Categoria: Sociedade

  • Sociedade Portuguesa de Pneumologia acusa investigação do PÁGINA UM de ter “consequências [negativas] para a saúde pública”

    Sociedade Portuguesa de Pneumologia acusa investigação do PÁGINA UM de ter “consequências [negativas] para a saúde pública”

    Por causa de três artigos de investigação, a Sociedade Portuguesa de Pneumologia quer que a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) censure e castigue o PÁGINA UM, alegando que houve pessoas que recusaram vacinar-se por causa de notícias que abordaram essa associação privada e as suas ligações com a indústria farmacêutica. Conheça os termos da queixa – e o texto integral – e mais alguns detalhes sobre os conflitos de interesses desta associação privada de pneumologistas.


    A Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP) considera que os artigos jornalísticos do PÁGINA UM que abordaram as suas ligações com a indústria farmacêutica “acarretou consequências para a saúde pública”.

    Em causa está uma investigação jornalística, constituída até agora por três peças, sobretudo baseadas em informação pública do Infarmed, publicadas sob os títulos “Sociedade Portuguesa de Pneumologia teve ano de ouro em receitas de farmacêuticas com 370 mil euros da Pfizer”, em 13 de Janeiro, “Farmacêuticas da covid-19 e gripe enchem cofres da Sociedade Portuguesa de Pneumologia”, em 16 de Fevereiro, e “Um congresso à pala: saiba quais os pneumologistas que receberam das farmacêuticas, e quanto receberam”, em 17 de Fevereiro.

    António Morais, presidente das Sociedade Portuguesa de Pneumologia, médico no Hospital de São João e Trofa Saúde, e ainda consultor da Direcção-Geral da Saúde.

    Numa queixa apresentada junto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) por esta associação privada de médicos daquela especialidade, o seu presidente, António Morais diz mesmo que “já existem relatos de médicos pneumologistas que foram confrontados por pacientes com essas publicações e outros até que recusaram vacinar-se apenas por estarem convictos de que o ato médico em causa não era necessário e apenas resultava de interesse pessoal do médico e na sua realização”.

    Na queixa à ERC, António Morais, que é pneumologista no Hospital de São João e também consultor da Direcção-Geral da Saúde, além de trabalhar ainda na Trofa Saúde, não apresenta testemunhas que validem esta informação, nem informa a que vacinas se refere.

    Na fundamentação da queixa contra o PÁGINA UM, a SPP não aponta qualquer erro, inexactidão ou falsidade sobre as parcerias comerciais e financeiras entre aquela associação privada de médicos e as farmacêuticas, apenas contestando as palavras usadas, as interpretações e o enfoque da investigação. Ou seja, questões no âmbito da liberdade de imprensa.

    Recorde-se que o PÁGINA UM revelou que só em 2021 a SPP recebeu 1,3 milhões de euros do sector farmacêutico, com destaque para uma campanha financiada pela Pfizer no valor de 370 mil euros de promoção da vacina pneumocócica. A Pfizer é, de longe, a principal fornecedora desta vacina em Portugal, comercializando-a sob a marca Prevenar.

    Por outro lado, o PÁGINA UM revelou ainda que a SPP recebeu no último quinquénio mais de 4,3 milhões de euros da indústria farmacêutica com o recorde a ser batido no ano passado, com destaque para a Boehringer Ingelheim, Novartis, BIAL, Pfizer, GlaxoSmithKline, A. Menarini e AstraZeneca.

    Também desvendou os meandros do último congresso de pneumologia, em Novembro passado, salientando que a SPP recebeu patrocínios de farmacêuticas no valor de 562.381,60 euros. Além disso, revelou que 14 empresas deste sector pagaram as inscrições ou as participações em eventos de quase quatro centenas de pneumologistas, tendo sido divulgados os nomes que constam na Plataforma da Transparência e Publicidade do Infarmed.

    Primeira página da queixa da Sociedade Portuguesa de Pneumologia à Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

    Apesar dos dados factuais, António Morais cita, na queixa à ERC, várias passagens dos artigos do PÁGINA UM, para concluir que estes “ofendem o direito fundamental à imagem da SPP e dos seus associados, pois insinuam que os médicos pneumologistas e a SPP se encontram ao serviço da indústria farmacêutica”.

    O presidente da SPP considera que o PÁGINA UM quis “induzir o leitor a uma interpretação dos factos que não só não corresponde à verdade, como resulta de uma visão deturpada e pessoal do próprio jornalista”.

    No texto enviado à ERC em 11 de Março, o presidente da SPP relembra que se está perante uma “associação sem fins lucrativos” – algo que, convém relembrar, não significa que esteja impedida de ter lucro, havendo apenas a obrigação de ser investido em iniciativas que beneficiem os seus associados, mesmo até monetariamente – e que “não faz publicidade ou comércio de produtos farmacêuticos”. E acrescenta que a SPP recolhe “patrocínios e donativos para concretizar os seus objectivos estatutários, no escrupuloso cumprimento das normas em vigor”.

    Convém referir que a SPP não esconde, pelo contrário, as suas fortes e permanentes ligações ao sector farmacêutico, tanto assim que o seu próprio site tem o apoio expresso da Medinfar, Takeda e BIAL.

    Além disso, nos congressos da SPP, as farmacêuticas escolhem especificamente as sessões que querem patrocinar, ou seja, optam por estarem associadas apenas aos temas em discussão onde têm interesses comerciais relevantes. E até pagam directamente aos especialistas, todos influentes e conceituados pneumologistas, que discursam ou moderam mesas.

    A título de exemplo, no último congresso, a BIAL – que comercializa medicamentos para a asma brônquica e a doença pulmonar obstructiva crónica (DPOC) – patrocinou expressamente a sessão “Treatable traits bringing precision medicine to the treatment of respiratory patients”. A sessão foi moderada por Carlos Robalo Cordeiro que, expressamente, recebeu 1.230 euros da BIAL apenas por fazer essa tarefa. Igual valor recebeu a co-moderadora Ana Sofia Oliveira, que além disso tem uma forte ligação a esta farmacêutica portuguesa: só no ano passado recebeu 22.231 euros por palestras e como consultora.

    Comprovativo do pagamento a Carlos Robalo Cordeiro pela moderação de uma sessão patrocinada pela BIAL no 37º Congresso da SPP.

    A Pfizer – que vende vacinas pneumocócicas – patrocinou uma sessão em que discursaram, entre outros, os médicos Melo Cristino e Filipe Froes. O primeiro, especialista em Patologia Clínica, recebeu mesmo um apoio financeiro (1.000 euros) da Pfizer para fazer uma apresentação neste congresso. Já o pneumologista Filipe Froes encaixou 1.160 euros, mas para este congresso foi pago pela Sanofi, que comercializa vacinas antigripais.

    No entanto, a Pfizer e muitas outras farmacêuticas, são “clientes habituais” deste mediático pneumologista, que desde 2013 recebeu mais de 380 mil euros desta indústria. Pela Pfizer recebeu 134.574 euros até final do ano passado.

    A AstraZeneca – que, por exemplo, teve um novo medicamento (Tagrisso) para o tratamento do cancro do pulmão – patrocinou, nem mais, a sessão “Cancro Pulmão”. A Nippon Gases patrocinou a sessão da Comissão de Trabalho de Reabilitação Respiratória. E por aí fora. Houve cerca de duas dezenas e meias de sessões patrocinadas. Houve outras sem patrocínio, obviamente aquelas que não suscitaram interesse comercial das farmacêuticas.

    Filipe Froes é o pneumologista com mais e maiores ligações comerciais com as farmacêuticas.

    Apesar destas evidências – e o PÁGINA UM nem sequer escalpelizou todas as relações entre pneumologistas e indústria farmacêutica –, António Morais lamenta que numa das notícias se tenha publicado uma lista nominativa – que, repita-se, é pública – dos médicos que tiveram a sua inscrição ou participação paga por farmacêuticas, considerando-a “completamente desnecessária”.

    Segundo este responsável, a notícia do PÁGINA UM, “visa[va] apenas lançar a suspeita sobre todos e cada um deles quanto à sua falta de isenção e independência”.

    Saliente-se que o PÁGINA UM decidiu listar aqueles médicos para que, eles próprios e os demais leitores, possam reflictir se existem ou não questões éticas a considerar em situações de apoio de farmacêuticas na inscrição e participação de médicos em congressos daquela natureza.

    Invocando que “vivemos numa era em que proliferam a desinformação e as fake news”, António Morais refere ainda que o “tipo de jornalismo” do PÁGINA UM “põe em causa a credibilidade científica de uma sociedade que, durante o período da pandemia, se prestou para prestar verdadeiro serviço público, disponibilizando informação séria, tendo como base as evidências científicas mais atuais”.

    Recorde-se que o PÁGINA UM foi o único órgão de comunicação social que tem pressionado a Direcção-Geral da Saúde a prestar informação sobre a pandemia, tendo divulgado no seu site em primeira-mão, após a obtenção desses documentos, o conteúdo integral dos pareceres da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC).

    Foi também o PÁGINA UM o único órgão de comunicação social que recuperou, e disponibilizou no seu site, os relatórios da Task Force das Ciências Comportamentais que em Janeiro a DGS decidiu retirar do seu site por via da polémica causada pelo seu conteúdo.

    Durante o seu 37º Congresso, a SPP publicou um jornal diário. Na edição nº 2, António Morais cumprimenta o secretário de Estado da Saúde, Lacerda Sales, com um aperto de mão e sem máscara. Neste congresso ocorreu um surto de covid-19.

    E tem sido o PÁGINA UM o único órgão de comunicação social que tem revelado muitos dos aspectos escondidos sobre a pandemia, e também, noutra linha, que tem denunciado as ligações comerciais entre algumas sociedades médicas e a indústria farmacêutica.

    Destaque-se também que para a investigação do PÁGINA UM sobre a SPP (e outras sociedades médicas) foram enviados dois e-mails a António Morais em 19 de Outubro e 1 de Novembro passado, solicitando um conjunto de informações e esclarecimentos.

    Nessas missivas questionava-se a existência de um código de ética perante a indústria farmacêutica, “designadamente ao nível de recebimento de verbas pagas por aquelas por participação em palestras, conselhos consultivos, etc.”

    Pediu-se também a opinião sobre se considerava “necessário a existência de uma maior regulação especial, além daquela já em vigor, para regular as actividades e a independência das sociedades e associação de médicos”. E solicitava-se também o Relatório e Contas entre 2018 e 2020. António Morais e a SPP não responderam.

