os manifestantes contra Lula da Silva receberam em Brasília. Na internet, circula uma fotografia sua com um chapéu em que se lê “Lula Ladrão seu lugar é na prisão”.
O músico chegou a encontrar-se com Bolsonaro, junto do qual tem fotografias e vídeos que partilhou nas redes sociais. A sua voz activa em defesa do antigo presidente brasileiro colocou-o na mira de alguns órgãos de comunicação brasileiros.
Judeu, diz ter sido salvo pela fé, depois de “múltiplas tentativas de suicídio” desde a sua adolescência. Nos últimos meses, começou a promover encontros de culto para “adorar Yeshua”, nos quais canta. Num recente episódio, chegou até a ser retido e expulso pela polícia.
MORGAN C. JONAS
No seio do movimento Global Walkout, o australiano Morgan C. Jonas, de 38 anos, é a personalidade mais próxima da líder Monica Smit. Na verdade, os dois activistas estão noivos.
No seu site oficial, Jonas revela que a desconfiança sobre o poder político começou a brotar durante a campanha presidencial de Donald Trump, em 2016. Na altura, era dono de uma empresa de equipamentos para desportos de combate, e os discursos de Trump fizeram-no repensar o seu modelo de negócio, sustentado sobretudo em importações, outsourcing e produção no estrangeiro, algo que contribuiria para o progressivo enfraquecimento do sector industrial.
Morgan C. Jonas
Para si, esse foi o ponto de viragem. A partir daí, cresceu em Jonas a vontade de empreender uma mudança, expondo “políticos corruptos” e “as suas más acções”.
Esse desejo culminou na organização de um comício em 2019, cujo alvo era Daniel Andrews – o primeiro-ministro do Estado australiano de Victoria, onde Jonas reside, na cidade de Melbourne. Na altura, o principal objectivo era denunciar os “perigosos” acordos comerciais com o Partido Comunista Chinês.
Com a pandemia de covid-19, Morgan C. Jonas lançou o “MCJ Report”, um programa com conteúdos noticiosos da sua autoria, somando conflitos com as autoridades. Em Setembro do ano passado fundou o Freedom Party of Victoria, com resultados modestos nas eleições para a Assembleia legislativa (1,71%).
ALEXANDER TSCHUGGUEL
O austríaco Alexander Tschugguel, que completa 30 anos em Junho, é um dos mais jovens propulsores do Global Walkout, sendo conhecido por protagonizar actos de protesto impetuosos e suis generis.
Por exemplo, em 2019, para combater o “paganismo”, liderou um grupo de manifestantes que roubou estátuas indígenas em madeira, de mulheres nuas e grávidas, expostas dentro da Igreja de Santa Maria em Traspontina, perto do Vaticano, e atirou-as ao Rio Tibre. E assumiu o acto no YouTube, na página do Instituto São Bonifácio, que se assume como “plataforma para apoiar a luta pela fé católica e defender essa fé quando e onde for necessário”.
Alexander Tschugguel
Descendente de uma família austríaca abrasonada da região de Bolzano, em Itália, Tschugguel é o arquétipo do conservador. Baptizado na doutrina protestante de Lutero, converteu-se ao catolicismo, aos 15 anos, regressando a uma tradição que tinha atravessado todos os seus antepassados, mas “quebrada” pelo seu bisavô.
Um ano depois, juntou-se uma organização política de carácter católico e conservador originária do Brasil, a “Tradição, Família e Propriedade” e, desde então, tem sido um fervoroso defensor dos valores católicos e tradicionais: opõe-se ao aborto, ao casamento homossexual, à União Europeia, e é avesso às políticas climáticas.
Em 2013, foi também um dos fundadores do partido conservador e eurocéptico Die Reformkonservativen, que cessou a actividade em 2016.
Em 2019, Alexander Tschugguel organizou também um protesto que consistia em orar, junto à catedral de Santo Estêvão, em Viena, que estava naquele momento a ser palco de um evento anual de angariação de fundos para campanhas de sensibilização para o HIV.
MICHAEL J. MATT
Jornalista norte-americano, Michael J. Matt combate, nas suas próprias palavras, “lunáticos e hereges” desde 1996. Após o falecimento do seu pai, Walter Matt, em 2002, assumiu o seu lugar como editor do The Remnant, um jornal norte-americano católico tradicionalista fundado em 1967.
Matt é, também, produtor da Remnant TV, uma plataforma que pretende ser “rival” do Youtube e onde apresenta o seu próprio programa.
Extremamente crítico do pontificado do Papa Francisco, opõe-se às mudanças na Igreja Católica, sobretudo daquelas tomadas a partir do chamado Concílio Vaticano II, em 1962. Na versão digital do seu jornal, defende que “tem lutado contra esta revolução na Igreja há mais de quarenta anos, tal como tem lutado contra os erros que infectam o Estado moderno – o liberalismo, socialismo, comunismo, a Nova Ordem Mundial, uma cultura de juventude degenerada, a epidemia de abortos, eutanásia, educação sexual”.
Michael J. Matt
O legado do “jornalismo católico”, herdado por Michael J. Matt através da sua família, remonta a várias gerações atrás. Foi o seu pai que criou The Remnant, depois de uma contenda com o seu irmão (o tio de Michael J. Matt), Alphonse Matt, com quem conduzia, até então, o The Wanderer, o jornal católico mais antigo do país, fundado em 1867 no Estado do Minnesota.
O The Remnant tem sido apelidado por alguns grupos – católicos ou de direitos civis, como o Southern Poverty Law Center, uma organização sem fins lucrativos – como “radical” e “reaccionário”, e acusado de “antisemitismo”.
No Twitter, Michael J. Matt tem mais de 32 mil seguidores, e o canal de Youtube do jornal conta com 262 mil subscritores.
AMANDA FORBES
Embora seja um dos principais rostos do Global Walkout, a canadiana Amanda Forbes é pouco conhecida publicamente. As causas que abraça dizem respeito sobretudo à “liberdade médica”, e à liberdade de escolha e consentimento informado nas políticas de vacinação.
Amanda Forbes
Integrou ainda a organização sem fins lucrativos Vaccine Choice Canada, fundada em 2014.
Amanda Forbes é também presidente da Children’s Health Defense Canadá e co-fundadora da Freedom Organization, que promove conferências sobre saúde.
As investigações ao mundo dos negócios dos media mainstream por parte do PÁGINA UM, desde a sua criação, revelaram cedo as ligações entre a Gaiurb, o município de Gaia, a Global Media e Domingos de Andrade, o jornalista-administrador globetrotter da Global Media. O processo em curso instaurado pelo Ministério Público, no âmbito da Operação Babel, por favorecimento em abordagens noticiosas, arrisca mudar o panorama dos contratos promíscuos entre a imprensa e entidades públicas, até agora sem controlo do regulador dos media (ERC) e dos jornalistas (CCPJ).
