Categoria: Política

  • Será que os ministros podem contribuir (com as suas casas) para o Programa Mais Habitação?

    Será que os ministros podem contribuir (com as suas casas) para o Programa Mais Habitação?

    Aviso: todos os ministros são proprietários imobiliários, embora alguns detenham apenas um mais ou menos “modesto” apartamento. Outros andam a pagar empréstimos bancários. Mas há um punhado de governantes que, além do próprio António Costa, possuem um património susceptível de vir a ser “cobiçado” pela ministra da Habitação, caso avance a peregrina ideia do arrendamento coercivo.

    Confira em baixo uma síntese da “busca” do PÁGINA UM ao património imobiliário dos principais governantes em funções, de acordo com as últimas declarações entregues no Tribunal Constitucional, e que escondem mais do que revelam, tantas são as rasuras justapostas para os jornalistas não verem e o público não saber.


    Marina Gonçalves, ministra da Habitação

    A responsável pelo pacote legislativo é apenas proprietária de uma fracção autónoma em Cristelo, no concelho de Caminha, de onde é natural, que pelo valor patrimonial (96.144,61 euros), deverá ser uma moradia.

    Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência

    A ministra da Presidência apenas detém um apartamento para habitação com três divisões e 67 metros quadrados. Frugal, portanto.

    Marina Gonçalves, ministra da Habitação, António Costa, primeiro-ministro, e Fernando Medina, ministro das Finanças, na apresentação do pacote legislativo para a habitação na passada quinta-feira.

    João Gomes Cravinho, ministro dos Negócios Estrangeiros

    Proprietário de duas fracções urbanas em Lisboa – uma na freguesia de Santa Maria Maior e outra em Arroios –, o ministro João Gomes Cravinho, não declarou rendimentos prediais. Assumindo que vive num dos dois apartamentos, o segundo pode vir a ser “cassado” pela colega Marina Gonçalves para avolumar a oferta no mercado de arrendamento.

    Helena Carreiras, ministra da Defesa Nacional

    Sem indicação sequer da freguesia, a ministra da Defesa Nacional é proprietária de um único prédio urbano na cidade de Lisboa, com o valor patrimonial de 128.138 euros, o que indicia ser um apartamento.

    Mariana Vieira da Silva é o membro do Governo com propriedade mais “exígua”.

    José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna

    O ministro da Administração Interna consegue que o Tribunal Constitucional lhe conceda direito a completo segredo sobre a sua propriedade predial. Apenas se sabe que tem um prédio urbano, mas não se sabe onde nem o seu valor patrimonial.

    Catarina Sarmento e Castro, ministra da Justiça

    Embora grande parte da informação da última declaração não seja transparente – ou seja, está rasurada –, a ministra da Justiça apresenta uma panóplia patrimonial, distribuída por Lisboa, Peniche e sobretudo Marinha Grande. Neste concelho do distrito de Leiria, Catarina Sarmento e Castro possui uma moradia T4 e mais uma garagem autónoma, enquanto em Peniche tem um T1 e outro apartamento da mesma dimensão em Carnide, na cidade de Lisboa. Além destes imóveis, tem um terço da herança indivisa de um T4 e de um T2 na Marinha Grande, além de um escritório de dimensões desconhecidas e três garagens autónomas. Como não apresenta rendimentos prediais, algumas destas propriedades são candidatas a integrarem a bolsa de arrendamento coercivo da ministra da Habitação.

    Se a peregrina ideia do arrendamento coercivo (sob a aura de inconstitucionalidade) avançar, e então se houver justiça, alguns das propriedades da ministra da Justiça serão as primeiras a entrarem no mercado…

    Fernando Medina, ministro das Finanças

    O antigo presidente da autarquia alfacinha detém um apartamento T4 nas Avenidas Novas, em Lisboa, mantendo uma dívida bancária de 351.855 euros. De resto, tem espalhados pelo Norte do país uma mão-cheia patrimonial que as rasuras do Tribunal Constitucional não permitem conhecer em detalhe: ½ de um prédio urbano em Vila real, ¼ de um prédio (não se sabe se rústico ou urbano) em Ribeira de Pena, mais ½ de três prédios rústicos em Celorico de Basto, e mais ½ de um prédio urbano em Muxões (Celorico de Basto), além de 1/6 de uma herança indivisa herdada do pai que o Tribunal Constitucional não considera merecedor de ser discriminada.

    Ana Catarina Mendes, ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares

    Proprietária de uma fracção – presume-se que apartamento – na freguesia lisboeta da Misericórdia, Ana Catarina Mendes detém ainda 50% de umas outras fracções na capital, ambas na freguesia de Campo de Ourique. Divorciada do ex-ministro Paulo Pedroso, a sua declaração não indica quem é detentor da outra metade destas duas fracções. Certo apenas que na declaração de 2019, Ana Catarina Mendes reportou um rendimento predial de 18.000 euros, mas na declaração de Março de 2022 – já separada de Pedroso – não indica qualquer rendimento deste tipo.

    Com duas casas de férias, António Costa Silva “livra-se” do arrendamento coercivo gizado pela sua colega da Habitação.

    António Costa Silva, ministro da Economia e do Mar

    Sendo porventura o ministro com maior património financeiro – e com o maior rendimento anual antes de entrar em funções governamentais (384.936 euros), António Costa Silva indica a propriedade de uma fracção em local desconhecido (apenas existe a referência ao artigo matricial 1344 e ao registo número 2099), além de um prédio urbano em Sobral da Lagoa, no concelho de Óbidos. Terá concluído a compra em Novembro de 2022 de uma fracção (não discriminada) na Quarteira, no concelho de Loulé.

    Pedro Adão e Silva, ministro da Cultura

    Proprietário de um apartamento na zona das Amoreiras, sob a qual tem um empréstimo de 465.656 euros, o ministro da Cultura apresenta-se como titular de uma fracção autónoma em Vila Nova de Milfontes (com valor patrimonial de 85.219 euros), a que acresce outra em Alvor (com valor patrimonial de 49.765 euros) e 1/24 de uma outra fracção na Praia do Alvor (com valor patrimonial de 77.495 euros).

    Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente, à esquerda de António Costa, tem um apartamento em Lisboa, e outro em Sintra, que já aluga.

    Elvira Fortunato, ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior

    Proprietária de uma fracção na Charneca da Caparica, provavelmente uma moradia, a atender ao valor patrimonial (160.339,55 euros), a ministra da Ciência detém ainda um prédio urbano em Vila Real de Santo António (com valor patrimonial de 7.875 euros) e 1/2 de uma outra parcela na mesma localidade.

    João Costa, ministro da Educação

    O ministro da Educação indica apenas uma moradia na Quinta do Anjo, sem mais qualquer indicação.

    Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

    Proprietária de um apartamento de 148 metros quadrados em Moscavide e de um T4 na Portela com 136 metros quadrados, a ministra do Trabalho é forte “candidata” a incorporar um destes prédios urbanos no pacote do arrendamento coercivo da Habitação, porque não apresenta rendimentos prediais. Tem ainda uma moradia na Silveira, no concelho de Torres Vedras, com 132 metros quadrados, integrado num terreno 750 metros quadrados, além de dois prédios urbanos, aparentemente em más condições, em Vila Nova de Foz Coa.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde

    Proprietário de um apartamento na freguesia portuense de Ramalde, bem como de duas outras fracções na mesma zona, uma das quais será o escritório onde funcionava a sua empresa de consultoria.

    Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente e Acção Climática

    Com ½ de um T3 em Lisboa, em freguesia desconhecida, o ministro do Ambiente indica a propriedade de uma fracção autónoma para habitação em Sintra, sem outra qualquer indicação. Apresentou um rendimento predial anual de 2.800 euros.

    João Galamba, ministro das Infraestruturas

    Proprietário de um apartamento em Arroios (com valor patrimonial de 87.077 euros), o novo ministro das Infraestruturas detém ainda um prédio urbano em Cascais com um valor patrimonial de 135.030 euros. Deve ser um bom senhorio, porque os rendimentos prediais declarados num ano foram apenas de 333 euros.

    João Galamba declara uma segunda habitação em Cascais e um rendimento predial anual de 333 euros.

    Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial

    Excluindo o património do marido, a ministra da Coesão Territorial é proprietária de um prédio urbano em regime de propriedade horizontal em Coimbra, sem se conhecer detalhes para além do artigo matricial urbano (nº 4277). Não tem rendimentos prediais.

