Categoria: Sociedade

  • ‘Doce centenário’: sem concurso público, Portimão paga quase um milhão para programa cultural

    ‘Doce centenário’: sem concurso público, Portimão paga quase um milhão para programa cultural

    A socialista Isilda Gomes quis, o município sonhou e as comemorações do centenário da cidade de Portimão estão a avançar com um custo de 910 mil euros. Tudo sem concurso público, e atropelando as mais elementares normas de transparência e de livre concorrência no criativo e competitivo mundo cultural. Alegando ser a única entidade capaz de executar a programação para os 100 anos da cidade, a autarquia de Portimão celebrou um contrato por ajuste directo com a cooperativa algarvia Lavrar o Mar, fundada e liderada pelo italiano Giacomo Scalisi, e para contornar a abertura de um concurso público invocou uma norma de excepção do Código dos Contratos Públicos apenas usada para a compra de uma obra de arte ou a aquisição de um simples espectáculo. Além disso, a edilidade acaba por confessar que Giacomo Scalisi já está a prestar serviços desde Outubro do ano passado, embora o contrato só tenha sido celebrado quatro meses depois.


    Um chorudo ajuste directo, sem concorrência, de mão-beijada. Para programar eventos culturais do primeiro centenário da cidade de Portimão, a autarquia local contratou a cooperativa algarvia Lavrar o Mar, presidida pelo encenador italiano Giacomo Scalisi, por um valor de 740 mil euros, que ascende a 910 mil euros com IVA incluído. O contrato celebrado no final de Fevereiro, e divulgado no início da semana passada, invoca um falso argumento previsto pelo Código dos Contratos Públicos, para um ajuste directo desta natureza, porque equipara a programação e gestão de 38 eventos culturais e festivos – que se iniciaram no passado mês, e se prolongam até ao final do presente ano – à aquisição (compra) de obra de arte, contratação de um artista ou de um espectáculo.

    De acordo com o registo inserido no Portal Base – que omite a proposta da Lavrar o Mar, apesar de se salientar “fazer parte integrante deste contrato” –, a decisão de contratar por ajuste directo a cooperativa sediada em Aljezur, e criada em 2014 por Giacomo Scalisi e Madalena Victorino, ocorreu em 6 de Dezembro do ano passado, invocando-se critérios materiais para contornar a abertura de um concurso público, ademais tendo em conta o elevado montante em causa.

    A socialista Isilda Gomes é presidente da Câmara Municipal de Portimão desde 2013. (Foto: D.R./PS)

    O uso de ajustes directos para a “criação ou aquisição de uma obra de arte ou de um espetáculo artístico” costuma ser uma prática banal e legal, embora discutível, mas aquilo que, no caso do centenário da cidade de Portimão, está em causa não é a mera aquisição de espectáculos ou a contratação de artistas, mas sim a “criação e execução de projecto artístico” com a duração de 397 dias.

    De acordo com o programa já disponível, apenas dois dos espectáculos são produzidos pela Lavrar o Mar: o primeiro, em Outubro, é de Scalisi; e o outro será um espectáculo que combina dança e música da autoria da bailarina e coreógrafa Madalena Victorino, co-diectora artística da cooperativa. Dos restantes eventos, que decorrem entre Fevereiro e Dezembro de 2024, encontram-se concertos, espectáculos circenses, exposições e outros eventos com a produção executiva ou organização por outras entidades, que foram programados pela cooperativa a partir do ajuste directo.

    Em respostas a questões colocadas pelo PÁGINA UM, o município liderado por Isilda Gomes, que dirige a autarquia há mais de uma década, limitou-se basicamente a reafirmar a fundamentação invocada no contrato bem como o objecto do concurso: “o desenho e operacionalização de um programa de comemorações” do centenário da cidade.

    Na verdade, ninguém parece esconder que a função da Lavrar o Mar nos eventos associados às comemorações é a de programação. Ainda hoje, o diariOnline Região Sul, anunciava “o primeiro espetáculo da programação artística criada e apresentada pela Lavrar o Mar Cooperativa Cultural para assinalar esta importante efeméride [centenário da cidade], com diversos momentos a decorrer até ao final do ano, numa parceria estabelecida com o Município de Portimão”. O espectáculo nada tem a ver com a cooperativa, uma vez que tem “a produção executiva da Unnica Arts”, conforme revela o jornal algarvio. E, obviamente, não se trata de uma parceria, mas sim de uma prestação de serviços.

    Madalena Victorino e Giacomo Scalisi, da cooperativa Lavrar o Mar.
    (Foto: Captura de imagem a partir de entrevista no YouTube)

    O próprio município não esconde ao PÁGINA UM que a Lavrar o Mar tem funções de programador e de gestor, e que tudo foi antecipadamente negociado com o director artístico Giacomo Scalisi, o que imediatamente deveria retirar a possibilidade de se invocar o ajuste directo por critério material para justificar um ajuste directo de 910 mil euros.

    Segundo a autarquia de Portimão, “todos os encargos inerentes à execução do projecto que venha a ser aprovado serão da responsabilidade da entidade a contratar”, sendo acompanhadas pelo município através de reuniões regulares com o diretor artístico da Lavrar o Mar, e pela “apresentação de relatórios e memorandos escritos”. Ou seja, uma mera prestação de serviços que dificilmente se enquadra nos critérios materiais de criação ou aquisição de uma obra de arte ou de um espetáculo artístico.

    A autarquia de Portimão defende que a escolha da Lavrar do Mar teve como pressupostos “o desenho e operacionalização de um programa de comemorações [que] exige que o mesmo seja acompanhado artisticamente por uma entidade de reconhecida competência no domínio da programação artística, visando assegurar a articulação entre os vários setores da produção e o acompanhamento de públicos em coerência com o programa artístico a conceber”, e também a necessidade de que a entidade escolhida possuísse “um conhecimento profundo não só de programação, mas também das companhias e artistas que possam vir a integrar o programa das Comemorações do centenário da Cidade de forma a potenciarem as interações artísticas e formativas entre os artistas e os públicos”.

    Mesmo estando em causa a eventual violação do Código dos Contratos Públicos – e a eventual fiscalização do ajuste directo pelo Tribunal de Conta pode vir a declarar mesmo ilegalidades e nulidades –, o município de Portimão insiste ter sido esta a melhor opção, embora tal seja difícil de provar quando se trata de um adjudicatário escolhido a dedo, sem concorrência.

    Fonte oficial do município disse ainda ao PÁGINA UM que “considerando que Giácomo Scalisi aceitou pensar connosco o passado e desenhar num programa artístico, o futuro cultural para a cidade, através das festividades do seu centenário (…), afigura-se-nos que a [única] entidade que poderá colaborar, com valor acrescentado, face a outras eventuais opções, na conceção e operacionalização do projecto artístico de comemorações declinando-o através de um planeamento adequado num conjunto de tarefas de conceção, pré-produção e produção que lhe caberá, depois, coordenar, será a entidade Lavrar o Mar”, concluindo que, desse modo, o “serviço pretendido apenas pode ser confiado a esta entidade”.

    A autarquia liderada por Isilda Gomes até admite que a Lavrar o Mar começou a desenvolver o projecto artístico para as comemorações em Outubro do ano passado, ou seja, quatro meses antes da assinatura do contrato por ajuste directo, algo que constitui uma outra evidente ilegalidade.

    (Foto: Captura de imagem de reportagem da TVI)

    Antes deste ‘jackpot‘ de 910 mil euros, o contrato com entidade pública de valor mais elevado que a cooperativa Lavrar o Mar tinha obtido foi um do município de Odemira, em 2018, no valor de cerca de 112 mil euros (IVA incluído), relativo à “aquisição de serviço de espectáculos e workshops pedagógicos”.

    Para o município de Portimão, este ajuste directo corresponde ao quarto maior contrato de sempre feito sem concurso. O maior ajuste directo foi adjudicado em 2011 para a construção da nova escola EB 2,3 na zona da Bemposta, no valor de quase cinco milhões de euros. O segundo maior, efectuado em 2010, no valor de 4,3 milhões de euros, destinou-se à “Ampliação e beneficiação do Centro Escolar do Pontal”. O terceiro maior ajuste directo, em 2018, foi efectuado com a EDP, para o “fornecimento de energia eléctrica para as instalações alimentadas em MT, BTE, BTN e BTN – Iluminação Pública”, no montante de 756 mil euros.