    Tem sido esta a visão de jornalismo do PÁGINA UM que a SPP e o seu presidente, António Morais, consideram agora “suficientemente grave e merecedora de atuação da ERC, ao abrigo dos arts. 7º e 8º da Lei 53/2005”. Saliente-se que é invocado uma norma das atribuições da ERC, extremamente importante: “assegurar o livre exercício do direito à informação e à liberdade de imprensa”.


    NOTA DA DIRECÇÃO: O PÁGINA UM divulgará, e abordará do ponto de vista noticioso, complementando com mais informação relevante, as queixas que sobre si forem endereçadas à ERC, divulgando o seu teor integral, mesmo antes da conclusão do processo, sempre que considerar relevante, e de acordo com a sua linha editorial.

    No caso em apreço, uma vez que a ERC não indica em concreto quais são as normas da Lei da Imprensa que o PÁGINA UM terá alegadamente violado, serão pedidos mais esclarecimentos. Em todo o caso o ofício da ERC avisa que “a falta de apresentação de oposição [pelo PÁGINA UM] implica a confissão dos factos alegados pelo queixoso, com consequente proferimento de decisão sumária pelo conselho regulador, sem prévia realização de audiência de conciliação”.

    O PÁGINA UM considera que a queixa da SPP tem um claro objectivo de pressionar e condicionar a liberdade de um órgão de comunicação social independente, uma vez que nem sequer se aponta um erro factual. Nem uma vírgula mal posta, mesmo se, nesse caso, até deverá haver alguma, certamente.

  • Rússia vs. Ucrânia: um é pecador e o outro  santo? Fomos ver se assim é…

    Rússia vs. Ucrânia: um é pecador e o outro santo? Fomos ver se assim é…

    Como estavam ambos os países, como Estados de direito, e os seus cidadãos, antes do dia 24 de Fevereiro? O PÁGINA UM foi analisar o que diz um dos mais conceituados índices mundiais sobre esta matéria. Como vem a talho de foice, apresentamos a situação portuguesa e o melhor e pior para cada um dos indicadores do World Justice Project. Há umas quantas surpresas. Confira.


    No estilo maniqueísta como muitos observam a invasão russa à Ucrânia, Vladimir Putin é um tirano sanguinário, manipulador, um ditador que oprime tanto o seu povo como os demais. Apontam-no como o novo Hitler.

    Do outro lado, Volodymyr Zelensky é olhado como um patriota, fiel ao seu povo, que luta sem tréguas contra o seu opressor. Apontam-no como o novo Churchill.

    Que Putin, numa Rússia sem a glória passada, continua a ser personalidade pouco recomendável, envolta em corrupção, oligarquias e pouca liberdade individual, já há muito – tempo demais – se sabia. Não foi um acaso que o mais recente Prémio Nobel da Paz foi entregue a um jornalista russo Dmitry Muratov, o fundador e editor-chefe do jornal Novaya Gazeta, que viu já vários colaboradores serem assassinados em guerras ou por causa de investigações.

    shallow focus photography of brown wooden floor signage

    Mas, e Zelensky? E a Ucrânia, tão desconhecida, tanto que tanta gente ignora até os conflitos dos últimos oito anos no Donbass? Será o antigo humorista um líder impoluto de um país moderno e próximo das democracias ocidentais, em completa oposição do modelo russo. Será a Ucrânia um bastião do Leste ao nível da liberdade, da justiça, da luta contra a corrupção e do nepotismo e em prol do bem comum?

    Como estavam ambos os países, como Estados de direito, antes do dia 24 de Fevereiro?

    O PÁGINA UM decidiu confrontar a Rússia e a Ucrânia pela “lupa” do Índice do Estado de Direito do World Justice Project, uma organização internacional fundada por dois reconhecidos advogados norte-americanos associada à American Bar Association (Ordem dos Advogados dos Estados Unidos).

    Avaliando todos os anos 139 países, este índice é constituído por oito factores (ou subíndices), que integram 44 indicadores, com avaliações que se baseiam em pesquisas nacionais de mais de 138 mil famílias e 4.200 profissionais e especialistas jurídicos.

    Para se ter uma ideia mais detalhada, e com referências, além do Índice do Estado do Direito em 2021, apresentamos também a posição da Ucrânia e da Rússia em cada um dos factores e indicadores – e respectivas pontuações de 0 a 1. Colocamos também Portugal em comparação, e mostramos o melhor e o pior país.

    E deixamos o leitor retirar as suas conclusões.


    FACTOR 1
    Restrições aos poderes do Governo

    Este factor mede o nível de vínculo do Governo face às leis. Compreende os meios, tanto constitucionais quanto institucionais, pelos quais os poderes do Governo e dos seus funcionários e agentes são limitados e responsabilizados perante as normas legais. Também inclui as verificações não-governamentais sobre o poder do Governo, como uma imprensa livre e independente.

    red and white stop sign

    1.1 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados pelo poder legislativo

    1 – Noruega (0,95)

    8 – Portugal (0,83)

    80 – UCRÂNIA (0,55)

    133 – RÚSSIA (0,34)

    139 – Egipto (0,08)

    1.2 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados pelo poder judiciário

    1 – Noruega (0,96)

    17 – Portugal (0,75)

    125 – RÚSSIA (0,32)

    126 – UCRÂNIA (0,32)

    139 – Venezuela (0,12)

    1.3 – Os poderes do Governo são efetivamente limitados por auditorias e revisão independentes

    1 – Suécia (0,97)

    17 – Portugal (0,76)

    92 – UCRÂNIA (0,43)

    114 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,07)

    1.4 – Os funcionários do Governo são punidos se agirem com má conduta

    1 – Dinamarca (0,94)

    26 – Portugal (0,64)

    115 – RÚSSIA (0,33)

    127 – UCRÂNIA (0,28)

    139 – Venezuela (0,10)

    black abuse of power comes as no surprise signage

    1.5 – Os poderes do Governo estão sujeitos a verificações não-governamentais

    1 – Dinamarca (0,96)

    13 – Portugal (0,80)

    121 – RÚSSIA (0,37)

    127 – UCRÂNIA (0,28)

    139 – Egipto (0,06)

    1.6 – A transição de poder está sujeita à lei

    1 – Finlândia (0,98)

    15 – Portugal (0,91)

    67 – UCRÂNIA (0,64)

    121 – RÚSSIA (0,37)

    139 – Venezuela (0,19)

    Avaliação global do Factor 1: Restrições aos poderes do Governo

    1 – Dinamarca (0,94)

    16 – Portugal (0,78)

    94 – UCRÂNIA (0,47)

    129 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,17)


    FACTOR 2
    Ausência de corrupção

    Este factor mede a ausência de corrupção no Governo, considerando três tipos: suborno, influência indevida de interesses públicos ou privados e apropriação indevida de fundos públicos ou outros recursos. Essas três formas de corrupção são avaliadas para os funcionários do Governo no poder executivo, judiciário, militar, policial e legislativo.

    2.1 – Funcionários do Governo no poder executivo não usam cargos públicos para ganho privado

    1 – Dinamarca (0,93)

    26 – Portugal (0,65)

    89 – RÚSSIA (0,40)

    127 – UCRÂNIA (0,31)

    139 – República Democrática do Congo (0,23)

    focus photography of person counting dollar banknotes

    2.2 – Funcionários do Governo no poder judiciário não usam cargos públicos para ganho privado

    1 – Dinamarca (0,99)

    31 – Portugal (0,87)

    74 – RÚSSIA (0,54)

    88 – UCRÂNIA (0,48)

    139 – Camboja (0,14)

    2.3 – Funcionários do Governo na polícia e nas forças armadas não usam cargos públicos para ganho privado

    1 – Dinamarca (0,98)

    19 – Portugal (0,87)

    82 – RÚSSIA (0,52)

    106 – UCRÂNIA (0,43)

    139 – República Democrática do Congo (0,19)

    2.4 – Funcionários do Governo no poder legislativo não usam cargos públicos para ganho privado

    1 – Dinamarca (0,91)

    29 – Portugal (0,49)

    104 – RÚSSIA (0,23)

    136 – UCRÂNIA (0,08)

    139 – Guatemala (0,05)

    Avaliação global do Factor 2: Ausência de corrupção

    1 – Dinamarca (0.95)

    24 – Portugal (0,72)

    88 – RÚSSIA (0,42)

    115 – UCRÂNIA (0,33)

    139 – República Democrática do Congo (0,16)


    FACTOR 3
    Governo aberto

    Este factor mede a abertura e transparência do governo definida pela forma como compartilha informações, capacita as pessoas com ferramentas de controlo da acção governativa e promove a participação dos cidadãos nas deliberações de políticas públicas. Avalia assim também se as leis básicas e informações sobre direitos legais são divulgadas, bem como a qualidade das informações publicadas pelo Governo.

    3.1 – Leis divulgadas e dados governamentais

    1 – Finlândia (0,91)

    37 – UCRÂNIA (0,61)

    41 – RÚSSIA (0,57)

    46 – Portugal (0,55)

    139 – Serra Leoa (0,09)

    grey hlalway

    3.2 – Direito à informação

    1 – Suécia (0,92)

    33 – Portugal (0,60)

    64 – UCRÂNIA (0,51)

    102 – RÚSSIA (0,41)

    139 – Egipto (0,10)

    3.3 – Participação cívica

    1 – Dinamarca (0,94)

    18 – Portugal (0,76)

    68 – UCRÂNIA (0,58)

    122 – RÚSSIA (0,37)

    139 – Egipto (0,16)

    3.4 – Mecanismos de reclamação

    1 – Holanda (0,92)

    30 – Portugal (0,72)

    66 – RÚSSIA (0,59)

    76 – UCRÂNIA (0,57)

    139 – Mauritânia (0,25)

    Avaliação global do Factor 3: Governo aberto

    1 – Noruega (0,89)

    29 – Portugal (0,66)

    51 – UCRÂNIA (0,57)

    78 – RÚSSIA (0,49)

    139 – Egipto (0,22)


    FACTOR 4
    Direitos fundamentais

    Este factor mede o sistema do Estado de direito dos países, concentrando-se porém num menu relativamente modesto de direitos estabelecidos sob a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

    4.1 – Igualdade de tratamento e ausência de discriminação

    1 – Finlândia (0,85)

    31 – Portugal (0,68)

    35 – UCRÂNIA (0,67)

    67 – RÚSSIA (0,58)

    139 – Sudão (0,32)

    4.2 – O direito à vida e à segurança da pessoa é efectivamente garantido

    1 – Dinamarca (0,99)

    29 – Portugal (0,85)

    59 – UCRÂNIA (0,66)

    93 – RÚSSIA (0,45)

