Num cenário onde a credibilidade política se tem esvaído ao sabor dos conflitos de interesse e promiscuidades em redor da alteração da Lei dos Solos – com a possibilidade arbitrária de se transformar terrenos rurais pouco valorizados em áreas urbanizáveis de elevado valor, criando-se mais-valias de um dia para o outro –, ontem aplicou-se, durante o debate da moção de censura do Chega, um adágio: “fala o roto do nu”.
Hugo Soares defendeu Luís Montenegro e acusou deputados do Chega de ter imobiliárias. Afinal, com a sua mulher, também detém uma consultora que também compra e vende imobiliário.
Com efeito, depois de o secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Hernâni Dias, se ter demitido após se saber que criara duas empresas imobiliárias; depois da revelação da existência de uma empresa familiar de consultadoria (a Spinumviva) de Luís Montenegro e dos seus terrenos rurais; depois de o ministro da Coesão Territorial ter confessado que vendera recentemente a sua quota de uma empresa imobiliária; e depois de a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, e da ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, também terem entrado no lote de “governantes imobiliários”, eis que surgiu o contra-ataque: afinal, até no Chega havia deputados “promíscuos”. E logo quatro.
Na verdade, eram três – como mais tarde se corrigiu –, porque a empresa do deputado Pedro Pessanha (a PP Gest) foi entretanto dissolvida. E a empresa de José Dias Fernandes estará sedeada em França – portanto, sem benefícios directos na Lei dos Solos. Mas duas sempre são duas, claramente na área do imobiliário. Mas esse nem é o maior “problema” descoberto pelo PÁGINA UM.
No caso da empresa unipessoal do deputado Filipe Melo, foi criada em Braga no final de 2016, com um capital de 5.000 euros, e no seu objecto social incluem-se “actividades de consultoria para os negócios e a gestão; realização de créditos [dentro de limites legais]; promoção imobiliária; e compra e venda de imóveis”.
Aguiar-Branco tem uma participação de quase 40% de uma empresa do sector imobiliário.
Mas as actividades desta empresa – formalmente denominada António Filipe Dias Melo Peixoto, Unipessoal, Lda. – são completamente desconhecidas. O deputado do Chega não entregou a Informação Empresarial Simplificada (IES) de 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021, 2022 e 2023 – são oito anos de actividade “fantasma”, que lhe poderão custar multas e vistorias da Autoridade Tributária.
Quanto à empresa de Felicidade Vital, denominada LXDomi, foi criada também em 2016, tendo a deputada do Chega quotas de 75% com o seu marido, e tem “apenas” um ano de atraso na entrega do IES. Em todo o caso, nas demonstrações financeiras de 2022 consultadas pelo PÁGINA UM, a LXDomi registou uma actividade residual, com prestação de serviços de 18.300 euros, e até está em falência técnica, com capitais próprios negativos de 6.655 euros.
Mas se o partido de André Ventura não sai nada bem na “fotografia” deste RusticGate, pior fica o denunciador das “promiscuidades imobiliárias” do Chega: Hugo Soares, o líder parlamentar dos sociais-democratas que ontem solicitou ao presidente do Parlamento, Aguiar-Branco, a divulgação dos interesses empresariais de Filipe Melo, Pedro Pessanha, Felicidade Vital e José Dias Fernandes.
E porquê?
Alteração da Lei dos Solos do Governo Montenegro está férida de morte com tantas polémicas, mas o RusticGate revela sobretudo negócios de ‘part time’ pouco transparentes dos políticos.
Porque, e parecendo uma triste anedota, tanto Hugo Soares como José Pedro Aguiar-Branco são de empresas com actividade no sector imobiliário. Com efeito, Hugo Soares, bastante próximo de Luís Montenegro, criou em 2020 a Capítulo Universal com a sua mulher, Patrícia Lopes Mendes. Com um capital social de 5.000 euros, a empresa começou por estar sedeada em Caminha, mas mudou-se entretanto para Braga. E tem um objecto social quase decalcado da Spinumviva: além de actividades de consultoria, surge a inevitável “gestão e comércio de bens imóveis próprios ou de terceiros, incluindo a compra para revenda”.
A empresa de Hugo Soares não tem facturado tanto como a de Luís Montenegro, mas aparenta ser um bom “pé-de-meia”. Nas últimas contas apresentadas, a Capítulo Universal facturou 164.000 euros – nem um cêntimo a mais nem a menos – e um lucro de quase 69 mil euros, tendo Hugo Soares declarado que recebeu 19 mil euros como gerente. Sem distribuição de lucros – para não haver aplicação de impostos –, o presidente do grupo parlamentar do PSD tem lucros acumulados de cerca de 285 mil euros, um pecúlio de quatro anos bastante razoável para quem investiu cinco mil euros.
Quanto a Aguiar-Branco, conhecido pela sua actividade de advogado, também mete o dedo no imobiliário. De entre as três empresas em que declara participações, uma delas – a Portocovi – tem actividade no sector imobiliário. Com uma participação minoritária do social-democrata (38,97%), a Portocovi tem sede em Lisboa, um capital próprio de 29 mil euros e no seu objecto social está “a compra e venda de bens móveis e imóveis, arrendamento, gestão e administração de bens próprios ou alheios e prestação de serviços”.
Extracto do registo da Capítulo Universal, detida por Hugo Soares e a sua mulher, onde consta a “gestão e comércio de bem imóveis próprios ou de terceiros”.
Na análise às demonstrações financeiras feita pelo PÁGINA UM, esta empresa não tem uma elevada facturação (63.200 euros em 2023), mas acumula lucros de quase 195 mil euros. Na aparência, tendo em conta que lhe foi entretanto “associado” um activo fixo tangível de 631 mil euros (um imóvel) com o correspondente empréstimo bancário de 391 mil euros, a Portocovi servirá sobretudo para obter benefícios fiscais, por via das depreciações e gastos com juros. Este tem sido, aliás, um expediente legal de muitos políticos e empresários, pelos benefícios fiscais que incorpora, mas também constitui um risco se houver falência.
Seja como for, a ‘colecção’ de políticos de quase todos os quadrantes com interesses imobiliários coloca a alteração da Lei dos Solos a caminho de uma ‘morte certa’, excepto, claro, se a impunidade política já estiver bem enraizada numa sociedade passiva e dócil. Até porque, na verdade, os bons negócios não são os que se fizeram antes da alteração da Lei dos Solos, mas sim aqueles que se preparam agora. No urbanismo, não se enriquece demasiado construindo onde antes se podia construir, mas sim construindo onde antes não se podia construir.
O primeiro-ministro Luís Montenegro possui 46 prédios rústicos na freguesia do Rabal, em pleno Parque Natural de Montesinho, e pode vir a beneficiar economicamente da alteração da Lei dos Solos, que permite, em determinadas condições, que as autarquias autorizem construções. O líder do Governo possui ainda, além de cinco prédios urbanos, incluindo a polémica vivenda em Espinho, mais três prédios rústicos na freguesia de Barro, no concelho de Resende, um dos quais um terreno de 4,5 hectares, com cultura de regadio, uma vinha, pastagens, mato e árvores de fruto.
O Parque Natural de Montesinho, criado em 1979, é um santuário natural e uma das mais extensas áreas protegidas de Portugal, estendendo-se por 75 mil hectares nos concelhos de Bragança e Vinhais, com uma paisagem diversificada, onde se alternam serras, vales profundos e vastos planaltos, moldados por uma interação secular entre a Natureza e as práticas agrícolas tradicionais. Além de bem preservados carvalhais, predominam bosques de castanheiros e azevinhos. Porém, no seu mosaico de habitats habitam importantes populações de lobo ibérico, símbolo da região, de corço e da lontra, para além de águia-real, tartaranhão-azulado e picanço-real.
Luís Montenegro herdou terrenos do avô e pai, naturais desta aldeia de Bragança.
De acordo com a declaração do primeiro-ministro na Entidade para a Transparência – que agora é responsável por disponibilizar informações sobre o património e rendimento de titulares de cargos –, as 46 parcelas que Montenegro possui no concelho de Bragança não se destacam pelo seu valor patrimonial nas Finanças, que historicamente têm valores simbólicos. Com efeito, na zona de Montesinho, os valores patrimoniais estão compreendidos entre os 10 cêntimos, numa parcela de apenas 90 metros quadrados, e os 86,1 euros, para uma parcela de 5.400 metros quadrados (um pouco mais de meio hectares).
Contudo, se se considerar as parcelas de Montenegro naquela área protegida – todas de uso ‘passivo’, ou seja, são pastagens, lameiros ou áreas de arvoredo –, identificam-se várias com potencial de uso urbano, se se considerar a possibilidade de transformar prédios rústicos em áreas urbanizáveis.
De facto, de entre as 46 parcelas em Rabal, o PÁGINA UM identificou 29 com uma superfície susceptível de se poder edificar uma vivenda de mais de 150 metros quadrados com um índice de construção de 0,20. Isto porque, no lote de parcelas, ainda existem algumas que, no sistema de minifúndio daquela região transmontana, ‘exibem’ áreas consideráveis, havendo oito maiores do que meio campo de futebol. A parcela maior nesta zona tem 9.900 metros quadrados (quase um hectare).
Na zona de Resende, além do terreno agrícola de 4,5 hectares, Luís Montenegro tem uma pequena vinha de 470 metros quadrados e uma área de pastagem com oliveiras e vinha de 1.480 metros quadrados.
Embora os preços dos terrenos não urbanizáveis e urbanizáveis em zonas periféricas, como as localizadas em aldeias do concelho de Bragança, não tenham um preço de mercado similar aos de zonas urbanas, em consulta de sites imobiliários os preços podem variar numa proporção de 1 para 2. Ou seja, a ‘migração’ administrativa do uso de solo rural para solo urbano duplica o preço, podendo atingir nesta região entre os 5 e os 10 euros por metro quadrado.
O somatório das áreas das parcelas de Luís Montenegro no Parque Natural de Montesinho atinge os 87.210 metros quadrados. Não existem garantias de que toda esta área seja convertível em solo urbanizável, uma vez que a alteração da Lei dos Solos somente permite que tal ocorra nos perímetros das aldeias. Ou seja, o potencial de alteração depende da localização em concreto dos prédios rústicos. Saliente-se que, ao contrário da sua atitude quando apenas deputado e presidente do PSD, Luís Montenegro não solicitou que a Entidade da Transparência apagasse a inscrição matricial dos prédios rústicos e urbanos de que é proprietário.
Parque Natural de Montesinho no Inverno.
Carlos Aguiar, professor no Instituto Politécnico de Bragança, salienta que nesta zona do Parque Natural de Montesinho, a procura e a oferta de terrenos não segue a linha do mercado das cidades. “É mais uma questão de oportunidade, de alguém que quer vender e alguém que aparece a querer comprar”, salienta, manifestando críticas à alteração da Lei dos Solos por não resolver os problemas da habitação e somente ir buscar áreas com potencial agrícola.
“Pelo facto de determinadas zonas não terem agora uso agrícola, não lhes retira valor; pelo contrário, constitui uma reserva para o futuro, que não apenas se preserva mas que até melhora a fertilidade”, diz Carlos Aguiar.
N.D: Pelas 22:55 fez-se o seguinte acrescento: “Não existem garantias de que toda esta área seja convertível em solo urbanizável, uma vez que a alteração da Lei dos Solos somente permite que tal ocorra nos perímetros das aldeias. Ou seja, o potencial de alteração depende da localização em concreto dos prédios rústicos.”
O primeiro-ministro Luís Montenegro é detentor desde Agosto de 2023 de uma marca registada de vinhos que se insere num projecto pessoal que deverá passar também pela empresa familiar Spinumviva, actualmente no ‘olho do furacão’ por eventuais conflitos de interesses com as alterações da Lei dos Solos. A Spinumviva, com sede na residência do primeiro-ministro em Espinho, tem a viticultura como segundo CAE (Classificação das Atividades Económicas) secundário, descrito antes mesmo da compra e venda de bens imobiliários (terceiro CAE secundário).