A promiscuidade entre a Global Media – detentora dos periódicos Jornal de Notícias e Diário de Notícias e da rádio TSF – e a autarquia de Vila Nova de Gaia, agora alvo de um processo intentado pelo Ministério Público, começou a ser denunciada pelo PÁGINA UM em Dezembro de 2021.
De acordo com notícia de hoje da Lusa, um despacho do Departamento de Investigação e Ação Penal Regional do Porto (DIAPRP) revelou que o Ministério Público acusa o presidente da edilidade socialista, Eduardo Vítor Rodrigues, de ter determinado “a outorga pelo Conselho de Administração da Gaiurb, de modo arbitrário, sem qualquer requisição de despesa, manifestação de necessidades ou proposta de contratação de serviços e/ou fornecimentos de bens emanada pelos respetivos serviços, contratos públicos com o Grupo Global Media“.
Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Gaia.
O objectivo: garantir a chamada “boa imprensa”, como se pode constatar na leitura do Jornal de Notícias que incidem sobre Gaia e o seu presidente. Aliás, Eduardo Vítor Rodrigues é um colunista regular daquele diário nortenho, tendo começado a publicar artigos de opinião desde Junho de 2020. Já escreveu 60 artigos.
Revelava-se então que a Gaiurb – com competência na gestão urbanística e habitacional de Gaia – realizara três contratos com empresas da Global Media (num total de 465.000 euros). Todos os contratos tinham sido realizados por ajuste directo, sem visto prévio do Tribunal de Contas, e contra o código de contratos públicos.
Com a Global Media, a Gaiurb estabeleceu um primeiro contrato ainda em Dezembro de 2020 para o evento “Praça de Natal Jogos Santa Casa em Gaia”, que incluía a sua divulgação “junto da imprensa e outros meios de comunicação social”. O valor do contrato foi fixado em 195.000 euros.
Director da TSF e com funções de topo na coordenação de jornalistas em mais outros quatro órgãos de comunicação social, Domingos de Andrade participa activamente na gestão empresarial de oito empresas do Grupo Global Media. A promiscuidade entre informação e negócios só lhe custou 1.000 euros num processo instaurado (mas escondido) pela CCPJ, mantendo-se como jornalista acreditado.
No dia 3 de Dezembro de 2021, o contrato foi renovado, com o mesmo fim, e pelo mesmo valor. No ano de 2020 ainda se apontavam os motivos para o ajuste directo: “não existe alternativa ou substituto razoável” e “inexistência de concorrência”. No segundo contrato nada se refere.
Estes dois contratos comerciais foram assinados por Domingos de Andrade, então simultaneamente administrador e director de conteúdos da Global Media e director da TSF, algo que o Estatuto do Jornalista considera incompatível. Este administrador e também director de diversas publicações da Global Media viria a ser alvo de um processo de contra-ordenação por parte da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) – por assinar contratos comerciais ao mesmo tempo que era director editorial e jornalista –, mas que redundou apenas numa multa de 1.000 euros.
O PÁGINA UM tem tentado aceder ao processo instaurado contra Domingos de Andrade desde o ano passado, mas o Secretariado da CCPJ – constituído pelos jornalistas Licínia Girão e Jacinto Godinho – têm ostensivamente recusado, numa clara violação da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos.
Um outro contrato do grupo Global Media com a Gaiurb foi concretizado em 29 de Março de 2021 com a TSF – através da sua empresa Rádio Notícias – por ajuste directo para a produção de 26 episódios semanais, emitidos aos microfones entre Abril e Outubro. Apresentado como sendo uma “parceria TSF/ Gaiurb”, o programa foi intitulado “Desafios do Urbanismo”, e envolveu um pagamento de 75.000 euros, tendo sido conduzido por um jornalista Miguel Midões, mas sem liberdade editorial.
De facto, este contrato comercial – que possui, em nome da Global Media, a assinatura do jornalista Afonso Camões, o que constitui uma função incompatível nesta profissão – estipulava, na prática, uma subordinação editorial da TSF perante a Gaiurb.
Por exemplo, o ponto 1 da cláusula 5ª determinava que “o prestador de serviços obriga-se a entregar à Gaiurb, EM [empresa municipal] os produtos, serviços e conteúdos informativos a aplicar na execução do contrato, de acordo com as características, especificações e requisitos previstos no anexo ao Caderno de Encargos, que dele fazem, parte integrante”.
Mais recentemente, em Dezembro passado, houve novo contrato para a promoção das festas natalícias de Gaia, subindo o valor para 215.000 euros. Sempre por ajuste directo.
Mas as relações promíscuas entre a Global Media e entidades públicas, sobretudo autarquias, não se circunscrevem a Vila Nova de Gaia.
No ano passado, o PÁGINA UM detectou uma dezena e meia de contratos com entidades públicas assinados pela Global Media desde 2020. De entre estas estão, além da de Vila Nova de Gaia, as autarquias (ou empresas municipais) de Lisboa, Cascais, Valongo, Barreiro, Feira, Matosinhos, Aveiro, Viana do Castelo, Setúbal, Estarreja, Gondomar e Amarante, conforme o PÁGINA UM revelou em Maio do ano passado.
Embora estes contratos tenham, quase sempre, como objecto a promoção de eventos, na verdade acabam por ser uma oportunidade de promover políticos, uma vez que são publicados textos ou programas onde não fica absolutamente nada claro que se está perante uma prestação de serviço.
Em muitos casos detectados pelo PÁGINA UM, os jornalistas escrevem notícias condicionadas ao cumprimento dos cadernos de encargos, e até os directores editoriais da Global Media participam activamente nos eventos, sobretudo através da moderação de conferências que também estão estabelecidas nos contratos e onde os convidados são previamente indicados por quem paga. São os casos de Domingos do Amaral, como director da TSF, de Rosália Amorim, como directora do Diário de Notícias, de Joana Petiz, directora do Dinheiro Vivo, e de Inês Cardoso, directora do Jornal de Notícias.
Estas promiscuidades são já sobejamente conhecidas pela Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas e pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social, mas sem consequências. A intervenção do Ministério Público pode vir a mudar este modus operandi que mina a credibilidade do jornalismo – até por não ser um exclusivo da Global Media.
Apesar das evidências, em comunicado divulgado hoje, a administração da Global Media garantiu que os seus profissionais “exercem as suas funções com total respeito pelas normas deontológicas do jornalismo, preservando a independência e a separação dos compromissos comerciais assumidos com entidades externas, honrando a importância das suas marcas já centenárias no panorama dos media em Portugal”.
