Categoria: Sociedade

  • Judiciária já gastou 342 mil euros porque ex-funcionários do SEF não levaram computadores

    Judiciária já gastou 342 mil euros porque ex-funcionários do SEF não levaram computadores


    A reestruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) estava há muito anunciada, em consequência do trágico homicídio em 2020 de um ucraniano no aeroporto de Lisboa, e foi aprovada na Assembleia da República em Novembro de 2021. Mas somente no final de 2022 começou a ser gizada a sua substituta, a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), que entrou em funções no passado dia 29 de Outubro.

    Mas a AIMA não foi criada para ser um mero rebranding: as competências dos SEF foram redistribuídas por outras entidades já existentes. E, claro, houve ‘dança de cadeiras’. Um total de 740 funcionários do ex-SEF passaram para a sua sucessora natural, a AIMA, mas, por exemplo, o controlo das fronteiras passou a ser uma incumbência da GNR e da PSP, sendo que esta segunda ficou com a competência da gestão dos centros de instalação temporária nos aeroportos de Lisboa, Porto e Faro.

    Além dos funcionários que transitaram para a GNR e PSP, também o Instituto dos Registos e Notariado (IRN), a Autoridade Tributária e a Polícia Judiciária receberam funcionários. No caso desta última, foi anunciada a transferência de 789 profissionais da Carreira de Inspecção e Fiscalização do SEF, a que acrescem mais cinco elementos da Carreira de Vigilante e Segurança.

    No caso da Polícia Judiciária, se é certo que foram transferidos os funcionários do ex-SEF, aparentemente não levaram nada com eles dos seus antigos escritórios. Computadores, por exemplo. E daí que na última semana a Polícia Judiciária fez dois chorudos ajustes directos para a compra de equipamentos informáticos. No dia 21 foram adquiridos 45 computadores à T.A.D. – Equipamentos de Informática no valor de 72.126 euros; e no dia 27 foram mais 150 à Pamafe Informática no valor de 205.500 euros. No total, considerando o IVA, por 195 computadores, a Polícia gastou já 341.480 euros. Nenhum dos dois contratos celebrados foi reduzido a escrito.

    O PÁGINA UM tentou saber junto da AIMA, presidida por Luís Goes Pinheiro, se existe um inventário de bens e equipamentos, incluindo computadores, que estavam adstritos ao SEF, e qual o seu destino. Não se obteve resposta.

    O PÁGINA UM também questionou a Polícia Judiciária para receber esclarecimentos sobre estas compras, classificadas como urgentes, e por essa razão, feitas por ajustes directos sem contrato escrito. Não se obteve resposta nem informações sobre quantas mais compras similares haverá para apetrechar os ex-funcionários do SEF com os mesmos equipamentos que tinham antes da criação da AIMA. E não se sabe quem decidiu escolher especificamente as duas empresas de venda de computadores, e a razão para serem 45 a uma e 150 a outra. Incógnitas a precisar de investigação…

    closeup photo of computer keyboard

    Por fim, o PÁGINA UM questionou, igualmente, o Ministério da Administração Interna, liderado por José Luís Carneiro, sobre o destino dos equipamentos e bens do SEF. Não se obteve resposta.

    Um dos contratos de compra de equipamentos informáticos pela Polícia Judiciária integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos de ontem, que agregou os contratos divulgados no dia 27 de Novembro no Portal Base. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo. Consulte em baixo a súmula dos contratos divulgados em 28 de Novembro.

    PAV / MAP


    Ontem, dia 28 de Novembro, no Portal Base foram divulgados 885 contratos públicos, com preços entre os 3,18 euros – para aquisição de contraceptivos, pela Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, ao abrigo de acordo-quadro – e os 4.701.891,43 euros – para fornecimento de energia eléctrica em baixa tensão normal, pelo Município de Viana do Castelo, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 14 contratos, dos quais seis por concurso público, quatro ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 17 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Município do Porto (com a Protecção Total – Segurança Privada, no valor de 1.438.576,30 euros); Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental (com a Alexion Pharma, no valor de 887.816,80 euros); REN – Gasodutos (com a Sondagens do Oeste, no valor de 689.500,00 euros); Município de Lisboa (com a Vodafone Portugal, no valor de 591.516,34 euros); Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (com a Alexion Pharma, no valor de 399.517,56 euros); Ministério da Defesa Nacional – Marinha (com a NTG, Lda., no valor de 331.996,00 euros); Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (com a Rrts Unipessoal, no valor de 327.000,00 euros); Infraestruturas de Portugal (com a Spacetec Datengewinnung GmbH, no valor de 303.247,71 euros); Centro Hospitalar e Universitário de São João (com a Getinge Group, no valor de 247.756,00 euros); Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Sintra (com a Tecnirede, Comunicação de Dados, no valor de 147.987,20 euros); Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento dos Municípios de Oeiras e Amadora (com a EPAL – Empresa Portuguesa das Águas Livres, no valor de 146.000,00 euros); Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (com a Quilaban, no valor de 145.908,15 euros); Estado-Maior do Exército (com a EID – Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Electrónica, no valor de 132.258,00 euros); dois do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (ambos com a Gilead, no valor de 130.800,00 euros); Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária (com a Eco-Partner – Consultoria e Projectos Ambientais, no valor de 110.025,00 euros); e o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (com a Luso-Ambulâncias – Serviços Médicos, no valor de 101.769,30 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 28 Novembro (todos os procedimentos):

    1 Fornecimento de energia elétrica em baixa tensão normal (BTN) por lotes

    Adjudicante: Município de Viana do Castelo

    Adjudicatário: Endesa Energia

    Preço contratual: 4.701.891,43 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Aquisição de serviços de recolha bilateral, lavagem de equipamentos e transporte de resíduos urbanos

    Adjudicante: Município do Barreiro

    Adjudicatário: Rede Ambiente – Engenharia e Serviços     

    Preço contratual: 3.960.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de medicamentos      

    Adjudicante: Hospital Divino Espírito Santo de Ponta Delgada

    Adjudicatário: Sanofi 

    Preço contratual: 2.957.097,74 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    4Aquisição de combustíveis rodoviários para a frota municipal

    Adjudicante: Município do Seixal

    Adjudicatário: Lubrifuel, Lda.

    Preço contratual: 2.275.608,37 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Serviços de vigilância e segurança humana e de ronda móvel

    Adjudicante: Município do Porto

    Adjudicatário: Protecção Total – Segurança Privada

    Preço contratual: 1.438.576,30 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 28 de Novembro

    1 Serviços de vigilância e segurança humana e de ronda móvel

    Adjudicante: Município do Porto

    Adjudicatário: Protecção Total – Segurança Privada

    Preço contratual: 1.438.576,30 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental

    Adjudicatário: Alexion Pharma

    Preço contratual: 887.816,80 euros


    3Recondicionamento urgente de tubagem com perda de espessura e fissuras

    Adjudicante: REN – Gasodutos

    Adjudicatário: Sondagens do Oeste S.A.    

    Preço contratual: 689.500,00 euros


    4Aquisição de serviços de telecomunicações

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Vodafone Portugal

    Preço contratual: 591.516,34 euros


    5Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

    Adjudicatário: Alexion Pharma

    Preço contratual: 399.517,56 euros

    MAP

  • Paxlovid: Governo usou norma revogada para contrato secreto de 20 milhões com a Pfizer

    Paxlovid: Governo usou norma revogada para contrato secreto de 20 milhões com a Pfizer


    Foi mais um dos fármacos apontados como miraculoso durante a pandemia, e não se olhou a ‘burocracias’ nem a dinheiro. O Paxlovid, um antiviral da Pfizer, chegou apenas em 2021, mas rapidamente foi promovido por ‘peritos’, acabando também comprado pelo Governo português. Já se sabia que estaria a ser usado no país desde 2022, mas ignoravam-se pormenores sobre este fármaco que afinal causa um número elevado de recaídas. Na sexta-feira passada, no Portal Base surgiu finalmente informação demonstrativa de um modus operandi obscuro: a compra foi formalizada pela Direcção-Geral da Saúde em Dezembro do ano passado, há mais de 11 meses, custou 20 milhões de euros e para não haver contrato escrito nem caderno de encargos invocou-se o expediente de uma norma legal já revogada. A Pfizer, que vê esfumarem-se os anos de glória financeira, ‘agradece’ a falta de transparência.


    O Governo escondeu durante mais de 11 meses uma compra de quase 20 milhões de euros do fármaco Paxlovid, um antiviral de administração oral de eficácia muito duvidosa no combate à covid-19. A aquisição à Pfizer, feita pela Direcção-Geral da Saúde, somente surgiu na sexta-feira passada, mas a data do contrato no valor de 19.950.000 euros é de 31 de Dezembro do ano passado, constando apenas informação sintética sem qualquer contrato, alegadamente por ter sido feito por ajuste directo simplificado.

    Para o recurso ao regime de excepção do ajuste directo simplificado – que permite assim esconder os preços unitários, as quantidades adquiridas, as fases de entrega, as eventuais compras futuras e as possibilidades de devoluções por não administração –, o Governo invocou, sem justificar, um decreto-lei de Março de 2020 que estabeleceu “medidas excepcionais e temporárias” com a intenção de agilizar as compras urgentes de equipamentos, materiais e medicamentos contra o SARS-CoV-2.

    Paxlovid, um antiviral com contratos pouco claros.

    Porém, há um problema legal que o Portal Base desvenda: esse diploma (Decreto-Lei nº 10-A/2020) viu a parte respeitante ao “regime excepcional de ajuste direto simplificado” ser revogado no dia 30 de Setembro do ano passado, que fez cessar a vigência de dezenas de normas legais criadas pelo Governo socialista desde o início da pandemia. Ou seja, o Ministério da Saúde, através da DGS, jamais poderia contratualizar o Paxlovid usando um expediente que prescinde de procedimentos de contratação pública e omite informação sobre compras de milhões de euros.