Embora no vasto objecto social da Spinumviva se destaque as actividades de consultadoria e mesmo a mediação de seguros e a possibilidade de gestão de bens imóveis (terrenos e edifícios), há uma outra actividade relevante que tem passado de forma discreta: “exploração de recursos naturais e exploração e produção agrícola, predominantemente vitivinícola”.
Ora, Luís Montenegro é, desde Agosto de 2023, detentor da marca Murus, registada no Instituto Português de Propriedade Industrial, sob a classe 33 da Classificação de Nice, que inclui bebidas alcoólicas, excepto cervejas. No entanto, no registo consultado pelo PÁGINA UM é indicado expressamente que a Murus é uma marca de vinhos.
A Murus – que aparentemente nunca teve uso comercial até agora – foi inicialmente registada em 2008 por Virgínia Montenegro Esteves, antiga funcionária da ARS do Norte e mãe do primeiro-ministro. Houve uma renovação de uso exclusivo da marca em Abril de 2018, o que, em princípio, daria para um período de mais 10 anos. Porém, em 18 de Agosto de 2018, seria feita uma transmissão entre mãe e filho, assim ficando Luís Montenegro como proprietário exclusivo da Murus. O actual primeiro-ministro deu como endereço a sua residência em Espinho, também sede da Spinumviva.
A possibilidade de esta marca de Luís Montenegro vir a ser usada futuramente pela Spinumviva é significativa, uma vez que essa autorização pode ser concedida sem grandes formalismos, mesmo se o primeiro-ministro não é, em termos formais, sócio da empresa que criou e do qual foi sócio maioritário e gerente até finais de Junho de 2022, passando as quotas para os filhos e mulher. No entanto, como está casado em comunhão de adquiridos, a sua ligação à Spinumviva mantém-se por essa via.
Registo da Murus em nome de Luís Montenegro.
O PÁGINA UM não conseguiu ainda obter qualquer esclarecimento de Luís Montenegro sobre os seus projectos vitivinícolas actuais e futuros, sabendo-se, de acordo com uma notícia do Correio da Manhã de Agosto do ano passado, ter declarado ser proprietário de 54 prédios urbanos e rústicos. Neste último grupo estão 46 terrenos em Bragança e três em Resende, que aliás poderão vir a ser valorizados pela alteração da Lei dos Solos, que permite que os prédios rústicos sejam transformados, de forma arbitrária, em áreas urbanizáveis.
O PÁGINA UM ainda não conseguiu consultar os registos do primeiro-ministro na Plataforma Electrónica da Entidade para a Transparência, de modo a saber se aí constam as áreas em concreto e se têm actividade agrícola. No entanto, a entidade que agora acolhe as declarações de rendimentos dos políticos exigiu que o PÁGINA UM fundamentasse as razões do pedido, apesar de se ter anexado cópia da carteira profissional.
Em resposta, o PÁGINA UM forneceu a seguinte justificação, ainda sem resposta: “Se a política fosse transparente por vontade própria, este pedido seria desnecessário. Mas como a transparência política é um conceito mais mitológico do que real, peço acesso à informação porque sou jornalista e a teimosia profissional é uma das minhas virtudes.”
Empresa familiar de Luís Montentegro tem uma descomunal margem operacional para uma consultora.
Saliente-se que o PÁGINA UM revelou em primeira-mão – não sendo citado pela SIC que plagiou a notícia – que a Spinumviva registou uma facturação de 67 mil euros em 2021, de 415 mil euros em 2022, ano em que Luís Montenegro deixou formalmente a empresa familiar, e 235 mil euros em 2023, desconhecendo-se aindas contas do ano passado.
A empresa familiar Montenegro registava no final de 2023 um lucro acumulado de 345 mil euros, não tendo sido revelada a lista de clientes para apurar se houve consultadoria na área imobiliária.
Em apenas dois anos de plena actividade, a Spinumviva – a empresa de consultadoria fundada por Luís Montenegro no início de 2021, agora pertencente à mulher e filhos – facturou 650 mil euros e apresentou lucros de cerca de 345 mil euros. Tudo através de prestação de serviços de consultadoria realizada, ao que tudo indica, maioritariamente pelo actual primeiro-ministro, que não respondeu a um conjunto de questões colocada pelo PÁGINA UM. E foram bem pagas: só em 2022, a novel empresa da família Montenegro, com duas pessoas em funções (uma a tempo inteiro e outras a tempo parcial), facturou 415 mil euros, o que dá uma média de 162 euros por hora de trabalho.
Na análise detalhada do PÁGINA UM às demonstrações financeiras da Spinumviva, da qual o primeiro-ministro renunciou à gerência e às quotas em 2022 a favor da mulher e dos dois filhos, existem sinais de inexistência de qualquer património imobiliário ou terrenos com potencial de valorização – os activos fixos tangíveis cifravam-se apenas em 20.550 euros.
Empresa familiar de Luís Montentegro tem uma descomunal margem operacional para uma consultora.
Apesar de o objecto social integrar a compra, venda e arredamento de bens imobiliários, estas actividades surgem com o terceiro e quarto CAE (Classificação das Atividades Económicas), sendo que o CAE principal da Spinumviva é “outras actividades de consultoria para os negócios e a gestão”. Como primeiro CAE secundário aparecem “Outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares não especificadas” e a seguir ainda se indica a “viticultura” como segundo CAE secundário.
Um dos aspectos mais relevantes da empresa da família Montenegro – que no ano da sua criação, em 2021, apenas facturou 67.850 euros – tem sido a sua elevadíssima margem operacional, ou seja, a percentagem dos resultados operacionais face à facturação. Com efeito, apesar do que o nome possa sugerir – Spinumviva evoca, numa raiz latina, uma conjugação da ideia de espinho (e, por associação, a cidade de Luís Montenegro) com vida –, a ainda breve trajetória da empresa tem sido tudo menos espinhosa, revelando-se um verdadeiro mar de rosas.
Se em empresas de consultadoria, esse rácio se situa entre os 15% e os 35%, podendo chegar aos 40% em empresas altamente especializadas, a Spinumviva começou em 2021 por ter logo uma margem operacional de 35,3%, disparou no ano seguinte para 75,3% – com Luís Montenegro a ser ainda gerente e sócio até Junho – e em 2023 ficou pelos 46,2%. Esse desempenho permitiu à empresa, em apenas três anos, acumular lucros de 345 mil euros, descontados salários e despesas. Como não têm sido distribuídos dividendos, Luís Montenegro – que está casado em comunhão de bens como a sua mulher Carla, gerente e detentora de 70% do capital social –, não está obrigado a declarar esses valores.
As demonstrações financeiras da Spinumviva em três anos – as contas de 2024 somente serão apresentadas nos próximos meses, até Julho – não mostram quem são e foram os seus clientes, sendo certo que não surge qualquer contrato público no Portal Base. Mas esta é uma empresa que ‘vive’ dos eventuais pergaminhos e contactos de Luís Montenegro, uma vez que nem sequer tem um site, e tudo indica que a prestação de serviços, pelo menos na primeira fase, tenha sido suportada pelo actual primeiro-ministro. Com efeito, no ano de maior facturação, a empresa tinha apenas um trabalhador a tempo inteiro e outro a tempo parcial, enquanto em 2023, já sem Luís Montenegro como sócio, apresentava três pessoas a tempo inteiro e uma pessoa a tempo parcial, embora como salários baixos para uma consultora (menos de 1.200 euros por mês).
Sendo uma empresa familiar numa área de consultadoria altamente especializada – pela margem operacional –, nada indica que esse know how venha da mulher e dos dois filhos, que são agora os sócios-gerentes. Carla Montenegro tem formação académica como Educadora de Infância e em Ciências das Educação, o filho Diogo faz 20 anos este mês e o filho mais velho, Hugo, conta 23 anos, e terá terminado há poucos meses a licenciatura em Administração de Empresas na Universidade Católica do Porto, depois de desistir de Direito. O PÁGINA UM não conseguiu apurar mais informações porque não foram respondidas diversas questões pela Spinumviva.
Ontem, na edição do Correio da Manhã, Luís Montenegro afiançou que apenas executou serviços de consultoria “no âmbito da protecção de dados pessoais”, acrescentando que, “por ironia do destino”, a Medialivre, dona daquele jornal, fora “um dos clientes”. Mas ao PÁGINA UM, tanto o gabinete do primeiro-ministro como a gerência da Spinumviva não revelaram quais foram os outros clientes.
Extracto da certidão permanente da Spinumviva consultada pelo PÁGINA UM.
Aliás, mesmo existindo a garantia dada por Luís Montenegro ao Correio da Manhã de não haver necessidade de alteração do objecto social no sentido de eliminar os negócios imobiliários e extinguir o potencial conflito de interesses, na verdade a empresa pode executá-los quer estejam ou não previsto no objecto social. Isto porque o Código das Sociedade Comerciais pemite a realização de actos complementares ou conexos com o seu objecto social, ainda que este não mencione explicitamente essa actividade. Nessa medida, a consultadoria imobiliária pode ser vista como conexa à actividade principal, envolvendo aconselhamento sobre investimentos, avaliação de activos ou planeamento estratégico no sector.
O PÁGINA UM perguntou a Luís Montenegro e à Spinumviva se revelariam todos os clientes e tipo de consultadorias que passassem a realizar, mas, como já referido, não obteve qualquer reacção.
O Chega usufruiu de um ‘regime especial’ concedido pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social: apesar de não ter sequer jornalistas na sua Folha Nacional – o órgão de comunicação social em versão digital e impressa semanalmente –, o regulador permite ilegitimamente que ostente, na sua ficha técnica, um director (Nuno Valente), um director-adjunto (Patrícia Carvalho) e um subdirector (Ricardo Dias Pinto), além de um editor (Bernardo Pessanha). Ou seja, só ‘generais’ sem qualquer ‘soldado’. Assim, não surpreende que, apesar de actualizado diariamente, 97 das últimas 100 notícias, publicadas desde o dia 8 de Fevereiro, sejam ‘takes’ da Agência Lusa e apenas três são de ‘produção própria’, embora sem assinatura.
A Lei da Imprensa, um diploma de 1999 com a sua mais recente alteração de 2015, estabelece explicitamente, na secção da “organização das empresas jornalísticas”, que “nas publicações com mais de cinco jornalistas o director [que tem sempre de existir] pode ser coadjuvado por um ou mais directores-adjuntos ou subdirectores, que o substituem nas suas ausências ou impedimentos”. Ora, a Folha Nacional nem um, quanto mais seis jornalistas para possuir essa estrutura.
André Ventura, líder do Chega.
Aliás, nem o seu director, Nuno Valente – um assessor videógrafo do Grupo Parlamentar do Chega –, não tem carteira profissional ou de equiparado, algo que não é obrigatório no seu caso, uma vez que a Folha Nacional é classificada, no âmbito da Lei da Impresa, um periódico doutrinário, como são os casos do Povo Livre (PSD), Ação Socialista (PS), Esquerda.net (Bloco de Esquerda) e Avante (PCP).
Porém, ao contrário da Folha Nacional, nenhum dos outros órgãos de comunicação social considerados doutrinários por razões ideológicas – que se distinguem dos periódicos informativos por poderem ter um cunho ideológico assumido – têm mais do que o director no topo da sua estrutura, mesmo quando contam com jornalistas acreditados.
Por exemplo, o Avante – o quase centenário jornal do PCP – tem apenas um director, Manuel Rodrigues, que tem o chamado cartão equiparado a jornalista (TE310), – não tem director-adjunto, mesmo se conta, na sua redacção, com quatro jornalistas acreditados: Gustavo Carneiro (apresentado como chefe de redacção), João Chaqueira (apresentado como “chefe adjunto”) e dois redactores, Domingos Mealha e Hugo Janeiro.
Jornal ostenta um director, um director-adjunto e um subdirector, mas não tem jornalistas. Lei da Imprensa não permite, mas ERC fecha os olhos.
