Categoria: Saúde

  • Nos últimos três anos, morreram a mais 102 jovens, mesmo com menor letalidade das doenças respiratórias

    Nos últimos três anos, morreram a mais 102 jovens, mesmo com menor letalidade das doenças respiratórias

    Ao terceiro ano da pandemia, mostra-se cada vez mais evidente que a mortalidade total em Portugal apenas se agravou nas faixas etárias acima dos 55 anos, embora somente com relevância estatística na população em idade de reforma e, nesta, sobretudo nos maiores de 85 anos. Mas há uma gritante excepção, apesar do ensurdecedor silêncio do Governo e dos “peritos da pandemia”: no grupo dos adolescentes e jovens adultos, entre os 15 e os 24 anos, há um inexplicável e surpreendente incremento da mortalidade. Apesar de apenas se terem registado, neste grupo, cinco mortes por covid-19 e as doenças respiratórias até terem sido menos letais durante a pandemia, no somatório dos 10 primeiros meses do triénio 2020-2022 contabilizam-se mais 102 óbitos em comparação com o período homólogo anterior à pandemia. Em todos os outros grupos etários abaixo dos 55 anos, ao invés, observam-se reduções na mortalidade total.


    Mantém-se o silêncio oficial, continua o excesso de mortalidade. Os óbitos registados nos dez primeiros meses deste ano continuam a surpreender no grupo etário dos 15 aos 24 anos, e mostram a contínua “sangria” nos mais idosos, sobretudo dos maiores de 85 anos.

    De acordo com (mais) uma análise do PÁGINA UM, a mortalidade nos adolescentes e jovens adultos (entre os 15 e os 24 anos), que desde 2014 – ano a partir do qual existe informação diária fornecida pelo Sistema de Informação dos Certificados de Óbitos (SICO) – nunca excedera até Outubro os 290 óbitos, atingiu este ano os 321 óbitos. Parecendo uma subida absoluta pequena, a sua dimensão é extremamente relevante.

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    Com efeito, a mortalidade neste grupo etário – que, nos tempos modernos, e por razões compreensíveis, era inferior a uma morte por dia – está este ano a atingir dimensões surpreendentes. E não podem ser imputadas directamente ao SARS-CoV-2, uma vez que os dados da morbilidade e mortalidade hospitalar, que constam no Portal da Transparência do SNS, indicam apenas cinco óbitos por covid-19 entre os 15 e os 24 anos até Setembro passado. Globalmente, tendo em conta os 866 óbitos por todas as causas neste período, a covid-19 representou 0,6% do total.

    Convém referir, contudo, que a mortalidade por doenças do aparelho respiratório nesta faixa etária diminuiu bastante durante a pandemia. Entre Março de 2020 e Setembro deste ano, a base de dados da morbilidade e mortalidade hospitalar aponta para a ocorrência de 31 óbitos, menos 25 dos que aqueles contabilizados no período homólogo imediatamente anterior à pandemia (Março de 2017 a Setembro de 2019).

    Daí que o baixo contributo da covid-19 e até a situação mais “benigna” das doenças do aparelho respiratório mais adensam o “mistério”, que não parece do interesse do Governo ver desvendado, não apenas porque o Ministério da Saúde tem procrastinado uma análise independente como também porque recusa disponibilizar publicamente os dados anonimizados em bruto do SICO.

    Mortalidade total por grupo etário (idades) nos primeiros 10 meses de cada ano (Janeiro a Outubro) entre 2014 e 2022. Fonte: SICO

    Certo é que algo de estranho se passa neste grupo etário desde o início da pandemia – e não é, efectivamente, por culpa da covid-19. A mortalidade já tinha sido elevada em 2020 em comparação com os anos anteriores, tendo sempre como referência o período de Janeiro a Outubro. No primeiro ano da pandemia registaram-se 289 mortes neste grupo jovem, que confrontava com uma média de 256 mortes no quinquénio anterior (2015-2019). Em 2021 os valores regressaram para níveis “normais” (256), mas voltaram a disparar, e muito, em 2022.

    Caso se junte os três anos mais recentes (2020-2022), os 10 primeiros meses totalizam 866 mortes, enquanto no triénio anterior homólogo (2017-2019) se contabilizaram 764 mortes, ou seja, verifica-se um acréscimo de 102 mortes.

    Este fenómeno não se explica sequer por via do envelhecimento populacional – que justifica uma parte do aumento absoluto dos óbitos na faixa dos mais idosos, porque estão, efectivamente, a crescer nas últimas décadas, em virtude da melhoria da esperança de vida. Na verdade, como tem ocorrido uma redução nos nascimentos nas últimas décadas – e especialmente desde o início do presente século –, seria até expectável uma muito ligeira redução na mortalidade absoluta de jovens, mesmo se a taxa de mortalidade se mantivesse estável.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde.

    Além disso, a mortalidade no grupo dos 15 aos 24 anos surpreende por não encontrar correspondência nas faixas etárias adjacentes. Com efeito, confrontando os 10 primeiros meses deste ano com os períodos de 2017-2021 (incluindo assim os dois primeiros anos da pandemia) e de 2015-2019 (quinquénio anterior à pandemia), os menores de 15 anos registam uma redução nos óbitos contabilizados por todas as causas. No caso dos bebés com menos de um ano, mesmo se a mortalidade deste ano está acima da registada em 2020 e 2021, os valores são bastante mais baixos face ao período pré-pandémico (-11,8%).

    No grupo imediatamente superior – dos 25 aos 34 anos –, a mortalidade total em 2022 pode considerar-se dentro de uma certa normalidade, tanto em relação aos dois primeiros anos da pandemia como ao período pré-pandémico.

    Para aumentar a estranheza dos números registados entre os 15 e os 24 anos, também nos grupos etários dos 35 aos 44 anos e dos 45 aos 54 anos se observa uma significativa redução na mortalidade total ao longo dos primeiros 10 meses deste ano. Face ao período pré-pandémico, a redução no primeiro grupo etário é de 11,3% e do segundo de 5,9%.

    Comparação (variação percentual) nos grupos etários (idades) entre a mortalidade nos 10 primeiros meses de 2022 face à média dos quinquénios 2017-2021 e 2015-2019 e entre a mortalidade nos triénios de 2020-2022 e 2017-2019. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM

    Apenas a partir dos 55 anos se observa novamente um incremento da mortalidade face ao período pré-pandémico, embora com especificidades. Com efeito, embora o número de óbitos ainda esteja fora da normalidade face ao período anterior a 2020, entre os 55 e os 84 anos já se observam este ano valores mais baixos de mortalidade total do que em 2021.

    No confronto entre 2022 e 2021 nos primeiros 10 meses, para o grupo dos 55 aos 64 anos registaram-se menos 252 mortes, no grupo subsequente (65-74 anos) menos 517 e no grupo dos 75 aos 84 anos houve menos 951 óbitos. Em todo o caso, os valores de 2022 ainda continuam a ser bastante mais elevados do que antes da pandemia.

    Apenas no grupo dos maiores de 85 anos – aquele que, paradoxalmente, mais vacinado foi contra a covid-19 –, as mortes continuam a bater recordes. Nos 10 primeiros meses deste ano morreram mais 781 idosos desta faixa etária do que em 2021. Nos três anos da pandemia (2020-2022), no período de Janeiro a Outubro foram contabilizados 132.077 óbitos, que contrasta com as 114.552 mortes no triénio imediatamente anterior à pandemia (2017-2019). Ou seja, um incremento de 15,3%.

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    Em termos relativos, este aumento foi muito próximo do registado para o grupo dos 15 aos 24 anos (13,4%), com a agravante de que todos os outros grupos etários abaixo dos 55 anos tiveram mesmo quedas na mortalidade total durante a pandemia.  

    O PÁGINA UM contactou o Ministério da Saúde, no passado dia 4, para comentar estes valores, e também para saber se o estudo anunciado em Agosto pela ex-ministra Marta Temido sobre o excesso de mortalidade estava mesmo em curso, qual era a equipa (nomes) e qual o período previsto de conclusão. Não houve resposta, o que se mostra um “clássico de reacção” deste organismo governamental, que não se modificou com a entrada em funções de Manuel Pizarro.

  • “Nós, os Humanos”, e mais a interferência dos políticos na Medicina

    “Nós, os Humanos”, e mais a interferência dos políticos na Medicina

    A apresentação de uma reflexão sobre a Humanidade, escrita pelo vice-presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia, Jacinto Gonçalves, acabou por ser o mote para um debate sobre a gestão da covid-19. Nós, os Humanos, foi apresentado este sábado na sede da Ordem dos Médicos, é uma obra que constitui uma síntese da História da Humanidade e também um alerta para a necessidade da defesa do Planeta. No debate de apresentação do livro, no auditório da Ordem dos Médicos, falou-se da pandemia, da liberdade de expressão e de opinião, das farmacêuticas e também da ingerência dos políticos em questões de Medicina.


    Com o subtítulo “Quem somos, de onde vimos, para onde vamos?”, o novo livro de Jacinto Gonçalves, Nós, os Humanos, apresentado no sábado passado, é sobretudo uma “reflexão sobre a História da Humanidade e sobre os momentos marcantes da nossa evolução”, explicou o autor ao PÁGINA UM.