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  • Banco Português de Fomento: da Católica a Montenegro, gasta muito e ganha pouco

    Banco Português de Fomento: da Católica a Montenegro, gasta muito e ganha pouco

    Foi uma ‘invenção’ do Governo socialista. Em vez de se aproveitar o know-know e as sinergias da Caixa Geral de Depósitos (CGD), criou-se em 2020 o Banco Português de Fomento (BPF), um micro-banco que, na verdade, sendo um ‘pigmeu financeiro’, gasta que se farta. Se a CGD despende 690 euros em serviços administrativos e com pessoal para obter 1.000 euros de lucro, já o BPF precisa de gastar 5.367 euros para alcançar o mesmo objectivo. Mas se o BPF – que teve apenas lucros de 3 milhões de euros em 2022 com 16,1 milhões de euros em gastos de funcionamento – aparenta ser um péssimo negócio para os contribuintes, há quem não terá, por certo, a mesma opinião. São os casos de grandes consultoras financeiras, empresas tecnológicas, seguradoras, empresas de leasing automóvel e sociedades de advogados, onde se inclui a de Luís Montenegro e a de Pedro Rebelo de Sousa, irmão do Presidente da República. A avença do escritório do futuro primeiro-ministro terminou em Dezembro passado.


    Ao fim de menos de três anos de funcionamento, o Banco Português de Fomento – uma instituição bancária autónoma criada pelo Estado quando já detinha um banco estável, a Caixa Geral de Depósitos – mostra ter sido uma opção vantajosa para muitos, mas não para os contribuintes.  

    Criado em finais de 2020 como um banco promocional de desenvolvimento – isto é, para facilitar a concessão de crédito  proveniente sobretudo do Programa de Recuperação e Resiliência –, o BPF foi constituída pela fusão de diversas pequenas entidades financeiras públicas que não estavam sob alçada da Caixa Geral de Depósitos (CGD), nomeadamente da PME Investimento (uma sociedade pública de investimentos), a Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD) e a Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua (SPGM). A estratégia política do Governo agora cessante foi, na verdade, criar um novo banco de investimento, mas à margem de toda a estrutura já consolidada da CGD.

    Na verdade, olhando para as demonstrações contabilísticas das duas instituições bancárias públicas, o BFE é um autêntico pigmeu perante a CGD, o que leva a questionar a razão para não se ter criado um departamento autónomo na instituição liderada por Paulo Macedo aproveitando know-how e sinergias. Mas o BFE é um pigmeu mas com uma grande gula.

    Em 2022, o BPF apresentava apenas 848 milhões de euros em activos, que representam apenas menos de 9% dos activos da CGD no ano passado, de acordo com os resultados hoje apresentados. No entanto, enquanto os activos da CGD contribuíram para um lucro (recorde) de quase 1,3 mil milhões de euros, a que acresce de 529 milhões de euros impostos ao Estado, o BPF conseguiu em 2022 – ainda não apresentou resultados do ano passado – apenas um lucro de 3 milhões de euros. Apesar disso, para ter lucros de 3 milhões de euros, o BPF teve de gastar quase 10 milhões de euros com pessoal e 6,2 milhões de euros em gastos administrativos, que inclui serviços externos. Assim, se por cada 1.000 euros de lucro a CGD registou gastos administrativos e com pessoal de 690 euros, já o ‘esfomeado’ BPF teve de ‘comer’ 5.367 euros em gastos administrativos e com pessoal por cada 1.000 euros de lucro. Saliente-se que os gastos com pessoal subiram cerca de 18% entre 2021 e 2022. Ainda não foram apresentados os resultados de 2023.

    Esta absurda estrutura de custos do BPF tem uma explicação: criar um banco, independentemente da sua dimensão, implica um ‘custo fixo’ em termos de encargos com serviços financeiros (incluindo compliance e contabilidade), com assessoria jurídica e com tecnologias de informação, tanto de hardware como de software. E as duas administrações que já passaram por esta instituição bancária agora presidida por Ana Carvalho – e que acabou de celebrar um contrato de 700 mil euros com a Universidade Católica para serviços ainda não completamente conhecidos – têm sido pródigas em gastos, e generosas na sua distribuição.

    O Banco Português de Fomento foi uma ‘invenção’ do Governo socialista, que permitiu que muitas sociedades de advogados facturassem serviços. A sociedade de Luís Montenegro recebeu 100 mil euros numa avença que terminou em Dezembro passado.

    Ontem, a pretexto do contrato com a Universidade Católica, fonte do BPF referiu ao PÁGINA UM que, como o plano de actividades e orçamento de 2023 foi aprovado apenas em finais de Julho, apenas nos últimos meses do ano passado se concretizou “uma parte expressiva do início dos processos de contratações públicas”, salientando que foram desencadeados “456 procedimentos de contratação pública, com um investimento total de 4,21 milhões de euros”, dos quais 405 procedimentos, envolvendo 311.988 euros por ajuste directo simplificado e mais 34 por ajuste directo no valor de 1,1 milhões de euros. Em paralelo, o BPF efetuou quatro concursos públicos internacionais e nove nacionais, totalizando, respetivamente, 1,58 milhões e 962 mil euros.

    Mas a estes somam-me muitos mais nos anos recentes. Incluindo período anterior à criação do BFP em 2020 por fusão de outras entidades – o banco ‘herdou’ o número de pessoa colectiva da Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua –, já foram registados 268 contratos no Portal Base, dos quais 238 já como instituição bancárias.

    Num agrupamento por tipologia feita pelo PÁGINA UM, de um total de 21,15 milhões de euros, os maiores gastos foram para equipamentos e serviços associados a tecnologia de informação, com cerca de 6,8 milhões de euros (32% do total), destacando-se os ganhos da Glintt (1,4 milhões de euros), a Hydra IT (quase 1,2 milhões de euros), a IDW (650 mil euros), a TCSI (418 mil euros) e a Divultec (358 mil euros).

    Top 20 das entidades com maior valor de contratos celebrados com o Banco Português de Fomento. Antes de 2020, incluindo procedimentos para a criação do BPF, os contratos foram celebrados pela Sociedade Portuguesa da Garantia Mútua. Fonte: Portal Base. Análise: PÁGINA UM.

    A segunda maior tipologia de gastos foi para contratação de externa de serviços de assessoria financeira. Neste grupo destacam-se os contratos das consultoras Oliver Wyman (com 2,84 milhões de euros), Deloitte Risk Advisory (2,05 milhões de euros), KPMG (659 mil euros), Deloitte Consultores (334 mil euros) e ainda da Universidade Católica Portuguesa (720 mil euros, que inclui um pequeno ajuste directo de 20 mil euros em 2018).

    No terceiro grupo de serviços mais gastadores estão as assessorias jurídicas, pagas sempre a peso de ouro e escolhidas invariavelmente a dedo. A vários dedos. E os beneficiários são sonantes, para repartir um ‘bolo’ que já vai em cerca de 4,2 milhões de euros, a começar pelo futuro primeiro-ministro, Luís Montenegro.

    Em Janeiro de 2022, a sociedade de advogados Sousa Pinheiro & Montenegro beneficiou de uma avença mensal que terminou em Dezembro do ano passado, amealhando 100 mil euros, a que acresceu o IVA. Também Pedro Rebelo de Sousa, o irmão do Presidente da República, já viu a cor do dinheiro saído do BPF. Por duas vezes, a Sociedade Rebelo de Sousa & Associados recebeu ajustes directos desta instituição bancária: primeiro em 2020, no valor de 79.560 euros, e no ano passado entraram mais 32.650 euros.

    Valores dos contratos celebrados pelo Banco Português de Fomento (inclui valores gastos entre 2016 e 2019 pela Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua). Fonte: Portal Base. Agrupamento e análise: PÁGINA UM.