Já a Esquerda.net – a publicação online do Bloco de Esquerda – menciona apenas na sua ficha técnica o nome do director, Luís Branco, também jornalista acreditado. Apesar da generalidade das notícias não estarem assinadas, com excepção daquelas da autoria do próprio director, tudo está dentro da legalidade: com menos de seis jornalistas, não há mais nenhum cargo de direcção.
No caso da Ação Socialista, nada também a apontar. Há apenas um director – Porfírio Silva, ex-deputado socialista, sem título passado pela CCPJ, que no seu caso não é necessário – e mais duas pessoas na redacção: André Salgado e Mary Rodrigues, esta última jornalista acreditada.
Quanto ao Povo Livre, semanário do PSD, não surge uma ficha técnica específica no site, mas a edição imprensa ostenta apenas o nome da sua directora, a ex-deputada Emília Santos. Ou seja, sem mais qualquer cargo de direcção.
Contactada para esclarecer a legalidade da situação da Folha Nacional, a ERC – que costuma até fiscalizar a desconformidade dos logotipos, ameaçando com multas –, alega que “nas publicação periódicas de natureza não jornalística não são exigíveis para os cargos de directores-adjuntos e subdirectores o cumprimento dos requisitos”, ou seja, a existência de uma redacção com mais de cinco jornalistas.
Patrícia Carvalho é deputada do Chega e assume-se como directora-adjunta da Folha Nacional. A Lei da Imprensa não petmite.
Contudo, na verdade – e apesar do regulador dos media, liderado agora por Helena Sousa, ser useiro e vezeiro em interpretações jurídicas rocambolescas –, a Lei da Imprensa é muito clara, ao explicitar que “nas publicações [independentemente de serem informativas ou doutrinárias] com mais de cinco jornalistas o director pode ser coadjuvado por um ou mais directores-adjuntos ou subdirectores, que o substituem nas suas ausências ou impedimentos”. E apenas remete para uma outra norma (artigo 19º) para dispensar a audição do conselho de redacção se os dirigentes de um periódico doutrinário mudarem ou indicarem o director e eventuais adjuntos. Convém dizer que a Folha Nacional não tem conselho de redacção, exactamente porque é uma publicação periódica com menos de seis jornalistas.
Além disso, uma empresa ou entidade com uma publicação doutrinária é sempre jornalística se for periódica, como estipula claramente a Lei da Imprensa. Só não será jornalística se se tratar de uma publicação não periódica, classificando-se, nesse caso, a empresa como editorial. A única coisa que distingue as publicações doutrinárias (como a Folha Nacional e as dos outros partidos) das publicações informativas é o conteúdo e abordagem. No grupo das publicações doutrinárias, o objectivo predominante passa pela divulgação de uma ideologia ou credo religioso. Ou seja, podem fazer artigos jornalísticos – como fazem, claramente, o Avante e o Esquerda.net – ou divulgar as notícias da Lusa, como insistentemente faz a Folha Nacional.
O PÁGINA UM consultou dois advogados que destacaram ser “absurda” a interpretação da ERC, que “baralha conceitos” da própria Lei da Imprensa. Isto porque “embora doutrinária a Folha Nacional é uma publicação periódica, logo jornalística, e assim, não tendo mais de cinco jornalistas, não pode ter directores adjuntos”, salienta um dos causídicos. “A classificação das empresas enquanto jornalísticas ou não é conferida pela periodicidade, e não por ‘achismos’”, acrescenta.
Regulador dos media ‘baralha’ conceitos da Lei da Imprensa para ‘legalizar’ Folha Nacional.
Outro dos juristas contactados pelo PÁGINA UM também salienta que, embora publicações doutrinárias possam funcionar sem jornalistas, isso “automaticamente impede-as de ter directores-adjuntos”, uma vez que nunca conseguirão cumprir o requisito do número mínimo de jornalistas para haver ‘ajudantes’ do director”.
O PÁGINA UM insistiu junto da ERC para que fosse indicada em concreto a norma jurídica que permitia a Folha Nacional cumular cargos de direcção editorial, em violação da Lei da Imprensa, mas o regulador não respondeu ainda. O PÁGINA UM também decidiu, ao abrigo do seu direito editorial de obter comentários, colocar questões ao director da Folha Nacional, mas não obteve resposta.
Relatório de avaliação da notícia sobre a Sondagem para as Autárquicas de Lisboa e Porto – Correio da Manhã (3 de Fevereiro de 2025)
1. Introdução
Este relatório apresenta uma avaliação de uma notícia publicada pelo jornal Correio da Manhã no dia 3 de Janeiro de 2025, relativas à sondagem conduzida pela Intercampus para o Correio da Manhã e a CMTV. A peça analisada é a seguinte: :
A sondagem teve como objectivo avaliar as intenções de voto para as Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto, utilizando uma amostra nacional. No entanto, as eleições autárquicas são decididas exclusivamente pelos eleitores de cada concelho, pelo que a ausência de dados desagregados por concelho compromete drasticamente a validade dos resultados apresentados. Além disso, as margens de erro específicas para Lisboa e Porto não são mencionadas, agravando a fragilidade metodológica da análise.
A avaliação foi conduzida com base na metodologia Rigor Jornalístico sobre Sondagens (RJS), previamente definida em articulação com o jornal PÁGINA UM e ajustada para dar maior peso à precisão dos dados (35%) e à transparência na apresentação da informação (30%). A análise de conteúdo e a quantificação dos critérios foram da exclusiva responsabilidade do ChatGPT. A avaliação foi realizada com exigência rigorosa, considerando os princípios do jornalismo transparente e informativo numa sociedade democrática.
2. Metodologia de Avaliação
A avaliação segue a estrutura RJS (Rigor Jornalístico sobre Sondagens) e abrange seis critérios essenciais, aplicados a cada uma das três notícias.
A nota final de cada notícia resulta da aplicação destas ponderações às notas atribuídas a cada critério.
2.1. Processo de Avaliação da Inteligência Artificial
A avaliação das notícias foi realizada utilizando técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (PLN) e avaliação contextual.
O Processamento de Linguagem Natural (PLN) refere-se a um conjunto de técnicas que permitem a um modelo de inteligência artificial compreender, interpretar e analisar textos escritos de forma semelhante a um leitor humano. O PLN envolve análise sintáctica, semântica e pragmática, permitindo identificar factos, opiniões, dados estatísticos e omissões. No contexto desta avaliação, o modelo extrai e processa automaticamente as informações presentes na notícia, identificando padrões e verificando a completude dos dados.
A avaliação contextual complementa o PLN ao interpretar o significado e a relevância das informações no contexto específico da cobertura noticiosa. Esta abordagem analisa a estrutura argumentativa do texto, a escolha de palavras e a ênfase dada a determinados aspectos da notícia, permitindo detectar enviesamentos subtis ou omissões estratégicas. O modelo compara o conteúdo da peça com boas práticas jornalísticas e identifica se a apresentação dos dados pode influenciar indevidamente a percepção pública sobre os resultados da sondagem.
2.2. Etapas do Processo de Avaliação
A avaliação das notícias seguiu três níveis estruturados:
Segmentação e Extração de Informação
Identificação das percentagens apresentadas e verificação da sua completude.
Análise da manchete e do lead para detectar formulações enviesadas.
Verificação da presença e clareza da ficha técnica da sondagem.
Comparação com os Padrões de Rigor Informativo
Análise de omissões relevantes e apresentação de dados.
Identificação de linguagem potencialmente influenciadora da percepção do leitor.
Comparação entre as três notícias para detectar diferenças qualitativas.
Atribuição de Pontuações
Aplicação da escala de 0 a 20 pontos a cada critério, ponderando os resultados de acordo com a sua relevância.
3. Avaliação das Notícias
3. Avaliação da Notícia
A seguir apresenta-se o quadro consolidado com as avaliações de cada critério para cada notícia:
A análise dos resultados evidencia que a notícia analisada falha em critérios fundamentais de rigor jornalístico, com nota negativa nos domínios da precisão dos dados, da transparência e acesso à informaçºao, na qualidade da análise e contextualização e ainda no rigor metodológico e credibilidade..
A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a pior avaliação global (7,85/20), com resultados particularmente críticos nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A peça não apresenta a totalidade dos votos, omite valores essenciais como brancos e nulos e utiliza uma manchete que pode induzir uma percepção enganadora sobre a posição de Gouveia e Melo. A falta de contextualização dos números e a ausência de qualquer explicação sobre a margem de erro agravam ainda mais a falta de rigor informativo.
A notícia “Mendes à direita” teve a melhor nota (13,2/20), mas ainda assim insuficiente para ser considerada uma peça jornalística de qualidade. Embora tenha atingido o mínimo aceitável no critério de imparcialidade (15/20), continua a falhar nos critérios essenciais de precisão (12/20) e transparência (10/20), comprometendo a integridade da informação veiculada. O artigo não apresenta a relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto, omitindo dados essenciais para uma análise completa.
4. Justificação das Avaliações
A seguir apresenta-se a justificação detalhada para cada critério de avaliação aplicado a cada uma das três notícias.
4.1 Precisão dos Dados Apresentados (35%)
Avaliação – 6/20
A notícia apresenta percentagens das intenções de voto, mas a base da sondagem é nacional, o que não reflecte o universo relevante (eleitores de Lisboa e Porto). Sem saber quantos inquiridos pertencem a cada concelho, não é possível calcular a margem de erro específica para cada cidade, o que compromete gravemente a validade dos resultados apresentados. A ausência de dados desagregados impede a compreensão real da vantagem de Carlos Moedas e Manuel Pizarro nos respectivos concelhos.
4.2 Transparência e Acesso à Informação Completa (30%)
Avaliação – 6/20
A Embora a ficha técnica mencione a amostra total e a margem de erro geral (+/- 3,9%), não informa a distribuição dos inquiridos por concelho. Dada a natureza local das eleições autárquicas, esta omissão é extremamente grave, pois torna impossível avaliar a representatividade dos dados. Além disso, não há explicação detalhada sobre a ponderação dos resultados.
4.3 Imparcialidade e Isenção (15%)
Avaliação – 10/20
A notícia utiliza uma linguagem relativamente neutra, mas a manchete e os gráficos destacam os candidatos Carlos Moedas e Manuel Pizarro sem abordar adequadamente as limitações metodológicas da sondagem. A ausência de referências às fragilidades da amostra e das margens de erro específicas sugere um enviesamento implícito.
4.4 Qualidade da Análise e Contextualização (10%)
Avaliação – 7/20
Apesar de mencionar temas relevantes como segurança e imigração, a análise não explora cenários alternativos ou impactos das margens de erro específicas para cada concelho. A ausência de qualquer contextualização histórica das intenções de voto ou comparação com sondagens anteriores enfraquece ainda mais a análise.
4.5 Linguagem e Clareza (5%)
Avaliação – 16/20
A linguagem da notícia é clara e acessível, com gráficos que ajudam a sintetizar os resultados. Contudo, a falta de explicações metodológicas adequadas e a simplificação excessiva comprometem a compreensão do público sobre as limitações da sondagem.
4.6 Rigor Metodológico e Credibilidade (5%)
A ausência de dados desagregados por concelho e a falta de uma explicação clara sobre como a amostra nacional foi ajustada para refletir os universos eleitorais de Lisboa e Porto comprometem a credibilidade da sondagem. Este rigor metodológico insuficiente impacta directamente a validade da notícia.
5. Conclusão detalhada
A análise da notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica para Lisboa e Porto, conduzida pela Intercampus, revelou falhas estruturais graves que comprometem a validade e o rigor informativo da peça. As principais fragilidades detectadas enquadram-se em três domínios fundamentais: precisão dos dados, transparência na apresentação da metodologia e impacto da falta de desagregação da amostra no resultado da sondagem.