    “Precisamos mudar de rumo no respeito pela vida e pelos valores humanos em que acreditamos”, defende o autor. Sobre a influência da sua longa carreira como médico e professor na criação do livro, Jacinto Gonçalves diz que o livro constitui o resultado de 23 anos de ensino e de falar em público. “Temos de tornar as noções complexas em noções simples que sejam facilmente transmitidas e captadas”, diz.

    Jacinto Gonçalves na sessão de autógrafos do lançamento do seu livro Nós, os Humanos. Foto: ©Tozé Canaveira

    Uma das preocupações mostradas por Jacinto Gonçalves, em jeito de conclusão no seu livro, prende-se com a Revolução Industrial, que está a “provocar uma destruição maciça de ecossistemas e redução da biodiversidade”. Para o autor, o livro constitui um alerta para “a necessidade de as pessoas terem uma intervenção, se for possível, política, para defenderem o planeta”.

    António Pedro Machado, um dos convidados na apresentação desta obra, considera que o livro de Jacinto Gonçalves revela “a metodologia de um pedagogo e a escrita de um homem muito culto, que dedicou a vida não só à Medicina e aos doentes como também à Cultura, o que é próprio da sua geração”.

    Para este especialista em Medicina Interna, Nós, os Humanos é um livro que faz a cronologia dos acontecimentos, “mas que volta-e-meia faz-nos mergulhar naquilo que eu chamo um poço onde descemos milhares, por vezes, milhões de anos e depois faz-nos subir”. E acrescenta que “à medida que subimos no tempo, vamos relacionando fenómenos onde vamos percebendo melhor a evolução das coisas”.

    A apresentação do livro contou também com a presença da psicóloga Joana Amaral Dias, que aproveitou para revelar uma “inconfidência” sobre como conheceu o médico Jacinto Gonçalves. “Foi num período bastante crítico na minha vida no que diz respeito à minha consideração, confiança e respeito pela classe médica.”

    A psicóloga relembra que “no meio da crise de gestão da covid-19, fiquei perplexa porque apareceu-me um médico já de alguma idade, mas que era extremamente jovem, no sentido mais completo da palavra”. Joana Amaral Dias diz que foi graças a Jacinto Gonçalves e a outros médicos que restabeleceu essa confiança.

    Sobre a abordagem ao livro e ao seu autor, Joana Amaral Dias considerou que “não é a cultura, não é o conhecimento, não é o dinheiro que faz de nós humanos; é o serviço à Humanidade”.  E explicou que “a ética da Medicina, mostrada por Jacinto Gonçalves, e que me fez restaurar a consideração pela classe médica, é por revelar que essa Medicina não está ao serviço do dinheiro”. E concluiu: “A Medicina é, por vezes, uma serva, uma sabuja de grandes poderes económicos”.

    Embora o livro aborde uma temática global sobre o percurso da Humanidade, a pandemia acabou por interferir de uma forma indirecta, concedendo a Jacinto Gonçalves mais tempo para a escrita. Mas também para a reflexão sobre a gestão da crise sanitária, que considera ter “amputado liberdades e garantias”.

    Para este cardiologista, que exerce há mais de meio século, diz manter as suas posições críticas à forma como o SARS-CoV-2 se tornou omnipresente nas nossas vidas. “Daqui a seis meses, a covid-19 já passou, e já arranjaram outra coisa para nos entreter”, salienta, para acrescentar que, na sua opinião, foi “um meio, tal como sucederá com as alterações climáticas, para procurar controlar as pessoas”.

    Num auditório para mais de meia centena de assistentes, Jacinto Gonçalves garantiu ser “um homem para todas as estações. Não mudo de opinião na Primavera”, lamentando ainda que os médicos se tenham “acomodado excessivamente ao poder político”, como sucedeu durante a pandemia. “Houve erros na gestão, principalmente na parte pré-hospitalar, porque se apostou numa única forma de combater a doença, que é a vacina”.

    O lançamento do livro contou com a presença, da esquerda para a direita, de Joana Amaral Dias, Jacinto Gonçalves, Alexandre Loureço (Ordem dos Médicos) e António Pedro Machado. Foto: ©Tozé Canaveira

    E confessando ter levado as duas primeiras doses da vacina contra a covid-19, o também vice-presidente da Fundação de Cardiologia diz agora que, com este tipo de vacinas, não está “disponível para continuar a levar reforços de seis em seis meses.” E critica também “a atitude impensável de juntar a vacina da gripe, com a qual eu concordo plenamente, com um reforço da covid-19”, assegurando que “se anda a brincar aos feiticeiros”.

    Sobre a liberdade de expressão, que foi coarctada durante a pandemia, Jacinto Gonçalves lamenta que muitas opiniões válidas tenham sido “ocultadas ou impedidas de serem divulgadas”, e que poderiam ter sido implementadas. E exemplifica: “o primeiro grande erro foi o da prevenção, ao não utilizar-se medicamentos que são baratos e seguros, como é o caso da ivermectina. E depois foi o erro na fase pré-hospitalar, pois se um doente fosse testado positivo era mandado para casa com paracetamol; eu acho que isso foi criminoso”.

    Sobre a indústria farmacêutica, Jacinto Gonçalves considera também que “houve ganhos que foram pouco honestos sobre a promoção excessiva de um único meio”, exemplificando como a vacina rendeu milhões. “As acções da Pfizer aumentaram cinco vezes”, destaca. Contudo, o médico não pretende contribuir para diabolizar esta indústria “tantas vezes denegrida”, relembrando o seu papel extraordinário na melhoria das condições de saúde.

    Carlos Alberto Gomes à conversa com Jacinto Gonçalves sobre o livro Nós, os Humanos. Foto: ©Tozé Canaveira

    Para o cardiologista, “houve uma enorme evolução dos anos 50 para os anos 90; em cada década aparecia uma nova classe de medicamentos”, graças às farmacêuticas, defende Jacinto Gonçalves. “Não foram os organismos estatais que conseguiram essa evolução, mas sim as empresas farmacêuticas, que, obviamente têm de dar lucro”, acrescenta.

    Mas quanto aos políticos Jacinto Gonçalves não poupa críticas: “Lavam sempre as mãos como Pôncio Pilatos”, mostrando a sua preocupação por “a emergência sanitária estar a ser empurrada pelos poderes políticos, não só nacionais, como supranacionais”.

    “Os direitos, liberdades e garantias que estão salvaguardados na Constituição desaparecem quando uns senhores quaisquer da Assembleia da República determinarem que há uma emergência sanitária. E isso não pode suceder”, adverte.

  • Covid-19: Assintomáticos infectam 30% menos e originam três vezes mais casos sem gravidade, diz estudo norueguês

    Covid-19: Assintomáticos infectam 30% menos e originam três vezes mais casos sem gravidade, diz estudo norueguês

    Em artigo científico publicado ontem em prestigiada revista científica, investigadores do Instituto Norueguês de Saúde Pública concluíram que pessoas sem sintomas transmitem muito menos o SARS-CoV-2. Além disso, quando ocorre contágio nestas circunstâncias, a probabilidade de originar formas de doença menos grave (assintomáticos) é três vezes superior. O estudo norueguês revelou também que os casos assintomáticos eram, em média, mais frequentes nas faixas etárias jovens, em homens e em pessoas com menos doses de vacina em comparação com os casos sintomáticos.


    As pessoas infectadas pelo vírus SARS-CoV-2 que não apresentam sintomas transmitem quase 30% menos o vírus do que os sintomáticos, revelou ontem um artigo científico publicado na prestigiada revista BMC Medicine, pertencente à Springer Nature, que também edita a Nature. Os investigadores noruegueses – que analisaram mais de 27 mil casos positivos de covid-19 em Oslo entre Setembro de 2020 e Agosto de 2021 – revelam ainda que as pessoas contagiadas por assintomáticos tiveram três vezes maior probabilidade de também serem assintomáticas em comparação com a transmissão por um sintomático.

    Estas conclusões são extremamente importantes, uma vez que apontam para um menor nível de perigosidade do vírus no contágio por pessoas sem sintomas, pondo também em causa parte das medidas não-farmacológicas. Recorde-se que a maioria das autoridades de saúde chegaram a decretar o confinamento de pessoas com “contactos de risco” mesmo sem sintomas de covid-19.

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    Como o risco de transmissão era menor, mas mesmo existindo, as consequências eram menores, o confinamento aparenta não ter sido a melhor opção do ponto de vista da saúde pública. Ou seja, se houvesse maior transmissão por assintomáticos, que originam um maior rácio de infecções assintomáticas – em comparação com a transmissão por sintomáticos –, haveria, certamente, uma maior percentagem de pessoas a não desenvolverem formas graves de doença e a criarem assim imunidade natural útil para enfrentar posteriores infecções por sintomáticos.    

    A este respeito, o artigo, publicado já depois de revisto por pares (peer review), intitulado “Lower transmissibility of SARS-CoV-2 among asymptomatic cases” (em tradução livre, Menor transmissibilidade do SARS-CoV-2 entre casos assintomáticos) diz claramente que os “casos sintomáticos espalham o vírus em maior medida do que os assintomáticos, e que os infeciosos são mais propensos a serem assintomáticos se o seu infecioso assumido fosse assintomático”.

    Estudo foi ontem publicado na revista BMC Medicine.

    Os autores deste estudo – Fredrik Methi e Elisabeth Henie Madslien, ambos consultores do Instituto Norueguês de Saúde Pública – basearam a sua pesquisa em dados de rastreio de contactos na capital norueguesa, estimando “a dinâmica de transmissão e susceptibilidade entre casos sintomáticos e assintomáticos e os seus contactos identificados” a partir de 27.473 casos positivos e 164.153 contactos próximos.