    Mas Luís Montenegro e Pedro Rebelo de Sousa nem foram os advogados que mais receberam do BPF. Na lista de prestadores de serviços jurídicos, com contratos de mão-beijada, sem se saber ao certo aquilo que fizeram, estão conceituados escritórios de advogados como a Sérvulo & Associados (571 mil euros), a Cabeçais de Carvalho & Associados (270 mil euros), a Vieira de Almeida & Associados (254 mil euros), a Abreu & Associados (241 mil euros), a Santos Carvalho & Associados (179 mil euros), a Oliveira, Reis & Associados (168 mil euros) e a Andrade de Matos & Associados (120 mil euros).

    Também com gastos relevantes estão os diversos seguros contratados, que já totalizam quase 1,4 milhões de euros, bem como as prestações de serviços de contabilidade, que se aproximam dos 824 mil euros. Para serviços de leasing de automóveis e transporte, a factura assumida pelo BPF ascende já aos 550 mil euros. E o marketing, sempre necessário, atinge, por agora, os 265 mil euros.


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  • Ajuste milionário à Católica: Banco Português de Fomento diz que afinal consultou outras universidades, mas não apresenta provas

    Ajuste milionário à Católica: Banco Português de Fomento diz que afinal consultou outras universidades, mas não apresenta provas

    Deveria ter sido apenas mais um ‘banal’ contrato de consultadoria externa pelo Banco Português de Fomento, disfarçado no meio de muitos outros, mas o ajuste directo de 700 mil euros entregue no mês passado à Universidade Católica Portuguesa chamou a atenção ao PÁGINA UM: afinal, não é todos os dias que uma assessoria financeira é justificada como se estivesse em causa a segurança pública ou de bens, uma vez que, para evitar a abertura de um concurso público, foi alegada “urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis”, para uma tarefa que durará três anos. Agora, o banco presidido por Ana Carvalho, uma antiga aluna da Católica, diz que afinal consultou “várias instituições académicas de renome”, mas isso implicaria a existência de um procedimento de consulta prévia, o que comprovadamente não sucedeu. Quanto à Universidade Católica, preferiu, através da sua porta-voz – que foi assessora de João Galamba até à sua demissão de ministro das Infraestruras em Novembro – criticar aspectos deontológicos do trabalho do PÁGINA UM.


    Afinal, quais os serviços em concreto previstos no misterioso contrato de 700 mil euros adjudicado por ajuste directo ao Banco Português de Fomento (BPF) à Universidade Católica, noticiado anteontem pelo PÁGINA UM? E qual a razão para uma minúscula mas gastadora instituição financeira estatal – ao fim de dois anos de existência, nas contas consolidadas de 2022 apresentou um passivo de 284 milhões de euros com gastos de quase 10 milhões e um lucro de uns meros 3 milhões de euros – ter de fazer sucessivos contratos de consultadoria financeira e jurídica que não páram de se acumular?

    Estas questões continuam sem uma resposta cabal, porque o BPF, apesar de aditar alguns esclarecimentos, continuou sem endereçar, apesar das insistências do PÁGINA UM, o caderno de encargos e um anexo ao contrato, inexistentes no Portal Base, que, em princípio definirá as tarefas a executar pelo Centro de Estudos de Gestão e Economia Aplicada da Universidade do Porto. Saliente-se que a instituição bancária tem sede na Cidade Invicta e a sua presidente do Conselho de Administração, Ana Carvalho fez toda a sua formação universitária naquela instituição privada de ensino superior.

    Ana Carvalho, CEO do Banco Português de Fomento. A Universidade Católica Portuguesa recebe 700 mil euros da instituição bancária liderada por uma sua ex-aluna.

    Com efeito, sem remeter quaisquer dos documentos em falta no Portal Base – e que virão agora a ser solicitados formalmente pelo PÁGINA UM ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos com eventual remessa para o Tribunal Administrativo em caso de nova recusa no prazo de 10 dias –, fonte oficial do BPF diz que este ajuste directo se enquadra nas suas funções “de gestor do Fundo de Capitalização e Resiliência (FdCR)”, em que se mostrou necessário “reforçar o acompanhamento na gestão dos investimentos diretos efetuados” por este programa.

    Deste modo, acrescenta a mesma fonte, “com a perspetiva de assegurar um escrutínio prudente e neutro, o BPF decidiu pela designação [indicação] de ‘Observadores’ independentes, profissionais de elevada especialização, que terão assento nos Conselhos de Administração (CA) das Participadas do FdCR”. Esses ‘Observadores’, de acordo com o BPF, “como um elemento independente” têm como função “uma apreciação crítica sobre os temas de negócio e de gestão discutidos e as decisões tomadas, alertando para riscos e preocupações que sejam relevantes”, para além de terem um “papel de colaboração na preparação das intervenções do BPF nas Assembleias Gerais das Participadas”.

    Sobre a razão de não ter sido, em caso de comprovada ausência de meios humanos próprio, lançado um concurso público, a fonte da instituição bancária liderada por Ana Carvalho diz que foram consultadas “várias instituições académicas de renome”, que não identifica, acrescentando que “a Universidade Católica Portuguesa – Centro Regional do Porto [foi], até então, a única que atendeu plenamente aos requisitos especificados pelo BPF e no prazo proposto”.

    Saliente-se que este argumento de consulta agora aditado pelo BPF é estranho e contraditório mesmo com o expresso no contrato conhecido, porque uma consulta como a referida, com “requisitos especificados”, consubstanciria uma consulta prévia, com procedimentos contratuais próiprios, o que formalmente não foi feita, Na realidade, o BPF fez um ajuste directo – ou seja, entregou um contrato de 700 mil euros de mão-beijada à Universidade Católica, escolhida a dedo – alegando uma norma de excepção que permite o ajuste directo, mas apenas “na medida do estritamente necessário”, se se verificarem “motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante, [em que] não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”.

    Como pode estar aqui em causa falsas declarações, a forma que o PÁGINA UM tem de esclarecer esta situação é solicitar agora ao BPF, ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos, não apenas os ofícios que foram supostamente remetidos para  as “várias instituições académicas de renome” como também os documentos que fundamentam os “motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis” que impediram a realização de um concurso público aberto e transparente. Obviamente, o Tribunal de Contas também terá, se assim desejar, os meios próprios de fiscalização deste contrato público.

    Também foram pedidos esclarecimentos à Universidade Católica sobre o ajuste directo de 700 mil euros, incluindo se houve alguma proposta prévia, para complementar os factos noticiados pelo PÁGINA UM com base nos registos inseridos no Portal Base pelo BPF e validados pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC). Em resposta, a porta-voz para a imprensa da instituição universitário, Rita Penela – ex-jornalista do Observador e assessora até Novembro passado do antigo ministro João Galamba – disse que “na sequência das questões dirigidas ontem, dia 11 de março, às 22h41 à Universidade Católica Portuguesa, vimos lamentar que não tenha sido respeitado o tempo de resposta por vós concedido e que tenham avançado com a publicação do artigo” – que, repita-se, se baseia em factos inseridos numa base de dados pública.

    A mesma fonte da Universidade Católica – que ministra uma licenciatura em Comunicação Social e Cultural – acrescentou ainda que “tal conduta desrespeita o direito ao contraditório previsto no Código Deontológico do Jornalista”, apesar de nada constar no dito código sobre um alegado ‘direito de contraditório’ –, concluindo que “a Universidade Católica Portuguesa não se revê na abordagem referida e muito lamenta que a _’Página Um’_ [sic] desrespeite o Código pelo qual devia pautar-se”.

    Instado, novamente, a comentar e conceder mais esclarecimento sobre o contrato de 700 mil euros – o maior contrato público por si obtido (de forma isolada), ainda mais este, por ajuste directo, sem os ‘incómodos’ da concorrência –, a Universidade Católica nada mais acrescentou.


    Nota: A fonte oficial do BPF também remeteu outras informações sobre os montantes das consultadorias, mas essa informação será, em breve, integrada num trabalho do PÁGINA UM sobre o universo dos contratos públicos desta instituição financeira.


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  • TAP investiga ‘voo rasante’ sobre Nice

    TAP investiga ‘voo rasante’ sobre Nice

    Um voo da Portugália Airlines, que pertence ao grupo TAP, registou um incidente na sua descolagem de Nice, no passado Sábado. Num voo com destino a Lisboa, a aeronave, um Embraer, sobrevoou aquela cidade francesa a uma altitude demasiado baixa, de apenas 2.500 pés, ou seja, 762 metros. Também a trajectória do voo não foi usual. Fonte oficial da TAP revelou ao PÁGINA UM que a companhia está a investigar o incidente em “estreita colaboração com as autoridades francesas”. Mas a TAP garante que este incidente não está relacionado com um outro, recente, que envolveu um Airbus numa aterragem em Madrid, cujo caso também levou a uma investigação.