    139 – Venezuela (0,05)

    people painting

    4.3 – Processo legal correcto e com direitos do acusado

    1 – Suécia (0,91)

    32 – Portugal (0,64)

    72 – UCRÂNIA (0,45)

    112 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,17)

    4.4 – A liberdade de opinião e expressão é efectivamente garantida

    1 – Dinamarca (0,96)

    13 – Portugal – 0,80

    62 – UCRÂNIA (0,61)

    121 – RÚSSIA (0,37)

    139 – Egipto (0,06)

    4.5 – A liberdade de crença e religião é efectivamente garantida

    1 – Noruega (0,89)

    15 – Portugal (0,82)

    34 – UCRÂNIA (0,75)

    118 – RÚSSIA (0,49)

    139 – Irão (0,03)

    4.6 – Ausência de interferência arbitrária na privacidade é efetivamente garantida

    1 – Dinamarca (0,99)

    16 – Portugal (0,83)

    75 – UCRÂNIA (0,43)

    124 – RÚSSIA (0,18)

    139 – Venezuela (0,02)

    group of people setting up campfire

    4.7 – A liberdade de reunião e associação é efectivamente garantida

    1 – Dinamarca (0,98)

    11 – Portugal (0,86)

    66 – UCRÂNIA (0,64)

    121 – RÚSSIA (0,39)

    139 – China (0,11)

    4.8 – Os direitos fundamentais do trabalho são efectivamente garantidos

    1 – Dinamarca (0,95)

    31 – Portugal (0,69)

    44 – UCRÂNIA (0,65)

    63 – RÚSSIA (0,59)

    139 – Irão (0,24)

    Avaliação global do indicador do Factor 4: Direitos fundamentais

    1 – Dinamarca (0,92)

    21 – Portugal (0,77)

    55 – UCRÂNIA (0,61)

    114 – RÚSSIA (0,42)

    139 – Irão (0,22)


    FACTOR 5
    Ordem e segurança

    Este factor mede o nível de segurança de pessoas e propriedades garantida pelo Estado e pela sociedade.

    5.1 – O crime é efectivamente controlado

    1 – Singapura (0,98)

    18 – Portugal (0,91)

    71 – RÚSSIA (0,77)

    82 – UCRÂNIA (0,75)

    139 – Venezuela (0,32)

    5.2 – Os conflitos civis são efectivamente limitados

    Existem 105 países, incluindo Portugal, com a pontuação máxima (1,0)

    107 – RÚSSIA (0,94)

    108 – UCRÂNIA (0,94)

    139 – Afeganistão (0,04)

    5.3 – As pessoas não recorrem à violência para reparar queixas pessoais

    1 – Irlanda (0,92)

    41 – UCRÂNIA (0,51)

    71 – Portugal (0,45)

    99 – RÚSSIA (0,38)

    139 – Suriname (0,18)

    Avaliação global do indicador do Factor 5: Ordem e segurança

    1 – Irlanda (0,94)

    41 – Portugal (0,79)

    63 – UCRÂNIA (0,75)

    84 – RÚSSIA (0,70)

    139 – Afeganistão (0,30)


    FACTOR 6
    Aplicação regulatória

    Este factor mede até que ponto os regulamentos são implementados e aplicados de forma justa e eficaz, embora sem analisar as actividades reguladas nem a sua adequação.

    6.1 – Os regulamentos governamentais são efectivamente aplicados

    1 – Dinamarca (0,87)

    34 – Portugal (0,63)

    58 – RÚSSIA (0,54)

    112 – UCRÂNIA (0,42)

    139 – Mauritânia (0,23)

    6.2 – Os regulamentos governamentais são aplicados e executados sem influência imprópria

    1 – Noruega (0,99)

    29 – Portugal (0,80)

    93 – RÚSSIA (0,54)

    127 – UCRÂNIA (0,41)

    139 – Camboja (0,25)

    purple and pink light illustration

    6.3 – Os processos administrativos são conduzidos sem demora injustificada

    1 – Singapura (0,90)

    25 – RÚSSIA (0,62)

    35 – UCRÂNIA (0,57)

    89 – Portugal (0,43)

    139 – Venezuela (0,10)

    6.4 – Os procedimentos legais adequados são respeitados em processos administrativos

    1 – Finlândia (0,94)

    49 – Portugal (0,51)

    84 – UCRÂNIA (0,41)

    105 – RÚSSIA (0,34)

    139 – Camboja (0,13)

    6.5 – O governo não expropria sem processo legal e compensação adequada

    1 – Bélgica (0,93)

    36 – Portugal (0,66)

    117 – UCRÂNIA (0,41)

    124 – RÚSSIA (0,38)

    139 – Venezuela (0,14)

    aerial view of green grass field

    Avaliação global do indicador do Factor 6: Aplicação regulatória

    1 – Dinamarca (0,89)

    39 – Portugal (0,61)

    81 – RÚSSIA (0,48)

    102 – UCRÂNIA (0,44)

    139 – Venezuela (0,19)


    FACTOR 7
    Justiça civil

    Este factor mede o nível de resolução das queixas dos cidadãos de forma pacífica e eficaz por meio de um sistema de justiça civil, analisando também se são acessíveis e baratos, bem como livres de discriminação, corrupção e influência imprópria de funcionários públicos. De igual modo, examina se os processos judiciais são conduzidos sem atrasos injustificados e se as decisões são executadas de forma eficaz, incluindo também a acessibilidade, imparcialidade e eficácia dos mecanismos alternativos de resolução de disputas.

    7.1 – As pessoas podem aceder e pagar a justiça civil

    1 – Uruguai (0,80)

    15 – Portugal (0,71)

    38 – UCRÂNIA (0,63)

    44 – RÚSSIA (0,63)

    139 – Guatemala (0,34)

    7.2 – A justiça civil é livre de discriminação

    1 – Dinamarca (0,90)

    21 – Portugal (0,72)

    34 – UCRÂNIA (0,68)

    72 – RÚSSIA (0,55)

    139 – Afeganistão (0,14)

    7.3 – A justiça civil está livre de corrupção

    1 – Dinamarca (0,99)

    31 – Portugal (0,77)

    74 – RÚSSIA (0,51)

    97 – UCRÂNIA (0,41)

    139 – Camboja (0,12)

    7.4 – A justiça civil está livre de influência imprópria do Governo

    1 – Noruega (0,95)

    24 – Portugal (0,76)

    101 – UCRÂNIA (0,37)

    124 – RÚSSIA (0,27)

    139 – Venezuela (0,04)

    man in black suit standing on stage

    7.5 – A justiça civil não está sujeita a atrasos injustificados

    1 – Singapura (0,91)

    9 – RÚSSIA (0,74)

    38 – UCRÂNIA (0,53)

    70 – Portugal (0,44)

    139 – Venezuela (0,06)

    7.6 – A justiça civil é efetivamente aplicada

    1 – Singapura (0,92)

    56 – Portugal (0,54)

    75 – UCRÂNIA (0,49)

    82 – RÚSSIA (0,42)

    139 – Venezuela (0,17)

    7.7 – Mecanismos alternativos de resolução de disputas são acessíveis, imparciais e eficazes

    1 – Noruega (0,91)

    17 – Portugal (0,80)

    68 – UCRÂNIA (0,67)

    116 – RÚSSIA (0,55)

    139 – Camboja (0,41)

    woman in black long sleeve shirt holding black ceramic mug

    Avaliação global do indicador do Factor 7: Justiça civil

    1 – Dinamarca (0,86)

    25 – Portugal (0,68)

    64 – UCRÂNIA (0,54)

    70 – RÚSSIA (0,53)

    139 – Camboja (0,25)


    FACTOR 8
    Justiça criminal

    Este factor avalia o sistema de justiça criminal de um país, incluindo a actuação da polícia, advogados, promotores, juízes e agentes penitenciários.

    8.1 – O sistema de investigação criminal é eficaz

    1 – Singapura (0,83)

    41 – Portugal (0,49)

    118 – UCRÂNIA (0,28)

    136 – RÚSSIA (0,19)

    139 – Venezuela (0,11)

    8.2 – O sistema criminal é justo, oportuno e eficaz

    1 – Áustria (0,81)

    75 – Portugal (0,44)

    96 – UCRÂNIA (0,40)

    115 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,12)

    8.3 – O sistema correcional é eficaz na redução do comportamento criminoso

    1 – Noruega (0,93)

    45 – Portugal (0,49)

    62 – UCRÂNIA (0,40)

    78 – RÚSSIA (0,36)

    139 – Venezuela (0,05)

    architectural photography of trial court interior view

    8.4 – O sistema penal é imparcial

    1 – Dinamarca (0,81)

    66 – UCRÂNIA (0,48)

    73 – Portugal (0,46)

    101 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,12)

    8.5 – O sistema criminal está livre de corrupção

    1 – Dinamarca (0,98)

    21 – Portugal (0,78)

    84 – RÚSSIA (0,46)

    123 – UCRÂNIA (0,32)

    139 – Camboja (0,16)

    8.6 – O sistema criminal está livre de influência imprópria do Governo

    1 – Finlândia (0,98)

    13 – Portugal (0,84)

    106 – UCRÂNIA (0,28)

    134 – RÚSSIA (0,11)

    139 – Venezuela (0,01)

    8.7 – O processo legal é adequado e com direitos do acusado

    1 – Suécia (0,91)

    32 – Portugal (0,64)

    72 – UCRÂNIA (0,45)

    112 – RÚSSIA (0,35)

    139 – Venezuela (0,17)

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    Avaliação global do indicador do Factor 8: Justiça criminal

    1 – Noruega (0,85)

    33 – Portugal (0,59)

    91 – UCRÂNIA (0,37)

    121 – RÚSSIA (0,31)

    139 – Venezuela (0,12)


    ÍNDICE DO ESTADO DE DIREITO DO WORLD JUSTICE PROJECT

    1 – Dinamarca (0,90)

    2 – Noruega (0,90)

    3 – Finlândia (0,88)

    4 – Suécia (0,86)

    5 – Alemanha (0,84)

    6 – Holanda (0,83)

    7 – Nova Zelândia (0,83)

    8 – Luxemburgo (0,83)

    9 – Áustria (0,81)

    10 – Irlanda (0,81)

    (…)

    26 – Portugal (0,70)

    Mapa mundial com Índice do Estado de Direito em 2021 do World Justice Project. Fonte: WJP.

