A discussão de uma petição para a suspensão das vacinas contra a covid-19 em crianças serviu sobretudo para revelar a confrangedora iliteracia científica e a nula curiosidade dos deputados em analisar os mais recentes estudos sobre efeitos adversos em idade pediátrica. Nem um deputado aparentou alguma vez na vida ter olhado para a base de dados da Agência Europeia do Medicamento. Chavões e mais chavões foi o que mais se ouviu esta sexta-feira no Palácio de São Bento. Parecia estar-se em 2021. Ou na Idade das Trevas, onde se permite nada mais do que uma linha ortodoxa feita dogma.
Cavalgar a onda e acabar por debater bugalhos quando estava em causa alhos. Foi isto que sucedeu ontem em plenário da Assembleia da República com um debate que deveria analisar uma petição criada há 18 meses – e que andou a marinar infindável tempo sob o desinteresse geral dos deputados da Comissão da Saúde – que pedia a suspensão da vacinação contra a covid-19 em crianças porque os benefícios potenciais (numa doença que, para este grupo etário é irrelevante) não justificam os potenciais e reais efeitos adversos.
Em vez de questionar os factos científicos, que se têm vindo a acumular, e as evidências já recolhidas pela Agência Europeia do Medicamento sobre os efeitos adversos em idade pediátrica, os deputados da Nação optaram por acoplar à discussão uma proposta de recomendação ao Governo para “a avaliação do impacto psicológico da pandemia a crianças e jovens em idade escolar”, uma iniciativa do partido Chega. A petição original, com 9.046 assinaturas validadas, não incidia sobre os efeitos psicológicos da pandemia; mas sim sobre aspectos clínicos das vacinas sobre as crianças.
Assembleia da República, ontem durante o debate sobre a petição.
À boleia do assunto suscitado pelo Chega, a petição acabou por perder protagonismo, não tendo havido qualquer menção à necessidade de uma análise benefício-risco da administração de vacinas em jovens saudáveis, que até já nem é recomendada pela Direcção-Geral da Saúde (DGS). Neste momento, a DGS apenas recomenda a vacinação de menores com determindas comorbilidades, e já nem sequer aconselha boosters para menores de 50 anos.
A incerteza criada em redor da eficácia das vacinas e a falta de confiança nas autoridades, que continuam a esconder dados, tem sido responsável pela forte redução na procura de boosters nesta época sazonal. Desde 13 de Janeiro deste ano, segundo os últimos três relatórios semanais da resposta sazonal em saúde, apenas cerca de 10 mil pessoas entre os 18 e os 50 anos procuraram a dose de reforço sazonal. Isto num grupo etário superior a quatro milhões de pessoas.
O debate foi, também por isso, anacrónico, parecendo estar-se ainda no ano de 2021, quando dogmaticamente se faziam profissões de fé sobre os miraculosos fármacos que livravam da morte certa vulneráveis e saudáveis de qualquer idade e condição.
Os chavões ainda lá estiveram. Houve, e ouviram-se, deputados a evocar os famosos epítetos de “chalupas” e de “extrema-direita” para se referirem aos que levantaram dúvidas e perguntas sobre a gestão da pandemia e as vacinas contra a covid-19 administradas de forma maciça e com recurso à coerção. Foi o caso paradigmático de Pedro Filipe Soares, deputado do Bloco de Esquerda, que inusitadamente até insinuou que há quem acredite que a vacinação teve como efeito adverso a deterioração da saúde mental juvenil. A bizarra extrapolação dirigia-se sobretudo ao partido Chega – e aí tinha algum sentido, embora enviesado: o evidente impacto da pandemia ao nível psicológico nos jovens, já bastante estudado, advém das restrições (muitas, absurdas), e não à vacina propriamente dita, pelo que o debate parlamentar esteve a misturar alhos com bugalhos (mesmo se ambos são de produção vegetal).
Rita Matias, deputada do Chega.
E isso mesmo disse Pedro Filipe Soares: “Não é consequência das vacinas o problema de saúde mental nas escolas”, mas como se, entre as 10 razões elencadas pelos peticionários para suspender a vacinação nos mais jovens, ali figurasse aquela.
Esta intervenção do bloquista foi posterior à da deputada Rita Matias, do Chega, que apresentou a proposta do partido liderado por André Ventura, e com quem acabou por protagonizar uma acesa troca de palavras. E vieram mais chavões, com Pedro Filipe Soares a acusar o Chega de querer “agradar aos chalupas da sociedade”. A colagem ideológica à extrema-direita foi, aliás, um dos mais estafados truques da narrativa ortodoxa que, ao longo da pandemia, negou qualquer tipo de debate racional, tachando de extremistas e anti-ciência qualquer pessoa que se atrevesse a discordar da maioria.
Em todo o caso, o Chega acabou por ser o único partido a destacar-se de uma confrangedora homogeneidade de argumentos a favor da vacinação dos mais jovens. Com efeito, Rita Matias acabou por ser a única deputada a defender que na petição constam “verdades que não podem ser negadas”, tais como a falta de “dados de segurança das vacinas e noção dos seus efeitos nocivos a médio e longo prazo”, bem como sobre o excesso de reações adversas registadas em comparação com outras vacinas.
E criticou ainda Pedro Filipe Soares por chamar chalupas aos 9.046 peticionários, acusando-o de “fazer uma salada-russa de ideias”. Sobre uma das questões em debate – o alegado carácter voluntário da toma da vacina contra a covid-19 –, a deputada do Chega também relembrou que, apesar de ser opcional, muitos portugueses foram impedidos de “aceder a restaurantes, espaços de lazer, hotéis e grupos desportivos com base no estado vacinal ou no certificado digital”.
Pedro Filipe Soares, deputado do Bloco de Esquerda.
A par do Bloco de Esquerda – que teve Pedro Filipe Soares como protagonista a defender que “não são os decisores políticos que se devem substituir aos decisores técnicos no que toca à matéria de saúde” –, as intervenções do PCP, do Livre e do PAN tiveram em comum um lavar de mãos sobre a matéria, atribuindo a responsabilidade das decisões às autoridades sanitárias.
“Não existe nenhum medicamento nem nenhuma vacina que seja completamente inócuo, há sempre riscos associados”, frisou o deputado João Dias, do PCP, afirmando ainda que “devemos respeitar as decisões das autoridades de saúde pública”.
A deputada do PAN Inês Sousa Real, por seu turno, seguiu o mesmo diapasão, mas realçou ainda que “sempre defende[mos] a “não-discriminação” com base no estatuto vacinal, mas sim apenas com base num certificado de teste negativo. Algo que tem pouca base científica: um teste negativo não garante que a pessoa não esteja, nesse preciso momento, sem infecção.
Na sua maioria, as intervenções dos deputados foram meras réplicas dos argumentos já repetidos até à exaustão, sobretudo ao longo de 2021, para se justificar a administração das vacinas nas camadas mais jovens. Note-se que a própria Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC) já não se pronuncia sobre a administração em crianças desde 10 de Dezembro de 2021, sabendo-se que ao longo do ano passado o conhecimento científico sobre os efeitos adversos neste grupo etário se aprofundou bastante.
Inês Sousa Real, deputada do PAN.
Quanto aos dois principais partidos, o Partido Socialista (PS) e o Partido Social Democrata (PSD) assumiram posições quase indiscerníveis sobre o tema. Convergindo com o PS, a deputada social-democrata Cláudia Bento – uma médica nefrologista que foi nomeada relatora desta petição em Junho de 2022 – , reafirmou a importância da vacinação, mas sem dados: limitou-se a reiterar que são “seguras e eficazes”, apelando a que se confie “na Ciência e nas directrizes da autoridades de saúde”. Mas a Ciência esteve ausente porque nenhum deputado citou um estudo sequer ou um número válido e correcto sobre os efeitos adversos em crianças.
A “evidência científica” andou sempre de boca em boca como o Credo. Como na da deputada socialista Anabela Rodrigues que ainda afirmou que “as crianças são susceptíveis de infecção”, mas sem qualquer referência à taxa de letalidade, e invocando o aval das várias entidades de saúde, nacionais e internacionais, como a Agência Europeia do Medicamento e a Organização Mundial da Saúde.
Já Bernardo Blanco, deputado do Iniciativa Liberal, reconheceu ser “muito raro [jovens e crianças] desenvolverem problemas decorridos da covid-19”, e que há casos relatados de miocardites e pericardites após a vacinação. Contudo, ressalvou que estes efeitos adversos são também “muito raros”, e salientou que “o importante é que as famílias portuguesas possam escolher e o façam com cada vez mais informação”.
Clara Bento, deputada do Partido Social Democrata.
Na verdade, o deputado liberal foi o único que lá se muniu de um número: 1.007 miocardites em cerca de 50 milhões de vacinas administradas em jovens europeus, referindo-se a dados recentemente revelados pela Agência Europeia do Medicamento.
Esqueceu-se o deputado, em todo o caso, de referir que, dessas 1.007, houve 13 que resultaram em desfechos fatais, e que já foram notificadas à Agência Europeia do Medicamento um total de 125 mortes de crianças e adolescentes por forte suspeita de associação com as vacinas contra a covid-19, como o PÁGINA UM já relatou com base nos dados da EudraVigilance. E que as mortes e outras afecções, muitas com graves sequelas, não foram apenas cardíacas, mas também pulmonares e neurológicas.
Rui Tavares, do Livre, foi quem mais defendeu a vacinação de crianças como estratégia eticamente aceitável, porque terá, segundo ele, contribuído para diminuir a mortalidade geral, como se já não tivesse sido descartada há muito, mesmo pelas farmacêuticas, a possibilidade de se conseguir imunidade de grupo. Ou seja, já se sabe cientificamente que vacinar crianças saudáveis não concede qualquer protecção a idosos; aquilo que os pode proteger, na melhor das hipóteses, é eles se vacinarem. Sendo assim, mostra-se imprudente, e até contra as regras médicas, colocar em risco um grupo (idade pediátrica) de baixo risco. Saliente-se que a letalidade (sem vacina) para os menores de 20 anos é de 0,0003%, segundo um estudo este mês publicado numa reputada revista científica, e que tem como co-autor John Ioannidis, o mais citado epidemiologista mundial.
Rui Tavares, deputado do Livre.
Mas o deputado do Livre ainda foi mais longe: “Sem vacinação contra a covid-19 teríamos tido 10 vezes, provavelmente, mais mortalidade do que tivemos”, garantiu, fazendo até um paralelismo com a penumónica de 1918, que atingiu o Mundo numa época em que os avanços médicos e tecnológicos eram muito mais fragéis, e a condição de saúde mais débil. Saliente-se que a esperança média de vida há um século rondava os 40 anos em Portugal – e também que a pneumónica (ou gripe espanhola) se tornou menos virulenta (com o surgimento de variantes) antes de se encontrar qualquer vacina eficaz.
Sobre as potencialidades das vacinas para se evitar uma catástrofe humana durante a pandemia, recorde-se também que em Portugal tinham morrido cerca de sete mil pessoas por covid-19 até finais de 2020, antes do programa de vacinação. O número subiria para os 17 mil em Maio de 2021, quando já a esmagadora maioria da população mais vulnerável estava vacinada. Neste momento, ronda os 26 mil óbitos. Rui Tavares defendeu assim ser plausível que, sem vacinas, tivessem morrido 260 mil pessoas apenas de covid-19.