    Um voo da Portugália Airlines, do grupo TAP, fez uma razia sobre a cidade de Nice, no passado sábado, dia 9 de Março, voando a uma altitude demasiado baixa, numa rota não autorizada, o que levou à abertura de uma investigação por parte da TAP e das autoridades francesas.

    O incidente envolveu uma aeronave da Embraer, E190, e ocorreu logo após a descolagem de Nice, num voo com destino a Lisboa.

    Segundo o site de rastreio de voos Flightradar24 – o qual pode ser impreciso –, o voo TAP483 de Nice para Lisboa estaria apenas a 2.500 pés de altitude (762 metros) quando começou a sobrevoar o centro da cidade de Nice. A trajectória do voo aparenta também ter sido algo errática.

    Um Embraer E190 (Foto: TAP)

    O aparelho terá feito uma volta à esquerda após a descolagem, numa manobra não autorizada. Circulou sobre o centro de Nice, alarmando alguns residentes, antes de retomar ao seu plano de voo normal e autorizado.

    O incidente foi reportado pela France 3 Côte d’Azur que indica que o procedimento de descolagem do aeroporto de Nice aponta que uma aeronave, “a menos que autorizada de outra forma pelo ATC (Controle de Tráfego Aéreo), não sobrevoe a terra abaixo de 5000 pés (1500 metros)”.

    Fonte oficial da TAP afirmou ao PÁGINA UM que a companhia “já desencadeou um processo de investigação relativamente ao alegado incidente em questão e que envolve um voo da PGA, no sábado, dia 09MAR (TP483), à descolagem de Nice”. Segundo a mesma fonte, “o referido processo está a ser conduzido em estreita colaboração com as autoridades francesas”.

    Trajectória do voo TP483 sobre Nice, com uma manobra não autorizada e a baixa altitude.
    (Foto: Captura de imagem no site Flightradar24)

    A Autoridade de Aviação Civil (DGAC) francesa está também a investigar o incidente, disse Nicolas Boulay, director de navegação aérea da DGAC Sud-Est, ao Nice Matin, confirmando também que os pilotos não tinham autorização para efectuar a manobra sobre a cidade, tendo sido uma escolha do piloto ou erro do piloto.

    “Fomos imediatamente notificados. Essa trajetória está longe de ser compatível (com o plano de voo normal). O piloto teve que fazer a opção de não cumprir as obrigações por causa de problemas com as condições de voo, talvez o clima, como uma massa de nuvens, mas ainda não tivemos resposta”, disse a mesma fonte, citada pelo Nice Matin. “É muito cedo para dizer. Essa descolagem está a ser analisada e vamos ter conversas com a empresa para tentar entender o que aconteceu”, sublinhou.

    O incidente sobre Nice gerou relatos de algum espanto e alarme por parte de residentes, incluindo nas redes sociais. Um utilizador partilhou na rede X (antigo Twitter) uma imagem da manobra do voo da PGA no Flight Radar com a nota: “Que avião comercial é este [?] que passou a baixa altitude de oeste para leste sobre as colinas?”.

    Questionada sobre se este caso pode estar ligado a um outro, recente, que envolveu um Airbus A321LR, numa aterragem em Madrid no dia 3 de Setembro de 2023, a fonte oficial da TAP garantiu ao PÁGINA UM que “este alegado incidente não tem relação com qualquer outro”.


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  • Universidade Católica saca 700 mil euros em assessoria a banco estatal por urgência imperiosa… em serviço para três anos

    Universidade Católica saca 700 mil euros em assessoria a banco estatal por urgência imperiosa… em serviço para três anos


    A plataforma da contratação pública, o Portal Base, exige a divulgação de informação detalhada sobre contratos, mas no caso daquele que foi celebrado no dia 23 de Fevereiro e divulgado na passada sexta-feira entre o Banco Português de Fomento (BPF) e a Universidade Católica aquilo que se destaca mais é o que não se mostra.

    Assinado por dois administradores executivos do banco estatal, cujos nomes são intencionalmente apagados – e sabendo-se que a presidente da comissão executiva do BFP, Ana Carvalho, é uma alumna da Católica -, o ajuste directo de 700 mil euros tem um objecto ignoto, sobretudo porque documentos essenciais não constam no Portal Base, apesar de expressamente serem parte integrante do contrato. Assim, de acordo com o clausulado, o contrato “tem por objecto principal a aquisição de serviços de assessoria financeira, nas condições do Caderno de Encargos”, mas o Caderno de Encargos nem vê-lo. Aliás, a cláusula 2ª diz, de forma clara, que o Caderno de Encargos faz “parte integrante do contrato”, bem como a proposta adjudicada, mas nada disto foi colocado no Portal Base.

    Por outro lado, nem sequer se sabe ao certo que tipo de serviços a Universidade Católica irá desempenhar, uma vez que estes alegadamente estarão definidos num “Anexo A”, indicado na cláusula 5, mas que não foi anexada ao contrato disponibilizado publicamente, como deveria.

    Mais estranho ainda é o motivo alegado para se entregar um chorudo contrato de serviços de consultadoria à Universidade Católica sem os incómodos de um concurso público, numa área em que existe bastante concorrência. O BPF invocou, para o contrato de mão-beijada, escolhendo a dedo a Católica, uma norma de excepção que permite o ajuste directo “na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante, não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”.

    Ora, esta norma de excepção serve quando, por exemplo, existe uma derrocada ou uma emergência pública e se mostra necessário uma intervenção imediata sem a qual existiriam constrangimentos graves. Em todo o caso, difícil se mostra também compreender como uma alegada “urgência imperiosa” necessita de serviços que duram três longos anos.

    Ana Carvalho, presidente da comissão executiva do Banco Português de Fomento. (Foto: D.R./BPF)

    O ajuste directo entregue pelo BPF constitui o quarto de valor mais elevado de sempre, sendo que os três maiores foram adjudicados à mesma entidade: a consultora Oliver Wyman. De acordo com o contrato com a Universidade Católica, a factura para o banco público poderá ser ainda superior, uma vez que os 700 mil euros (a que acresce IVA) não inclui outras despesas que sejam necessárias para a execução do serviço, as quais serão pagas à parte.

    Desde que foi fundado em Agosto de 2020, com a missão de promover a modernização das empresas e o desenvolvimento económico e social – e por via da fusão da Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD) e da PME Investimentos na Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua – o BPF tem sido sobretudo um manancial de contratos públicos. De acordo com o Portal Base, esta instituição já celebrou 367 contratos que englobam mais de 21,1 milhões de euros, sendo que uma parte substancial se referem a serviços de consultadoria financeira ou jurídica e ainda serviços e equipamentos informáticos.

    Mais de dois em cada três destes contratos (252 em 367) são ajustes directos, que totalizam quase 11,1 milhões de euros. O recurso a concurso público é uma minoria: apenas 68 contratos envolvendo um total de pouco mais de 6,8 milhões de euros.

    O maior ajuste directo contratado pelo BPF beneficiou a consultora Oliver Wyman, com um valor de 1,2 milhões de euros e foi efectuado em 2021. Mas, no total, esta empresa sacou mais três ajustes directos de valor ‘chorudo’: em 2021 consta um de 895 mil euros, e no ano anterior outro de 749 mil euros. No total, a consultora norte-americana, com escritórios em Lisboa, ganhou, só nestes três contratos, 2,8 milhões de euros, mas a sua ligação ao Governo vem desde 2016 quando foi contratada pelo Ministério das Finanças para tratar do Fundo de Resolução do Novo Banco.

    Tendo em consideração que o PÁGINA UM detectou este caso apenas ao final da tarde de hoje, no decurso da habitual elaboração do Boletim P1 sobre contratação pública, não foi possível contactar ainda o BPF e a Universidade Católica Portuguesa para obter mais esclarecimentos sobre o ajuste directo de 700 mil euros. Saliente-se, contudo, que a filosofia subjacente ao Portal Base é de que a informação aí constante, a começar pelo clausulado nos contratos, seja suficientemente clara para evidenciar a forma como se gerem os dinheiros públicos.