    (…)

    74 – UCRÂNIA (0,51)

    (…)

    101 – RÚSSIA (0,46)

    (…)

    130 – Paquistão (0,39)

    131 – Nicarágua (0,38)

    132 – Haiti (0,38)

    133 – Mauritânia (0,36)

    134 – Afeganistão (0,35)

    135 – Camarões (0,35)

    136 – Egipto (0,35)

    137 – República Democrática do Congo (0,35)

    138 – Camboja (0,32)

    139 – Venezuela (0,27)

  • CADA diz haver manifesto “interesse público” em conhecer segurança das vacinas e Infarmed tem de abrir base de dados ao PÁGINA UM

    CADA diz haver manifesto “interesse público” em conhecer segurança das vacinas e Infarmed tem de abrir base de dados ao PÁGINA UM

    Um novo parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) concede direito ao PÁGINA UM em conhecer dados brutos sobre as reacções adversas das vacinas contra a covid-19 e o uso do remdesivir, o polémico antiviral usado em doentes-covid, desaconselhado pela Organização Mundial da Saúde mas “apadrinhado” por especialistas com ligações à farmacêutica Gilead. Infarmed não queria dar acesso, alegando que essa informação não se destina a “conhecimento público” e que pode haver “alarme social”.


    Apesar das tentativas do presidente do Infarmed, Rui dos Santos Ivo, em convencer a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) de que os jornalistas são “não-especialistas” com “um elevado potencial para criar alarme social totalmente desnecessário e infundado”, esta entidade que regula os medicamentos terá mesmo de disponibilizar a base de dados dos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19, bem como do fármaco remdesivir, um antiviral produzido pela farmacêutica Gilead.

    O parecer da CADA, aprovado por unanimidade na passada semana, vem no seguimento de duas queixas independentes apresentadas pelo PÁGINA UM após a recusa tácita de pedidos de acesso ao Portal RAM no início de Dezembro.

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    No caso dos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19, o PÁGINA UM não pretendia apenas consultar os habituais relatórios de farmacovigilância – cuja informação é “filtrada” e omite dados fundamentais –, mas sobretudo ter “acesso à base de dados [Portal RAM] e/ou a outros quaisquer documentos administrativos” que servissem para a elaboração daqueles relatórios públicos.

    Além disso, pretendia-se conhecer, em maior detalhe, os efeitos adversos estratificados por idades e também os critérios para classificação do grau de gravidade desses efeitos. Saliente-se que se ignora ainda quais os critérios usados pelo Infarmed para validar, de forma inequívoca, a associação entre uma morte e a toma da vacina contra a covid-19.

    Em relação ao remdesivir – um medicamento polémico que custou ao Estado português cerca de 20 milhões de euros, e cujos efeitos benéficos são considerados nulos, apesar do apoio de vários especialistas com ligações à Gilead –, o PÁGINA UM pretendia conhecer com detalhe todos os efeitos adversos reportados desde a sua utilização em doentes-covid a partir de Novembro de 2020.

    Em carta enviada à CADA, no âmbito do processo aberto após a queixa do PÁGINA UM, o Infarmed alegou que, apesar de estarmos perante questões de Saúde Pública e de saúde individual, “o Portal RAM não serve afinal propósitos públicos”.

    Rui dos Santos Ivo, actual presidente do Infarmed – que tem “saltitado”, no seu percurso profissional, entre a indústria farmacêutica e a regulação do sector dos medicamentos – alegou que os dados constantes no Portal RAM “não se destinam a ser disponibilizados para conhecimento público”, e que “o seu eventual fornecimento”, mesmo se fossem dados parciais, ocultando-se dados nominativos (que não existem, na realidade), redundaria num “risco de poderem ser analisados por não-especialistas”.

    [O autor desta notícia, e director do PÁGINA UM, tem formação na área do tratamento de dados e é sócio da Associação Portuguesa de Epidemiologia]

    À direita, Rui dos Santos Ivo, presidente do Infarmed, em descontraída entrevista em Setembro do ano passado, para o portal da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), na qual já foi director executivo (2008-2011). À esquerda André Macedo, antigo jornalista e ex-director-adjunto da RTP e que agora trabalha numa agência de comunicação.

    Na opinião deste responsável – que considerará, certamente, que ninguém mais do que a indústria farmacêutica e os reguladores entenderão ou saberão tratar dados médicos e estatísticos –, como o acesso a estes dados por supostos “não-especialistas” teria “um elevado potencial para criar um alarme social totalmente desnecessário e infundado”, defendeu junto da CADA que não deveria ser fornecido o acesso.

    A CADA, porém, considerou que “a informação solicitada” ao Infarmed pelo PÁGINA UM constitui mesmo “documentos administrativos”, e que, conforme fora feito o pedido, não era possível identificar pessoas. Com efeito, o PÁGINA UM solicitou, em concreto, que pretendia, tanto para as vacinas como para o remdesivir, uma “lista de reacções adversas (A, B, C, etc.) do indivíduo 1, 2, 3, etc. (…) de sexo determinado em datas elencadas após a toma de um medicamento concreto”. Ou seja, dados perfeitamente anonimizados.

    Primeira página do parecer da CADA.

    No seu parecer, a CADA informa o Infarmed dum aspecto óbvio em democracia: “as entidades não podem limitar o acesso com base no receio de alguma deturpação que possa ser feita”.

    E acrescenta ainda que “o interesse público no conhecimento de elementos que possam informar quanto à segurança da vacina [contra a covid-19] é, por conseguinte, manifesto”.

    Nessa medida, a CADA salienta que o Infarmed deverá facultar o acesso à informação solicitada pelo PÁGINA UM, “independentemente do suporte em que se encontre (…), expurgada dos elementos que por si ou conjugadamente permitam relacionar os dados de saúde a pessoas concretas”.

    Como a CADA considera, mesmo assim, que possa existir um volume de dados muito elevado – por exemplo, o último relatório do Infarmed sobre as reacções adversas das vacinas contra a covid-19, datado de 28 de Fevereiro passado, reporta a ocorrência de 22.927 reacções adversas –, o Infarmed tem a possibilidade de prorrogar o prazo “até ao máximo de dois meses”.

    Contudo, do ponto de vista técnico não há justificação para tal, uma vez que o Portal RAM permite descarregar a informação em formato compatível para tratamento estatístico de forma imediata.

    Na verdade, apenas uma razão política pode justificar o protelamento por parte do Infarmed. Ou uma recusa, o que levaria necessariamente a uma intimação junto do Tribunal Administrativo, mas que constituiria uma forte suspeita de algo de muito grave estar a ser escondido. Tanto no caso das vacinas como do remdesivir.

  • Cada vez mais dirigentes da Administração Pública ignoram Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos

    Cada vez mais dirigentes da Administração Pública ignoram Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos

    Uma legislação com quase 30 anos continua a ser “meiga” para quem recusa transparência e a abertura do Estado aos cidadãos. Nos últimos tempos, além de continuarem a recusar acesso a informação pública, muitos dirigentes da res publica já nem sequer ligam às cartas da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), que emite pareceres que continuam a ser não vinculativos. Ou seja, nada valem se a Administração Pública quiser. Os partidos na Assembleia da República continuam a assobiar para o ar. O estado da democracia vê-se nestes “pormenores”.


    Quase três décadas após a criação da legislação de incentivo à transparência da gestão da res publica, o modelo de acesso aos documentos administrativos está esgotado e moribundo. Um sinal, ou melhor dizendo, uma evidência, observa-se na taxa de respostas nos processos abertos pela entidade responsável pela gestão das queixas e emissão de pareceres – a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) –, que não tem parado de descer nos últimos dois anos.

    A cultura do obscurantismo na Administração Pública continua bem presente; e nos últimos tempos mostra-se em todo o esplendor, ou seja, nem sequer dão satisfações sobre a sua falta de transparência.

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    Desde 1993, de forma inequívoca, a lei portuguesa consagra o direito aos cidadãos acederem aos arquivos do Governo, Administração Pública, autarquias e mesmo entidades privadas com funções públicas, como ordens profissionais e determinadas associações e empresas que exerçam serviços públicos.

    Previsto na denominada Lei do Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), o princípio do “arquivo aberto” determina que essas entidades têm um prazo de 10 dias úteis para dar resposta aos pedidos de acesso aos diversos documentos (papel, digital, sonoro e audiovisual), sem sequer necessidade de justificar o motivos, excepto se, grosso modo, estiverem em causa dados pessoais, e mesmo assim estes podem ser expurgados.

    Contudo, como a própria Assembleia da República que aprovou esta lei já preveria a existência de dirigentes obstinados e relapsos em matérias de transparência, criou a CADA para defender os cidadãos daqueles que julgassem que poderiam tudo fazer sem dar satisfação aos cidadãos.

    A CADA, um organismo independente que funciona junto da Assembleia da República, é presidida por um juiz conselheiro e é constituída também por membros nomeados pelos deputados, Governos nacional e regionais, municípios, Ordem dos Advogados e Comissão Nacional de Protecção de Dados.

    Contudo, além da influência política na indicação dos seus membros, a acção da CADA sempre se mostrou bastante limitada, por uma simples mas marcante razão: os seus pareceres, no decurso das queixas, não são vinculativos. Ou seja, as entidades requeridas não ficam sequer obrigadas, nem os seus dirigentes são penalizados, se não cumprirem os pareceres. Se persistir a recusa após um parecer favorável às pretensões do requerente, restam os tribunais administrativos morosos e onerosos.

    Deste modo, até recentemente, a CADA constituía um mero organismo de pressão, uma espécie de provedoria, mas até isso agora parece estar a perder: nos últimos dois anos, cada vez mais entidades sujeitas à LADA deixaram de lhe responder às cartas da CADA para relatarem os motivos de não autorizarem o acesso a documentos administrativos.

    De acordo com um levantamento do PÁGINA UM aos pareceres emitidos nos dois primeiros meses (Janeiro e Fevereiro) dos anos de 2019 a 2022 – e respeitando somente a queixas de particulares e empresas –, a tendência para colaborar com a CADA tem diminuído drasticamente.

    Número de processos com (SIM) e sem (NÂO) colaboração das entidades requeridas referente aos pareceres (provenientes de queixas) emitidos em Janeiro e Fevereiro no período 2019-2022. Fonte: CADA.

    Enquanto nos processos finalizados naqueles dois meses de 2019 e em 2020, a taxa de resposta das diversas entidades (alvo de queixas) ainda rondava valores próximos dos 70%, este ano já só se cifrou em 39%. Em 2021, a taxa de resposta era já só de 57%.

    Este ano, de entre 71 pareceres já emitidos, a CADA não obteve colaboração das entidades requeridas em 33 casos. A Administração Pública foi o grupo que mais ignorou a CADA: apenas 26 dos 42 processos tiveram resposta da entidade sob queixa. No caso das autarquias, em seis pareceres, houve quatro que não colaboraram.

