Categoria: Saúde

  • Atletas e treinadores de judo não-vacinados pagam mais por participação na Taça da Europa de Seniores em Coimbra

    Atletas e treinadores de judo não-vacinados pagam mais por participação na Taça da Europa de Seniores em Coimbra

    A Federação Portuguesa de Judo (FPJ) enviou ontem uma norma para treinadores e atletas impondo uma discriminação entre quem se vacinou e não se vacinou contra a covid-19, que se reflecte no custo da pernoita em dois hotéis de Coimbra. A justificação para a diferença está, segundo a FPJ, nas diferenças de preços entre testes de antigénio (para quem foi vacinado) e PCR (para não-vacinados), algo que não encontra respaldo na lei portuguesa nem nas actuais normas da Federação Internacional de Judo. Hotéis garantem que nada têm a ver com esta política discriminatória.


    Para participarem na Taça da Europa de Seniores, que se realizará em Coimbra nos próximos dias 27 e 28 de Agosto, a Federação Portuguesa de Judo (FPJ) está a exigir que atletas e treinadores não-vacinados paguem em certos casos mais do dobro pela pernoita em dois hotéis da cidade em comparação com os vacinados.

    A discriminação explícita de preços consta da circular nº 117/22, assinada ontem pelo próprio presidente da FPJ, Jorge Fernandes, onde, além de se indicarem normas de participação, se impõe a obrigatoriedade de envio do certificado de vacinação ou de recuperação por parte de atletas e treinadores, de modo a assim permitir destrinçar depois o tipo de exigências à chegada para a competição. Estar ou não vacinado tem repercussões no preço da estadia nos dois hotéis escolhidos oficialmente pela FPJ: Villa Galé e D. Luís.

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    Com efeito, embora a todos os atletas e respectivos treinadores seja exigido um teste PCR negativo feito há menos de 48 horas antes da chegada ao hotel oficial, a FPJ impõe depois uma discriminação imediata entre vacinados (incluindo recuperados há menos de seis meses) e não-vacinados (incluindo aqueles sem esquema vacinal completo).

    Para os primeiros, a FPJ diz que têm de fazer ainda “um teste antigénio à chegada ao hotel oficial”, enquanto os segundos têm de fazer “um teste PCR”. Os custos são distintos: os testes de antigénio, se forem realizados sem credencial do SNS (nesse caso são gratuitos), podem ter um preço de 18 euros (valor cobrado pela Cruz Vermelha Portuguesa) e os PCR rápidos (com resultados em 30 minutos) chegam aos 70 euros. Ou seja, uma diferença de 52 euros.

    Contudo, saliente-se que aquilo que distingue os testes PCR e de antigénio residente são a melhor sensibilidade e especificidade dos primeiros – ou seja, teoricamente, dão menos falsos positivos e falsos negativos. Deste modo, não existe nenhum argumento científico que permita afirmar que um teste de antigénio seja o método mais adequado para uma pessoa vacinada, e que, para se detectar uma eventual infecção de uma não-vacinada, terá que se usar sempre um teste PCR.

    Extracto da circular nº 117/22 da Federação Portuguesa de Judo impondo preços distintos na estadia para atletas e treinadores em função do estado vacinal.

    O diferencial de preços nos testes exigidos aos dois grupos implica assim que a estadia tenha preços distintos. Por exemplo, um quarto individual para um atleta no Vila Galé custará 117 euros para um atleta vacinado e 190 euros para um atleta não-vacinado – ou seja, uma diferença de 73 euros. A mesma diferença (73 euros) se observa no Hotel D. Luís entre vacinados e não-vacinados. Ou seja, a preços de mercado, mesmo que houvesse necessidade de aplicar métodos distintos, os não-vacinados estariam a pagar sempre mais.

    Miguel Galhardas, responsável da comunicação da FPJ, alega que os valores mais elevados pela pernoita dos atletas e treinadores “não é uma discriminação”, devendo-se apenas “as normas exigidas pelas organizações internacionais de judo”, designadamente a European Judo Union (EJU) e a Internacional Judo Federation (IJF).

    Sucede, porém, que essas normas são já conflituantes. Com efeito, as normas da EJU prevêem um tratamento discriminatório aos não-vacinados, exigindo que façam um teste PCR (ao custo de 80 euros), enquanto que ao vacinados exige apenas um teste de antigénio, mesmo assim a um preço bem acima do mercado (40 euros). Já as normas do IJF não fazem discriminação, exigindo testes PCR para atletas e treinadores, independentemente do estado vacinal.

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    No meio desta política discriminatória, os dois hotéis escolhidos pela FPJ mostram-se surpreendidos. Em declarações ao PÁGINA UM, o gerente do Hotel D. Luís em Coimbra diz que nunca houve qualquer política de discriminação de preços com base na vacinação contra a covid-19. “Para nós as pessoas são todas iguais, não fazemos discriminação”, garante Luís Ribeiro da Silva, explicando ainda que “se um hóspede estiver doente, o que fazemos é apenas levar-lhe a comida ao quarto, mas até nessas circunstâncias os preços são iguais “.

    Por sua vez, o Hotel Vila Galé Coimbra esclarece também que os preços praticados pela empresa são sempre idênticos para vacinados e não-vacinados. “Não fazemos preços diferentes nem estamos a perguntar às pessoas se têm a vacina ou se não têm”, frisou André Pereirinha, assistente de direcção daquela unidade hoteleira.

  • Governos europeus estão a indicar números ao Eurostat completamente diferentes dos divulgados ao público

    Governos europeus estão a indicar números ao Eurostat completamente diferentes dos divulgados ao público

    Ainda não estão disponíveis dados de Portugal, mas os registos de alguns países europeus sobre as mortes por covid-19 em 2020 reportados ao Eurostat mostram desvios colossais. Terá a pandemia sido pior do que o reportado ao público? Ou houve um empolamento da covid-19 como causa porque os médicos legistas foram pressionados a atribuir ao SARS-CoV-2 a morte sempre que houvesse teste positivo?


    Quase todos os países que já reportaram ao Eurostat dados sobre as causas de morte ocorridas em 2020 indicaram valores substancialmente superiores àqueles que foram divulgando oficialmente durante o primeiro ano da pandemia.

    De acordo com a consulta do PÁGINA UM à base de dados internacional daquele gabinete de estatística da União Europeia – que, agrega, além dos 27 Estados-membros, os países candidatos e da EFTA –, já houve nove países que, para a totalidade das doenças, indicaram as causas registadas nos certificados de óbitos em 2020, seguindo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde da Organização Mundial da Saúde (CDI). Ou seja, passa-se a saber, formalmente, qual foi causa principal da morte atribuída pelos médicos legistas aos distintos óbitos, incluindo por covid-19, durante o primeiro ano da pandemia que atingiu a Europa naquele ano.

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    De entre os nove países já com informação no Eurostat para o ano de 2020 – Alemanha, Espanha, Lituânia, Holanda, Polónia, Islândia, Liechtenstein, Sérvia e República Checa –, apenas neste último o número de mortes por covid-19 (código U07.1 da CDI, com vírus identificado) ou por suspeita (código U07.2, com vírus não identificado) é inferior ao que foi indicado pelas autoridades sanitários no final daquele ano.