    O contrato celebrado pelo BPF e a Universidade Católica integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 8 e 10 de Março de 2024. Desde Setembro de 2023, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    ET / PAV


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    Nos últimos três dias, de sexta-feira até ontem, no Portal Base foram divulgados 823 contratos públicos, com preços entre os 52,50 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, ao abrigo de acordo-quadro – e os 6.201.029,20 euros – para aquisição de medicamentos, pela Unidade Local de Saúde de Santa Maria, também ao abrigo de acordo-quadro.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 17 contratos, dos quais 11 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste-directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 17 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: três do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (um com a Novartis Farma, no valor de 1.855.141,00 euros, outro com a Vertex Pharmaceuticals, no valor de 482.364,72 euros, e outro com a Dh Hps, no valor de 102.072,59 euros); Unidade Local de Saúde de São João (com a Alexion Pharma, no valor de 1.570.752,80 euros); Banco Português de Fomento (com a Universidade Católica Portuguesa, no valor de 700.000,00 euros); Município de Santo Tirso (com a Transdev Norte, S.A., no valor de 692.914,30 euros); dois do Estado-Maior-General das Forças Armadas (um com a Endesa Energia, no valor de 435.786,34 euros, e outro com a Interlimpe Facility Services, no valor de 275.871,20 euros); dois do Instituto dos Registos e do Notariado (um com a Fine Facility Services, no valor de 364.256,14 euros, e outro com a Eipeople, Lda., no valor de 197.999,98 euros); Unidade Local de Saúde da Região de Leiria (com a Beckman Coulter Portugal, no valor de 270.925,20 euros); Instituto Politécnico de Portalegre (com a Reerguer – Reconstrução e Construção de Imóveis, no valor de 251.842,38 euros); Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (com a Bristol – Myers Squibb, no valor de 198.746,00 euros); Centro Hospitalar de Setúbal (com a várias farmacêuticas, no valor de 114.020,91 euros); Unidade Local de Saúde de Almada-Seixal (com a Interlimpe – Facility Services, no valor de 105.958,80 euros); Lisboa Ocidental, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana (com a RIOBOCO – Serviços Gerais, Engenharia e Manutenção, no valor de 104.930,00 euros); e o Instituto do Turismo de Portugal (com a C-More Sustainability, no valor de 100.100,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 8 a 10 de Março

    1Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de Santa Maria

    Adjudicatário: Biogen Portugal

    Preço contratual: 6.201.029,20 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    2Aquisição de serviços de telecomunicações

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Vodafone Portugal

    Preço contratual: 2.996.405,72 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de equipamentos de protecção individual para combate a incêndios

    Adjudicante: Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil

    Adjudicatário: Dragontrophy II          

    Preço contratual: 2.695.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos

    Preço contratual: 1.855.141,00 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    5Aquisição de serviços de varredura mecânica para limpeza de arruamentos

    Adjudicante: Município de Oeiras

    Adjudicatário: ECOAMBIENTE – Serviços e Meio Ambiente

    Preço contratual: 1.686.056,97 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 8 a 10 de Março

    1 Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos

    Preço contratual: 1.855.141,00 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de São João

    Adjudicatário: Alexion Pharma Spain

    Preço contratual: 1.570.752,80 euros


    3Aquisição de serviços de assessoria financeira

    Adjudicante: Banco Português de Fomento

    Adjudicatário: Universidade Católica Portuguesa

    Preço contratual: 700.000,00 euros


    4Aquisição de serviços de transporte regular de passageiros

    Adjudicante: Município de Santo Tirso

    Adjudicatário: Transdev Norte S.A.

    Preço contratual: 692.914,30 euros


    5Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Vertex Pharmaceuticals

    Preço contratual: 482.364,72 euros


    MAP

  • Carla Matadinho ganha contrato (pejado de rasuras) para gestão do Centro Cultural da Malaposta

    Carla Matadinho ganha contrato (pejado de rasuras) para gestão do Centro Cultural da Malaposta

    Um contrato de concessão para a gestão do Centro Cultural da Malaposta, entre a autarquia de Odivelas e a Yellow Star Company, detida pela ex-modelo Carla Matadinho, é um caso paradigmático da absurda falta de cultura de transparência na Administração Pública: uma lei impõe a publicitação numa plataforma de acesso público (Portal Base); os gestores públicos tratam de meter um manto escuro sobre o papel. O texto do contrato que vale mais de 2,7 milhões de euros, inserido por obrigação legal no Portal Base, está inundado de rasuras a negro, ficando sem se perceber o seu conteúdo. O edil socialista Hugo Martins, que assinou o contrato, nem se digna a dar explicações.


    O município de Odivelas celebrou um contrato de concessão da gestão e exploração do Centro Cultural da Malaposta no valor de cerca de 2,7 milhões de euros com uma empresa detida pela ex-modelo Carla Matadinho, mas a cópia inserida por obrigação legal no Portal Base está pejado de rasuras, que em muitos casos nem sequer permitem compreender o seu alcance. O contrato foi oficialmente assinado em 14 de Fevereiro, mas somente colocado na plataforma da contratação pública na quinta-feira passada.

    Contratualizada após um concurso público em que apenas a Yellow Star Company Unipessoal – a empresa detida integralmente por Carla Matadinho –, a concessão terá um prazo inicial de vigência de quatro anos, podendo eventualmente prolongar-se por mais quatro. Em termos práticos, a autarquia entregará por ano 336 mil euros pela produção de 94 espectáculos, desde teatro e música até oficinas artísticas e projecção de cinema, nas quatro salas, constituídas pelo auditório principal (com 159 lugares), sala experimental (40 lugares), sala de cinema (54 lugares), sala Black Box (50 lugares) e café-teatro (100 lugares).

    Carla Matadinho, proprietária exclusiva da Yellow Star Company, numa homenagem este mês ao actor Ruy de Carvalho, ao lado do encenador Paulo Sousa Costa (seu marido) e de Marcelo Rebelo de Sousa.

    Independentemente de se considerar ou não um bom negócio para as partes envolvidas, aquilo que mais estupefacção causa é a quantidade absurda de rasuras que constam no contrato que sem qualquer justificação legal, tanto mais que não aparentam esconder dados pessoais.

    Por exemplo, logo na cláusula primeira a segunda frase é amputada. Refere-se que “o objecto de concessão incluiu igualmente as instalações, equipamentos, materiais e espaços complementares de apoio”, com vista a algo desconhecido porque foi eliminado. O mesmo sucede no ponto 2 dessa cláusula sobre os espaços excluídos

    A cláusula quarta, referente ao prazo de vigência, também tem três rasuras. A cláusula seguinte referente ao preço contratual tem uma rasura que torna mesmo enigmático o preço contratual, porque se fica a saber que os 336 miul euros por ano, acrescidos de IVA, são pagos à empresa de Carla Matadinho pela “concessão objeto presente contrato, bem como pelo cumprimento das demais”… coisas que estão rasuradas.

    Centro Cultural da Malaposta, em Olival de Basto, no concelho de Odivelas.

    Parte da cláusula das condições de pagamento estão também eliminadas no contrato disponível no Portal Base, o mesmo se verificando no clausulado do direito de utilização, dos investimentos complementares, das obrigações do concessionário (Yellow Star Company), das obrigações do concedente [autarquia), e muitas mais, ficando mesmo a desconhecer-se o calor da caução que corresponde a 5% do preço de algo que também foi rasurado.

    Este contrato inédito pela quantidade de rasuras que possui na cópia inserida no Portal Base – e o PÁGINA UM, ao longo dos últimos meses analisou centenas de contratos – tem, no total, de 164 manchas rectangulares a preto, tapando por completo partes do texto9, embora haja até sobreposições de rasuras e mesmo umas poucas rasuras que, na verdade, nem sequer ocultam texto.

    O PÁGINA UM procurou saber os motivos desta ‘fúria obscurantista’ num contrato público junto da autarquia de Odivelas, liderada pelo socialista Hugo Martins, que o assinou, mas não obteve qualquer resposta. Também sem resposta ficou a razão pela qual um concurso público desta natureza apenas recebeu o interesse de uma empresa.