Obviamente, tudo isto disse o deputado do Livre sem citar qualquer artigo científico validado e sem sequer referir que os estudos científicos mostram que a Ómicron fez, por si só, baixar significativamente a letalidade do SARS-CoV-2, e que os ganhos da vacinação com as novas variantes (que tornaram a covid-19 mais transmissível e rapidamente endémica) são desprezíveis ou mesmo nulos abaixo dos 40 anos de idade. E isto sem se conhecer os efeitos a longo prazo.
Augusto Santos Silva, deputado do Partido Socialista e presidente da Assembleia da República.
Na verdade, embora muitos deputados tivessem assumido a existência de efeitos secundários como “normais” em todos os fármacos, foram evidentes as dificuldades em lidar com argumentação científica sustentada mesmo quando a Ciência foi evocada e invocada – tanto ao nível dos efeitos adversos com sequelas como ao nível de mortes –, sabendo-se ser com números (e não com profissões de fé) que se decide se o benefício compensa o risco. Nesse aspecto, e é quase tudo, nenhum deputado mostrou estar habilitado.
Em suma, muita palra para tão pouco sumo. Se vantagens houve no debate da petição e da recomendação proposta pelo Chega – que seria chumbada – foi o de se saber que os deputados portugueses continuam apenas com chavões na boca e a necessitarem urgentemente de uma rápida reciclagem científica à cabeça. O Google Scholar ajudaria, embora depois dê trabalho ler o que a Ciência tem revelado nos últimos tempos sobre estas matérias – não convém muito ir ao ChatGPT, diga-se, porque (ainda) repete chavões, e ainda não está ligado a artigos científicos.
Já nem é uma questão só de promiscuidade, mas de despudor: o pneumologista Filipe Froes já recebe honorários para estar presente em sessões de lançamento de fármacos que acaba por recomendar como consultor da Direcção-Geral da Saúde. O caso passou-se com um evento sobre um fármaco da AstraZeneca, o Evusheld, um anticorpo monoclonal. Mas o fármaco serve para tão pouco que, nos Estados Unidos, a Food & Drug Administration retirou a autorização porque o Evusheld tinha eficácia sobre menos de 10% das variantes do SARS-CoV-2. O Ministério da Saúde mantém-se em silêncio sobre (mais este) caso do pneumologista que se destacou como uma das figuras mais mediáticas a nível nacional durante a pandemia, e que é mandatário de Carlos Cortes, um dos “finalistas” a novo bastonário da Ordem dos Médicos.
O médico Filipe Froes recebeu 750 euros da farmacêutica da AstraZeneca apenas por participar na sessão de lançamento do Evusheld, um fármaco constituído por anticorpos monoclonais. A verba consta do Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed, onde se mostra que o pneumologista acumulou, só em Janeiro deste ano, 3.353 euros da AstraZeneca, Merck Sharpe & Dohme e GlaxoSmithKline.
O montante recebido pelo evento da AstraZeneca, em si, até chega a ser banal para os bolsos deste pneumologista – actual mandatário de Carlos Cortes nas eleições a bastonário da Ordem dos Médicos – que saltita entre os corredores do Hospital Pulido Valente e as salas e apertos de mão de dezenas de farmacêuticas, sempre com contrapartidas económicas, se não fosse o caso de ele ser um dos consultores da Direcção-Geral da Saúde (DGS) que recomendou este mesmo fármaco Evusheld como terapia contra a covid-19 para imunodeprimidos.
Filipe Froes (ao centro), entregou como mandatário, no dia 21 de Novembro, a candidatura de Carlos Cortes (quarto à esquerda) a bastonário da Ordem dos Médicos.
Com efeito, no passado dia 2 de Dezembro, a directora-geral da Saúde, Graça Freitas, aprovou a norma 015/2022 que definiu “a implementação da profilaxia de pessoas com imunodepressão grave, através da utilização de anticorpos monoclonais anti-SARS-CoV-2”.
Nessa linha ficou estabelecido que eram elegíveis para profilaxia com anticorpos monoclonais (PAM) as pessoas com transplantes (medula óssea, coração e pulmão), com certos tumores ou com infecção por VIH, tendo-se recomendado “a administração conjunta de Tixgevimab e de Cigavimab”, os dois anticorpos monoclonais que constituem o fármaco Evusheld, da AstraZeneca. A Agência Europeia do Medicamento tinha aprovado este fármaco apenas em Setembro do ano passado.
De entre os 12 peritos da DGS que elaboraram esta norma, consta Filipe Froes. Este médico participou, aliás, na generalidade das normas terapêuticas aprovadas contra a covid-19 durante a pandemia, introduzindo medicamentos de farmacêuticas com quem trabalhava, através de consultadorias e participação em eventos de interesse comercial.
O fármaco da AstraZeneca foi aprovado pela Agência Europeia do Medicamento em Setembro do ano passado.
Froes foi, por exemplo, consultor da Gilead especificamente para o remdesivir, um polémico antiviral usado para o tratamento de doentes com covid-19. E no ano passado esteve particularmente activo em eventos com a Sanofi e a GlaxoSmithKline, farmacêuticas que entraram recentemente no chorudo negócio das novas versões dos boosters contra a covid-19, com a VidPrevtyn Beta.
Ao longo do ano passado, Filipe Froes foi um dos mais fervorosos adeptos do uso – e da compra pelo Estado – dos diversos medicamentos de última geração contra a covid-19, mas de eficácia duvidosa, que foram surgindo pelas mãos de muitas importantes farmacêuticas, como a Pfizer (antiviral Paxlovid), a Merck Sharpe & Dohme (antiviral Lagrevio) e a GlaxoSmithKline (anticorpo monoclonal Xevudy).
Com todas e muitas mais farmacêuticas, Froes teve fortes relações comerciais, com valores totais que rondam os 50 mil euros por ano, de acordo com o Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed. Convém, contudo, salientar que o regulador não faz fiscalização regular a estas relações entre clínicos e farmacêuticas, sendo a inserção dos montantes realizada voluntariamente e sem necessidade de comprovativo legal.
Apesar do Ministério da Saúde não ter revelado ao PÁGINA UM, depois de questionado, o valor de eventuais compras de Evusheld à AstraZeneca, certo é que a sua utilização poderá vir a ser reduzida, se for seguida, na Europa, a decisão da agência norte-americana Food and Drug Administration (FDA) que, no passado dia 26 de Janeiro, decidiu retirar a autorização para administração do fármaco da AstraZeneca.
O regulador dos Estados Unidos concluiu que o Evusheld era eficaz apenas para menos de 10% das variantes que circulavam naquele país, e que só se justificariam os eventuais efeitos adversos se a eficácia fosse superior a 90%. A própria farmacêutica já assumiu essa decisão do regulador norte-americano no seu próprio site.
Registo de Janeiro de 2023 dos honorários (registados) de Filipe Froes provenientes da indústria farmacêutica. Fonte: Infarmed.
A decisão da FDA acaba por não surpreender, porque o regulador foi dando avisos ao longo de 2022 sobre o fraco desempenho do fármaco da AstraZeneca: o primeiro em Fevereiro do ano passado, o segundo em Junho, o terceiro em Outubro e o quarto já no dia 6 de Janeiro deste ano.
Surpreendente, talvez mais, seja a manutenção da confiança do Ministério da Saúde em Filipe Froes, que entretanto está com um processo disciplinar instaurado pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) desde Fevereiro do ano passado. O PÁGINA UM quis saber se a participação de Filipe Froes na sessão de lançamento – um evento comercial – do fármaco da AstraZeneca alteraria essa postura governamental, mas não obteve, até agora, qualquer resposta.
N.D. Embora se esteja a noticiar factos, tanto nesta como em outras notícias o PÁGINA UM poderia ter tentado obter um comentário de Filipe Froes. Sucede que não o fez nem faz por uma simples razão: há um meses, tentou-se obter uma reacção deste pneumologista, através de uma mensagem por Messenger, que obteve como resposta um simples “bloqueio de conta”, que se mantém. Presume-se assim que Filipe Froes jamais esteja interessado em dar esclarecimentos aos leitores do PÁGINA UM. Contudo, isso não desonera o PÁGINA UM de escrever com o máximo rigor sobre tudo aquilo que diga respeito à acção pública deste médico. Como, aliás, faz com tudo o resto.
Uma petição que pede a suspensão da vacinação de crianças contra a covid-19 esperou 18 meses para ser debatida no Parlamento. Os deputados debatem esta sexta-feira o tema, mas 45% das crianças em Portugal com idades entre os 5 e os 11 anos de idade já foram vacinadas contra a doença. No grupo etário dos 12 aos 17 anos de idade, 98% das crianças e jovens já tomaram também duas doses das vacinas contra a covid-19. Apesar da irrelevante letalidade da doença em idade pediátrica (0,0003%), o alarme social levou muitos pais a vacinarem os filhos, muitas vezes também por ser exigida a vacinação para os jovens praticarem desporto. O tema chega agora ao Parlamento numa altura em que a própria Direcção-Geral da Saúde já nem aconselha qualquer reforço a menores saudáveis de 18 anos. No Espaço Económico Europeu, já foram notificadas 125 mortes de crianças e adolescentes por forte suspeita de eventos adversos das vacinas contra a covid-19.
Já diz o ditado que mais vale tarde do nunca. Está marcado para hoje de manhã, mas o debate no Parlamento português de uma petição para a suspensão da vacinação de crianças contra a covid-19 já vem tarde. Só esta sexta-feira os deputados vão debater um pedido popular que deu entrada no dia 9 de Agosto de 2021 na Assembleia da República, quando já então contava com mais de 9.000 assinaturas.
Apesar de as novas vacinas terem apenas uma autorização de uso de emergência e parca testagem clínica, a Direção-Geral da Saúde (DGS) avançou com uma campanha em massa de vacinação de crianças e jovens em Portugal, depois de um polémico parecer da Comissão Técnica de Vacinação. Com a prudência e os alertas de pediatras colocados numa gaveta, as autoridades portuguesas avançaram com a vacinação de crianças entre os 5 e os 11 anos em Dezembro de 2021. A vacinação dos adolescentes começou poucos meses antes, após a sua autorização pela DGS em Agosto daquele ano.
Hoje, já há países que limitam a vacinação apenas a crianças com comorbilidades graves, como a Dinamarca, enquanto a Suécia e o Reino Unido não recomendam a menores de 12 anos. Em Portugal, a DGS não recomenda nem desaconselha. Mas, entretanto, em Dezembro do ano passado, emitiu um comunicado sobre a relação da ocorrência de miocardites nestes grupos etários e a toma das novas vacinas contra a covid-19. Recorde-se que não existem dados nacionais detalhados sobre reacções adversas destes fármacos, estando em curso um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa.