    Com efeito, a 31 de Dezembro de 2020, a República Checa reportou a ocorrência de 12.017 óbitos atribuídos à covid-19, mas agora na base de dados do Eurostat encontram-se contabilizados 10.397 óbitos com o código U07.1 e mais 173 com o código U07.2. Saliente-se que este país do Leste da Europa encontra-se actualmente no top 10 dos mais atingidos pela covid-19, com 3.751 óbitos por milhão de habitantes, embora a esmagadora maioria das mortes atribuídas ao SARS-CoV-2 tenham, oficialmente, ocorrido em 2021.

    Esta é, porém, de facto, a única excepção, por agora, porque todos os outros oito países reportaram em “tempo real”, no decurso dos relatórios diários divulgados ao longo de 2020, muito menos óbitos do que aqueles que agora os Governos enviaram ao Eurostat.

    Se houve óbitos inicialmente escondidos (para inicialmente subestimar a pandemia) ou se houve exageros e pressões para que os médicos legistas atribuíssem mortes ao SARS-CoV-2 com base apenas num teste positivo, uma coisa parece, desde já, evidente: as estatísticas oficiais da primeira doença com um desmesurado acompanhamento informático informativo, mostra afinal um rigor das estatísticas oficiais muito sofrível. No mínimo.

    Óbitos reportados ao público (compilados pelo Worldometers) e reportados ao Eurostat para 2020. Fonte: Worldometers e Eurostat.

    O caso mais flagrante sucede na Espanha, onde o desvio entre os dados do Eurostat e os inicialmente apontados no final de 2020 é colossal. No Worldometers surgem, para o país-vizinho, 50.955 óbitos a 31 de Dezembro de 2020, mas no Eurostat as autoridades espanholas indicaram agora, apenas para aquele ano, 60.358 mortes por covid-19 (U07.1) e mais 14.481 com suspeitas (U07.2). Ou seja, somando os dois códigos há um desvio de 23.884 óbitos a mais, representando uma diferença de 47%.

    Em termos relativos, o desvio maior – e extremamente suspeito – surge na Sérvia. Neste país, que tal como a República Checa oficialmente não teria sofrido a primeira vaga da pandemia na Primavera de 2020, as autoridades de saúde indicaram, segundo o Worldometers, 3.250 óbitos até final daquele ano. Afinal, para o Eurostat, durante 2020 os médicos legistas sérvios registaram 8.866 óbitos por covid-19 (U07.1) e mais 1.490 mortes suspeitas por esta doença (U07.2). Portanto, no Eurostat aparece mais do triplo (218%) das mortes por covid-19 do que as indicadas inicialmente pelas autoridades sérvias.

    O desvio da Holanda também foi significativo: 75%. Para este país, no Worldometers contabilizam-se, no final do primeiro ano da pandemia na Europa, 11.565 óbitos por covid-19, enquanto no Eurostat estão agora 17.527 mortes confirmadas (U07.1) e mais 2.685 suspeitas (U07.2). Portanto, há uma diferença de 8.647 mortes por esta causa directa.

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    Na Polónia, por sua vez, o desvio também é relevante: 12.530 óbitos (entre confirmados e suspeitos) na base de dados do Eurostat face aos números que constam em 2020 no Worldometers, o que representa, em termos relativo, uma diferença de 43%. Já na Alemanha, conhecida por ser um país de grande rigor, as estatísticas também não batem certo: o Governo apontou inicialmente que tinham morrido, até 31 de Dezembro de 2020, um total de 34.639 pessoas por covid-19; agora, entre casos confirmados e suspeitos, informou o Eurostat que foram 39.886.

    Apenas os números da Islândia batem certo, mas porventura devido à sua dimensão demográfica (cerca de 370 mil habitantes). No Worldometers surgem 29 óbitos até 31 de Dezembro de 2020, tantos quantos os que surgem agora no Eurostat. No entanto, acresce ainda um óbito suspeito (U07.2).

    Nas próximas semanas será previsível que mais países surjam na base de dados do Eurostat, incluindo Portugal. Até agora, a Direcção-Geral da Saúde mantém segredo sobre toda a informação estatística existente no Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos – razão pela qual o PÁGINA UM intentou um processo de intimação contra o Ministério da Saúde no Tribunal Administrativo de Lisboa – e o Instituto Nacional de Estatística não divulga informação detalhada sobre a covid-19 nas estatísticas da mortalidade de 2020 que tem vindo a revelar nas últimas semanas.

  • Mais de 10.000 mortes no mês de Junho: um trágico recorde ignorado pelo Governo

    Mais de 10.000 mortes no mês de Junho: um trágico recorde ignorado pelo Governo

    “Vai ficar tudo bem”, clamou-se nos primórdios da pandemia. Mas afinal está a “ficar tudo mal”, com a mortalidade por todas as causas a atingir valores absurdos para esta época do ano. Com base nos dados históricos, o PÁGINA UM estima que este mês, a poucas horas de terminar, houve um excesso de 60 óbitos todos os dias. Incluindo dias santos.


    Um excesso de mortalidade de quase 1.800 óbitos – este será, para já, o saldo negro de um insólito mês de Junho em Portugal, de acordo com cálculos do PÁGINA UM baseados no histórico desde 1980 e dos valores expectáveis para esta época do ano.

    Algumas horas antes de Junho encerrar, aquele que em situações normais deveria ser o segundo mês menos mortífero de um qualquer ano – apenas atrás de Setembro –, apresenta este ano valores de mortalidade total típicos de Inverno, quando o frio e os surtos de doenças do aparelho respiratório e circulatório fazem mais vítimas.

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    Segundo os dados disponibilizados em tempo real pelo Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO), até às 21 horas de hoje estavam já contabilizados 10.104 óbitos no mês de Junho. O valor deverá, contudo, chegar próximo das 10.200 mortes com as actualizações finais.

    Este número contrasta com uma média de 8.323 óbitos no mês de Junho ao longo do último quinquénio (2017-2021), que englobam dois dos anos de pandemia. Nunca antes houve um registo estatístico de Junho acima sequer dos 9.000 óbitos. Por norma, apenas os meses de Janeiro, Fevereiro e Dezembro ultrapassam a fasquia dos 10.000 óbitos.

    Antes do presente ano, o triste recorde em Junho pertencia a 1981. Há cerca de quatro décadas, uma extrema onda de calor entre os dias 9 e 21 de Junho – com termómetros a ultrapassarem os 43 graus em Beja, quase 42 em Lisboa e 39 no Porto – contribuiu fortemente para se atingir, no final desse mês, 8.867 óbitos. Só no dia 15 de Junho daquele ano foram registadas 676 mortes.

    Mas nessa altura, na década de 1980, a população idosa não era tão numerosa como agora – e os óbitos rondavam geralmente, no sexto mês de cada ano, os cerca de sete mil.

    Mais recentemente, mesmo com um tempo mais quente em Junho nos anos de 2013 e 2020, as mortes nunca ultrapassaram a fasquia dos 8.600 óbitos totais.

    Porém, mesmo contabilizando o expectável incremento da mortalidade – devido ao incremento da população mais idosa –, a situação actual é deveras impressionante, ainda mais sabendo-se que, do ponto de vista de saúde pública, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) andou parte do tempo mais preocupada com a varíola dos macacos, que não causou qualquer vítima mortal.

    Óbitos totais no mês de Junho entre 1980 e 2022. Linha de tendência a azul. Fonte: INE e SICO. Análise: PÁGINA UM.