E ainda dizem que “dentro da Comissão Executiva da GMG [Global Media] são claras as separações de funções entre as áreas comercial, financeira e editorial”, o que não corresponde à verdade.
De acordo com o Portal da Transparência da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), Domingos de Andrade é director tanto da TSF como da Rádio Jovem de Évora e da Rádio Caldas, tendo também uma crónica regular no Jornal de Notícias. Surge também nas fichas técnicas dos jornais O Jogo e Jornal de Notícias como director-geral editorial. Até Julho do ano passado ainda acumulava o cargo de director-editorial do Diário de Notícias.
Rosália Amorim, directora do Diário de Notícias. Responsáveis editoriais da Global Media colaboram activamente na execução de contratos comerciais por vezes com cláusulas de subordinação e de confidencialidade.
No entanto, apesar de deter estas responsabilidades jornalísticas de topo, que implicam a definição das linhas editoriais e a coordenação de equipas de jornalistas, Domingos Andrade ainda se ocupa, qual globetrotter dos media, em funções de gestão executiva, incluindo obviamente as áreas comerciais, sendo gerente de quatro empresas (Difusão de Ideias, Lda.; Pense Positivo, Lda.; Rádio Comercial dos Açores, Lda.; TSF – Rádio Jornal Lisboa, Lda.) e de vogal do Conselho de Administração em mais outras quatro empresas (TSF – Cooperativa Rádio Jornal do Algarve; Açormédia – Comunicação Multimédia e Edição de Publicações; Global Notícias – Media Group; e Rádio Notícias – Produções e Publicidade). Todas são do universo do Grupo Global Media.
Mas o comunicado da Global Media, querendo ignorar estes factos públicos, ainda acrescenta que “os diretores das respetivas marcas (…) têm, como não poderia deixar de ser, total autonomia editorial e de gestão de recursos”.
Ainda em plena pandemia da covid-19, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou uma nova emergência sanitária em redor do surto de uma doença viral já conhecida desde 1957. Em Portugal, os primeiros casos foram detectados em 18 de Maio do ano passado. Um ano depois, a “montanha pariu um rato”: 953 casos; e apenas uma morte, segundo o Ministério da Saúde, ou nenhuma morte, segundo a OMS.
Foi apresentada como uma ameaça pandémica, ainda longe estava a pandemia da covid-19 da fase de “rescaldo”. Há um ano, no dia 18 de Maio de 2022, o vírus causador de uma doença denominada Monkeypox (varíola-dos-macacos) – entretanto rebaptizada como Mpox – causava apreensão, e a Direcção-Geral da Saúde (DGS) começava a apresentar relatórios diários sobre a evolução dos casos em Portugal, na linha das preocupações transmitidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Por exemplo, nesse dia, a CNN Portugal salientava que os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos afirmava que os relatos chegados de África indicavam que “a varíola dos macacos causou a morte a uma em cada dez pessoas que ficaram doentes”, acrescentando ser “uma taxa alta [10% de letalidade], mas ainda assim bastante abaixo da varíola comum, que antes de ser considerada erradicada, por meio da vacina, matava cerca de 30% dos doentes, segundo dados da Organização Mundial de Saúde”.
Mas, na verdade, a evolução mundial da Mpox – mesmo se apenas há uma semana deixou de ser emergência internacional de saúde pública – ficou muito aquém das previsões mais catastrofistas. De acordo com o mais recente relatório da OMS, foram reportados 87.377 casos positivos de Mpox até 8 de Maio deste ano, envolvendo 111 países, que resultaram em 140 óbitos. Ou seja, uma taxa de letalidade de 0,16%.
Contudo, mesmo sendo globalmente já bastante baixas, as taxas de letalidade foram muito distintas entre continentes e países. Em África registaram-se 18 mortes em 1.587 casos positivos, uma taxa de letalidade de 1,13%, enquanto na Europa essa taxa foi de 0,02%, que correspondeu a seis óbitos decorrentes de 25.891 casos positivos.
Os cinco países com maior número de óbitos foram os Estados Unidos (com 42 óbitos e uma taxa de letalidade de 0,14%), México (com 26 óbitos e uma taxa de letalidade de 0,65%), Peru (com 20 óbitos e uma taxa de letalidade de 0,53%), Brasil (com 16 óbitos e uma taxa de letalidade de 0,15%) e Nigéria (com 9 óbitos e uma taxa de letalidade de 1,08%). Apesar do alarme global, apenas houve registo de mortes em 20 países, dos quais oito contabilizando um óbito.
De acordo com este relatório da OMS, na Europa (incluindo Israel) apenas foram reportadas três mortes em Espanha, duas na Bélgica e uma na República Checa. Sobre Portugal, a OMS aponta zero mortes em 953 casos.
Esta informação não coincide, porém, com a transmitida ao PÁGINA UM por fonte oficial do Ministério da Saúde, que salienta ter ocorrido “em Abril de 2023, um caso fatal num indivíduo com comorbilidade a condicionar imunodepressão grave, que apresentou uma evolução rara da Mpox para uma forma progressiva e disseminada”.
Ontem, o Ministério da Saúde destacou que “o controlo desta epidemia só foi possível pela pronta resposta a nível nacional, nomeadamente em termos de diagnóstico clínico e laboratorial da infeção, reforçando-se a cooperação entre os organismos do Ministério da Saúde e as associações de base comunitária.”
No comunicado do Ministério da Saúde, é apresentada uma citação da secretária de Estado da Promoção da Saúde, Margarida Tavares, que destaca que “o trabalho com as comunidades em maior risco e a rápida partilha de informação e boas práticas entre os países mais afetados foi crucial”, acrescentando que isso “permitiu dar novos passos na preparação dos sistemas de saúde para a vigilância e intervenção face a doenças infeciosas emergentes, realidade que as alterações climáticas e maior circulação de pessoas torna hoje mais premente”.
O Ministério da Saúde diz também que “foi possível interromper as cadeias de transmissão, através do diagnóstico, sensibilização e, posteriormente, através da vacinação”. Segundo o Ministério da Saúde, “numa primeira fase, a vacina foi oferecida a pessoas que tinham tido contacto com alguém infetado, com posterior alargamento a outros indivíduos em maior risco”, abrangendo até ao final da semana passada 3.554 indivíduos, a maioria na região de Lisboa e Vale do Tejo.
Esta operação não terá tido encargos públicos. Fonte do Ministério de Manuel Pizarro informou o PÁGINA UM que “Portugal recebeu até à data um total de 11.460 doses da vacina, todas doadas no âmbito da aquisição conjunta por parte da Autoridade Europeia de Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias”.