Em Portugal, de acordo com dados da DGS, 45% das crianças com idades entre os 5 e os 11 anos de idade tomaram duas doses de vacinas contra a covid-19, o que compara com 98% dos jovens entre os 12 e os 17 anos. Na generalidade destes jovens, a vacinação ocorreu há mais de um ano, pelo que a imunidade vacinal já estará fraca.
A petição tem como primeira peticionária Sónia Patrícia Barros de Sousa, que foi entretanto ouvida no Parlamento pela Comissão de Saúde, acompanhada ainda pela médica-dentista Marta Gameiro Branco, e a cardiologista Teresa Gomes Mota.
Apesar disso, a esperança de que seja decretada formalmente uma suspensão da vacinação contra a covid-19 de crianças em Portugal é, para já, nula. “Não tenho grandes expectativas de que vá acontecer”, disse Teresa Mota ao PÁGINA UM, na véspera do debate da petição. Esta cardiologista salienta, contudo, que “cada vez há mais estudos científicos que comprovam o que afirma a petição”, com os riscos da vacinação a superarem os benefícios. Segundo Teresa Mota, é necessário vacinar um milhão de crianças para evitar menos de um internamento com covid-19 com gravidade. “Repare: nem sequer é para evitar uma morte, mas para evitar um internamento com covid-19 grave”, frisou a médica. Por outro lado, a incidência de miocardites é mais de um em cada milhão de crianças.
Recorde-se que, em Portugal, foi atribuída à covid-19 a morte de três pessoas com idade pediátrica, todas com comorbilidade, duas das quais com poucos meses de vida, e que tinha nascido com malformações cardíacas.
Também para Marta Gameiro Branco, as evidências científicas deveriam ser mais do que suficientes para as autoridades suspenderem de imediato a vacinação de crianças, mesmo com as novas versões. E fala ainda do excesso de mortalidade geral. “Nós avisámos, não foi por falta de aviso. Hoje, há excesso de mortalidade em pelo menos 30 países, e existe uma correlação com as datas das campanhas de vacinação contra a covid-19; isso deve ser investigado”, disse a médica-dentista ao PÁGINA UM. “Se as vacinas fossem mesmo eficazes e seguras não deveria haver este excesso de mortalidade. Até porque estamos a falar também de excesso de mortalidade entre a população jovem”, disse.
Certo é que o Parlamento não deu a entender que esta petição seja uma prioridade. “Nunca houve muita consideração do Parlamento por esta petição”, disse Teresa Mota. Mesmo na audição da Comissão de Saúde, em Junho do ano passado, estiveram apenas presentes sete dos mais de 20 deputados que compõem aquela Comissão parlamentar. Na altura, o PÁGINA UM contactou todos os deputados (efectivos e suplentes) da Comissão de Saúde sobre esta matéria, tendo apenas respondido (a justificar as ausências com justificações plausíveis) os deputados Pedro Melo Lopes, Fátima Ramos, Joana Cordeiro e António Maló de Abreu.
Os serviços desta Comissão de Saúde, presidida por aquele último deputado, disseram então ao PÁGINA UM que “os motivos de ausência dos Senhores Deputados devem-se, certamente, a afazeres inadiáveis de natureza política ou outras e garantidamente justificáveis”, acrescentando que “cabe[ria] a cada Deputado, individualmente e se assim o entender, dar boa justificação da sua não presença na audição dos peticionários – sendo que a isso não estão regimentalmente obrigados”.
A subida da petição ao Plenário foi, na verdade, uma mera imposição regimental, em virtude do número de peticionários subscritores.
Entretanto, os peticionários enviaram uma carta a todos os deputados para que no debate desta sexta-feira estejam a par do histórico desta petição. Apenas o Partido Chega respondeu à carta, anunciando que apresentará também esta sexta-feira um projecto de resolução para recomendar ao Governo “a avaliação do impacto psicológico da pandemia a crianças e jovens em idade escolar”.
Para Teresa Mota, o lado positivo do debate no Parlamento é que a opinião pública poderá reflectir sobre o tema da suspensão da vacinação de crianças contra a covid-19. Além disso, há uma responsabilização dos deputados, que passaram a estar cientes dos riscos para os grupos etários mais jovens.
A Ciência costumava ser aberta e transparente, mas o Instituto Superior Técnico tem estado a escrever vergonhosas linhas sombrias. Um simples pedido de envio de um relatório em Julho feito por um jornal, transformou-se numa “recusa infantil” enviada pelo smartphone do presidente da instituição universitária. O caso acabou no Tribunal Administrativo de Lisboa, onde a defesa do catedrático Rogério Colaço garantiu estar-se perante não um relatório, mas sim um “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”. Agora, feita a sentença, que o PÁGINA UM ainda aguarda esclarecimentos, o Instituto Superior Técnico enviou apressadamente o suposto relatório (que recusara em Julho) e não perdeu tempo a requerer a retirada do processo do suposto original que fora obrigado pela juíza a enviar em envelope lacrado. Se a juíza concordar com este expediente, apaga-se a prova de um eventual crime de fraude científica.
Tem 11 páginas, um sumário, 12 gráficos, uma breve conclusão. O PÁGINA UM recebeu ontem pela manhã, por correio electrónico, o famigerado Relatório Rápido nº 52 do Instituto Superior Técnico, que em Julho do ano passado “responsabilizou” as festividades de Junho (festas populares e festivais de música) da responsabilidade por 330 mortes. Mas esta autêntica “novela científica” está ainda longe do seu epílogo.
A sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, assinada pela juíza Telma Nogueira na sexta-feira passada, concedeu razão ao PÁGINA UM quanto ao considerar a existência do direito de acesso aos relatórios elaborados pelo Instituto Superior Técnico numa parceria – que até teve apresentação pública – com a Ordem dos Médicos. No total, terão sido realizados 52 relatórios.
Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico, quer ver destruído documento enviado ao Tribunal Administrativo de Lisboa para evitar confronto com a cópia que foi remetida ontem. Não deu sequer tempo para o trânsito em julgado. Tanta pressa e falta de transparência alimenta legítimas suspeitas de se estar perante uma fraude.
Porém, a juíza ter-se-á esquecido de decretar explicitamente que o Instituto Superior Técnico teria também de enviar os outros relatórios, bem como os ficheiros com os dados que permitiram a elaboração das previsões e dos gráficos para se garantir não se estar perante uma fraude científica com objectivos de alarme social ou outros fins menos nobres. No requerimento do PÁGINA UM constava explicitamente esses pedidos, que permitiriam uma avaliação independente do rigor científico, uma tarefa considerada normal e até banal em debates científicos.
No entanto, sem sequer aguardar o trânsito em julgado – e, portanto, o direito de o PÁGINA UM requerer a consulta do processo e tomar outras diligências, incluindo recurso ao Tribunal Central Administrativo Sul para satisfação integral dos direitos de acesso aos outros relatórios e aos ficheiros informáticos –, ontem mesmo os serviços jurídicos do Instituto Superior Técnico requereram à juíza Telma Nogueira o “desentranhamento” (retirada e devolução) do original do documento que fora obrigado a enviar em envelope lacrado.
Última página do relatório nº 52 enviado ontem pelo Instituto Superior Técnico. O conteúdo será similar ao documento enviado à juíza? Existiria em Julho de 2022?
O envio desse original ao Tribunal teve como objectivo saber se o polémico relatório rápido número 52 era ou não um “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”. Se fosse assim considerado pela juíza, então não seria um documento administrativo e o Instituto Superior Técnico estaria livre de continuar a esconder esse documento ao PÁGINA UM e ao público.
A solicitação, feita de forma inaudita e tão lesta, para a retirada do suposto relatório original – a única pessoa fora da instituição universitária que, até agora, o viu e analisou foi a juíza Telma Nogueira –, alimenta e sustenta fortes e legítimas suspeitas de o dito original não ser semelhante ao relatório ontem enviado ao PÁGINA UM.
Se houver deferimento da juíza, algo ao qual o PÁGINA UM já se opôs por requerimento, o Instituto Superior Técnico conseguiria, para todo o sempre, apagar a “prova do crime”.
Este caso absurdo, aliás, mostra-se ainda mais suspeito, porquanto, apesar do relatório enviado ser de qualidade paupérrima – por não justificar cientificamente qualquer número e conter afirmações pueris do género “Neste momento ter excesso de confiança é o risco que Portugal corre (…)” –, pela sua estrutura nunca poderia ser considerado um “esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”. Quando muito apenas um mau relatório.
Aliás, durante o processo de intimação, a defesa do Instituto Superior Técnico acabou até por defender que as suas conclusões, que permitiu serem divulgadas com grande destaque pela imprensa em finais de Julho passado, ” “não se vislumbra[va] também qual a utilidade que um documento incompleto, ou seja, por concluir, possa ter para o requerente [PÁGINA UM], pois tratando-se de um ensaio de projeção/ estimativa, ” pode não conter informações exatas e precisas, para que o requerente como jornalista possa depois difundir, podendo até sugestionar interpretações contrárias à verdadeira pretensão.”
Ao longo dos últimos seis meses, a instituição universitária tudo fez para não ser obrigada a divulgar o documento ao PÁGINA UM, o que incluiu até a sugestão de ser ouvida uma testemunha, algo que a juíza considerou não ser necessário.
A instituição liderada actualmente por Rogério Colaço, integrada na Universidade (pública) de Lisboa esteve intensamente envolvida em actividades de investigação e de parcerias empresariais durante a pandemia, contando com pelo menos 14 projectos em áreas tão distintas como a produção de viseiras, desinfectantes e zaragatoas até um jogo de computador para boas práticas sociais relacionado com a covid-19, passando por modelos de simulação e previsão e até por sistemas de detecção do SARS-CoV-2 através da fala.
Henrique Oliveira, Rogério Colaço, Miguel Guimarães e Filipe Froes, na sede da Ordem dos Médicos, em Julho do ano passado, aquando da apresentação do plano de acompanhamento da pandemia. O Instituto Superior Técnico diz que não houve um acordo escrito desta parceria, mas foram elaborados 52 relatórios, sem que nunca se tenha visto ainda os ficheiros de dados
Além destes projectos, não se conhecem ligações directas dos investigadores do Instituto Superior Técnico a farmacêuticas, mas no famigerado relatório número 52 tecem-se considerações muito elogiosas às “vacinas de nova geração”, mesmo se o foco do estudo não mede indicadores de eficiência das antigas e novas versões. Por exemplo, na página 11 do relatório 52 diz-se, sem se vislumbrar qualquer base científica que “se a hipótese da perda de imunidade se verifica, estas vagas [de infecções] vão-se suceder de forma periódica ao longo dos anos”, concluindo que “a única forma de quebrar estes ciclos será com vacinas de nova geração”.
Recorde-se que o processo de intimação do PÁGINA UM veio no decurso de uma tentativa informal, em finais de Julho, para que a equipa do Instituto Superior Técnico, supervisionada pelo próprio presidente Rogério Colaço, disponibilizasse o relatório, os dados e a metodologia de um relatório divulgado em exclusivo pela Lusa – e que “viralizaria” pela imprensa mainstream, que nunca o viu. O suposto relatório responsabilizava o levantamento das restrições por 790 mortes atribuídas à covid-19, das quais 330 devidas às festividades de Junho.