    De facto, como em 2020 e 2021, os efeitos da pandemia não se fizeram sentir na transição da Primavera para o Verão, seria de esperar que a mortalidade total de 2021 rondasse os 8.300 óbitos, de acordo com a linha de tendência traçada pelo PÁGINA UM. Significa assim que os números de Junho deste ano são absurdamente elevados, sem que haja uma explicação oficial coerente.

    No passado dia 17 de Junho, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) alegou que a mortalidade mais elevada deste mês se devia à conjugação da covid-19 – num país com uma das mais elevadas taxas de vacinação do Mundo e com a maior prevalência de covid-19 desde o início da pandemia – com o ‘aumento da temperatura média do ar’. A entidade liderada por Graça Freitas dizia mesmo que “este indicador tem estado ‘acima do normal para esta época do ano’”, o que é desmentido pelos dados do Índice Ícaro constantes do Portal da Transparência.

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    Com efeito, ao longo de Junho, dos 30 dias destes mês, houve 22 com valor de zero neste índice – ou seja, sem qualquer impacte na mortalidade. E o valor máximo foi de apenas 0,11 no dia 13, o que não é excessivamente relevante. No dia 14, por exemplo, foi apenas de 0,06, mas isso não impediu que se tenham atingido os 421 óbitos, quando a média diária no último quinquénio é inferior a 280 mortes.

    Recorde-se que a DGS, apesar de poder saber quais são as doenças que estiveram a matar mais do que seria suposto ao longo de Junho – recorrendo aos dados em bruto do SICO –, nada tem investigado sobre este excesso. Por sua vez, o Ministério da Saúde tem-se também oposto a que o PÁGINA UM aceda a essa base de dados para realizar uma análise independente, razão pela qual está em curso um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa.

  • Pandemia foi período perigoso para as crianças? Não; pelo contrário: houve menos 51 mil hospitalizações e menos 233 mortes

    Pandemia foi período perigoso para as crianças? Não; pelo contrário: houve menos 51 mil hospitalizações e menos 233 mortes

    A base de dados da Morbilidade da Mortalidade Hospitalar foi “apagada” do Portal da Transparência, mas o ficheiro descarregado pelo PÁGINA UM antes deste acto anti-democrático permite revelar mais episódios sobre a real dimensão da pandemia até Janeiro deste ano. Hoje, demonstramos que o pânico lançado em redor da saúde dos mais novos não correspondia à realidade: globalmente, as crianças com menos de 15 anos necessitaram de menos internamentos e os desfechos trágicos em meio hospitalar foram largamente inferiores. Nos tempos em que só havia gripes e pneumonias, as crianças estavam sujeitas a muitos e maiores perigos, mesmo até baixos. E não havia quem se “alimentasse” do pânico à custa do crescimento saudável das crianças.


    Avós, pais e filhos andaram em pânico por causa do SARS-CoV-2, encheram-se as crianças de máscaras e muitas famílias correram a vacinar os mais novos. Contudo, na verdade, a época da pandemia da covid-19 foi, paradoxalmente, um período muito benigno para as crianças com menos de 15 anos.

    De acordo com a análise do PÁGINA UM à base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar, a covid-19 foi responsável por 758 internamentos neste grupo etário, com um registo de dois óbitos, mas todos os outros grupos de doenças registaram uma fortíssima redução tanto ao nível das hospitalizações como das mortes.

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    Globalmente, em todas as 62 unidades hospitalares do SNS e por todas as causas contabilizaram-se, entre Março de 2020 e Janeiro de 2022, um total de 181.428 internamentos de crianças, havendo a lamentar 413 óbitos. Porém, no período homólogo imediatamente anterior à pandemia – entre Março de 2018 e Janeiro de 2020 –, tinham sido contabilizados 646 óbitos de crianças até aos 15 anos, resultantes de 232.287 internamentos.

    Recorde-se que a base de dados oficial usada pelo PÁGINA UM foi entretanto “apagada” do Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde (SNS), pelo que apenas se mostra possível aceder a um ficheiro descarregado em Maio passado, que continha elementos entre Janeiro de 2017 e Janeiro de 2022. Se não tivesse ocorrido o “apagão” já deveriam estar disponibilizados os dados de Fevereiro e eventualmente de Março deste ano.

    A redução global de 22% nas hospitalizações e de 36% no número de mortes observado no período pandémico face ao período pré-pandémico fez-se sentir mais em certos grupos de doenças, sobretudo nas doenças respiratórias e nas doenças infecciosas e parasitárias. Na verdade, se se excluir o grupo de causas de internamento classificado como “factores que influenciam o estado de saúde e o contacto com os serviços de saúde” – o código que classifica sobretudo, mas não apenas, os internamentos para exames sem um diagnóstico prévio –, a descida nas hospitalizações foi de 39%.

    Internamentos e óbitos de menores de 15 anos em unidades do SNS em pré-pandemia (Março de 2018-Janeiro de 2020) e pandemia (Março de 2020-Janeiro de 2022). Fonte: SNS (base de dados “apagada” da morbilidade e mortalidade hospitalar. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Com efeito, não apenas pela menor agressividade do SARS-CoV-2 nos menores como, em parte, às medidas que afastaram fisicamente as crianças uma das outras, os hospitais portugueses receberam apenas 11.981 crianças com doenças respiratórias entre Março de 2020 e Janeiro de 2022, quando no período homólogo imediatamente anterior à pandemia contabilizaram-se 25.273 internamentos neste grupo etário. Uma queda de 53%, ou seja, menos 13.282 internamentos.

    No caso das doenças infecciosas e parasitárias, a redução relativa nos internamentos ainda foi maior: 62%. Entre Março de 2018 e Janeiro de 2020 – ou seja, antes da pandemia – tinham sido hospitalizadas 6.629 crianças; ao longo dos primeiros 23 meses da pandemia (Março de 2020 a Janeiro de 2022), por este grupo de doenças tinham sido hospitalizadas apenas 2.540.

    Em relação a outras doenças destacam-se as reduções nos internamentos por doenças da pele e do tecido subcutâneo (menos 51%), doenças do ouvido e aparelho mastóide (menos 43%), doenças do aparelho circulatório (menos 40%) e mesmo por cancros (menos 30%).

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    Mesmo se a mortalidade por qualquer doença é, felizmente, bastante baixa nos menores de 15 anos, a base de dados agora “desaparecida” do Portal da Transparência permite concluir que o período da pandemia foi muito menos mortífera para esta faixa etária. Se é certo que se registaram em hospitais duas mortes atribuídas à covid-19 no certificado de óbito – no Algarve em Agosto de 2020 e em Lisboa em Agosto do ano passado –, do ponto de vista da Saúde Pública, e mesmo de receio dos pais, a pandemia foi muito mais “saudável”.

    De facto, confrontando os óbitos declarados nos hospitais, a redução da prevalência da gripe e de outras doenças respiratórias, entre as quais as pneumonias, levaram a uma fortíssima redução da mortalidade. Sem a presença da covid-19, seria expectável que as habituais doenças respiratórias levassem, entre Março de 2020 e Janeiro de 2021, um número de vidas próximo daquele que se observou no período homólogo anterior à pandemia (Março de 2018 a Janeiro de 2020): 646.

    Contudo, o saldo foi assim francamente mais favorável: nos primeiros 23 meses da pandemia morreram 413 menores de 15 anos nos hospitais, menos 233 do que no período homólogo pré-pandemia.