    E estimaram, com rigor, que a taxa de ataque secundário (SAR) era 28% mais baixa por exposição assintomática em comparação com a exposição sintomática. Com efeito, no caso dos assintomáticos a taxa era de apenas 13%, valor que contrastava com os 18% no caso dos sintomáticos.

    Esse aspecto nem era o mais relevante. “As pessoas infectadas por pessoas assintomáticas eram quase três vezes mais propensos a serem [também] assintomáticas em comparação com as infetadas por casos sintomáticos”, adiantam os investigadores noruegueses.

    Por outro lado, os investigadores descobriram que, estranhamente, as pessoas com sintomas tinham mais doses de vacinas do que as pessoas sem sintomas – algo que entra em contradição com a propalada eficácia das vacinas na redução das formas graves de doença –, acrescentando assim que “os casos assintomáticos eram, em média, mais jovens e maioritariamente do sexo masculino.

    Os autores referem que “existem várias razões para os casos assintomáticos poderem ser menos transmissíveis do que os sintomáticos”, apontando “a falta de tosse, espirros e outros sintomas respiratórios [que] podem reduzir a disseminação de gotículas respiratórias”, além da existência de “diferenças na carga viral e excreção viral entre [esses] dois grupos”.

    No entanto, salientam que “até agora, a literatura [científica] sobre a relação entre carga viral e gravidade da doença é inconclusiva. E dizem ainda que “pode haver diferenças nos padrões comportamentais de pessoas sintomáticas e assintomáticas”, embora acrescentem que, em Oslo, não as encontraram.

  • Colunex: a empresa de colchões foi dar uma “ajudinha” aos hospitais e facturou 1,3 milhões de euros numa semana

    Colunex: a empresa de colchões foi dar uma “ajudinha” aos hospitais e facturou 1,3 milhões de euros numa semana

    No início da pandemia, um mastodôntico Estado com quase nove séculos de História não conseguiu reunir logística suficiente para garantir o suprimento de equipamentos e produtos para contrariar os fenómenos de especulação e disrupção do mercado. Preferiu receber de braços abertos quem se predispusesse a dar uma “ajudinha” para encontrar materiais e produtos, mesmo que custassem os “olhos da cara” aos contribuintes. Até a Colunex, uma empresa de colchões, decidiu “auxiliar” o Estado nesse desígnio. Acabou a facturar 1,3 milhões de euros em máscaras. Em apenas uma semana. Tudo por ajuste directo e sem se conhecer sequer o preço unitário.


    Apesar de ser uma das mais icónicas marcas de colchões, a Colunex nunca vendeu uma só unidade deste produto a qualquer entidade pública, incluindo hospitais. Nem um sobre-colchão, nem uma almofada, nem um jogo de lençóis, nem uma cama articulada, nem um sommier ou um estrado, nem um banco ou uma poltrona, nem sequer uma mesinha de cabeceira. Nada.

    Tudo mudou com a pandemia. Mas não porque o fluxo de doentes nos hospitais justiçasse a compra de mais camas e colchões – na verdade, os internamentos totais reduziram-se, como o PÁGINA UM já revelou – ou que os produtos da Colunex tivessem tido alguma recomendação especial numa das muitas normas relacionadas com a covid-19 da Direcção-Geral da Saúde, por indicação dos seus consultores. Nada disso. Desde Março de 2020, mês oficial da chegada do SARS-CoV-2 a Portugal, a Colunex vendeu zero colchões ao Estado, tanto quanto os que vendera desde que o Portal Base elenca todos os contratos públicos, há mais de uma década.

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    Porém, vendeu algo que passou a ser corriqueiro ao longo da pandemia para qualquer empresa, desde as multinacionais até às de vão-de-escada: máscaras.

    Não se sabe quantas foram; terão sido muitas. Mas sabe-se quanto o Estado gastou com a compra de máscaras à Colunex. E não se sabe as quantidades, porque tudo foi por ajuste directo com competente direito a nada ficar escrito, sempre invocando a famigerada alínea c do número 2 do artigo 95º do Código dos Contratos Públicos: ”por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade, é necessário dar imediata execução ao contrato”. Portanto, nada se sabe sobre as quantidades nem sobre o preço unitário se sabe. Somente se sabe aquilo que saiu dos cofres dos hospitais, ou seja, do Estado; isto é, dos contribuintes.

    Foi tudo muito repentino, diga-se. Em apenas uma semana, com sábado e domingo de permeio, entre 25 de Março e 1 de Abril de 2020, a Colunex teve artes e virtudes de garantir seis contratos com hospitais, quatro dos quais de três unidades da região do Porto, pelo valor total de 1,3 milhões de euros. Ou, para se ser mais preciso, 1.304.025 euros.

    A Colunex, fundada em 1986, tem sede numa freguesia de Paredes, tendo oito lojas espalhadas sobretudo por centros comerciais de grande dimensão.

    Depois dessa data, pelo menos que conste do Portal Base, nada mais a Colunex vendeu deste ou de qualquer outro produto. Foi um negócio repentino. E assim veio, e assim foi. Um negócio que se assemelhou ao tempo de vida de uma borboleta adulta. Mas um negócio tão “belo” como alguns destes insectos.

    O primeiro contrato da Colunex foi estabelecido com o Centro Hospitalar Universitário do Porto, no dia 25 de Março, por 78.000 euros. Com a mesma data surge um segundo contrato com a mesma unidade de saúde – que integra Hospital Santo António, o Centro Materno Infantil do Norte, o Centro de Genética Médica e o Centro Integrado de Cirurgia de Ambulatório – por 124.200 euros.

    Este contrato foi para aquecer. No dia seguinte terá sido um dia de festa na Colunex. O Centro Hospitalar Universitário de São João – cujo presidente do conselho de administração era o agora director executivo do Serviço Nacional de Saúde, Fernando Araújo – comprou à empresa de colchões 587.325 euros em máscaras. Ao preço unitário agora praticado, apenas 2 cêntimos por unidade, teria dado para adquirir 29.366.250 máscaras – ou seja, para mascarar quase três vezes a população portuguesa inteira, mas naquela altura vendia-se ao preço que se queria e nem se regateava.  

    Fernando Araújo, então presidente do Conselho de Administração do Hospital de São João, autorizou a compra de quase 600 mil euros em máscaras, sem contrato escrito, e sem se saber o preço unitário. Eis o resultado da oferta de ajuda feita pela Colunex.

    No mesmo dia, a Colunex obteve mais um contrato nas redondezas: vendeu 222.500 euros de mais umas quantas máscaras à Unidade Local de Saúde de Matosinhos, que gere o Hospital Pedro Hispano. Este contrato demorou bastante a aparecer no Portal Base: somente surgiu a partir de 8 de Fevereiro do ano passado.

    A 27 de Março surge o único contrato de máscaras fora da região nortenha: o Hospital de Santo Espírito da Ilha Terceira decidiu comprar à Colunex 76.000 euros deste equipamento facial.

    Por fim, com um fim-de-semana pelo meio, esta incursão da Colunex com o mundo das máscaras terminou num contrato a 1 de Abril de 2020 com o Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa. O preço total: 216.000 euros.

    A administração da Colunex não quis esclarecer o PÁGINA UM sobre os meandros destes fugazes contratos nem dos lucros. Tão-pouco houve comentários dos responsáveis da Unidade de Saúde Local de Matosinhos, a segunda entidade pública com valores mais elevados de compras de máscaras à empresa de colchões.

    Quanto ao Centro Hospitalar Universitário de São João, a assessoria de imprensa justifica o recurso a esta e outras empresas que não costumavam vender produtos de uso hospitalar por causa de “quebras nas cadeias logísticas de material de consumo clínico, tendo estado em risco iminente, e por diversas vezes, incapacidade de proteção dos profissionais de saúde para a prestação de cuidados a doentes com covid-19”.

    E explica que “a comunidade civil (pessoas e empresas), ao ter conhecimento desta tremenda dificuldade, manifestaram junto dos hospitais diversas formas de ajuda, sem as quais não teria sido possível cumprir a nossa missão.”, acrescentando que “foi o caso da empresa Colunex Portuguesa S.A., que entrou em contacto com quatro hospitais da região Norte, tendo disponibilizado a sua logística para o transporte para Portugal de máscaras de proteção à covid-19, de forma a evitar rotura destes bens essenciais, pois na altura não existia oferta no mercado”.

    Este centro hospitalar do Porto diz ainda que “as quantidades de máscaras cirúrgicas e FFP2 entregues às quatro unidades hospitalares terão sido similares, bem como iguais os preços unitários”. Contudo, não adiantou qual foi o preço unitário. Está no “segredo dos deuses”, como estranhamente se tornou norma durante a pandemia.

  • Excesso de mortalidade não-covid disparou: este ano é mais de 10 vezes superior a 2021

    Excesso de mortalidade não-covid disparou: este ano é mais de 10 vezes superior a 2021

    O ano de 2022 já não é atípico, porque sucedeu a dois completamente anormais por causa da pandemia. Mas assacar responsabilidades somente ao SARS-CoV-2 ou a factores meteorológicos parece cada vez fazer menos sentido. Com vacinas disponíveis e uma variante menos letal (Ómicron), acabou por se morrer este ano muito mais por covid-19 do que em 2020, sem vacinas e com escassa imunidade natural. Mas pior ainda: o excesso de mortalidade não-covid, que já tinha sido elevada nos primeiros 10 meses de 2020, regressou agora em grande força este ano. Explicações oficiais? Não há. O Ministério da Saúde diz estar em estudos; e, enquanto isso, vai “lutando” no Tribunal Administrativo para convencer os juízes a não conceder o direito à informação pelo PÁGINA UM.