    O contrato entre a Câmara Municipal de Odivelas e a Yellow Star Company é um caso paradigmático da absurda falta de cultura de transparência na Administração Pública: uma lei impõe transparência; os gestores públicos tratam de meter um manto escuro sobre o papel.

    Antes desta concessão, que entrará em breve quando o Tribunal de Contas conceder visto, o Centro Cultural da Malaposta era gerido, desde 2019, por um colectivo de artistas, a Minutos Redondo. Contactada pelo PÁGINA UM, uma das produtoras deste colectivo, Manuela Jorge, diz que perante as condições colocadas pelo município de Odivelas no concurso público não se mostraram suficientemente atractivas para concorrerem e tentarem renovar a conceção, que assim durou cerca de quatro ano.

    A Yellow Star Company tem sido produtora de recentes espectáculos de sucesso, entre os quais Os Monólogo da Vagina, e os musicais Madagascar e A Bela e o Monstro, grande parte dos quais encenados por Paulo Sousa Costa – marido de Carla Matadinho -, bem de Ruy, a História Devida, em homenagem a ao actor Ruy de Carvalho, que este mês perfez 97 anos de idade.


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  • Do céu ao purgatório: Pfizer cota em mínimos de cinco anos e despede 26 em Portugal

    Do céu ao purgatório: Pfizer cota em mínimos de cinco anos e despede 26 em Portugal

    Em três anos, a Pfizer vendeu 85,8 mil milhões de euros de vacinas contra a covid-19, mas os tempos da pandemia já lá vão. A ‘ressaca’ financeira está agora a bater forte: os resultados em 2023 foram decepcionantes e as expectativas para este ano são pouco risonhas. A cotação da empresa no mercado de capitais norte-americano está em mínimos dos últimos cinco anos. Depois de uma ‘festa’ em que conseguiu vender vacinas até para deitar ao lixo, é agora a altura de despedir sem contemplações. Em Portugal, apurou o PÁGINA UM, está a decorrer um despedimento colectivo que atinge, para já, 26 funcionários.


    A Pfizer está em processo de despedimento em Portugal, que atingirá, nesta primeira fase, um total de 26 empregados. O despedimento colectivo atinge mesmo altos funcionários em Portugal da farmacêutica norte-americana, tendo o PÁGINA UM tido acesso à lista completa de rescisões.

    Fonte da farmacêutica confirma esta decisão, não querendo indicar qual o impacte operacional deste despedimento colectivo – que está a criar um sentimento de ‘traição’ após resultados financeiros excepcionais durante a pandemia –, dizendo que se enquadra num “programa de restruturação da sua actividade a nível global, de que resulta a necessidade de ajustamento da dimensão da Companhia em Portugal face ao novo modelo de funcionamento”, acrescentando que pretende “minimizar o impacto desta decisão nos colaboradores, e, sempre que possível, proporcionar oportunidades de realocação em funções disponíveis dentro da organização”.

    Ursula von der Leye, presidente da Comissão Europeia, e Albert Bourla, presidente da Pfizer
    Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, e Albert Bourla, presidente-executivo da Pfizer. Negócios de compra de vacinas deram resultados excepcionais entre 2020 e 2022. Agora, é a ‘ressaca’.

    A Pfizer reitera ainda “o compromisso de que todas as decisões serão tomadas com transparência, respeito e em conformidade com as leis aplicáveis”, mas o PÁGINA UM sabe existirem casos de despedimentos com cláusulas de confidencialidade para evitar queixas futuras.

    Depois de um triénio de ouro, no decurso da pandemia, a actual situação financeira da Pfizer assemelha-se ao mito de Ícaro: de forma demasiado ambiciosa, quis rentabilizar ao máximo a pandemia, recorrendo a um modelo de negócio de lucros iniciais excepcionalmente elevados, mas de repente está a sofrer os efeitos de uma menor procura de vacinas contra a covid-19 e do antiviral Paxlovid, devido à menor agressividade das variantes do SARSC-CoV e à perda de eficácia dos dois fármacos.

    No final de Janeiro, a farmacêutica norte-americana anunciou resultados decepcionantes com lucros por acção (EPS) em 2023 de apenas 0,37 dólares, que representam uma queda de 93% face ao ano anterior. As receitas caíram para 58,5 mil milhões de dólares, que resultaram de uma descida de facturação da vaciona Comirnaty e do Paxlovid de 41% face a 2022. Este último ano já se revelara mais fraco do que o de 2021.

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    Pandemia já foi ‘chão que deu uvas’ à Pfizer, e a ‘peritos’ que promoveram as vacinas Comirnaty e o antiviral Paxlovid. Agora, é tempo de despedir.

    As ‘coqueluches’ da Pfizer durante a pandemia têm agora expectativas de vendas bastante fracas: a farmacêutica prevê vender apenas 5 mil milhões de euros de vacinas Comirnaty e 3 mil milhões de euros de Paxlovid. As receitas da vacina contra a covid-19 da Pfizer – a mais vendida de todas as autorizadas – tinha totalizado uma facturação de 11,2 mil milhões de dólares em 2023, que já mostrava uma queda de 70% face ao ano de 2022, quando tinham sido vendidas doses no valor de 37,8 mil milhões de euros.

    Saliente-se que, em apenas três anos, a Pfizer consegui com as várias versões da vacina Comartiny facturar um total de 85,8 mil milhões de dólares entre 2021 e 2023. Agora, previsivelmente, mesmo se as expectativas de vendas para 2024 não falhem para a vacina contra a covid-19, esta perderá a liderança para o fármaco Eliquis, usado para tratamento de trombose venosa profunda, cujas vendas andam na ordem dos 6 mil milhões de dólares por anos.

    Quanto às vendas do antiviral Paxlovid – que nunca mostrou uma grande adesão por parte da generalidade dos médicos, mas que beneficiou de fortes compras pelo Governo Federal norte-americano –, em 2022 ainda conseguiram uma facturação bastante significativa (18,9 mil milhões de dólares), colocando-o no segundo lugar dos fármacos mais rentáveis (apenas atrás da vacina contra a covid-19). Porém, no ano passado descambou para menos de 1,3 mil milhões de dólares de receita, reposicionando-a na quarta posição. Nesse sentido, dificilmente se atingirá em 2024 as expectivas de vendas de 3 mil milhões de dólares indicada pela administração da farmacêutica.

    Evolução da cotação da Pfizer no New York Stock Exchange (NYSE) nos últimos cinco anos.

    Quem também não está nada optimista sobre o desempenho da farmacêutica são os investidores, que estão a penalizar as acções. Hoje, os títulos da Pfizer negociados no mercado de Nova Iorque (NYSE) fecharam em mínimos dos últimos cinco anos, cotando nos 26,58 dólares, caindo quase 14% no último ano, e estando 55% abaixo do máximo atingido em 17 de Dezembro de 2021 (59,48 dólares).

    A evolução da cotação da Pfizer nos últimos cinco anos mostra uma queda de 35,3%, um cenário que não se observa em grande parte das farmacêuticas que estiveram muito ‘activas’ durante a pandemia. Mesmo a Moderna – com uma cotação hoje em redor dos 95 dólares, apesar de ter caído quase 80% em relação ao máximo de 2021 (quando teve um pico a 449,38 dólares) – regista ainda uma valorização de 329% face à cotação registada em Março de 2019.


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  • Administração Central do Sistema de Saúde mente: não há jurisprudência do Tribunal de Contas sobre ‘contratos perpétuos’

    Administração Central do Sistema de Saúde mente: não há jurisprudência do Tribunal de Contas sobre ‘contratos perpétuos’

    “A jurisprudência invocada não existe” – é assim, de forma taxativa, que o Tribunal de Contas põe por terra os argumentos (falsos) da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) que tem um contrato desde 1994, no tempo de Cavaco Silva, com a sociedade de advogados BAS, em cujo escritório tem ‘residência profissional’ Diogo Lacerda Machado, o amigo de António Costa no epicentro da Operação Influencer. A ACSS insiste na legalidade do processo, agora usando outros argumentos, e diz ainda que coloca os contratos no Portal Base, mas sem os expor ao público, uma atitude surpreendente se considerarmos que essa plataforma serve apenas para uma coisa: informar o público.