O problema da precisão dos dados
A notícia apresenta percentagens de intenções de voto para Carlos Moedas e Alexandra Leitão, em Lisboa, e para Manuel Pizarro e Pedro Duarte, no Porto, sem clarificar a representatividade estatística desses números. Como a sondagem é baseada numa amostra nacional e não numa amostra específica de eleitores de Lisboa e Porto, os valores apresentados são profundamente enganadores para o leitor, pois transmitem uma falsa noção de competitividade entre os candidatos.
Em termos estatísticos, para que uma sondagem autárquica seja precisa, seria necessário garantir um número adequado de inquiridos exclusivamente residentes em Lisboa e no Porto, garantindo que a margem de erro fosse controlada para cada concelho. Como a ficha técnica da sondagem não apresenta essa desagregação, a margem de erro real pode ser muito superior à margem de erro global de +/- 3,9% indicada na notícia.
Por exemplo, se no universo de 638 inquiridos da sondagem apenas 80 a 100 forem de Lisboa e 60 a 80 do Porto (números meramente indicativos, mas realistas, porque a sondagem ainda não se econtra disponível), a margem de erro para cada cidade poderia facilmente ultrapassar os 10% ou 12%, tornando os resultados estatisticamente irrelevantes para prever cenários eleitorais nestes concelhos. Esta falha é crítica e deveria ter sido explicitada no artigo.
➡ Conclusão: A notícia omite o problema da representatividade da amostra e não esclarece que a sondagem não é fiável para prever o comportamento eleitoral nos dois municípios.
Transparência e Omissões na Apresentação da Metodologia
A ficha técnica da sondagem, incluída na notícia, é insuficiente para garantir a transparência necessária para uma interpretação rigorosa dos resultados. Os problemas principais incluem: • Não há qualquer referência ao número de inquiridos por concelho, impedindo que se avalie a validade dos dados apresentados. • A margem de erro global (+/- 3,9%) não se aplica a Lisboa nem ao Porto, já que essa margem só seria válida para a totalidade da amostra nacional. • A forma de ponderação da amostra não é explicada, o que pode distorcer a comparação entre candidatos.
O princípio básico de qualquer sondagem é que os leitores possam compreender o quão fiáveis são os dados apresentados. Como estas informações são omitidas, o artigo induz o público em erro ao sugerir que Moedas e Pizarro lideram as corridas autárquicas com base numa amostra que não representa eleitoralmente esses municípios.
➡ Conclusão: A falta de desagregação e a omissão da margem de erro para cada concelho comprometem a transparência da notícia, tornando os resultados praticamente inutilizáveis como previsão eleitoral.
O Impacto da Interpretação Jornalística e a Construção da Narrativa
O modo como os dados são apresentados na notícia reforça percepções políticas específicas, sem que existam bases metodológicas sólidas para tal. O artigo dá como certo que Moedas e Pizarro estão à frente nas intenções de voto, sem mencionar que os dados não permitem essa conclusão.
Além disso, a escolha de frases como “Moedas ganha a Alexandra” e “Pizarro bate Pedro Duarte” induz o leitor a acreditar que há uma vantagem estatística clara, quando, na realidade, os dados apresentados podem estar dentro de uma margem de erro muito elevada, o que inviabiliza qualquer certeza sobre liderança.
O artigo ainda explora a narrativa temática das campanhas, destacando temas como segurança e imigração, o que pode reforçar um enquadramento favorável para determinados candidatos. Contudo, a relação entre esses temas e as intenções de voto não é demonstrada com dados concretos, tornando-se apenas um exercício de especulação editorial.
➡ Conclusão: A narrativa da notícia é construída de forma a sugerir certezas eleitorais que os dados não permitem sustentar, o que representa uma falha grave do ponto de vista jornalístico.
Considerações Finais
A análise global da notícia revela um conjunto de problemas que a tornam estatisticamente inválida e editorialmente enviesada. As falhas metodológicas são particularmente graves, pois transmitem ao leitor informações que não podem ser sustentadas pela sondagem realizada. As principais conclusões são:
✅ Omissão de dados fundamentais: A falta de desagregação por concelho e a não divulgação da margem de erro específica para Lisboa e Porto tornam a sondagem estatisticamente inútil para prever eleições autárquicas.
✅ Apresentação enganadora dos resultados: A forma como os dados são relatados sugere que existem líderes claros na corrida eleitoral, quando, na realidade, as intenções de voto podem estar dentro da margem de erro ou sequer serem representativas da realidade local.
✅ Narrativa editorial sem suporte estatístico: A tentativa de associar determinados candidatos a temas específicos, como segurança ou imigração, não é sustentada por dados concretos, reforçando um enquadramento tendencioso.
🔴 Conclusão Final: A notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica não cumpre os requisitos mínimos de rigor estatístico e jornalístico. Deveria, no mínimo, alertar para as limitações da sondagem e fornecer transparência sobre os riscos de extrapolação de dados de uma amostra nacional para eleições locais. Sem estas correções, o artigo induz os leitores em erro e compromete a fiabilidade da informação.
Relatório de avaliação do conjunto de notícias sobre a Sondagem Presidencial – Expresso (30 de Janeiro de 2025)
1. Introdução
Este relatório apresenta uma avaliação conjunta das três notícias publicadas pelo jornal Expresso no dia 30 de Janeiro de 2025, relativas à sondagem presidencial conduzida pelo ICS/ISCTE para o Expresso e a SIC. As peças analisadas são:
Estas três notícias fazem parte de uma única análise noticiosa sobre a sondagem, abordando diferentes aspectos do estudo. Assim, a avaliação conjunta permite identificar tendências, padrões e eventuais discrepâncias qualitativas entre os artigos.
A avaliação foi conduzida com base na metodologia Rigor Jornalístico sobre Sondagens (RJS), previamente definida em articulação com o jornal PÁGINA UM e ajustada para dar maior peso à precisão dos dados (35%) e à transparência na apresentação da informação (30%). A análise de conteúdo e a quantificação dos critérios foram da exclusiva responsabilidade do ChatGPT. A avaliação foi realizada com exigência rigorosa, considerando os princípios do jornalismo transparente e informativo numa sociedade democrática.
2. Metodologia de Avaliação
A avaliação segue a estrutura RJS (Rigor Jornalístico sobre Sondagens) e abrange seis critérios essenciais, aplicados a cada uma das três notícias.
A nota final de cada notícia resulta da aplicação destas ponderações às notas atribuídas a cada critério.
2.1. Processo de Avaliação da Inteligência Artificial
A avaliação das notícias foi realizada utilizando técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (PLN) e avaliação contextual.
O Processamento de Linguagem Natural (PLN) refere-se a um conjunto de técnicas que permitem a um modelo de inteligência artificial compreender, interpretar e analisar textos escritos de forma semelhante a um leitor humano. O PLN envolve análise sintáctica, semântica e pragmática, permitindo identificar factos, opiniões, dados estatísticos e omissões. No contexto desta avaliação, o modelo extrai e processa automaticamente as informações presentes na notícia, identificando padrões e verificando a completude dos dados.
A avaliação contextual complementa o PLN ao interpretar o significado e a relevância das informações no contexto específico da cobertura noticiosa. Esta abordagem analisa a estrutura argumentativa do texto, a escolha de palavras e a ênfase dada a determinados aspectos da notícia, permitindo detectar enviesamentos subtis ou omissões estratégicas. O modelo compara o conteúdo da peça com boas práticas jornalísticas e identifica se a apresentação dos dados pode influenciar indevidamente a percepção pública sobre os resultados da sondagem.
2.2. Etapas do Processo de Avaliação
A avaliação das notícias seguiu três níveis estruturados:
Segmentação e Extração de Informação
Identificação das percentagens apresentadas e verificação da sua completude.
Análise da manchete e do lead para detectar formulações enviesadas.
Verificação da presença e clareza da ficha técnica da sondagem.
Comparação com os Padrões de Rigor Informativo
Análise de omissões relevantes e apresentação de dados.
Identificação de linguagem potencialmente influenciadora da percepção do leitor.
Comparação entre as três notícias para detectar diferenças qualitativas.
Atribuição de Pontuações
Aplicação da escala de 0 a 20 pontos a cada critério, ponderando os resultados de acordo com a sua relevância.
3. Avaliação das Notícias
3. Avaliação das Notícias
A seguir apresenta-se o quadro consolidado com as avaliações de cada critério para cada notícia:
A análise dos resultados evidencia que todas as notícias analisadas falham em critérios fundamentais de rigor jornalístico, com nenhuma das três peças a alcançar uma avaliação satisfatória nos domínios da precisão e da transparência.
A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a pior avaliação global (7,85/20), com resultados particularmente críticos nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A peça não apresenta a totalidade dos votos, omite valores essenciais como brancos e nulos e utiliza uma manchete que pode induzir uma percepção enganadora sobre a posição de Gouveia e Melo. A falta de contextualização dos números e a ausência de qualquer explicação sobre a margem de erro agravam ainda mais a falta de rigor informativo.
A notícia “Mendes à direita” teve a melhor nota (13,2/20), mas ainda assim insuficiente para ser considerada uma peça jornalística de qualidade. Embora tenha atingido o mínimo aceitável no critério de imparcialidade (15/20), continua a falhar nos critérios essenciais de precisão (12/20) e transparência (10/20), comprometendo a integridade da informação veiculada. O artigo não apresenta a relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto, omitindo dados essenciais para uma análise completa.
A notícia “PS só tem lugar para um” obteve um resultado intermédio (11,6/20), demonstrando fragilidades tanto na precisão (10/20) quanto na transparência (8/20). A peça explora a divisão no PS, mas sem fornecer uma visão completa do impacto eleitoral desse factor. A ausência de um quadro comparativo e a omissão de cenários de segunda volta tornam a análise incompleta e pouco rigorosa.
O critério de qualidade da análise e contextualização apresentou notas insuficientes em todas as peças (abaixo de 15/20), o que reforça a fragilidade interpretativa das notícias. Nenhuma das análises explorou de forma rigorosa os impactos dos cenários eleitorais alternativos, nem relacionou as tendências de intenção de voto com a evolução histórica do eleitorado.
A linguagem e clareza obtiveram 18/20, demonstrando que a apresentação dos textos é acessível. Contudo, uma escrita clara não significa rigor informativo. O problema reside na seleção e estruturação das informações, que distorcem a percepção eleitoral ao omitir elementos fundamentais.
O rigor metodológico e credibilidade recebeu 16/20, um valor relativamente elevado, mas ainda assim insuficiente para um padrão de excelência. A apresentação da ficha técnica da sondagem poderia ser mais clara e acessível, incluindo detalhes sobre a distribuição da amostra e ponderação dos resultados.
4. Justificação das Avaliações
A seguir apresenta-se a justificação detalhada para cada critério de avaliação aplicado a cada uma das três notícias.
4.1 Precisão dos Dados Apresentados (35%)
“Sondagem presidenciais” – 5/20
A notícia apresenta dados incompletos e omite elementos fundamentais para a interpretação da sondagem. A ausência da distribuição total dos votos impede que o leitor compreenda a real dimensão dos indecisos, dos brancos e nulos e dos candidatos com menos expressão. Além disso, a manchete usa o termo “destacado” para descrever Gouveia e Melo, o que pode levar a uma percepção exagerada da sua vantagem eleitoral, quando, na realidade, tem apenas 25% dos votos num cenário altamente fragmentado. A falta de qualquer análise sobre a margem de erro e variações possíveis dos resultados torna a peça extremamente deficiente em precisão.
“Mendes à direita” – 12/20
Embora esta peça não apresente uma análise directa das intenções de voto, os dados que fornece sobre a percepção ideológica dos candidatos são apresentados de forma relativamente correcta. No entanto, falta-lhe uma relação entre essa percepção e a intenção de voto, o que compromete a interpretação dos números. O leitor não consegue inferir se a percepção de um candidato como “mais à direita” ou “mais ao centro” afecta a sua elegibilidade e competitividade eleitoral. A ausência de comparação com outras sondagens também limita a precisão dos dados ao não oferecer um quadro evolutivo das tendências eleitorais.