    No entanto, em abono da verdade, até a data do contrato que consta agora no Portal Base poderá ser falsa. Com efeito, além desta compra de 20 milhões de euros do antiviral da Pfizer com data de 31 de Dezembro de 2022, não surge mais nenhuma na plataforma da contratação pública, mas o Infarmed revelara em Julho do ano passado – portanto, cinco meses antes – que o país tinha então “em stock 9.975 unidades do antiviral oral Paxlovid, de um total de 30 mil tratamentos adquiridos para este ano, dos quais foram já entregues em território nacional 10.000 unidades”. Ou seja, ou a data da celebração do contrato entre a DGS e a Pfizer é falsa ou então a Pfizer entregou fármacos à discrição sem qualquer acordo comercial prévio.

    Saliente-se que, no Verão do ano passado, o Infarmed também informara que também tinham sido adquiridas 5.000 unidades de Lagevrio à Merck Sharp & Dohme (MSD), mas não consta ainda qualquer contrato no Portal Base. Este fármaco da MSD, cujo princípio activo se denomina molnupiravir, acabou por ser retirado do mercado por ser ineficaz em Julho passado. O regulador liderado por Rui Santos Ivo também revelara que estava então em curso a aquisição de 1.728 tratamentos de Evushled e 300 de Xevudy, dois anticorpos monoclonais bastante caros com aprovação apressada pela Agência Europeia do Medicamento.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde, mantém como política habitual o total e absoluto obscurantismo sobre contratos associados à pandemia que envolvem muitos milhões de euros.

    O primeiro destes fármacos, comercializado pela AstraZeneca, acabou por ser comprado em Novembro do ano passado, custando 695 mil euros, mas no contrato publicado entretanto no Portal Base foi ilegitimamente rasurado o preço unitário, desconhecendo-se assim a quantidade adquirida. Em todo o caso foi mais um flop: em Janeiro deste ano, a Food & Drug Administration retirou a autorização deste fármaco nos Estados Unidos por ser também ineficaz.

    Quanto ao Xevudy, comercializado pela GlaxoSmithKline, não há registo de compra, até agora, no Portal Base, mas tal não significa que o Governo não esteja também a esconder as aquisições.

    Esta compra de Paxlovid no valor de 20 milhões de euros vem assim acentuar a obscuridade dos negócios envolvendo o Governo e as farmacêuticas, tanto mais que surgem cada vez mais evidências que muitos dos fármacos concebidos para combater o SARS-CoV-2 se mostraram ineficazes ou mesmo contraproducentes. No caso particular do antiviral da Pfizer, apesar de mostrar eficácia, tem um grave problema: depois do tratamento, 20% dos pacientes têm uma recaída (denominado, em inglês, por rebound). Ao contrário, em pacientes que não usaram Paxlovid só cerca de 2% registaram esse fenómeno.

    Aliás, apesar desse evento adverso estar a ser cada vez mais consolidado em artigos científicos – do qual é exemplo um publicado no passado dia 14 de Novembro no Annals of Internal Medicine –, já era conhecido desde o ano passado. Por exemplo, em Julho de 2022 o presidente norte-americano Joe Biden sofreu um rebound após tratamento com Paxlovid. Também Antony Fauci alegou ter sofrido este evento. Na altura, o médico da Casa Branca, Kevin O’Connor, garantia que eram situações raras, e a própria FDA informara que os ensaios clínicos da Pfizer os rebounds tinham uma probabilidade de ocorrência entre 1% e 2%. Mas afinal é de 20%, pelo menos 10 vezes mais.

    Informação minimalista no Portal Base ‘aguardou’ 11 meses e nem sequer há contrato nem sequer indicação de quantidades compradas. Tudo isto num contrato de 20 milhões de euros através de um procedimento que já não podia legalmente ser usado.

    Estes resultados decepcionantes deste fármaco, a par da redução do impacte da covid19 na Saúde Pública (e na comunicação social mainstream), tem causado estragos financeiros à Pfizer, apesar da aprovação definitiva da FDA em Maio passado pra doentes com sintomas fracos a moderados.

    No mês passado, a farmacêutica norte-americana reduziu em 13% das suas previsões de receita para este ano por causa da queda nas receitas de produtos para a covid-19, tanto de vacinas como de Paxlovid. A Pfizer viu-se obrigada a reduzir a sua previsão de venda do antiviral em cerca de 7 mil milhões de dólares, incluindo a reversão de receitas devida a devoluções de 7,9 milhões de unidades por parte do Governo federal dos Estados Unidos, que ‘oferecia’ o tratamento gratuitamente.

    Os anos de ouro da Pfizer – entre 2020 e 2022 – estão, aliás, agora a esfumar-se. No terceiro trimestre de 2023 – que registou um prejuízo líquido de 2,39 mil milhões de euros –, as vacinas contra a covid-19 registaram uma queda de receitas de 42% face ao período homólogo do ano passado, enquanto as vendas de Paxlovid baixaram 97%. Depois de as suas acções na Bolsa de Nova Iorque (NYSE) terem atingido um máximo próximo dos 60 dólares em Dezembro de 2021, as cotação está agora nos 30 dólares, uma queda de metade do seu valor, e pouco acima dos mínimos dos últimos cinco anos.

    Foto inserida num tweet do dia 9 deste mês da conta da Pfizer da rede social X, informando que o Paxloxid deixará de ser oferecido pelo Governo Federal dos Estados Unidos aos seus cidadãos. Situação financeira da farmacêutica não é, porém, agora para grandes risadas.

    E sem os contratos secretos na União Europeia, assumidos por Ursula von der Leyen – que provavelmente manterão receitas para fármacos desnecessários e até eventualmente contraproducentes –, o cenário financeiro para o futuro da Pfizer (e de outras companhias que lucraram com a pandemia) ainda seria mais sombrio.

    Saliente-se que o PÁGINA UM contactou o Ministério da Saúde para obter comentário sobre o contrato com a Pfizer para a compra de Paxlovid, mas como é hábito não houve resposta do gabinete de Manuel Pizarro.

  • 1001 noites (um pouco mais): Agência de promoção do voluntariado aluga hotel de quatro estrelas por ajuste directo usando ‘truque’

    1001 noites (um pouco mais): Agência de promoção do voluntariado aluga hotel de quatro estrelas por ajuste directo usando ‘truque’


    Não é todos os dias que a gerência do Sana Metropolitan, um hotel de quatro estrelas em Lisboa, celebra contratos com entidades públicas. Pelo contrário. No Portal Base constavam, até ao mês passado, cerca de duas dezenas de contratos, mas quase todos de alugueres de salas para eventos. Para dormidas, muito poucos. Em todo o caso, nunca tinham ultrapassado os 20 mil euros. Isto até Outubro deste ano.

    Mas um dia não são dias, e na passada quarta-feira foi ‘dia de festa’ para a Sociedade Hoteleira de Sete Rios, a empresa do Grupo Sana que gere esta unidade. A Agência Nacional para a Gestão do Programa Erasmus + Juventude/Desporto (ANGPE+J/D) – uma entidade pública de promoção do voluntariado juvenil sedeada em Braga e tutelada pela ministra Ana Catarina Mendes – decidiu fazer um ajuste directo no valor de 122.415,39 euros para reservar 1.362 noites (dormidas) para cerca de duas centenas de participantes em acções de formação marcadas para a primeira semana de Dezembro.

    Este é o maior ajuste directo de sempre para serviços desta natureza, de acordo com uma consulta do PÁGINA UM no Portal Base. A factura total deverá atingir, contudo, os 132 mil euros, tendo em conta o IVA (6%) e a taxa turística (2 euros por noite). No entanto, além do custo elevado, houve um ‘truque’ para legalizar mais um contrato de ‘mão-beijada’.

    Para justificar um ajuste directo de tão elevado montante, ainda por cima sem sequer ser feito um contrato escrito, a ANGPE+J/D lançou um concurso público “relâmpago” condenado a ficar vazio porque só esteve aberto durante 49 horas e 11 minutos. Nem mais um segundo. Com efeito, no passado dia 6 de Novembro, a direcção desta agência, presidida por Luís Mendes Alves – membro da Comissão Nacional do Partido Socialista – lançou um concurso público para reservar dormidas, em quatro lotes, com um preço-base perto dos 140 mil euros. O anúncio foi colocado na plataforma acinGov às 15h49, de acordo com o Diário de República, e apenas foi concedido um prazo para propostas até às 17h00 do dia 8, ou seja, apenas dois dias úteis.

    Em consequência de um prazo tão curto para a candidatura e muito pelo facto de serem necessários 216 quartos (com duração variável, mas a maioria para uma ocupação de sete noites) no período compreendido entre 3 e 9 de Dezembro, ou seja, menos de um mês mais tarde, o concurso público ficou vazio. Resultado: a ANGPE+J/D conseguiu assim ‘luz verde’ para um ajuste directo sem contrato escrito. Por sorte, o Sana Metropolitan estava ali ‘à mão de semear’, com muitos quartos disponíveis, de contrário os participantes da formação promovida por esta agência arriscariam ter de acampar debaixo da ponte.

    Luís Mendes Alves, director da Agência Nacional para a Gestão do Programa Erasmus + Juventude/Desporto, tem ocupado diversos cargos do Partido Socialista, integrando actualmente o seu Conselho Nacional.

    O alojamento (que incluirá pequeno-almoço) no Sana Metropolitan – um hotel de quatro estrelas na Rua Soeiro Pereira Gomes, perto da sede do PCP – servirá para os participantes do Ciclo de Formação e Avaliação do Corpo Europeu de Solidariedade, e tem por objectivo dar formação a voluntários nacionais e internacionais, estando prevista a participação de jovens que exercem voluntariado oriundos, segundo informações da própria ANGPE+J/D, “da Alemanha, França, Itália, Espanha, Turquia, Polónia, Luxemburgo, Azerbaijão, Tunísia, Letónia, Áustria, Grécia, Países Baixos, Rússia, Roménia, Angola, Bélgica, Estónia, Suécia, Eslovénia, Finlândia, Palestina, Macedónia, Jordânia, Portugal e Brasil”.