Desde 2019, em cada ano, morreram menos de três bebés com menos de um ano em cada 1.000 nascimentos. Apesar de uma ligeira subida entre 2021 e 2022, nunca em Portugal se registara quatro anos consecutivos com a fasquia abaixo deste nível. Em 1970, a taxa de mortalidade infantil era 22 vezes superior. Médicos ouvidos pelo PÁGINA UM confirmam desempenho que coloca Portugal no Primeiro Mundo, mas lançam alertas para o futuro, sobretudo com a comunidade estrangeira ainda sem acompanhamento médico adequado e com a opção de partos fora dos hospitais.
Quatro anos consecutivos com menos de três mortes de bebés com menos de um ano de idade por cada 1.000 nascimentos – este é o melhor desempenho de sempre do indicador da mortalidade infantil em Portugal, de acordo com a série de dados entre 1970 e 2022, disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
O primeiro ano em que Portugal conseguira ficar abaixo dos três óbitos por mil nascimentos foi em 2010, tendo repetido em 2013, 2014, 2015, 2017 e depois, paulatinamente, a partir de 2019. Nos dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021) até se conseguiram os melhores desempenhos: 2,44 e 2,43, respectivamente.
Sendo certo que a mortalidade infantil em 2022 subiu ligeiramente face a 2021, não existem, na verdade, motivos para fazer soar os alarmes, porque será humana e tecnologicamente impossível reduzir indefinidamente a mortalidade infantil.
Actualmente, os valores colocam Portugal no pelotão da frente a nível mundial neste importante indicador que, além de representar vidas humanas, separa indelevelmente os países desenvolvidos daqueles que estão bastante atrasados em termos de desenvolvimento.
Além disso, este indicador mostra uma evolução extraordinária numa geração: em 1970, a mortalidade infantil era cerca de 22 vezes superior: morriam então mais de 55 bebés em cada 1.000 nascimentos, ou seja, 5,5%. A partir da década de 80 do século passado, o indicador passou a estar abaixo dos 20, descendo para menos de 10 em 1.000 nascimentos nos anos 90. No presente século, apenas num ano (2002) se superou os 5 óbitos por 1.000 nascimentos, estando os valores da última década entre os 2,44 (em 2020) e os 3,24 (em 2016).
Vários factores têm contribuído para o caminho que levou o país a uma redução tão acentuada da mortalidade infantil. “Melhorou o acesso a cuidados de saúde primários; houve uma maior vigilância de grávidas; e mais partos no hospital” destacou, ao PÁGINA UM, Miguel Oliveira e Silva, ginecologista-obstetra no Hospital de Santa Maria e professor catedrático de Ética Médica na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
Evolução da taxa de mortalidade infantil (óbitos por mil nascimentos) entre 1970 e 2022. Fonte: INE.
Este médico considera que os actuais indicadores são “positivos e encorajadores”, mas, apesar de acreditar que se pode reduzir ainda mais a mortalidade infantil em Portugal, defende que “não se pode esperar uma redução a zero”. “Haverá sempre algumas mortes”, apontou.
Para este especialista, que também já foi presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, há porém questões fundamentais a resolver no sector da Saúde Pública. “Preocupa-me que 1,5 milhões de portugueses não tenham ainda acesso a cuidados de saúde primários, não têm médico de família. Isso pode afectar a vigilância de grávidas por terem dificuldade de acesso a cuidados de saúde.”
Este problema incide, em particular, à comunidade imigrante, sobretudo os que são oriundos de países asiáticos, como a Índia, o Bangladesh ou o Paquistão. “Além da questão da língua, porque não falam português e alguns mal falam inglês, não têm também acesso a cuidados de saúde primários; e, aliás, estamos muito longe disso”, lamenta Miguel Oliveira e Silva.
Também Maria Paula Arteaga, directora do serviço de obstetrícia do Hospital dos Lusíadas, está preocupada com as perspetivas futuras. Sendo especializada em Medicina Materno-Fetal e Obstetrícia de Alto Risco, releva o aumento da mortalidade infantil em 2022 face a 2021, mas também de mães.
Esta responsável salienta que, desde a década de 70, “a medicalização dos partos fez melhorar muito” o nível de mortalidade de mães e bebés, bem como a universalização do Plano Nacional de Vacinação. E considera que, apesar de tudo, se assiste actualmente a algum retrocesso que pode resultar num aumento futuro dos níveis de mortalidade infantil e materna.
“Por um lado, há muito mais mulheres de risco (a serem mães), mais velhas e com mais comorbilidades. A média de idades das mães nos partos ronda os 37 anos. Há mais mães com patologias e, portanto, mais gravidezes com patologias.”, destaca Maria Paula Arteaga.
Além disso, a médica obstetra lamenta que estejam a “aumentar os partos não medicalizados, os partos em casa”, considerando-os “um risco enorme”. “O parto em si é um risco. Uma mulher pode morrer de hemorragia pós-parto”, relembra ao PÁGINA UM. “Se antes, havia um excesso de medicalização do parto, agora caiu-se no extremo: temos telemóveis, Internet e Chat GPT, mas quer-se fazer partos como em África. Não faz sentido”, desabafa.
Para Maria Paula Arteaga “devem existir normas e deve haver um meio-termo: não é medicalizar os partos, nem é cair no outro extremo”.
É uma modalidade cada vez mais usada por empresas privadas, mas agora também por autarquias: as parcerias comerciais com grupo de comunicação social. Consegue-se cobertura mediática, sempre favorável, e até entrevistas e convites para integrar conselhos estratégicos. E talvez mesmo a parte mais apetecível: acabam-se com as notícias negativas e com investigações jornalísticas aos sempre nebulosos processos de autorização urbanística. O PÁGINA UM mostra como, nos últimos três anos, a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia usou contratos com três grupos de media para transmitir uma mensagem idílica do urbanismo daquele concelho nortenho. Não é caso único, como o PÁGINA UM revelará nas próximas semanas.
Nos últimos anos, a autarquia de Vila Nova de Gaia tem sido uma das mais activas na contratação de serviços aos grupos de comunicação social, através de parcerias comerciais com a participação de jornalistas numa promiscuidade que põe em causa a independência na cobertura noticiosa. E, obviamente, na descoberta e denúncia de processos de legalidade duvidosa, que sempre foram o apanágio de uma comunicação social independente.