    Maria do Céu Antunes, ministra da Agricultura e da Alimentação

    A antiga presidente da autarquia de Abrantes, apenas indica a propriedade de um prédio naquela cidade, sem outra referência além do artigo matricial (nº 7771).

  • António Costa tem dois apartamentos elegíveis para arrendamento coercivo

    António Costa tem dois apartamentos elegíveis para arrendamento coercivo

    Uma das medidas mais polémicas – e eventualmente inconstitucional – do plano do Governo para aumentar a oferta de casas é o arrendamento coercivo, ou seja, o Estado obrigará os proprietários com alojamentos desocupados a alugarem. A ministra Marina Gonçalves já veio descansar emigrantes e proprietários com casa de férias, mas ficarão assim eventualmente elegíveis apartamentos que não apresentem rendimento predial e se situem próximo da habitação permanente. O primeiro-ministro António Costa tem dois apartamentos nestas condições, um na Penha de França e outro em Odivelas.


    Dois dos apartamentos do primeiro-ministro António Costa na região de Lisboa não lhe estão a dar qualquer rendimento predial nem podem ser consideradas segunda residência, pelo que eventualmente ficarão abrangidos pela mais polémica medida prevista pelo pacote legislativo do Ministério da Habitação: o arrendamento coercivo.

    De acordo com a consulta feita pelo PÁGINA UM à última declaração de património e rendimentos do primeiro-ministro no Tribunal Constitucional, António Costa declarou a posse de cinco fracções autónomas em Portugal: três em Lisboa – na freguesia de Benfica, onde oficialmente mora, de Santa Clara e de Penha de França –, uma em Odivelas, e uma ainda no Carvoeiro, onde passa férias quando está no Algarve, embora neste caso detenha apenas uma parte indivisa de herança. Além dessas, sabe-se que António Costa detém ainda uma fracção – que ele próprio desconhece as características – na cidade de Margão, em Goa, por herança.

    Estrada do Desvio, junto à Calçada de Carriche, na freguesia de Santa Clara, onde António Costa é senhorio de um apartamento.

    No entanto, nessa declaração – feita em 21 de Novembro passado, que consistiu num esclarecimento exigido pelo Ministério Público sobre uma declaração anterior, datada de 30 de Março de 2022 –, António Costa explicita que os seus rendimentos prediais, num total de 7.300,80 euros por ano, “provêm do arrendamento da fracção sita na freguesia de Santa Clara, devidamente identificada no campo próprio, e ainda da permilagem correspondente às rendas do condomínio sito na freguesia de Benfica”, dizendo que “não há qualquer outro rendimento a declarar”.

    Apesar desta última declaração ter sido rasurada pelos serviços do Tribunal Constitucional – alegadamente por permitir a identificação individualizada de residências, mas em que se expurgou indevidamente a tipologia e área das fracções –, o PÁGINA UM sabe que esse apartamento de António Costa na freguesia de Santa Clara se localiza num segundo andar de um prédio da Estrada do Desvio, junto à Calçada do Carriche. Não se divulga o endereço completo por não ser, por agora, relevante.

    Rua Estácio da Veiga, à esquerda, na freguesia de Penha de França, onde António Costa é proprietário de um apartamento sem rendimento predial.

    Desta forma, assumindo António Costa que as outras duas fracções não têm rendimento predial, nem são casas de férias, significa que o primeiro-ministro pode ser considerado, segundo os critérios do Ministério da Habitação, um proprietário elegível para arrendamento coercivo, caso não prove inequivocamente que aquelas têm uma ocupação frequente ou permanente.

    O apartamento da Penha de França, localiza-se também num segundo andar da Rua Estácio da Veiga, num prédio de três pisos em boas condições. O primeiro-ministro já possui este apartamento pelo menos desde 2015, como noticiou o Observador em Março daquele ano, quando António Costa assumiu o cargo de secretário-geral do Partido Socialista.

    Já o apartamento em Odivelas, na Rua da Paiã, situa-se também no segundo andar, neste caso de um prédio em más condições de conservação. O apartamento foi dado como vendido em 21 de Outubro de 2016 numa notícia do Observador, de há quatro anos, que revelava os intensos negócios imobiliários de António Costa. Mas o PÁGINA UM pode garantir que é esse o apartamento que ainda está declarado pelo primeiro-ministro como pertencendo a si e à mulher Fernanda Tadeu.

    Rua da Paiã, em Odivelas. No edifício verde, ao lado esquerdo, está o apartamento de António Costa.

    Pode, em todo o caso, haver mais uma confusão na declaração de António Costa. Nos esclarecimentos transmitidos pelo primeiro-ministro ao Tribunal Constitucional surge mesmo a informação de que ele desconhecia que uma conta bancária não identificada, por rasurada pelos serviços daquele órgão de fiscalização e controlo dos políticos e da democracia, e que ele repetidamente indicava como sua, afinal, para sua “surpresa”, nem sequer era titular. O primeiro-ministro prometeu vir a rectificar a situação.

  • Jacinda Ardern deixa Nova Zelândia em crise económica e com excesso de mortalidade

    Jacinda Ardern deixa Nova Zelândia em crise económica e com excesso de mortalidade

    No auge, a sua popularidade nacional e internacional chegou a ser apelidada de “Jacindamania”. Nas eleições de Outubro de 2020, em plena pandemia, Jacinda Arden obteve 50,01% dos votos, um resultado histórico, assegurando 65 dos 120 lugares na Câmara dos Representantes. Mas a aprovação popular da estratégia fortemente restritiva e até segregacionista da primeira-ministra da Nova Zelândia foi-se esfumando, sobretudo quando a Ómicron “varreu” a ilha da Oceânia a partir do início do ano passado, e a inflação e as tensões sociais aumentaram. Para piorar, a Nova Zelândia apresenta, desde 2022, um inusitado excesso de mortalidade, confirmada por uma análise do PÁGINA UM recorrendo a dados estatísticos oficiais.


    Heroína ou ditadora. Amor e ódio. Agradecimento e desprezo. Assim foram os sentimentos antagónicos em reacção ao anúncio da recente demissão de Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia. Não deixou ninguém indiferente. Nos antípodas do continente europeu, com uma população a rondar os 5,1 milhões de habitantes, nunca um Governo daquela ilha da Oceânia foi tão falado.

    Até em Portugal, onde o interesse sobre a Nova Zelândia, antes da pandemia, era tão abundante como os cangurus naquela ilha: zero. A primeira-ministra da pequena ilha ao largo da Austrália tornou-se tudo menos consensual nos últimos três anos.

    Jacinda Ardern com António Guterres.

    Mulher, jovem e comunicativa, Jacinda Ardern revelou-se ao Mundo pela forma empática como lidou com o atentado contra a mesquita de Christchurch em Março de 2019, mas depois transformou-se numa “dama de ferro” pela forma como impôs uma estratégia de restrições durante a pandemia, com lockdowns draconianos – que proibiam mesmo “recuperar uma bola de críquete perdida no quintal do vizinho”, como recordava ontem uma notícia do The New York Times.

    Além disso, apesar de inicialmente assegurar que as vacinas seriam voluntárias, impôs a sua administração obrigatória para determinadas profissões, como agentes fronteiriços, polícias, militares, profissionais do sector da Educação, da saúde e serviços policiais, além de empregados do sector da restauração. O seu discurso tornou-se, por vezes, incrivelmente segregacionista, defendendo a punição e discriminação de quem não se vacinasse ou realizasse testes. O bordão do governo trabalhista de Ardern não podia ser mais incisivo: “no jab, no job” [sem vacina, sem trabalho].

    Com o surgimento das vacinas em finais de 2020, o objectivo de Jacinda Arden passou a ser alcançar rapidamente os 90% da população vacinada. Os fins desejados pela primeira ministra justificaram os meios por si impostos – e isso conseguiu Jacinda Ardern.

    Jessica Ardern impôs a vacinação obrigatória em determinados grupos profissionais.

    Os dados mais recentes do Ministério da Saúde neozelandês indicam que 90,2% dos maiores de 12 anos tinham completado a primeira fase da vacinação. Porém, a adesão ao primeiro reforço, para os maiores de 18 anos, já foi menor (73,3%), e ainda se reduziu mais para o segundo reforço. Neste momento, apenas 47,3% dos neozelandeses optaram por tomar o denominado segundo booster, mostrando uma tendência de desinteresse que também atinge Portugal.