    Apesar de pouco detalhados, os dados oficiais do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) não enganam e mostram um cenário aterrador: apesar da mortalidade total no ano passado ser ainda ligeiramente superior à do ano corrente (uma diferença de apenas 1.013 óbitos entre 1 de Janeiro e 31 de Outubro), o excesso de mortalidade não-covid disparou e está em níveis absurdamente elevados.

    A análise do PÁGINA UM mostra que, se se descontar ao total os óbitos oficiais da covid-19 em períodos homólogos dos três anos da pandemia (meses de Janeiro a Outubro), o ano de 2020 surge ainda como aquele que apresenta uma maior mortalidade atribuída a outras causas, embora 2022 esteja a uma pequena distância.

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    Contudo, aquilo que mais surpreende pela dimensão catastrófica surge quando se compara os anos de 2021 – onde se registou um pico de mortalidade por covid-19 em Janeiro e Fevereiro – e de 2022 – marcada pela dominância da variante Ómicron, muito menos letal, e com parte substancial da população com vacinação contra a covid-19 completa e com vários reforços.

    De facto, o ano de 2021 ainda tem mais mortes totais, mas quando se descontam os óbitos por covid-19, ressalta um quadro negro de excesso de mortalidade não-covid ao longo do presente ano: mais que decuplica. Ou seja, aumenta quase 1.000%. Mais chocante do que este espantoso incremento é a inércia do Governo em apurar as causas, sobretudo sabendo-se de o presente ano estar a ser o terceiro consecutivo com mortalidade excessiva. Portanto, já não são apenas os mais vulneráveis a “partirem”; é também, e muito, quem não deveria deixar esta vida tão cedo.

    Analisar os três anos em detalhe ajuda a contextualizar o problema.

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    No primeiro ano da pandemia, entre Janeiro e Outubro, os dados oficiais contabilizam a morte de um total de 98.837 pessoas, das quais 2.544 atribuídas à covid-19, significando assim que por outras doenças se registaram-se 96.293 óbitos. Deste modo, face à média do período homólogo (Janeiro a Outubro) do quinquénio anterior à pandemia (2015-2019), o ano de 2020 teve então um excesso total de 7.095 óbitos, mas que descia para os 4.551 se descontadas as mortes por covid-19. Ou seja, este último valor era o excesso não-covid.

    O ano de 2021 começou com uma inusitada mortandade, fruto de surtos agressivos de covid-19, de uma intensa vaga de frio e do colapso das unidades do Serviço Nacional de Saúde. Só no mês de Janeiro do ano passado morreram 19.649 pessoas, quando a média do período homólogo do quinquénio anterior à pandemia (2015-2019) era de 12.561 óbitos. A mortalidade ao longo do ano passado manteve-se sempre elevada, apesar do programa vacinal contra a covid-19. Entre Janeiro e Outubro acabaram por falecer um total de 103.334 pessoas, das quais 11.190 atribuídas à covid-19.

    Deste modo, o excesso não-covid foi assim de apenas 402 – ou seja, uma descida substancial face ao ano anterior. Note-se, contudo, que subsistem sérias dúvidas sobre a mortalidade atribuída à covid-19, tanto mais que, de acordo com a base de dados da Morbilidade e Mortalidade Hospitalar, cerca de um terço das mortes atribuídas a esta doença ocorreram fora de unidades de saúde.

    Óbitos no período Janeiro-Outubro desde 2015 até 2022 por causas diversas, por covid-19 e excesso de mortalidade não-covid-19 face à média (2015-2019) em Portugal. Fonte: SICO.

    Em todo o caso, o excesso global da mortalidade total em 2021, até finais de Outubro, foi elevadíssimo: mais 11.592 óbitos acima da média do período homólogo, ou seja, um acréscimo de 12,6%.

    Já o ano de 2022 não surpreende somente pelo elevado número de mortes por todas as causas, mas sobretudo por se verificar tanto na covid-19 – com uma variante menos agressiva a afectar população vulnerável praticamente toda vacinada e já com largas franjas com imunidade natural – como em causas não-covid. Até finais de Outubro, dos 102.321 óbitos contabilizados, 6.252 foram atribuídos à covid-19 – pouco mais de metade (56%) dos de 2021, mas 146% a mais do que em 2020, quando então não havia sequer vacinas e a população estava naive perante o SARS-CoV-2.

    Saliente-se que nesta comparação deve ser considerado que a covid-19 causou a primeira morte em Março de 2020; porém, mesmo assim era suposto que uma vacina, que chegou ser anunciada como tendo uma eficácia quase total, registasse um impacte muito mais positivo na redução da mortalidade por covid-19 em 2021 e 2022.

    Mas mesmo morrendo mais pessoas do que seria expectável por covid-19, são as mortes não-covid-19 que merecem explicações oficiais, que invoquem mais do que um Verão de temperaturas quentes e uma Primavera mais primaveril.

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    Com efeito, uma das tónicas mais marcantes de 2022 tem sido o sistemático excesso de mortalidade, persistente e não conjuntural, como sucede com as ondas de calor. Este ano, até Julho, todos os meses ultrapassaram os 10 mil óbitos. Os três últimos meses foram mais amenos – Agosto com 9.305 óbitos; Setembro com 8.751 e Outubro com 9.489 –, mas sempre com valores acima do ano passado e da generalidade dos anos anteriores. Considerando a média no quinquénio anterior à pandemia (2015-2019), entre Janeiro e Outubro, o excesso não-covid é de 4.327 óbitos.

    E assim, mesmo que o ano de 2022 acabe com valores abaixo de 2021, a actual situação demonstra estarmos a passar por um estado extremamente periclitante da saúde pública. Três anos de excesso de mortalidade ininterrupta. Vai durar? Se enterrarmos a cabeça na areia, sim…

  • Michael Levitt avisa: “Na Ciência, a verdade prevalece sempre”

    Michael Levitt avisa: “Na Ciência, a verdade prevalece sempre”

    Prémio Nobel da Química de 2013, Michael Levitt é um dos cientistas que marcam presença no Congresso Internacional sobre a Gestão da Pandemia que decorre entre os dias 28 e 31 deste mês, em Fátima. O bioquímico britânico tem vindo a denunciar, desde 2020, as muitas tentativas para descredibilizar cientistas que apenas tentavam tirar conclusões com base em dados e evidências científicas. A criação de uma indústria de “prevenção de pandemias”, que está em marcha e que absorve já milhares de milhões de euros, foi um dos alertas deixados por outro especialista de renome presente neste evento, David Bell. Entre os participantes nacionais neste congresso, destaque para dois antigos bastonários da Ordem dos Médicos, Germano de Sousa e José Manuel Silva, a psicóloga e ex-deputada Joana Amaral Dias e o fundador da AMI, Fernando Nobre.


    “Na Ciência, a verdade prevalece sempre, mesmo que demore anos ou décadas”. Estas foram as palavras de Michael Levitt no primeiro dia do Congresso Internacional sobre a Gestão da Pandema / Saúde que decorre desde ontem em Fátima. O Prémio Nobel da Química de 2013 acusa que, durante a pandemia, houve “muita oposição à ciência aberta, muitas tentativas de descredibilizar cientistas que estão apenas a analisar os dados, tal como eu fiz”.

    Levitt foi um dos muitos cientistas conceituados a nível mundial que foi alvo de censura desde 2020, chegando a ser desconvidado da primeira Conferência Internacional de BioDesign, a qual se baseava precisamente no trabalho que o próprio cientista desenvolveu. Mas Levitt manteve sempre a sua posição, de que estava a ser exacerbado o nível de perigosidade da covid-19.

    Michael Levitt na cerimónia de entrega do Prémio Nobel, em 2013

    Hoje, sabe-se que a doença afecta sobretudo as camadas mais idosas da população e que a sua taxa de letalidade média é de 0,035% abaixo dos 60 anos, segundo um artigo científico de vários cientistas, incluindo John Ioannidis, o epidemiologista mais citado a nível mundial. Este artigo veio, aliás, revelar a baixíssima letalidade na população jovem: de 0,0003% nos menores de 19 anos, de 0,003% entre os 20 e os 29 anos, de 0,011% entre os 30 e os 39 years, de 0,035% entre os 40 e os 49 anos, e de 0,129% entre os 50 e os 60 anos.

    Note-se que até John Ioannidis, o mais citado epidemiologista mundial, com um h-index do Scopus de 176, também foi alvo de censura e perseguição quando questionou a eficácia das medidas de confinamento, que, entretanto, diversos estudos confirmaram terem causado maiores danos na população do que proveitos ao longo da pandemia.

    Na sua apresentação no congresso, feita por videoconferência, Michael Levitt destacou que, durante a pandemia, “alguns países tiveram uma mortalidade abaixo do que é habitual” – incluindo a Suécia, Dinamarca, Noruega, Islândia, Austrália, Coreia do Sul e Nova Zelândia.

    Michael Levitt numa entrevista em sua casa após o anúncio da atribuição do Prémio Nobel da Química, em 2013.
    (Foto: Linda A. Cicero/ Universidade de Stanford)

    No caso da Europa, Levitt salientou que, nos países onde se verificou um excesso de mortalidade, “foi sobretudo na faixa etária acima dos 65 anos”.