Essa conclusão (supostamente científica de uma prestigiada instituição universitária pública) contrastava, porém, com a realidade: ao longo daquele mês até se observara uma redução dos casos positivos e da mortalidade por essa doença, mesmo a despeito dos grandes ajuntamentos de eventos como as festas de Santo António de Lisboa e do São João do Porto e também de alguns festivais de música.
Investigadores do Instituto Superior Técnico responsabilizaram festividades de Junho pela morte de 330 pessoas e culparam o levantamento das restrições por 790 óbitos. Números constam do relatório ontem enviado ao PÁGINA UM, mas surgem “caídos do céu”.
Na verdade, tendo havido uma descida de casos – ao contrário de uma previsão anterior dos investigadores do Instituto Superior Técnico, que apontavam para valores mais elevados –, mostrava-se impossível individualizar um efeito negativo das festividades. E muito menos apontar a responsabilidades directas por mortes, quantificando-as mesmo.
Apesar de o PÁGINA UM ter como prática a máxima transparência dos documentos recebidos, no caso do relatório enviado ontem pelo Instituto Superior Técnico aguardaremos esclarecimentos do Tribunal Administrativo de Lisboa, estando ainda em análise outro tipo de medidas.
N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. O PÁGINA UM considera que os processos, quer sejam favoráveis quer desfavoráveis, servem de barómetro à Democracia (e à transparência da Administração Pública) e ao cabal acesso à informação pelos cidadãos, em geral, e pelos jornalistas em particular, atendíveis os direitos expressamente consagrados na Constituição e na Lei da Imprensa.
Há uma semana, o PÁGINA UM denunciava o atraso de Portugal na divulgação das causas de morte por idade no site do Eurostat, e menos de uma semana depois surgiram. Coincidências à parte, conseguiu-se finalmente saber o impacte do primeiro ano da pandemia e sobretudo revelar a fraca relevância da covid-19 na população jovem, que acabou vacinada ao longo de 2021 e 2022. Sem necessidade, na verdade: a mortalidade por covid-19 nos menores de 25 anos não teve qualquer expressão estatística (cinco mortes em 2020), muito abaixo do impacte das pneumonias e praticamente ao nível da gripe. Os dados também permitem saber finalmente o número exacto para fins estatísticos das mortes atribuídas à covid-19 em Portugal no primeiro ano da pandemia (2020): segundo os valores enviados ao Eurostat, morreram 7.009 pessoas com confirmação laboratorial, a que acresceram mais 116 sob suspeita (sem confirmação laboratorial). A Direcção-Geral de Saúde apontava para 6.972 mortes em 31 de Dezembro de 2020.
Apesar das pneumonias virais e bacterianas serem doenças raras e felizmente pouco letais nas populações jovens, o seu impacte neste grupo etário diminuiu em 2020 – no primeiro ano da pandemia causada pelo SARS-CoV-2 –, mas mesmo assim o número de óbitos foi quatro vezes superior à da covid-19. Noutra perspectiva, a relevância da covid-19 em termos de saúde pública para este grupo etário foi claramente empolada antes e durante a fase de vacinação.
Esta é uma das principais conclusões da análise do PÁGINA UM feita à base de dados do Eurostat referente à mortalidade entre 2012 e 2020, incidindo sobre os óbitos no grupo etário dos menores de 25 anos. Ainda não existe qualquer informação para 2022, e os dados de 2021 ainda não estão disponibilizados para a esmagadora maioria dos países da União Europeia. Mesmo para o ano de 2020 a Itália e a Bélgica ainda não os disponibilizaram, pelo que esta análise excluiu estes países. Curiosamente, só esta semana surgiram os dados de Portugal, por coincidência poucos dias depois de o PÁGINA UM ter denunciado o atraso do Governo português.
Sabe-se agora, finalmente, os números totais das mortes atribuídas à covid-19 no nosso país em 2020: para todas as idades, houve 7.125 óbitos, embora 116 sem confirmação laboratorial. As pneumonias foram responsáveis por 4.375 mortes, observando-se uma descida acentuada face aos anos anteriores. Por exemplo, em 2012 (sem covid-19), as pneumonias tinham sido responsáveis por 6.795 mortes em todas as idades. Mesmo com a baixa actividade do vírus influenza, os registo portugueses apontam para 133 óbitos, quando em 2019 se tinham contabilizado 334.
No caso do grupo das crianças, adolescentes e adultos jovens, os dados confirmam, contudo, que a covid-19 teve um impacte nulo do ponto de vista do risco de vida. De acordo com a base de dados do Eurostat – que, ao contrário da informação disponível pelo Instituto Nacional de Estatística, desagrega em detalhe as causas de morte pela codificação da Organização Mundial da Saúde –, a covid-19 terá causado no ano de 2020 a morte de 176 jovens com menos de 25 anos da União Europeia (não incluindo ainda Bélgica e Itália), representando somente 0,6% do total dos óbitos deste grupo etário (29.585).
As pneumonias, por sua vez, resultaram em 680 desfechos fatais neste grupo etário (2,3% do total), enquanto a gripe – mesmo com o seu quase desaparecimento – surge como causa de 84 mortes (0,3% do total).
Mortalidade por pneumonias, gripe e covid-19 entre 2012 e 2020 nos jovens com menos de 25 anos na União Europeia (excluindo Bélgica e Itália). Fonte: Eurostat. Análise: PÁGINA UM.
Em parte pelas medidas não-farmacológicas – que afectaram significativamente o normal desenvolvimento dos mais novos, tanto a nível escolar como de convívio social –, a letalidade das pneumonias até registaram uma redução significativa. No quinquénio anterior ao início da pandemia (2015-2019), as pneumonias provocaram, em média, 864 óbitos por ano nestes países europeus, o que significa que em 2020 se contabilizou uma queda de 21,3% (menos 184 óbitos). Comparando com os piores anos da última década, a redução das mortes de jovens por pneumonias ainda é maior. Por exemplo, em 2012 faleceram 1.175 jovens destes países europeus por pneumonias – o que confronta com as 176 mortes por covid-19 e as 680 mortes por pneumonias em todo o ano de 2020.
Aliás, para uma comparação mais efectiva e correcta do impacte da pandemia nos mais jovens, se se somar as mortes por covid-19, gripe e pneumonias – o denominado PIC (pneumonia, influenza e covid), que chegou a ser usado nos Estados Unidos para medir o impacte da pandemia – observa-se que, face a 2020, houve anos muito piores. Com efeito, para o grupo dos menores de 25 anos, segundo os dados do Eurostat, a mortalidade por PIC nos menores de 24 anos foi de 940 óbitos, ligeiramente superior ao ano anterior, mas sendo o terceiro menos mortífero desde 2012. Portanto, antes da existência da vacina contra a covid, esta situação configura um contexto claramente muito desfasada do alarme social junto de muitos pais e de jovens adultos.
Este cenário da mortalidade por PIC foi, porém, bastante distinto nos diferentes países, mas não necessariamente por causa da covid-19, antes sim pelo paradoxal aumento das mortes por pneumonias não-covid-19 e pela gripe. Neste grupo de países em contra-ciclo destacam-se a França, Espanha e até Portugal.
Com efeito, no nosso país, embora a covid-19 tenha apenas causado em 2020 a morte de cinco menores de 25 anos (dos quais dois com menos de um ano, que nasceram com comorbilidades), as pneumonias provocaram 13 e a gripe mais quatro.
As quatro mortes em 2020 por gripe em Portugal de menores de 25 anos acabam mesmo por ser surpreendentes, porque a actividade do vírus influenza foi muito fraca nesse ano, por via da sua “substituição” pelo SARS-CoV-2. Com efeito, entre 2012 e 2019 apenas em três anos houvera mortes neste grupo etário causadas pelo vírus influenza: em 2016 (cinco óbitos), 2018 (também quatro óbitos) e 2019 (um óbito). Contudo, 2016 e 2018 ficaram marcados por uma forte actividade gripal.
No caso das pneumonias, os 13 óbitos também foram um número relativamente elevado, apenas ultrapassado, desde 2012, pelas 15 mortes em 2016.
Mortalidade por pneumonias, gripe e covid-19 entre 2012 e 2020 nos jovens com menos de 25 anos em Portugal. Fonte: Eurostat. Análise: PÁGINA UM.
Numa outra (breve) análise do PÁGINA UM, verificou-se também que a covid-19 – face à mortalidade de 2020 e dos anos anteriores com maior mortalidade por infecções respiratórias de cariz sazonal (pneumonias e gripes) – somente começou a ser uma doença de contornos mais preocupantes no primeiro ano da pandemia a partir dos 40 anos.
Além de somente a partir dos 40 anos de idade a covid-19 ter começado no ano de 2020 a matar mais – e, portanto, a ser mais perigosa do que as pneumonias –, se considerarmos as PIC no ano de 2016 (sem covid-19 e “apenas” com gripe e pneumonias) registou exactamente o mesmo número de mortes do primeiro ano da famigerada pandemia.
São sobretudo malformações congénitas que afectam o sistema neurológico, cardíaco e pulmonar, mas há também já fortes suspeitas de os efeitos adversos das vacinas para recém-nascidos provierem do leite de mães vacinadas. A análise exclusiva do PÁGINA UM, que revela todos os registos individuais (anonimizados) das 37 mortes (e centenas de sequelas) notificadas na base de dados da Agência Europeia do Medicamento (EMA), levanta o véu sobre um assunto que ninguém quer falar nem debater: quais os custos em vidas inocentes de uma vacinação maciça mesmo de pessoas saudáveis? Apesar de toda a pressão que houve para se vacinarem grávidas mesmo saudáveis, uma meta-análise publicada no ano passado mostrava que a taxa de letalidade nas grávidas não era estatisticamente superior à das não grávidas.
A última comunicação à Agência Europeia do Medicamento tem pouco mais de uma semana – e é já a sexta do género este ano. Apesar dos dados disponíveis serem muito vagos, a farmacêutica Moderna fez uma notificação assumindo que a sua vacina contra a covid-19 seria fortemente suspeita responsável pela morte súbita de uma bebé com idade entre os dois meses e os 2 anos. Não é indicada a nacionalidade da criança.
A vacina, obviamente, fora tomada pela mãe durante a gestação, mas neste caso em concreto nem sequer existe referência se os efeitos adversos vieram durante a gestação, uma vez que a amamentação será também uma forma de transmissão.
Se uma morte súbita ainda se reveste de uma aura de mistério – em todo o caso, sendo a notificação sido feita pela própria farmacêutica –, certo será que a descrição das mortes de recém-nascidos (e fetos) “descobertas” pelo PÁGINA UM numa pesquisa detalhada à complexa base de dados da Eudravigilance mostram um cenário preocupante.
Com efeito, mesmo sabendo que por ano nascem cerca de 4 milhões de crianças na União Europeia – embora se desconheça, em dois anos, quantas gestantes tomaram a vacina contra a covid-19 –, na base de dados da EudraVigilance surgem já reportadas 37 mortes atribuídas às diferentes marcas, sendo que 11 se notificaram em 2021, outras 20 no ano passado. As restantes seis foram indicadas já este ano até ao dia 23, data da última consulta do PÁGINA UM. Todas estas mortes foram notificadas por profissionais de saúde e validadas pelos reguladores nacionais e/ ou pela EMA.