    Mas se a estratégia de Jacinda Ardern – que chegava a ser similar à chinesa, apontando para a covid zero – parecia estar a resultar nos primeiros dois anos da pandemia, em pouco mais de dois meses colapsou.

    Com efeito, até ao final de Janeiro de 2022 a Nova Zelândia contava apenas 16.620 casos positivos de covid-19 desde o início da pandemia, contabilizando 63 óbitos. Como termo de comparação, Portugal – com o dobro da população – tinha, nessa altura, cerca de 20 mil mortes atribuídas ao SARS-CoV-2 e mais de 2,8 milhões de casos positivos.

    Vacinada em Junho de 2021, Jacinda Ardern testou positivo em Maio do ano passado. Usou fortemente as redes sociais para comunicar questões relacionadas com a covid-19.

    Apesar de contar com uma população fortemente vacinada, a variante Ómicron “varreu” literalmente a ilha de Jacinda Ardern – e também a sua estratégia de covid, apesar de continuar a receber os louros de uma política segregacionista e pouco democrática. Na segunda semana de Maio do ano passado, a Nova Zelândia superava já um milhão de casos e, nesse mesmo mês, ultrapassou os 1.000 óbitos.

    Actualmente, segundo os dados do Worldometers, este país da Oceânia regista mais de 2,1 milhões de casos – uma incidência que já ultrapassou a da Suécia –, embora conte somente com 3.676 óbitos, ou seja, uma taxa de letalidade de 0,17%, o que se explica pela menor agressividade da variante Ómicron.

    À medida que o suposto sucesso da estratégia de Jacinda Ardern no combate à pandemia se esfumava com a Ómicron, aumentava a contestação interna à sua política segregacionista. Em Agosto do ano passado, manifestações em Wellington mostravam já uma estrela cadente em queda livre. Os índices de popularidade do Partido Trabalhista de Ardern tinha então despencado para os 33% de aprovação, quando no final de 2021 era ainda de 41%. No mês seguinte, Jacinda Arden viu-se obrigada a deixar cair as máscaras e os mandatos de vacinação, enquanto já defendia então ser necessário “virar a página”.

    Manifestações contra os mandatos de vacinação atingiram o seu auge em Agosto do ano passado.

    Mas já era tarde para recuperar a popularidade interna perdida. Hoje, o jornal Stuff noticia que uma pesquisa (Taxpayers’ Union – Curia Poll), realizada pouco antes do anúncio da sua renúncia, apurara que que 40% dos inquiridos tinham uma posição favorável à primeira-ministra neozelandesa contra 41% com opinião desfavorável. É a primeira vez, desde que o balanço de Jacinda Ardern se mostrava negativo. Por outro lado, o índice de popularidade do Partido Trabalhista desceu para os 31,7%, estando já bastante abaixo do Partido Nacional, de centro-direita, que conta com 37,2% das intenções de voto.

    Recuperar a popularidade do Partido Trabalhista para as eleições marcadas para o próximo mês de Outubro será ainda mais complexo pela evolução económica e financeira, a par de uma situação de saúde pública marcada por um forte recrudescimento da mortalidade total.

    De facto, a taxa de inflação na Nova Zelândia, que era de 1,5% em Março de 2021, estava já em 7,2% no terceiro trimestre ano passado, de acordo com dados oficiais. Este é o valor mais elevado desde Setembro de 1990. Embora a taxa de desemprego esteja em apenas 3,3% – o valor mais baixo dos últimos 15 anos –, existem receios forte de uma recessão económica.

    Evolução da taxa de inflação anual (%) por trimestre na Nova Zelândia de Janeiro de 1990 a Setembro de 2022. Fonte: Stats NZ.

    Em todo o caso, com um produto interno bruto per capital de cerca do dobro de Portugal, a situação económica não se augura demasiado dramática no futuro da Nova Zelândia.

    Mais dramática mostra ser a evolução da mortalidade total da Nova Zelândia. Com efeito, se os dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021) pareciam mostrar que a estratégia restritiva draconiana defendida por Jacinda Ardern era uma aposta vencedora, agora afigura-se terrível.

    Uma análise detalhada aos dados oficiais do Stats NZ – a agência neozelandesa de Estatística – entre Janeiro de 2010 e Setembro do ano passado – uma tendência crescente da mortalidade total, depois de uma redução ao longo de 2020 e 2021. Considerando a média móvel de 12 meses – para atenuar completamente o efeito das variações sazonais –, observa-se um crescimento ininterrupto a partir de Novembro de 2020, quando então as medidas não-farmacológicas e os lockdowns reduziam o risco de vida para grande parte das doenças.

    Evolução da mortalidade total na Nova Zelândia entre 2010 e 2019, e estimativa do excesso ou défice de mortalidade entre 2019 e 2022 (em todos os anos apenas para os primeiros nove meses) em função do número expectável e registado. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    A tendência de incremento da mortalidade total passou a ser preocupante quando em Novembro de 2021 se ultrapassaram os valores de Março de 2020. A mortalidade total em Setembro do ano passado – último período com dados – já se situou em 6.438 óbitos (média de 12 meses), que contrastava com os 5.786 óbitos no mês homólogo imediatamente anterior à pandemia (Setembro de 2019). Significa isto um desvio de 11%.

    Fazendo uma análise comparativa, por agora, dos nove primeiros meses de cada ano (Janeiro a Setembro), desde 2010 até 2022, e considerando também a tendência crescente de mortalidade (por envelhecimento populacional), chega-se à conclusão que ao pretenso sucesso das políticas de saúde de Jessica Ardern em 2020 e 2021 sucedeu um desastre em 2022.

    Sobretudo em 2020, a mortalidade total nos primeiros nove meses ficou bastante abaixo dos valores expectáveis: seria de aguardar, sem pandemia, um registo de 53.086 óbitos, mas afinal houve menos 3.592 mortes. Ou seja, com o Mundo então a sofrer uma pandemia, a Nova Zelândia apresentava até uma descida da mortalidade por todas as causas.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) na Nova Zelândia entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Em 2021, manteve-se esse saldo favorável, embora já não tão evidente. Seria expectável o registo de 54.018 óbitos, tendo-se contabilizado menos 624.

    Porém, o ano de 2022 “estragou a festa” – e nem se pode dizer que tenha sido por causa da covid-19, porque entre Janeiro e Setembro morreram pouco mais de 2.900 neozelandeses por esta doença. Com efeito, o excesso na mortalidade total neste período foi de 4.856 óbitos, um valor que suplanta em muito o “défice” favorável de 2020 e 2021.

    O grupo etário que apresentou um maior agravamento foi o dos muito idosos (maiores de 90 anos), que estão com valores cerca de 17% acima do período imediatamente anterior à pandemia, e numa tendência que não parece ter encontrado o topo. Essa “razia” dos super-idosos pode ter uma razão simples: a vida não dura sempre e o sacrifício de os proteger contra a covid-19 descurou outras afecções que agora manifestam os seus efeitos, através de um aumento dos desfechos fatais.

    Essa evidência também se afigura no grupo etário dos 85 anos 89 anos, onde se observa uma redução da mortalidade expectável nos primeiros dois anos da pandemia, sucedendo depois um crescimento acentuado ao longo dos meses de 2022.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022 nos grupos etários dos maiores de 60 anos. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Já sem atenuação da mortalidade durante 2020 e 2021, a evolução dos desfechos fatais para os idosos entre os 80 e 84 anos apresenta também sinais preocupantes. Tanto antes como nos dois primeiros anos da pandemia, o número de óbitos por mês (média móvel de 12 anos) rondava valores entre os 800 e os 850, mas o valor de Setembro do ano passado situou-se nos 987 óbitos.

    Tendência recente preocupante abrange também o grupo etário dos 75 aos 79 anos, com o número de óbitos em Setembro passado (média móvel de 12 meses) a aproximar-se dos 800, quando antes e durante os primeiros dois anos da pandemia andou entre os 650 e os 700 óbitos. Ou seja, os valores mais recentes representam um agravamento superior a 10% face ao normal.

    Similar efeito, embora atenuado, se mostra nos diversos grupos etários dos 60 aos 74 anos, embora em termos relativos se esteja sempre perante acréscimo da ordem dos 10%.