    O Governo – que tem também funções de orientação das práticas da Administração e de exemplo – foi já sujeito, neste período, a três pareceres (por outras tantas queixas devidas a recusas de acesso a documentos administrativos), todas favoráveis aos requerentes. Porém, só prestou informações à CADA num dos processos, relativo à queixa do jornalista de um órgão de comunicação não identificado que solicitou ao ministro das Infraestruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos, o acesso a uma carta de uma empresa, datada de 2 de Outubro, a propósito da reprivatização da CP Carga, na qual solicitava ao Governo que concluísse a privatização com a venda dos 5% que ainda são detidos pela CP – Comboios de Portugal”.

    Nos outros dois processos, nada. No primeiro caso, foi aberto no seguimento de uma queixa do Pingo Doce contra o Ministério da Administração Interna, devido à recusa de acesso a documentos relacionados com o exercício de competências da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil. No segundo caso, o queixoso foi um denominado Movimento Cívico Grupo de Lisboa, que requereu documentação na posse da Presidência do Conselho de Ministros sobre a situação pandémica e medidas, com o seu custo, adoptadas desde Maio de 2020. Saliente-se que mesmo se uma entidade pública não deter os documentos solicitados, deve então indicar quem os possa ter.

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    Tal como tem sido habitual, o sector da Saúde foi aquele que, este ano, já registou mais processos com parecer aprovado, e também o que mais ignora a CADA. Nos dois primeiros meses de 2022, em 12 dos 17 pareceres não houve colaboração por parte de entidades da Administração da Saúde.

    Neste lote encontram-se cinco pareceres solicitados pelo PÁGINA UM face ao obscurantismo da Direcção-Geral da Saúde, mas também mais sete relativos a queixas contra o Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia-Espinho, a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, o Centro de Saúde de Ponte da Barca, a Administração Regional de Saúde do Norte e os hospitais de Loures, de Amadora-Sintra e de Ponta Delgada.

    Pela amostra dos dois primeiros meses dos últimos três anos, nota-se que algumas entidades – ou seja, dirigentes, com nome – optam ostensivamente por ignorar tanto os pedidos dos requentes como os convites da CADA para se pronunciarem. Além da Direcção-Geral da Saúde, são os casos da Direcção-Geral da Administração Escolar, Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, Autoridade para as Condições de Trabalho, Instituto da Segurança Social, Câmara de Grândola, Agrupamento de Escolas dos Templários (Tomar), Instituto de Conservação da Natureza e Florestas.

    Instado a comentar esta situação de menosprezo pela legislação que promove o “arquivo aberto”, o presidente da CADA salienta que “responder a requerimento de acesso é um dever jurídico”, mas constitui “um dever jurídico cujo incumprimento não acarreta sanção jurídica”.

    Alberto Oliveira refere ainda que, embora a CADA “tenha o dever jurídico de convidar a entidade demandada a responder”, na verdade não existe dever jurídico de responder. “Corresponder ao convite é uma opção da entidade demandada”, esclarece este juiz conselheiro.

    Considerando que “a opção legislativa”, desde a criação da CADA em 1993, foi “uma figura próxima da do Ombudsman [uma espécie de defensor público], também sem poderes vinculativos”, Alberto Oliveira recusou emitir a sua opinião sobre algumas questões colocadas pelo PÁGINA UM, entre as quais se considerava útil a existência de obrigatoriedade de resposta ou se os pareceres da CADA deveriam passar a vinculativos com penalizações aos dirigentes que não os acatassem.

    Os últimos dados relativos ao cumprimento dos pareceres não-vinculativos da CADA são apenas referentes ao ano 2020, estimando-se que, no total de 297 pareceres favoráveis emitidos naquele período, 48 não terão sido seguidos, ou seja, cerca de 16%. Convém, no entanto, destacar que a CADA fez esse levantamento junto das entidades requeridas, e não dos queixosos. Na última década, a CADA tem emitido uma média de cerca de 430 pareceres por ano, com o máximo a ocorrer em 2018, com 556.

    No ano passado, a CADA emitiu 370 pareceres, mas tal pode não dever-se a uma redução de conflitos, mas sim a atrasos na conclusão dos pareceres. Na verdade, até nos processos que envolvem jornalistas – que são considerados prioritários –, raramente a CADA consegue agora cumprir o prazo de 40 dias úteis para emitir um parecer após a entrada da queixa. Para um cidadão comum pode atingir mais de quatro meses.

    Número global de pareceres emitidos pela CADA desde 1993 (inclui queixas, pedidos de esclarecimentos e reclamações). Fonte: CADA.

    Por exemplo, actualmente, o PÁGINA UM tem um processo a aguardar parecer da CADA desde Novembro do ano passado – ou seja, há quatro meses – relativo à recusa de acesso à base de dados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE) por parte da Direcção-Geral da Saúde. A CADA já agendou por duas vezes a votação deste parecer para se aceder a uma base de dados fundamental para entender a gestão da pandemia – e por isso, é assunto politicamente delicado.

    O presidente da CADA justifica ser “inerente ao trabalho colegial a possibilidade de um tema apresentado para apreciação necessitar de melhor reflexão para a obtenção do entendimento a ser subscrito por cada membro”, acrescentando que “o colégio é soberano na decisão de adiamento”. O juiz conselheiro Alberto Oliveira apresenta um, e apenas um, outro caso de duplo adiamento (processo n.º 339/2021), que também versava matéria sensível, neste caso um pedido de acesso ao registo disciplinar de um advogado.

  • PÁGINA UM obtém mais uma vitória na luta pela transparência com direito de acesso ao inquérito sobre a Operação Marquês

    PÁGINA UM obtém mais uma vitória na luta pela transparência com direito de acesso ao inquérito sobre a Operação Marquês

    O Conselho Superior da Magistratura quis saber qual o motivo para um jornalista querer ter acesso ao inquérito sobre a distribuição do juiz da Operação Marquês. O PÁGINA UM recusou aceitar essas condições anticonstitucionais e apresentou queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. O PÁGINA UM foi o único órgão de comunicação social que, ao longo deste processo, não aceitou um “não” do CSM.


    O Conselho Superior da Magistratura (CSM) deve conceder ao PÁGINA UM acesso a todos os documentos do inquérito interno relativo à escolha inicial do juiz Carlos Alexandre para dirigir a Operação Marquês, iniciada em 2014, e que resultou na prisão preventiva do ex-primeiro-ministro José Sócrates.

    Esta é a posição da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), através de um parecer solicitado pelo PÁGINA UM, no decurso da recusa do CSM de ceder essa documentação, e que foi aprovado nos últimos dias de Fevereiro passado.

    Conselho Superior da Magistratura quis sempre manter secretismo sobre os meandros da Operação Marquês.

    Recorde-se que o PÁGINA UM – que noticiou em primeira-mão que José Sócrates obtivera um parecer da CADA que lhe deu razão sobre o direito de acesso a esse inquérito – solicitou também o acesso em 2 de Novembro do ano passado.

    Contudo, o CSM sempre recusou esse acesso ao PÁGINA UM, tendo mesmo a sua Encarregada da Protecção de Dados, Ana Sofia Wengorovius – após uma troca de e-mails, exigido que se esclarecesse “qual a finalidade do acesso e da recolha” dos documentos solicitados. Esta juíza, através de um longo parecer de sete páginas, defendia o secretismo deste inquérito, que na verdade se trata da “averiguação sumária nº 2018-346/AV”.

    No seu parecer, Ana Sofia Wengovorius argumenta que o inquérito, mesmo se arquivado, se mantinha “confidencial”, porque se deveria ter “em vista assegurar a defesa dos direitos fundamentais de personalidade como o direito ao bom nome e à reputação”, invocando a Constituição. E que a divulgação por parte de um jornalista poderia violar ou afectar “os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”. Nessa medida, esta responsável do CSM dizia que o jornalista deveria obrigatoriamente de invocar um “interesse atendível ou legítimo”.

    Ora, como o PÁGINA UM invocara de forma implícita esse interesse atendível (porque o pedido foi feito por um jornalista) e explicitamente (repetindo, por palavras, quais as funções de um jornalista), seguiu uma queixa para a CADA.

    Primeira página do parecer do CADA que dá razão ao PÁGINA UM.

    No parecer da CADA, presidida pelo juiz-conselheiro Alberto Oliveira, e que deu razão às pretensões do PÁGINA UM, destaca-se ser “doutrina (…) que o processo de inquérito e o processo de averiguações concluídos são livremente acessíveis (…), respeitando mesmo a matéria funcional”, o que incluiu mesmo “os depoimentos prestados, os quais são determinantes para compreender a globalidade do processo e a razão por que a administração decidiu num determinado sentido”. A CADA defende apenas que devem ser “expurgados”, ou seja, rasurados a negro, os dados “irrelevantes para a concreta decisão administrativa, designadamente, moradas, números de telefone, números de identificação civil e fiscal dos intervenientes”.

    Em suma, a existência desses dados nos documentos originais não implica que aqueles possam manter-se secretos. Além disso, devem manter-se os nomes e mesmo as funções das pessoas envolvidas.

    A atribuição do processo ao juiz Carlos Alexandre terá sido executada por uma funcionária judicial sem a presença de Ivo Rosa, o outro juiz que então integrava o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). Segundo o jornal ECO, a defesa de Sócrates alega que esta funcionária que fez a distribuição “já vinha a trabalhar com Carlos Alexandre há anos” em outro tribunal, e que “não era ela que estava para ser nomeada escrivã do TCIC” em Setembro de 2014.

    De acordo com o Diário de Notícias, o juiz Carlos Alexandre terá sido entretanto constituído arguido no mês passado, depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter aceitado o requerimento de abertura de instrução apresentado por José Sócrates. Fonte judiciária adiantou também à Agência Lusa que por despacho do juiz desembargador Jorge Antunes foi ainda declarada aberta a instrução pedida por José Sócrates. O juiz Carlos Alexandre e a escrivã Maria Teresa Santos assumiram a qualidade formal de arguidos nesse processo.

  • PÁGINA UM obriga Direcção-Geral da Saúde a divulgar documentos que escondeu durante mais de quatro meses

    PÁGINA UM obriga Direcção-Geral da Saúde a divulgar documentos que escondeu durante mais de quatro meses

    A Direcção-Geral da Saúde escondeu desde Outubro o acesso aos documentos solicitados sobre os trabalhos da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTCV), mesmo após um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Disse hoje que vai disponibilizar todos os pareceres daquela entidade no seu site. Uma vitória do jornalismo sobre o obscurantismo da Administração Pública.