A maioria dos casos (23 mortes) têm as vacinas da Pfizer como “suspeitas”, havendo ainda sete associadas à vacina da Moderna, uma a ambas, cinco à vacina da Janssen e uma à AstraZeneca. Convém, contudo, salientar que com estes valores absolutos não se pode aferir o perfil de segurança das vacinas de cada farmacêutica, sendo para tal necessário conhecer o número de grávidas que tomaram as vacinas de cada uma das farmacêuticas.
Registo de uma das seis notificações de morte de recém-nascidos por suspeita de efeitos adversos da vacina tomada pela mãe durante a gravidez. Fonte: EudraVigilance.
Em todo o caso, na mais recente actualização de segurança das vacinas, a EMA informa que, para todos os grupos populacionais, já foram administradas no Espaço Económico Europeu (que inclui países da União Europeia, Noruega, Islândia e Liechtenstein) 685 milhões de doses das vacinas da Pfizer, liderando com larga distância da segunda farmacêutica, a Moderna, que conta com 161 milhões de doses.
A AstraZeneca já viu serem injectadas 68,8 milhões de doses e a Janssen apenas 18,6 milhões de doses. As vacinas de outras farmacêuticas, nunca usadas em Portugal, têm uma fraca expressão mesmo em contexto europeu.
Nessa linha, se a vacinação de grávidas tiver sido proporcional, o perfil de segurança da Janssen será desastrosa em comparação com o da Pfizer, e o desta pode ser melhor do que a Moderna.
Apesar das garantias prévias das instituições europeias e das farmacêuticas sobre a segurança das vacinas contra a covid-19 nas grávidas, nunca até agora foram apresentados relatórios detalhados sobre os seus efeitos dos adversos nos fetos e mesmo sobre eventuais problemas na fase da amamentação.
A EMA prometeu, ainda em Julho de 2020, a realização de um projecto, denominado CONSIGN, para colectar dados sobre o impacto da covid-19 na gravidez, a fim de orientar a tomada de decisões sobre indicações de vacinas, políticas de vacinação e opções de tratamento em gestantes. Porém, mesmo envolvendo universidades de oito países, os resultados têm sido aparentemente omissos quanto aos impactes da vacinação no desenvolvimento dos fetos e durante a amamentação.
Embora fosse necessária informação clínica mais detalhada, com base nos registos das notificações – uma parte das quais, como sucede nas mortes das 125 mortes de crianças que o PÁGINA UM revelou na sexta-feira passada – observa-se pelo menos seis mortes fetais, mas os óbitos no período neonatal são os mais abundantes. Nem sempre surge indicada a causa de morte, mas em muitos mostram-se evidentes as gravíssimas malformações congénitas, sobretudo cardíacas, vasculares e mesmo cerebrais, algumas que impressionam.
Por exemplo, em 23 de Novembro do ano passado foi feita uma notificação por forte suspeita da vacina da Pfizer ter causado hidranencefalia num bebé do sexo masculino: basicamente nascem sem cérebro. Sete meses antes, uma notificação indicava que a vacina da Moderna seria a única suspeita de ter causado agenesia de corpo caloso num bebé do sexo feminino. E foram também reportados três casos de hidrocefalia, dois dos quais após hemorragia cerebral.
Contudo, são as malformações ou problemas cardíacos que se mostram mais frequentes, chegando mesmo a ser indicada a vacina da Pfizer – e não uma infecção por SARS-CoV-2 – a causar a morte de um bebé do sexo masculino pela famosa síndrome inflamatória multisistémica em crianças (MIS-C).
Saliente-se, contudo, que estes são apenas os casos fatais. De acordo com a análise do PÁGINA UM, só a versão original da vacina da Pfizer (Tozinameran) tem notificadas, além das 24 mortes, mais 108 casos considerados graves, grande parte dos quais conhecidos no ano passado. No caso da Moderna, a sua primeira versão (Elasomeran) conta com 38 casos sérios, incluindo as sete mortes. Em grande parte destes casos, são malformações ou afecções congénitas que limitarão ou encurtarão a vida destes recém-nascidos.
Curiosamente, em Portugal, a Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 – um organismo que supostamente nunca fez actas porque tinha pressa em salvar vidas – conseguiu elaborar um parecer (o único) sobre administração de vacinas em grávidas sem qualquer menção à base de dados da EudraVigilance sobre efeitos adversos em fetos e recém-nascidos. Esse parecer de 4 de Fevereiro do ano passado, nunca mais actualizado – e que teve a votação favorável de todos os membros –, tem apenas uma página, sendo acompanhado por um parecer técnico de três obstetras.
Nesse parecer técnico, as três médicas destacam, além da referência a uma plataforma electrónica do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), dois estudos sobre a incidência de malformações congénitas, mas ambos têm um grave problema de base: o primeiro apenas abrange 140 grávidas vacinadas e o outro 10.064 grávidas vacinadas. Ou seja, número abaixo do limiar de detecção de efeitos adversos graves, excepto se forem muitíssimo frequentes.
Destaque-se que, em Junho de 2022, um artigo científico de revisão e meta-análise publicado na revista American Journal of Emergency Medicine concluiu que, apesar de existir um aumento do risco de internamento em unidades de cuidados intensivos e de ventilação em caso de infecção por covid-19, a taxa de mortalidade nas grávidas não era estatisticamente maior em comparação com as não-grávidas.
REGISTOS INDIVIDUAIS (ANONIMIZADOS) DAS MORTES NOS PAÍSES DO ESPAÇO ECONÓMICO EUROPEU POR SUSPEITA DE EFEITOS ADVERSOS DAS VACINAS CONTRA A COVID-19 EM RECÉM NASCIDOS E BEBÉS
Medicação associada: Sim (loratadina, para tratamento de alergias, e crisaborol, para tratamento de dermatite atópica, não considerados suspeitos). Deduz-se que a mãe terá tomado duas doses de vacina
A Direcção-Geral da Saúde não recomenda nem desaconselha, e perante esta repentina atitude de lavagem de mãos à Pilatos – após quase dois anos de incentivo e coerção –, a procura de doses de reforço da vacina contra a covid-19 caiu para níveis irrelevantes. Desde dia 13 deste mês, a modalidade Casa Aberta ficou disponível para os adultos entre os 18 e os 49 anos, mas num universo de 4 milhões de pessoas, nos primeiros 10 dias somente cerca de 5.000 se apressaram a tomar o booster. Com a fraca procura, mais de cinco milhões de doses arriscam perder a validade, juntando-se assim às três milhões de doses já destruídas. Um gasto inglório de mais de 120 milhões de euros de dinheiros públicos, que entraram nos cofres das farmacêuticas.
Apenas cerca de cinco mil portugueses entre os 18 e os 50 anos terão aderido à modalidade Casa Aberta para a toma da dose de reforço sazonal da vacina contra a covid-19, desde o dia 13 de Janeiro. Numa população que engloba 4,1 milhões de pessoas, estes números confirmam um massivo desinteresse dos adultos em idade activa, num período em que aumentam as desconfianças sobre os efeitos adversos das vacinas perante o secretismo das autoridades dos diversos Governos, incluindo o português, em explicar o inopinado excesso de mortalidade total.
Embora não sejam disponibilizados números exactos por grupo etário, mas apenas gráficos de barra, o último relatório da Resposta Sazonal em Saúde, publicado anteontem pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), mostra que no período entre 16 e 23 de Janeiro (semana 3 de 2023) foram apenas vacinadas 20.244 pessoas (uma média de apenas 2.892 por dia em todo o país). Destas, somente 25% têm idades entre os 18 e os 50 anos. A estes terão de acrescentar as cerca de 100 mil pessoas com menos de 50 anos (incluindo menores de idade) com comorbilidades de risco que foram vacinados com dose de reforço entre Setembro e Novembro do ano passado.
Na primeira quinzena de Janeiro, a procura também já fora pequena: 21.006 e 19.531 doses, respectivamente, nas semanas 1 e 2 deste ano. Nos dias da semana 2 em que já poderiam vacinar-se adultos sem comorbilidades graves até aos 49 anos, a adesão terá sido residual, porque este grande grupo etário (cerca de 40% da população nacional) nem surge com representatividade no gráfico apresentado no segundo relatório de 2023 da DGS.
A fraquíssima adesão dos menores de 50 anos já seria expectável, mas não de uma forma tão marcante, face à forte quebra na procura pela dose de reforço sazonal registada no grupo dos 50 aos 59 anos, cuja campanha de vacinação (neste caso recomendada pela DGS) começou em 10 de Novembro do ano passado.
Apesar da DGS indicar que toda a população com mais de 18 anos tinha completado o esquema vacinal inicial – duas doses, ou uma no caso da Janssen, ao longo de 2021 e início de 2022 –, para o reforço dito sazonal apenas 43% do grupo etário entre os 50 e 59 anos responderam até agora favoravelmente à “chamada”. Mesmo no grupo dos 60 aos 69 anos se observa um grau de renitência significativo: mais de um terço das pessoas (36%) não quis dose de reforço sazonal. Nas faixas etárias mais avançadas mostra-se evidente que se esgotou o interesse: no grupo dos 70 aos 79 anos, no último mês, a percentagem de vacinados apenas subiu de 77% para 78%, enquanto nos maiores de 80 anos aumentou somente dos 81% para 82%.
Até anteontem, de acordo com dados oficiais, 177 pessoas morreram este mês por covid-19, uma média um pouco superior a seis por dia. Antes da pandemia, no período de 2014 a 2019, a média diária de mortes no mês de Janeiro causadas por pneumonias e gripe, segundo dados da Plataforma da Mortalidade, situava-se em 25, ou seja, quase quatro vezes superior aos valores actuais da doença provocada pelo SARS-CoV-2.
A fraca procura da vacina contra a covid-19 colocará, por outro lado, uma questão bastante relevante. O Estado português já terá comprado cerca de 45 milhões de vacinas, e em Outubro passado o Ministério da Saúde revelou ao PÁGINA UM que tinham sido doadas 7,8 milhões de doses, sobretudo aos PALOP, e revendidas 2,6 milhões de doses. Tendo em conta que foram já administradas cerca de 26,5 milhões de doses desde finais de 2021 e outras 3 milhões foram entretanto inutilizadas, haverá mais 5 milhões de doses que podem estar em risco de serem inutilizadas por falta de uso. Significa assim que até 8 milhões de doses compradas às farmacêuticas, num valor que se estima superior a 120 milhões de euros, podem ter sido desperdiçadas, ou melhor dizendo, entrado nos cofres das farmacêuticas sem qualquer utilidade.
Recorde-se que o PÁGINA UM entrou com uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa no último dia do ano passado para obrigar o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, a disponibilizar a “consulta presencial e obtenção de cópia, em qualquer formato disponível, de todos os contratos integrais (incluindo anexos e cadernos de encargos) assinados entre a Direcção-Geral da Saúde (ou outras entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde) e as farmacêuticas que comercializam vacinas contra a covid-19, desde 2020 até à data, incluindo documentos de entrega (guias de transporte), bem como toda a documentação (troca de correspondência) entre as entidades adjudicantes e adjudicatárias ao longo desde período.”