    Base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar foi “apagada” do Portal da Transparência. Ministério da Saúde não explica os motivos.

    O destaque, mais uma vez, vai para as doenças respiratórias: nos 23 primeiros meses de pandemia morreram, por estas causas, 20 crianças com menos de 15 anos, enquanto entre Março de 2018 e Janeiro de 2020 tinham falecido 50. Confrontando os dois períodos, nas doenças infecciosas e parasitárias, os óbitos passaram de 19 para 7, nas neoplasias de 54 para 41, nas doenças do sistema nervoso de 21 para 9 e nas doenças do aparelho circulatório de 22 para 12.

    Até mesmo em problemas relacionados com recém-nascidos, a situação melhorou durante a pandemia. No grupo das “condições originadas no período perinatal”, os óbitos no período pré-pandemia (Março de 2018 a Janeiro de 2020) foram 71, mas durante os 23 primeiros meses da pandemia apenas chegaram aos 39.

  • Este país não é para velhos: uma catástrofe sem precedentes nos mais idosos

    Este país não é para velhos: uma catástrofe sem precedentes nos mais idosos

    Amanhã começa o Verão. E a Primavera despede-se num cenário de autêntico morticínio. Nunca como em 2022 se registaram tantos óbitos nos maiores de 80 anos entre 20 de Março e 19 de Junho. Quais as razões? Ninguém sabe, mas todos desejam especular. E, porém, para saber a verdade bastava o Ministério da Saúde ser transparente e mostrar os dados brutos do Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos. Como assim não procede, a morte morre solteira, mas leva milhares de idosos consigo.


    Em 4 de Dezembro do ano passado, em entrevista na SIC ao programa Alta Definição, o então vice-almirante Gouveia e Melo reflectia, não sem alguma demagogia: “Não podemos relativizar a morte dos idosos. Que raio de ética é a nossa se pensarmos assim?”

    Pouco mais de meio ano depois, as palavras do actual chefe de Estado-Maior da Armada fazem cada vez mais sentido, mas sobretudo porque as autoridades de Saúde e o próprio Governo, estes sim, desejam claramente relativizar o morticínio dos mais idosos, não mostrando qualquer interesse em indagar as causas de um aumento inopinado nos óbitos dos maiores de 85 anos, sobretudo na segunda metade da Primavera.

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    Com o Verão a iniciar-se amanhã, já é garantido que a Primavera deste ano será a mais mortífera de sempre para os maiores de 85 anos.

    De acordo com a análise do PÁGINA UM, a partir dos dados do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO), entre o último 20 de Março e ontem – ou seja, faltando somente contabilizar o dia de hoje –, morreram 14.398 pessoas deste grupo etário, superando largamente 12.948 mortes em toda a Primavera de 2020, que integrou a primeira vaga da pandemia da covid-19 numa população naïve, ou seja, sem imunidade a esta doença.

    No ano passado, faleceram durante a Primavera, 10.758 pessoas – o segundo valor mais baixo do quinquénio (2017-2021), mas muito em virtude da “sangria” do Inverno. Recorde-se que em Janeiro e Fevereiro de 2021 – quando as mortes por covid-19 chegaram a ultrapassar as 300 por dia e uma parte substancial da população, mesmo idosa, não estava vacinada – os óbitos nos maiores de 85 anos totalizaram os 14.805. Este ano foram “apenas” 10.001.

    Mortalidade na Primavera e total acumulado dos maiores de 85 anos até 19 de Junho entre 2017 e 2022. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

    Aliás, a elevadíssima mortalidade da Primavera deste ano – mais surpreendente porque o último Inverno foi “normal” – terá como consequência que, em breve, a mortalidade por todas as causas dos maiores de 85 anos ultrapasse este ano os valores assombrosos do ano passado. Considerando o período de 1 de Janeiro e 19 de Junho tinham, no ano passado, falecido 27.942 pessoas; este ano já se alcançaram os 27.393 óbitos.

    Caso se mantenha esta aproximação – e tendo em conta que o diferencial médio em Junho está a ser de 51 óbitos entre os dois anos –, dentro de 11 dias será expectável que haja mais mortes acumuladas em 2022 do que em 2021 para os maiores de 85 anos, um cenário inimaginável. Ainda mais porque os dois anos de pandemia teriam supostamente “eliminado” grande parte dos mais vulneráveis de entre os idosos.

    Embora o Ministério da Saúde continue, apesar das insistências do PÁGINA UM, a remeter-se ao silêncio – havendo apenas explicações pouco consentâneas com a realidade por parte da Direcção-Geral da Saúde –, a análise do PÁGINA UM à evolução da mortalidade neste grupo etário evidenciava que os problemas já eram bem patentes desde o início da Primavera.

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    Com efeito, entre 20 de Março e os primeiros 10 dias de Abril de 2022, os números diários de óbitos destacavam-se da generalidade dos anos do quinquénio de 2017-2021, com excepção do ano de 2020, quando a pandemia surgiu.

    Porém, este ano, ao invés do que sempre sucede – incluindo em 2020 –, o avanço da Primavera não trouxe qualquer redução da mortalidade; pelo contrário, acabou por aumentar a partir do início de Maio para níveis próximos dos meses de Inverno.

    Por exemplo, este ano, no mês de Janeiro morreram por dia 167 idosos com mais de 85 anos, enquanto a média em Junho está, por agora, nos 165. Mas desde o passado 14 de Junho, a média móvel de 7 dias está a ultrapassar os 170 óbitos diários, quando em anos anteriores não chega sequer aos 120. Ou seja, actualmente estão a morrer por dia mais de cerca de 60 idosos deste grupo etário do que seria expectável.

    Evolução da mortalidade diária na Primavera de 2017 a 2022 dos maiores de 85 anos (média móvel de 7 dias). Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

    As especulações sobre esta matéria podem ser muitas, mas improdutivas, porquanto apenas com uma análise dos dados brutos do SICO – que o Ministério da Saúde recusa fornecer ao PÁGINA UM, estando em curso um processo de intimação junto do Tribunal Administrativo de Lisboa – se poderá saber quais são as doenças que estão a contribuir para o morticínio da Primavera.

    A possibilidade dessa análise é absoluta e extremamente fácil de ser feita, uma vez que as causas dos óbitos são obtidas no exacto momento em que o médico legisla regista a morte no sistema, condição obrigatória para as cerimónias fúnebres.

    Em todo o caso, a hipótese de efeitos adversos dos sucessivos reforços de vacinação contra a covid-19 deverá ser necessariamente equacionada, numa altura em que já foram vacinadas com a quarta dose cerca de 45% dos maiores de 80 anos.

    Porém, acrescente-se que a quarta dose administrada aos mais idosos, sobretudo em lares, foi iniciada apenas em 16 de Maio, e o incremento da mortalidade – em contra-ciclo com a habitual descida da mortalidade na segunda metade da Primavera – começou mais cedo, e de uma forma mais evidente a partir do início da segunda semana de Maio.

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    Mistérios à parte – que poderiam ser desvendados rapidamente, nem que seja, em derradeira análise, pelo Ministério Público.

    E mais. Se nada se fizer, com todos os indicadores a mostrarem uma forte fragilidade da população mais idosa, o próximo Verão pode reunir terríveis condições para uma “tempestade perfeita”: com grande parte do pessoal médico em férias, se se verificar alguma onda de calor intensa em Julho ou Agosto, o morticínio entre os maiores de 85 anos poderá atingir níveis verdadeiramente pavorosos. Excepto se, entretanto, se descobrir uma vacina contra a incompetência.