    Após contínuas diligências do PÁGINA UM, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) promete agora publicar a totalidade de todos os pareceres da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC) realizados no decurso da pandemia. Até agora apenas se conhece o parecer relativo às crianças, divulgado em Dezembro passado, mas nunca foi disponibilizada, nem permitido o acesso, a qualquer documentação sobre os trabalhos dessa entidade criada por Graça Freitas em Novembro de 2020.

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    A CTVC, constituída por um vasto conjunto de especialistas em medicina e epidemiologia, tem como funções, entre outras, recomendar grupos-alvo da vacinação COVID-19 e a sua priorização, e ainda propor e acompanhar o desenvolvimento de estudos sobre a vacinação e as vacinas utilizadas em Portugal.

    Esta decisão da DGS em conceder acesso universal aos documentos foi comunicada esta tarde ao PÁGINA UM, e aparenta constituir o epílogo de uma árdua e solitária “batalha” para o acesso a documentação vital para a compreensão da pandemia e a avaliação da gestão das políticas de saúde.

    E constitui sobretudo uma mudança radical desta entidade, que nunca se mostrou, até agora, favorável à prática do chamado “arquivo aberto”.

    Com efeito, o PÁGINA UM começou há quatro meses a solicitar o acesso a esta documentação, ainda quando estava a preparar o projecto jornalístico.

    Em 26 de Outubro do ano passado, foi endereçado um pedido expresso à DGS, ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos (LADA), para “acesso a todos e quaisquer pareceres técnicos, pareceres e outros documentos considerados documentos administrativos” relacionados com a CTVC.

    O PÁGINA UM referiu então que deveriam ser igualmente disponibilizados os ofícios enviados por Graça Freitas à ministra da Saúde, Marta Temido, “contendo o(s) dito(s) parecer(es) e recomendações, e também todos e quaisquer documentos escritos ou sob a forma áudio ou audiovisual de especialistas consultados pela CTVC”, bem como as actas de reuniões.

    A DGS remeteu-se ao silêncio, e o PÁGINA UM apresentou uma queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) em 11 de Novembro.

    A CADA apenas se pronunciaria em 20 de Janeiro do presente ano – 48 dias úteis após a queixa, sendo que a legislação lhe impõe um máximo de 40 dias para uma decisão –, através de um parecer em que referia que, “no quadro exposto, salvo razão para alguma não satisfação do pedido, que haverá de ser a entidade requerida [DGS] a comunicar directamente ao requerente [PÁGINA UM] deverá ser facultado o acesso” aos documentos da CTVC.

    Cópia do e-mail enviado hoje ao PÁGINA UM pela Direcção-Geral da Saúde

    Saliente-se que a DGS, que nem sequer respondera à CADA quando convidada a pronunciar-se, tinha de dar acesso ao documento ou dar uma justificação ao PÁGINA UM no prazo de 10 dias úteis, ou seja, até 3 de Fevereiro. Também nada fez.

    O PÁGINA UM também procurou saber, junto dos partidos com assento no próximo Parlamento (PS, PSD, Chega, Bloco de Esquerda, PCP, Livre e PAN), que comentários faziam sobre esta atitude de recusa da DGS, mas não obteve qualquer resposta aos e-mails enviados em 21 de Fevereiro. Nenhum, partido, note-se, mostrou interesse em ver a DGS a cumprir um parecer da CADA e a aplicar o princípio do “arquivo aberto” da Administração Pública, consagrado numa legislação criada já em 1993.

    Recorde-se ainda que o PÁGINA UM foi o único órgão de comunicação nacional que, durante a pandemia, solicitou documentação escondida pela DGS.

    Até à data, o PÁGINA UM já solicitou informação distinta, mas bastante detalhada, em oito situações concretas, invocando sempre a LADA. Com excepção de um pedido ainda com o prazo legal de 10 dias em curso, a directora-geral da Saúde tem optado até agora, e de forma sistemática, em indeferir tacitamente – isto é, opta por manter o obscurantismo da Administração Pública, e nem sequer responde.

    A abertura agora da DGS em disponibilizar os documentos da CTVC, após todas as diligências do PÁGINA UM, pode ser assim o princípio de uma nova era.

  • Ordem dos Médicos extingue o seu gabinete de crise. PÁGINA UM foi ver quanto ganharam das farmacêuticas os seus 10 membros

    Ordem dos Médicos extingue o seu gabinete de crise. PÁGINA UM foi ver quanto ganharam das farmacêuticas os seus 10 membros

    O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, decidiu esta semana decretar o fim do gabinete de crise dedicado à covid-19. O PÁGINA UM foi escrutinar quanto receberam da indústria farmacêutica, durante a pandemia, os seus 10 membros, a saber: Filipe Froes (coordenador), António Sarmento, Carlos Robalo Cordeiro, José Poças, Ana Maria Correia, Ricardo Mexia, António Diniz, António Vaz Carneiro, Vítor Almeida e Patrícia Pacheco.


    Sete dos 10 médicos que integraram o Gabinete de Crise contra a Covid-19 da Ordem dos Médicos – extinto esta semana pelo bastonário Miguel Guimarães – receberam verbas de farmacêuticas durante a pandemia, totalizando, no conjunto 200.551 euros, de acordo com o Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed.

    De entre os elementos designados por este grupo de trabalho – que teve o pneumologista Filipe Froes como coordenador e seu membro mais activo –, apenas António Sarmento (director de infecciologia do Hospital de São João e primeiro português a ser vacinado contra a covid-19), Ana Maria Correia (directora da delegação do Porto do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge) e Vítor Almeida (médico no Hospital de Viseu) não receberam desde 2020 qualquer verba de farmacêuticas ou outras entidades associadas ao mundo dos medicamentos.

    António Vaz Carneiro, professor catedrático jubilado da Faculdade de Medicina de Lisboa e presidente do Instituto de Saúde Baseada na Evidência, também pode ser incluído nesse grupo: apenas recebeu 226 euros da Grünenthal para um webinar no ano passado.

    Miguel Guimarães (à direita), urologista e bastonário da Ordem dos Médicos, ao lado de Carlos Robalo Cordeiro, sendo galardoado com a medalha do Congresso de Pneumologia do Centro-Ibérico, em Setembro do ano passado

    Já quanto aos outros seis, os montantes vão desde os 6.123 euros recebidos por Ricardo Mexia – antigo líder da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública e actual presidente da Junta de Freguesia do Lumiar – até aos 113.405 euros do pneumologista Filipe Froes, um dos médicos com maiores ligações ao mundo farmacêutico.

    Médico no Hospital Pulido Valente e consultor da Direcção-Geral da Saúde (DGS) – integrando a equipa que definiu as terapêuticas e escolheu os fármacos a usar nos internados por covid-19 –, Filipe Froes arrecadou mais de 380 mil euros do sector farmacêutico desde 2013.

    Nos anos da pandemia, a partir de 2020, contabilizou já 113.405 euros, com a Merck Sharp & Dohme (23.850 euros) à cabeça, seguindo-se a Pfizer (21.852 euros) – produtora de vacinas contra a covid-19 – e a Sanofi (20.301 euros), produtora de vacinas contra a gripe. Froes também recebeu 13.030 euros da Gilead – fabricante do remdesivir, do qual foi consultor – e 8.250 euros da AstraZeneca, outra produtora de vacinas contra a covid-19. Durante a pandemia, Filipe Froes – uma das mais reconhecidas personalidades ouvidas pelos media – estabeleceu relações comerciais com 14 farmacêuticas.

    Valores recebidos pelos membros do Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos das farmacêuticas desde 2020. Fonte: Infarmed.

    Também Carlos Robalo Cordeiro – antigo presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia e actual director da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar desta cidade – teve também boas relações com as farmacêuticas, enquanto integrou o gabinete da Ordem dos Médicos.

    Quer a título pessoal quer através da sua empresa por quotas (Robalo Cordeiro, Lda.), este pneumologista recebeu, desde 2020, um total de 37.664 euros de uma dezena de farmacêuticas, entre as quais a Sanofi (7.128 euros), a Boehringer Ingelheim (6.690 euros) e a Merck Sharp & Dohme (5.957 euros). No seu portefólio estão também a AstraZeneca (3.854 euros) e a Pfizer (2.664 euros). Robalo Cordeiro foi recentemente eleito presidente da European Respiratory Society, onde não surge, à data de hoje, ainda qualquer menção a conflitos de interesse, apesar de os ter.

    Quanto ao pneumologista António Diniz – que chegou a presidir à estrutura hospitalar de contingência para a cidade de Lisboa (EHCL), durante a primeira vaga da pandemia – teve igualmente boas relações com as farmacêuticas enquanto andou pelo gabinete de crise da Ordem dos Médicos. Desde 2020, amealhou do sector farmacêutico um total de 20.185 euros, dos quais 8.258 euros da Gilead, tendo sido consultor desta farmacêutica para o remdesivir. E, claro, também recomendou, como membro da equipa de consultores da DGS, este ineficaz fármaco – que custou cerca de 20 milhões de euros aos cofres do Estado – como terapêutica anti-covid.

    Outro dos elementos do gabinete de crise foi José Poças, director de serviços no Hospital de Setúbal, que conseguiu encontrar tempo para consultadorias a três farmacêuticas: a ViiVHIV (uma subsidiária da GalxoSmithKline, da qual recebeu 8.854 euros), a incontornável Gilead (6.390 euros) e a AbbVie (1.353 euros). No total, levou para casa em tempos de pandemia mais 16.597 euros.

    Por fim, ambos com recebimentos na casa dos 6.000 euros, encontramos Patrícia Pacheco (infecciologista no Hospital Amadora-Sintra) e Ricardo Mexia. No primeiro caso, esta médica recebeu sobretudo apoios da ViiVHIV (5.836 euros), a que acresceram somente mais 350 euros da Gilead e 125 euros da Merck Sharp & Dohme.

    Filipe Froes (primeiro a contar da esquerda) e António Diniz (terceiro) durante um evento na Ordem dos Médicos sobre a pandemia, organizada em parceria com uma empresa de comunicação.

    Já Ricardo Mexia – que foi também uma das figuras mais mediáticas durante a pandemia – teve relações comerciais com três farmacêuticas em eventos pontuais: Merck Sharp & Dohme (2.200 euros), Gilead (1.875 euros) e Pfizer (548 euros). Recebeu ainda 1.500 euros de uma consultora, a Exigo, que coordena a Pharmascientic, uma rede científica das farmácias hospitalares.