    Mas não seria expectável que eventos desta natureza tivessem uma programação atempada – por motivos logísticos e até para caber na agenda das duas centenas de participantes –, para dar tempo ao lançamento de concursos públicos com maior antecedência, de modo a encontrar soluções mais económicas para o erário público? Luís Mendes Alves, director da ANGPE+J/D, diz que não. “A natureza do processo não permite a programação da formação com meses de antecipação, como gostaríamos e, sobretudo, como conviria ao nosso (curto) quadro de pessoal”, alegou este dirigente em resposta ao PÁGINA UM.

    E acrescenta ainda que “o procedimento em causa [ajuste directo que custará ao erário público cerca 132 mil euros] tem por objeto a aquisição de serviços de uso corrente – alojamento e alimentação – sem exigência de qualquer outra especificidade que não sejam as decorrentes do sector de atividade, sendo o único critério de escolha o preço, pelo que se enquadra nas condicionantes inerentes ao procedimento de concurso público urgente”.

    Apesar de, repita-se, este ser o mais elevado ajuste directo de sempre para alojamento e alimentação, o dirigente desta agência defende que “os serviços a contratar e respetivo caderno de encargos não apresentam complexidade face à prática corrente do mercado, pelo que a utilização do citado expediente [ajuste directo sem contrato escrito] não coloca em causa a respetiva concorrência subjacente ao procedimento”, acrescentando que “apenas pretendíamos serviços que os operadores prestam quotidianamente, sem qualquer complexidade adicional de análise que não corresponda aos serviços e cotações que diariamente prestam”.

    Sobre a razão da escolha específica do Sana Metropolitan, Luís Mendes Alves diz que foi “em virtude de se tratar da entidade que, em função do local e datas definidos para a realização das atividades em causa, das especificações necessárias à boa execução do contrato, bem como da experiência da mesma na prestação desta tipologia de serviços, demonstrou disponibilidade e capacidade de resposta para a realização da totalidade das formações em causa”, acrescentando que foram contactados “vários hotéis da zona de Lisboa, como sejam o Hotel Mundial, o Hotel Vip Executive, o Hotel Ramada, o Sana Metropolitan Hotel, o Lutécia Hotel, o Masa Hotel, o Novo Hotel, o Hotel Mercure, o Hotel Roma, entre outros, sendo que apenas o Sana Metropolitan demonstrou disponibilidade para a realização da totalidade das formações pretendidas nas datas indicadas”.

    A pretexto deste facilitismo no recurso a ajustes directos mesmo quando em causa estão montantes elevados, saliente-se ainda que a ANGPE+J/D quase não sabe o que é um concurso público. De acordo com o Portal Base, desde 2015, ano da criação desta agência, foram celebrados 206 contratos no valor de 3.977.024,77 euros (sem IVA), mas só dois (ambos em 2021 e com um valor total de pouco mais de 143 mil euros) foram sujeitos a concurso público, ou seja, 3,6% do montante global.

    Luís Mendes Alves alega, contudo, que são quatro, sendo dois em 2021, um em 2022 e outro em 2023. Mas se assim é, então a sua agência está em falta na informação constante hoje no Portal Base, onde só constam mesmo dois. E, talvez por ironia, ou não, são dois contratos por concurso público para serviços de alojamento, com direito a caderno de encargos e cláusulas escritas. E os montantes em causa estavam abaixo daquele que foi feito agora por ajuste directo ao Sana Metropolitan.

    O contrato entre a Agência Nacional para a Gestão do Programa Erasmus + Juventude/Desporto (ANGPE+J/D) e a Sociedade Hoteleira de Sete Rios (empresa detentora do Hotel Sana Metropolitan) integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre 24 e 26 de Novembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV / MAP


    Nos últimos três dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 699 contratos públicos, com preços entre os 5,00 euros – para aquisição de serviço de cobrança de portagens, pelo Ministério da Defesa Nacional – Marinha, através de ajuste directo – e os 19.950.000,00 euros – para aquisição de Paxlovid, pela Direcção-Geral da Saúde, também por ajuste directo.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 15 contratos, dos quais oito por concurso público, três ao abrigo de acordo-quadro, um por consulta prévia e três por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 13 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Direcção-Geral da Saúde (com a Pfizer, no valor de 19.950.000,00 euros); dois do Centro Hospitalar Universitário de Santo António (um com a Alnypt, Sociedade Unipessoal, no valor de 3.039.607,20 euros, e outro com a Gilead, no valor de 144.900,00 euros); Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (com a Pfizer, no valor de 1.613.944,10 euros); Estrutura de Missão Recuperar Portugal (com a Inetum España, no valor de 230.482,71 euros); três do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (um com a Terumo Bct Portugal, no valor de 213.788,00 euros, e dois com a Fresenius Kabi Pharma, um no valor de 158.630,40 euros e outro no valor de 152.755,20 euros); Município de Lagoa (com Teresa Sofia Paulino, no valor de 145.000,00 euros); Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga (com a J.J.L. – Instalações Eléctricas, no valor de 141.690,10 euros); Hospital da Horta (com a Biomerieux Portugal, no valor de 124.376,37 euros); Agência Nacional para a Gestão do Programa Erasmus + Juventude/Desporto e Corpo Europeu de Solidariedade (com a Sociedade Hoteleira de Sete Rios, no valor de 122.415,39 euros); e o Hospital de Braga (com a Pfizer, no valor de 105.920,80 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 24 a 26 Novembro (todos os procedimentos):

    1 Aquisição de tratamentos de medicamento Paxlovid (Nirmatrelvir+Ritonavir)

    Adjudicante: Direcção-Geral da Saúde

    Adjudicatário: Laboratórios Pfizer

    Preço contratual: 19.950.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo simplificado


    2Construção de edifício que comporte todos os serviços da autarquia, e da Praça da Democracia Local

    Adjudicante: Município de Valongo

    Adjudicatário: Atlântinivel – Construção Civil

    Preço contratual: 13.994.003,26 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Santo António

    Adjudicatário: Alnypt, Sociedade Unipessoal

    Preço contratual: 3.039.607,20 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    4Construção de Lar Residencial para Pessoas com Deficiência

    Adjudicante: CERCIMA – Cooperativa de Educação, Reabilitação, Capacitação e Inclusão de Montijo e Alcochete

    Adjudicatário: Rocwork – Soluções Construtivas

    Preço contratual: 2.597.582,67 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Aquisição de serviços de desenvolvimento e implementação do Sistema de Recolha e Tratamento de Dados

    Adjudicante: Estrutura de Missão Recuperar Portugal

    Adjudicatário: Babel Ibérica, S.A.

    Preço contratual: 1.776.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 24 a 26 de Novembro

    1 Aquisição de tratamentos de medicamento Paxlovid (Nirmatrelvir+Ritonavir)

    Adjudicante: Direcção-Geral da Saúde

    Adjudicatário: Laboratórios Pfizer

    Preço contratual: 19.950.000,00 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de Santo António

    Adjudicatário: Alnypt, Sociedade Unipessoal

    Preço contratual: 3.039.607,20 euros


    3Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Laboratórios Pfizer

    Preço contratual: 1.613.944,10 euros


    4Aquisição de licenciamento Microsoft 365 E5 e serviços conexos

    Adjudicante: Estrutura de Missão Recuperar Portugal

    Adjudicatário: Inetum España

    Preço contratual: 230.482,71 euros


    5Aquisição de kits

    Adjudicante: Instituto Português do Sangue e da Transplantação

    Adjudicatário: Terumo Bct Portugal

    Preço contratual: 213.788,00 euros

    MAP

  • Web Summit: AICEP ‘estoira’ 421.675 euros em alugueres de minivans

    Web Summit: AICEP ‘estoira’ 421.675 euros em alugueres de minivans


    Anteontem, o presidente da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) reuniu com a Embaixada da China sobre o ambiente de investimento em território nacional, com foco na fileira produtiva da mobilidade elétrica. Mas no início deste mês, decidiu alugar 50 minivans convencionais para transportar ignotos convidados para a Web Summit. Não foi a primeira vez: já no ano passado, a agência que procura investimento externo decidiu gastar uma boa maquia a levar gentes para uma zona bem servida de transportes públicos. A factura disto tudo já supera os 420 mil euros. Despesismo ou investimento? Da parte da AICEP ‘veio’ o silêncio.


    Na filosofia política que fez germinar, florescer e amadurecer a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), consolidada ao longo de décadas de um mix de marketing diplomático com arte da sedução, certamente não há despesas – há apenas investimento, porque a despesa, se improdutiva, ganha o sufixo ‘ismo’, tornando-se despesismo, enquanto os investimentos subentendem benefícios públicos futuros, mesmo se à primeira vista esse tal investimento surja aos olhos dos incréus como um gasto supérfluo que, enfim, se confunde com despesismo.

    Por esse motivo, por compreender que nem todos os gastos – aparentemente supérfluos – sejam mesmo uns despesismos incompreensíveis, o PÁGINA UM quis saber junto da AICEP o motivo pelo qual decidiu celebrar duas aquisições de serviços para transporte de passageiros para as últimas edições da Web Summit. Não houve resposta.

    Filipe Santos Costa, primeiro à direita, é o presidente da AICEP desde o Verão passado.

    Sabe-se assim apenas que, apesar da localização da Web Summit ser próxima da estação de metro do Oriente, o primeiro contrato de aluguer de minivans, assinado em Outubro do ano passado entre a AIECP e a Choice Car, custou 206.425 euros (IVA incluído). Para a edição deste ano – que decorreu entre 11 e 14 deste mês –, já por concurso público (em que apenas concorreu outra empresa), a Choice Car sacou mais 215.250 euros (IVA incluído).