“PS só tem lugar para um” – 10/20
A notícia fornece percentagens sobre a disputa interna do PS, mas não contextualiza como essas percentagens se integram no panorama geral da corrida presidencial. O texto refere que Centeno teria melhor desempenho do que Vitorino e Seguro, mas não explica a base comparativa desse cenário, nem especifica como a amostra foi segmentada. Além disso, não são apresentados dados sobre a margem de erro, o que impede que o leitor compreenda se a diferença entre os candidatos socialistas é estatisticamente significativa ou apenas uma variação normal dentro da margem de erro.
4.2 Transparência e Acesso à Informação Completa (30%)
“Sondagem presidenciais” – 4/20
A notícia omite a distribuição completa dos votos, dificultando a compreensão do peso real de cada candidato. Não há qualquer menção aos votos brancos, nulos e aos inquiridos que se declararam indecisos, o que impede uma leitura correcta da sondagem. Além disso, a ficha técnica da sondagem não é apresentada de forma clara e acessível ao leitor, e a ausência de referências detalhadas à metodologia usada no estudo compromete ainda mais a transparência da peça.
“Mendes à direita” – 10/20
A transparência desta peça é ligeiramente melhor, mas ainda deficitária. A notícia expõe algumas informações úteis sobre a percepção ideológica dos candidatos, mas não fornece um quadro claro sobre a distribuição total das respostas. Além disso, não há qualquer referência à margem de erro, à metodologia da recolha de dados ou à amostra utilizada para essa avaliação da percepção ideológica, o que prejudica a sua credibilidade.
“PS só tem lugar para um” – 8/20
A transparência desta notícia é insuficiente, embora um pouco superior à da peça sobre Gouveia e Melo. A peça fornece alguns números relevantes, mas não detalha a amostra utilizada para avaliar o impacto de cada candidato socialista nas eleições. A ausência de dados sobre o número total de inquiridos e a margem de erro torna a leitura dos números parcial e incompleta.
4.3 Imparcialidade e Isenção (15%)
“Sondagem presidenciais” – 10/20
Embora a notícia não contenha ataques directos a qualquer candidato, a forma como apresenta os dados reforça uma percepção enviesada da corrida presidencial. A manchete e o lead enfatizam a “liderança” de Gouveia e Melo de maneira desproporcionada, sem destacar que 25% das intenções de voto num cenário de grande dispersão não significa uma vantagem decisiva. A falta de referências a outros candidatos menos expressivos também contribui para um enquadramento desequilibrado da informação.
“Mendes à direita” – 15/20
A notícia apresenta um enquadramento mais neutro, relatando apenas a percepção ideológica dos candidatos sem sugerir favoritismos. No entanto, a peça não faz qualquer esforço para contextualizar o impacto da percepção ideológica nas intenções de voto, o que pode limitar a compreensão do leitor sobre a relevância desses dados no cenário eleitoral.
“PS só tem lugar para um” – 12/20
A peça acentua a divisão interna do PS e pode sugerir uma crise no partido, ainda que não contenha ataques directos aos candidatos mencionados. A forma como apresenta Centeno como uma alternativa eleitoralmente mais viável pode influenciar a percepção do leitor, principalmente porque não são fornecidos dados suficientes para fundamentar essa conclusão.
4.4 Qualidade da Análise e Contextualização (10%)
“Sondagem presidenciais” – 12/20
A análise centra-se exclusivamente na possibilidade de Ventura chegar à segunda volta, mas não explora outras hipóteses ou cenários alternativos, como o impacto de um crescimento de outro candidato de direita. A ausência de um enquadramento histórico ou de comparações com sondagens anteriores reduz a profundidade da análise.
“Mendes à direita” – 14/20
A peça apresenta um contexto interessante sobre a percepção ideológica dos candidatos, permitindo uma leitura mais aprofundada sobre o espectro político da eleição. No entanto, a análise não estabelece qualquer ligação entre essa percepção e as intenções de voto, o que a torna menos útil para o entendimento do impacto eleitoral dessa dinâmica.
“PS só tem lugar para um” – 13/20
A análise sobre a disputa interna do PS é relevante, mas falta-lhe uma exploração mais profunda das consequências desse cenário no contexto eleitoral mais amplo. O artigo não avalia cenários de segunda volta ou a redistribuição de votos caso o PS apresente um candidato diferente.
4.5 Linguagem e Clareza (5%)
Todas as três notícias obtiveram 18/20 neste critério, indicando que a linguagem utilizada é clara, directa e acessível ao público. No entanto, uma escrita clara não significa rigor informativo. A escolha de termos nas manchetes, sobretudo na peça sobre Gouveia e Melo, tem impacto na percepção pública e pode distorcer a interpretação dos leitores sobre a corrida eleitoral.
4.6 Rigor Metodológico e Credibilidade (5%)
As três notícias receberam 16/20 neste critério. Embora a ficha técnica da sondagem seja referida, falta uma explicitação detalhada sobre a metodologia utilizada, incluindo a ponderação dos votos e a forma como foram tratados os indecisos. A inclusão desses elementos teria aumentado a credibilidade da informação apresentada.
5. Conclusão detalhada
A avaliação detalhada das três notícias do Expresso sobre a sondagem presidencial de 30 de Janeiro de 2025 revela falhas estruturais graves na apresentação e interpretação dos dados eleitorais, comprometendo a sua transparência e o rigor informativo esperado num jornalismo de qualidade. Nenhuma das peças analisadas atingiu um nível aceitável nos critérios essenciais de precisão dos dados e transparência na exposição das intenções de voto, e todas apresentaram deficiências na imparcialidade e na contextualização das informações.
A principal crítica global é a omissão da distribuição total dos votos, um elemento fundamental para uma análise rigorosa da sondagem. Sem essa informação, os leitores não conseguem interpretar correctamente a posição relativa de cada candidato, nem compreender o impacto real dos indecisos, dos votos brancos e nulos e das oscilações entre os diferentes cenários eleitorais. Esta ausência de dados configura uma grave falha jornalística, pois limita o acesso do público a uma leitura completa e isenta dos resultados da sondagem.
As notas finais atribuídas a cada notícia demonstram que todas apresentam problemas sérios na forma como estruturam a informação e comunicam os resultados eleitorais:
Com base nestes resultados, destaca-se que:
A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a avaliação mais baixa (7,85/20), com falhas graves nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A omissão de informações essenciais sobre a distribuição total dos votos e a construção de uma narrativa que enfatiza a “liderança” de Gouveia e Melo sem o devido enquadramento quantitativo configuram erros inaceitáveis para uma cobertura informativa deste tipo.
A notícia “Mendes à direita” teve a melhor avaliação (13,2/20), mas não atinge um patamar aceitável de rigor jornalístico. Embora seja menos enviesada na sua estrutura, a falta de uma relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto compromete a sua utilidade informativa. A ausência de contextualização histórica e de cenários alternativos impede que a peça seja considerada um exemplo de jornalismo rigoroso.
A notícia “PS só tem lugar para um” ficou com uma nota intermédia (11,6/20), sendo penalizada por falhas na transparência (8/20) e na precisão dos dados (10/20). A peça apresenta números relativos à disputa interna do PS, mas não explica o impacto dessa divisão no contexto eleitoral geral, nem fornece elementos que permitam uma interpretação objectiva dos dados.
Em termos de linguagem e clareza, todas as notícias obtiveram avaliações elevadas (18/20), o que demonstra que os textos são acessíveis ao público. No entanto, uma escrita clara não é sinónimo de rigor informativo, e a forma como a informação é estruturada e selecionada pode influenciar percepções eleitorais de maneira subtil, mas relevante.
O rigor metodológico e credibilidade das peças foi insuficiente (16/20 em todas as notícias), pois a ficha técnica da sondagem não foi devidamente destacada nem explicada em profundidade. A ausência de informações sobre a ponderação dos dados e sobre a forma como foram tratados os indecisos limita a credibilidade das notícias.
5.1 Considerações Finais
A avaliação global da cobertura do Expresso sobre a sondagem presidencial indica uma abordagem deficiente no que diz respeito à transparência e ao rigor da apresentação dos dados eleitorais. As três peças analisadas falham em apresentar um panorama completo e objectivo da corrida presidencial, deixando lacunas significativas que podem afectar a percepção dos leitores sobre a realidade eleitoral.
A falta de um quadro comparativo completo das intenções de voto compromete a análise global da sondagem, e a escolha de manchetes e leads sem a devida sustentação quantitativa introduz um viés na percepção pública, ainda que de forma implícita.
Se estas deficiências fossem corrigidas, as notícias poderiam atingir notas entre 16 e 18 em 20, garantindo um padrão informativo adequado ao jornalismo de qualidade e ao dever de transparência perante os leitores.
A presente avaliação sublinha a importância do rigor na apresentação de sondagens eleitorais, um elemento central para garantir que os cidadãos tenham acesso a informação completa, fiável e imparcial.
A Administração Biden, cujo mandato decorreu entre 2021 e 2024, mais do que duplicou o número de repatriamentos de estrangeiros face aos anos do primeiro mandato de Donald Trump (2017-2020), embora usando um expediente especial – uma lei sanitária de 1944, o Título 42 – que fez baixar artificialmente as deportações formais. Estes dados foram recolhidos e analisados pelo PÁGINA UM nos relatórios do Serviço de Imigração e Alfândega (Immigration and Customs Enforcement) e de uma unidade de estatística do Departamento de Segurança Interna (DHS) dos Estados Unidos, com informação detalhada desde 1996 até finais de 2024.
Apesar de a recém-formada Administração Trump ter elegido o controlo intensivo da imigração ilegal como uma das suas bandeiras – provocando já celeuma com deportações para o Brasil e a Colômbia –, certo é que, nos últimos quatro anos, os Estados Unidos até impediram um maior número de permanências face aos anos anteriores.
Criança numa caravana de migrantes a caminho dos Estados Unidos. Foto: AFP
Considerando todas as tipologias de repatriamento – retornos administrativos e forçados, deportações coercivas e expulsões sob regimes específicos, como o Título 42 –, foram contabilizados 777.590 processos ao longo de 2024. De entre estes, os retornos administrativos – aplicados quando um estrangeiro é intercetado na fronteira ou detetada a sua ilegalidade em inspeções regulares e sai voluntariamente do território norte-americano sem ser sujeito a um processo formal de deportação – totalizaram 92.310 casos, ou seja, 12% do total. No caso dos retornos forçados (‘enforcement returns’) – que não envolvem processo judicial completo, sendo uma forma simplificada de repatriamento –, no ano passado contabilizaram-se 355.290 casos, ou seja, 46% do total.
Já as deportações coercivas, também denominadas formalmente como remoções (‘removals’) – que implicam um processo legal mais rigoroso, com a expulsão e outras penalidades, baseando-se em violações das leis de imigração –, atingiram os 329.990 casos, representando 42% do total.
O total de repatriamentos a partir dos Estados Unidos no último ano civil do mandato de Joe Biden supera qualquer dos quatro anos do primeiro mandato de Donald Trump. Mas a contabilidade ainda se torna mais tenebrosa, e altera a perceção, se se contabilizar o período em que se aplicou o regime especial do Título 42, durante a pandemia. Aí, chega-se à conclusão de que, no mandato de Joe Biden, entre 2021 e 2024, foram repatriadas 4.779.640 pessoas – contra 2.001.220 pessoas no primeiro mandato de Trump (2017-2020) –, o que torna este o terceiro presidente que mais repatriou desde o mandato de Eisenhower (1953-1960).
Expulsões sumárias durante a pandemia, ao abrigo do Título 42, fundada numa lei sanitária de 1944, permitiu ‘mascarar’ ondas de deportações da Administração Trump..Foto: AP.
Com efeito, tendo a Administração Biden repatriado, por ano, uma média de quase 1,2 milhões de pessoas, só foi superado por Bill Clinton (1,5 milhões por ano) e George W. Bush (1,3 milhões por ano). Na lista dos últimos 13 presidentes, Donald Trump surge, porventura surpreendentemente, apenas na nona posição em termos de repatriamentos totais – e é aquele que menos repatriou nos últimos 50 anos.