    Nas populações adultas entre os 40 e os 59 anos, o efeito da pandemia foi nulo. Quer antes da pandemia, quer antes do surgimento da vacina quer depois quer ainda nos meses de 2022, as flutuações são mínimas e dentro daquilo que estaticamente se pode considerar norma. O mesmo se aplica nos menores de 40 anos, tanto nos jovens adultos como nos adolescentes, crianças e recém-nascidos.

    Evolução da mortalidade total por mês (média móvel de 12 meses) entre Janeiro de 2015 e Setembro de 2022 nos grupos etários dos menores de 60 anos. Fonte: Stats NZ. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Ou seja, tal como em muitos outros países – incluindo Portugal –, quando se olha para o impacte da pandemia nos menores de 50 anos, nada aconteceu. Sem vacina ou com vacina, o perfil da mortalidade total é similar àquilo que era antes de 2020.

    Porém, o caso muda de figura para os mais idosos. Na Nova Zelândia, se a política de Jacinda Ardern foi de salvar idosos, de facto conseguiu-o, mas com um trágico desfecho: alguns idosos tiveram “direito” a uns quantos meses de vida suplementar, é certo, mas em absoluta reclusão e medo da covid-19.

    E depois desses meses acabaram muitos desses – e outros mais, em excesso – por perecer. Sem glória. E a trágica procissão pode ainda estar no adro. Na Nova Zelândia, Jacinda Ardern já não estará no Governo para assumir responsabilidades; ao invés, sai com aura de heroína internacional, sobretudo para quem não olha para os números, para a realidade.

  • Irmão do presidente da República ganha contrato na NAV três dias após nomeação de Alexandra Reis para liderar a empresa pública

    Irmão do presidente da República ganha contrato na NAV três dias após nomeação de Alexandra Reis para liderar a empresa pública

    Não foi apenas a negociar a indemnização de 500 mil euros por rescindir com a TAP que os caminhos do advogado Pedro Rebelo de Sousa e da ex-secretária de Estado do Tesouro se cruzaram. Três dias após a nomeação formal de Alexandra Reis para liderar a NAV, esta empresa pública contratou a sociedade do irmão do presidente da República para prestar serviços jurídicos na área do trabalho. Em todo o caso, já se sabia desde Abril passado que a agora ex-secretária de Estado do Tesouro iria para aquela empresa pública de gestão da navegação aérea. Quanto a Pedro Rebelo de Sousa, apesar do seu irmão, o presidente da República, defender que tem já pouca influência na gestão do sociedade de advogados que fundou, imagine-se então se tivesse muita: o PÁGINA UM revela aqui a evolução dos contratos públicos sacados pela SRS – Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados, na esmagadora maioria por ajuste directo.


    A sociedade de advogados de Pedro Rebelo de Sousa, irmão do presidente da República, conseguiu ganhar um contrato de prestação de serviços à Navegação Aérea de Portugal (NAV), no valor de 66.861 euros, apenas três dias após a nomeação formal de Alexandra Reis como presidente do conselho de administração daquela empresa pública.  O despacho de nomeação, assinado pelo ainda ministro das Finanças, Fernando Medina, e pelo demissionário ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos tem data de 24 de Junho deste ano; o contrato entre a NAV e a SRS – Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados é de 27 de Junho, embora tenha entrado em vigor retroactivamente, em 14 de Junho daquele mês.

    Embora Alexandra Reis não tenha estado directamente envolvida no contrato – terá sido assinado por dois vogais em funções, uma vez que só assumiu a presidência formal em 1 de Julho –, há muito era conhecida a sua indigitação para liderar a empresa de gestão do tráfego aéreos. E as suas ligações a Pedro Rebelo de Sousa eram óbvias: o advogado negociara, no início deste ano, a famosa indemnização de 500 mil euros pela rescisão do cargo de vogal do conselho de administração da TAP.

    Pedro Rebelo de Sousa, como surge no site da SRS – Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados

    Alexandra Reis saíra da companhia aérea estatal em Fevereiro passado – em rota de colisão com a CEO Christine Ourmieres-Widener –, mas em 11 de Abril já estava o seu currículo em análise pela Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração (CReSAP).

    O contrato de prestação de serviço, disponível no Portal Base, não identifica sequer quem assinou o contrato de ambas as partes – o que é uma situação ilegal e de pouca transparência, uma vez que a protecção de dados não se aplica aos nomes das pessoas envolvidas na sua assinatura –, e apenas refere, de forma muito abstracta, o objecto: “serviços de assessoria jurídica no âmbito da área de prática de Direito do Trabalho”, remetendo para um caderno de encargos não disponibilizado (o que também não é legal). Sabe-se apenas que a sociedade de Rebelo de Sousa foi a escolhida, ignorando-se os critérios, depois de uma consulta prévia a outros três conhecidos escritórios de advogados: PLMJ, Garrigues e Vieira de Almeida.

    Alexandra Reis foi nomeada para liderar uma empresa que três dias depois contratou o advogado que negociara a sua indemnização pela rescisão na TAP.

    Este contrato de Rebelo de Sousa acaba por ser, porém, apenas mais um dos muitos que a sua sociedade tem conseguido nos últimos anos.

    Apesar de Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República, ter já tentado desvalorizar o papel do irmão na sociedade SRS (que fundou e onde é manager partner), dizendo que tem “uma posição simbólica” –, na verdade os contratos com entidades públicas e similares têm estado a aumentar nos últimos três anos. E este ano bateu já mesmo um recorde: contabilizam-se 10 contratos com o valor total de 471.216 euros, sem IVA incluído.

    Este ano, o contrato mais elevado foi assinado com a Secretaria de Estado Regional da Economia da Madeira (100.000 euros). Aliás, no arquipélago madeirense, Pedro Rebelo de Sousa conseguiu seis contratos nos últimos dois anos no valor de 234.950 euros.

    Acima do valor do contrato com a NAV, a SRS obteve também um contrato de 70.000 euros com a ATEC, uma academia de formação nascida de um acordo entre o Instituto de Emprego e Formação Profissional e empresas alemãs (Volkwagen, Autoeuropa, Siemens e Bosch).

    No lote de entidades públicas com contratos este ano com Pedro Rebelo de Sousa conta-se ainda a Fundação Centro Cultural de Belém (15.000 euros), os municípios de Sever do Vouga (50.000 euros) e do Porto (44.955), a própria Ordem dos Advogados (20.000 euros), a Ordem dos Contabilistas Certificados (59.400 euros), a Secretaria Regional de Equipamentos e Infraestruturas da Madeira (25.000 euros) e a Transtejo (20.000 euros).

    Uma evidência dos negócios da sociedade de Pedro Rebelo de Sousa estarem de vento em pompa é a evolução da facturação. Nos últimos três anos (2020-2022), a SRS concretizou contratos públicos no total de 1.286.751 euros, quando no triénio anterior facturara, em contratos deste género, apenas 455.378 euros.

    Evolução do valor total dos contratos públicos da SRS – Sociedade Rebelo de Sousa & Advogados Associados. Fonte: Portal Base.

    Se se considerar a média dos 10 anos anteriores a 2020, a SRS registara apenas um valor anual de 158.054 euros, que contrasta com os 428.917 euros de média anual do triénio 2020-2022. Ou seja, um aumento de 171%.

    Além disto, nos últimos três anos, Pedro Rebelo de Sousa conseguiu também angariar 17 novos clientes entre as entidades públicas, ou seja, antes de 2020 nunca com estas estabelecera contratos. E também desde 2020, grande parte dos contratos obtidos foram concretizados apenas pela “linda cor dos olhos” do irmão do presidente da República: 73% do montante nestes últimos três anos foi obtido em ajustes directos, sem concorrência, apenas por contactos privilegiados.

    Note-se que alguns dos contratos entretanto assinados nos últimos anos podem não estar ainda no Portal Base.

  • Serão agora a Ciência e a Censura as novas armas políticas em democracia?

    Serão agora a Ciência e a Censura as novas armas políticas em democracia?

    Ferramentas da Psicologia Comportamental e técnicas de supressão e controlo de informação têm estado a ser usadas, nos últimos dois anos, para gerar uma maior concentração de poder político e económico, num ataque à democracia que está em curso. Esta é uma das conclusões de cientistas e especialistas que participaram no Congresso Internacional sobre a Gestão da Pandemia, que decorreu em Fátima entre sexta-feira e hoje. A supressão de informação, acusam, está a servir para ajudar a concentrar mais poder em políticos e interesses económicos, salientando que, agora, a Medicina Baseada na Evidência foi substituída pela Medicina Baseada em Políticas. E avisaram também que, desde 2020, se registam “níveis de propaganda sem precedentes”, com “desenvolvimentos alarmantes” para a democracia.