    Em conjunto, deste modo, apenas em passeios de minivans, transportando não se sabe quantas pessoas, a AICEP pagou, para estas duas edições da ‘feira tecnológica’, um total de 421.675 euros para serviços de cerca de uma dúzia de dias. No caderno de encargos do último contrato apenas se refere que os “serviços serão prestados na área metropolitana de Lisboa e/ou regiões adjacentes à mesma, prevendo-se o transporte de passageiros entre o Aeroporto de Lisboa, as instalações da Feira Internacional de Lisboa, os diversos hotéis onde se encontram hospedados os participantes e outros locais e eventos organizados pela Web Summit”.

    Os montantes dispendidos pela AICEP para estas deslocações dariam para adquirir 63.890 bilhetes diários de metro, ou, se a opção fosse táxi, para pagar 28.783 viagens da redacção do PÁGINA UM até ao Centro de Congressos no Parque das Nações. Noutra perspectiva, daria mais de quatro mil passeios turísticos de tuk-tuk até ao Parque das Nações, ainda com direito a passagem por Marvila para desfrutar de street art e visitar a Fábrica de Unicórnios.

    António Costa Silva (ministro da Economia), Katherine Maher (CEO da Web Summit) e Carlos Moedas (presidente da Câmara Municipal de Lisboa) na abertura de oitava edição da ‘feira tecnológica’.

    Diga-se ainda que, apesar deste avultado ‘investimento’ de mais de 420 mil euros no comércio interno – uma vez que a Choice Car tem capital inteiramente lusitano, apesar da denominação em língua anglo-saxónica –, a presença da AICEP pela Web Summit tem sido sempre bastante discreta.

    Na última edição, o ponto alto atingiu-se no encontro do actual presidente da agência, Filipe Santos Costa, com uma comitiva de empresas luxemburguesas presidida pelo grão-duque herdeiro daquele país. O PÁGINA UM não conseguiu confirmar se Filipe Santos Costa se dirigiu até à Web Summit usando uma das minivans alugadas, que terão transportado um número indeterminado de pessoas a partir de incógnitos sítios para o Parque das Nações, e respectivo regresso.

  • Turismo de Portugal entrega ‘jackpot’ a sociedade de advogados ‘amiga’ [act.]

    Turismo de Portugal entrega ‘jackpot’ a sociedade de advogados ‘amiga’ [act.]


    Se não há duas sem três, para a sociedade de advogados Clareira Legal depois de seis contratos houve um sétimo, e com direito a ‘jackpot’. Na semana passada, o Turismo de Portugal entregou de ‘mão-beijada’, e sem os estorvos de concorrência, um contrato no valor de 1,2 milhões de euros à sociedade fundada por André Luiz Gomes, conhecido por ter sido advogado de Joe Berardo. Os contratos anteriores, vistos na perspectiva do que está em curso, parecem uma ‘pechincha’: custaram, para o mesmo período, ‘apenas’ 190 mil euros.


    Todos os anos, desde 2017, a sociedade Clareira Legal – fundada por André Luiz Gomes, que ficou conhecido por ter sido advogado de Joe Berardo – podia contar com uma coisa: uma avença do Turismo de Portugal para patrocínio judicial e consultadoria em litígio com empresas concessionárias das zonas de jogo, ou seja, sobretudo casinos.

    Assim foi em 2017 – ainda a sociedade se denominava Luiz Gomes & Associados –, logo com um ajuste directo que, formalmente, se iniciou no dia 18 de Dezembro, e durou apenas 13 dias, pelo valor de 150 mil euros. Continuou em 2018, com a assinatura de novo ajuste em 29 de Novembro pelo valor de 190 mil euros, com a particularidade de ter efeitos retroactivos ao início daquele ano.  Repetiu-se a ‘dose’ de 190 mil euros em 2019, com similares circunstâncias: contrato de mão-beijada – leia-se, ajuste directo – celebrado já na segunda metade do ano, mas com efeitos a iniciar-se, mais uma vez, em Janeiro.

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    E escusado quase seria necessário acrescer que em 2020, 2021 e 2022 foi mais do mesmo: no primeiro destes anos, o contrato por ajuste directo de 190 mil euros foi assinado em 20 de Novembro; no segundo destes anos, o contrato de ‘mão-beijada’ calhou ter a data de 8 de Outubro; e no terceiro destes anos, lá se antecipou a ‘coisa’ para o início de Agosto.

    Sabendo-se que já se andava com seis contratos anuais por ajuste directo para o mesmo objecto, cinco dos quais ‘religiosamente’ com a mesma verba, não seria necessário ser-se ‘bruxo’ para prever como certo que este ano, mais dia menos dia, surgisse o habitual ‘beija-mão’ sob a forma de contrato por ajuste directo entre a administração do Turismo de Portugal, agora liderado por Carlos Abade, e pela Clareira Legal, que assumiu esta denominação no Verão passado.

    E assim foi, mas com direito a ‘jackpot’ para a sociedade de advogados: em vez de um ajuste directo com os habituais 190 mil euros, o Turismo de Portugal atribui um contrato de 1,2 milhões de euros, ou seja, o equivalente a mais de seis anos da ‘avença habitual’. No convite à apresentação da proposta para o ajuste directo “com base em critérios materiais” – que não são sequer justificados, pese embora a sociedade de advogados ostente um especialista em direito de jogos –, salienta-se apenas que o objectivo é representar o Turismo de Portugal “junto do Tribunal Arbitral no âmbito dos processos arbitrais propostos contra o Turismo de Portugal e/ ou o Estado português pelas empresas concessionárias das zonas de jogo”.

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    Por sua vez, o contrato não adianta muito mais, apenas referindo que o preço por hora de (suposto) trabalho será de 150 euros, um aumento de 43% face aos honorários praticados no contrato do ano anterior. Mesmo assim o Turismo de Portugal terá contratado 8.000 horas de serviços jurídicos à Clareira Legal, ou seja, 32 horas por dia útil do presente ano.

    O PÁGINA UM contactou o Turismo de Portugal no sentido de obter uma justificação com base legal para sete ajustes directos sucessivos no mesmo âmbito com a Clareira Legal, e sobretudo a razão de um contrato desta natureza em 2023 com um montante tão elevado – e com efeitos retroactivos, o que significa que à data da assinatura quase todo o serviço estava afinal já executado –, mas não obteve qualquer reacção.

    Sem resposta ficaram assim também as perguntas sobre os processos em concreto no Tribunal Arbitral que estiveram a ser patrocinados pela Clareira Legal e se existem garantias de que o sócio da Clareira Legal especialista em direito de jogo (Gonçalo Proença) nunca trabalhou, ou trabalhará, para as concessionárias dos jogos.


    N.D. Pelas 23:18 de 21/11/2023, o PÁGINA UM recebeu o seguinte esclarecimento do Turismo de Portugal:

    O contrato a que se refere o texto [acima] foi celebrado pelo Turismo de Portugal, em cumprimento da obrigação atribuída a este Instituto pelo Estado Português para assegurar os atos e os meios necessários para a representação na defesa do Estado Português, em três ações arbitrais. As ações foram propostas em 2022 e 2023 contra o Estado Português e o Turismo de Portugal, I.P. pelas concessionárias de três zonas de jogo e o valor global dos pedidos de compensação apresentados ascende a mais de 330 milhões de euros.

    A contratação em causa, respeitou integralmente as regras da contratação pública, e teve em consideração a escolha de um escritório de advogados especializado em direito público e, em especial, em contratos de concessões e, em particular, com uma experiência de vários anos no acompanhamento de concessões de exploração de jogos de fortuna ou azar em Portugal, atento o seu regime específico e de contornos muito particulares, circunstâncias determinantes nas ações arbitrais propostas, que aliás tinham ligação a outras ações judiciais já propostas e acompanhadas pelo referido escritório.

    Para a escolha da referida sociedade de advogados foi ainda determinante o facto de ter conseguido obter vencimento nas ações propostas pelas concessionárias perante os tribunais judiciais, protegendo e beneficiando assim o interesse público. Neste caso foi escolhido o prestador em quem se deposita confiança técnica e profissional, sendo que, nestes casos, as próprias Diretivas Comunitárias de contratação pública não se aplicam a este tipo de contratos.

    Daquele que é o conhecimento do Turismo de Portugal, não existe qualquer relação da sociedade de advogados contratada com empresas concessionárias da exploração de jogo em casinos em Portugal.

    Sobre esta matéria, o PÁGINA UM reitera que no contrato por ajuste directo deste ano, pelo valor de 1,2 milhões de euros (mais de um milhão de euros superior às seis avenças anuais anteriores), não se encontra justificação para o montante de horas pagas nas três acções arbitrais, nem ao incremento do preço à hora. O Turismo de Portugal defende que “respeitou integralmente as regras da contratação pública” quando, em sete contratos, todos foram por ajuste directo. Ou seja, aplica a excepção em sete dos sete contratos públicos assinado. O ajuste directo não é a regra do Código dos Contratos Públicos, mas constata-se ser a regra do Turismo de Portugal. Por outro lado, está por provar que a Clareira Legal seja a única sociedade de advogados capaz de defender o interesse público, pelo simples facto de nunca ter tido sequer concorrência. Se for mesmo melhor, em termos de relação qualidade-preço, por certo conseguirá provar isso num regime de livre concorrência, através de concurso público. De resto, o PÁGINA UM continuará a denunciar flagrantes actos de contratação pública, com recurso a dinheiros dos contribuintes, através de ajustes directos decididos por gestores públicos com ‘argumentos’ pouco transparentes.

  • Seis hospitais públicos ocultam contratos de milhões

    Seis hospitais públicos ocultam contratos de milhões

    O Regulamento Geral de Protecção de Dados (RGPD) tem servido de ‘desculpa’ para administrações hospitalares atropelarem a lei da transparência, não divulgando a cópia dos contratos públicos no Portal Base, alguns envolvendo mais de meio milhão de euros. As administrações dos hospitais de Santarém, de Loures, dos centros hospitalares do Oeste, do Barreiro-Montijo e de Setúbal e da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano ‘mandam integralmente às malvas’ a transparência, mas ainda há mais 24 que fazem rasuras nos contratos, que incluem, na generalidade dos casos, que não se fique a saber sequer quem foi o administrador que os assinou. Numa investigação detalhada do PÁGINA UM, analisados os contratos assinados por 42 administrações das unidades do Serviço Nacional de Saúde, desde a entrada em vigor do RGPD, apenas 12 mostram transparência absoluta. 