  • Gestão da pandemia faz perder 10.000 novas vidas em Portugal

    Gestão da pandemia faz perder 10.000 novas vidas em Portugal

    Não se deve apenas contabilizar as vidas perdidas durante a pandemia, mas também os bebés que não nasceram, e que todos os anos não serão recordadas porque nem sequer tiveram a oportunidade de ser concebidas. O PÁGINA UM fez uma análise aos dados do Instituto Nacional de Estatística e concluiu que o medo e a incerteza deixaram um rasto marcante: em média por dia, entre Dezembro de 2020 e Março deste ano, houve menos 20 nascimentos por dia face à média antes da pandemia. São já 10 mil vidas literalmente perdidas.


    A pandemia provocou, por via da incerteza resultante do alarme social e do receio quanto ao futuro económico, uma redução de 20 nascimentos por dia em Portugal, o que, em termos práticos, significa que nasceram menos cerca de 10 mil crianças entre Dezembro de 2020 e Março de 2022. Esta é a principal conclusão de uma análise do PÁGINA UM à evolução do número de nascimentos registados na base de dados do Instituto Nacional de Estatística.

    Embora a pandemia tenha chegado a Portugal em Março de 2020, o seu impacte indirecto na descida das gravidezes e nos partos – que não se deveu em nada a questões sanitárias – apenas se começou a observar em Dezembro daquele ano, devido ao tempo de gestação.

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    De facto, excluindo os prematuros, somente a partir de Dezembro de 2020 todos os recém-nascidos foram concebidos em plena pandemia, que desde o início ficou marcado pela incerteza quanto ao futuro, o que terá influenciado muitas famílias e mulheres a adiarem a decisão de ter filhos.

    De acordo com os cálculos do PÁGINA UM, a média diária de nascimentos entre Dezembro de 2020 e Março de 2022 – abrangendo os 16 meses com um efectivo impacte, ou influência, da pandemia – situou-se nos 216, variando entre um mínimo de 194, em Janeiro de 2021, e um máximo de 242, em Setembro de 2021.

    Confrontando este período com os cinco períodos homólogos pré-pandemia – a começar no período de Dezembro de 2014 a Março de 2016 e a terminar no período de Dezembro de 2018 e Março de 2020 –, constata-se uma evidente queda: os nascimentos desde 2014 apresentavam valores relativamente estáveis, em redor dos 235 por dia, pese embora as flutuações mensais.

    Número de nascimentos por dia (média) antes e durante a pandemia. Fonte: INE. Análise: PÁGINA UM.

    Para ficar demonstrado o efeito da pandemia, saliente-se que a média diária de nascimentos entre Abril e Novembro de 2020 – ou seja, de bebés concebidos antes de Março de 2020 – se manteve em linha com o período pré-pandemia: 236.

    Os primeiros três meses da pandemia – Março, Abril e Maio de 2020 – foram aqueles onde se destaca uma maior retracção nas gravidezes, pois a maior redução nos nascimento ocorreu no período compreendido entre Dezembro daquele ano e Fevereiro de 2021.

    Com efeito, em Dezembro de 2020 registaram-se apenas 204 nascimentos por dia, quando a média desse mês no quinquénio anterior (2015-2019) era de 232. Por sua vez, em Janeiro de 2021 nasceram apenas 194 bebés – o valor mais baixo num mês desde que existem registos em Portugal –, o que contrasta com uma média também de 232 no quinquénio anterior (2016-2020), ainda sem influência da pandemia. Por sua vez, em Fevereiro de 2021, contabilizaram-se 205 nascimentos por dia, quando a média no quinquénio anterior foi de 225.

    Evolução do número de nascimentos (média diária) por mês entre Janeiro de 2011 e Março de 2022. Fonte: INE. Análise: PÁGINA UM.

    Ao longo de 2021 houve meses que registaram um maior número de nascimentos por dia, acompanhando o perfil habitual – nascem mais crianças no Verão do que no Inverno, o que significa que as concepções são mais frequentes no Outono –, mas com uma redução face aos período pré-pandemia.

    Por exemplo, os partos em Setembro de 2021 – de crianças concebidas maioritariamente em Dezembro de 2020 – atingiram em média os 242 por dia, mas mesmo assim bastante abaixo do habitual. Nos cinco meses de Setembro anteriores tinham nascido 262 crianças por dia – ou seja, mais 20 em cada 24 horas, ou mais 600 nos 30 dias.

    Embora com um desfasamento de nove meses, mostra-se também evidente os efeitos marcantes das ondas de alarme social que se foram enraizando desde 2020. Por exemplo, as repercussões da maior concentração de mortes atribuídas à covid-19 em Janeiro e Fevereiro de 2021 atingiram os nascimentos em Outubro e Novembro desse ano, que registaram decréscimos de 28 e 23 partos por dia, respectivamente.

    Total de nascimentos por mês entre Janeiro de 2011 e Março de 2022. Fonte: INE.

    Os primeiros três meses de 2022 mostram um ligeiro acréscimo na natalidade face aos meses homólogos de 2021, mas continuam ainda abaixo da média do período pré-pandemia.   

    Ignora-se se a redução dos nascimentos foi acompanhada por um aumento do número de interrupções voluntárias de gravidez, porquanto a Direcção-Geral da Saúde não divulga quaisquer elementos desde 2018.

    Em todo o caso, existem indicadores de que possa ter ocorrido um maior recurso ao aborto a partir de Março de 2020, uma vez que os quatro primeiros meses de 2020 (Janeiro a Abril) até registaram um aumento de partos face à média, sendo que somente a partir de Agosto daquele ano se acentuou a redução nos nascimentos.

  • Até 13 de Junho, em média há 61 dias com menos de 300 óbitos. Este ano, só tivemos um dia

    Até 13 de Junho, em média há 61 dias com menos de 300 óbitos. Este ano, só tivemos um dia

    Por norma, mesmo nos primeiros anos da pandemia, a Primavera seguiu o padrão habitual de menor taxa de mortalidade, mas 2022 está a fugir completamente do padrão. O número de óbitos em Maio e Junho assemelham-se aos de dias de Inverno, e não existe uma explicação para tamanha mortandade, uma vez que na Primavera as doenças fatais do sistema respiratório e circulatório causam menos vítimas. Do que estão a morrer os portugueses, um dos povos mais vacinados do Mundo contra a covid-19?


    Em 2022, o excesso de mortalidade em Portugal é já estrutural, e todos os indicadores mostram que se prolongará. A culpa não é directamente da covid-19, mas aparentam, cada vez mais, ser de factores decorrentes da gestão da pandemia que terá exacerbado outras doenças não relacionadas com a sazonalidade.

    Uma análise estatística do PÁGINA UM aos dados do Sistema de Informação dos Certificado de Óbito (SICO) revela que este ano houve apenas um dia – 2 de Maio – com os óbitos totais abaixo dos 300. Nesse dia faleceram 291 pessoas – uma situação excepcionalmente atípica. Na verdade, noutros anos a excepção é quando, em plena Primavera, há dias com mais de 300 óbitos.