    Foi um retrato negro o traçado no terceiro e último dia do Congresso Internacional sobre Gestão da Pandemia, que decorreu em Fátima, desde sexta-feira. Cientistas, médicos e outros especialistas –muitos dos quais se queixam de ter sofrido censura durante a pandemia – alertaram para a forma como os últimos dois anos e meio trouxeram uma nova era em que a Ciência passou a ser usada como arma. E dizem ainda que, a par da censura de informação, muitos homens e mulheres da Ciência acabaram por aceitar servir políticos e indústrias para concentrarem um maior poder.

    Patrick Fagan, um conhecido especialista comportamental com obra publicada, não tem dúvidas sobre terem sido aplicadas técnicas de psicologia para manipular e condicionar o comportamento da população, para um reforço do poder político e económico durante a pandemia, tendo a ajuda da comunicação social.

    Este especialista disse ser evidente uma mudança, a partir de 2020, de uma sociedade democrática – em que os políticos aplicavam a vontade dos cidadãos – para uma sociedade em que os políticos alteram agora a vontade dos cidadãos para que estes aceitem as suas políticas. “A ciência comportamental foi instrumentalizada”, assegura.

    Segundo Fagan, durante a pandemia de covid-19, várias técnicas de psicologia comportamental foram usadas, incluindo o exacerbamento do medo ou a “programação” da população para aceitar certas medidas. Entre estas estão os casos de os políticos negarem medidas se determinadas circunstâncias não ocorressem, mas acabarem por as aplicar, ou então alargarem medidas definidas para um fim, para outros que não estavam inicialmente previstos – como sucedeu com o certificado digital. “Foi como um sapo que foi sendo cozido vivo”, explicou Fagan.

    Várias medidas foram assim sendo aplicadas de forma gradual, para levar a cabo intenções políticas. A técnica da negação inicial – introduzindo um conceito junto da população para a preparar – foi também utilizada no caso da vacinação: inicialmente, foi negado que seria obrigatória; depois, em alguns países, passou a ser obrigatória, ou então quem optasse por não se vacinar acabou a sofrer censura social ou dificuldades em aceder a determinados locais, mesmo no espaço doméstico.

    Patrick Fagan, cientista comportamental.

    Fagan explicou também como tantas pessoas foram conduzidas a aceitar políticas, mesmo que irracionais ou ilegais, com base no medo e em técnicas científicas que levam facilmente os indivíduos a seguirem uma ideia de comportamento de grupo. O cientista detalhou que isso ocorreu mesmo em pessoas inteligentes e cultas, que cederam às diferentes formas de pressão e manipulação psicológicas utilizadas.

    Já a psicóloga Joana Amaral Dias, também presente em Fátima, defendeu que parte da população esteve e está sob hipnose coletiva. “As pessoas estão mesmerizadas“, afirmou na sua apresentação, lembrando a estratégia de incutir medo na população desenhada por uma task force de medidas comportamentais que assessorou a Direcção-Geral da Saúde na pandemia, e cujos documentos estiveram disponíveis online, e acabaram depois por ser retirados.

    Relacionado com a psicologias, também especialistas presentes no congresso denunciaram graves atropelos e violações da ética médica desde 2020. “A Medicina Baseada na Evidência foi substituída por uma Medicina Baseada em Políticas”, avisou Alexandra Henrion Caude, geneticista, directora de Investigação do Instituto Nacional Francês de Saúde (Inserm). Com um pós-doutoramento concluído na Harvard Medical School, Caude tem conduzido, durante mais de 20 anos, investigação centrada na forma como as sugestões ambientais são traduzidas em informação genética, especificamente em doenças genéticas raras em crianças.

    Na sua apresentação, a geneticista francesa acusou que foram desrespeitadas boas práticas científicas e cometidas graves violações de ética médica, que incluiu vacinação sem o devido consentimento do paciente ou administração deste medicamento de uma forma obrigatória, sabendo-se que podem causar reacções adversas, e cujos efeitos no longo prazo são ainda desconhecidos.

    Alexandra Henrion Caude, geneticista, directora de Investigação no Instituto Nacional Francês de Saúde.

    Outro dos temas abordados foi a criação de uma “indústria” de combate à (alegada) desinformação, e que se transformou numa arma que serviu para suprimir visões divergentes das do poder político e económico.

    “Tem havido desde 2020 uma tremenda concentração do poder e um ataque à democracia”, defendeu Piers Robinson, cientista político e co-diretor da Organização de Estudos de Propaganda.

    Para este especialista britânico em media, desde 2020 registaram-se “níveis sem precedentes de propaganda”, com recurso, inclusive, a ferramentas de coacção e de “assassinato de carácter e difamação de todos os que contrariaram ou questionaram” a gestão da pandemia,

    “Tem-se assistido nesta pandemia a níveis de propaganda sem precedentes, envolvendo não apenas a sua promoção, mas também o silenciamento do debate, pela via da censura, da difamação e da pressão coerciva”, disse Robinson. “Há indicações de que os desenvolvimentos legislativos em torno da definição de online harm [informação online que pode causar prejuízo] e a ascenção de uma indústria de anti-desinformação vai efetivamente constituir um nível de controlo em esferas públicas anteriormente democráticas”, acrescentou.

    Este cientista político alertou ainda que estas tendências têm de ser “compreendidas no contexto de estruturas emergentes – como a agenda de resposta e prevenção de pandemias – a um nível global e associadas a uma concentração de poder político e económico”.

    No caso da difamação e assassinato de carácter, Piers Robinson deu o exemplo dos epidemiologistas que dinamizaram e assinaram a Declaração de Great Barrington, que foram alvo de difamação e perseguição por questionarem e se oporem a medidas adoptadas por governos e autoridades na gestão da pandemia. Entre os epidemiologistas que encabeçaram esse movimento estavam Jay Bhattacharya (Universidade de Stanford), Sunetra Gupta (Universidade de Oxford) e Martin Kulldorff (Universidade de Harvard), que foram censurados e alvo de censura mediática.

    Piers Robinson, cientista político.

    Robinson considerou ainda que a indústria de fact-checkers – que não são independentes, por estarem dependentes de orientações sobre as matérias sobre as quais escrevem e dependem financeiramente – está a servir para reforçar ainda mais a concentração de poder que tem ocorrido desde 2020. Segundo este especialista, esta “indústria dos verificadores de factos” está a servir para eliminar opiniões e informações verdadeiras.

    Piers Robinson lamenta também que a criação de legislação – supostamente para combater a desinformação –, como a lei dos Serviços Digitais na União Europeia, possa vir a eliminar informação verdadeira que acaba por ser “eliminada” por não beneficiar políticos e autoridades.

    E criticou ainda que muitos media mainstream têm sido usados para espalhar medo, aumentar falsamente a percepção de ameaças e ajudar ao assassinato de carácter e difamação de todos os que contradigam aquilo que governos e autoridades desejam.

    E também a eliminar “temas delicados” do contacto do público,

    Aliás, o PÁGINA UM constatou que nenhum órgão de comunicação social da denominada imprensa mainstream fez a cobertura noticiosa deste congresso, apesar de terem participado diversos cientistas e médicos nacionais – entre os quais os ex-bastonários Germano de Sousa e José Manuel Silva, e ainda Fernando Nobre, presidente da AMI, e Joaquim Couto, ex-presidente da autarquia de Santo Tirso – e especialistas internacionais, incluindo mesmo Michael Levitt, galardoado como Prémio Nobel da Química em 2013.

    Nota: 03/11/2022 – Germano de Sousa não esteve presente à última hora por motivos de saúde.

  • Exclusivo P1: A Manuel Pizarro Consultadoria vai vender loja… a Manuel Pizarro

    Exclusivo P1: A Manuel Pizarro Consultadoria vai vender loja… a Manuel Pizarro


    Ficará tudo em casa. Ou perto de casa. A loja adquirida em 2020 pela empresa do ministro da Saúde, na freguesia portuense de Ramalde, vai ser comprada agora pelo próprio Manuel Pizarro. A informação foi revelada esta sexta-feira pelo gabinete do Ministério da Saúde ao PÁGINA UM, após vários dias de insistência.