    Para algumas administrações hospitalares, a decisão de divulgar, e em que termos, os seus contratos no Portal Base parece seguir o critério “à vontade do freguês”. Numa análise exaustiva às práticas de todos os centros hospitalares e hospitais integrados no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o PÁGINA UM identificou cinco que simplesmente não revelam qualquer contrato escrito, invocando erradamente os preceitos do Regulamento Geral de Protecção de Dados. E mais uma que faz quando calha.

    O Código dos Contratos Públicos obriga que todas as entidades públicas disponibilizem os contratos realizados no Portal Base, sendo apenas admissível o expurgo de alguns elementos de identificação pessoal, conforme estabelece uma norma do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC), a entidade que gere a plataforma de contratação pública. Ou seja, as entidades públicas jamais podem simplesmente optar pela não inclusão do contrato escrito, como fazem seis administrações hospitalares detectadas pelo PÁGINA UM.

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    Para não divulgarem os seus contratos, o Hospital Distrital de Santarém e o Centro Hospitalar Barreiro Montijo, declaram simplesmente que “para os efeitos previstos nos artigos 127º e 465º do CCP, na sua última redação, é publicada/publicitada a celebração do presente contrato e seus elementos constituintes, através do preenchimento do presente formulário do portal base gov, não sendo assim necessário a submissão do contrato escrito, que contém elementos que violam o RGPD”. A argumentação não encontra justificação sequer no RGPD. O Hospital de Loures (Beatriz Ângelo) segue o mesmo diapasão, alegando a “protecção de pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais”, conforme a Lei n.º 58/2019, de 8 de Agosto. Ou seja, para supostamente proteger os nomes de pessoas em funções públicas, escondem-se contratos, o que impede assim que se detectem irregularidades nos contratos.

    Algumas administrações são mais lacónicas na justificação, como sucede com o Centro Hospitalar do Oeste, a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano e o Centro Hospitalar de Setúbal: limitam-se a informar que, tendo publicado a celebração dos contratos através do preenchimento de um formulário do Portal Base, “não é necessário submeter a cópia do contrato escrito”, o que está longe de ser legal.

    O Hospital de Loures (Beatriz Ângelo), por sua vez, tem uma atitude quase ‘esquizofrénica’: por vezes divulga os contratos; outras vezes esconde-os, alegando o RGPD.

    Para agravar a opção das seis administrações hospitalares, acima referidas, que escondem os contratos, diga-se que acabam por ser uma minoria. De entre as 42 administrações hospitalares analisadas, o PÁGINA UM identificou 12 que divulgam, quando aplicável, os contratos escritos sem qualquer rasura relevante, ou seja, incluindo o nome e detalhes dos signatários. São os casos dos centros hospitalares de Coimbra, de Lisboa Central, do Porto, de São João (Porto), de Espinho-Gaia, do Médio Ave, dos hospitais de Guimarães (Senhora da Oliveira), Amadora-Sintra (Fernando da Fonseca) e as Unidades Locais de Saúde (ULS) do Alto Minho, Nordeste, de Matosinhos e do Litoral Alentejano.

    Além destes 12, há outros 24 (vd. lista em baixo) que, embora revelem os contratos, expurgam demasiada informação, incluindo mesmo o nome dos administradores que os assinaram ou mesmo o gestor público responsável pela sua execução e supervisão. Esta prática, embora relativamente comum noutros sectores, e até ‘validada’ em certa medida pela norma do IMPIC, não se baseia, porém, em nenhum critério legal, porque não está em causa a protecção da intimidade dessas pessoas, mas sim a identificação de responsáveis em funções públicas.

    O PÁGINA UM tentou perceber, junto das administrações hospitalares que não divulgam os contratos, se existe algum parecer interno para sustentar a decisão de não publicação dos contratos, ou se, em alternativa, foi pedida uma opinião à Comissão Nacional de Protecção de Dados ou ao IMPIC.

    Nenhuma destas administrações apresentou ao PÁGINA UM qualquer parecer destas duas entidades ou qualquer parecer jurídico que justifique, com uma base legal, a não-inclusão dos contratos escritos na plataforma da contratação pública, de modo a existir um escrutínio dos dinheiros públicos gastos.

    Aliás, só uma das 12 administrações hospitalares que escondem os contratos públicos acharam por bem responder ao PÁGINA UM sobre uma matéria relevante em democracia; a transparência. Apesar das evidências de não conformidade legal, o Centro Hospitalar Barreiro Montijo reitera que “os contratos celebrados (…) estão devidamente publicados no Portal Base, de acordo com a legislação em vigor”, acrescentando que, na sua opinião, “as publicações do CHBM cumprem com o estipulado no artigo 27.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, no que respeita à utilização de dados pessoais na contratação pública”.


    HOSPITAIS QUE NÃO DIVULGAM CONTRATOS PÚBLICOS (clicar para visualizar exemplo)

    Hospital Distrital de Santarém

    Centro Hospitalar do Oeste

    Hospital Beatriz Ângelo

    Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano

    Centro Hospitalar Barreiro Montijo

    Centro Hospitalar de Setúbal


    HOSPITAIS QUE DIVULGAM COM RASURAS ABUSIVAS (clicar para visualizar exemplo)

    Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga

    Centro Hospitalar do Baixo Vouga

    Hospital Dr. Francisco Zagalo

    Unidade Local de Saúde de Castelo Branco

    Hospital Distrital da Figueira da Foz

    Instituto Português de Oncologia de Coimbra

    Hospital do Espírito Santo de Évora

    Centro Hospitalar Universitário do Algarve

    Centro Hospitalar de Leiria

    Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte

    Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa

    Hospital de Vila Franca de Xira

    Instituto Português de Oncologia de Lisboa

    Centro Hospitalar Póvoa de Varzim

    Centro Hospitalar do Médio Tejo

    Hospital Garcia de Orta

    Centro Hospitalar de Tondela e Viseu

    Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro

    Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo

    Centro Hospitalar Universitário Cova da Beira

    Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental

    Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa

    Hospital de Magalhães Lemos

    Hospital Santa Maria Maior


    HOSPITAIS QUE DIVULGAM SEM RESTRIÇÕES (clicar para visualizar exemplo)

    Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães

    Unidade Local de Saúde do Nordeste

    Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

    Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central

    Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca

    Centro Hospitalar e Universitário de São João

    Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia

    Centro Hospitalar do Médio Ave

    Centro Hospitalar Universitário do Porto

    Unidade Local de Saúde de Matosinhos

    Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano

    Unidade Local de Saúde do Alto Minho

  • Sede da Polícia Judiciária custa mais 833 mil euros para ‘deitar abaixo’ prédio danificado [act.]

    Sede da Polícia Judiciária custa mais 833 mil euros para ‘deitar abaixo’ prédio danificado [act.]


    Durante a construção da sede nacional da Polícia Judiciária, um prédio nas imediações começou a colapsar e, em vez de se responsabilizar o empreiteiro, a Câmara Municipal de Lisboa tomou a posse administrativa. Os anos passaram e a autarquia de Carlos Moedas decidiu demolir parcialmente o edifício, com carácter urgente e, portanto, usando um ajuste directo. O erário público desfaz-se de mais de 800 mil euros. A Câmara de Lisboa só inseriu o contrato no Portal Base vários meses depois de a empreitada ter sido concluída, e sem caderno de encargos.


    O calvário começou em 2020 e vai custar ao erário público – ou, melhor dizendo, aos cofres da Câmara Municipal – mais de 830 mil euros. Ou em 2012, se quisermos ser mais rigorosos. Nesse ano, a autarquia de Lisboa aprovou um projecto para a construção da sede nacional da Polícia Judiciária, mas as obras orçadas em 87 milhões de euros, executadas pela Opway, infernizaram a vida dos vizinhos.

    A empreitada, finalizada em 2014, implicou uma escavação profunda e afectou a estabilidade de um prédio nas imediações, no número 26 da Rua General Garcia Rosado, localizado na freguesia de Arroios. Nunca mais se conseguiu recuperar o prédio, que foi parcialmente demolido por iniciativa da Câmara de Lisboa.

    Edifício parcialmente demolido, fotografado na quarta-feira, na Rua General Garcia Rosado, em Lisboa.

    Os efeitos fizeram-se sentir logo no início dos trabalhos da sede da Polícia Judiciária, com as queixas dos moradores a sucederem-se. Mas o desastre anunciado só culminou, em pleno, em Fevereiro de 2020, com a Protecção Civil a evacuar o edifício por razões de segurança – o imóvel predial estava em risco de colapso, e os mais de 30 moradores foram forçados a abandonar as suas casas.

    Depois de um longo processo, levado até aos tribunais, a Câmara Municipal de Lisboa assumiu, em Julho do ano passado, a posse administrativa do edifício e procedeu à sua demolição parcial – apesar de a sua intenção ter sido, inicialmente, a destruição total.

    Na altura, os residentes deslocados afirmaram-se “destroçados” com a decisão. No entanto, o custo dessa decisão, que com IVA, será de 833.053 euros, só esta semana foi divulgado no Portal Base, vários meses depois do fim da empreitada. Erroneamente, a autarquia indicou ainda que a celebração do contrato, com a Metalcário, datava de 13 de Outubro deste ano.

    O PÁGINA UM esteve no local na manhã de quarta-feira e verificou que, além das estruturas de contenção já colocadas, há estruturas metálicas sobre o lado esquerdo do edifício. A vereadora com pelouro das Obras Municipais, Filipa Roseta, afirmou, em Abril passado, que a obra já estava concluída, e pelo que se observou às 10h da manhã, é o número 20 da mesma rua que agora está a ser intervencionado.