De acordo com um levantamento do PÁGINA UM no Portal Base, desde 2020 o município liderado pelo socialista Eduardo Vítor Rodrigues, sobretudo através da Gaiurb – que tem a gestão do sector da habitação, do urbanismo e do planeamento, incluindo a revisão do Plano Director Municipal – assinou oito contratos de parcerias jornalistico-comerciais com três grupos de media: Público, Global Media (Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF) e Cofina (Correio da Manhã e Jornal de Negócios).
Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Gaia.
O montante de maior dimensão foi entregue à Global Media, de Marco Galinha. Em 2020, a Gaiurb – que em finais de 2021 fechou as contas com um passivo de 7,1 milhões euros – estabeleceu um primeiro contrato para o evento “Praça de Natal Jogos Santa Casa em Gaia”, que incluía a sua divulgação “junto da imprensa e outros meios de comunicação social”. O valor do contrato foi fixado em 195.000 euros.
Um ano mais tarde, no dia 3 de Dezembro de 2021, o contrato foi renovado, com o mesmo fim, e pelo mesmo valor. Em Dezembro passado, novo contrato, subindo o valor para 215.000 euros. Sempre por ajuste directo.
Mas houve mais contratos da Gaiurb fora do âmbito deste evento natalício. Em Novembro de 2021, foi feito por 19.990 euros, e também por ajuste directo, uma “aquisição de serviços de comunicação”. Nada mais se sabe porque nem sequer foi reduzido a escrito o contrato, através de uma interpretação muito abrangente do Código dos Contratos Públicos.
Um outro contrato do grupo Global Media com a Gaiurb foi concretizado em 29 de Março de 2021 com a TSF – através da sua empresa Rádio Notícias – por ajuste directo para a produção de 26 episódios semanais, emitidos aos microfones entre Abril e Outubro. Apresentado como sendo uma “parceria TSF/Gaiurb”, o programa foi intitulado “Desafios do Urbanismo”, e envolveu um pagamento de 75.000 euros, tendo sido conduzido por um jornalista Miguel Midões (CP 4707), mas sem liberdade editorial.
Quanto ao Público, foi estabelecido em Abril de 2021 – mas apenas publicado sete meses depois no Portal Base – um contrato para o desenvolvimento de um projecto jornalístico de podcasts denominado “Conversas Urbanas”, no valor de 64.500 euros.
Este contrato concretizou-se através de 16 podcasts numa rubrica intitulada “Conversas Urbanas”, assumida pelo Público como tendo o “apoio da Gaiurb”. Saliente-se, contudo, que esse apoio, em concreto, foi exclusivamente monetário, ou seja, uma prestação de serviços de âmbito comercial. Este programa, financiado pela Gaiurb, consistiu sobretudo em entrevistas com especialistas em urbanismo, conduzidas pela jornalista Ana Isabel Pereira e pelo director-adjunto David Pontes, que no próximo mês assume a função de director do jorna detido pela Sonae.
Por fim, os contratos da Cofina. O primeiro foi assinado em 10 de Novembro de 2020, e o único pormenor conhecido, além do valor do ajuste directo (53.000 euros), é que serviu para promover o projecto Meu Bairro, Minha Rua durante 20 dias.
A única referência que o PÁGINA UM encontrou em órgãos de comunicação social da Cofina sobre este projecto foi um vídeo, já inactivo, no Correio da Manhã, na secção de conteúdos pagos denominada C-Studio CM. Na sua página do Facebook, a Gaiurb informa que existiriam quatro vídeos, mas apenas divulgou o primeiro, em 3 de Julho daquele ano.
Mais recentemente, em 19 de Outubro do ano passado, a Cofina assinou um contrato de 19.900 euros denominado “aquisição de serviços de promoção de Gaia Município Sustentável para o Município de Vila Nova de Gaia, no âmbito da atribuição do Prémio Nacional de Sustentabilidade”.
Para além de custear a realização de um ciclo de três conferências temáticas, uma das quais obrigatoriamente em Vila Nova de Gaia, este contrato serviu para se conseguir um “convite ao Presidente da Câmara de Gaia [Eduardo Vítor Rodrigues] para integrar o Conselho Estratégico do Negócios Sustentabilidade]”, bem como uma entrevista que acabou por ser transformada num depoimento e artigo noticioso do Jornal de Negócios de 25 de Outubro do ano passado.
Extracto do caderno de encargos
A aquisição de serviços pelas autarquias para a elaboração de conteúdos editoriais ou eventos com uma componente de divulgação noticiosa, tem sido uma fórmula cada vez mais seguida pelos media nacionais, como alternativa financeira à queda do mercado publicitário e à “fuga” de leitores.
Porém, a forma como muitos destes contratos são estabelecidos, e as suas cláusulas, levantam fortes suspeições sobre a equidistância necessária entre actividades de marketing e independência jornalística.
Em diversos contratos com cadernos de encargos publicados no Portal Base – o que não sucede com todos – constam claramente cláusulas de confidencialidade. Por exemplo, no caderno de encargos do contrato da autarquia com a Cofina, assinado em Outubro do ano passado, saliente-se que “o prestador de serviços [que engloba os seus jornalistas] deve guardar sigilo sobre toda a informação e documentação, técnica e não técnica, comercial ou outra, relativa ao Município de Vila Nova de Gaia, de que possa ter conhecimento ao abrigo ou em relação com a execução do contrato.”
Acrescenta-se ainda que “a informação e a documentação cobertas pelo dever de sigilo não podem ser transmitidas a terceiros, nem objeto de qualquer uso ou modo de aproveitamento que não o destinado direta e exclusivamente à execução do contrato”, excluindo-se apenas informações que “comprovadamente [sejam] do domínio público à data da respetiva obtenção pelo prestador de serviços ou que este seja legalmente obrigado a revelar, por força da lei, de processo judicial ou a pedido de autoridades reguladoras ou outras entidades administrativas competentes.” E determina mesmo um prazo deste estranho dever de sigilo que engloba jornalistas: dois anos.
Mas além da participação de jornalistas em eventos, e o compromisso de cobertura noticiosa e de entrevistas a autarcas, sempre numa linha muito favorável e até por vezes encomiástica, este tipo de contratos com peso comercial levanta questões éticas muito relevantes, porque pode levar a ponderar sobre a publicação ou não de notícias desfavoráveis sobre uma determinada autarquia.
Não por acaso, ainda recentemente, duas jornalistas do Conselho de Redação do jornal Público que “as dúvidas sobre a separação entre o que são conteúdos jornalísticos e conteúdos comerciais seriam por si só suficientes” para chumbar o nome de David Pontes para director daquele periódico. Saliente-se também que há mais de um ano a Entidade Reguladora para a Comunicação Social está alegadamente a investigar mais de meia centena de contratos entre grupos de media e entidades públicas, em especial autarquias.