    Nos diversos gráficos que disponibilizou na sua apresentação, ficou patente que, entre 2020 e 2022, as mortes em excesso nas pessoas com idade superior a 65 anos foi de 616 mil, enquanto nos restantes rondou os 94 mil.

    Apontou que o cenário foi diferente nos Estados Unidos, onde se registou, comparativamente, uma mortalidade mais elevada entre as camadas mais jovens. Naquele país, os óbitos entre os maiores de 65 anos totalizaram as 730 mil, e entre os menores de 65 anos rondaram as 390 mil – cerca de quatro vezes mais do que no Velho Continente.

    José Manuel Silva, antigo bastonário da Ordem dos Médicos (2011-2017) e actual presidente da Câmara Municipal de Coimbra.

    O congresso, que decorre até este domingo, contou ainda, no primeiro dia, com a participação de David Bell, um destacado médico clínico e de saúde pública norte-americano, doutorado em saúde populacional.

    Este médico, que coordenou a estratégia de diagnóstico da malária com a Organização Mundial de Saúde (OMS), acredita estar a desenvolver-se uma “indústria de pandemias”, a qual “está a ganhar muito dinheiro com base em falácias”.

    Para Bell, estas falácias são as teorias falsas de que “as pandemias se estão a tornar cada vez mais frequentes” e que “a interação entre humanos e animais selvagens está a aumentar”.

    “Nos últimos 20 anos, houve uma grande mudança no financiamento da OMS, que passou de ser maioritariamente de países-membros para financiadores privados, que dão dinheiro para ser alocado numa determinada doença”, frisou Bell.

    “Dizem-nos que há cada vez mais ameaças à saúde pública e que precisam de mais dinheiro”, disse ainda, referindo-se ao acordo Pandemic Preparedness and Response, liderado pela OMS, cujo objectivo é, alegadamente, prevenir e combater eventuais pandemias futuras. Este acordo e outros planos de prevenção de pandemias, irão absorver milhares de milhões de euros.  

    Este congresso, que vai contar ainda com a participação de muitos outros cientistas e especialistas nacionais e internacionais, foi organizado por Marta Gameiro, médica dentista, e financiado integralmente por donativos particulares, através de uma campanha de angariação de fundos.

    A lista de especialistas portugueses com presença confirmada no evento inclui dois antigos bastonários da Ordem dos Médicos –  Germano de Sousa e José Manuel Silva -, a psicóloga e ex-deputada Joana Amaral Dias e o médico e fundador da AMI – Assistência Médica Internacional, Fernando Nobre.

    Germano de Sousa, antigo Bastonário da Ordem dos Médicos e fundador do Grupo Germano de Sousa,
    que opera uma vasta rede de laboratórios.

    O primeiro dia do congresso teve como mote Confinamentos e Medidas Draconianas de Saúde Pública: o outro lado. Em análise estiveram as restrições impostas em nome da luta contra o vírus, os seus efeitos colaterais a nível global e a conduta da OMS durante a pandemia.

    As terapêuticas potencialmente eficazes no tratamento da covid-19 e o estado actual do Serviço Nacional de Saúde foram os temas de discussão no segundo dia do congresso.

    No último dia do evento será abordado o tema da saúde mental durante a pandemia, as vacinas contra a covid-19 e a controversa tecnologia de mRNA.

    O congresso é gratuito e poderá ser acompanhado em directo através do site oficial.

    Texto editado por Elisabete Tavares

    Nota: 03/11/2022 – Germano de Sousa não esteve presente à última hora por motivos de saúde.

  • Covid-19: apesar da redução da procura, Portugal já comprou stock para vacinar toda a população com mais de 5 anos

    Covid-19: apesar da redução da procura, Portugal já comprou stock para vacinar toda a população com mais de 5 anos

    Afinal, Portugal terá já gastado mais de 660 milhões de euros (e não 500 milhões) em vacinas contra a covid-19. Embora o Ministério da Saúde remeta para a Direcção-Geral da Saúde a divulgação dos contratos, assume que foram compradas 45 milhões de doses desde finais de 2020. Contas feitas, entre vacinas tomadas, doadas e revendidas, o stock actual é de 9,5 milhões de doses que valerão pelo menos 140 milhões de euros. Entretanto, com a previsível redução do “consumo”, a Pfizer prepara-se para quadruplicar o preço das vacinas para o próximo ano. O negócio tem de continuar.


    Desde Dezembro de 2020, Portugal já comprou quase 45 milhões de vacinas contra a covid-19 e tem um stock actual de cerca de 9,5 milhões de doses, mesmo se a adesão da população aos reforços esteja a ficar muito aquém das expectativas. Quase todos os contratos relativos a essas compras ainda não constam do Portal Base de contratação pública, sem que a Direcção-Geral da Saúde dê qualquer explicação.

    O número total de doses já adquiridas pelo Estado português foi transmitida esta semana ao PÁGINA UM por fonte oficial do Ministério da Saúde, que indicou que até ao dia 14 deste mês, “Portugal recebeu 44,9 milhões de vacinas”, tendo doado 7,8 milhões de doses, sobretudo aos PALOP, e revendido 2,6 milhões de doses.

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    O Ministério da Saúde acrescenta ainda que “até 17 de Outubro foram administradas cerca de 25 milhões de vacinas”, pelo que restam assim 9,5 milhões de doses em armazém. O número de vacinas administradas fica, porém, aquém do número estimado esta semana pelo PÁGINA UM (quase 26,8 milhões de vacinas administradas), calculado em função da cobertura vacinal por grupo etário indicada semanalmente pela DGS. O site Ou World in Data aponta para a administração de 25.965.516 doses em Portugal até 14 de Outubro.

    Deste modo, considerando um custo médio unitário de 14,7 euros – valor dos lotes financiados pela União Europeia através do Compete 2020 –, Portugal já terá afinal despendido cerca de 660 milhões de euros em vacinas contra a covid-19, e o stock actual (9,5 milhões de doses) terá um valor de quase 140 milhões de euros. Na semana passada, o PÁGINA UM tinha avançado que teria sido gastos 500 milhões de euros, mas desconhecia ainda a quantidades de doses em stock agora confirmado pelo Ministério da Saúde.

    A questão, neste momento, é saber se a procura por vacinas contra a covid-19 justificara a compra de tantas doses, quando se observa a nível mundial uma redução da adesão sobretudo nas idades mais jovens na toma de reforços.

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    Em Portugal, a campanha de reforço em curso – denominada de “sazonal”, embora seja a quarta ou quinta dose para a maioria dos casos – foi iniciada na primeira quinzena de Setembro, foram “alcançadas”, por agora, pouco mais de um milhão de pessoas.

    De acordo com os dados ontem divulgados pela DGS, 60% dos maiores de 80 anos tinham recebido esse reforço, sendo que essa taxa descia para os 30% no grupo etário dos 65 aos 79 anos. Essas percentagens representam cerca de 407 mil e 485 mil pessoas, respectivamente. Abaixo dos 65 anos, a DGS diz que tomaram reforço sazonal 5% das pessoas com idades entre os 50 e 64 anos e 1% das pessoas com idades entre os 25 e os 49 anos, ou seja, um total de pouco mais de 140 mil pessoas.

    Embora o coordenador do programa de vacinação, Penha Gonçalves tenha adiantado, anteontem, ao Público que 1,27 milhões de pessoas acima dos 60 anos tinha tomado já dose de reforço, e que “a vacinação está a decorrer dentro daquilo que está planeado”, as expectativas de se repetir um ritmo similar ao ano passado – que incluiu a vacinação de jovens e de crianças – parecem baixas.

    Sendo certo que entre 3 de Setembro e 14 de Outubro deste ano se vacinaram, de acordo com o OurWorldinData, quase tantas pessoas como em período homólogo do ano passado (1.052.968 pessoas vs. 1.070.286), até agora, nesta fase, foram abrangidas sobretudo os mais idosos, incluindo os residentes em lares. Porém, enquanto ao longo do Outono de 2021 e Inverno de 2021-2022, houve uma grande adesão da população portuguesa – entre Setembro do ano passado e Março deste ano foram administradas quase 8,5 milhões de doses –, incluindo de adolescentes e jovens adultos, agora não parece ser muito previsível a repetição desse fenómeno.

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    Com efeito, face à vacinação primária – que a DGS garante ter sido de 100% acima dos 25 anos e de 98% entre os 12 e os 24 anos –, a adesão ao primeiro reforço foi bastante mais baixa, sobretudo abaixo dos 50 anos. Entre os 25 e os 49 anos foi de 68% e entre os 18 e os 24 anos apenas de 55%. A DGS não recomendou, ao longo dos primeiros nove meses de 2022, o reforço para os menores de idade. Recuperou recentemente o apelo, através de declarações de Graça Freitas, embora sem a existência de uma justificação científica.

    Esta tendência de recusa dos reforços estará também relacionada com a percepção de um muito menor risco da Ómicron – que já atingiu quase metade da população portuguesa este ano, atendendo aos casos positivos acumulados –, que tem efectivamente uma taxa de hospitalização e de letalidade muitíssimo mais baixa do que as variantes anteriores. Além disso, a confirmação de que a imunidade natural dá garantias fortes de protecção, sobretudo às pessoas mais novas e saudáveis, pode ainda afastar mais as pessoas de optarem pelo reforço vacinal.  