    Questionada pelo PÁGINA UM, a autarquia informou que foi colocada “uma cobertura sobre o imóvel para evitar a sua deterioração”, mas que os proprietários já recuperaram a posse do edifício. O município adiantou ainda que “o custo das obras coercivas é imputado aos proprietários – ainda que esse custo possa ser assumido por entidades como uma seguradora com base em decisões judiciais sobre casos específicos”, explicando que “acautelou o reembolso pelas obras coercivas realizadas, e de forma a evitar que as frações que compõem o edifício sejam alienadas sem haver pagamento do valor, requereu o registo do ónus de inalienabilidade no valor estimado da intervenção realizada, sendo o valor repartido pelas frações autónomas”.

    Os moradores, que incluem crianças, idosos e pessoas que, em alguns casos, ainda estão a pagar as casas, tiveram a possibilidade de obter apoio municipal para o seu realojamento, mas, de acordo com a autarquia, só um dos proprietários manifestou essa necessidade, estando essa ajuda ainda a ser prestada.

    O contrato foi publicado no dia 13 de Novembro, celebrado entre o Município de Lisboa e a Metalcário, no valor de 677.279 euros, chegando o valor a atingir os 833 mil euros com IVA, e o prazo de execução é de 262 dias, mas não se sabe mais nada, uma vez que o caderno de encargos não foi sequer disponibilizado no Portal Base.


    N. D. – Notícia actualizada no dia 17/11/2023 às 13:03 horas, com informações entretanto enviadas pela Câmara Municipal de Lisboa.

  • Inédito: PSP já contrata Securitas para funções de vigilância

    Inédito: PSP já contrata Securitas para funções de vigilância


    A Polícia de Segurança Pública tomou uma decisão inédita, que até à data nunca ocorrera, ou pelo menos nada consta de similar na plataforma da contratação pública: adquiriu serviços de vigilância humana a uma empresa privada.

    No passado dia 3 de Novembro, a PSP celebrou um contrato de ajuste directo com a Securitas por um prazo de 64 dias, entre 29 de Outubro e o final de Dezembro deste ano, para que a empresa de segurança privada ocupe os postos de vigilância humana na sede da Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI), na lisboeta Rua Martens Ferrão, nos três aeroportos portugueses (Portela, com dois postos, Pedras Rubras e Faro) e na Unidade Habitacional de Santo António no Porto.

    De acordo com o contrato escrito, ontem divulgado no Portal Base e detectado pelo PÁGINA UM no âmbito da elaboração diária do Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos, a PSP irá pagar à Securitas por seis postos de vigilância em permanência (24 horas) um total de 136.692 euros (111.131,52 euros, a que acresce IVA). O contrato durará até ao final do ano, o que dá uma média de cerca de 2.135 euros em cada dia.

    O serviço adquirido pela PSP inclui até um pagamento de ligação à central da Securitas, pelo que, assim, em caso de ser detectada uma anomalia grave, a empresa poderá assim… avisar a PSP para intervir.

    No Portal Base – onde não se detecta qualquer outro contrato similar em anos anteriores – é justificado o ajuste directo à Securitas “por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis” pela PSP.

    O contrato entre a PSP e a Securitas integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados ontem, dia 14 de Novembro. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    PAV


    Ontem, dia 14 de Novembro, no Portal Base foram divulgados 721 contratos públicos, com preços entre os 23,80 euros – para aquisição de álcool gel, pela Administração do Porto de Aveiro, através de ajuste directo simplificado – e os 13.761.726,70 euros – para fornecimento de aerogeradores e serviços de Instalação, ligação à rede e manutenção de parques eólicos, pela EDA Renováveis, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 16 contratos, dos quais 12 por concurso público, um ao abrigo de acordo-quadro e três por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 15 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Santa Casa da Misericórdia de Braga (com a Costeira Empreiteiros – Sociedade de Construções, no valor de 4.463.870,55 euros); Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (com a Gilead, no valor de  1.308.000,00 euros); Centro Hospitalar de São João (com a Alexion Pharma, no valor de 645.374,52 euros); Lisboa Ocidental, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana (com a Site Specific Arquitectura, no valor de 385.000,00 euros); Direcção Regional da Saúde dos Açores (com a MedicineOne Life Sciences Computing, no valor de 328.308,18 euros); Município de Lisboa (com a Protecnil – Sociedade Técnica de Construções, no valor de 320.950,00 euros); dois do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (um com a ITAU – Instituto Técnico de Alimentação Humana, no valor de 258.200,31 euros, e outro com a Sá Limpa – Facility Services, no valor de 110.281,98 euros); Município de Oeiras (com a Resitul – Equipamentos, Serviços e Tecnologias Ambientais, no valor de 180.000,00 euros); Município do Seixal (com a Carlos Alberto Rodrigues, Unipessoal, Lda., no valor de 149.175,00 euros); dois do Hospital do Espírito Santo de Évora (um com a COPS – Companhia Operacional de Segurança, no valor de 127.985,44 euros, e outro com a Dr. Campos Costa – Consultório de Tomografia Computorizada, no valor de 115.360,00 euros); dois da Unidade Local de Saúde do Alto Minho (um com a Janssen Cilag, no valor de 120.252,24 euros, e outro com a Sanofi, no valor de 111.946,00 euros); e a Polícia de Segurança Pública (com a Securitas – Serviços e Tecnologia e Segurança, no valor de 111.131,52 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 14 de Novembro

    (todos os procedimentos)

    1 Fornecimento de aerogeradores e serviços de instalação, ligação à rede e manutenção dos parques eólicos das ilhas de Santa Maria, São Jorge e Flores

    Adjudicante: EDA Renováveis

    Adjudicatário: Enercon GmbH

    Preço contratual: 13.761.726,70 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Empreitada de requalificação e ampliação de edifício

    Adjudicante: Santa Casa da Misericórdia de Braga

    Adjudicatário: Costeira Empreiteiros – Sociedade de Construções

    Preço contratual: 4.463.870,55 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    3Aquisição de serviços de recolha, transporte e deposição de resíduos sólidos urbanos       

    Adjudicante: Município de Montalegre

    Adjudicatário: Suma – Serviços Urbanos e Meio Ambiente 

    Preço contratual: 3.301.425,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de serviços para a carteira de seguros municipal

    Adjudicante: Município de Gondomar

    Adjudicatário: Fidelidade – Companhia de Seguros

    Preço contratual: 2.959.478,67 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Construção de edifício residencial, de saúde e de actividades ocupacionais 

    Adjudicante: Santa Casa da Misericórdia do Cadaval

    Adjudicatário: Joaquim Fernandes Marques & Filho, S.A. 

    Preço contratual: 2.649.013,09 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no dia 14 de Novembro

    1 Empreitada de requalificação e ampliação de edifício

    Adjudicante: Santa Casa da Misericórdia de Braga

    Adjudicatário: Costeira Empreiteiros – Sociedade de Construções

    Preço contratual: 4.463.870,55 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

    Adjudicatário: Gilead

    Preço contratual: 1.308.000,00 euros


    3Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário de São João

    Adjudicatário: Alexion Pharma

    Preço contratual: 645.374,52 euros


    4Aquisição de serviços para a elaboração de projecto de requalificação de escola básica e jardim de infância           

    Adjudicante: Lisboa Ocidental, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana

    Adjudicatário: Site Specific – Arquitectura    

    Preço contratual: 385.000,00 euros


    5Aquisição de serviços de modernização da aplicação MedicineOne, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência

    Adjudicante: Direcção Regional da Saúde

    Adjudicatário: MedicineOne Life Sciences Computing

    Preço contratual: 328.308,18 euros

    MAP

  • Ex-administradora da Lusa saca veniaga na Câmara de Almada (com actualização)

    Ex-administradora da Lusa saca veniaga na Câmara de Almada (com actualização)


    Durante cerca de dois anos, Helena Ferro de Gouveia acumulou funções de administração na Lusa e da Global Media, e ainda de directora de comunicação do Grupo Bel, mas deixou de estar nas graças do empresário Marco Galinha. A meio deste ano, a presidente socialista de Almada deu-lhe a mão e mais 3.075 euros de avença mensal. O PÁGINA UM quis saber o que faz a conhecida comentadora da CNN Portugal em terras almadenses, mas Inês Medeiros não explica, enquanto Helena Ferro de Gouveia ficou de indicar, mas sem concretizar, o contacto do advogado Rogério Alves para esclarecer as dúvidas sobre um contrato para fazer não se sabe bem o quê. Uma veniaga, em toda a sua aparência. Ou esplendor.


    Na riquíssima língua de Camões, seria um esperdício – que também admite assim ser escrito, sem o D inicial – simplesmente catalogar com o corriqueiro ‘tacho‘ o cargo sacado na Câmara Municipal de Almada por Helena Ferro de Gouveia, a conhecida comentadora da CNN Portugal e ex-administradora da Lusa.  

    Em linguagem mais erudita, dir-se-ia até mais barroca, por ser coisa comum em tempos de antanho, poderíamos optar antes por prebenda, mas este termo, além de melhor se aplicar a benefícios eclesiásticos, terá, no país-irmão, o significado de tarefa sem préstimo, desagradável ou trabalhosa – o que não aparenta ser o caso das funções alegadamente desempenhadas por Helena Ferro de Gouveia, previstas por ajuste directo, em assessorar a edil socialista da Outra Margem, Inês de Medeiros. O mesmo para o uso de conezia, porquanto só por derivação pejorativa se usa em emprego rendoso e de pouco trabalho, uma vez que originalmente se associa à renda do canonicato de um cónego.

    Helena Ferro de Gouveia em funções ao vivo como comentadora da CNN Portugal

    Enfim, as opções em português culto são imensas para qualificar o trabalho decorrente do contrato autárquico de Helena Ferro de Gouveia – depois que afastada foi, no início deste ano, da administração da Global Media e da direcção de comunicação do Grupo Bel, do empresário Marco Galinha. Todas, porém, com o risco de serem confundidas com outras acepções.