Hoje, no 126º episódio de Caramba, ó Galamba, a jornalista Elisabete Tavares fala sobre a forma como os nossos pensamentos e crenças podem ou não moldar a nossa realidade. Todos ouvimos falar em “pensamento positivo” e em “milagres” ou, no inverso, no “fado” e no “destino”. E, como povo: as nossas crenças colectivas moldam o país que temos?
O secretismo tem sido a base do negócio das vacinas contra a covid-19. Contratos com claúsulas confidenciais, assumidas pela Comissão von der Leyen, custos unitários e totais escondidos pelos Governos, e cada vez mais lotes a serem deitados para o lixo por perda de validade. Mas agora que a pandemia foi dada como “extinta” pela Organização Mundial da Saúde, estando agora a covid-19 em fase endémica, os negócios chorudos das farmacêuticas anunciam-se ruinosas para as contas públicas na área da Saúde. Desde 2020, o Governo português já autorizou, através de Resoluções de Conselho de Ministros, gastos de quase 877 milhões de euros para a compra de 40 milhões de doses. Mas, pelas contas do PÁGINA UM, terá de pagar mais 66 milhões de doses, atendendo ao número estimado para Portugal nos denominados Advance Purchase Agreements (APAs), feitos em nome dos Estados-membros pela Comissão Europeia.
Portugal já gastou quase 877 milhões de euros com o processo de vacinação contra a covid-19, mas a factura total deverá superar os 1,6 mil milhões de euros, independentemente de as doses virem a ser administradas.
Embora o Governo queira manter secretos os contratos assinados com as farmacêuticas – estando uma intimação a correr uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, por iniciativa do PÁGINA UM –, as diversas Resoluções de Conselho de Ministros, a última de 15 de Dezembro do ano passado, desvendam já um pouco do véu sobre os sumptuosos gastos para uma operação vacinal sem precedentes, mas que foi perdendo gás nos últimos meses.
Na última semana com dados disponibilizados pela Direcção-Geral da Saúde, entre 15 e 21 de Abril, foram apenas vacinadas 187 pessoas por dia. Na época de Inverno de 2022-2023 apenas se vacinaram cerca de 30% da população total, mas apenas 1% dos menores de 50 anos decidiu tomar a dose de reforço.
Com o final do período de emergência da pandemia, recentemente decretado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), será previsível que a administração das vacinas se circunscreva à população mais vulnerável – os maiores de 65 anos e/ ou pessoas com comorbilidades, tal como sucede com a vacina da gripe –, mas as compras terão de se manter por força dos acordos entre a Comissão von der Leyen e as farmacêuticas.
Ainda antes da aprovação de qualquer vacina, a Comissão Europeia, através de acordos específicos – os denominados Advance Purchase Agreements (APAs) – negociou contratos com cláusulas confidenciais, embora se saiba que foram assumidas compras de até 4,6 mil milhões de doses de vacinas a um custo total estimado próximo de 71 mil milhões de euros, de acordo com o Relatório Especial do Tribunal de Contas Europeu. Ou seja, um custo médio de 15,4 euros.
Ursula von der Leyen estabeleceu acordos secretos e principescos para as farmacêuticas.
Mesmo estando os compromissos assumidos pelo Governo português através da Comissão von der Leyen ainda no segredo dos deuses, como a população do nosso país representa 2,3% da população da União Europeia, a Direcção-Geral da Saúde deverá ter de adquirir um total de cerca de 106 milhões de doses.
Ora, de acordo com informações transmitidas pelo Ministério da Saúde ao jornal Público, entre 2020 e este ano, as farmacêuticas – sobretudo a Pfizer e a Moderna – entregaram apenas cerca de 40 milhões de um total de 61,7 milhões de doses encomendadas e adquiridas para o período até 2023.
Deste modo, Portugal terá ainda de encomendar um pouco mais de 44 milhões de doses, mesmo se não tiver população suficiente a querer vacinas antes daquelas perderem a validade.
Seja como for, e apesar do Governo, ao arrepio de um Estado democrático, esconder intencionalmente os contratos e os compromissos financeiros com as farmacêuticas, sabe-se que, até agora, e pela consulta das diversas Resoluções de Conselho de Ministros, o Governo consignou para a compra de vacinas e aquisição de consumíveis (agulhas, seringas e solventes) um total de 876.892.973 euros.
Ainda durante o ano de 2020, o Governo de António Costa disponibilizou uma verba de 215,5 milhões de euros, através de três diplomas. Ao longo de 2021 foram aprovados pelo Governo mais dois reforços muito substanciais – o primeiro de cerca de 241,5 milhões de euros e o segundo de um pouco mais de 291 milhões de euros.
Por fim, no ano passado, houve mais dois reforços que totalizaram os 128,4 milhões de euros. Estes montantes não incluem os gastos que muitas autarquias tiveram com arrendamento de espaço e contratação de pessoal de enfermagem para os centros de vacinação.
Mas há ainda mais incógnitas: não se sabe quantos dos 877 milhões de euros consignados para o programa vacinal se destinaram especificamente para a compra das vacinas, e se somente estarão pagas as 40 milhões de doses entregues ou também as 21,7 milhões de doses já encomendadas mas não entregues.
Governo já consignou 877 milhões de euros para o programa vacinal contra a covid-19. Ainda vai ter de gastar muito mais mesmo que não haja procura dos portugueses por mais vacinas.
Contudo, certo é que, confirmando-se que Portugal terá de adquirir o equivalente a 2,3% das doses assumidas pela Comissão von der Leyen, proporcional à população comunitária, o custo apenas das vacinas contra a covid-19 deverá ascender aos 1,6 mil milhões de euros. Ou seja, tanto quanto o Governo já autorizou gastar, até agora, na execução do programa vacinal.
Porém, com uma diferença: enquanto até finais de 2022 apenas se deitou ao lixo, uma percentagem pequena de vacinas – o Ministério da Saúde fala numa taxa de inutilização de 8,5% –, a partir de agora, a menos que haja uma renegociação – que nunca poderá a prazer ser desfavorável aos vendedores –, as doses inutilizadas podem superar largamente aquelas que forem administradas. E começa a renascer o espectro do que sucedeu há uma década, com o Tamiflu.