    Além disso, a falta de transparência – e mesmo obscurantismo – em redor das vacinas tem resultado num aumento da desconfiança alimentada pela “fadiga vacinal”. Aliás, existe um receio de que, com tanta pressão para se vacinar contra a covid-19, as pessoas mais vulneráveis à gripe possam até recusar a vacina contra esta doença.

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    Em Portugal também não tem ajudado a postura das autoridades de Saúde, que aparentam estar sobretudo a defender os interesses das farmacêuticas e a proteger decisões políticas polémicas. Recorde-se, por exemplo, que o Infarmed continua a recusar o acesso ao Portal RAM, que cataloga os efeitos adversos das vacinas contra a covid-19, estando o processo de intimação ainda a decorrer no Tribunal Administrativo, por iniciativa do PÁGINA UM.

    Entretanto, esta semana soube-se que a Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 terá funcionado à margem da lei, sem sequer registar a sua actividade em actas, como agora alega a Direcção-Geral da Saúde, que poderá também estar, na verdade, a sonegar informação comprometedora.

    Neste cenário, as farmacêuticas preparam já uma eventual descida do “consumo” para não perderem uma “receita” comercial de sucesso. Na sexta-feira passada, a agência Reuters anunciou que a Pfizer tem um plano para quadruplicar o preço nos Estados Unidos a partir do próximo ano, para valores entre os 110 e os 130 dólares por dose. Esta decisão, que deverá ser acompanhada pelas outras farmacêuticas, terá um impacte favorável das receitas da Pfizer de até três mil milhões de dólares por ano, segundo analistas.

  • Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19: para se salvar vidas, não houve tempo para actas, diz DGS

    Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19: para se salvar vidas, não houve tempo para actas, diz DGS

    A Direcção-Geral da Saúde (DGS) escreveu ao PÁGINA UM para informar “sobre os motivos para a inexistência de actas formais das reuniões da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19”. Graça Freitas diz, desta vez, que havia “urgência para salvar vidas”, pelo que não houve tempo para actas mas apenas para pareceres, que, diga-se, não identificam sequer quem votou contra. A DGS não quantifica quantas vidas se perderiam se as actas – obrigatórias por lei e que revelariam o debate científico entre os membros – fossem escritas e divulgadas. O PÁGINA UM vai pedir ao Ministério Público que apure se Graça Freitas está a dizer a verdade ou se procura sonegar informação comprometedora, depois de uma sentença do Tribunal Administrativo a ter intimado a mostrar as actas ao PÁGINA UM


    A Direcção-Geral da Saúde justifica que foi por causa das “circunstâncias de elevada pressão sobre os serviços de saúde e urgência para salvar vidas” que não se mostrou possível “elaborar as actas formais das reuniões” da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC).

    Esta comissão consultiva, criada em Novembro de 2020, conta com 13 membros efectivos, peritos supostamente independentes, a que acrescem 16 membros consultivos. Aparentemente, nenhum terá tido tempo ou disponibilidade – à conta de salvar vidas – para escrever e aprovar actas onde, por exemplo, ficasse expresso quem foram os membros que, por exemplo, votaram contra o processo de vacinação dos adolescentes e das crianças aquando da discussão destas questões em Agosto e Dezembro de 2020, respectivamente.

    Graça Freitas diz agora que não há actas da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19: um acto ilegal, se for verdade; um crime, se for mentira.

    Recorde-se que a CTVC tem como funções a elaboração de pareceres técnicos sobre as vacinas contra a covid-19 e as estratégias de vacinação, de recomendações sobre os grupos-alvo da vacinação COVID-19 e a sua priorização, bem como apresentar propostas e acompanhar o desenvolvimento de estudos sobre os programas vacinais e ainda pronunciar-se sobre necessidade de formação.

    Na carta hoje recebida pelo PÁGINA UM, Graça Freitas diz que “face à urgência na tomada de decisões fundamentadas e fundamentais que permitissem a célere implementação do processo de vacinação da população residente em Portugal, e a redução do consequente impacte da infecção na saúde dos cidadãos, todos os esforços foram alocados para assegurar a atempada fundamentação técnico-científica e ética das decisões e a sua rápida implementação, através da elaboração e atualização de Normas da DGS”.

    Mas agora, acrescenta, parece que haverá tempo ao fim de dois anos de existência da CTVC. Graça Freitas assegura que “com a não prorrogação do estado de alerta a 30 de setembro de 2020, bem como com a cessação da vigência de diversos decretos-leis e resoluções aprovadas no âmbito da pandemia, será assegurada a elaboração das atrás das reuniões ocorridas após aquela data”.

    Dossier dos pareceres da CTVC consultados pelo PÁGINA UM em Março. A DGS sempre recusou revelar as actas. Agora, intimada pelo Tribunal Administrativo, diz que afinal nunca houve actas, mas que a CTVC vai agora começar a fazê-las.

    Destaque-se, contudo, que nenhum decreto-lei nem nenhuma resolução aprovada no âmbito da pandemia permitia que uma comissão consultiva como a CTVC não tivesse de elaborar actas, até por não ser algo que exigisse um dispêndio de tempo e de recursos relevante.

    Apesar da obrigatoriedade legal, e de não existir qualquer regime de excepção – e ser crucial conhecer a fundamentação técnica e científica de cada um dos membros, no pressuposto de que todos pugnavam apenas por princípios éticos e científicos, e não de outra natureza, mormente comerciais –, em mais de duas dezenas de pareceres não terão sido assim, alegadamente, elaboradas actas. Ou então está-se perante falsas declarações agora que o Ministério da Saúde foi intimado pelo PÁGINA UM a disponibilizar as actas.

    Esta situação mostra-se ainda mais anormal por terem sido indicados, dentro do grupo, um coordenador – Válter Fonseca, então director do Departamento de Qualidade da Saúde da DGS – e um coordenador-adjunto, Luís Graça. Este médico imunologista – que não andou a salvar vidas nos hospitais –, porquanto é investigador do Instituto de Medicina Molecular na área da regulação de linfócitos, acumula ainda a presidência da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa.

    Esta entidade é sobretudo conhecida por promover os Prémio Pfizer, que distingue anualmente investigação médica com uma recompensa monetária de 60 mil euros por ano. Além disso, Luís Graça tem tido, a título pessoal, ao longo dos últimos anos, diversas ligações a outras farmacêuticas com interesses nas vacinas, como a AstraZeneca. Da farmacêutica anglo-sueca recebeu oficialmente 3.050 euros nos últimos dois anos. Aparentemente, Luís Graça – que não respondeu às questões do PÁGINA UM – não teve assim tempo disponível para escrever uma acta sequer relativa a uma comissão consultiva para a qual não foi compelido a aceitar.

    Também nenhum outro membro da CTVC terá tido tempo para escrever actas nem a responder às questões do PÁGINA UM.

    Luís Graça (à esquerda), coordenador-adjunto da CTVC, não teve tempo para elaborar actas, mas teve tempo para conversas amigáveis com Paulo Couto Ferreira, relações públicas da Pfizer, em Novembro de 2021. E também para colaborar com a AstraZeneca por diversas vezes em 2021 e 2022.

    Recorde-se que a justificação da directora-geral da Saúde sobre a inexistência de actas desta importante comissão científica – que a confirmar-se significa que a sua “ciência” da CTVC se sustenta em coisa nenhuma – surge depois de largos meses sem que esta responsável manifestasse essa situação. Pelo contrário.

    Em Março passado, o gabinete jurídico da DGS informou o PÁGINA UM que “por despacho da Senhora Diretora-Geral da Saúde, datado de 18 de Março de 2022, foi solicitada apreciação jurídica sobre as duas questões requeridas” pelo PÁGINA UM, a saber: a identificação dos membros que votaram contra e se abstiveram face ao parecer (homologado em 28/07/2021) relativo à vacinação contra a covid-19 em adolescentes, e o mesmo em relação ao parecer sobre a mesma matéria, homologado em 8 de Agosto de 2021. Ora, apesar desse parecer nunca ter sido enviado ao PÁGINA UM, pressupunha que existia um documento oficial onde constavam as orientações de voto e a sua justificação. Ou seja, uma acta.

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    Também num processo levantado pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, Graça Freitas nunca alegou que as actas não existiam. E nem mesmo nas diversas intervenções no processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, do qual o Ministério da Saúde era réu, foi suscitada a inexistência de actas. Só agora que uma juíza sentenciou a obrigatoriedade de entrega, sob risco de multa, vem a DGS dizer que não há actas… porque se esteve sempre a salvar vidas.

    O PÁGINA UM vai solicitar ao Ministério Público diligências para apurar se as actas não existem mesmo ou se estão a ser sonegadas ou mesmo eliminadas.


    N.D. Todas as diligência do PÁGINA UM nos processos entrados no Tribunal Administrativo, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Até ao momento, o PÁGINA UM está envolvido em 13 processos de intimação, quatro dos quais em segunda instância, e ainda em duas providências cautelares. Até ao momento foram angariados 11.131 euros, um montante que começa a ser escasso face à dimensão e custos envolvidos nos processos. Na secção TRANSPARÊNCIA começamos a divulgar todas as peças processuais dos processos. em curso no Tribunal Administrativo. Este processo específico pode ser consultado aqui.