    Por exemplo, se se considerasse que o contrato nº 11/2023, saído de um despacho de 7 de Junho deste ano da secretária-geral da Câmara Municipal de Almada, se tratava de uma tribuneca, logo viria alguém dizer que o termo é depreciativo quando referido a um tribunal ou periódico ordinário.

    Restando assim outros termos similares, entre as quais mama e mamata – que sempre seriam pouco cavalheirescos –, acabou por se escolher, para título, a palavra veniaga que, podendo referir-se tanto a mercadoria como a comércio (legal e ilegal), também significa “emprego remunerado, de pouco ou nenhum trabalho”. Ou seja, encaixa na perfeição nas funções de Helena Ferro de Gouveia como assessora de Inês Medeiros na autarquia almadense. Além disso, sempre suscitará maior curiosidade aos leigos que só lêem títulos a buscarem o significado desta palavra num dicionário – isto no pressuposto de não pensarem que o título da notícia contém gralha.

    person cross leg next to body of water

    Independentemente de tudo isto, vamos ao assunto. O ajuste directo celebrado pela autarquia de Almada em Junho passado com Helena Ferro de Gouveia, por um prazo de 884 dias e um preço contratual de 89.175 euros (IVA incluído), tem todas as condições para se transformar numa perfeita veniaga, na quarta acepção do termo explicitado no Dicionário Priberam.  

    De acordo com a cláusula 1ª, a actual comentadora da CNN Portugal terá de prestar “serviços de Apoio Técnico/Assessoria, na área da Comunicação ao Gabinete da Presidência”, mas “visando a satisfação de necessidades não permanentes”, e ainda mais “em completa autonomia técnica e sem subordinação nem sujeição a horário de trabalho”. Sem horas mínimas e sem horário. E sem tarefa concreta que se vislumbre.

    Além de tudo isto, remetendo para um caderno de encargos que não surge, como deveria, no Portal Base, Helena Ferro de Gouveia, que vive numa freguesia de Odivelas, nem sequer precisa de atravessar a ponte de 25 de Abril: tem liberdade para trabalhar onde lhe indicarem, podendo a avença – com a remuneração mensal de 3.075 euros (IVA incluído) – resultar também em tarefas a serem realizadas por “telefone, correio electrónico ou outro meio acordado”, o que, não se excluindo, admite, em hipótese académica, o uso de sinais de fumo ou pombo-correio.

    Helena Ferro de Gouveia em funções ao vivo como assessora da presidente da Câmara Municipal de Almada, Inês de Medeiros.

    Tendo já decorrido quase cinco meses desde que Helena Ferro de Gouveia assessora Inês Medeiros – daí tendo já resultado o pagamento de quatro meses no valor de 12.300 euros –, o tempo poderia ter conseguido dissipar dúvidas sobre as funções em concreto desta antiga jornalista em terras de Almada. E, por esse motivo, o PÁGINA UM procurou, em detalhe, algumas provas do trabalho da assessora de comunicação de Inês de Medeiros, através da pesquisa das acções de Almada divulgadas na rede social Facebook.

    E, de facto, nas inúmeras aparições em acção política da presidente socialista daquele município, pode-se ver a comunicadora a assessorá-la presencialmente por duas vezes: a sorrir enquanto Inês de Medeiros faz festas a um cachorro, em visita ao Centro de Recolha Oficial de Almada, em 28 de Julho; e numa foto de grupo numa limpeza de plásticos numa das praias da Costa da Caparica, em 18 de Setembro.

    Para melhor esclarecimento, o PÁGINA UM enviou na passada terça-feira a Inês de Medeiros um pedido para que fossem indicadas “as funções, em concreto, que Helena Ferro de Gouveia já desempenhou desde o início do contrato”, e se o “seu trabalho tem sido [sobretudo] presencial, ou de outra forma”, e se se circunscreve à presidência ou também à vereação da Câmara Municipal de Almada. Não houve resposta.

    [vd. adenda, em baixo, com mensagem enviada pela autarquia de Almada, dois dias após a publicação da presente notícia]

    Helena Ferro de Gouveia, atrás de Inês de Medeiros, numa foto de grupo em acção de limpeza de praias em Setembro passado.

    Contactada Helena Ferro de Gouveia, a actual comentadora da CNN Portugal, diz que não exerce aquelas actividades como jornalista, garantindo que, no contrato com a autarquia de Almada, “não há qualquer ilegalidade na prestação de serviços de assessoria”. E acrescentou ainda que, “em caso de persistirem dúvidas terei todo o gosto em indicar-lhe o número do meu advogado, Dr. Rogério Alves [antigo bastonário da Ordem dos Advogados], que lhe poderá prestar todos os esclarecimentos adicionais que possa necessitar”.

    O PÁGINA UM, por considerar que seria necessário “esclarecimentos adicionais”, pediu a Helena Ferro de Gouveia que indicasse então o contacto de Rogério Alves, mas tal não foi feito, aguardando-se ainda essa informação.

    Recorde-se que a saída de Helena Ferro de Gouveia da esfera dos negócios de media de Marco Galinha – que a levaram à administração da Lusa e da Global Media, dona do Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF – fez-se com algum estrondo, tendo chegado a trocas de ‘galhardetes’ na rede social X em Setembro passado.

    golden gate bridge san francisco california
    Ponte 25 de Abril: quantas vezes será ultrapassada pela assessora Helena Ferro de Gouveia enquanto durar um contrato no valor de 89.175 euros concedido por Inês de Medeiros?

    Helena Ferro de Gouveia escreveu então que a sua “posição relativa à guerra da Ucrânia custou-me o emprego” (na Lusa, Global Media e Grupo Bel), o que levou o empresário, seu ex-patrão, a ameaçar divulgar e publicar “as razões todas” para o seu despedimento, e acusando-a de “mentiras e falsidades”.

    A comentadora da CNN Portugal ripostou, aludindo a um “processo de assédio moral e laboral” que lhe terá sido movido por discordar de Marco Galinha, e garantindo que não seria silenciada.


    ADENDA: Na segunda-feira, dia 13, pelas 15:48 horas, seis dias após terem sido pedidos esclarecimentos, o PÁGINA UM recebeu a seguinte mensagem, por e-mail, de Bruno Gabriel, chefe de gabinete de Inês Medeiros, presidente da autarquia de Almada: “No seguimento do pedido de informação infra, informo V. Exas. que a Assessora do Gabinete de Apoio à Presidência da Câmara Municipal de Almada, Helena Ferro de Gouveia, desempenha as funções de Assessora de comunicação e imprensa, neste gabinete. As referidas funções de assessoria incidem, especialmente, na preparação e acompanhamento das intervenções públicas da Senhora Presidente da Câmara, ou quaisquer outras indicadas por esta. O trabalho prestado assume um caráter presencial, ou à distancia, variando consoante as necessidades identificadas.” Ou seja, nada mais acrescenta ao que consta no contrato e à notícia do PÁGINA UM.

  • Câmara de Lisboa: só este ano, contratos em assessoria política atingem os 1,8 milhões de euros

    Câmara de Lisboa: só este ano, contratos em assessoria política atingem os 1,8 milhões de euros


    O PÁGINA UM foi investigar as contratações de serviço político na Câmara Municipal de Lisboa. Até porque ontem foram publicados mais dois contratos no Portal Base para auxiliar uma vereadora do Bloco de Esquerda que, sem pelouro, já conta cinco assessores. Só este ano, celebraram-se 27 contratos, que incluem até jovens militantes, e onde se destaca o ex-jornalista Maia Abreu, com nova avença mensal desde Setembro no valor de 4.616 euros, e que nem obriga à sua presença diária. E até há um assessor para o PPM que vive nos Açores, um exotismo que levou o deputado municipal Gonçalo da Câmara Pereira a insurgir-se face a um pedido de comentário, mandando o jornalista do PÁGINA UM para “o caralho”  e recomendando-lhe a ir “pintar macacos para a China”.


    A Câmara Municipal de Lisboa já contratou este ano mais 27 assessores para auxílio político dos seus autarcas (vereadores e deputados municipais), comprometendo-se a gastar cerca de 1,8 milhões de euros, IVA incluído. Esta lista inclui um contrato celebrado no dia 27 de Dezembro do ano passado, mas com duração de quase dois anos. De acordo com o levantamento do PÁGINA UM, encontram-se assessores para todos os gostos e carteiras, desde seis assessores a receber mais de 4.000 euros por mês – valores superiores aos salários dos próprios vereadores, cuja remuneração nas duas principais autarquias do país ronda os 3.200 euros – até um contratado por cerca de 1.100 euros, mas neste caso o assessor, para trabalhos de apoio ao grupo municipal do PPM, viverá nos Açores.

    Os contratos têm duração distinta, mas a esmagadora maioria (21) abrange mais de 700 dias. Assim, no presente mês de Novembro, apenas para os contratos celebrados em 2023, a autarquia irá gastar cerca de 81 mil euros, não estando aqui contabilizados os assessores com contratos de prestação de serviços celebrados antes deste ano mas que ainda se encontram em vigor.

    Apesar da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas determinar a inserção obrigatória em “página electrónica, por extracto” dos contratos de prestação de serviços, o departamento de comunicação da Câmara Municipal de Lisboa remeteu o PÁGINA UM para a pesquisa no boletim municipal ou no Portal Base, não enviando a lista dos assessores e dos contratos como outras autarquias fazem. Ou seja, quis que o PÁGINA UM procurasse ‘agulhas em palheiro’. Saliente-se que para cumprimento da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos, não basta a uma entidade pública dizer que a informação consta no seu site; tem de enviar as ligações ou disponibilizar a informação escrita.