    No total, para os especialistas do extinto Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos, todos muito próximos de Miguel Guimarães, a Merck Sharp & Dohme – que perdeu a “corrida para as vacinas”, mas tinha grandes esperanças em comercializar um anti-viral contra a covid-19 (o molnupiravir) – foi a farmacêutica com mais apoios (41.298 euros), seguindo-se a Gilead – interessada no negócio do remdesivir, com 29.902 euros – e a Sanofi (27.429 euros), que acabou também por beneficiar indirectamente com a pandemia, porquanto, mesmo com o “desaparecimento” da gripe aumentou as vendas da vacina quadrivalente contra o vírus influenza. A Pfizer e a AstraZeneca gastaram 25.064 e 12.104 euros, respectivamente.

  • Comissão Europeia ‘inundada’ de comentários sobre polémica extensão do certificado digital da covid-19

    Comissão Europeia ‘inundada’ de comentários sobre polémica extensão do certificado digital da covid-19

    Como habitualmente, antes da aprovação de regulamentos, a Comissão Europeia lança uma consulta pública aos cidadãos. Por regra, as iniciativas contam com nula ou escassa participação. Desta vez, com a intenção de manter os certificados digitais por mais um ano, os comentários multiplicam-se: são já 130 vezes mais do que os da segunda iniciativa com maior participação. E ainda faltam mais de 40 dias para a consulta terminar.


    A intenção da Comissão Europeia em prolongar a vigência do certificado digital da covid-19, neste momento em fase de consulta pública, está a sofrer uma contestação jamais vista. De acordo com os registos no site desta entidade, foram já registadas, até às 20 horas de hoje, um total de 61.532 comentários. A consulta pública foi iniciada no passado dia 3 e prolongar-se-á até 8 de Abril.

    Em causa está a alteração do regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que criou, em Junho do ano passado, “um regime para a emissão, regime para a emissão, verificação e aceitação de certificados interoperáveis de vacinação, teste e recuperação da COVID-19 (Certificado Digital COVID da UE)”, com o objectivo de “facilitar a livre circulação de pessoas durante a pandemia”.

    Estes certificados acabaram, contudo, por ser usados pelos diversos Estados-membros, incluindo Portugal, para sobretudo discriminar não-vacinados (mesmo se recuperados há mais de seis meses) no acesso a determinados espaços.

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    A Comissão von der Leyen assume na nova proposta, que visa prolongar por mais um ano este documento digital, que a sua existência contribuiu decididamente para o aumento das taxas de vacinação. Recorde-se que a União Europeia, em conjunto, já comprou vacinas às farmacêuticas até 2023.

    Tendo em conta que as vacinas afinal não evitam a infecção e a covid-19 se está a tornar endémica, sobretudo com o surgimento da variante Omicron, a proposta da Comissão Europeia está longe de ser pacífica.

    Logo na primeira semana de consulta pública, o site da Comissão Europeia recebeu cerca de 24 mil comentários, então com particular destaque dos italianos. Contudo, nas últimas duas semanas, a participação aumentou substancialmente e alargou-se o espectro geográfico. Neste momento, os comentários provenientes da Itália são já apenas 28% do total, tendo a França (23%), Holanda (21%), Alemanha (8%) e Bélgica (7%) ganhado relevância.

    A maioria dos comentários é de cidadãos da União Europeia, mas também já deram opinião mais de duas centenas de empresas, 53 universidades, 37 entidades públicas, 56 organizações não-governamentais, de consumidores e de ambiente, entre outras. A participação de portugueses ainda é pouco significativa: apenas 839 comentários (1,4% do total). No dia 15 deste mês eram 451.

    Embora seja praticamente impossível apresentar uma estatística detalhada, mostra-se notório um claro sentimento contrário às pretensões da Comissão Europeia, com quase todas as opiniões a centrarem-se no carácter anticonstitucional, segregacionista e ineficaz, como instrumento de controlo da pandemia, do certificado digital.

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    Contudo, o maior destaque desta consulta pública – que consubstancia a polémica que encerra – é a desmesurada participação pública.

    Com efeito, actualmente, a Comissão Europeia tem em curso 91 iniciativas legislativas que versam as mais variadas temáticas, nomeadamente finanças, economia, agricultura, alimentação, transportes, direitos humanos e igualdade, energia e ambiente.

    Uma parte considerável (53 em 90) têm menos de uma dezena de comentários. Muitas nem sequer recebem ainda uma única opinião, mesmo se o tema é relevante. É o caso, por exemplo, da avaliação da Directiva Igualdade Racial ou da revisão das regras macroprudenciais para limitar o risco sistémico – ou seja, para reduzir uma nova crise financeira.

    De resto, apenas 10 iniciativas tiveram, até agora, mais de uma centena de comentários, grande parte das quais relacionadas com alimentação, energia e ambiente, que são historicamente temáticas com activa participação pública.

    Contudo, a distância é colossal face à participação pública sobre os certificados digitais.

    Com efeito, de acordo com os dados da Comissão Europeia, a revisão do regulamento de rotulagem de alimentos é a segunda iniciativa com maior número de comentários (472), seguindo-se um diploma sobre os processos de concessão de licenças e contratos de aquisição de energia renovável (341) e a revisão do regulamento REACH sobre substâncias tóxicas (325).

    Na verdade, a participação pública sobre a extensão dos certificados digitais é, neste momento, quase 60 vezes superior à de todas as outras 90 iniciativas juntas. E ainda faltam 43 dias para terminar a consulta. A Comissão Europeia refere que “todos os comentários recebidos serão resumidos (…) e apresentados ao Parlamento Europeu e ao Conselho a fim de contribuir para o debate legislativo”.

  • Bebés em países ricos só podem ter 7% da ‘pegada ecológica’ dos avós

    Bebés em países ricos só podem ter 7% da ‘pegada ecológica’ dos avós

    A Revolução Verde, nas próximas décadas, será sobretudo tecnológica para manter o conforto civilizacional. Uma coisa é certa: as crianças nascidas nesta década terão de reduzir o seu impacte ambiental, em especial nos países mais ricos. A Agência Internacional de Energia garante que haverá vantagens económicas.


    Para se conseguir uma neutralidade carbónica (Net Zero) no meio deste século, quem nasceu há dois anos terá de reduzir em 90% a sua pegada ecológica ao longo da vida em comparação com a de um seu avô que começou a ver a luz dia em 1950, segundo estimativas da Agência Internacional de Energia (AIE).

    Esta redução a pique do impacte dos nossos comportamentos, medido em emissões de dióxido de carbono (CO2), constitui uma das metas fixadas pela União Europeia UE, e vai implicar uma mudança radical nos hábitos de produção e consumo de energia.

    As contas da AIE indicam que enquanto, em média, uma pessoa nascida na década de 1950 emitirá, durante a sua vida, 350 toneladas de CO2, as crianças nascidas na actual década só poderão chegar às 34 toneladas, se se pretender mesmo alcançar a desejada neutralidade carbónica.

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    Para a chamada geração Z, que abrange as pessoas nascidas entre 1997 e 2012, estima-se que as emissões sejam, em média, de 110 toneladas por habitante. A redução que agora se “exige” às novas gerações advém da necessidade de encontrar um equilíbrio entre as actividades humanas e a capacidade inata da Natureza em anular os seus impactes.

    Nos países com emissões per capita historicamente elevadas, na América do Norte e na Europa, serão exigidas reduções geracionais muito maiores do que em regiões menos desenvolvidas. A AIE refere que até 2050, as pegadas de CO2 de cada pessoa nascida na década de 1950 nos Estados Unidos ou na União Europeia será de 695 toneladas de CO2, cerca de 14 vezes maiores do que as pegadas dos seus descendentes nascidos na década de 2020, que emitirão, em média, 51 toneladas ao longo das suas vidas.

    Em comparação, por exemplo, as pessoas nascidas na Índia na década de 1950 emitirão apenas 3,5 vezes mais CO2 do que os descendentes nascidos na década de 2020, enquanto na China esse rácio é de quatro.

    O principal objectivo do Net Zero é limitar o aumento médio da temperatura global a apenas 1,5 graus centígrados em relação aos níveis pré-industriais, de forma a evitar um agravamento dos efeitos do aquecimento global. Esta ambição requererá uma autêntica revolução do paradigma energético.

    Emissões médias globais de CO2 ao longo da vida per capita por década de nascimento no Cenário Zero Líquido, 1950-2020. Fonte: IEA.

    Até meio deste século, de acordo com o relatório “Net Zero by 2050 – A Roadmap for the Global Energy Sector”, da responsabilidade da AIE, o investimento mundial por ano necessário em “energias limpas“ deverá ser mais do triplo do valor actual, ou seja, tem de chegar aos 3,5 biliões (milhão de milhões) de euros por ano.

    Essa será uma aposta fundamental para diminuir a dependência energética em combustíveis fósseis (como as gasolinas, carvão e gás natural), que deverão reduzir a sua quota global dos actuais 80% do consumo total para apenas 20% em 2050. Para manter os mesmos padrões de conforto, a solução tem mesmo de passar por uma mudança de paradigma, numa maior aposta nas energias renováveis, como a eólica e a fotovoltaica.

    A almejada neutralidade carbónica também obrigará a que os carros ditos “normais“ (diesel e gasolina) cedam, progressivamente, o seu lugar às versões eléctricas. As vendas de carros eléctricos terão, contudo, de crescer 18 vezes entre 2020 e 2030. Um salto quase “estratosférico”, dado que “obrigará”, numa só década, que as vendas anuais da ordem dos 3 milhões de unidades subam para quase 60 milhões. Em suma, daqui a oito anos, os carros ecológicos terão de representar 60% do total de vendas.

    Emissões de CO2 ao longo da vida per capita por década de nascimento em economias avançadas no Cenário Zero Líquido, 1950-2020. Fonte: IEA.

    Este objectivo mostram-se extremamente ambicioso, mesmo se as vendas dos carros ecológicos aumentaram já bastante no último ano, atingindo 6,6 milhões de unidades, quando em 2020 se cifrara em três milhões. Se esse ritmo absoluto de crescimento se mantiver apenas se venderão 39 milhões de euros em 2030.

    Em todo o caso, prevê-se que esta autêntica Revolução Verde seja bastante benéfica para e Economia em geral. A AIE estima a criação de 30 milhões de novos postos de trabalho por actividades e investimentos ligados às energias limpas. No entanto, estas oportunidades serão em sectores e locais diferentes, exigindo, outro tipo de competências. Em contrapartida, serão perdidos cerca de cinco milhões de empregos, frequentemente bem pagos, associados a tecnologias consideradas obsoletas.