    O Tribunal de Contas nega que haja qualquer jurisprudência sobre a possibilidade de renovações contratuais sem limite de tempo como o contrato ‘perpétuo’ da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) com a sociedade de advogados BAS, onde Diogo Lacerda Machado – o amigo de António Costa que está no epicentro da Operação Influencer – tem o seu escritório. A reacção do Tribunal de Contas, hoje enviada no decurso de uma notícia de ontem no PÁGINA UM, permite assim concluir que esta entidade tutelada pelo Ministério da Saúde, e presidida por Victor Herdeiro, usou um argumento falso para continuar a manter uma avença mensal de serviços jurídicos desde 17 de Fevereiro de 1994, ainda no tempo do Governo de António Costa. O contrato está, assim, à margem da lei.

    De acordo com a informação ontem revelada, a ACSS justifica a contínua renovação do contrato com a BAS – que representa esta entidade num diferendo com o PÁGINA UM para tentar não cumprir uma acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de acesso a uma base de dados de internamentos hospitalares – “com base em jurisprudência do Tribunal de Contas”, que alegadamente determinaria que os contratos celebrados ao abrigo de um diploma de 1999 não estariam sujeitos a qualquer limite de vigência.

    Um argumento que se revela completamente falso.

    Victor Emanuel Marnoto Herdeiro, presidente da ACSS.

    Fonte oficial do Tribunal de Contas, presidido pelo juiz conselheiro José Tavares, foi peremptória, quando solicitada a comentar a informação integral da ACC: “A jurisprudência invocada não existe”, acrescentando que, “pelo contrário, a jurisprudência do Tribunal em matéria de contratação pública é no sentido de procedimentos concursais, regularmente renovados”. E adianta ainda que “os contratos em causa [que se iniciaram antes do Código dos Contratos Públicos] estão sob o controlo do Tribunal de Contas, embora não sujeitos a fiscalização prévia até ao montante de 750.000 euros”. O contrato com a sociedade BAS é de 54 mil euros por ano.

    Mais do que este caso, a existência desta interpretação pela ACSS à margem da lei indicia que possam existir muitos mais casos de contratos públicos de prestação de serviços teoricamente vitalícios na Administração Públicas, escondidos até do Portal Base. Conforme o PÁGINA UM revelou ontem, ninguém na Administração Pública sabe (ou quer dizer) quantos procedimentos destes existem e quais os montantes.

    Instada a comentar as declarações taxativas do Tribunal de Contas – e sem margem para outras interpretações –, ou seja, não há jurisprudência que sustente a renovação do contrato ‘perpétuo’ com a sociedade de advogados BAS, a ACSS insiste na legalidade da contratação. Numa longa argumentação, a entidade presidida por Vitor Herdeiro diz ser “absolutamente legítima a contratação (sucessiva) de serviços jurídicos de patrocínio judiciário (objeto deste contrato) por ajuste direto, independentemente do valor”, argumentando com interpretações de uma sentença do Tribunal de Contas que não se aplica ao caso em concreto, e invocando mesmo uma directiva que também não se aplica.

    Informação que renova novamente um contrato de avença entre a ACSS e a sociedade BAS que começou no Governo de Cavaco Silva invoca jurisprudência do Tribunal de Contas como fundamento. A jurisprudência não existe.

    Por exemplo, no caso da directiva referida pela ACSS (Diretiva 77/249/CEE do Conselho), refere-se que existe uma excepção na contratação de serviços jurídicos para os casos de uma “arbitragem ou conciliação realizada num Estado-Membro ou num país terceiro ou perante uma instância internacional de arbitragem ou conciliação, ou — em processos judiciais perante os tribunais ou autoridades públicas de um Estado-Membro ou de um país terceiro ou perante tribunais ou instituições internacionais”, ou ainda em casos de “aconselhamento jurídico prestado em preparação” de determinados processos” de qualquer dos processos referidos na subalínea i) da presente alínea, “, ou ainda “ou “quando haja indícios concretos e uma grande probabilidade de a questão à qual o aconselhamento diz respeito se tornar o objeto desses processos, desde que o aconselhamento seja prestado por um advogado”. Ora, para a ACSS, a sociedade de advogados BAS tem sido a representante legal desde 2022 no processo que corre no Tribunal Administrativo de Lisboa, intervindo em processos que exigem um contrato regular.

    A ACSS diz ainda que, como o contrato com a BAS é anterior ao Código dos Contratos Públicos, “tem procedido ao registo de todos os procedimentos na plataforma [de contratação pública], mas os mesmos não são visíveis para o público”. Mas não explica a fundamentação legal nem o motivo ético para não os colocar acessíveis no Portal Base, sabendo-se que esta plataforma foi concebida com um único e singelo objectivo: a transparência da gestão pública – algo que, tudo indica, não integra os pergaminho do conselho directivo da ACSS, a começar por invocar, como verídica, jurisprudência do Tribunal de Contas que não existe. Mas, em Portugal, aparentemente, isso (ainda) pode fazer-se sem penalizações.


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  • Perpétuo obscurantismo: ainda há contratos com o Estado por tempo indeterminado, mas ninguém sabe quantos são nem quanto valem

    Perpétuo obscurantismo: ainda há contratos com o Estado por tempo indeterminado, mas ninguém sabe quantos são nem quanto valem

    Obscurantismo mais obscurantista não há. O Código dos Contratos Públicos já tem 15 anos, mas ainda perdura um número indeterminado de avenças e outras relações comerciais que fogem a todas as regras da transparência e livre concorrência, perpetuando-se no tempo, sem sequer caírem no ‘radar’ do Portal Base. O PÁGINA UM descobriu uma estranha avença entre a sociedade de advogados BAS – onde ainda tem assento Lacerda Machado, o amigo íntimo de António Costa no epicentro da Operação Influencer – e a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), que começou no dia 17 de Fevereiro de… 1994. Ou seja, fez há dias 30 anos. Ninguém no sector do Estado sabe dizer quantos contratos desta natureza ainda existem, nem a razão para persistirem, porque as renovações nem sequer são obrigatórias.


    Há um número indeterminado de contratos públicos de prestação de serviços teoricamente vitalícios na Administração Públicas, escondidos até do Portal Base, mas ninguém sabe quais os montantes nem sequer se existe uma fundamentação legal para se perpetuarem. São contratos ‘invisíveis’, completamente fora do ‘radar’ da fiscalização pública e até do Tribunal de Contas.

    Esta conclusão é obtida depois do PÁGINA UM ter identificado uma prestação de serviços jurídicos entre a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e a sociedade de advogados BAS que perdura desde 1994, mas sem que essa relação contratual seja assumida através de um contrato público formal divulgado no Portal Base.

    Time and Money

    Foi apenas após um pedido expresso do PÁGINA UM à ACSS para consultar os eventuais contratos de serviços jurídicos prestados pela BAS, recorrendo à Lei do Acessos aos Documentos Administrativos (desta vez sem necessidade de apresentar intimação em tribunal administrativo) que foi assumido que aquela sociedade de advogados tem vindo a beneficiar de sucessivas renovações de “um contrato de avença para acompanhamento judicial dos processos em que este Instituto [ACSS] é parte, celebrado em 17.02.1992 [17 de Fevereiro de 1994] e que foi objecto de adicionais (nos anos de 1998 e 2008) e de adendas sucessivas que prorrogam o prazo de execução”.

    Esta situação consta de uma informação de Janeiro passado escrita por uma técnica superior da ACSS, consultado pelo PÁGINA UM, com vista à autorização da despesa e aprovação da minuta de adenda da renovação deste patrocínio judiciário – e que tem permitido, por exemplo, à ACSS manter em ‘despique’ jurídico o legítimo acesso à base de dados dos internamentos hospitalares, mesmo depois de o PÁGINA UM ter conseguido vitórias sucessivas, incluindo um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.