Manuel Pizarro, ministro da Saúde, recusa mostrar contratos das vacinas contra a covid-19. Direcção-Geral da Saúde diz estar a fazer auditoria às compras e gestão, mas não adianta os motivos nem mostra qualquer comprovativo da veracidade dessa diligência.
Apesar da obrigatoriedade legal de colocar todos os contratos públicos no Portal Base, o Governo, através da DGS – que terá sido a única entidade pública a efectuar as aquisições –, está intencionalmente a omitir a inclusão de qualquer contrato relacionado com as vacinas contra a covid-19 desde Março de 2021. Ignoram-se assim, de forma inequívoca, quantos lotes foram adquiridos a cada farmacêutica, os preços unitários e as condições de venda, incluindo as relacionadas com responsabilização.
A DGS veio dizer, entretanto, estar a realizar uma auditoria à compra e gestão das vacinas contra a covid-19, apresentando esse facto como um dos motivos para recusar o acesso aos contratos com as farmacêuticas, não tendo apresentado, contudo, qualquer documento comprovativo dessa diligência, nem justificado os motivos. A veracidade dessa informação será, certamente, verificada pelo Tribunal Administrativo de Lisboa, onde decorre o processo de intimação.
O PÁGINA UM começou a analisar, em detalhe a base de dados da Agência Europeia do Medicamento, enquanto aguarda que o Tribunal Administrativo obrigue (ou não) o Infarmed a revelar as notificações dos efeitos adversos em Portugal das vacinas contra a covid-19. No registos individuais dos casos mais graves na Europa – e que resultaram em mortes de crianças e jovens–, e que o PÁGINA UM apresenta em exclusivo, não se pretende satisfazer qualquer curiosidade mórbida. A perturbação que pode a leitura causar deve sim obrigar a uma questão imediata: eram precisas estas vítimas, em concreto, como danos colaterais, numa doença que, para os menores de 20 anos, causa três mortes em cada 1.000.000 de infecções? E isto englobando aqueles com comorbilidades graves, porque no caso das vítimas dos efeitos adversos das vacinas a esmagadora maioria era saudável, o que lhes daria, com uma certeza estatisticamente absoluta, capacidade de sobreviverem a uma infecção causada peloSARS-CoV-2.
A Agência Europeia do Medicamento (EMA) já recebeu e validou um total de 125 mortes de crianças e adolescentes em que existem fortíssimas suspeitas de associação directa à vacina Tozinameran, produzida pela Pfizer-BioNTech, comercializada sob a marca Comirnaty. Este número surge numa análise detalhada – e ainda em curso – que o PÁGINA UM está a realizar à base de dados da EudraVigilance, que compila as notificações da própria indústria farmacêutica e dos reguladores dos diversos países, entre os quais o Infarmed.
Na mais recente actualização da informação de segurança, em 8 de Dezembro do ano passado, a EMA refere já terem sido administradas cerca de 57,3 milhões de doses em crianças e adolescentes (abaixo dos 18 anos) – o que indicia aproximadamente 30 milhões de vacinados nestes grupos etários –, mas nem uma palavra nem um número sobre mortes e efeitos adversos graves.
Esta vacina da Pfizer foi a única com permissão de uso em Portugal. Além desta, na Europa foram ainda administradas, segundo a EMA, cerca de 3,1 milhões de doses da Spikevax, a vacina da Moderna, em crianças e adolescentes. O PÁGINA UM ainda não analisou os efeitos adversos da Spikevax nestes grupos etários.
Apenas uma consulta detalhada à base de dados da EudraVigilance – pouco intuitiva e a necessitar de uma posterior análise de dados –, permite a obtenção dos registos individuais (anonimizados e sem identificação do país) e um apuramento rigoroso dos efeitos adversos das vacinas contra a covid-19.
Além das 125 mortes, encontram-se notificadas, apenas para esta vacina da Pfizer e somente no ano passado, mais de 11.500 reacções adversas consideradas graves, das quais cerca de nove mil na faixa etária dos 12 aos 17 anos. Conhecer quantos casos resultaram em hospitalização e as sequelas mostra-se uma tarefa de muito difícil execução, até por falta de informação contida nos registos individuais disponibilizados. Por outro lado, a base de dados da EMA encontra-se estruturada de forma que dificulta análises mais finas.
Saliente-se, contudo, que a totalidade das notificações de mortes que constam na EudraVigilance foram feitas por profissionais de saúde, o que reforça a forte suspeita de ser mesmo a vacina o “promotor” exclusivo do desfecho fatal. Até porque na notificação tem sempre de constar o medicamento suspeito.
Aliás, curiosamente, 97 das 125 notificações de mortes de crianças e jovens foram mesmo indicadas pela Pfizer, que não respondeu a um pedido de informações e esclarecimento do PÁGINA UM. A razão parece simples: como as vacinas contra a covid-19 tiveram um estatuto especial de emergência, concedida pelas instituições internacionais, desonerando as farmacêuticas de responsabilidades, a Pfizer (e outra qualquer das empresas que as comercializam) só terão eventuais problemas futuros se esconderem intencionalmente alguma informação relevante. Em todo o caso, a farmacêutica norte-americana jamais indicaria estas 97 mortes de crianças e jovens se não tivesse um elevado grau de certeza de terem sido provocadas pela sua vacina.
Mas daí a ter uma atitude activa de prudência e de relato público sobre os reais eventos adversos, sobretudo em grupos sem vulnerabilidades (como são as crianças e os jovens saudáveis), vai uma grande distância. A Pfizer jamais falou em mortes de jovens e crianças, apresentando a sua vacina como segura e até necessária numa análise custo-benefício. E as autoridades políticas e de saúde assinaram por baixo.
Na verdade, causa sim estranheza o reduzido número de casos letais notificados pelos reguladores dos diversos países, tendo em conta que são as autoridades de saúde institucionais que têm maior capacidade técnica (e até legal) para aprofundar diagnósticos e exames de medicina legal para apurar a efectiva causa da morte e confirmar, sem margem para dúvidas, a associação com as vacinas. Contudo, não menos se mostra evidente que as autoridades de saúde, ligadas aos Governos, não estarão muito interessadas politicamente em provar (com evidências científicas) qualquer tipo de relação entre as vacinas contra a covid-19 e a morte de crianças e adolescentes, sobretudo porque foram montadas fortes campanhas de persuasão (ou até de pressão) para os pais vacinarem os filhos.
Certo é que a informação disponibilizada no seu portal pela EMA para cada caso mortal contém incompreensivelmente poucos detalhes clínicos de relevo – ignora-se, por exemplo, o período entre a administração da vacina e a morte –, se a informação sobre hospitalizações (ou não) é correcta, nem se mostra evidente que tenha havido autópsias e diagnósticos post mortem.
Porém, torna-se evidente nesta análise à informação oficial disponível, que na esmagadora maioria dos casos se está perante desfechos trágicos em jovens saudáveis, uma vez que, por norma, não se encontram outros medicamentos sob suspeita. Com efeito, de entre as 125 mortes registadas na vacina da Pfizer, apenas em 16 casos houve outros medicamentos envolvidos, se bem que em algumas situações se depreenda que, quando referidos, foram usados aquando de hospitalizações.
No total, a maioria das mortes são de rapazes: 67 contra 58 raparigas. E o grupo mais representativo – e também maior por ter sido mais vacinado – é o dos adolescentes entre os 12 e 17 anos, com 93 óbitos. Sendo certo que numa parte destes trágicos eventos apenas são destacados sintomas gerais – como febre, fraqueza, vómitos e diarreia –, que nem sequer permitem aferir qual o “impacte” da vacina, noutras situações os eventos clínicos identificados remetem para afecções específicas que têm sido alvo de preocupação. Nestas estão os problemas cardíacos, e especialmente as miocardites.
De facto, numa análise global aos efeitos adversos da Comirnaty ao longo do ano passado, da Pfizer salienta-se a detecção de 1.028 miocardites como casos graves. Das 13 que contribuíram para a morte, de acordo com os resgistos consultados pelo PÁGINA UM, 10 observaram-se em rapazes e três em raparigas, o que vem confirmar as indicações de vários estudos sobre esta matéria.
Mas existem ainda outros dados perturbantes – e que deveriam levar a uma reflexão sobre questões éticas, entre as quais a de poder causar efeitos adversos, mesmo que numa probabilidade mínima, para uma pessoa que não está vulnerável a uma doença.
De facto, em todos casos que abaixo se descrevem – e até mais nuns que noutros – é desconcertante imaginar a evolução do estado de saúde daquelas crianças e adolescentes que acabaram fulminadas. E algumas literalmente, como as oito que sofreram enfarte agudo do miocárdio ou as cinco em que se registou morte súbita.
E isto, assim tudo indica, por causa da administração de um fármaco que prometia salvá-las de uma doença que, para as suas idades, tinha uma taxa de letalidade de 0,0003% sem vacina – como confirma um recente estudo publicado este mês numa revista científica, e que tem como co-autor John Ioannidis, o maior reconhecido epidemiologista mundial.