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    Com efeito, se excepcionarmos o ano de 2020 – no auge da primeira vaga da pandemia –, em quase todos os dias de Maio dos anos anteriores a mortalidade esteve abaixo dos 300 óbitos por dia. Aliás, em 2014 todos os dias de Maio registaram mortalidade abaixo daquela fasquia. No ano passado (2021), após um Inverno de morticínio, apenas em quatro dias de Maio se registaram mais de 300 óbitos.

    Em 2020, mesmo tendo em conta as mortes por covid-19 – numa população então completamente naïve (sem contacto anterior com o vírus) –, contabilizaram-se 10 dias de Maio abaixo desse nível de mortalidade total.

    Em Junho, acrescente-se, ainda é mais raro observarem-se mais de 300 óbitos diários. No entanto, neste ano em curso morreram 324 pessoas no dia menos mortífero – aliás, dois dias: 1 e 3 de Junho. O dia mais mortífero foi ontem, 13 de Junho, com o SICO a apontar 385 óbitos, valor que poderá vir a aumentar devido a actualizações que ocorrem com regularidade no prazo de 48 horas.

    A dimensão da catástrofe que se vive agora é incomensurável, e não aparenta ser passageira ou conjuntural. Com efeito, considerando os últimos 10 anos – que englobam 2020 e 2021, já dentro da pandemia –, observa-se uma média de 61 dias com menos de 300 mortes, que resultam da chegada das temperaturas mais amenas e propícias a menores fatalidades por doenças respiratórias e do sistema circulatório.

    Número de dias com mortalidade abaixo (verde) e acima dos 300 óbitos por dia até 13 de Junho entre 2009 e 2022. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

    Numa perpectiva relativa, e tendo em conta os primeiros 164 dias do ano, seria suposto que, em média, 62,8% (103 em 164) dos dias registassem uma mortalidade total acima dos 300 óbitos. Ora, este ano está em 99,4%.

    Numa altura em que Portugal é um dos países mais vacinados com vacinas contra a covid-19, já inoculou 300 mil idosos com a quarta dose e apresenta a mais alta incidência cumulativa de covid-19 (desde o início da pandemia) no universo dos Estados com mais de 10 milhões de habitantes (48 casos por 100 habitantes), o “perfil” evolutivo da mortalidade total no ano de 2022 não encontra paralelo, mesmo se confrontada com 2020 e 2021.

    Recorde-se que, no primeiro ano da pandemia, a mortalidade total aumentou significativamente sobretudo em Março e Abril, e em alguns dias de Maio, mas mesmo assim em 13 de Junho contabilizavam-se 21 dias com menos de 300 óbitos. Note-se que, para aquele ano, nos 143 dias acima dos 300 óbitos, estão englobados os meses de Janeiro e Fevereiro, antes da chegada da covid-19 ao território português.

    No ano passado, os dias com menos de 300 óbitos atingiram níveis até ligeiramente acima da média (76 dias), mas muito por força da elevadíssima mortalidade em Janeiro e Fevereiro. Saliente-se que nos dois primeiros meses de 2021 morreram, em média, 634 e 457 pessoas, respectivamente, quando no período de 2015-2019 (pré-pandemia) a mortalidade em Janeiro e Fevereiro foi de 405 e 371 óbitos, respectivamente.

    Mortalidade média diária por mês no período 2015-2019 (média) e em 2020, 2021 e 2022. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

    Porém, ao contrário daquilo que por norma sucede – mesmo com os anos de 2020 e 2021 –, o ano agora em curso está a apresentar um perfil de autêntico colapso. E nem pareceria expectável em Janeiro. Com efeito, o primeiro mês de 2022 até teve uma mortalidade total abaixo da média de 2015-2019 (apenas 379 óbitos vs. 405), ligeiramente abaixo de 2020 (ainda antes da pandemia, com 383) e bem abaixo de 2021 (634 óbitos).

    No entanto, a partir daí, ao invés do que por norma sucede – com o aproximar da Primavera a mortalidade começa a descer –, o mês de Fevereiro deste ano suplantou já a média do período 2015-2019 (382 óbitos vs. 371), ficou acima de 2020 (com 341 óbitos) e já se aproximou de 2021 (ainda com 457 óbitos).

    O mês de Março de 2022 começou já a mostrar sinais de graves problemas de saúde pública. Não apenas a mortalidade total suplantou o período homólogo de 2020 – que marcou a chegada da covid-19 ao território português – como também foi superior à média de 2015-2019 e aos valores do ano passado.

    A mortalidade do mês de Abril deste ano assemelhou-se bastante à do mês homólogo de 2020 (339 óbitos vs. 350). Porém, com a enorme diferença de que, em 2020, a covid-19 estava a entrar numa população sem qualquer imunidade, enquanto em 2022 tínhamos já então cerca de 40% da população com contacto anterior com o vírus, apresentava uma das mais altas taxas de vacinação do Mundo e “beneficiava” de um lamentável (e teórico) “rejuvenescimento” da população mais vulnerável, por força do sistemático excesso de mortalidade ao longo da pandemia.

    Contudo, o mês de Maio, e agora também Junho, estão a confirmar que existe actualmente um inquestionável problema. A mortalidade total não diminuiu ao longo da Primavera, como seria de esperar, e “estabilizou” em redor dos 330-350 óbitos por dia. No presente ano, Maio registou 334 óbitos por dia, e em Junho (até dia 13) até subiu, fixando-se em 346.

    Em anos anteriores, os valores geralmente estão já, nesta época do ano, muito abaixo dos 300. Aliás, em Maio, a mortalidade total é em média (2015-2019) de apenas 279 óbitos e nos primeiros 13 dias de Junho atinge os 269.

    Embora a mortalidade acumulada em 2022 seja ainda menor do que a do ano passado, a tendência mostra que pode vir a suplantar, até Dezembro, os valores de 2021. Com, efeito, confrontando a mortalidade de ambos os anos até finais de Fevereiro, o ano de 2021 apresentava então um diferencial a rondar os 10 mil óbitos (32.433 vs. 22.429), mas agora, em meados de Junho, a diferença cifra-se apenas em 4.336 óbitos (62.639 vs. 58.303).

  • Um (inexplicado) ‘morticínio’ nunca visto em Junho

    Um (inexplicado) ‘morticínio’ nunca visto em Junho

    Mesmo em 2020 e em 2021, em plena pandemia, Junho foi mês ameno, tal como é norma nos outros anos em que a transição da Primavera para o Verão se mostra mais aprazível para se manterem as vidas. Mas este ano sucedem-se os dias com mais de 300 óbitos, e já se chegou mesmo aos 362 em apenas 24 horas. O excesso de mortalidade nos mais idosos chega a atingir os 42%.


    Este ano, nos primeiros 10 dias de Junho – um mês caracterizado por um reduzido nível de mortalidade – registaram-se 684 óbitos em excesso face à média do último quinquénio (2017-2021), que inclui os dois primeiros anos da pandemia.

    De acordo com a análise do PÁGINA UM aos dados do Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos (SICO), entre os dias 1 e 10 de Junho contabilizaram-se 3.390 mortes por todas as causas, quando a média (2017-2021) se situa nos 2.706. Ou seja, um aumento global de 25%.