    “O comprador será o próprio Manuel Pizarro, por ser a solução que permite, de forma mais célere, concretizar a venda e dissolver a empresa”, diz fonte oficial do Ministério da Saúde. Sem resposta ficam, contudo, várias questões pertinentes em redor da aquisição desta loja com 51,20 metros quadrados, e não de 31,80 metros quadrados como consta no esclarecimento revelado à imprensa pelo gabinete de Manuel Pizarro durantee sta semana.

    Prédio onde se localiza a loja comprada pela Manuel Pizarro Consultadoria em 2020,. Manuel Pizarro vai comprar a si próprio.

    Recorde-se que o imóvel em causa localiza-se no número 360 da Avenida das Congostas, na freguesia de Ramalde, a poucos metros da residênca oficial do ministro da Saúde na cidade do Porto. Nos últimos dois anos, esta zona do Porto beneficiou de uma forte valorização, com preços por metro quadrado a superarem os mil euros.

    Nessa medida, vender a loja a um terceiro com demasiada rapidez poderia ser um mau negócio pessoal para o ministro. A venda do imóvel é fundamental para dissolver uma empresa que necessita de realizar uma liquidação integral dos seus activos, ou seja, que tudo fique sob a forma de dinheiro corrente para que sejam cobertos eventuais passivos e depois distribuído o remanescente pelos sócios.

    O ministro da Saúde não revela a quem foi feita a compra em 2020, nem o mês da sua concretização, nem o valor em causa. Nem qual o valor da venda a si próprio. O PÁGINA UM fez no dia 4 de Outubro um pedido de consulta do registo predial permanente da fracção em posse da Manuel Pizarro Consultadoria, para conhecer o histórico das transacções, mas o Instituto dos Registos e do Notariado (INR) não concedeu acesso ao fim de três dias. O tempo de resposta é de dois dias, conforme se refere no recibo do pedido.

    Embora as transacções não sejam assim (ainda) públicas, a loja consta no activio da Manuel Pizarro Consultadoria como valendo cerca de 35 mil euros. Nos últimos dois anos, esta zona do Porto beneficiou de uma forte valorização, com os preços por metro quadrado a superarem os mil euros.

  • Afinal, a empresa do ministro da Saúde esteve sempre activa em 2020 e 2021

    Afinal, a empresa do ministro da Saúde esteve sempre activa em 2020 e 2021

    O PÁGINA UM foi olhar para a empresa de consultadoria que Manuel Pizarro garante não ter actividade desde Março de 2020. Mas, na verdade, actividade houve: o ministro fartou-se de indicar o 514710659, o número fiscal da sua empresa, para a carregar de despesas, de modo a obter benefícios fiscais, como a dedução do IVA e possíveis reportes de prejuízos em exercícios futuros.


    A empresa de consultadoria de Manuel Pizarro manteve actividade ao longo dos anos de 2020 e 2021, ao contrário das declarações do novo ministro da Saúde ao jornal Público.

    Uma análise aos quatro relatórios e contas da Manuel Pizarro Consultadoria, Lda. – criada em 15 de Março de 2018 pelo governante em parceria com Artur Rocha Viana (quota de 30%) – revela que esta sociedade, mesmo não tendo receitas ao longo de 2021, registou sempre as suas despesas nos dois últimos anos do exercício. Ou seja, a empresa do ministro pode não ter facturado nada desde Março de 2021, como declarou ao Público, mas ele nunca se esqueceu de pedir facturas em compras e serviços para as meter como despesas na dita. E não foram poucas.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde e actual gerente da Manuel Pizarro Consultadoria, Lda., da qual detém 70% do capital social.

    Com efeito, no ano passado, em que não houve receitas, foram apresentadas despesas em fornecedores e serviços externos de 10.217 euros, enquanto em 2020 surge um montante de 17.698 euros, num período em que as receitas foram de 26.000 euros.

    O montante destas despesas em fornecedores e serviços externos no ano de 2020 indicia que estas abarcaram também os meses dos segundo, terceiro e quatro trimestres, quando a empresa já deixara de facturar, ou seja, de obter receitas. Em 2018 e 2019, a Manuel Pizarro Consultadoria facturou exactamente 58.000 e 64.000 euros, respectivamente, com despesas em fornecedores e serviços externos de 19.537 euros e 29.135 euros, respectivamente.

    Como as despesas com pessoal foram relativamente baixas (cerca de 11 mil euros nos dois anos), os lucros foram razoáveis: 26.361 euros em 2018 e 21.820 anos em 2019. Em 2020 baixaram para 5.710 euros.

    Manuel Pizarro declarou ontem ao Público que a “empresa não tem actividade desde Março de 2020”.

    E foi esse bom desempenho que permitiu a Manuel Pizarro adquirir o imóvel que o ministro diz agora ser o único empecilho para a dissolução imediata da empresa. O imóvel é, na verdade, uma pequena loja no número 360 da Avenida das Congostas, na freguesia portuense de Ramalde – a poucos metros da residência do ministro da Saúde – com uma área de 51,20 metros quadrados, e não de 31,80 metros quadrados como diz o esclarecimento ontem enviado à imprensa pelo gabinete de Manuel Pizarro.

    O ministro da Saúde ainda não respondeu ao PÁGINA UM sobre os contornos desta aquisição, que apenas surge no balanço da sua empresa em 2020, ou seja, no exacto ano em que Manuel Pizarro alega que a sua empresa deixou de ter actividade.

    O preço de compra desta loja em 2020 não foi revelado pelo gabinete do ministro, embora esteja reconhecido um montante na ordem dos 35 mil euros nos balanços de 2020 e 2021 da Manuel Pizarro Consultadoria. Nos últimos dois anos, esta zona do Porto beneficiou de uma forte valorização, com os preços por metro quadrado a superarem os mil euros.

    Prédio onde se localiza a loja comprada pela Manuel Pizarro Consultadoria em 2020, e que é agora o “empecilho” para a dissolução imediata da empresa

    A manutenção de uma sociedade sem quaisquer receitas não é ilegal, e esta pode sempre apresentar livremente despesas. Por exemplo, nada invalida que uma empresa fique dois ou mais anos sem facturar e depois consiga um contrato. Ou seja, a sociedade tem actividade fiscal, embora seja passiva. Aliás, uma empresa como a Manuel Pizarro Consultadoria – que o ministro se apressa a querer dissolver –, tem direito a pedir reembolsos de IVA.

    Sem facturar e com despesas, obviamente a sociedade terá prejuízos, como se verificou com a empresa do ministro no ano passado, que apresentou resultados líquidos negativos de 11.855 euros. Porém, como seria o caso da Manuel Pizarro Consultadoria, a dissolução não seria a melhor opção financeira.

    Na verdade, se um empresário não necessitar para a sua vida quotidiana dos lucros adquiridos nos anos anteriores – e ficarem acumulados no capital próprio da sociedade –, pode sempre ir desviando para o seu “bolso” o valor das despesas que imputar à empresa, tais como as despesas pessoais compatíveis com actividade profissional (alimentação, alojamento, viagens, etc.).

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    Os prejuízos acumulados por essa via podem acabar por ser um bónus no futuro. Se a empresa recomeçar a actividade e passar a ter novamente lucros – mesmo que com outros sócios e outra designação – pode usufruir de um reporte fiscal, ou seja, os prejuízos acumulados nos cinco anos anteriores serão abatidos à matéria colectável.

    Este estratagema tem sido usado por vários empresários, uma vez que pode mesmo ser bastante lucrativo vender uma sociedade sem facturação e sem passivo relevante (sem dívidas à banca, ao Estado ou a fornecedores, por exemplo) e com alguns anos de prejuízos por força da contabilização de despesas pessoais compatíveis com actividade profissional.

    Como nessa circunstância, esses prejuízos “comem” apenas o capital próprio, a empresa acaba potencialmente por valer muito mais do que o capital próprio deduzido do eventual passivo. Por uma simples razão: um eventual comprador (ou os sócios originais, em caso de reactivação da facturação) tem ali uma chance de reduzir a matéria colectável se conseguir colocar a empresa a funcionar com bom lucro. A título de exemplo, os 11.855 euros de prejuízo da Manuel Pizarro Consultadoria apenas no ano passado têm um “valor potencial” de até quase 3.320 euros. Porém, com a dissolução da empresa, Manuel Pizarro (ou o seu sócio Artur Rocha Viana), essa possível benesse extingue-se.