REGISTOS INDIVIDUAIS (ANONIMIZADOS) DAS MORTES NOS PAÍSES DO ESPAÇO ECONÓMICO EUROPEU POR SUSPEITA DE EFEITOS ADVERSOS DA VACINA DA PFIZER-BIONTECH (COMIRNATY – TOZINAMERAN)
Evento após vacinação: Fadiga, distúrbios sensoriais, dispneia, dores e síndrome do desconforto respiratório agudo. Indicação de erro de vacinação (Vaccination error)
Evento após vacinação: Complexo quadro de complicações que incluíram pancreatite aguda, insuficiência cardíaca, pneumonia, sepsis, derrame pleural, infecção urinária, paralisia do intestino e síndrome da disfunção de múltiplos órgãos
Evento após vacinação: Apenas referência abstracta a evento adverso (Adverse event following immunisation). Indicação de administração da Comirnaty (Tozinameran) e da Spikevax (Elasomeran)
Evento após vacinação: Apenas referência abstracta a evento adverso (Adverse event following immunisation). Indicação de administração da Comirnaty (Tozinameran) e da Spikevax (Elasomeran)
Evento após vacinação: Vómitos, insuficiência respiratória, tosse, mal-estar, diarreia e encefalite. Indicação de a encefalite ter sucedido após vacinação (Encephalitis following immunisation procedures)
Evento após vacinação: Não é explícita a causa de morte, havendo referência a um aumento de d-dímeros (associado a coagulação), intercambialidade de produtos vacinais, covid-19, uso off label (off label use) e ineficácia de fármacos (drug ineffective) Indicação de administração da Comirnaty (Tozinameran) e de uma vacina inactivada não identificada
Evento após vacinação: Complexo quadro clínico, que inclui insuficiência renal, taquicardia ventricular, miocardite, cardiopatia isquémica, paragem cardíaca, infecção por enterovírus e rinovírus e síndrome da disfunção de múltiplos órgãos. Indicação de problema na administração da vacina (Inappropriate schedule of vaccine administered)
Medicação associada: Sim (três medicamentos, deduz-se que no decurso de hospitalização)
Evento após vacinação: Ansiedade agravada, desordem psicótica, medo da morte e pensamentos anormais. Indicação de problema na administração da vacina (Inappropriate schedule of vaccine administered)
Evento após vacinação: Miocardite e insuficiência cardíaca. Indicação de problema na administração da vacina (Inappropriate schedule of vaccine administered)
Evento após vacinação: Desmaio e enfarte agudo do miocárdio. Indicação de problema na administração da vacina (Inappropriate schedule of vaccine administered)
Evento após vacinação: Complexo quadro clínico que incluiu braço inchado, edema na perna, dor de cabeça, perda de sensibilidade, pupilas dilatadas, cianose, pneumonia, enfarte agudo do miocárdio, bradicardia, ruptura de aneurisma hemorragia intracraniana
Evento após vacinação: Quadro clínico complexo, que inclui dores nas costas, dor no braço hipoxia, desmaio, tremores, sonolência, problemas sanguíneos, púrpura trombocitopénica trombótica e choque cardiogénico
Evento após vacinação: Dorsalgia, dor de cabeça, hipertensão, hemiparesia, sensação de queimadura, polineuropatia e experiência de quase-morte (Near death experience)
Evento após vacinação: Dor de cabeça, febre, dificuldade respiratória. Dor abdominal, vómito de sangue, aumento de batimento cardíaco e paragem cardíaca
Evento após vacinação: Apneia, epilepsia, herpes zoster, insuficiência renal, convulsões e morte súbita. Indicação de idade inadequada para vacinação (Inappropriate age at vaccine administration)
Evento após vacinação: Quadro clínico complexo, que incluiu distúrbios de motilidade intestinal, perimiocardite, septicémia pneumocócica, estado paranóico, ideação suicida e insuficiência cardíaca
Medicação associada: Sim (quatro medicamentos, dois dos quais também sob suspeita)
Evento após vacinação: Distúrbio do movimento rítmico (Head banging). Referência a evento adverso após vacinação (Adverse event following immunisation).
Evento após vacinação: Tosse, fadiga, dificuldades respiratórias e cianose. Referência a tempestade de citocina e a medicamento ineficaz (Drug inefective)
Portugal tem uma das plataformas mais potentes de vigilância epidemiológica a nível mundial – o Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) –, que permite em tempo real conhecer em detalhe as causas de morte e detectar rapidamente um problema de Saúde Pública para uma intervenção rápida. Mas depois tudo esbarra num crónico e irresponsável muro de obscurantismo e secretismo, apenas para salvar políticos da eventual exposição pública. Esconde-se para evitar conhecer problemas. E assim a culpa morre literalmente solteira. Daí que não surpreende que, apesar de tecnologicamente avançado nesta matéria, Portugal seja um dos três países da União Europeia que ainda nem sequer tem disponíveis no Eurostat os dados detalhados da mortalidade de 2020. E estamos em 2023.
Portugal, Itália e Bélgica são os únicos países da União Europeia ainda sem dados disponibilizados no Eurostat relativos às causas de morte em 2020, o primeiro ano da pandemia. O Mundo já está, segundo o método de calendarização mais usado, no ano de 2023. Esta base de dados específica do gabinete estatístico da União Europeia, que agrega também informação de outros países, permite conhecer com detalhe todas as causas de mortes, de acordo com as centenas de códigos (um por cada doença) da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde da Organização Mundial da Saúde (CDI).
Apesar de Portugal possuir desde 2014 um sistema pioneiro de vigilância de saúde pública em tempo real – o Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) –, os meses passam sem que se consiga ainda perceber qual o verdadeiro impacte da pandemia, tanto de mortes directas (ou suspeitas) de covid-19 como de todas as outras causas.
O Instituto Nacional de Estatística já divulgou no ano passado os dados relativos a 2020, mas com uma agregação confusa – e que não segue as normas da (CDI). Por exemplo, no caso da covid-19, o código da CDI usado para mortes directas é o U07.1 (ou seja, existem testes laboratoriais a confirmar a presença do vírus), enquanto o código U07.2 se utiliza quando ocorre uma mera suspeita. Os códigos da totalidade de doenças e afecções do aparelho respiratório são iniciadas pela letra J neste sistema de classificação.
Com o SICO, o Governo português, através de diversas instituições, tem acesso imediato à informação diária – em tempo real, até –, porque os médicos legistas, ao introduzirem os dados dos certificados de cada óbito, este segue de imediato para o Ministério Público (para eventual pedido de autópsia), para entidades dos Ministérios da Saúde, da Justiça, da Administração Interna e da Defesa para todos os procedimentos e assentamentos legais que uma morte determina.
Contudo, esta desburocratização esbarra depois, como se tem observado nos últimos anos, numa barreira de secretismo e obscurantismo do Governo e Administração Pública. A única informação revelada a partir do SICO é a quantificação do número de mortes, por grupo etário e localização. Sobre as causas específicas de morte – e, portanto, sobre os impactes da covid-19 e do colapso do Serviço Nacional de Saúde (SNS) –, embora essa informação seja acessível de imediato, tanto para todo o ano de 2020 como até para o dia de hoje, nada as autoridades governamentais querem que se saiba publicamente.
Portugal é um dos três países da União Europeia sem dados de mortalidade por todas as causas no Eurostat. Já há cinco países com informação relativa a 2021.
Recorde-se, aliás, que sobre o excesso de mortalidade que atravessa Portugal de forma ininterrupta desde 2020, o Ministério da Saúde já veio dizer que conclusões só lá para o fim deste ano, através de um suposto estudo do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.
O Ministério da Saúde também implementou há anos um intuitivo sistema de consulta de dados sobre causas de morte por mês, grupos etários e região, permitindo algum cruzamento de outras variáveis. Mas essa denominada Plataforma da Mortalidade foi entretanto retirada em 2021, sem qualquer explicação da Direcção-Geral da Saúde, e reapareceu agora, sem pompa, mas ainda apenas com 2019 como último ano disponível. Recorde-se que estamos no ano de 2023.
Mas voltando às estatísticas do Eurostat, o atraso de Portugal – e também da Itália e da Bélgica – ainda se mostra mais escandaloso por já haver cinco países da União Europeia com dados das causas de morte para 2021: República Checa, Lituânia, Holanda, Áustria e Polónia.
Quadro com as mortes atribuídas à covid-19 com confirmação laboratorial (U07.1). A base de dados do Eurostat permite pesquisa por qualquer doença letal por país e ano.
Os dados de conjunto já disponibilizados no Eurostat permitem começar a ter uma melhor percepção do impacte da pandemia do ponto de vista da saúde pública, detectando também alguma manipulação sobre os dados tornados públicos. Por exemplo, no caso específico do SARS-CoV-2, sem prejuízo de a covid-19 ter causado inequivocamente um acréscimo da mortalidade – e os dados estatísticos mostram sem margem para dúvidas –, houve países que parecem ter optado por alguma “criatividade” na hora da atribuição das causas de morte.
Por exemplo, no caso da Espanha, dos 74.839 óbitos atribuídas à covid-19, 14.481 (24%) não tiveram teste laboratorial a suportar essa causa de morte – e, por isso mesmo têm o código U07.2. Este problema também surge na França e na Holanda, em que 15,9% e 15,3% das mortes por covid-19 não tiveram confirmação laboratorial. Essa opção terá levado certamente a uma sobrestimação do peso da covid-19 nesses países.
Com efeito, de acordo com cálculos do PÁGINA UM aos dados do Eurostat referentes a 2020, a Espanha surge como o país da União Europeia a ter a covid-19 como o maior contribuidor para a mortalidade: 15,2% do total. Logo atrás surgem Eslovénia (14,4%), Liechtenstein (14,1%), Holanda (12,0%), Luxemburgo (10,7%), França (10,4%). No extremo oposto, surgem diversos países onde, em 2020, a covid-19 teve fraca expressão, incluindo a Noruega (que não é da União Europeia, mas integra o Eurostat) com apenas 1%, e diversos países da parte oriental da Europa.
Tecnologicamente, Portugal tem dos sistemas de vigilância epidemiológica mais modernos do Mundo. Mas, depois, tudo esbarra no secretismo e falta de transparência.
Também aqui os dados do Eurostat permitem revelar que houve alguns países, sobretudo no Leste da Europa, que tentaram ao longo de 2020 dar uma ideia de estarem a controlar a pandemia. E como? Manipulando a informação sobre a causa de morte. De facto, uma das consequências mais faladas da pandemia foi o “desaparecimento” da gripe e, em consequência, das pneumonias e doenças afins do aparelho respiratório.
Na generalidade dos países onde a covid-19 registou uma elevada letalidade, as doenças respiratórias como causa de morte desceram consideravelmente. Por exemplo, na Espanha – que, como se referiu contabilizou 74.839 óbitos por covid-19 (confirmada e suspeita) teve menos 7.906 mortes por doenças do aparelho respiratório (código J) face à média do quinquénio anterior. A Alemanha e Holanda tiveram menos 6.650 e 2.367 óbitos, respectivamente. neste grupo de doenças, que assim devem ser deduzidas às 39.886 e 20.212 mortes, respectivamente, atribuídas à covid-19.
Contudo, noutros países, sobretudo do Leste da Europa, estranhamente as doenças respiratórias não-covid tiveram um aumento em 2020, como foram os casos da Bulgária (mais 35,6% face á média do quinquénio anterior), da Roménia (mais 34,1%) e Eslováquia (mais 18,2%). Ou seja, neste caso, é muito provável ter existido pressão para que os médicos legislas atribuíssem a casos de covid-19 uma causa de morte distinta, como pneumonias.
Uma outra situação que se observa nos dados do Eurostat é a falta de rigor das informações políticas que foram sendo reveladas durante a pandemia, como o PÁGINA UM já tinha salientado em Julho passado. O caso mais flagrante sucede na Espanha, onde o desvio entre os dados do Eurostat e os inicialmente apontados no final de 2020 é colossal.
No Worldometers surgem, para o país-vizinho, 50.955 óbitos a 31 de Dezembro de 2020, mas no Eurostat as autoridades espanholas indicaram agora, apenas para aquele ano, 60.358 mortes por covid-19 (U07.1) e mais 14.481 com suspeitas (U07.2). Ou seja, somando os dois códigos há um desvio de 23.884 óbitos a mais, representando uma diferença de 47%.
Este tipo de manipulações em matéria de Saúde Pública, por ingerência política – de que o Governo português foi e é um expoente –, vem assim apenas reforçar a necessidade de analisar a pandemia desde 2020 não numa visão redutora do impacte da covid-19, mas sim no conjunto da mortalidade. E não apenas num ano, mas no conjunto de diversos anos. Por isso mesmo, com medo disso, o Governo português tudo tem feito para adiar o estudo sobre o excesso de mortalidade e sobretudo a tentar evitar a divulgação de dados detalhados (que não possam ser manipulados). Daí que haja tantos processos do PÁGINA UM no Tribunal Administrativo de Lisboa para se aceder às bases de dados (anonimizadas), incluindo a do SICO.