A aplicação do Título 42 foi inicialmente usada pela Administração Trump, em Março de 2020, ‘ressuscitando’ uma lei sanitária de 1944, que permitia assim ao Governo adotar restrições à entrada de pessoas ou bens no país para prevenir a disseminação de doenças transmissíveis. Transposta para desburocratizar expulsões de forma sumária, Trump usou-a bastante para controlo da imigração a partir do México, alegando que a sobrelotação em centros de detenção promoveria surtos incontroláveis. Sem acesso ao sistema tradicional de imigração, incluindo o direito de solicitar asilo – e contrariando assim o direito internacional –, no final do primeiro mandato de Trump, entre março e setembro de 2020, foram expulsas quase 207 mil pessoas, cerca de 34% dos 608 mil repatriamentos daquele ano.
Este número anual (608.380) foi o mais elevado do primeiro mandato de Trump. Antes da pandemia, sem Título 42, os repatriamentos da primeira Administração Trump tinham atingido 387 mil em 2017, um pouco mais de 487 mil no ano seguinte e cerca de 518 mil em 2019.
Número médio de repatriamentos por ano de cada Administração norte-americana desde 1953. Barras a azul referem-se a presidente democratas; barras a vermelho a republicanos. Fonte: DHS.
Se parece evidente que Trump usou, em 2020, a ‘desculpa’ da pandemia para expulsar mais imigrantes sem burocracias nem pingo de humanidade, então a Administração Biden abusou nos anos seguintes. De facto, se, no primeiro ano da pandemia, Trump usou o Título 42 para expulsar uma média mensal de quase 61 mil (em 10 meses), a Administração Biden tomou-lhe o ‘gosto’. Ao longo do primeiro ano de mandato, Joe Biden tinha, na sua conta, 1.071.080 repatriamentos apenas pelo Título 42, sem incluir as restantes ‘modalidades tradicionais’.
Por esse motivo, só contabilisticamente, as deportações (‘removals’) nos Estados Unidos desceram de 234.340, em 2020 (era Trump), para apenas 85.100, em 2021 (primeiro ano da era Biden). Assim, juntando um pouco mais de 128 mil de retornos administrativos e quase 50 mil de retornos forçados, a Administração Biden acabou, no primeiro ano de mandato, por ‘mandar embora’ um total de 1.334.200 pessoas, um crescimento de 119% face ao ano anterior, ainda sob governo federal do seu opositor republicano.
No ano seguinte, em 2022, o democrata repetiu a dose: os repatriamentos surgiram à boleia do famigerado Título 42, com base em supostos motivos de saúde pública. Nessa ‘modalidade’, foram expulsos, sem apelo nem agravo, mais de 1,1 milhões de pessoas, uma média próxima das 100 mil por mês. Além destes, foram ainda repatriados mais 154 mil por retornos administrativos, quase 81 mil por retornos forçados e cerca de 123 mil deportações coercivas. No total, em 2022, a Administração Biden repatriou quase 1,47 milhões de pessoas, de longe o número mais elevado desde 2010.
Por via da maior facilidade de expulsar imigrantes através do Título 42, a Administração Biden teve um efeito talvez esperado: quem era sumariamente ‘atirado’ fora da fronteira tentava de novo. O relatório de 2022do Office of Homeland Statistics salienta que as expulsões ao abrigo do Título 42 contribuíram para “encontros” repetidos das autoridades com os mesmos indivíduos. “Em 2022, 26% dos encontros de aplicação da lei pela CBP [Agência de Proteção de Fronteiras e Alfândega] envolveram pessoas anteriormente encontradas nos 12 meses anteriores, em comparação com 45% dos encontros entre março e setembro de 2020, 35% em 2021 e uma média de 15% entre 2014 e 2019.”
Somente em Maio de 2023 o Título 42 foi descontinuado, e o sistema de imigração norte-americano retornou às regras tradicionais, que exigem processos legais mais estruturados para avaliar os pedidos de asilo, impondo penalidades severas para reentradas não autorizadas. Nesse ano, ainda foram expulsos sumariamente, por essa via, um total de 579 mil pessoas, registando-se uma descida do total dos repatriamentos para valores próximos de 1,2 milhões de pessoas. Neste ano, já se observou uma subida das deportações ‘clássicas’, com recurso a meios judiciais, que se cifraram em 117.540 pessoas, enquanto os retornos forçados aumentaram para quase 289 mil e os retornos administrativos se quedaram nos 154 mil.
Observando as expulsões de território norte-americano ao abrigo da aplicação do Título 42, os valores impressionam em quatro anos: 2.960.910 casos, representando 64% do total dos repatriamentos. Neste período, em cada 100 expulsos por esta via, 97 foram durante o mandato de Biden. Por causa disso, as deportações tiveram apenas um peso de 13% no total dos repatriamentos, quando, no quinquénio anterior à pandemia, representavam 71% do total dos repatriamentos.
Joe Biden usou e abusou de uma lei sanitária de 1944 para expulsar de forma imediata, sem apelo nem agravo, mais de 2,7 milhões de pessoas de imigrantes ilegais entre 2021 e 2023. Fonte: DR.
Por esse motivo, mostra-se enganador analisar somente a evolução dos números de deportações considerando o período, uma vez que a descida entre 2021 e 2023 é fictícia. Sem pandemia, muitos casos de expulsão sumária seguiriam a via judicial. Também é certo que a expulsão sumária promoveu, indirectamente, uma ‘inflação’ de casos, já que quem fosse mandado sair ao abrigo do Título 42 não incorria nas penalizações (por regra, pena de prisão de dois anos) caso fosse novamente apanhado ilegalmente – e daí os novos ‘reencontros’ com as autoridades fronteiriças.
Seja como for, o padrão do imigrante ilegal nos Estados Unidos não se modificou substancialmente nos últimos anos, embora se tenha intensificado em função do crescimento generalizado dos repatriamentos entre os períodos da primeira Administração Trump (2017-2020) e da Administração Biden (2021-2024). Com efeito, somando todas as modalidades de repatriamento, México (a grande distância), Guatemala e Honduras mantêm-se no topo, representando em conjunto 69% das ‘saídas’, mas com crescimentos acentuados.
O vizinho do sudoeste dos Estados Unidos, onde maiores tensões fronteiriças existem, registou 1.061.890 repatriamentos no quadriénio 2017-2020 e subiu para 2.363.640 no mandato de Biden. Já a Guatemala teve um crescimento de 167%, passando de 187.220 repatriamentos no primeiro mandato de Trump para 500.260 no mandato de Biden. Quanto às Honduras, a subida relativa foi de 228% entre as administrações republicana e democrata, passando de 134.630 repatriamentos para 442.040.
Top 20 dos países de origem dos imigrantes repatriados na Administração Trump (2017-2020) e na Administração Biden (2021-2024).
Um dos sinais do recrudescimento dos repatriamentos na Administração Biden mostra-se pelo número de países com mais de 100 mil casos em quatro anos. No período do primeiro mandato de Trump, além da tríade habitual (México, Guatemala e Honduras), só as Filipinas ultrapassaram aquela fasquia, havendo apenas mais três países (El Salvador, Canadá e China) com repatriamentos acima de 50 mil. Já durante o mandato democrata, que agora terminou, contabilizam-se sete países acima de 100 mil repatriamentos em quatro anos: a tríade México, Guatemala e Honduras, e ainda El Salvador (que passou para a quarta posição), Filipinas, Índia e Canadá. Com mais de 50 mil deportações entre 2021 e 2024 contam-se também o Equador, China, Colômbia e Venezuela.
De destacar que esta evolução mostra, de igual modo, que a pressão sobre as fronteiras norte-americanas está a recrudescer a partir da América Latina, sendo particularmente relevantes os crescimentos relativos dos repatriamentos do Equador, Colômbia, Venezuela, Haiti e mesmo Brasil.
Apesar destes factos mostrarem que o partido democrata no poder foi mais ‘repressivo’ sobre estrangeiros ilegais, Donald Trump tem sido visto como um impiedoso adversário da imigração desde que tomou posse para o seu segundo mandato não consecutivo na Casa Branca. O 47.º presidente norte-americano prometeu a deportação de “milhões e milhões” de imigrantes.
E, na última semana, já estalaram várias polémicas em torno do tema das deportações. O caso do avião com 88 brasileiros deportados gerou uma onda de indignação internacional, que os media tradicionais se encarregaram de reforçar, aproveitando para culpar Trump. Os cidadãos brasileiros estavam algemados e relataram ter sido alvo de maus-tratos durante o voo, onde seguiam 16 agentes de segurança dos Estados Unidos, além da tripulação composta por oito membros. O avião, com destino a Belo Horizonte, no sudeste do Estado de Minas Gerais, aterrou em Manaus devido a problemas técnicos, segundo informações do Ministério da Justiça brasileiro, citadas pela agência de notícias Reuters.
Zona fronteiriça. Foto: Greg Bulla.
O Ministério das Relações Exteriores brasileiro anunciou na rede X que pedirá explicações aos Estados Unidos sobre o que classificou como o “tratamento degradante” a que foram sujeitos os brasileiros deportados. Saliente-se, contudo, que este foi já o segundo voo de imigrantes brasileiros ilegais indocumentados que chegou ao Brasil este ano, sendo que um ocorreu durante os últimos dias do mandato de Joe Biden.
Outra polémica surgiu com a Colômbia, que é o terceiro maior parceiro comercial dos Estados Unidos na América Latina. O presidente colombiano, Gustavo Petro, começou por anunciar que o país iria recusar a aterragem de aviões militares norte-americanos com imigrantes deportados. Mas a ameaça de Trump de impor tarifas a produtos colombianos e outras sanções, nomeadamente a suspensão de vistos, surtiu efeito. Petro voltou atrás com a sua decisão, e a Casa Branca colocou a guerra comercial e as sanções em standby.
O plano de ‘castigo’ dos Estados Unidos previa a imposição de tarifas de 25% sobre todos os produtos colombianos e ainda a proibição de viajar e a revogação de vistos atribuídos aos funcionários do governo colombiano. Também incluía sanções financeiras e bancárias, entre outras ameaças.
Nos media, o tom geral tem sido de crítica à postura de Trump, sobretudo pelo recurso à táctica de ‘chantagem’ para pressionar o presidente colombiano. Numa outra polémica, foi noticiado também que a ‘polícia de imigração’ (ICE) recebeu autoridade sem precedentes para agilizar deportações, numa altura em que há relatos de ‘raides’ em diferentes locais nos Estados Unidos e as tropas norte-americanas estão a ser colocadas na fronteira com o México.
Foto: TheDigitalArtist
Em todo o caso, convém referir que, quando tomou posse em 2017, Trump manifestou a sua intenção de criar um muro contínuo na longa fronteira de 3.142 quilómetros com o México para controlar a imigração. Queria mesmo obrigar aquele país a pagar pela obra, fazendo ameaças de sanções, cobranças de dívidas e cortes de acordos comerciais. Também prometeu ainda expulsar todos os imigrantes ilegais e previa aumentar os custos de taxas de entrada no país e de vistos temporários.
Na campanha que então venceu contra Hillary Clinton, Trump queria obrigar as empresas a empregar primeiro cidadãos norte-americanos, sem exceção, e ainda pretendia vedar a entrada a sírios, iraquianos e outros cidadãos de países de maioria muçulmana.
A realidade foi menos ‘brutal’, a tal ponto que a Administração Biden até acabou por repatriar muitos mais estrangeiros do que ele no seu primeiro mandato.
Apesar da diminuição da subvenção pública pela perda de deputados nas eleições de 2022 ter sido a principal justificação alegada pelo Bloco de Esquerda para uma redução de pessoal – que implicou o despedimento de duas mulheres lactantes –, o partido agora liderado por Mariana Mortágua tem tido uma generosa folga financeira, mesmo se o período entre 2019 e 2022 tenha mostrado algumas fragilidades, mas longe de serem dramáticas.
Com efeito, de acordo com a análise do PÁGINA UM às demonstrações financeiras depositadas na Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, o Bloco de Esquerda, bem antes das eleições legislativas de 2022 – que levaram à queda de 19 para apenas cinco deputados –, já andava com as contas no ‘vermelho’ por um longo período. Desde 2019, para ser mais preciso, registou um longo período de prejuízos, pouco normal na história deste partido de esquerda.
No final de 2012, culminando com a saída de Francisco Louçã da coordenação bloquista, o partido apresentava uma situação financeira já bastante desafogada, com um capital próprio de quase 2,3 milhões de euros. Não são montantes exorbitantes – comparando com PS, PSD e mesmo PCP –, mas aquilo que mais impressionava era o excelente controlo da dívida e a elevada liquidez. Nesse ano, o passivo era apenas de 71 mil euros, todo de curto prazo, e havia 680 mil euros em contas bancárias.
Nos anos seguintes, apesar de variações entre exercícios melhores e menos bons, o Bloco de Esquerda atingiu em 2018 a melhor situação financeira de sempre, com fundos patrimoniais de 2,96 milhões de euros, um passivo perfeitamente controlável (171 mil euros), sem dívidas de longo prazo. Com uma subvenção pública nacional e regional de quase 1,7 milhões de euros, o Bloco de Esquerda terminou esse ano com mais de 1,5 milhões de euros em contas bancárias. Em todo o caso, embora 2018 tivesse sido ainda de lucro, verificou-se uma redução significativa: no ano anterior tinha sido de 445 mil euros, baixando para 130 mil. Uma das razões terá sido o aumento de gastos com pessoal – que subiram, entre 2017 e 2018, de 365 mil para 672 mil euros – e de fornecimentos e serviços externos, que pularam de 616 mil euros para 1,06 milhões de euros.
A partir de 2019, as contas começam a mostrar alguns sinais de degradação. Embora o Bloco de Esquerda tenha mantido, nas legislativas desse ano, os 19 deputados que alcançara em 2015, os custos com as campanhas eleitorais, que incluiu também as europeias, atiraram as contas para o ‘vermelho’. Deste modo, em 2019, o Bloco de Esquerda teve um prejuízo de quase 378 mil euros. Em todo o caso, a liquidez manteve-se elevada: quase 1,1 milhões de euros em depósitos bancários.
A situação financeira do partido não melhorou, pelo contrário no triénio da pandemia (2020-2022), período em que o Bloco de Esquerda praticamente não fez oposição ao Governo socialista, acabando com uma ‘derrocada’ na representação parlamentar nas eleições de 2022, recuando para cinco deputados. Com inéditos custos de pessoal em 2020 da ordem dos 850 mil euros, o Bloco de Esquerda teve então o segundo ano consecutivo de prejuízos (-143 mil euros). E não parou por aí. Os gastos com pessoal reduziram-se em 2021 e 2022 (584 mil e 630 mil euros, respectivamente), mas a redução da subvenção pública neste último ano agravou as contas. Em 2021 o prejuízo foi de 58 mil euros e em 2022 foi de quase 303 mil euros.
Embora os prejuízos acumulados nesse quadriénio (2019-2022), rondando 882 mil euros, tenham ‘limpado’ parte dos fundos patrimoniais, o Bloco de Esquerda estava, até em comparação com os restantes partidos políticos, em situação de desafogo financeiro quando procedeu aos despedimentos das suas funcionárias lactantes.
Com efeito, o ano de 2022 terminou com fundos patrimoniais de 2,2 milhões de euros, um passivo de apenas 103 mil euros e com as contas bancárias a contabilizarem 792 mil euros. Ou seja, o Bloco de Esquerda não estava numa situação aflitiva que justificasse um despedimento de mulheres em situação delicada, sobretudo se se considerar ser essa uma das ‘bandeiras’ do partido. Em todo o caso, na análise das contas de 2023, as últimas apresentadas, nota-se que o ‘sacrifício das lactantes’ contribuiu para o bem económico do partido: as contas regressaram ao ‘verde’ (+ 35 mil euros).
Nota-se, aliás, que Mariana Mortágua impôs uma austeridade draconiana, tendo apenas gastos de pessoal de 456 mil euros, menos 44% do que no ano anterior. Porém, o dinheiro em contas bancária teve uma ligeira redução, para os 717 mil euros, mas com o passivo total a recuar para apenas 79 mil euros.
Se se excluir o Livre – por ter fundos patrimoniais ainda muito reduzidos (172 mil euros em 2023, não tendo praticamente passivo) – e o Chega – que em 2023 ainda tinha fundos patrimoniais de apenas 217 mil euros –, o Bloco de Esquerda é o partido que apresenta melhor situação económica relativa, com um rácio de autonomia financeira de 96%, bem à frente do PSD (86%) e do PCP e PAN, ambos com 85%. O PS apresenta um rácio de apenas 8%, mesmo assim uma melhoria face ao ano anterior, quando estava em falência técnica. Pior ainda só o CDS, que em 2023 estava com capitais próprios negativos de 302 mil euros, e encontra-se em falência técnica desde 2016, pelo que não tem qualquer autonomia financeira.
Fraude. Não há outra palavra que possa caracterizar a mais recente sondagem da Pitagórica para a TVI e CNN Portugal que teve as Presidenciais de 2026 como ‘prato forte’. Apresentada no passado dia 9 de Janeiro, a sondagem – cujos detalhes só esta madrugada [ontem pelas 23:03 horas ainda não estavam] foram disponibilizados pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) –, a sondagem destacou que “Gouveia e Melo é o preferido dos portugueses para a Presidência”, mas a metodologia para a obtenção desta conclusão radica em erros e enviesamentos graves que anulam a sua validade (e até a legalidade).
Com efeito, de acordo com a primeira notícia desta sondagem da TVI – que seria repercutida, de forma acrítica, pela imprensa generalista, tornando-se alvo de inúmeros debates e artigos de opinião –, “o até há pouco tempo chefe do Estado-Maior da Armada é quem reúne as preferências, ficando à frente de figuras que ainda não abriram o jogo quanto a uma candidatura, mas também de outras pessoas que estariam potencialmente bem colocadas”.
TVI e CNN Portugal apresentaram resultados fraudulentos como se fossem intenções de voto. Apesar de haver apenas 400 inquiridos, contabilizaram-se 1032 votos ‘de certeza’, o que significa que cada inquirido atribuiu, de forma convicta, uma média de 2,6 votos pelos proto-candidatos. Assim, uma parte dos 28% dos 400 inquiridos que garantiram que votariam ‘de certeza’ em Gouveia e Melo terão também votado ‘de certeza’ noutros proto-candidatos.
A notícia salientava que “a sondagem dividia-se em quatro respostas: ‘votaria de certeza’; ‘talvez votasse’; ‘jamais votaria’; ‘não conhece o candidato / não consegue ou não quer avaliar o candidato’”, e acrescentava então que, “neste cenário, Gouveia e Melo obteve 28% no ‘votaria de certeza’, um número só igualado por António Guterres” e que, “ainda assim, há mais pessoas que ‘talvez votassem’ no almirante (29%) do que no antigo primeiro-ministro (26%)”.
Numa apresentação televisiva desta sondagem, o jornalista Pedro Benevides, além de mostrar uma lista exaustiva de proto-candidatos, com as percentagens relativas à questão “em quem votaria?”, afirmou, de forma categórica, que Gouveia e Melo, colocado na primeira posição, tinha “28% das intenções de voto dos portugueses que foram consultados nessa sondagem; 28% que dizem que vão mesmo votar nele”.
Mostra-se evidente que a sondagem, por dolo, negligência ou incompetência, deveria ter tido um único destino: o ‘caixote do lixo’. Com efeito, tendo sido inquiridas apenas 400 pessoas – um número que, estatisticamente, para o universo dos recenseados, implica uma margem de erro anormalmente elevada (5%) –, se se somarem apenas os números relativos às respostas ‘votaria de certeza’ alcançar-se-iam 1.032 votos. Ou seja, em média, cada inquirido terá indicado que ‘votaria de certeza’ em 2,6 candidatos.
Em concreto, se Gouveia e Melo teve 28% dos inquiridos a dizerem que votariam nele ‘de certeza’, então foi porque 112 pessoas assim o garantiram na sondagem; se António Guterres teve a mesma percentagem, correspondeu então a 112 pessoas; se Passos Coelho teve 23%, então contam-se mais 92 pessoas; se António Costa teve 22%, significa mais 88 pessoas. Ora, só com estes quatro proto-candidatos se contabilizavam 404 votos em 400 inquiridos.
Ficha técnica da sondagem da Pitagórica disponibilizada hoje pela ERC não revela que as respostas na opção ‘votaria de certeza’ não eram exclusivas. Os resultados da sondagem jamais poderiam ser apresentados como intenção de voto nem têm validade metodológica.
Junte-se mais os 60 inquiridos que supostamente garantiram também que votariam de ‘certeza’ em Marques Mendes (15%); mais os 52 que supostamente garantiram também que votariam de ‘certeza’ em Rui Rio (13%), outros tantos em Durão Barroso, e outros tantos em Cotrim Figueiredo, então os ‘votos de certeza’ sobem para 620 votos em 400 inquiridos. Se se juntar ainda mais os votos ‘de certeza’ em Paulo Portas (48), em Ana Gomes (mais 48), em António Vitorino (mais 44) e André Ventura (mais 44), o pecúlio de votos ‘de certeza’ – e que foram interpretados como “intenções de voto” – ascende então aos 805 votos em apenas 400 inquiridos. Juntando os votos ‘de certeza’ dos restantes proto-candidatos (António José Seguro, Aguiar-Branco, Francisco Louçã, Santana Lopes, Jerónimo de Sousa e Rodrigo Saraiva), atinge, então, um total de 1302 votos.
Esta impossibilidade democrática (cada pessoa ‘vale’ apenas um voto) e semântica (‘de certeza’ significa uma decisão convicta, garantida e exclusiva perante um candidato) invalida qualquer credibilidade à sondagem da Pitagórica e às conclusões retiradas, designadamente aquelas que colocaram Gouveia e Melo como o preferido dos portugueses. De facto, declarar um voto “de certeza”, em democracia, não admite múltiplas escolhas igualmente certas para diferentes opções num mesmo contexto.
Além disso, o inquirido que votasse ‘de certeza’ num determinado candidato deveria, além de ficar automaticamente bloqueado para votar ‘de certeza’ noutro candidato, não ter a possibilidade de ponderar votar em qualquer outro (ou seja, em responder, uma ou mais vezes, na opção ‘talvez votasse’). De igual modo, um voto ‘de certeza’ num determinado candidato, pela assertividade da decisão, implicaria que todos os outros proto-candidatos teriam de receber, de forma automática, um igualmente assertivo ‘jamais votaria’.
Contudo, nem sequer se sabe, na verdade, quantos, de entre os 400 inquiridos, votaram ‘de certeza’ apenas uma vez, nem quantos votaram ‘de certeza’ em dois ou mais candidatos. Aliás, seria curioso saber em quantos proto-candidatos votou o inquirido mais ‘liberal’. Note-se que na Ficha Técnica, hoje divulgada no site da ERC, se omite completamente que os inquiridos podiam optar várias vezes, em diversos proto-candidatos, algo que desvirtua também a sondagem por falta de transparência. Certo é que, havendo ainda indecisão – e daí até a possibilidade de se escolher ‘talvez votasse’ (que poderia ‘beneficar’, aqui sim, vários proto-candidatos –, seria de esperar que o número de votos ‘de certeza’ fosse até substancialmente inferior ao número dos inquiridos.
Numa sondagem com uma absurda margem de erro de 5% e com inquiridos que poderiam escolher vários candidatos em simultâneo a quem entregariam o seu voto ‘de certeza’, o principal beneficiado acabou por ser Gouveia e Melo, apresentado como “o preferido” dos portugueses.
Os resultados da sondagem sobre as Presidenciais, agora divulgada em pormenor no site da ERC, permite, com maior detalhe, a repetição de votos ‘de certeza’ sobre vários quadrantes. Através dos dados em percentagem, o PÁGINA UM conseguiu saber como os diversos ‘simpatizantes’ dos partidos distribuíram os seus votos na opção ‘votaria de certeza’. Por exemplo, no caso dos eleitores da Aliança Democrática – que representavam 123 dos 400 inquiridos –, houve 53 votos em Passos Coelho, 35 em Gouveia e Melo, 30 em Marques Mendes, 29 em Paulo Portas, 27 em António Guterres, 26 em Durão Barrosos, 23 em Rui Rio, 19 em Aguiar-Branco, 18 em Cotrim Figueiredo, 16 em António Costa, 10 em Ana Gomes, 10 em, António Vitorino e mais 34 nos restantes proto-candidatos (Mário Centeno, António José Seguro, André Ventura, Francisco Louçã, Jerónimo Sousa e Rodrigo Saraiva. Soma-se tudo e dá 2,8 votos ‘de certeza’ nos eleitores da Aliança Democrática.
No caso dos eleitores do PS – que representam 116 dos 400 inquiridos – repete-se este padrão. Há 47 inquiridos que ‘juraram’ que votariam em António Costa, 46 que ‘juraram’ votar em António Guterres e 36 em Gouveia e Melo. Somente com estes três proto-candidatos há um problema: para um universo de 116 eleitores socialistas já se contam 129 votos ‘de certeza’. Mas isto agrava-se porque os restantes 16 proto-candidatos recolhem ‘de certeza’ mais 163 votos. Daqui se conclui que em 116 eleitores socialistas, a Pitagórica recolheu 292 votos ‘de certeza’, uma média de 2,52 votos ‘de certeza’.
No terceiro partido com maior representatividade parlamentar, o Chega, também houve muitos eleitores inquiridos que votaram ‘de certeza’ em mais do que um proto-candidato. E nem a absurda possibilidade de se votar várias vezes com convicção em diversos candidatos beneficiou o líder deste partido. Tendo sido ‘seleccionados’ 66 eleitores do Chega, apenas 30 disseram que votariam ‘de certeza’ em André Ventura, pouco à frente de Gouveia e Melo (27). Mas é muitíssimo provável que tenha havido eleitores que garantiram o seu voto a ambos – fazendo relembrar a famosa música de Marco Paulo –, porque os 66 eleitores do Chega votaram 176 vezes ‘de certeza’.
Na sondagem da Pitagórica, um inquirido podia declarar que tinha dois ou mais ‘amores’, indicando que votaria ‘de certeza’ em mais do que um candidato. Integridade e validade dos resultados são, deste modo, absolutamente nulas.
Houve, porém, eleitores de outros partidos mais ‘incertos’ na certeza, ou seja, que deram o voto ‘de certeza’ mais candidatos. Por exemplo, os sete eleitores do PAN, que integraram esta sondagem, concederam 27 votos ‘de certeza’ por diversos candidatos. Cada um teve direito a votar, média, quase quatro vezes (3,86). Os 18 eleitores do Livre também tiveram, segundo a sondagem da Pitagórica, dificuldades em perceber que votar ‘de certeza’ não implica votar em vários candidatos. Com efeito, contabilizaram-se, neste grupo, um total de 59 votos ‘de certeza’, dando assim uma média de 3,28 votos por cada eleitor.
Os eleitores com menor número médio de votos ‘de certeza’ são os do PCP. Em 13 inquiridos, no universo de 400 inquiridos, ‘só’ se contabilizam 19 votos ‘de certeza’. Curiosamente, apenas três se direccionaram para o único militante comunista (Jerónimo Sousa) na lista de proto-candidatos.
Se isto não bastasse, a Estatística Inferencial comprovaria a absoluta fraude desta sondagem da Pitagórica, usada, primeiro, pela TVI e CNN Portugal, e depois amplificada pela imprensa generalista. Com base nos dados conhecidos da sondagem, se se usar uma distribuição de Poisson, a probabilidade de um inquirido ter votado na opção ‘de certeza’ em apenas um proto-candidato foi somente de 19,6%. Usando o método de distribuição binomial, a probabilidade estimada desce para 18,9%, enquanto na simulação multinomial (Monte Carlo) surge a indicação de que todos os inquiridos votaram na opção ‘de certeza’ em mais do que um proto-candidato, reflectindo assim o enviesamento estrutural dos dados da Pitagórica.
O PÁGINA UM contactou Alexandre Picoto, patrão da empresa de sondagens Pitagórica, e próximos dos círculos do PSD, que confirmou a existência da possibilidade de os inquiridos puderem votar em mais do que um dos proto-candidatos na opção ‘votaria de certeza’. “Este tipo de sondagens tem como principal objectivo avaliar a taxa de conhecimento que os eleitores têm dos candidatos, a sua taxa de rejeição e a capacidade potencial de angariar votos, conjugando a opção ‘votaria de certeza’ e ‘talvez votasse’”, alega o responsável pela empresa de sondagens, descartando responsabilidade sobre a interpretação dos resultados feita pelos clientes (TVI e CNN Portugal) pela outra imprensa generalista.
Percentagem de inquiridos que, para cada candidato, lhe garantiram ‘de certeza’ o voto. Valores para a totalidade da amostra e por partido [OBN: outros partidos, brancos e nulos]. Fonte: Pitagórica.
Como Alexandre Picoto não deu uma explicação razoável sobre ter sido possível (contra a lógica democrática e semântica) os inquiridos optarem por ‘votaria de certeza’ em diversos proto-candidatos, o PÁGINA UM decidiu apresentar uma queixa formal junto da ERC, uma vez que a ausência de regras que assegurassem exclusividade nas respostas torna esta sondagem incapaz de captar intenções de voto reais e confiáveis, convertendo-a num exercício vazio de significado e sem qualquer utilidade prática ou analítica. Ou seja, um puro objecto de manipulação e de desinformação.
A Lei das Sondagens determina, como uma das regras gerais, que “a interpretação dos resultados brutos deve ser feita de forma a não falsear ou deturpar o resultado da sondagem”, impondo, de igual modo, que “a publicação, difusão e interpretação técnica dos dados obtidos por sondagens de opinião devem ser efectuadas de forma a não falsear ou deturpar o seu resultado, sentido e limites”.
Na queixa do PÁGINA UM, com cinco páginas, explicitaram-se as “falhas metodológicas”, salientando que “comprometem seriamente a utilidade desta sondagem, e a sua divulgação constituiu um gravíssimo atropelo legal, mais ainda sendo extremamente fácil a detecção das anomalias metodológicos e a falsidade dos resultados, como indicativo de intenções reais de voto”. E solicitava-se que a ERC determinasse a obrigatoriedade da “assumpção pública dos erros metodológicos e de interpretação abusiva por todos os órgãos de comunicação social que [tivessem] abordado a sondagem da Pitagórica”.
Número absoluto de votos contabilizados como ‘votos de certeza’ para cada candidato. Valores para a totalidade da amostra e por partido [OBN: outros partidos, brancos e nulos]. Análise: PÁGINA UM com base nos dados da ficha técnica da Pitagórica.
Porém, apesar da Lei das Sondagens, explicitamente, indicar que “as queixas relativas a sondagens ou inquéritos de opinião publicamente divulgadas, que invoquem eventuais violações do disposto na presente lei”, devem ser alvo de deliberação pela ERC “no prazo máximo de oito dias após a sua recepção”, o Conselho Regulador fez vista grossa a esta sua obrigação.
Tendo o prazo legal para deliberar sobre a queixa do PÁGINA UM terminado na passada segunda-feira, a ERC nada decidiu, dizendo apenas que “se encontra, nos moldes habituais, em apreciação pelos serviços”. Saliente-se que os “moldes habituais” da ERC tem sido mandar para as calendas uma decisão, esvaziando por completo a sua função de regulação e de zeladora contra a manipulação e desinformação. Com efeito, de entre as diversas queixas envolvendo sondagens, o hiato entre a participação e a deliberação da ERC tem sido de vários meses e mesmo anos. E nos casos mais gravosos, que implicaram a violação da Lei das Sondagens, a admoestação é geralmente a sanção aplicada.
Por exemplo, uma queixa contra um jornal de Vila Nova de Famalicão sobre uma sondagem política local apresentada à ERC em 26 de Setembro de 2013 só teve uma deliberação praticamente dois anos depois, em 23 de Setembro de 2015, que concluiu pela abertura de um processo de contra-ordenação. A decisão final, através de uma admoestação, demorou mais de quatro anos e sete meses, ou seja, foi proferida em 7 de Maio de 2020.
Regulador apenas divulgou a ficha ténica da sondagem da Pitagórica duas semanas depois da divulgação da parte sobre as Presidenciais, e não cumpre o prazo de oito dias para análise de queixas determinado pela Lei das Sondagens.
Outra queixa, sobre a actuação do jornal I face a uma sondagem da Pitagórica sobre as eleições legislativas, apresentada em finais de Agosto de 2015, somente teve uma deliberação em 4 de Maio de 2016. Neste caso, o processo de contra-ordenação até resultou numa coima de 15 mil euros, mas a decisão foi proferida em 15 de Dezembro de 2021. Ou seja, seis anos e quatro meses após os factos.
A passividade e a lentidão da ERC contribuem, assim, e de forma decisiva, como um convite para a manipulação pura e dura das sondagens e inquéritos de opinião num clima propício à impunidade. E mesmo se um dia houver penalidades, o objectivo da manipulação foi alcançado, por se tornar inútil e intempestiva posterior acção do regulador. Aliás, perante o incumprimento dos prazos legais por parte da ERC, o PÁGINA UM perguntou a esta entidade se, pelo menos, uma deliberação sobre a sua queixa contra esta sondagem fraudulenta sairia antes das Presidenciais previstas para Janeiro de 2026. Não obteve resposta.
N.D. As 16h53, de 23 de Janeiro de 2023, o PÁGINA UM recebeu uma mensagem da ERC, em correio electrónico, que se transcreve na íntegra:
“A ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social atua em estrito cumprimento da lei e para o fazer tem obrigatoriamente de conciliar tempos de decisão variáveis, ponderando sobre a melhor forma de compatibilizar direitos dos interessados e disposições legais previstas nos diferentes enquadramentos jurídicos das questões que analisa; este exercício nalgumas situações confronta o processo de decisão com prazos processuais contraditórios entre si.
No caso em apreço, estão a ser cumpridos o ‘direito de defesa’ das partes visadas conforme disposto nos Estatutos da ERC (cf. n.º2, art. 56.º) e o direito de ‘audiência dos interessados’ nos termos gerais do Código do Procedimento Administrativo.
Mais se informa que o depósito da sondagem considerada neste processo encontra-se disponível para consulta pública desde ontem, de acordo com os prazos estabelecidos para consulta pública de sondagens e estudos de opinião (cf. Deliberação 1/SOND/2009).”
O PÁGINA UM reitera o que escreveu: a Lei das Sondagens é clara no tempo definido para tomar uma deliberação: oito dias, prazo que se encurta para apenas dois dias durante os períodos de campanha eleitoral. Como se compreende, se os membros do Conselho Regulador da ERC não concordam com essa imposição legal, têm um de dois caminhos: ou procuram, junto da Assembleia da República, a alteração da lei; ou optam por se demitir, considerando-se incompetentes para executar uma norma legal. Uma deliberação deve ser sustentada, neste caso, por uma analise inicial, que pode desencadear um arquivamento ou a abertura de um processo de contra-ordenação, aí sim com possibilidade de defesa. Aquilo que não pode suceder é o benefício do potencial infractor: ou seja, passar para a opinião, durante meses ou até anos, que uma sondagem fraudulenta tem validade com as repercussões públicas e políticas conhecidas.