    Apesar disso, o PÁGINA UM predispôs-se a fazer uma pesquisa detalhada, mas morosa, no Portal Base, desvendando alguns casos muito sui generis de aquisição de serviços de assessoria política em contratos em vigor a partir de 2023. Não estão, assim, incluídas as aquisições de serviços políticos celebradas no ano passado, e não se incluindo, deste modo, por exemplo os oito assessores contratados no início de 2022, e ainda em funções, para prestar assessoria a Rui Tavares, vereador sem pelouros do Livre e também deputado na Assembleia da República.  

    A primeira conclusão é que mesmo os partidos sem funções executivas usam os orçamentos camarários para contratar assessores políticos em número assinalável, mesmo podendo recorrer, na recolha de informação, aos próprios serviços administrativos do município. E não contratam, como se observa pelo acima referido para o Livre, a um, a dois ou a três assessores. Por exemplo, actualmente, a vereadora bloquista Beatriz Gomes Dias, mesmo também sem pelouro, já aumentou este mês para cinco o número de assessores, depois de mais dois contratos de prestação de serviços celebrados no passado dia 1, e que ontem foram detectados pelo PÁGINA UM aquando da elaboração do Boletim 1 dos ajustes directos.

    Contratos por ajuste directo em vigor a partir de 2023 para assessoria política na Câmara Municipal de Lisboa, O valor mensal foi calculado em função do preço contratual divido pelo prazo de execução em dias e multiplicado por 30. O IVA é de 23% do valor contratual. Fonte: Portal Base. Análise: PÁGINA UM. Ver aqui em maior resolução.

    Um dos contratos foi com Ackssana Rodrigues da Silva, no valor de cerca de 3.000 euros por mês, especificamente para a “área dos Direitos Sociais, com foco nas questões da discriminação de género e da discriminação racial, das migrações e da proteção de crianças e jovens”. O outro foi com Ana Filipa Gonçalves, que receberá cerca de 3.500 euros por mês para trabalho político genérico. Esta assessora já tinha executado funções similares no gabinete de Ricardo Robles em 2018, um bloquista caído em desgraça.

    Esta vereadora do Bloco de Esquerda conseguira assegurar os outros três assessores entre Abril e Maio do ano passado, cujos contratos ainda estão em vigor. Carolina Almeida da Silva, Carlos Sainica Carujo e Tiago André Teixeira estão a receber por mês cerca de 3.000 euros. Em suma, a ‘folha salarial’ dos cinco assessores políticos para uma vereadora bloquista sem pelouro fica em quase 16.000 euros por mês.

    Mas os primeiros dois lugares do pódio em número de contratos de assessoria política em 2023 são ocupados pela vereadora Joana Almeida, com os pelouros do Urbanismo e da Reabilitação Urbana, e pela vereadora da oposição Floresbela Mendes Pinto, eleita na coligação Mais Lisboa (PS e Livre). Ambas contrataram três novos assessores desde Janeiro.

    Beatriz Gomes Dias, vereadora sem pelouro do Bloco de Esquerda, conseguiu mais dois novos assessores este mês. Já conta cinco, de acordo com os dados do Portal Base.

    A primeira vereadora, eleita na lista de Carlos Moedas, passou a contar este ano com Adriano Prates, Inês Chambel Borges e António Graça Vieira, que se juntaram a mais quatro outros assessores ainda em funções: Bruno Valente Mourão, Rita Apolinário, José Cunha e Henrique Galado, cada um recebendo por mês, com IVA incluído, cerca de 3.000 euros. Os sete assessores podem justificar-se pelas necessidades nos sectores por si tutelados, uma vez que os novos serviços de assessoria se destinam às áreas jurídica, de arquitectura, gestão urbanística e planeamento urbano, e ainda para “apoio à implementação do programa municipal Lisboa sem Fios”.

    Quanto a Floresbela Mendes Pinto – que já esteve do ‘outro lado’, arrecadando cerca de 4.600 euros por mês entre Dezembro de 2017 e Outubro de 2021, quando foi assessora da vereadora Paula Tavares – rodeou-se este ano de Isabel Cotrim, André Ferreira e António Diegues Ramos para “apoio à atividade” do seu gabinete e para “suportar a necessária articulação da atividade autárquica desenvolvida”. Isto mesmo não tendo funções executivas. Não se encontram no Portal Base assessores políticos em anos anteriores para o seu gabinete.

    Mas o partido político que, no conjunto, mais assessores conseguiu contratar este ano para a Câmara Municipal de Lisboa foi o CDS-PP, para auxiliar o vice-presidente Filipe Anacoreta Correia e os vereadores Diogo Moura e Sofia Athayde. Por agora, são oito.

    Rui Tavares, vereador sem pelouro, não teve nenhum novo assessor este ano, mas conseguiu que em 2022 o município lhe pagasse nove, dos quais oito ainda em funções.

    De entre os contratados neste lote destaca-se a contratação do ex-jornalista João Maia Abreu. Há alguns meses, o antigo director dos canais internacionais da TVI suscitou polémica ao ser-lhe adjudicada, por ajuste directo, a liderança da comunicação da Jornada Mundial da Juventude, que terminou em Agosto passado.

    Maia Abreu nem sequer duas semanas descansou, porque Anacoreta Correia conseguiu lhe uma nova avença, no valor de 4.616 euros por mês, por uma assessoria de comunicação de 13 meses. A assessoria não obriga à sua presença diária, uma vez que no contrato apenas se explicita que a “prestação de serviços de aconselhamento, elaboração de elementos e recolha de informações” se fará “quando e sempre que para tal [for] solicitado pelo Gabinete, mantendo disponibilidade e encontrando-se sempre contactável para o efeito”.

    Mas Maia Abreu nem sequer é o que vai receber mais. Rui Castello-Branco Ribeiro, que já exerceu funções no grupo parlamentar CDS-PP, mas perdeu o emprego com a saída deste partido da Assembleia da República, está a auferir cerca de 4.600 euros por mês num contrato até Maio de 2025.

    Há outro caso digno de nota nas contratações para os vereadores centristas: com um mestrado em Ciência Política concluído no ano passado, António Pereira da Silva é um dos assessores mais jovens, estando a auferir um salário mensal de cerca de 3.600 euros, IVA incluído. Vai receber 92.250 euros até Outubro de 2025.

    João Maia Abreu, em 2016, a fazer playback numa festa da TVI. Agora, ‘canta’ na Câmara Municipal de Lisboa, para o vice-presidente Anacoreta Correia, com uma avença não-presencial de 4.616 euros por mês.

    Ainda em relação ao CDS-PP, está neste lote o assessor Pedro Vaz Pinto Furtado de Mendonça, contratado em finais de Janeiro, e que recebeu 7.380 euros no seu primeiro mês de trabalho. Mas, na verdade, o seu contrato, válido até Janeiro de 2025, terá uma retribuição mensal média de cerca de 3.500 euros.

    Mesmo na oposição, o gabinete dos vereadores do Partido Socialista deu as boas-vindas a dois novos assessores. Um deles é o jovem advogado Ricardo Marcos, na casa dos 20 anos, que integra a Comissão Nacional da Juventude Socialista, e que foi contratado para assessorar a vereadora Inês Drummond na área jurídica. Custará à autarquia cerca de 100 mil euros até Outubro de 2025, auferindo um salário um pouco superior a 4.500 euros. Menos sorte teve outro assessor contratado para prestar “apoio técnico” ao grupo socialista: Ricardo Gonçalves Dias só está a receber desde o início deste ano cerca de 1.300 euros por mês.

    Por sua vez, o PSD contratou cinco novos assessores: dois para o gabinete da vereadora Filipa Roseta, dois para o vereador Ângelo Pereira, e um para o Grupo Municipal. Os serviços em causa cobrem desde as áreas das “obras municipais e concretização das acções em habitação incluindo as financiadas pelo PRR” à “higiene urbana”. No total, os contratos feitos pelos sociais-democratas perfazem 189.990 euros. Destes assessores, aquele que está a receber mais é Pedro Silva Vieira, que aufere desde Maio passado cerca de 4.000 euros por mês, tendo o contrato mais longo (915 dias).

    António Pereira da Silva, um dos mais jovens assessores políticos com uma avença de cerca de 3.600 euros por mês.

    Os partidos Chega, PCP e o Partido Popular Monárquico foram, ao longo de 2023, mais ‘comedidos’, tendo contratado apenas um assessor. O PCP contratou um assessor (Fernando Manuel Carvalho Henriques) com um salário de cerca de 2.000 euros por mês para auxiliar o vereador João Ferreira.

    Por sua vez, para assessorar os deputados municipais, o partido de André Ventura conseguiu que o município de Lisboa adquirisse os serviços de assessoria de comunicação, com uma duração de 23 meses, a Sofia Félix Teixeira, uma militante do Chega da freguesia de Penha de França. O custo mensal para os cofres municipais será de cerca de 3.600 euros por mês.

    Por seu turno, o PPM destaca-se por, no grupo de assessores com contrato celebrado este ano, ter o mais ‘baratinho’, mas também o mais ‘exótico’, uma vez que Edgardo Costa Madeira vive nos Açores.

    Gonçalo da Câmara Pereira, deputado municipal de Lisboa pelo Partido Popular Monárquico.

    Com o objectivo de dar “apoio técnico na érea da educação e cultura” ao Grupo Municipal do PPM da Assembleia Municipal de Lisboa, o açoriano Edgardo Costa Madeira – que não respondeu ao pedido de comentário do PÁGINA UM – pode, de acordo com o contrato que lhe vale quase 1.200 euros por mês, prestar o seu trabalho “em qualquer local que o Município de Lisboa designar, desde que se justifique para assegurar a execução dos serviços (…) sem necessidade de anuência por parte do prestador de serviços”.

    Sobre esta contratação, também se quis obter um comentário do único deputado do Partido Popular Monárquico na Assembleia Municipal da capital, Gonçalo da Câmara Pereira, mas este muito republicamente, e com elevado espírito filosófico, declarou, de forma repetida, ao PÁGINA UM: “Vá pintar macacos para a China. Vá para o caralho”.