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    Este acréscimo, da ordem dos 68 óbitos por dia, não é justificável apenas pela covid-19, mesmo se Portugal atravessa, oficialmente, um estranhíssimo recrudescimento da pandemia, porquanto apresenta uma taxa de mortalidade que é 17 vezes superior à média mundial, e não encontra paralelo a nível europeu. Nos últimos dados semanais, apenas até ao dia 6 de Junho, a DGS informou que a covid-19 foi responsável por aproximadamente 42 óbitos diários, dos quais 33 de pessoas com mais de 80 anos.

    Pela primeira vez desde que existem registos diários, não houve ainda qualquer dia de Junho deste ano abaixo dos 300 óbitos. Aliás, em anos anteriores, raros foram os dias acima dessa fasquia. Por exemplo, todos os dias da primeira década de Junho dos anos de 2010, 2011, 2012, 2014, 2015, 2017 e até de 2021 nunca ultrapassaram os 300 óbitos.

    Mortalidade total em Portugal nos primeiros 10 dias (primeira década) de Junho entre 2009 e 2022. Fonte: SICO.

    A mortalidade nesse período, entre os anos de 2009 e 2021, situou-se entre os 2.387 óbitos (em 2011) e os 2.840 (2016). Até este ano, o valor máximo diário tinha sido registado em 5 de Junho de 2018, com 314 mortes. Na passada quarta-feira, dia 8, contabilizaram-se 362 mortes.

    Este excesso de mortalidade está, porém, exclusivamente concentrado na população mais idosa, a partir dos 65 anos, e sobretudo nos maiores de 85 anos, que têm sido continuamente flagelados desde o início da pandemia.

    Segundo a análise do PÁGINA UM, a mortalidade nos maiores de 85 anos registou, nos primeiros 10 dias de Junho, um aumento de 42% face à média do último quinquénio – ou seja, morreram 1.540 pessoas, quando a média se situava nos 1.085. Esta situação mostra-se ainda mais assombrosa tendo em conta a “sangria” já decorrente de dois anos de pandemia, em que este grupo etário foi o mais flagelado.

    Mortalidade total em Portugal nos primeiros 10 dias (primeira década) de Junho entre 2017 e 2022 nos grupos etários dos maiores de 55 anos. Fonte: SICO.

    A faixa etária imediatamente anterior – dos 75 aos 84 anos – também regista uma subida inopinada, da ordem dos 21%: a média do último quinquénio era de 797; este ano subiu para os 968.

    No caso do grupo dos 65 aos 74 anos, o aumento foi de quase 18%, tendo morrido 476 pessoas, o que confronta com os 404 óbitos em média entre 2017 e 2021.

    Nos menores de 65 anos não se observa qualquer variação de relevo, registando-se até, na generalidade dos grupos etários, valores mais baixos do que a média. A excepção refere-se ao grupo dos 35 aos 44 anos (mais 8,8% do que a média), mas dentro do intervalo expectável para esta época do ano.

    As autoridades de Saúde mantém um silêncio activo sobre esta matéria.

  • Estado compra 21 milhões de euros em antivirais ‘promovidos’ por Filipe Froes

    Estado compra 21 milhões de euros em antivirais ‘promovidos’ por Filipe Froes

    O PÁGINA UM confirmou hoje que os antivirais, que tiveram aprovação em tempo recorde, já foram adquiridos para integrar a Reserva Estratégica de Medicamentos. Custo de cada tratamento, para doentes ainda com sintomas ligeiros ou moderados, podem ascender aos 500 euros. Mas as polémicas não se restringem aos custos.


    O Governo decidiu comprar cerca de 21 milhões de euros em antivirais contra a covid-19 às farmacêuticas Pfizer e o Merck Sharpe & Dohme (MSD), destinadas a doentes considerados vulneráveis, mas ainda com sintomas ligeiros ou moderados.

    Nos Estados Unidos, onde sobretudo o antiviral da Pfizer – o Paxlovid – está a ser mais usado, têm sido reportados casos de doentes que, após o tratamento, voltam a ter covid-19 com sintomas graves.

    A notícia foi esta tarde confirmada ao PÁGINA UM pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), e surge após Graça Freitas ter homologado uma nova norma terapêutica, no passado dia 28 de Maio, que incluiu, pela primeira vez, a adopção conjunta dos fármacos irmatrelvir e ritonavir (sob a marca Paxlovid, da Pfizer) e do fármaco molnupiravir (sob a marca Lagevrio, da MSD).

    Paxlovid, da Pfizer. A farmacêutica norte-americana prevê facturar, até ao final do ano, 20 mil milhões de euros com este fármaco.

    A nova norma terapêutica (Norma 005/2022) foi elaborada por uma equipa de consultores onde se destaca o pneumologista Filipe Froes, um dos médicos com maiores relações comerciais com a Pfizer e a MSD. Na segunda semana de Maio, Froes desdobrou-se publicamente em declarações elogiosas a favor dos antivirais e anticorpos monoclonais para tratamento da covid-19. A inclusão destes fármacos na norma tornou, na prática, obrigatória a sua aquisição pelo Estado.

    Estes medicamentos – cuja rapidez na aprovação por parte dos reguladores causa espanto, apesar das dúvidas da sua eficácia e das notícias sobre os efeitos secundários – têm sido, claramente, uma aposta de marketing das farmacêuticas nesta fase da pandemia: na generalidade, destinam-se a doentes com sintomas ligeiros a moderados, numa altura em que a Omicron, no caso português, somente causa a hospitalização de 0,2% dos casos positivos.

    Como cada tratamento poderá vir a custar cerca de 500 euros, fácil se conclui que as farmacêuticas ficam com os louros e com o dinheiro mesmo se a eficácia dos medicamentos for idêntica à de um placebo. E isto já para não falar nos problemas já anotados, sobretudo nos Estados Unidos, onde o seu uso, promovido por Joe Biden, se tem generalizado.

    O elevado preço destes fármacos também tem sido alvo de fortes críticas,

    Filipe Froes,o principal promotor dos antivirais, também elaborou a norma que “forçou” a aquisição dos antivirais.

    Além disso, por exemplo, no caso do Paxlovid, as interacções medicamentosas que desaconselhavam o seu uso (mais de uma centena) podem restringir a sua aplicação prática.

    As aquisições da DGS, que ainda não constam no Portal Base, foram realizadas no âmbito da criação da “Reserva Estratégica de Medicamentos”.

    Constituída em 2020, no contexto da pandemia, essa reserva é constituída, segundo o gabinete de comunicação da DGS, por “medicamentos, equipamentos de proteção individual e outros produtos de saúde, os quais foram sendo disponibilizados aos serviços de saúde de acordo com as necessidades, privilegiando os princípios da eficácia financeira, adaptabilidade, bom uso e eficiência dos artigos que a constituem, evitando dispersão e desperdício desnecessários.”

    Numa parte dos casos, como sucedeu com o antiviral remdesivir, da Gilead, que se mostrou pouco eficaz – mas que ainda integra a Norma 005/2022, não sendo coincidência Filipe Froes manter-se como consultor daquela farmacêutica norte-americana especificamente para este fármaco –, Portugal foi obrigado a fazer as compras, porque a contratualização foi centralizada pela Comissão Europeia. Com o remedesivir, a DGS gastou também quase 20 milhões de euros no final de 2020.

    Noutros casos, foi realizada através de “acordos bilaterais com as empresas, tendo sido a aquisição de antivirais uma das recentes aquisições realizadas”, adiantou a DGS ao PÁGINA UM.