    Recorde-se que é nas instalações da sociedade de advogados BAS que se mantém, ainda hoje, o endereço profissional de Diogo Lacerda Machado, o amigo de António Costa que está no epicentro da Operações Influencer. Isto apesar de a BAS ter negado já em 2016 não ter relações com Lacerda Machado, quando foram noticiados contratos ganhos a entidades associadas ao Ministério da Saúde, mas a ligação ao escritório manter-se quando implodiu a Operação Influencer. Desde Novembro do ano passado, as ligações formais mantêm-se de pedra e cal, tanto mais que o registo do endereço não é um pro forma; é uma obrigação imposta pela Ordem dos Advogados, tanto aos advogados como às sociedades.

    Contrato de avença entre a ACSS e a sociedade BAS começou no Governo de Cavaco Silva, passou pelos de António Guterres, de Santana Lopes, de José Sócrates, de Passos Coelho e de António Costa. São 30 anos de avença sem sequer ser revelado no Portal Base. Caso único? Ninguém sabe. Ou melhor: ninguém quer saber.

    Para justificar esta avença – que em 2023 atingiu os 54.000 euros, pagos mensalmente –, a ACSS argumenta com uma alegada “jurisprudência do Tribunal de Contas” que determinará que “os contratos celebrados ao abrigo do Decreto-Lei nº 197/99, de 8 de junho [anterior ao actual Código dos Contratos Públicos de 2008], não estão sujeitos a qualquer limite de vigência”.

    Mas existe um outro problema com estes ‘contratos perpétuos’, para além da evidente violação do princípio da livre concorrência: na verdade, estas prestações de serviços estarão a ser ocultados na actual plataforma da contratação pública, o Portal Base.

    De acordo com a informação da ACSS, e outros documentos consultados, a renovação deste contrato com a BAS, através de um parecer prévio vinculativo do Governo, tem sido sistematicamente deferido tacitamente – ou seja, autorizado por ausência de resposta – e depois também tacitamente aprovado pela Secretaria de Estado da Saúde. E nada disto é depois remetido para o Portal Base.

    Sobre esta matéria, a resposta do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC) – a entidade responsável pela gestão do Portal Base – é completamente dúbia e completamente evasiva. Apesar de questionado pelo PÁGINA UM sobre se o caso concreto das renovações sucessivas da avença com a BASA deveria ou não ser inserido naquela plataforma pública, aquele instituto diz apenas que o actual Código dos Contratos Públicos “não se aplica a prorrogações, expressas ou tácitas” em procedimentos que tenham sido iniciados “previamente à data de entrada em vigor daquele”, ou seja, em 2008.

    Sociedade BAS tem sede no Pátio Bagatela, em Lisboa, exactamente no mesmo edifício e andar onde Diogo Lacerda Machado tem o endereço profissional activo.

    E acrescentando ainda que “o Portal dos Contratos Públicos constitui um espaço multifuncional destinado a disponibilizar a informação sobre a formação e a execução dos contratos públicos sujeitos às regras de formação ou execução”, pelo que “assim, todos os contratos celebrados após a entrada em vigor do CCP devem ser registados no Portal BASE”, não respondendo explicitamente se aqueles que se prolonguem por adendas artificiosas não devem ser considerados novos contratos. Saliente-se que são proibidos ‘contratos perpétuos’ no actual Código dos Contratos Públicos e limites de vigências.

    Além de tudo isto, ninguém sabe quantos contratos, além daquele detectado pelo PÁGINA UM, andam aí a circular sem sequer serem ‘apanhado no radar’ do Portal Base, tanto mais que o IMPIC também não respondeu se tinha conhecimento de casos similares.

    O PÁGINA UM sabe também que, até final de 2020, existia forma de conhecer, pelo menos no caso concreto das prestações de serviços jurídicos, quais os contratos estabelecidos pela Administração Pública, uma vez que estavam sujeitos ao parecer prévio do Centro de Competências Jurídicas do Estado (JurisAPP), que começou a funcionar em 2018.

    Cockroach Lying on Its Back on the Ground

    Contudo, mesmo para o curto período em que havia necessidade de parecer prévio, a directora da JurisAPP, Virgínia Silva, admite que entre 2018 e 2020 muitos contratos de avença jurídica “possam não ter sido enviadas a parecer prévio [as] renovações de avenças nos casos em que a entidade contratante” tenha feita outra interpretação sobre a obrigatoriedade, “escapando tal facto ao controlo ou escrutínio deste Centro”.  

    Ou seja, obscurantismo mais obscurantista não há. O PÁGINA UM detectou um contrato de uma longa vida de 30 anos com outras tantas renovações. Pode ser só este? Claro que sim; é uma hipótese com um certo grau de probabilidade. Ou podem ser milhares; também com um certo grau de probabilidade. Mas, neste caso, misturando a lei das probabilidades com o empirismo tende a acreditar-se que os contratos sem limite temporal (e bem escondidos) sejam tantos quantas as baratas que realmente existem num imundo compartimento cheio de mobiliário quando vemos uma a passear-se descontraidamente pelo soalho, e a pisamos. Percepcionamos, nessa altura, que centenas, senão milhares, nos miram pelas frinchas. Talvez seja mesmo aquilo que sucede, mas com uma diferença: ninguém quer saber quantas são nem parece estar interessado em ‘fumigar’ estes contratos ‘vitalícios’.


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  • Prémio Nobel vítima de furto no Algarve faz apelo para recuperar portáteis e diários

    Prémio Nobel vítima de furto no Algarve faz apelo para recuperar portáteis e diários

    Laureado com o Prémio Nobel da Química em 2013, Michael Levitt foi vítima de um furto em Portimão, tendo ficado sem os seus portáteis, telemóvel e cadernos de apontamentos que se encontravam no interior do carro. O reputado biofísico, actualmente com 76 anos, fez um apelo na rede social X (antigo Twitter) numa tentativa de recuperar os bens roubados. Levitt reside na China com a mulher, mas tem dois filhos e cinco netos a viver em Lagos, no Algarve, visitando frequentemente a região portuguesa. Com quatro nacionalidades (britânica, israelita, sul-africana e norte-americana), Michael Levitt tem sido um dos cientistas de topo a analisar os dados da pandemia de covid-19 com a sua equipa da Universidade de Stanford. Em entrevista ao PÁGINA UM, em 2022, Levitt classificou Portugal como “um país belíssimo”.  


    O cientista Michael Levitt fez um apelo na rede social X (antigo Twitter) para tentar recuperar portáteis, diários e o telemóvel que foram roubados de um carro em Portimão, no Algarve.

    O biofísico de 76 anos reside na China com a mulher, revelou numa entrevista ao PÁGINA UM, em 2022, que tem dois filhos e cinco netos a viver em Lagos, no Algarve, pelo que ocasionalmente visita Portugal.

    Levitt começou por dizer, na sua mensagem publicada há poucas horas, que tem estado em “silêncio por um tempo”, estando “focado em escrever artigos sobre covid”. “Agora peço ajuda para rastrear preciosos laptops e diários roubados das nossas duas mochilas de um carro perto de Portimão, Portugal”, apela.

    Explica que a “última localização do telefone também roubado é Rua do Alto do Pacheco, 8500 Portimão, Portugal”.

    Na mesma entrevista ao PÁGINA UM, o biofísico classificou Portugal como “um país belíssimo” e comentou: “Tenho uma ligação muito forte com o vosso país”.

    Na altura, Levitt referiu conhecer Lisboa, o Porto, e o Algarve, o qual conhece “razoavelmente bem”. Disse também gostar “muito das pessoas” em Portugal, indicando que os filhos gostam de viver no país.

    Levitt tem quatro nacionalidades (britânica, israelita, sul-africana e norte-americana) e tem sido um dos cientistas de topo a analisar os dados da pandemia de covid-19 com a sua equipa da Universidade de Stanford.

    O reputado biofísico tem publicado diversos artigos científicos, inclusive com John Ioannidis, o epidemiologista mais conceituado e mais citado do mundo, do qual se tornou amigo durante a pandemia. Ambos publicaram artigos científicos durante a pandemia e foram vozes críticas sobre a forma como a Ciência foi politizada e instrumentalizada durante na covid-19, o que levou à imposição de medidas sem fundamentação científica em países como Portugal, as quais prejudicaram a saúde da população e a economia.

    Entre os artigos que Levitt tem publicado, contam-se artigos com a análise de dados sobre excesso de mortalidade, publicado na revista científica Environmental Sciences em Novembro do ano passado.


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