    A AIE acredita que a tendência quase generalizada de crescimento económico nas últimas décadas não será comprometida por um mundo mais ecológico. No cenário hipotético do relatório “Net Zero Emissions by 2050”, formulado por aquela agência, a economia global duplicará entre 2020 e 2050.

    Se atentarmos aos valores absolutos de emissões de dióxido de carbono por cada país, obtemos um ranking diferente do que teríamos se calculássemos a pegada carbónica per capita. Utilizando o primeiro critério, a China é, indubitavelmente, o país que mais polui. Segundo as estatísticas da British Petroleum (BP) relativas ao ano de 2020, este país era responsável pela libertação de 9,9 mil milhões de toneladas de CO2 para a atmosfera (30,7% do total global). Seguiam-se os Estados Unidos, com 4,4 mil milhões (14%), e a Índia, com 2,3 (7%).

    No panorama europeu, a Alemanha lidera a lista dos países mais poluentes, devido à sua forte dependência do carvão. Com efeito, no início desta década, mais de 25% do total de emissões de CO2 da União Europeia, englobando 27 Estados-membros, provinha daquele país.

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    Se, por outro lado, aplicarmos o critério das emissões de CO2 por cada habitante, a Ásia Ocidental assume a liderança, com destaque para países com grandes reservas petrolíferas como Qatar, Kuwait e Arábia Saudita.

    Tendo em conta a sua pequena dimensão, Portugal emitiu cerca de 41 mil milhões de toneladas de CO2 em 2020, perfazendo apenas 0,1% da “pegada” global. Mas, a reboque da “emergência climática”, o governo de António Costa pretende que este saldo passe a ser neutro ainda antes de 2050, o prazo definido pela UE. Em Novembro passado, o Partido Socialista apresentou na Assembleia da República uma proposta para se antecipar a meta da neutralidade carbónica já para 2045.

    No ano passado, em Portugal, as energias renováveis estiveram na origem de mais de metade (59%) do consumo de electricidade no nosso país. A energia eólica e a hidroeléctrica estiveram em destaque, representado 26% e 27%, respectivamente. Apenas 3,5% do consumo foi proveniente de energia solar fotovoltaica, mas o uso desta tecnologia cresceu em 37% face ao ano anterior.

    De acordo com dados da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN), no mês passado Portugal foi o quarto país da Europa com maior taxa de incorporação de energias renováveis na produção de electricidade (59,7%), atrás da Noruega, Dinamarca e Áustria.

    Texto editado por Pedro Almeida Vieira

  • Supremo Tribunal de Justiça espetou três placas fora da lei em pleno Monumento Nacional

    Supremo Tribunal de Justiça espetou três placas fora da lei em pleno Monumento Nacional

    A caminhar para os dois séculos de implantação da sede no Terreiro do Paço, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu identificar-se agora melhor através de três gigantes placas em acrílico e alumínio, “pregadas” em plenas arcadas de um Monumento Nacional. A Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) diz ter sido apenas “informalmente” informada da pretensão, mas não concedeu qualquer autorização. Uma ilegalidade certa numa decisão de gosto estético muito duvidoso.


    Olha-se e não se acredita. O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) lembrou-se, ao fim de quase 188 anos de existência na ala nordeste da Praça do Comércio, de mandar espetar três placas identificativas entre as colunas das arcadas de um Monumento Nacional. E sem autorização da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), contrariando o que manda a lei.

    O STJ é uma instituição judicial que trata dos recursos em processo penal e civil em última instância, tendo poder também em julgar o presidente da República, presidente da Assembleia da República e primeiro-ministro, por crimes praticados no exercício das suas funções, e ainda de juízes e magistrados do Ministério Público dos tribunais superiores.

    Embora o Terreiro do Paço – denominação popular que advém da existência do antigo Paço Real, destruído pelo terramoto de 1755 – já não seja agora o centro do poder do país, estando já ocupado por muitos estabelecimentos comerciais, como restaurantes e hotéis, o STJ não é um deles. E nem tem, no sentido estrito do termo, porta aberta ao público.

    No século XVIII lisboeta, não havia acrílicos nem alumínios.

    As placas agora colocadas na ala nordeste na oficialmente chamada Praça do Comércio, a identificar o STJ, são visivelmente mais intrusivas nas colunas do que as de alguns restaurantes ao longo dos edifícios do lado nascente e poente, todos integrados no conjunto arquitectónico do Monumento Nacional, classificado em 16 Junho de 1910, pouco antes da queda da Monarquia.

    A única placa semelhante às do STJ encontra-se no extremo oposto da Ala Nordeste, e identifica a Pousada Lisboa, do grupo turístico Pestana. Tal como as placas do STJ, é formada por uma estrutura transparente com barras de metal fixas nas colunas centenárias. Se no caso da pousada ainda se pode argumentar a necessidade comercial de informar o público, o mesmo não se pode dizer do STJ. Além disso, há muito que esta instituição judicial tem a devida identificação na parte superior da vetusta porta principal.

    As três placas do STJ provocam ainda um notório desequilíbrio arquitectónico da ala nordeste, fronteira às instalações do Ministério da Justiça na ala vizinha. E, aí, não houve qualquer necessidade de colocar placas como aquelas que o STJ achou agora por bem pregar.

    Supremo Tribunal de Justiça não quis ficar atrás de hotel e restaurante e encheu arcaria. Ninguém autorizou.

    Para além de não terem grande utilidade informativa, e tirarem o equilíbrio paisagístico/arquitectónico a uma das mais belas praças mundiais, visitada diariamente por milhares de turistas, as placas não obtiveram a devia autorização da entidade máxima da gestão do património português: a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), tutelada pelo Ministério da Cultura.

    Esta entidade tem a incumbência de supervisionar e autorizar a conservação de monumentos, imóveis ou conjuntos de imóveis e sítios de interesse público ou municipal de âmbito cultural, baseando a sua acção sobretudo através de uma lei de bases do início do presente século (Lei 107/2001 de 8 de Setembro). E é aí que a acção do STJ se mostra e demonstra contrária à lei.

    Por exemplo, no número 2 do artigo 11º determina-se que “todos têm o dever de defender e conservar o património cultural, impedindo, no âmbito das faculdades jurídicas próprias, em especial, a destruição, deterioração ou perda de bens culturais”.

    1, 2, 3… e, nesta ala, ainda estão oito arcos livres de acrílicos e alumínios.

    É um artigo vago, mas o artigo 41º já parecer ser muito mais explícito. Referente a “Inscrições e afixações”, estabelece que “é proibida a execução de inscrições ou pinturas em imóveis classificados” acrescentando ser igualmente proibida “a colocação de anúncios, cartazes ou outro tipo de material informativo fora dos locais ali reservados para a exposição de elementos de divulgação das características do bem cultural e das finalidades e realizações a que corresponder o seu uso, sem autorização da entidade responsável pela classificação”.

    Ainda noutro artigo, o 45º, referente a “Projectos, obras e intervenções”, prevê-se que “os estudos e projectos para as obras de conservação, modificação, reintegração e restauro em bens classificados, ou em vias de classificação, são obrigatoriamente elaborados e subscritos por técnicos de qualificação legalmente reconhecida ou sob a sua responsabilidade directa”, acrescentando-se ainda que, “concluída a intervenção, deverá ser elaborado e remetido à administração do património cultural competente um relatório de onde conste a natureza da obra, as técnicas, as metodologias, os materiais e os tratamentos aplicados, bem como documentação gráfica, fotográfica, digitalizada ou outra sobre o processo seguido”.

    Por fim, no artigo 51º, referente a “intervenções”, é frisado que “não poderá realizar-se qualquer intervenção ou obra, no interior ou no exterior de monumentos, conjuntos ou sítios classificados, nem mudança de uso susceptível de o afectar, no todo ou em parte, sem autorização expressa e o acompanhamento do órgão competente da administração central, regional autónoma ou municipal, conforme os casos”.

    Embutido em pedra.

    Ora, segundo informações recolhidas pelo PÁGINA UM junto da DGPC, o STJ terá solicitado em Agosto do ano passado, e apenas “informalmente” – leia-se, sem ser por ofício ou outro documento administrativamente válido –, uma “posição sobre a adequabilidade de uma proposta de sinalética exterior de identificação da instituição, a colocar nas arcadas da Praça do Comércio, segundo uma solução similar a uma outra colocada nas proximidades”.

    Acontece que a DGPC nem sequer se tinha pronunciado relativamente a qualquer suposta “solução de referência” e “não concordava com as soluções existentes no local nas alas nascente e poente da praça”, apesar de nada ter feito para alterar a situação. Em causa estarão as placas que identificam os estabelecimentos comerciais a funcionar nos pisos térreos dos três edifícios que compõem o conjunto arquitectónico do Terreiro do Paço, que remontam ao tempo da reconstrução da Baixa Pombalina.

    Acrescenta ainda que o organismo estatal até “desconhecia a existência de um plano ou normas gerais para o local por parte do Município de Lisboa, pelo que diz agora ter “solicitado à Câmara Municipal de Lisboa (CML), via e-mail de 25 de Agosto de 2021, os esclarecimentos tidos por conveniente sobre a matéria”. A resposta da autarquia chegou a 7 de Setembro, através da Divisão de Gestão de Projetos do Espaço Público, informando que “as questões colocadas seriam da competência dos serviços de licenciamento do município, pelo que não haveria possibilidade de aferição da situação”.

    Independentemente disto, a DGPC afirmou ao PÁGINA UM que, embora informada sobre a pretensão do STJ, “não emitiu qualquer parecer prévio e vinculativo sobre a sinalética colocada, atendendo à classificação da Praça do Comércio enquanto Monumento Nacional, através do Decreto de 16/06/1910”. E diz ainda ter solicitado “os devidos esclarecimentos junto do STJ e da CML”.

    O PÁGINA UM pediu ao STJ que explicitasse as diligências tomadas junto da DGPC, e se estaria em condições de garantir que a colocação das placas seguiu os preceitos legais determinados pela lei do património culturais. No dia 9 deste mês, os serviços de Comunicação do STJ responderam que “estamos a recolher todos os elementos relacionados com o assunto”. Uma semana mais tarde, após insistência, repetiu a mesma resposta.

    Também a Câmara de Municipal de Lisboa foi contactada pelo PÁGINA UM. Fonte da vereação da Cultura remeteu a explicação para a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior. Contactada esta edilidade, liderada pelo socialista Miguel Coelho, foi dito que, dadas “as especificidades do local, um Monumento Nacional, e sendo uma placa de identificação institucional, e não de publicidade, a Junta não tem competências de autorização”. De igual modo, a Pousada Pestana – que pregou placa similar à do STJ – não respondeu ao pedido de esclarecimentos do PÁGINA UM.