  • ESCÂNDALO: Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 funcionou à margem da lei

    ESCÂNDALO: Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 funcionou à margem da lei

    Durante meses, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) recusou ao PÁGINA UM facultar as actas das reuniões da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19, formada por peritos independentes, que determinaram as normas para a inoculação, incluindo em crianças e adolescentes, onde não terá existido unanimidade. O Tribunal Administrativo de Lisboa intimou agora a DGS a entregar ao PÁGINA UM essa actas, mas a entidade dirigida por Graça Freitas, vem agora dizer que nunca foram feitas. Mas adianta que as vai fazer a partir de agora. Sonegação ou apenas ilegalidade, eis a questão que se coloca. Nenhum membro da CTVC quis esclarecer o PÁGINA UM sobre se houve actas ou como eram, afinal, elaborados e aprovados os polémicos pareceres.


    O Tribunal Administrativo de Lisboa intimou o Ministério da Saúde a entregar ao PÁGINA UM as actas das reuniões da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC), mas a Direcção-Geral da Saúde diz agora que “não existem actas das reuniões”.

    Ao longo dos meses em que o PÁGINA UM solicitou a consulta a essa documentação, o gabinete de Graça Freitas nunca confessou que a CTVC – a comissão consultiva criada por despacho de 4 Novembro de 2020, e posteriormente alterado em Julho e em Dezembro do ano passado – não se reunia nem funcionava de acordo com a lei. Nem a DGS admitiu tal situação no decurso de uma queixa junto da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) nem durante o processo judicial que correu no Tribunal Administrativo de Lisboa, cuja sentença foi concluída em 30 de Setembro passado.

    Ilegalidade ou crime? CTVC nunca teve actas ou a DGS está a sonegar as actas?

    Na verdade, Graça Freitas até admitia mais do que implicitamente a existência dessas actas quando em meados de Março passado o PÁGINA UM consultara os pareceres da CTVC nas instalações da DGS, após um parecer da CADA.

    Na missiva enviada pela jurista Isabel Alves Pires salientava-se que “por despacho da Senhora Diretora-Geral da Saúde, datado de 18 de Março de 2022, foi solicitada apreciação jurídica sobre as duas questões requeridas” pelo PÁGINA UM, a saber: a identificação dos membros que votaram contra e se abstiveram face ao parecer (homologado em 28/07/2021) relativo à vacinação contra a covid-19 em adolescentes, e o mesmo em relação ao parecer sobre a mesma matéria, homologado em 8 de Agosto de 2021.

    Esse parecer nunca foi comunicado ao PÁGINA UM, razão pela qual o PÁGINA UM apresentou o caso ao Tribunal Administrativo de Lisboa. Mesmo no âmbito do processo judicial no Tribunal Administrativo, que se iniciou em 27 de Maio, a DGS alegou que não havia actas.

    Admitindo agora que afinal nunca foram exaradas quaisquer actas da CTVC, fica em causa a própria legalidade daqueles pareceres que apenas contêm a assinatura de Valter Fonseca, então director do Departamento de Qualidade da Saúde na DGS, e a homologação de Graça Freitas. E nem sequer se consegue conhecer a identidade dos membros da CTVC que, em alguns pareceres, votaram contra nem quais as justificações para esse sentido de voto.

    Graça Freitas homologou pareceres de uma comissão consultiva que funcionou à margem da lei?

    Recorde-se que, no âmbito da estratégia do combate à pandemia, a DGS justificou a implementação do programa de vacinação em adolescentes, no Verão de 2021, com base em dois pareceres polémicos que mereceram mesmo a não concordância de cinco dos membros da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC). Esta situação foi inédita em todos os outros 21 pareceres.

    Na totalidade dos 23 pareceres feitos até ao primeiro trimestre deste ano, apenas outros dois não mereceram unanimidade, mas apenas por um dos membros, cada: o primeiro, referente à vacinação de maiores de 80 anos; o segundo, sobre a co-administração das vacinas contra a covid-19 e a gripe.

    Destaque-se que as discordâncias nos dois pareceres sobre vacinação de adolescentes, datados em 28 de Julho e em 8 de Agosto do ano passado, foram sempre omitidas pela DGS. Relembre-se que todos os membros, com funções consultivas e publicamente pró-vacinas, foram escolhidos a dedo pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas. O conteúdo destes pareceres nunca constaram da informação então dada aos pais em 2021 com vista ao consentimento informado. Ou seja, os pareceres foram “vendidos” à opinião pública como se houvesse consenso entre peritos. Nunca houve.

    Dossier dos pareceres da CTVC consultados pelo PÁGINA UM em Março. A DGS sempre recusou revelar as actas. Agora, intimada pelo Tribunal Administrativo, diz que afinal nunca houve actas, mas que a CTVC vai agora começar a fazê-las.

    Além da questão da transparência em matéria de grande sensibilidade pública, a ilegalidade cometida pela DGS com a inexistência de actas da CTVC fica patente pela simples leitura do Código do Procedimento Administrativo, que determina que os organismos da Administração Pública, incluindo comissões consultivas ad hoc, devem lavrar em cada reunião uma acta que “contém um resumo de tudo o que nela tenha ocorrido e seja relevante para o conhecimento e a apreciação da legalidade das deliberações tomadas, designadamente a data e o local da reunião, a ordem do dia, os membros presentes, os assuntos apreciados, as deliberações tomadas, a forma e o resultado das respetivas votações e as decisões do presidente.“

    O diploma prevê que essas actas sejam “ submetidas à aprovação dos membros no final da respetiva reunião ou no início da reunião seguinte, sendo assinadas, após a aprovação, pelo presidente e pelo secretário”, acrescentando ainda que “o conjunto das atas é autuado e paginado de modo a facilitar a sucessiva inclusão das novas atas e a impedir o seu extravio.” E conclui, por fim, que “as deliberações dos órgãos colegiais só se tornam eficazes depois de aprovadas as respetivas atas ou depois de assinadas as minutas e a eficácia das deliberações constantes da minuta cessa se a ata da mesma reunião não as reproduzir.”

    Por esses motivos, Paulo Morais, presidente da Frente Cívica, diz que “a CTVC não pode deixar de apresentar as actas das reuniões que fez”, acrescentando ter a obrigação de “dar conhecimento ao público das deliberações que tomou.” Para este professor universitário e antigo candidato à Presidência da República, estamos perante uma de duas situações. “ou a DGS está a sonegar informação, o que é inaceitável; ou então é porque nunca houve reuniões.”. “Ora, num estado democrático é inaceitável que se esteja a sonegar informação”, conclui.

    A eventualidade de se estar perante a sonegação de actas com matérias sensíveis – por revelarem detalhes sobre algumas polémicas decisões, que poderiam até ter consequências legais e penais futuras para os seus membros – é, na verdade, uma das hipóteses.

    Ainda hoje, a DGS comunicou ao Tribunal Administrativo de Lisboa que afinal não existem actas, e por isso não as disponibiliza ao PÁGINA UM, mas sabendo da ilegalidade deste procedimento, acaba de informar a juíza do processo “que, com a não prorrogação do estado de alerta em 30-09-2022, será assegurada e garantida a produção das atas das reuniões ocorridas após esta data.”

    Extracto do requerimento (completo aqui) entregue hoje pela DGS ao Tribunal Administrativo alegando que não existem actas, mas que “será assegurada e garantida a produção de atas das reunião ocorridas” a partir de 30 de Setembro deste ano.

    Saliente-se que os diplomas do estado de emergência e do estado de alerta nunca estabeleceram que organismos públicos ou comissões consultivas estivessem isentos de elaborar actas para ficarem expressas as suas decisões. Ou seja, se nunca houve actas – e vai passar a haver a partir deste mês, como afirma agora a DGS –, então o organismo liderado por Graça Freitas assume que, pelo menos, teve uma comissão com a relevância política, pública e mediática (a CTVC) a funcionar completamente à margem da lei.

    O PÁGINA UM enviou questões à quase totalidade dos membros da CTVC, questionando-se se confirmavam a inexistência de actas e se tinham mesmo votados os pareceres em reuniões. Contudo, Manuel Carmo-Gomes, Ana Correia, António Sarmento, Fernando Rodrigues, João Pedro Rocha, Luís Graça, Luísa Rocha Vaz, Raquel Guiomar Moreira e Válter Fonseca – este presidente da CTVC – não responderam. Ou seja, oito membros da CTVC não estabeleceram se a DGS diz a verdade ou mente.

    O Ministério da Saúde também não deu esclarecimentos sobre esta matéria.


    N.D. O PÁGINA UM considera lamentável e intolerável esta postura da Direcção-Geral da Saúde em matéria de tamanha sensibilidade e gravidade. Tomaremos as diligências no sentido de as autoridades judiciais apurarem se houve uma ilegalidade – ausência de actas – ou um acto criminal – sonegação de informação.

  • Covid-19: Portugal gasta 500 milhões de euros em vacinas, mas contratos deixaram de ser públicos

    Covid-19: Portugal gasta 500 milhões de euros em vacinas, mas contratos deixaram de ser públicos

    A Direcção Geral da Saúde já comprou cerca de 33 milhões de doses de vacinas contra a covid-19, se se incluírem as doações para países terceiros. Mas a transparência destas massivas compras é inexistente: no Portal Base somente constam os primeiros quatro contratos (dois da Pfizer e dois da Moderna), mas com pouca ou nenhuma informação relevante, porque se remete para os obscuros Acordos de Aquisição (APA) da Comissão Europeia, que agora estão em investigação pela Procuradoria Europeia. O PÁGINA UM também revela os contornos das compras da Direcção-Geral da Saúde financiadas a 100% pela União Europeia, que mostram que a Pfizer tem ficado com a “fatia de leão”. Também os detalhes destas compras são desconhecidos.