    Embora a DGS nada refira sobre compra de anticorpos monoclonais – que são novos fármacos destinados a doentes com fraca imunidade –, terão também já sido adquiridas doses de Ronapreve, produzido pelas farmacêuticas Roche e Regeneron, uma vez que o fármaco consta como integrado na Reserva Estratégica de Medicamentos pelo Infarmed. Ainda em análise, também para compra, estarão os anticorpos monoclonais da GlaxoSmithKline (Xevudy), da AstraZeneca (Evusheld) e da Cektrion HealthCare (Regkirona).

    Destaque-se que, de acordo com o site Worldometers, a mortalidade atribuída à covid-19 atingiu, no passado dia 8 de Junho, o valor mais baixo desde 21 de Março de 2020, no início da pandemia. Anteontem, a nível mundial contabilizaram-se 1.281 óbitos (média móvel de 7 dias), o que contrasta com o máximo deste ano nos 10.952 mortes, ocorrido em 9 de Fevereiro. O valor máximo durante a pandemia verificou-se em 27 de Janeiro de 2021 com 14.723 óbitos, ou seja, o valor mais recente representa 8,7% do pico.

  • Primavera varre de luto várias regiões de Portugal. Conheça os 21 concelhos com agravamento da mortalidade total superior a 50%

    Primavera varre de luto várias regiões de Portugal. Conheça os 21 concelhos com agravamento da mortalidade total superior a 50%

    O PÁGINA UM analisou a mortalidade total em cada um dos 308 municípios portugueses entre as semanas 13 e 21; ou seja, grosso modo, nos dois primeiros meses da Primavera. Alguns concelhos parecem ter sido varridos por um desastre. Mas ninguém estuda as causas. A Direcção-Geral da Saúde dá mais atenção à varíola dos macacos do que a apurar a raiz de uma Primavera funesta.


    Nunca a Primavera foi tão fúnebre em Portugal. Apesar da pandemia da covid-19 estar já em fase endémica – e numa altura em que o Governo decidiu intensificar o programa de vacinação contra esta doença com a quarta dose –, nunca como agora as agências funerárias de vastas regiões do país tiveram tanta actividade ao longo dos meses de Abril e Maio.

    De acordo com a análise detalhada do PÁGINA UM aos dados disponíveis do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO), este ano a mortalidade total no país cresceu 16% entre o início da semana 13 (28 de Março) e o fim da semana 21 (29 de Maio) face à média do período homólogo dos cinco anos anteriores à pandemia (2015-2019).

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    Segundo os registos por concelho do SICO, o número total de óbitos nos 308 municípios portugueses neste período atingiu, este ano, os 21.263, o que contrasta com as 17.698 mortes no período homólogo do ano passado – que tragicamente “beneficiou” da mortandade dos dois primeiros de 2021 – e com as 20.987 mortes em 2020, que integra a primeira fase da pandemia da covid-19 em Portugal. No período de 2015-2019, a média foi de 18.306 óbitos,

    Mas esse aumento, já de si significativo à escala nacional, não ocorreu de forma uniforme.

    Analisando a situação individual de cada município, os cenários são muito mais preocupantes em determinadas regiões, sobretudo no Minho, em algumas partes do interior das regiões Norte e Centro, no Baixo Alentejo, no Algarve e nos Açores. Detectaram-se mesmo três municípios onde a mortalidade nas semanas de 13 a 21 de 2022 mais do que duplicou quando comparada com a média do período homólogo no período 2015-2019: Calheta (+118%), Monforte (+107%), Alvito (103%). Caso se considere o período 2017-2021, para integrar os dois anos de pandemia, a situação não se altera muito.

    Variação da mortalidade total nas semanas 13-21 de 2022 face à média do período homólogo de 2015-2019. Fonte: SICO. Mapa: ©João Cláudio Martins.

    Praticamente todos os concelhos com maiores incrementos são rurais – e, portanto, com menor quantidade e qualidade de serviços e assistência médica, como se pode observar naqueles que, além dos três já mencionados, registaram aumentos superiores a 50% em comparação com o período 2015-2019: Santana (95%), Terras de Bouro (83%), Miranda do Corvo (80%), Vizela, Reguengos de Monsaraz e Alcoutim (75% cada), Vila Franca do Campo (72%), Pinhel (70%), Mira (64%), Almodôvar (60%), Sousel (59%), Nordeste (57%), Tabuaço (55%), Alpiarça e Estremoz (53%, ambos), Alandroal (52%), Vale de Cambra e Sabrosa (51% ambos).

    No entanto, também alguns importantes concelhos, mais urbanos, contabilizaram acréscimos significativos, como Ponte de Lima (acréscimo de 43%, decorrente de 106 óbitos em 2022 em confronto com 74 óbitos em média no período homólogo de 2015-2019), Viseu (41%; 224 vs. 158), Portimão (38%; 141 vs. 102), Beja (36%; 111 vs. 81), Póvoa de Varzim (35%; 110 vs. 81), Maia (35%; 216 vs. 160) e Oeiras (31%; 332 vs. 253).

    Os cinco mais populosos municípios de Portugal apresentaram situações quase semelhantes, com excepção do Porto. No caso de Lisboa – que, além de ser o concelho mais povoado, tem uma população bastante idosa – registou-se um acréscimo de 12%, ligeiramente abaixo da média nacional, mas mesmo assim um aumento absoluto de 138 óbitos (1.247 este ano vs. 1.109 no período de 2015-2019).

    Sintra, por sua vez, contabilizou um acréscimo de 15%, com 546 óbitos este ano que confrontam com 477 em média no período 2015-2019. Mais a norte, Vila Nova de Gaia – o terceiro concelho com mais habitantes – registou uma subida de 22% na mortalidade total (519 vs. 426). Cascais – o quinto concelho mais povoado de Portugal – teve um aumento em linha com a média (16%), decorrente dos 382 óbitos que comparam com os 330 em média no período 2015-2019.

    O município do Porto, o quarto município mais populoso, acaba por ser, de entre os concelhos urbanos, uma feliz excepção. Entre as semanas 13 e 21 contou 484 óbitos, somente mais cinco do que a média no período de 2015-2019, o que resultou num aumento de apenas 1%.   

    Contudo, se os dados concelhios mostram que, durante a presente Primavera, houve um agravamento da mortalidade muito significativo e bastante preocupante em vastas regiões do país, também causa admiração que se encontrem 77 concelhos com uma redução, por vezes significativa, o que mostra assim realidades distintas e não a existência de factores abrangentes que atingem todo o país por igual.

    Quais são os motivos? Ninguém sabe. Nem estuda.

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    Aparentemente, o excesso de mortalidade em Portugal está para ficar, de forma indefinida, sobretudo se não se quiser colocar a hipótese de se estar perante disfunções do Serviço Nacional de Saúde e de que os acréscimos de óbitos são efeitos secundários da estratégia governamental em secundarizar as outras doenças em tempos de pandemia.

    Entretanto, a Direcção-Geral da Saúde considera mais relevante um acompanhamento diário da situação da varíola dos macacos – que ainda não causou qualquer fatalidade –, e nem autoriza que outros façam o trabalho por si.

    Recorde-se que o PÁGINA UM já solicitou à DGS o acesso aos dados em bruto do SICO, o que foi recusado. Espera-se, neste contexto, uma decisão do Tribunal Administrativo de Lisboa para que se possa apurar as causas desta Primavera funesta.