É falso que não haja dados sobre enfartes ou sobre outras quaisquer doenças que afectam os portugueses, e que se mostra impossível saber a evolução. Mesmo se essa “informação” é garantida pelo Expresso, pois trata-se de misinformation. Na verdade, não só há informação detalhada sobre enfartes como de todas as outras doenças na Base de Dados dos Grupos Homogéneos de Diagnóstico, que o Ministério da Saúde está a lutar até ao Supremo Tribunal Administrativo para não permitir o acesso ao PÁGINA UM. Após duas decisões desfavoráveis, no Tribunal Administrativo de Lisboa, em Janeiro passado, e no Tribunal Central Administrativo Sul, o Ministério de Manuel Pizarro luta agora convencer os desembargadores do Supremo Tribunal Administrativo, a derradeira instância, de que o pedido do PÁGINA UM é “manifestamente abusivo”. Repete 11 vezes este argumento para contestar o direito constitucional à informação de um jornal independente.
Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO.
Uma notícia da última edição de Abril deste ano do semanário Expresso era taxativa: “Portugal sem registo do número de enfartes”. No corpo da notícia, Hélder Pereira, presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, explicava que “em Portugal, o registo de casos de enfarte no Registo Nacional de Síndromes Coronários Agudos feito pelos hospitais é voluntário. “Nem metade dos enfartes que acontecem estão registados”, sublinhava.
É assim?
Não, não é verdade. Sendo certo que este registo, gerido pela SPC, peca por defeito, por não ser obrigatório, existe um registo oficial, este sim obrigatório, onde constam todos os doentes admitidos nos hospitais públicos quer sejam por enfartes quer por outros problemas de doenças coronárias. E, enfim, de todas as doenças, acrescido da evolução ao longo do internamento.
Chama-se Base de Dados dos Grupos de Diagnósticos Homogéneos, servindo também como forma de cálculo para financiamento dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde. Os dados, que são anonimizados, permitiriam facilmente – cruzando ainda com as causas da morte do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) – contabilizar ao dia, à semana, ao mês e ao ano a totalidade dos enfartes, e aliás de toda e qualquer doença e afecção.
A quantidade e qualidade da informação presente na Base de Dados dos Grupos de Diagnósticos Homogéneos é, porém, simultaneamente de enorme utilidade para uma adequada política de saúde pública mas sensíveis, se tornados públicos, para um Governo, porque se consegue detalhar, ao pormenor, o desempenho de cada hospital do Serviço Nacional de Saúde. Permite, ao pormenor, detectar evoluções anómalas de determinadas doenças. Permite, ao pormenor, encontrar indicadores de eventuais negligências médicas ou deficientes desempenhos. Permite saber muito.
E é esse “permite saber muito” que faz com que esteja na “mira” do PÁGINA UM há quase um ano, e faz com que a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), a entidade responsável pela gestão da Base de Dados dos Grupos de Diagnósticos Homogéneos, lute encarniçadamente para evitar o seu acesso integral e livre.
Expresso noticiou que não há registos do número de enfartes. Não só dos enfartes como de todas as outras doenças na Base de Dados dos Grupos Homogéneos de Diagnóstico, que o Ministério da Saúde está a lutar até ao Supremo Tribunal Administrativo para não permitir o acesso ao PÁGINA UM.
Mas uma coisa é a vontade política, e a cultura de obscurantismo, e outra a Lei.
A “luta” vai, neste momento, já no Supremo Tribunal Administrativo. Esta semana, o PÁGINA UM teve de contra-alegar no recurso apresentado pela Administração Central do Sistema de Saúde, depois desta entidade tutelada pelo ministro Manuel Pizarro ter tido já duas decisões desfavoráveis. A primeira, em 24 de Novembro do ano passado, através da sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa. A segunda, mais recente, em 23 de Março deste ano, através do acórdão de três desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul.
Mas o Ministério da Saúde não desiste. Nunca desiste nem desistirá da sua cultura de obscurantismo. O chamado “recurso de revisão”, que apresentou através da sociedade de advogados BAS – a mesma que defende o Infarmed a não conceder outra base de dados anonimizada, o Portal RAM (reacções adversas de medicamentos) – é uma peça de antologia, onde se explana a última cartada para convencer a Justiça da bondade de uma entidade que somente quer afastar dos olhos dos cidadãos sobre aquilo que sucede dentro dos hospitais e no interior dos gabinetes das autoridades de saúde.
Neste recurso, entenda-se, está muito em jogo – e a própria Administração Central do Sistema de Saúde não tem papas na língua em assumir: fala até da relevância de uma decisão numa “dimensão social” – uma forma de dizer “dimensão política”, se o Supremo Tribunal Administrativo confirmar a legitimidade do acesso à base de dados.
Victor Herdeiro, presidente da ACSS, quarto a contar da esquerda, durante a sessão de apresentação dos novos Estatutos do SNS em 7 de Julho do ano passado.
Atente-se, por exemplo, a esta passagem crucial no argumentário usado pela sociedade de advogados que defende esta entidade tutelada pelo Ministério da Saúde:
“A capacidade de repercussão social da questão que subjaz aos presentes autos é evidente, designadamente pelo facto de, atualmente, ser possível identificar um vasto número de pedidos de acesso a documentação administrativa que contêm, em regra, dados pessoais, especificamente dados pessoais de natureza clínica, não sendo a ACSS a única entidade objeto de pedidos desta natureza, conforme tem vindo a ser objeto do conhecimento público. Ou seja, os contornos da questão a apreciar nos presentes autos indiciam que a solução a adotar poderá servir de bússola para a apreciação de casos análogos, extravasando, por isso, a esfera das partes aqui envolvidas. Deste modo, a questão a apreciar no presente recurso revela uma especial capacidade de repercussão social, termos em que a utilidade da decisão a proferir por este Supremo Tribunal extravasa tanto os limites do caso concreto como as partes envolvidas no litígio, impondo-se, por isso, um crivo mais exigente na solução a alcançar, justificando-se, nesses termos, e também por tais razões, a admissibilidade do presente recurso de revista.”
Por outras palavras: o Ministério da Saúde está preocupado com os outros processos de intimação em curso intentados pelo PÁGINA UM, sobretudo relacionados com bases de dados de saúde, mesmo se estes são anonimizados ou anonimizáveis – ou seja, impossibilitam a identificação de qualquer pessoa.
Brande um argumento político associado ao argumento da protecção da intimidade das pessoas – que está já protegida pela anonimização – para que, com isso, fiquem protegidos pela sindicância do desempenho do Serviço Nacional de Saúde e das políticas de saúde por parte de uma imprensa independente.
Sentença de Novembro de 2022 e Acórdão de Março deste ano concedem legitimidade ao PÁGINA UM a aceder a uma base de dados anonimizada. ACSS argumenta agora basicamente que o pedido é “manifestamente abusivo”.
No argumentário para “sensibilizar” os conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo, a Administração Central do Sistema de Saúde não se cansa de reputar e repetir, por 11 vezes, que o pedido de acesso à base de dados – que é susceptível de anonimação, conforme um despacho assim o admite – é “manifestamente abusivo”.