    O PÁGINA UM colocou um conjunto de questões ao ministro da Saúde sobre este e outros assuntos relacionados com a sua empresa, mas ainda não obteve resposta.

  • Empresa de marido de Ana Abrunhosa só facturou 5.400 euros em 2021

    Empresa de marido de Ana Abrunhosa só facturou 5.400 euros em 2021

    Em artigo de opinião no Público, Ana Abrunhosa diz que Thermalvet estava “disposta a assumir a totalidade do investimento”. Mas em 2021, a empresa do marido da ministra da Coesão Territorial não recebeu ainda o financiamento, e pouco fez, excepto pagar ordenados e criar um impalpável activo intangível. E facturou meros 5.400 euros.


    Engenharia financeira e prejuízos – esta é a realidade empresarial da Thermalvet, a empresa de Idanha-a-Nova dominada por António Trigueiros de Aragão, e que conta como sócio o chinês Zhu Xiaodong, condenado a três anos e três meses de pena suspensa no caso dos “vistos Gold”, como o PÁGINA UM divulgou em primeira-mão na passada quinta-feira.

    De acordo com a análise do PÁGINA UM aos relatórios e contas dos últimos exercícios (2020 e 2021) da Thermalvet, criada em Outubro de 2020, a empresa de Trigueiros de Aragão e Zhu Xiaodong praticamente não teve actividade. Em todo o ano de 2021, as vendas e prestações de serviços ascenderam aos 5.400 euros.

    Ana Maria Pereira Abrunhosa Trigueiros de Aragão é ministra da Coesão Territorial desde Outubro de 2019

    Na verdade, a empresa não esteve inteiramente a trabalhar para o “boneco”, porque do ponto de vista contabilístico surge um montante: 62.629 euros em trabalhos para a própria entidade, mas foi para a “construção” de um activo intangível. Se assim não fossem a Thermalvet teria apresentado um prejuízo superior a 67 mil euros, a acrescentar aos 15mil negativos em 2020.

    Ora, mas os activos intangíveis – que estarão relacionados, no caso da Thermalvet, com patentes dos produtos veterinários com recurso a água termal – são activos bastante fluídos, uma vez que representam bens não-monetários sem substância física, sobre os quais pode valer tudo desde que haja imaginação.

    Por exemplo, uma empresa pode contabilizar um montante que corresponde à suposta avaliação da sua marca, ou de uma patente ou software ou até mesmo passes de jogadores. O problema da adequada mensuração dos activos intangíveis surge que quando a própria empresa os sobrevaloriza, e o valor desses activos não são reconhecidos por terceiros.

    António Trigueiros de Aragão, empresário e marido da ministra da Coesão Territorial

    Neste caso, ao ter nas suas contas um activo que vale na realidade menos do que o valor que consta no relatório e contas da sociedade, a empresa tem de reconhecer, mais tarde ou mais cedo, imparidades – ou seja, previsão de perdas devido à diferença entre o valor real do ativo intangível e a sua avaliação feita pela empresa. E pode ser o descalabro financeiro.

    Um outro aspecto que transparece das contas é que a Thermalvet apenas teve a sua candidatura de cerca de 132 mil euros aprovada em 2021, mas as verbas não foram ainda recebidas naquele ano.

    Em todo o caso, do ponto de vista contabilístico, a simples aprovação da candidatura permitiu equilibrar as contas da empresa de Trigueiros de Aragão, uma vez que pôde ser reconhecido um diferimento e, mesmo sem entrada de dinheiro, o activo da empresa aumentou em 132 mil euros.

    Tudo isto conjugado, fez com que a Thermalvet acabasse 2021 com um prejuízo relativamente pequeno (5.018 euros), mesmo se os encargos com pessoal tenham “limpado” cerca de metade do montante da candidatura aos fundos comunitários.

    Com efeito, mesmo sem actividade relevante, ao longo de 2021 a Thermalvet teve 65.599 euros em gastos com pessoal, mesmo com apenas dois empregados, um dos quais a tempo parcial.

    Hoje, a ministra Ana Abrunhosa tentou esvaziar, em artigo de opinião no Público, salientando que “o projeto [da Thermalvet] arrancou depois da submissão da candidatura, no dia 1 de novembro de 2020, antes de obter qualquer apoio, não porque o meu marido soubesse que ia ganhar ou qualquer outra razão pérfida, mas porque a empresa acreditava no potencial comercial do projecto e estava disposta a assumir a totalidade do investimento.”

    Ana Abrunhosa acrescentou ainda ser esta “uma prática normal em empresas com capacidade financeira e que pode ser comprovada através de consulta à página do Portugal 2020, onde se encontram variadíssimos exemplos de projetos que iniciaram a execução antes de terem apoios aprovados.”

  • Empresa do marido da ministra da Coesão Territorial tem sócio condenado por corrupção activa no caso dos ‘vistos Gold’

    Empresa do marido da ministra da Coesão Territorial tem sócio condenado por corrupção activa no caso dos ‘vistos Gold’

    A THVM – Thermalvet, dominada por empresas de António Trigueiros de Aragão, marido de Ana Abrunhosa (que adoptou os apelidos do cônjuge), tem como sócio um dos condenados no caso dos “vistos Gold”. Zhu Xiaodong, bem como a sua mulher Zhu Baoe, foram sentenciados por corrupção activa a mais de três anos de prisão, com pena suspensa. António Trigeiros de Aragão, cujas empresas também detêm as Termas de Monfortinho, adquiridas após o colapso do BES, está associado a mais empresários chineses, através da Xipu, que também recebeu fundos comunitários sob tutela da mulher.


    Diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és. Esta máxima, se aplicada ao marido da ministra da Coesão Territorial, deixa sinais que não abonam a favor do empresário que está atualmente debaixo dos holofotes. António Trigueiros de Aragão embora sendo um conhecido empresário albicastrense, que detém a Fábricas Lusitana da conhecida farinha Branca de Neve tem estado agora na ribalta após o Observador ter noticiado que duas das suas empresas receberam fundos comunitários já quando a sua mulher, Ana Abrunhosa, detinha a tutela das entidades que gerem os fundos comunitários.

    Uma das empresas é a Thermalvet, controlada quase na totalidade por entidades na esfera da família Trigueiros de Aragão. O único sócio fora do seio desta ancestral família albicastrense é o empresário chinês Zhu Xiaodong, casado com Zhu Baoe, com residência em Cascais, no número 34 da Travessa do Flamingo, na Quinta da Bicuda.

    Ana Maria Pereira Abrunhosa Trigueiros de Aragão é ministra da Coesão Territorial desde Outubro de 2019

    Trata-se do casal que viu o Tribunal da Relação confirmar-lhes, em Junho de 2020, a condenação por co-autoria material de um crime de corrupção activa na Operação Labirinto, um caso judicial envolvendo uma rede ilegal dos “vistos Gold”. Zhu Xiaodong foi condenado a três anos e cinco meses de prisão, enquanto a mulher a três anos e três meses, em ambos os casos com as respectivas penas suspensas.

    Recorde-se que a Operação Labirinto teve também como réu o antigo ministro social-democrata da Administração Interna, Miguel Macedo, que acabou absolvido, tal como Jarmela Palos, ex-director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

    Já o ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado António Figueiredo, viu então ser-lhe agravada a sua pena para cinco anos, mas suspensa pelo mesmo período. Também a antiga secretária-geral do Ministério da Administração Interna Maria Antónia Anes, foi condenada a uma pena suspensa de três anos e cinco meses de prisão pela autoria material de um crime de corrupção passiva para prática de acto ilícito.

    De acordo com o noticiado pelo Observador, a Thermalvet viu aprovada uma candidatura para receber cerca de 133 mil euros. O projeto em questão, que teve início a 1 de Novembro de 2020, será financiado pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural e visa desenvolver “produtos inovadores de uso veterinário” com água termal. Mas a empresa foi criada a 14 de Outubro de 2020, apenas 15 dias antes do início da execução do projeto, e quando Ana Abrunhosa já era ministra no Governo de António Costa.