    O Estado português já terá gastado 500 milhões de euros na compra de mais de 33 milhões de doses de vacinas contra a covid-19, mas somente se encontram disponíveis no Portal Base quatro contratos (dois da Pfizer e dois da Moderna), todos anteriores a Fevereiro de 2021, no valor de cerca de 135 milhões de euros.

    O secretismo da aquisição nacional de vacinas segue a linha dos designados Acordos de Aquisição (APA), estabelecidos pela Comissão Europeia e as farmacêuticas, e que agora atinge um ponto alto de desconfiança com o anúncio ontem da abertura de uma investigação pela Procuradoria Europeia.

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    De acordo com a análise dos dados da Direcção-Geral da Saúde sobre a evolução do programa de vacinação ao longo das várias fases da vacinação – por idade e tipologia – até 10 de Outubro terão sido já administradas pelo menos 26 milhões de doses, das quais quase 19 milhões na primeira fase de vacinação. O reforço vacinal com pelo menos uma dose, sobretudo ao longo deste ano, totalizou cerca de 6,9 milhões de doses. No reforço sazonal, actualmente em curso, terão sido já injectadas quase 817 mil pessoas, sobretudo com mais de 65 anos.

    Esta quantidade de vacinas, estimada pelo PÁGINA UM – uma vez que a DGS apenas divulga a percentagem de vacinação por grupo etário – é ligeiramente superior ao número de doses indicada pelo Infarmed no último relatório da farmacovigilância, que tem dados apenas até finais de Setembro. O regulador aponta para a administração, até 30 de Setembro passado, de um total de 25.600.892 doses.

    Estes valores têm de ter incluídas as compras para as doações a países terceiros. Até Fevereiro deste ano, o Governo anunciou ter já doado sete milhões de doses de vacinas a países terceiros, sobretudo dos PALOP.

    Número de doses administradas em Portugal até 10 de Outubro de 2020. Fonte: DGS (% de população vacinada) e INE (estimativa da população em 2020). Cálculos: PÁGINA UM. Nota: Considerou-se duas doses por pessoa na vacinação primária e apenas uma dose no reforço, uma vez que se ignora quantas pessoas tomaram mais do que um reforço.

    Apesar do Portal Base obrigar a incluir todos os contratos públicos, nunca mais foram colocadas as compras de vacinas contra a covid-19 a partir de início de Fevereiro do ano passado. Os dois (curtos) contratos entre a Pfizer e a DGS, decorrentes dos APA, assinados em 9 de Dezembro de 2020 e em 18 de Janeiro do ano passado visaram a aquisição de 4.440.804 e 2.220.596 doses, respectivamente.

    O primeiro lote ficou ao preço unitário de 12 euros, mas o segundo já subiu para 15,5 euros. Assim, por estas duas compras à Pfizer, a DGS pagou 54.489.660 euros pelo primeiro contrato e 34.419.238 euros pelo segundo.

    Os outros dois contratos que constam no Portal Base foram com a Moderna, não constando sequer o número de doses nem o preço unitário, apenas mencionando o valor total da aquisição. Ambos os contratos foram assinados pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas, em 29 de Dezembro de 2020, a um preço de 27.247.155 euros e de 18.780.000 euros. É uma completa anormalidade a existência de contratos públicos desta natureza e dimensão sem qualquer informação nem detalhe.

    A farmacêutica norte-americana Pfizer tem sido a preferida nas compras de vacinas contra a covid-19 pelo Estado português. Os contratos não são conhecidos desde Janeiro de 2021.

    Deste modo, somente são conhecidos os contratos relativos a compras de vacinas no valor de cerca de 135 milhões de euros, embora sem grandes detalhes.

    Com efeito, estes quatro contratos estão enquadrados no chamado Acordo Global de Compra (Advanced Purchase Agreement) assinado entre a Comissão Europeia e as diversas farmacêuticas. A partir desse acordo, cada país ficou apenas incumbido de indicar as doses e os prazos de entregas, mas sem a inclusão de quaisquer cláusulas de responsabilidade civil para as empresas produtoras das vacinas. Ou seja, em caso de problemas, as farmacêuticas descartam-se do pagamento de indemnizações.

    A mesma desresponsabilização sucederá com os diversos Estados da União Europeia, como Portugal. Independentemente das pressões sociais e políticas, sendo a vacinação voluntária e havendo um consentimento informado oral, assume-se que as pessoas vacinadas e os pais dos menores assumiram os riscos, pelo que quaisquer danos físicos ou não-patrimoniais nunca serão, em princípio, garantidos pelo Estado nem pelas farmacêuticas.

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    Nos dois contratos com Pfizer/BioNTech expostos no Portal Base, ficou assumido que “as circunstâncias de emergência” implicavam que o Estado português “reconhecia que a vacina, e os materiais relacionados com as vacinas, e seus compostos e materiais constituintes, estão a ser desenvolvidos rapidamente”. E, por esse motivo, “o Estado Membro Participante [o Estado português, neste caso] reconhece ainda que os efeitos a longo-prazo e a eficácia da vacina não são actualmente conhecidos.”

    Esta autêntica cláusula de exclusão de responsabilidades também se reforça na cláusula que refere que “o Estado Membro Participante reconhece que a vacina não deve ser serializada.”

    Por lei, todos os contrato já deveriam constar do Portal BASE, mas o Ministério da Saúde não explica a razão pela qual não foram ainda enviados mais contratos para registo ao Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção (IMPIC), a entidade gestora daquela base de dados da contratação pública.

    O PÁGINA UM apenas encontrou, através da consulta a documentação solicitada ao Compete 2020, duas referências sobre compras de vacinas pelo Governo, por via de candidatura a programas da União Europeia para financiamento a 100%. A Autoridade Central do Sistema de Saúde (ACSS) obteve um financiamento de 11.209.000 euros em Outubro do ano passado para a compra de vacinas, mas que estranhamente acabou por ser destinado, na verdade, a financiar a DGS a comprar vacinas contra a covid-19.

    Graça Freitas, directora-geral da Saúde, não coloca contratos da compra de vacinas contra a covid-19 no Portal Base.

    Por sua vez, a DGS obteve um apoio comunitário, também através do Compete 2020, da ordem dos 191 milhões de euros para compra de 12.975.027 doses. Estas compras específicas foram sendo realizadas sobretudo a partir de Junho de 2021, em vários lotes. E percebe-se que a Pfizer passou a ser a farmacêutica preferida.

    Com efeito, entre a documentação consultada pelo PÁGINA UM conta-se a referência a 132 compras àquela farmacêutica norte-americana num valor global da ordem dos 130 milhões de euros, enquanto a Moderna registou 17 vendas com um montante acima dos 50 milhões. A AstraZeneca e a Janssen – que não usam a tecnologia mRNA – ficaram com fatias minúsculas deste colossal bolo: apenas conseguiram vender vacinas em montantes da ordem dos dois milhões de euros. O custo unitário médio foi de 14,7 euros.

    Mas estas compras da DGS financiadas pela União Europeia – que nem sequer ainda foram auditadas pelo Compete 2020, segundo apurou o PÁGINA UM – representam pouco mais de um terço do total de vacinas administradas.

    Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, fez vários acordos com farmacêuticas, mesmo antes de estar provada a sua eficácia, como sucedeu coma Curevac em 16 de Novembro de 2020.

    E, em todo o caso, até estas compras se mantêm no segredo dos deuses, desconhecendo-se os compromissos já assumidos com as farmacêuticas numa altura em que a covid-19 se tornou endémica. Tanto em Portugal como nos outros países da União Europeia, sobretudo porque as compras foram negociadas directamente entre a Comissão von der Leyen e as farmacêuticas.

    Aliás, nos APA chegou-se mesmo a prometer compras de vacinas a farmacêuticas que nunca as conseguiram concluir, como sucedeu com a do consórcio da Sanofi e da GlaxoSmithKline e com a da Curevac. No primeiro caso, estava já prometida a compra pela Comissão Europeia de até 300 milhões de doses da vacina, enquanto para a vacina da Curevac ficou prevista a aquisição inicial de 225 milhões de doses, bem como a opção de se requerer 180 milhões de doses suplementares se ficasse comprovada a segurança e a eficácia de uma vacina contra a covid-19.

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    Este modelo seguido pela Comissão Europeia mostra bem como os negócios das farmacêuticas floresceram ao longo da pandemia, mesmo quando nada garantia que houvesse sucesso na produção de vacinas seguras e eficazes. Por exemplo, a Curevac, uma farmacêutica alemã, obteve 80 milhões de euros de financiamento da União Europeia e um empréstimo de 75 milhões do Banco Europeu de Investimento, além da entrada no capital da KfW, um banco estatal, que injectou 300 milhões de euros para ficar com cerca de um quarto do capital social.

    Em Agosto de 2020, a Curevac entrou no Nasdaq, através de uma oferta pública inicial (IPO), conseguindo ainda mais 213 milhões de dólares para se financiar. Começou com uma cotação de 46,55 dólares, chegou a atingir os 116,94 dólares em 1 de Abril de 2021, fruto da especulação e da promessa de contratos. Com o completo insucesso da sua vacina contra a covid-19, começou a despencar. Fechou a sessão de ontem a valer apenas 7,52 dólares, uma descida de quase 94% face ao seu máximo histórico.