Apenas uma semana após tomar posse na task force, Gouveia e Melo, o agora Chefe do Estado-Maior da Armada, negociou com o bastonário Miguel Guimarães as condições para se vacinarem quase três mil médicos que não estavam na lista de prioridade da Direcção-Geral da Saúde. O negócio envolveu o pagamento de mais de 27 mil euros ao Hospital das Forças Armadas, e também uma contabilidade criativa com donativos de quatro farmacêuticas à Ordem dos Médicos. A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde abriu um processo de esclarecimento, no decurso das investigações do PÁGINA UM.
A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) abriu um “processo de esclarecimento” para apuramento de eventuais ilegalidades em redor do acordo ad hoc para a vacinação de médicos não-prioritários em Fevereiro do ano passado entre o actual bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, e o então coordenador da task force Gouveia e Melo, actual almirante e Chefe do Estado-Maior da Armada.
A informação oficial surge na sequência de uma investigação do PÁGINA UM ao registo das actividades operacionais e contabilísticas da campanha Todos por Quem Cuida – cujo acesso aos documento apenas foi possível após sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa –, que consistiu numa campanha de angariação de fundos protagonizado pela Ordem dos Médicos e Ordem dos Farmacêuticos, em parceria com a Apifarma.
Gouveia e Melo, actual Chefe do Estado-Maior da Armada, foi coordenador da task force. Uma semana após a tomada de posse, começou logo a fazer aquilo que prometera não permitir: vacinações à margem das prioridades definidas pela DGS.
Numa mensagem ao PÁGINA UM, a IGAS diz que, “por Despacho do Inspetor-Geral [Carlos Carapeto] de 15 de Janeiro de 2023, foi determinada a abertura de um processo de esclarecimento, com o objetivo de avaliar se existe matéria que deva e possa ser avaliada (…) no âmbito das suas competências.”
O processo de esclarecimento, segundo o léxico operativo da IGAS, é formalmente “o conjunto organizado de documentos que traduzem um procedimento rápido e expedito destinado à recolha de elementos com vista ao esclarecimento de expediente geral, à verificação prévia de requisitos que habilitem a eventual decisão de instauração de ação inspectiva ou ao acompanhamento de ações inspetivas dentro ou fora” desta entidade. Sendo assim uma “análise de natureza inspetiva preparatória”, fica assim sujeita à elaboração de um relatório, que será para todos os efeitos consultável no futuro, ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos.
Sobretudo através de transferências da indústria farmacêuticas, na verdade este fundo foi gerido numa conta pessoal de Miguel Guimarães, Ana Paula Martins (ex-bastonária da Ordem dos Farmacêuticos e indigitada presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte) e Eurico Castro Alves, recém-eleito presidente da secção regional do Norte da Ordem dos Médicos. O PÁGINA UM detectou, documentalmente, um conjunto de irregularidades e ilegalidades na gestão do fundo, que pode mesmo consubstanciar a criação de um “saco azul” de mais de 968 mil euros, além de fuga ao fisco e ausência declarações de rendimentos proveniente de farmacêuticas no Portal da Transparência do Infarmed.
Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, foi o “maestro” da campanha “Todos por Quem Cuida”, que, apesar das boas intenções, se encontra enxameada de maus procedimentos.
O acordo de vacinação dinamizado pelo bastonário da Ordem dos Médicos e pelo coordenador da task force tem, porém, contornos distintos, muito peculiares, mas não de menor gravidade, como o PÁGINA UM revelou em 15 de Dezembro passado, no primeiro de um conjunto de artigos de investigação jornalística dedicado à gestão do fundo “Todos por Quem Cuida”, que envolveu cerca de 1,4 milhões de euros.
Pouco depois de tomar posse como coordenador da task force – substituindo Francisco Ramos, que se demitira por irregularidades na selecção de profissionais para a administração das primeiras doses de vacinas (então ainda raras) –, Gouveia e Melo aceitou as diligências de Miguel Guimarães para serem vacinados quase 3.700 médicos que não se enquadravam nas prioridades determinadas pela Direcção-Geral da Saúde.
A norma 002/2021 de 30 de Janeiro de 2021 determinava então que na fase 1 deveriam ser vacinados os “profissionais de saúde diretamente envolvidos na prestação de cuidados a doentes”, os profissionais de lares (ERPI) ou de instituições similares e da rede de cuidados continuados, as pessoas com 80 ou mais anos, as pessoas de mais de 50 anos com determinadas comorbilidades e ainda “os profissionais das forças armadas, forças de segurança, serviços críticos e titulares de órgãos de soberania e altas entidades públicas”. Para a fase 2, que então não estava ainda a desenvolver em Fevereiro de 2021, estava prevista a vacinação do grupo etário dos 65 aos 79 anos e pessoas dos 50 aos 64 anos com determinadas comorbilidades. Somente no final da Primavera de 2021 começaram a ser vacinados os menores de 50 anos, quando já não se colocavam problemas de escassez de doses.
A troco de mais de 27 mil euros para o Hospital das Forças Armadas, Gouveia e Melo permitiu, à margem das prioridades então definidas pela Direcção-Geral da Saúde, que Miguel Guimarães “brilhasse” junto dos seus colegas.
Ora, isso significava que uma pequena parte dos médicos – aqueles que trabalhavam no sector privado, em função não directamente de cuidados de saúde – seriam tratados em Fevereiro como comuns cidadãos, ou seja, seriam vacinados em função da idade e/ ou das comorbilidades – e não pela profissão ou pela inscrição numa associação pública profissional. Algo que Miguel Guimarães, como bastonário, nunca aceitou.
Por esse motivo, Miguel Guimarães foi lesto a estabelecer contactos com Gouveia e Melo, havendo um e-mail que mostra ter ocorrido uma reunião em 10 de Fevereiro de 2021 entre os dois. Seguiu-se troca de mensagens até que o bastonário conseguiu aquilo que desejava: em 25 de Fevereiro, após um contacto telefónico com Gouveia e Melo, Miguel Guimarães terá fechado então um acordo ad hoc – dir-se-ia informal, porque não há qualquer protocolo ou acordo escrito – para vacinar 1.382 médicos não-prioritários no pólo do Porto do Hospital das Forças Armadas, 2.004 no de Lisboa, 623 no Centro de Saúde Militar de Coimbra e 189 no centro hospitalar do Algarve.
Em vésperas da primeira toma, Miguel Guimarães estava sobretudo preocupado em saber se poderia chamar a comunicação social para acompanhar toda a operação, que acabou por se realizar de forma discreta. Foram vacinados quase 3.700 médicos. Obviamente, as vacinas tiveram de ser “desviadas” do circuito oficial.
Factura pela vacinação paralela dos médicos foi enviada à Ordem dos Médicos, mas paga pela campanha solidária. Contudo, depois surgem documentos de donativos de quatro farmacêuticas que custearam a vacinação.
Como contrapartida ao acordo, o Hospital das Forças Armadas recebeu 27.365 euros da Ordem dos Médicos – assumindo-se que cada administração custava 3,7 euros.
No processo consultado pelo PÁGINA UM, não existe qualquer documento comprovativo de um contrato de prestação de serviço que justifique este pagamento.
Se esse documento existe, então deveria estar nos documentos, porque o Tribunal Administrativo obrigou as Ordens dos Médicos e dos Farmacêuticos a disponibilizarem todos os documentos operacionais e contabilísticos da campanha “Todos por Quem Cuida”. Ou seja, se existe e não foi disponibilizado aquando da consulta pelo PÁGINA UM, então houve incumprimento de uma sentença judicial, com subtracção de documentos.
Embora o pagamento pela administração das vacinas às Forças Armadas tivesse vindo da conta pessoal conjunta de Miguel Guimarães, Ana Paula Martins e Eurico Castro Alves – gestores da campanha Todos por Quem Cuida –, a factura foi passada em nome da Ordem dos Médicos.
Para aumentar o rol de irregularidades, existem também documentos de donativos para esse mesmo fim provenientes de quatro farmacêuticas: Gilead (3.725,2 euros), Ipsen Portugal (11.040 euros), Bial (2.590 euros) e Laboratórios Atral (10.000 euros).
Nenhuma destas farmacêuticas fez declaração de entrega de donativos no Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed, entidade cujo presidente, Rui Santos Ivo, continua sem realizar qualquer acção inspectiva. Ana Paula Martins, ex-bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, trabalhava então na Gilead aquando da data desse alegado donativo.
Todos estes factos estão documentados pelo PÁGINA UM, no seguimento da sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa.
Aliás, nessa documentação não existe qualquer acordo escrito entre a Ordem dos Médicos e a task force ou Gouveia e Melo, até por uma simples razão: a task force, criada em finais de Novembro é uma estrutura sem qualquer autonomia própria, dependente do Ministério da Saúde, uma vez que as atribuições concedidas ao “núcleo de coordenação” estiveram sempre sob a liderança da Direcção-Geral da Saúde (DGS), Infarmed, Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS). Basta saber ler o artigo 4º do Despacho nº 11737/2020, de 26 de Novembro.
Manuel Pizarro, ministro da Saúde, continua em silêncio sobre a vacinação de médicos não-prioritários à margem das normas em vigor em Fevereiro de 2021.
A evidência deste acordo ter sido realizado à margem da lei fica patente no silêncio do Ministério da Saúde quando, por duas vezes, o PÁGINA UM confrontou Manuel Pizarro sobre estas matérias: a primeira vez, no dia 5 de Dezembro passado; a segunda vez, uma semana depois, em 12 de Dezembro. Em mais de um mês, o Ministério da Saúde não mostrou qualquer reunião nem mostrou qualquer documento que comprove ter existido autorização superior para conceder um excepção – o que, obviamente, não significa que não surja, agora, assim, num repente, de forma inopinada, com a IGAS a iniciar um processo de esclarecimento.
Em todo o caso, será interessante saber como agirá agora a IGAS neste “processo de esclarecimento”, que envolve o próprio bastonário da Ordem dos Médicos e o atual Chefe do Estado-Maior da Armada – que até recebeu o Prémio Nacional de Bioética em Novembro de 2021 –, tendo em conta as recentes notícias de estar a decorrer um processo disciplinar contra a directora da Delegação Regional do Sul do INEM. Teresa Brandão é acusada pela IGAS de ter cometido irregularidades na vacinação contra a covid-19 naquele instituto, em Janeiro de 2021. Mas aí estavam em causa apenas quatro frascos de vacinas, que dariam para 24 doses.
Ora, o acordo ad hoc entre o bastonário Miguel Guimarães e o agora almirante Gouveia e Melo permitiram o desvio de 7.396 doses – 1.140 vezes mais. Uma questão de estatística, de legalidade e de ética que a IGAS agora analisará.
N.D. Em resultado da investigação do PÁGINA UM sobre este acordo ad hoc, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) abriu um processo por alegada falta de rigor. O processo surge no decurso de uma participação de alguém cuja identificação foi escondida pela ERC. A resposta do PÁGINA UM fez-se através de uma carta aberta, enviada também por e-mail, ao presidente do regulador, Sebastião Póvoas.