    A Thermalvet, ao contrário do referido pelas notícias de ontem, é completamente dominada pela família da ministra da Coesão Social. Com efeito, a empresa, uma sociedade por quotas, com sede nas Termas de Monfortinho, tem um capital social de apenas 25 mil euros, repartido por cinco sócios, todos com 20%: Zhu Xiaodong, o próprio marido da ministra da Coesão Territorial, a TRU SGPS e a Multialimenta SGPG (ambas dominadas pela família Trigueiros de Aragão) e ainda a Raúl César Ferreira Herdeira S. A., uma consultora especializada em propriedade industrial que tem António Trigueiros de Aragão como presidente do Conselho de Administração.

    Outra empresa da esfera da família Trigueiros de Aragão também recebeu fundos comunitários, neste caso no valor de 66.015 euros, através do programa Compete 2020, tutelado pelo Ministério da Economia.

    Trata-se da empresa Xipu, criada em 2016 para adquirir as Termas de Monfortinho então na posse do Banco Espírito Santo, que deixou esta estância à beira do colapso , cuja estranha denominação tem uma origem sínica. Xipu é uma cidade chinesa de onde será natural Lu Shengrong, um dos sócios originais desta empresa. Lu Shengrong vive nas Ilhas Baleares e chegou também a ser investigado no âmbito do caso dos “vistos Gold” pelas suas ligações empresariais a Zhu Xiaodong e mulher.

    António Trigueiros de Aragão, empresário e marido da ministra da Coesão Territorial

    Apesar de adquirir todas as infraestruturas nas Termas de Monfortinho e com necessidade de investimento de dois milhões de euros -, a Xipu nasceu apenas com um capital social de 5.000 euros, dos quais 1.000 euros de Lu Shengrong.

    Contudo, em Março do ano passado, a Xipu registou um aumento considerável de capital, para os 210 mil euros, através da incorporação de suprimentos, onde o domínio das empresas da esfera do marido de Ana Abrunhosa saiu muito reforçado.

    Com efeito, a TRU ficou com um capital de 10% da Xipu, a Multialimenta com 30% e a Raúl César Ferreira (Herdeira) com 40%. Entrou nesta sociedade, por troca da saída formal de Lu Shengrong, um novo sócio chinês, que ficou com 20% da empresa. De seu nome Zhu Chunxing, o PÁGINA UM não conseguiu ainda apurar se tem relações familiares com Zhu Xiaodong.

  • Partido Socialista está em falência técnica desde 2013

    Partido Socialista está em falência técnica desde 2013

    Mesmo tendo recebido 52 milhões de euros de subvenção pública nos últimos 10 anos, o Partido Socialista está com os seus capitais próprios negativos há nove ininterruptos anos. Desde que António Costa assumiu a liderança do país, a situação financeira do seu partido tem melhorado – como sempre que o PS está no Governo –, mas mesmo assim vai precisar de mais seis anos no poder para o partido da rosa sair do vermelho.


    O Partido Socialista (PS) – que governa ininterruptamente Portugal desde Novembro de 2015 – apresenta capitais próprios negativos desde 2013, apesar de ter recebido mais de 52 milhões de euros na última década de subvenção pública do Estado, que constitui actualmente cerca de três quartos das suas receitas.

    Esta é a principal conclusão de uma análise financeira do PÁGINA UM às contas dos partidos políticos desde 2003, que se encontram arquivadas na Entidade das Contas e Financiamentos Políticos. Nas próximas semanas serão apresentadas análises similares sobre os principais partidos políticos.

    António Costa, secretário-geral do Partido Socialista e primeiro-ministro de Portugal.

    Em termos práticos, esta situação financeira do partido cujo secretário-geral é o primeiro-ministro português significa que se encontra em falência técnica há já nove anos, porquanto o valor do passivo é superior aos activos desde 2013.

    Numa acepção economico-financeira não significa que esteja em via de ficar insolvente, ou de falir, até porque desde 2016 os seus resultados positivos têm sido positivos, embora ainda muito insuficientes para tapar o “buraco” onde ainda se encontra. De facto, o PS só não abre falência por via dos contínuos financiamentos externos, de instituições bancárias, e do protelamento de pagamentos.

    Na verdade, pese embora os lucros dos últimos anos, desde 2013 o passivo do PS tem estado quase sempre a rondar os 20 milhões de euros. Esta é sobretudo ainda uma herança de 2013. Então na oposição ao Governo de Pedro Passos Coelho, o PS ficou endividado de forma repentina, tendo o seu passivo pulado de cerca de 8,6 milhões de euros para 29 milhões, sobretudo por causa da degradação da rubrica relativa às estruturas partidárias e campanhas eleitorais. Nunca mais recuperou a situação anterior, contrariando o que sucedera em 2009. Então em pleno mandato de José Sócrates, o PS subiu o seu passivo de 3,8 milhões de euros em 2008 para os 35,8 milhões em 2009, mas desceria depois, no ano seguinte para os 7,1 milhões.

    Capital próprio (em euros) do Partido Socialista desde 2003. Fonte: Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

    Com variações ao longo dos últimos nove anos, o seu passivo nunca baixou dos 18 milhões de euros, situando-se no final de 2021 em quase 22,9 milhões, quase mais 3 milhões do que em 2020.

    Uma parte considerável da degradação das contas, vem assim directamente do elevado passivo, devido ao pagamento de juros. Por exemplo, no ano de 2012 – antes do endividamento de 2013 – o PS gastou um pouco menos de 220 mil euros em juros e gastos similares. No ano passado chegou aos 410 mil euros.

    No entanto, a situação financeira até tem estado em recuperação desde que o PS retomou as rédeas do poder, estando agora com menores custos com pessoal do que quando estava na oposição, o que se compreende por ser habitual as estruturas partidárias se encaixarem no aparelho do Estado. Por exemplo, em 2013, na oposição, os gastos com pessoal foi de quase 2,5 milhões de euros, enquanto no ano passado (no poder) se cifraram apenas nos 1,8 milhões de euros.

    Estar no Governo tem sido, aliás, a tábua de salvação das contas do PS. Além da redução nos custos de pessoal, também os fornecimentos e serviços externos diminuíram. Em 2012 e 2013 – em pleno mandato de Passos Coelho –, o PS gastou, em cada um desses anos, cerca de 4,3 milhões de euros nessa rubrica. Nos dois mais recentes anos, no poder, as contas para essa rubrica situam-se em redor dos 3 milhões de euros.

    Passivo (em euros) do Partido Socialista desde 2002. Fonte: Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

    Mesmo se os actos eleitorais – que coincidem sempre com um aumento significativo de donativos mas também de custos – não são necessariamente um bom negócio para os partidos, o day after tem sido importante no caso do PS: poder significa desafogo financeiro; oposição resulta em consequente aflição financeira nos anos seguintes. Até porque as subvenções estatais estão associadas a esta relevante variável.

    Com efeito, analisando os resultados líquidos desde 2003, observa-se que nos 15 anos em que o PS esteve no poder em grande parte ou na totalidade do ano económico (entre 2005 e 2010, e desde 2016), apenas em 2009 registou prejuízo (quase 2,2 milhões de euros). Nos outros, os lucros variaram entre os 264 mil euros (em 2018) e os 2,3 milhões (em 2006).

    Em todo o caso, os seis anos económicos completos de José Sócrates na liderança do PS foram em média melhores do que os seis anos de António Costa: 1,1 milhões de euros contra 468 mil euros. No entanto, Sócrates teve um ano económico completo de prejuízo (2006) e deixou uma herança pesada quando em Junho de 2011 “entregou” o poder ao PSD. Nesse ano, o PS registou um prejuízo de quase 3,2 milhões de euros – mesmo assim menor do que os de 2012 e 2014, quando António José Seguro foi líder.

    Resultados líquidos (em euros) do Partido Socialista desde 2002. Fonte: Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

    Em contraste, nos anos económicos (ou na maior parte dos meses) em que o PS se encontrava no estatuto de oposição, os resultados financeiros foram, geralmente um desastre: apenas em 2012 não ficaram no vermelho – com um lucro de quase 590 mil euros – mas depois do “desastre” de 3,1 milhões de euros de prejuízo no ano anterior, que obrigou, em consequência, a um corte para quase metade nas despesas com fornecimentos e serviços externos.

    Mesmo assim, ao ritmo em que os lucros dos últimos seis anos – uma média anual de 469 mil euros –, o PS vai precisar de mais seis anos para que os capitais próprios fiquem novamente positivos. Mas têm de ser sempre seis anos de poder, porque na oposição a situação tende a piorar, como mostra a sua História.