Por 11 vezes, não vá, pensará o Ministério da Saúde, os conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo estarem desatentos na leitura de algumas das 26 páginas.
Sim, são 11 vezes, a saber:
1 – “Ora, a realização do interesse público que incumbe à Administração Pública e, neste caso, à ACSS nos termos que vêm previstos na sua Lei Orgânica, determina que não deve a Administração executar tarefas que visem satisfazer pedidos manifestamente abusivos e que, em rigor, contendem diretamente com a prossecução das suas efetivas missões e atribuições, conforme sucede in casu.” (pg. 11)
2 – “A questão basilar, neste caso, é, portanto, a seguinte: será razoável e conforme aos princípios gerais da atividade administrativa, concluir que a Administração Pública e, neste caso, a ACSS, deve ser condenada a satisfazer pedidos manifestamente abusivos que, para além de o serem, se afiguram prescindíveis por já terem sido previamente, in totum, satisfeitos? A resposta parece ser, necessária e indubitavelmente, negativa, à luz, uma vez mais, do princípio da proporcionalidade.” (pg. 11)
3 – “Neste sentido, assume uma inegável relevância social fundamental a delimitação das verdadeiras funções da Administração Pública, sob pena de se admitir, levianamente, que a Administração deve satisfazer todo e qualquer pedido, ainda que manifestamente abusivo e desrazoável, o que não se pode admitir.” (pg. 12)
4 – “A desrazoabilidade da decisão do TCA Sul, inclusive, motivo de espanto da Recorrente, uma vez que, sendo os órgãos jurisdicionais conhecedores diretos do número limitado de meios e da dificuldade inerente à prossecução e concretização das missões e atribuições dos órgãos e entidades que integram a Administração Pública, deles se esperaria um mais adequado juízo acerca da (des)proporcionalidade e (des)razoabilidade de pedidos de acesso a informação que, por se revelarem abusivos e, e[m] rigor, desnecessários, impedem uma eficaz prossecução das aludidas missões e atribuições.” (pg. 13)
5 – “Em suma, tais questões, incidem, fundamentalmente, sobre os seguintes aspetos, manifestamente contrários ao princípio da proporcionalidade: i) o pedido de informação subscrito é manifestamente abusivo, atenta a sua dimensão, bem como a dimensão da anonimização dos dados pessoais que dela constem; ii) o prazo de dez dias concedido à Recorrente para o fornecimento daquela informação com o consequente expurgo dos dados pessoais é manifestamente incompatível com o esforço, os meios e os recursos que aquela tarefa implica; e iii) a informação constante do Portal da Transparência já satisfaz, in totum, a pretensão do aqui Recorrido. Em face do exposto, é cristalina a relevância jurídica e social fundamentais da apreciação do caso dos presentes autos, sendo ainda tal apreciação necessária para uma melhor aplicação do direito, estando, assim, preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade consagrados no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.” (pg. 15)
6 – “Mais acrescenta o n.º 3 do artigo 15.º do mesmo diploma que «[a]s entidades não estão obrigadas a satisfazer pedidos que, face ao seu carácter repetitivo e sistemático ou ao número de documentos requeridos, sejam manifestamente abusivos, sem prejuízo do direito de queixa do requerente». Em face do que antecede e da circunstância de consubstanciar um facto notório que a base de dados GDH contém uma vastidão de informação, designadamente atenta a janela temporal desenhada pelo Recorrido, a conclusão de que tal pedido é desproporcional, desrazoável e excessivamente oneroso para a ACSS decorre, em todo o caso, das regras da experiência comum, conforme já referido em sede de análise da admissibilidade do presente recurso.” (pg. 18)
7 – “Em síntese, a violação do princípio da proporcionalidade manifesta-se na circunstância de não ser razoável condenar a Recorrente na satisfação de um pedido que é, por natureza, manifestamente abusivo, bem como pela circunstância de, mesmo que assim não se entenda, se ter condenado a ACSS a satisfazer tal pedido no prazo reduzido de dez dias e, ainda, na circunstância de tal pedido ter sido já cabalmente satisfeito por via da publicação dos dados no supramencionado Portal.” (pg. 20)
8 – “Determina o princípio da proporcionalidade que não deve, sem mais, ser admitido o sacrifício desproporcionado de interesses próprios da Administração. É, no entanto, precisamente isso que se verifica in casu, uma vez que a decisão do douto Tribunal a quo se revela manifestamente desproporcional ao considerar procedente um pedido de informação manifestamente abusivo, concedendo, nesse quadro, um reduzido prazo de dez dias para a sua satisfação, não atendendo, contudo, ao facto de tal pedido já estar integralmente satisfeito atenta a informação publicamente disponível no Portal da Transparência do SNS.” (pg. 22)
9 – “Nesta ótica, o presente recurso assume um papel fundamental na resposta à questão de saber qual é, afinal, o papel da Administração Pública (em concreto, da ACSS) e, nesse caso, se lhe deve ser exigida a satisfação de pedidos manifestamente abusivos, desproporcionais e desrazoáveis, em detrimento do desempenho de todas as funções que efetivamente lhe incumbem nos termos da lei.” (pg. 23)
10 – “Dito isto, refira-se que a violação do princípio da proporcionalidade pelo TCA Sul consubstancia-se, em síntese, no facto de o pedido formulado pelo Recorrido ser manifestamente abusivo atenta a dimensão da informação requerida, bem como pela circunstância de o prazo fixado pelo tribunal para a satisfação de tal pedido ser absolutamente insuficiente e incompatível com as circunstâncias do caso concreto, e, ainda, pelo facto de não se compreender em que medida pode a Recorrente ser condenada a satisfazer um pedido já satisfeito, conforme fica demonstrado por via da consulta e análise dos dados publicados no Portal da Transparência do SNS.” (pg. 24)
11 – “Atentas as regras da experiência comum e o facto de a excessiva onerosidade inerente ao pedido do Recorrido consubstanciar um facto notório, mesmo que tal não tivesse sido alegado ou o tivesse sido imperfeitamente, sempre se alcançaria a conclusão de que a anonimização do vasto número de dados aqui em causa representa uma violação do princípio da proporcionalidade, consubstanciando um pedido manifestamente abusivo e, por isso, inaceitável.” (pg. 25)
E, no entanto, o PÁGINA UM somente está a fazer jornalismo num país que, dentro de meses, comemora os 50 anos de Democracia. Tem agora a palavra o Supremo Tribunal Administrativo.
N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Neste momento, por força de 18 processos em curso, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras.