Categoria: Opinião

  • O primeiro aniversário do PÁGINA UM: balanço em entrevista

    O primeiro aniversário do PÁGINA UM: balanço em entrevista


    Seria importante fazer aqui um texto, em forna de balanço, sobre o primeiro aniversário do PÁGINA UM. Acabámos por optar por uma conversa sobre como se criou e foi avançando o projecto do PÁGINA UM desde que a ideia germinou, e foi crescendo ao longo de 2022, até hoje.

    Mais do que comemorar aquilo que já fizemos, esta entrevista serve, para mim, para agradecer a todos aqueles que têm feito e colaborado com o PÁGINA UM, e sobretudo aos leitores. Foram e são os leitores que são o suporte e o sustento deste projecto.

    E serve também para fazer um balanço daquilo que fizemoscomo jornal independente, isento e irreverente.

    Deixo aqui a entrevista. Obrigado a todos. O segundo ano será melhor, assim espero.

  • Terrorismo à portuguesa

    Terrorismo à portuguesa


    Não há crime mais criticado, em todo o Mundo, do que o de terrorismo.

    Por ser ultra-violento e cobarde.

    De modo geral, quem coloca uma bomba – por exemplo – não faz ideia de quem poderão ser as vítimas.

    Quem mata, sem se preocupar com danos colaterais, tem que ser considerado como duplamente criminoso.

    photo of person holding teal smoke grenade

    O terrorismo é a arma dos amorais. Dos que pretendem conseguir os seus objectivos sem olhar a meios.

    Daí que os Estados, e bem, se tenham preparado contra este flagelo com Leis fortemente punitivas e dissuasoras da prática deste crime.

    O problema é que “alguns” Estados optaram por aproveitar esta oportunidade para aprovarem uma Lei que lhes permite contornar alguns dos mais sagrados Direitos conseguidos durante anos de luta.

    Uma Lei sobre “terrorismos” devia estar escrita de modo a não permitir interpretações dúbias, sempre em desfavor dos inimigos políticos de quem esteja no Poder.

    Nem dar a oportunidade a magistrados sem preparação, que, por incompetência ou maldade, a possam usar como arma de destruição de arguidos que, sem ela, dificilmente poderiam ser pronunciados.

    Vem isto a propósito de dois casos recentes.

    white printer paper

    O primeiro tem, como figura principal, um jovem muito doente, complexado, com uma necessidade enorme de começar a ser respeitado pelos seus colegas de estudo, que terá feito ameaças de matar uma série de alunos da sua Faculdade.

    E terá confessado isso a alguém dos Estados Unidos que, por sua vez, alertou o FBI, que avisou a Polícia Judiciária.

    Os inspectores portugueses prenderam-no e, durante semanas, as principais figuras da nossa Polícia pintaram, para a comunicação social, o quadro da prisão de um novo Bin Laden que tinha, como objectivo, fazer um massacre na Universidade.

    Não mencionaram que o jovem é um doente, que sofre de Síndrome da Asperger.

    Não convinha dar qualquer hipótese a um perigoso “terrorista”, que ficou preso, até ao julgamento, onde foi condenado a dois anos e meio de prisão com necessidade de tratamento psiquiátrico.

    Mais um recluso a elevar o número de doentes mentais presos em cadeias por falta de hospitais psiquiátricos.

    Este caso fez lembrar uma outra decisão de prisão, por terrorismo.

    Lembro o conhecido “ataque” à Academia do Sporting, em Alcochete, levado a cabo por quatro dezenas de adeptos idiotas, zangados com a má qualidade do jogo que a equipa de futebol vinha praticando.

    Quarenta parvos invadiram a Academia, e um deles agrediu com um cinto um atleta, fazendo-lhe um golpe na cabeça.

    Outro, atirou uma tocha incendiária para dentro da Academia.

    Foram, os quarenta, presos preventivamente por terrorismo.

    A única explicação para este absurdo é que, quando acusados de terroristas, as leis mudam para os arguidos.

    Podem ficar sujeitos a prisão preventiva e podem ver as suas casas revistadas a qualquer hora  

    Um maná para quem considere importante a prisão de alguém sem poder contar com uma Lei que a permita.

    Os quarenta jovens ficaram presos por mais de um ano.

    Muitos deles perderam um ano de estudo.

    Outros, os seus empregos.

    people walking on the street during daytime

    No final, como não podia deixar de ser, os “terroristas” foram absolvidos.

    Os incompetentes que fizeram a investigação, a acusação e a pronúncia, continuaram nos seus postos. Excepto os que foram promovidos.        

    Para quem analisa estes casos como “um falhanço da Justiça”, quero deixar um alerta: esta Lei tem de passar a ser fortemente criticada e punida.

    A sua actual interpretação permite que, com base em suspeitas de terrorismo, seja lá por aquilo que for, qualquer cidadão seja apanhado de surpresa numa busca a sua casa, pelas três ou quatro da manhã, levado para uma cela onde pode ficar impedido de contactar quem quer que seja, enquanto uma comunicação social, colaborante, vai destruindo a sua imagem para a opinião pública.

    Passados uns anos, quando houver a certeza de que está destruído politicamente, até pode ser libertado.

    in flight dove

    Mas nunca mais será considerado um cidadão credível porque, sabe-se, “não há fumo sem fogo” e para ter estado preso… algo fez.

    Na verdade, a interpretação que alguns investigadores e magistrados dão às Leis, e o apoio que recebem de alguma comunicação social a legitimar essa leitura, funciona como a legalização de métodos usados na ditadura.

    E, isso sim, é que é um verdadeiro terrorismo.

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • E agora, minhas senhoras e meus senhores: o Kosovo

    E agora, minhas senhoras e meus senhores: o Kosovo


    Vi passarem, entre rodapés e notícias de futebol, duas intervenções que me pareceram importantes para antevermos 2023 já a imaginar o que será 2024. A primeira foram as afirmações de um representante ucraniano, opinando que as economias desenvolvidas davam pouco suporte à Ucrânia e que, na visão dele, cada membro da União Europeia deveria dar 0,1% do respectivo produto interno bruto (PIB). Dizia ele que, se fizéssemos as contas, até perceberíamos ser uma gota no oceano dos orçamentos da União Europeia.

    Eu não só concordo com ele como, até, acrescento que o pedido peca por escasso: mas é, por acaso, a Ucrânia algum Ministério da Cultura para ficar com percentagens tão ínfimas de um Orçamento de Estado?

    blue flag on top of building during daytime

    Não bastam os 2% do PIB para a NATO, o material e dinheiro enviado pelos países europeus ou até as sanções à Rússia, que nos fazem pagar a mesma energia bem mais cara.

    Portanto, ficamos a saber que não basta empobrecer para garantir a defesa da Ucrânia; é preciso empobrecer por decreto e passar a incluir esta guerra, apenas esta, no planeamento do que fazer com os impostos no próximo ano.

    Há aqui um certo conforto com esta solidariedade europeia, que passou de necessária para obrigatória, seguida de “mais e mais”, vindos de Zelensky e companhia, que a cada dia exigem mais empobrecimento a todos nós para defender uma causa sua.

    Compreendo que o peçam; estão a manter a sua causa viva, mas não percebo porque se sentem os dirigentes europeus no direito de utilizarem livremente os impostos dos seus constituintes, de forma repetitiva, a favor da Ucrânia, mantendo o empobrecimento geral deste lado.

    blue and yellow striped country flag

    Bem sei que ninguém gosta de perder fatias de terreno, mas não nos cabe, a nós europeus, pagar uma guerra sem fim à vista.

    Quem a estimulou (Estados Unidos e Rússia), e quem acreditou no conto de fadas que ouviu (Ucrânia), que a pague ou resolva. Mas já chega de isto sobrar para todos. E já chega de ver Ursula e demais dirigentes europeus baixarem a cabeça a cada nova exigência de Zelensky, como se nós lhes devêssemos algo, ou como se aquela guerra fosse nossa. Lamento pelo povo dos dois lados, mas eles que resolvam as suas diferenças e, de caminho, se vejam livres de Putin e Zelensky.

    Por acaso alguém vê dirigentes palestinianos a exigirem anti-aéreas todos os dias? Acham que levam com poucos rockets? Ou os combatentes no Iémen, bombardeados pela ditadura “nossa amiga” (saudita), lembram-se de os ver em intervenções emocionadas nos parlamentos europeus a exigir armamento pesado?

    Não suporto esta hipocrisia com quase um ano, que se vai vivendo, em redor da Ucrânia. Há um problema para resolver, como em tantas partes do Mundo. O problema não é nosso. Ponto final. Se os deputados europeus começassem a defender os direitos de quem os elegeu é que a democracia agradecia.

    two hands

    A segunda notícia que me pareceu interessante, mas para a qual ninguém convidou a Helena Ferro Gouveia para falar, logo não deve ser importante, foi a recente tensão na fronteira do Kosovo com a Sérvia.

    Para a rapaziada mais nova que lê o PÁGINA UM, mas que ainda era pequenina na mudança do século, o Kosovo é um país que resultou de um corte de 20% do território da Sérvia, depois da NATO bombardear civis em Belgrado. Pronto: este é o trailer. Para o filme completo, vejam no Netflix.

    Contudo, a parte importante é esta: um território de um país soberano tinha uma maioria étnica, neste caso albaneses, que achou boa ideia formar um novo país. E conseguiram, com o apoio da comunidade internacional. A mesma lógica (das maiorias étnicas) poder-se-ia aplicar ao Donbass, Catalunha, País Basco, Chechénia, enclaves sérvios da Bósnia, Palestina, Curdistão…

    Epá… por absurdo, se amanhã o Paquistão, Bangladesh, Nepal ou Índia quiserem reclamar como seu o Qatar ou o Dubai, em princípio podem. Os emigrantes destas zonas já devem estar em maioria relativamente aos indígenas.

    Para resolver rapidamente estes problemas na fronteira, e a pressão sérvia, os kosovares pediram adesão à NATO há já algum tempo e, agora, à União Europeia. É o precedente que se abriu com a Ucrânia. Se um país em conflito passa por cima de todos os critérios para aderir, por que razão se deveria facilitar a entrada apenas à Ucrânia? 

    No ranking da liberdade, o Kosovo está ali por perto de países como as Filipinas (não sei se já ouviram falar do seu presidente e das medidas bem democráticas que implementa no país), da Somalilândia, de El Salvador e claro, da Ucrânia. Estão na parte da lista das democracias complicadas e consideradas “parcialmente livres”. 

    Ursula von der Leyen acha este interesse maravilhoso, porque, segundo ela, a União Europeia não está completa sem os Balcãs… Já agora, alguém poderia dizer à Ursula que a União Europeia costuma fazer umas certas “exigências” naquela região. Por exemplo, a Croácia só entrou em 2013, uma década após ter feito o pedido de adesão e depois de ter entregado uns generais por causa da Guerra dos Balcãs. E exigiu ainda mais à Sérvia, que está a marcar passo desde 2009 por não ter feito o mesmo com um batalhão de gente. Aliás, a proximidade de Belgrado a Putin não nasce de inspiracão divina.

    Com o Mundo novamente a caminho de formar dois blocos (ou três, quem sabe), a Europa tenta reunir todas as suas fronteiras e não olha a critérios ou nomes. O Kosovo pode não cumprir nada do que é necessário para integrar o grupo da União Europeia, mas faz parte daquele restrito leque de países onde atacar território soberano e roubar-lhe uma fatia, não é imperialista nem tão pouco errado. É apenas justo e reconhecido por todos.

    satellite photo of islands

    Portanto, perante isso, o que é uma entrada a pés juntos na União Europeia com o árbitro de olhos fechados?

    Por mim, incluímos no negócio a Albânia, a Moldávia, a parte turca do Chipre, o Montenegro e a Macedónia. Depois, ainda esticávamos o bloco mais a sul e, na expectativa de criar um grande bloco, fazíamos o convite ao Sahara Ocidental, Argélia e Líbia. Se nos dessem gás e petróleo, e sem mandarem migrantes nos barcos de borracha, claro.

    Se os critérios servem para pouco, por mim então era só juntar mais pessoal. Imaginem o melão dos liberais quando vissem que, com esta malta toda, e mesmo ultrapassados pela Roménia, acabaríamos ali a meio da tabela para os próximos 10 anos. Sempre com o Ruanda à perna.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A invasão do Centro de Reabilitação Rovisco Pais

    A invasão do Centro de Reabilitação Rovisco Pais


    Dados estatísticos que fundamentem a decisão sobre o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e sua construção – e inclusive o seu aumento ou extensão para Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro (vulgo, Rovisco Pais) e ao Hospital de Cantanhede – são, por certo, de uma acuidade intocável. Fui ver!

    Apresenta estudos bem-feitos de índices de saúde na Região Centro, mas terminam em 2015. Não devem ser estes que fundamentam a decisão.

    O Instituto Nacional de Estatística em 2020 disseca diversos pontos, revelando, por exemplo, que a região do país com menos camas é a do Centro; nesta região os internamentos especializados são os mais longos (incluam aqui o Rovisco Pais), e as despesas de saúde têm aumentado, sendo agora 9,4% do PIB (o caminho traçado de alterações parece não ter qualquer sucesso), o valor da despesa privada está a diminuir e a pública a aumentar (o fim das PPP não foi avaliado). Nada sugere que a concentração seja um bom caminho.

    Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro é uma unidade especializada da rede de referenciação hospitalar de medicina física e de reabilitação do Serviço Nacional de Saúde.

    Um trabalho importante – que todos os anos alguns insistem em escrever e os políticos gostam de esquecer – é o do Observatório Português do Sistemas de Saúde, de onde retiro uma frase que contraria a fusão em mega-estruturas: “E, diga-se também, que não valerá a pena insistir na inaceitável ideia das falsas urgências: se o recado pode ser aceitável para quem desenha os serviços e o acesso a eles – embora também por aí algo injusto, pois não se pode imaginar que é possível uma mudança radical num curto espaço de tempo – o que se exige é não culpar a vítima. Espera-se antes a evidência de um caminho que progressivamente racionalize o acesso aos cuidados e no qual as telecomunicações podem ter um papel essencial.”

    Para a solução dos problemas não tem bastado construir mais e cada vez maior, excepção feita aos apocalípticos cruzeiros de agora, aos mega-aviões. Como sempre, eles condicionam problemas graves de ambiente que vão obrigar a repensar o conceito. Na saúde, o conceito do cruzeiro tem seus defensores em entidades privadas – como o Hospital da Beneficência do Brasil, ou o Hospital das Clínicas de São Paulo.

    São estruturas orientadas para o lucro, financiadas por grandes grupos económicos onde os direitos não são iguais aos dos sindicatos da Função Pública portuguesa nem aos compadrios políticos desta alma pátria.

    Centro de reabilitação funciona na Quinta da Fonte Quente, na freguesia da Tocha (concelho de Cantanhede), desde 1996.

    Outra ideia forte deste relatório é o da domiciliação de cuidados que ganha força no mundo e contraria totalmente estas concentrações apocalípticas.

    Ou seja, a decisão de assaltar “Mariupol” (Rovisco Pais) ou “Donetsk” (Cantanhede), como já se fizera à “Crimeia” (Covões/ Maternidades) tem a mesma lógica do Putinismo mais primário: invadir sem plano e sem estratégia, abafar e apagar. Dos planos escritos não há nenhum que nos indique esta solução escolhida “superiormente”.

    Os erros de Cantanhede e Rovisco Pais foram desenhados em estratégias obtusas do PS que os converteu em locais de emprego de militantes – que denunciei no seu tempo próprio –, gente que foi para destruir e empregar votos em vez de corrigir os defeitos e transportar soluções. Quando menos se trabalhava nessas casas era quando mais gente ficava funcionária delas. Votos comprados para o PS.

    Diogo Cabrita é médico


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Miocardites & aldrabões: coisas que nos devem tirar do sério

    Miocardites & aldrabões: coisas que nos devem tirar do sério


    Após a Direcção-Geral da Saúde (DGS) ter feito na sexta-feira um estranho alerta – e escrevo estranho, porque esta entidade é perita em esconder informação por acção e inacção –, apelando para os médicos reportarem casos de miocardites e pericardites em crianças dos 5 aos 11 anos após a toma da vacina contra a covid-19, ontem surgiu um comunicado de imprensa desta entidade com o Infarmed, para “esclarecimentos”.

    A credibilidade destas duas entidades – DGS e Infarmed – para prestar esclarecimentos é, convenhamos, quantificável: vale ZERO.

    boy in green shirt holding red paper heart cutout on brown table

    A DGS anda, desde sempre, a manipular informação, a mentir descaradamente, a esconder documentos. Os números da covid-19 ou de outras quaisquer doenças têm sempre um cunho político, e Graça Freitas não poderia ser o melhor capacho para limpar responsabilidades políticas pela gestão da pandemia nos últimos anos, e que nos tem custado excessos de mortalidade sem fim e sem qualquer justificação.

    Por sua vez, o Infarmed, em vez de se portar como um regulador defensor da Saúde Pública e dos interesses dos cidadãos, tem preferido claramente a postura de paladino da indústria farmacêutica e do Governo. Não se compreende como o Infarmed luta tenazmente, há mais de um ano, para não libertar os dados das reacções adversas (Portal RAM), alegando todo o tipo de argumentos falaciosos para que não se saiba a verdade.

    Aquilo que mais me choca no “esclarecimento” de ontem da DGS e do Infarmed é, porém, a sua convicção de que estão a “falar” com uma comunicação social dócil e colaborativa, pelo que sabiam que lhes bastava colocar água na fervura para que o “deslize” da sexta-feira passada ficasse no esquecimento.

    person in black knit cap and gray sweater

    Senão vejamos. Começam por dizer que o Comité de Avaliação do Risco em Farmacovigilância da Agência Europeia de Medicamentos (EMA) concluiu em 9 de Julho do ano passado, que “podem ocorrer, muito raramente, casos de miocardite e pericardite após vacinação com as vacinas Comirnaty e Spikevax”. Qual o risco quantificado? Não dizem!

    E desde essa data – e sabendo-se que só este ano, de acordo com uma consulta rápida no Google Académico, foram concluídos cerca de 4.340 artigos científicos em que se abordou a questão das miocardites em vacinas contra a covid-19 –, porque nada esclarecem a DGS e o Infarmed? Porque não lhes interessa nem ajuda as suas aldrabices.

    Depois, diz ainda o “esclarecimento” da DGS e Infarmed, que “o número de casos de miocardites e pericardites notificado na União Europeia/ Espaço Económico Europeu ao EudraVigilance foi de 901 casos relativamente à vacina Comirnaty (em 16,1/milhão de vacinados), e de 106 para a Spikevax (em 34,1/milhão de vacinados)”.

    Consegue-se confirmar essa informação em algum lado para além deste “esclarecimento”? Não. O Infarmed e a EMA são “peritos” em manipular informação sobre as reacções adversas, de sorte que nada muito em concreto se sabe consultando os dados disponíveis, por exemplo, no Eudravigilance.

    girl getting vaccine

    Em concreto, consultando esta base de dados que serve para fazer de conta que se mostra alguma coisa – sem se mostrar nada –, verifica-se que no grupo das “afecções cardíacas” (cardiac disorders) – onde certamente estarão integradas as miocardites e pericardites – não se vislumbram casos concretos para aquele grupo etário (5 aos 11 anos) – embora o número de indivíduos sem idade apurada seja muito grande – e para a idade dos 12 aos 17 anos estão indicados 5.368 casos de afecções cardíacas para a vacina da Pfizer (Tozinameran). E nenhum para a da Moderna (Elasomeran).

    Em seguida, continua o “esclarecimento” da DGS e Infarmed, ao melhor estilo aldrabão do toda-a-gente-já-sabe: “Recorda-se que a miocardite e pericardite são complicações conhecidas da COVID19 e ocorrem com maior frequência após a infeção COVID-19 em comparação com a ocorrência observada após a vacinação.”

    Ocorrem com maior frequência? Onde estão esses dados?

    Estarão no Portal RAM que o Infarmed esconde há um ano e que luta desde Abril passado para o Tribunal Administrativo de Lisboa não o obrigar a ceder ao PÁGINA UM?

    Dados sobre reacções adversas no Eudravigilance sobre as vacinas da Pfizer por grupo etário para todo o espaço europeu

    Estarão na base de dados dos Grupos de Diagnósticos Homogéneos que o Tribunal Administrativo de Lisboa obrigou a Administração Central do Sistema de Saúde a disponibilizar ao PÁGINA UM, mas que esta entidade do Ministério da Saúde continua a obstaculizar, através de um recurso?

    E, por fim, onde estão “os dados disponíveis” que, diz a DGS e o Infarmed, “confirmam que o desenvolvimento de miocardite e pericardite após vacinação segue um perfil clínico típico, geralmente com melhoria após descanso ou tratamento”?

    Em toda a gestão da pandemia, não há perdão para quem promoveu e apadrinhou, através do medo e da ideia de um perigo que nunca existiu para os mais jovens, um programa de vacinação imprudente, no mínimo, e que pode ser mesmo criminoso.

    Mesmo havendo jovens que pudessem estar em risco em caso de infecção por SARS-CoV-2, devido a certas comorbilidades, jamais isto justificaria uma vacinação massiva e independentemente da existência de imunidade natural; bastaria identificar essa pequena minoria, e poupar o grupo largamente maioritário a receber um medicamento que ainda não estava minimamente testado para ser usado de forma indiscriminada.

    Dados sobre reacções adversas no Eudravigilance sobre as vacinas da Moderna por grupo etário para todo o espaço europeu

    Qual é a parte do número 4.340 – o número de estudos que foram publicados só este ano, em 2022, sobre miocardites relacionadas com a vacina da covid-19, independentemente das suas conclusões – que a DGS e o Infarmed não percebem? Como podem assegurar que já se sabia tudo, que a vacina era segura para um grupo de baixíssimo risco, e depois surgem 4.340 estudos científicos só sobre uma matéria tão específica?

    Que aldrabice criminosa é esta de se usarem números não confirmáveis de uma forma independente, e de ignorar toda a literatura que foi apresentada depois da decisão espúria de vacinar crianças, adolescentes e jovens adultos saudáveis?

    Ontem, devo ter sido o único jornalista a ter colocado questões e pedido dados quantitativos à DGS para que fosse justificado o “esclarecimento”. Não tive resposta, o que diz muito da credibilidade deste tipo de aldrabices que a imprensa mainstream engole sem engasgar…

  • A última dança do melhor jogador do Mundo

    A última dança do melhor jogador do Mundo

    Tal como no jogo da meia-final, contra a Croácia, a Argentina começou o jogo da final com um penalti. O quinto da competicão, o segundo seguido a desbloquear a fase inicial de um jogo onde a Argentina foi superior durante 80 minutos.

    A França, abalada pelo inexplicável penalti sobre Di Maria, nunca se encontrou e esteve longe da equipa que se superiorizou em todos os jogos até hoje. Messi conduziu os colegas magistralmente e, a espaços, a França ficou reduzida a uma equipa banal, que se limitou a andar atrás da bola. Di Maria foi um desequilíbrio constante, na asa esquerda, e a bola rodava sempre por Messi, que, com poucos toques, procurou constantemente o ex-benfiquista.

    Com a França a tentar aproximar-se da baliza argentina, o segundo golo acabou por aparecer de forma natural, tal como com a Croácia, num contra-ataque exemplar concluido por Di Maria, que, aos 33 anos, ainda faz sprints de um lado ao outro do campo.

    A aula argentina terminou a 10 minutos do fim, quando Mbappé marcou dois golos de rajada. O primeiro num penalti também bastante duvidoso e o segundo num gesto técnico de difícil execução. O jogo mudou a partir desse momento, e os franceses voltaram a acreditar, encostando os argentinos às cordas nos instantes finais.

    No prolongamento, a Argentina voltou a mostrar coração e ficou novamente por cima da contenda. Messi puxou dos galões e decidiu que este seria, definitivamente, o seu Mundial. 

    Nesta fase, os franceses insistiam essencialmente nas jogadas individuais e deixaram de atacar como equipa. Os cruzamentos para a área desapareceram e a troca de Thuram por Giroud, um perigo no jogo aéreo, revelou-se pouco acertada por parte de Deschamps.

    Os 10 minutos finais do prolongamento foram de nervos e de imprevisibilidade, com a França a atacar e a Argentina a controlar a posse como podia. Di Maria passou 15 minutos a chorar. Ora porque marcava Messi, ora porque marcava Mbappé. Não consigo imaginar o que sente um profissional num momento destes.

    O empate aos 117 minutos de jogo, conseguido pelo hat-trick de Mbappé, garantiu a montanha-russa de emoções. Nos dois minutos finais, a Argentina ainda teve uma oportunidade na cabeça de Lautaro, mal concluída, e Kolo Muani, completamente isolado em frente a Emiliano Martinez, falhou quase na última jogada do encontro o golpe de teatro que daria o 4-3.

    Depois de um jogo absolutamente épico, seguiu-se a lotaria dos penalties. Aliás, lotaria não. Ganha quem não treme, e a Argentina não tremeu. Martinez voltou a provar que é um especialista na matéria e os jogadores franceses não tiveram a frieza para seguir os passos de Mbappé que, por três vezes, facturou da linha da grande penalidade.

    Assim, 36 anos depois, a Argentina consegue colocar Messi ao nível de Maradona, e, provavelmente, terá garantido a oitava Bola de Ouro com uma despedida de sonho.

    O Mundial do Qatar termina com um vencedor que não tinha a melhor equipa, mas possuía mais alma e, como se percebeu, o ainda melhor jogador do Mundo.

    A última dança de Messi foi, por isso, perfeita. Parabéns ao génio e aos fãs argentinos que, como se percebe pela paixão, também são de outro planeta.

    Até 2026!

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Este é o corpo de Cristo

    Este é o corpo de Cristo

    Jesus Maria Corcovan era uma vereda que ia dar ao humanitarismo. Tentava aliviar o sofrimento, procurava mitigar a dor, compartilhava a felicidade. Não existia nenhum Jesus Maria endurecido, ou com pensamentos negros. O seu coração estava sempre disponível para quem dele quisesse fazer uso. A sua energia e o seu engenho estavam abertos a todos os que, nestes dons, fossem menos ricos do que ele.

    John Steinbeck

    Tortilla Flat


    Pois então, ora muito bem.

    Sendo a realidade aquele monstro incontornável que mais cedo ou mais tarde nos apanha a todos nas curvas, também eu acabo de passar pela experiência sui generis de já estar extremamente doente em casa, acabar por ser socorrida pelos bombeiros, e depois ficar a receber o tratamento para a minha colite em cima de uma maca, nas Urgências de um grande hospital, durante os oito dias consecutivos que contribuiram para instalar a minha pneumonia. E atenção, nem imaginam a quantidade de velhinhas como eu que para ali estavam. Exactamente como eu, reitere-se: de batinha aberta atrás e  cabelo empastado, de fraldinha e algália, algumas de nós em prantos e outras de nós em brados, todas nós com a nossa dignidade a esquivar-se para cada vez mais longe.

    Agora, eu sei que esta descrição confere com todos os horrores que nos contam a propósito do Sistema Nacional de Saúde, mas mete-se-me pelos olhos dentro que seria criminoso deixar a descrição ficar por aqui depois de ter sido pessoalmente chamada a fazer parte integrante de um pesadelo desta envergadura.

    Acontece que todas as ladainhas das desgraças da Saúde, tantas vezes recitadas aos ouvidos cansados dos Portugueses, têm um outro lado da moeda, e é absolutamente inacreditável que ainda ninguém tenha dito uma palavra a seu respeito. Porque, desse lado da moeda, de noite e de dia, estão a compaixão, o carinho, a paciência, de todo aquele pessoal encarregue de zelar por nós: auxiliares, enfermeiros, medicozinhos fresquinhos acabadinhos de sair do curso, e ainda maqueiros, bombeiros, meninos sangradeiros – toda aquela gente nos tratava como Jesus tratou os pobres, os pescadores, e as prostitutas. Toda aquela gente levava muito a sério o seu Juramento Hipocrático. Toda aquela gente, por muito que se estafasse, estava impecavelmente organizada para nos acudir. E, depois de percebermos isso, já podíamos respirar fundo e entregar-nos nas suas mãos. Com um alívio imenso, pelo menos do tamanho das nossas dores e maleitas…


    … Não estou a brincar, nem a inventar, nem a exagerar. Fiz mesmo o número das velhinhas, 100% by the book: passei tanto tempo naquela minha maca que deu para perceber que as histórias das outras senhoras mal se distinguiam da minha.

    E então a narrativa é mais ou menos assim, no que diz respeito às partes que eu recordo[1]:

    Comecei por ficar fechada em casa porque seria de loucos ir às Urgências por causa de uma mera intoxicação alimentar. Depois comecei a deixar cair tudo das mãos, e a espalhar cacos por todos os meus cantos. Depois comecei a tropeçar, e depois comecei mesmo a cair. Depois comecei a ter períodos de inconsciência, ao que consta cada vez mais prolongados.

    E depois, por fim, um dos meus melhores amigos, a quem eu nunca mais atendia o telefone, assustou-se. Não esteve para mais meias medidas, e chamou logo os bombeiros. Os bombeiros, profissionais de salvar velhinhas, arrombaram-me logo a porta e vieram em meu socorro.

    Ainda me lembro de estar a vê-los subir a escada.

    E, depois disto, não me lembro de mais coisíssima nenhuma.

    Entrei inconsciente no Hospital de Évora, recuperei os sentidos já em cima da tal maca, demorei um bocado a perceber onde estava e a lembrar-me do nome da cidade onde vivo, ainda meti água da primeira vez que me perguntaram a idade[2], e a seguir começaram a passar dias e dias e dias, todos iguais e todos perfeitamente amparados pela tenacidade e pela dedicação das equipas que se iam sucedendo à cabeça do serviço.

    Ouvimos dizer que este era o Corpo de Cristo. CPC esteve infiltrada e investigou.

    Todos os dias vinha sempre uma dupla de uma auxiliar com uma enfermeira, de peso e altura muito bem calibrados, para evitar desequilíbrios, fazer-nos os chamados posicionamentos. Ou seja, nós torcemo-nos todas a tentar dormir, e a dupla repõe-nos direitinhas dentro dos confins complicados da nossa maca, para evitar mais dores musculares. E vêm ter connosco sempre de cara alegre, embora muitas vezes o nosso peso bruto as obrigue a verdadeiros trabalhos forçados. Mais: vêm sempre a tratar-nos por querida, vizinha, meu amor, princesa, e outra coisas assim. Coisas mesmo boas de ouvir no caos aparente de uma Urgência.

    Todos os dias vinha sempre um médico muito querido fazer-nos o update da nossa situação clínica com voz de veludo, e explicar-nos, uma vez mais, que só estávamos ainda ali nas Urgências porque não existia, mesmo, qualquer espécie de vaga na Medicina Interna. Isto está assim em todos os hospitais. Não há mais espaço, e não há mais pessoas. Mas os portugueses, abalados pela crise da COVID, e logo a seguir pela crise da Guerra da Ucrânia, andam cada vez mais deprimidos. O que quer dizer que ficam cada vez mais doentes. Mas agora não se preocupe, e tente mesmo descansar.

    Todos os dias íamos fazer um ou outro exame, e depois o especialista punha-nos a mão no braço com muito cuidado, e dizia, com toda a sinceridade, então as suas melhoras.

    Todos os dias alguém nos levava até à casa de banho, a empurrar a maca com imenso jeitinho. E, depois de lá estarmos dentro, a pessoa lavava-nos e dava-nos um banho. Tal e qual como a Madre Teresa quando lavava as chagas dos párias de Mumbay. Este é o corpo de Cristo.

    Todos os dias aparecia por lá o maqueiro Ricardo, que nos brindava com piadas eruditas, tipo, confie em mim que eu sempre fui um homem muito à frente e até tirei logo a carta de condução em 1652 que era para ficar despachado.

    O que a Comunicação Social nos diz é uma tanga descarada ao pior estilo tuga da esperteza saloia.

    É muito fácil apupar, denegrir, e deitar abaixo tudo o que ainda estiver em pé. Entretanto, em absoluto anonimato e subjugado por faltas de condições orçamentais que o ultrapassam, o Serviço Nacional de Saúde continua a funcionar com a maior abnegação deste mundo. Num País nada espartano e muito pouco dado a heróis, estas pessoas que acumulam horas, e dormem em hotéis para conseguirem acudir-nos a todos por igual, são a verdadeira definição de tudo quanto é estóico e de tudo quanto é heróico.

    Então e o nosso Presidente, que gosta tanto de condecorar os seus súbditos? Nem sequer lhes dá uma medalha?

    Isto é tudo uma vergonha, uma vergonha, uma verdadeira vergonha![3]

    Clara Pinto Correia é bióloga, professora universitária e escritora


    [1] Disseram-me que houve várias outras, mas a questão parece-me despicienda. Foram todas partes gagas de velhinha.

    [2] De certeza que foi por causa do romance que acabei agora mesmo de escrever. A principal protagonista tem 53 anos. Foi isso mesmo que eu comecei por dizer ao medicozinho Emanuel Noivo, quando, na realidade, estou quase a fazer 63. Em troca da gaffe, ele mediu-me a tensão e a temperatura. Sem comentários. Não se pergunta a idade às senhoras.

    [3] Estava sempre a repetir a Dona Isilda, que passou cinco dias na maca ao lado da minha.

    Nota: O título da crónica “Este é o corpo de Cristo” remete para a máxima que os frades e freiras da Ordem dos Missionários da Caridade (criada por Madre Teresa de Calcutá, em 1950) repetem uns para os outros e para si próprios enquanto lavam os corpos esqueléticos, imundos, e lacerados dos Intocáveis.

  • ‘Karma is a bitch’: jornalistas mainstream em choque porque sofrem “censura” no Twitter

    ‘Karma is a bitch’: jornalistas mainstream em choque porque sofrem “censura” no Twitter


    O Twitter tem menos de 400 milhões de utilizadores. O Facebook tem mais de dois mil milhões de utilizadores, sendo a maior rede social do Mundo. O Twitter suspendeu contas de jornalistas e caiu o Carmo e Trindade. Os media mainstream desataram aos berros, a Comissão Europeia rosnou ameaças. Mas quando um jornalista é censurado no Facebook (como conto mais abaixo neste artigo)… sepulcral silêncio. Nada acontece. Nenhum jornalista se revolta. Nenhuma entidade oficial lança ameaças a Mark Zuckerberg.

    Porquê? A resposta é: Twitter e Musk. O Twitter era antes, até à sua compra por Elon Musk, o recreio da maioria dos que (erradamente classificados como liberais ou de esquerda, porque são, na realidade, fascistas) têm sido a favor de censura de conservadores e de cientistas de topo, os quais discordavam das medidas da pandemia. Aqui estão incluídos muitos jornalistas que trabalham para grandes grupos de comunicação social.

    man in white and blue crew neck t-shirt

    Musk mudou tudo e tirou-lhes o recreio. Já não podem brincar à censura e perseguição. Agora, a eles – que são adeptos de censura à moda do regime chinês – saiu-lhes o bolinho da sorte especial (ou a fava, na versão popular portuguesa). Se quiserem brincar à censura, têm de ir para o Facebook ou continuarem a passear no Instagram.

    Mas isto não se inventa. A sério. Depois de terem apoiado durante quase três anos a censura praticada no Twitter, jornalistas estão em choque porque… há censura no Twitter.

    Em resumo, isto foi o que aconteceu agora: o Twitter suspendeu temporariamente uma dezena de contas de jornalistas famosos de grandes meios de comunicação social norte-americanos. O novo dono do Twitter, Elon Musk, alegou que os jornalistas partilharam um link que permite mostrar a localização exacta, em tempo real, do avião privado que o transporta e também à sua família.

    Ontem mesmo, Elon Musk denunciou que um agressor perseguiu um carro onde viajava o seu filho em Los Angeles, tendo bloqueado a viatura e subido para cima do capô do carro.

    Musk alertou que o chamado doxxing – identificação de alguém na Internet, permitindo a sua localização, por exemplo – não seria permitido no Twitter e que as contas que o fizessem seriam suspensas. Mais tarde, depois das contas de jornalistas terem sido suspensas, Musk afirmou que as regras do Twitter também se aplicam a jornalistas, os quais não são especiais face aos restantes utilizadores da rede social.

    Os jornalistas mainstream, que até agora andavam caladinhos sobre as chocantes revelações dos #Twitter Files saíram aos gritos contra Musk. Também a Comissão Europeia, cúmplice e parte activa da censura que se tornou normal nas redes sociais e nos media mainstream desde 2020, saiu também aos gritos e ameaças contra Musk. Sem surpresas. Musk está a expor as mentiras e os crimes cometidos pela anterior administração do Twitter contra muitos dos que lutaram contra as medidas ilegais e anti-científicas que a Comissão Europeia patrocinou.

    Reparem: Musk abriu a guerra aos media mainstream e à Comissão Europeia. Escolheu jornalistas independentes para divulgar os documentos internos que provam as antigas práticas de censura do Twitter. Critica os media mainstream frequentemente, acusando-os de serem parciais e não isentos. E levantou a suspensão de contas no Twitter de cientistas de topo a nível mundial – que tinham sido alvo de censura – e de vozes conservadoras.

    Alguns media tradicionais, incluindo media portugueses, que têm estado tranquilamente a fazer um boicote e a recusar publicar notícias sobre o preocupante e gigantesco escândalo que é os “Twitter Files”, apressaram-se a noticiar em força que Musk suspendeu contas de jornalistas que denunciaram a sua localização em tempo real e da sua família. [O PÁGINA UM tem acompanhado as revelações dos “Twitter Files”, que pode ler aqui]

    Jornalistas a incentivar a localização em tempo real de alguém e da sua família – mesmo sendo uma figura pública – não está correcto. E jornalistas não estão acima das regras. Pelo contrário: por exemplo, no Código Deontológico dos Jornalistas salienta-se que estes devem “respeitar a privacidade dos cidadãos, excepto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende.” Não me parece que divulgar em tempo real a localização do avião de Elon Musk seja “interesse público” ou que a sua conduta seja susceptível para tal.

    Não sou absolutamente nada a favor de censura (a não ser de situações concretas, como incentivo ao ódio, pedofilia e outros crimes), sobretudo no caso de jornalistas que estão a relatar um acontecimento. No entanto, compreendo Musk. É a segurança da sua família que está em causa. Os jornalistas sabem disso (ou têm a obrigação de saber).

    Mas este caso acaba por ser como que uma armadilha para a Comissão Europeia e os jornalistas apoiantes da censura e da perseguição de vozes “dissidentes” das de governos e “narrativas oficiais”, incluindo as impostas pelos dólares de farmacêuticas a facturar como nunca e em ascensão nos mercado de capitais.

    Ao censurarem a censura aplicada por Musk a contas que fazem doxxing, acabam por cair direitinhos na armadilha do dono do Twitter. Então, afinal os jornalistas e a Comissão Europeia estão contra a censura? A sério?

    Só podem estar a gozar. A sua hipocrisia não tem limites.

    Se há coisa que os “Twitter Files” vieram provar é que cientistas de topo a nível mundial foram alvo de censura pelos antigos executivos do Twitter. Também vozes conservadoras foram visadas.

    A maioria dos jornalistas que trabalham para grandes grupos de comunicação social não só foram cúmplices dessa censura como a incentivaram, incluindo nas notícias que publicavam e no tempo e espaço que recusavam dar aos que tinham “algo diferente” a dizer em relação aos comunicados de imprensa de governos e autoridades de saúde.

    O resultado foi a destruição da percepção pública do que é o Jornalismo e do que é a Ciência – não, não é algo que pessoas “seguem” ou “acreditam, porque isso é religião. Foi também uma campanha de terra queimada – eliminando-se todas as vozes discordantes em temas como política, saúde, ou outros.

    Além da interferência que houve nas eleições presidenciais norte-americanas: antigos funcionários do Twitter censuraram conteúdos de conservadores e suspenderam a conta do então presidente, Donald Trump, enquanto protegiam o candidato democrata, Joe Biden, proibindo a divulgação das notícias sobre o famoso escândalo envolvendo o portátil de Hunter Biden.

    Elon Musk, novo dono do Twitter, tem estado a divulgar documentos internos da rede social que provam as antigas práticas de censura da empresa. Vozes do lado político mais conservador eram visadas pela censura, tal como cientistas de topo que se mostraram contra as medidas de alegado combate à covid-19. As revelações estão a ser feitas por jornalistas independentes e não pelos tradicionais grandes grupos de comunicação social que pactuaram com a censura que era feita anteriormente pelo Twitter.

    Em Portugal, a maioria dos grandes grupos de comunicação social alinharam com as políticas de censura, achando-se “importantes” e parte do “poder”. Que falácia tão grande. Ao alinharem com as políticas de silenciamento e perseguição de vozes discordantes, os media auto-destruíram a sua credibilidade e a do Jornalismo.

    Pela positiva, começaram a nascer e a florescer órgãos de comunicação social, como o PÁGINA UM, ou o The Free Press, nos Estados Unidos. E também blogues, como o Farol XXI, da Plataforma Cívica Cidadania XXI, que foi uma lufada de ar fresco num panorama de censura e obscurantismo que se vivia em Portugal durante a pandemia.

    A diferença na “censura” actual no Twitter é que as contas de jornalistas que praticaram doxxing deixarão de estar suspensas em alguns dias, em princípio, segundo sugeriu Musk. No passado, na era pré-Musk, personalidades foram banidas definitivamente do Twitter. Porque divulgaram mentiras? Não. Porque incentivaram agressões e assédio a figuras públicas e às suas famílias? Não. Simplesmente porque diziam algo diferente do que os governos queriam. E os ajudantes desta PIDE da Internet e da comunicação social executavam as “sentenças” e os “castigos”.

    Enquanto os olhos das redes sociais estão agora voltados para o Twitter, no Facebook, no Google e nas suas apps e empresas continua tudo igual como era desde 2020: censura vasta e precisa aplicada a quem não diz o que governos e autoridades comprometidas e moralmente falidas não autorizam.

    Foi frequente, na pandemia, a censura nos media de vozes discordantes da chamada “narrativa” oficial. Alguns media mainstream passaram notícias falsas e desinformação. Jornalistas incentivaram o ódio e a perseguição de pessoas que discordavam das medidas da pandemia. As pessoas que decidiram não tomar vacina foram alguns dos alvos visados por jornalistas e directores de publicações, sem qualquer justificação científica e claramente em violação do Código Deontológico dos Jornalistas.

    Na semana passada, esta “vossa” jornalista viu a sua conta ser bloqueada por um dia no Facebook e agora os meus conteúdos são “escondidos” durante cerca de um mês. O motivo: partilhei uma notícia do PÁGINA UM – um órgão de comunicação social português constitucionalmente protegido – sobre uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa. A sentença é verdadeira. A notícia é verdadeira. Mas o tema da sentença e da notícia não é aprovado pelo Facebook.

    Apetece fazer “LOL”, quando uma empresa tecnológica pode decidir que a divulgação de uma sentença de um Tribunal de um país deve ser censurada e bloqueada para não chegar ao conhecimento do público. Apetece rir, porque deveria ser uma anedota, o Facebook poder bloquear uma notícia escrita por um jornalista com carteira profissional e publicada num jornal licenciado junto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

    Nenhum jornalista se revoltou. Nenhum burocrata na Comissão Europeia vociferou. Dirão: ah, claro, porque és só uma jornalista portuguesa e no Twitter foram suspensos uma dezena de jornalistas famosos norte-americanos. É certo. Mas é normal que uma jornalista europeia, com carteira profissional há mais de 25 anos, seja bloqueada pelo Facebook por… partilhar uma sentença de um Tribunal e uma notícia sobre o tema?

    Não, não é normal. E também não foi caso único. E não será o último. A diferença é que esta jornalista (e muitos outros), além de não ser famosa, nem norte-americana, também nunca apoiou a censura, pelo contrário. Nunca apoiou a perseguição de cientistas de topo durante a pandemia. Essa é a diferença.

    Tecnológicas como a Meta (Facebook) e Google aplicam ferramentas de censura sob o disfarce de bloquear “desinformação”. O bloqueio de notícias e informações verdadeiras é comum, tal como a suspensão de contas de personalidades que discordam das suas “políticas” de informação, disfarçadas de políticas de comunidade. Estas empresas também cedem a governos, como o chinês, na censura e bloqueio de conteúdos e de utilizadores.

    Apetece rir, mas não é para rir. É antes um caso de polícia. É um caso grave e deve fazer-nos a todos pensar se vamos aceitar estas situações durante mais tempo, se vamos aceitar esta “normalização” da censura de notícias verdadeiras, sentenças de tribunais. De opiniões de cientistas sérios e dos melhores do mundo. De opiniões de pessoas de esquerda e de direita.

    Porque é disto que se trata, desta “normalização” da censura que ocorreu desde 2020. Os jornalistas não são a única classe profissional culpada pela normalização da censura. Os médicos também, os juízes, os polícias, os políticos, os professores, os donos de restaurantes, os enfermeiros, os empregados de limpeza, os académicos, os artistas, … todos os que fizeram silêncio e continuam a aceitar esta anormalidade grave.

    A diferença é que os jornalistas não são um profissional qualquer. O código profissional e de ética que os rege, exige rectidão, imparcialidade, verdade, isenção, objectividade. Em lado nenhum diz que jornalistas são (da falsa) de esquerda, “wokistas, defensores da censura, promotores de ódio e perseguição. Mas isso aconteceu desde 2020 e continua a acontecer.

    A suspensão de contas de jornalistas no Twitter está a levar os media a gritar: “censura!; “perseguição!”. Irónico, não é?

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    Alguns jornalistas descobriram agora o que é a censura nas redes sociais.

    Não sei o que aconteceu à classe jornalística. Mas não é bom, nem é bonito de se ver. A classe, em geral, traiu o Jornalismo e a população. Traiu a Ciência e os cientistas. Traiu a democracia e os democratas. Traiu a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e a liberdade, em geral. A mesma que agora jornalistas reclamam a Musk.

    A sua hipocrisia, a hipocrisia da Comissão Europeia e a de todos os que promoveram a censura e perseguição desde 2020 está exposta. Às claras, perante todos.

    Que esta luz que foi colocada nas atitudes hipócritas de jornalistas, políticos e burocratas arrogantes de Bruxelas sirva para que o resto da população entenda isto, de uma vez: a defesa do mundo livre e da democracia, da liberdade de expressão, não está nas mãos de Musk ou de um político. Nem nas mãos de uma só classe, como a dos jornalistas. Está nas nossas mãos. Nas mãos de todos nós. Vamos agir por isso e para isso. Antes que seja tarde para a liberdade e para o Mundo.

    Somos nós que integramos os 400 milhões de utilizadores do Twitter. Os mais de dois mil milhões de utilizadores do Facebook. E, mais importante, somos cidadãos. Deixar este Mundo ser governado por burocratas comprometidos e tecnológicas cheias de poder não é uma opção.


    N.D. Elisabete Tavares é membro fundador da Plataforma Cívica Cidadania XXI, não exercendo actualmente qualquer função executiva

  • A lei do mais forte

    A lei do mais forte

    Termina o sonho marroquino, de forma mais ou menos natural, frente ao grande favorito da competição. Ainda o relógio não tinha chegado aos cinco minutos e já a selecção francesa estava em vantagem com o golo de Theo Hernandez. Pela primeira vez, os leões do Atlas estiveram a perder neste Mundial e tiveram que sair do conforto do bloco baixo.

    A primeira parte foi de total controlo francês, e até o selecionador marroquino voltar ao 4-3-3 habitual, pensei que a coisa ficasse resolvida cedo.

    Destaque para Antoinne Griezmann, longe das tácticas de maratonistas impostas por Simeone, a fazer outro grande jogo na distribuição e ligação entre a defesa e o ataque.

    Por norma, os destaques na equipa francesa são os velocistas da frente e a eficácia de Giroud, mas se perderem tempo a ver a movimentação de Griezmann, e a forma como desce no terreno para receber e distribuir, observam como se está a criar um número 10 de eleição. 

    Mesmo a perder, Marrocos não parecia interessado em sair defesa, chegando a ter 11 homens atrás da linha da bola. Os lances de perigo resumiram-se, na primeira parte, às bolas paradas.

    Na segunda parte houve, finalmente, risco. Os marroquinos mostraram que também sabiam atacar com qualidade e jogar no meio-campo adversário. En-Nesyri, que marcara contra Portugal, saiu aos 66 minutos depois de tocar três vezes na bola durante todo o período que esteve em campo. 

    França joga de forma simples: dois ou três toques e a bola está na área adversária. Seja por arrancadas de Mbappé, idas à linha com cruzamentos para Giroud ou progressão em tabela, não escolhem o clássico “controlo da posse”, que significa que os centrais tocam 200 vezes na bola a cada ataque iniciado.

    Ora, esse controlo exasperante, como feito por Portugal, significa que equipas como Marrocos podem ficar de cadeirinha à espera de uma bola para aliviar perto da baliza a cada cinco minutos. Com França, tinham sarna para se coçarem a cada 30 segundos.

    Chega à final uma das equipa que jogou sempre para ganhar e que, de forma consistente, foi sempre superior aos adversários.

    Sábado teremos, não a final sonhada pela FIFA, mas certamente a final entre a melhor equipa do torneio e a equipa que não desperdiçou as oportunidades que lhe foram surgindo pelo caminho.

    Espera-se, portanto, um jogo épico.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A magia do directo à portuguesa

    A magia do directo à portuguesa


    Em Campo Maior, numa rua cheia de lama, com carros ao monte, há pessoas de galochas e pás na mãos, encasacados até à cabeça, recolhendo o entulho e empurrando a água para as entradas de esgoto.
    Percebe-se, em apenas cinco segundos, o que estão ali a fazer.

    A jornalista, obrigada a criar qualquer coisa para o directo, aproxima-se, obriga um dos senhores a parar tarefa e atira-lhe a pergunta do milhão de dólares:

    “Então, o que estão aqui a fazer?”

    grayscale photo of water waves

    O camarada alentejano levantou os olhos da enxada, olhou para a jornalista e deve ter pensado num “f***-se!! O que é que te parece que estamos a fazer??”. Mas respirou, lembrou-se que tinha ali uma câmara, e disse, de rajada e em volume aceitável: “LIMPEZAAA!”

    Os directos são um mistério para mim. Nunca percebi o interesse de, por exemplo, ter alguém numa cidade a 1.000 quilómetros de uma frente de batalha para entrar à noite, em directo do hotel, a tempo de nos contar o que alguém lhe disse que está a acontecer a oito horas de carro dali.

    Compreendo, obviamente, o interesse da reportagem em directo, que nos traz as imagens do que está a acontecer. Mas a necessidade extrema de criar conteúdo com interesse informativo nulo, para além de deixar uma sensação de vergonha alheia, acaba apenas por atrapalhar quem, de facto, está a tentar fazer algo de jeito.

    A história de Campo Maior fez-me lembrar um dos incêndios deste Verão, quando uns jornalistas, da CNN julgo, tentavam entrevistar bombeiros enquanto estes apagavam o fogo, o que é, só por isso, bizarro. Acabaram por ouvir, entre corridas desesperadas, que “têm que desviar o carro para o camião conseguir passar”.

    shallow focus photography of black DSLR camera

    Ou pior, quando perguntavam a populares o que por ali faziam, num incêndio junto ao Fundão, se a memória não me falha, e uma senhora, a carregar baldes de água, lhes disse: “se largassem o microfone e agarrassem nuns baldes é que era de valor!”

    Que informação relevante é que pode dar um popular, no meio de uma aflição, a quem precisa de encher uns minutos de directo? Não entendo, a sério que não.

    Mas pior do que as horas de irrelevância informativa, é a estratégia editorial. Seja qual for o tema, desde que apareça como novo, é espremido até à exaustão, como se deixasse de existir mundo a partir desse momento informativo.

    Quando a covid-19 rebentou tínhamos directos do aeroporto de Lisboa para acompanhar a chegada dos portugueses que tinham sido evacuados da China. O pessoal médico estava vestido com uns fatos da NASA, como naquele filme Outbreak dos anos 90 (com Dustin Hoffman), e lá atrás da rede de protecção, as câmaras das televisões faziam o zoom possível para nos mostrar qualquer coisa.

    Dois anos com directos dos hospitais, conferências do Infarmed, powerpoints do Costa, vacinas do almirante, regras e mais regras. Polícias na rua a correr com velhotes que comiam sandes num banco de jardim, restauração na falência, palminhas nas varandas. Mal nos apercebemos que já havia rockets no Donbass.

    Nos Verões são os incêndios, nos Invernos as cheias. Enquanto acontecem, temos horas e horas de directos, debates, diagnósticos do que está mal (matas, num caso, e sarjetas sujas, no outro) para, um ano depois, repetirmos todo o processo: directo, debate, diagnóstico. Pelo meio, mete-se o Natal e os directos passam para os centros comerciais ao som de Mariah Carey ou Wham.

    Chega a guerra a de 2014 até 2022 foi só o aquecimento e durante meses temos tanques no quintal e mapas de ocupação. Desaparece o resto do Mundo novamente. Acaba a covid-19 de forma oficial.

    Em Novembro, a guerra acalmou para ligarmos aos diretos do Qatar. Até a selecção portuguesa ser eliminada, ninguém se magoou em Donetsk. Por essa altura, interessou saber tudo, mas mesmo tudo, que Ronaldo disse, pensou, fez, disse mas não fez, pensou mas não disse, disse mas não queria dizer, e todas as demais combinações.

    person about to touch the calm water

    É importante massacrar um jogador até que já ninguém, nem sequer entre os seus colegas, consiga ouvir falar mais no tema. É importante não discutir o que joga ou podia jogar uma equipa de 25 e criar, em vez disso, uma gigantesca onda negativa em torno de uma equipa que, afinal, todos queríamos que vencesse.

    O golo marroquino acontece e o São Pedro começou a castigar o território ibérico. Os mouros estão de volta. Há água por todo o lado, carros a boiar, casas alagadas, cidades transformadas na Veneza dos subúrbios.

    Percebo a gravidade, os problemas e os dramas, mas, tal como nos demais temas, o Mundo volta a desaparecer. Como se, com tantos recursos de recolha de informação, cada linha editorial só conseguisse lidar com um tema de cada vez. Ou até como se, para representar uma calamidade, seja necessário entrevistar pessoas que limpam as ruas em cada aldeia do país. Vi um directo do Muxito. Do Muxito!

    Para vós que sois menos versados em cultura urbana da margem sul, o Muxito era uma mata que, na minha juventude, era conhecida por ser um sítio de paragem para profissionais de um ramo profissional muito antigo, ligado à venda de sensações cutâneas. Não é uma zona que tenha visto os seus primeiros líquidos nesta enchente.

    black and gray microphone

    E enquanto escrevia isto, pensando que então que terminara o texto, notei que o directo regressou a Campo Maior e apanhou outro senhor. O homem estava a carregar móveis, cheio de lama na cara e nas mãos, e, mal lhe cheira a pergunta, vira as costas ao jornalista que, para desenrascar, diz: “as pessoas não querem falar, mas as imagens falam por si”.

    Aleluia irmão!, aleluia!

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.