Categoria: Opinião

  • Novas eleições: a perpetuação de um embuste

    Novas eleições: a perpetuação de um embuste


    Parece que iremos ter novas eleições legislativas; infelizmente, vamos continuar a perpetuar o regime que nos conduziu a esta situação de total ruína. Já dura há mais de cinco décadas. Este modelo baseia-se na glorificação patética da democracia e da soberania popular, que é vista como um altar intocável.

    A realidade, porém, revela que se trata de um dos sistemas mais perversos que já se inventou. Ao contrário de uma monarquia absoluta, onde o monopólio do governo estava nas mãos de um rei que legaria o trono ao filho, os incentivos para confiscar a população eram consideravelmente menores. Porquê?

    Porque o rei não precisava de encher os bolsos à pressa; o seu filho herdaria o reino e a máquina de parasitagem já estava montada. Além disso, o rosto do ladrão era conhecido por todos: um senhor rechonchudo e rosado, a empanturrar-se de pernas de frango. A resistência era mais firme porque o inimigo era claro e evidente. Talvez por isso, nunca um monarca absoluto se atreveu a confiscar mais de 15% ou 20% da riqueza produzida. As modernas democracias, em contrapartida, fazem gala em sugar 50% do PIB, tudo em nome do combate às desigualdades sociais e da sustentação daquela vaca sagrada chamada Estado Social.

    Enquanto no mercado queremos concorrência, que atrai os mais produtivos e inovadores para satisfazer as necessidades dos consumidores, na democracia sucede precisamente o inverso. Ao permitir que “qualquer um” possa concorrer à chefia desta organização criminosa chamada Estado — que vive do confisco e detém o monopólio da força e dos tribunais —, abrem-se as portas para que demagogos, crápulas e vigaristas assumam o controlo. Os produtivos, como é natural, afastam-se desse pântano.

    Não é casualidade que a qualidade da classe política esteja em queda livre. Como a propriedade do governo é “pública” e não privada, todos se sentem com legitimidade para meter a mão na gamela. Um monarca absoluto, por exemplo, trataria de preservar a sua propriedade e geriria os seus bens com prudência, sabendo que, no longo prazo, esse património passaria para o seu filho. Havia parcimónia e cuidado na gestão dos recursos.

    Na democracia, porém, a lógica é inversa: o tempo para roubar é limitado e há que ser rápido na pilhagem antes que o cargo escorregue pelas mãos. Daí que os políticos gastem boa parte do seu tempo a inventar esquemas para se perpetuarem no poder, comprando votos das massas e roubando uma minoria produtiva cada vez mais pequena – ser otário toda a vida é complicado e estúpido.

    Veja-se o caso da Segurança Social, onde se faz crer que os descontos dos trabalhadores activos estão guardados num porquinho mágico, pronto para sustentar a sua velhice. Nada mais ilusório: esses 34,75% do salário bruto dos trabalhadores servem apenas para pagar as pensões dos actuais reformados — hoje, nem é suficiente, outros impostos cobrem a diferença negativa entre receitas e despesas.

    A escalada no assalto aos activos tem sido incessante ao longo das últimas cinco décadas, tudo para manter a farsa de que o Estado Social é sustentável. É assim que o bloco central se perpetua no poder: prometendo saquear os que produzem para comprar os votos dos reformados, dos funcionários públicos e dos subsidio-dependentes. Eles sabem perfeitamente que este esquema piramidal há-de ruir, mas, na democracia, ponderar as consequências futuras é coisa que simplesmente não existe.

    A escória sem escrúpulos que governa vendeu-nos de corpo e alma a instituições transnacionais em troca de subsídios e prebendas para amigos e companheiros — como é o caso da sinecura de deputado europeu. Venderam a nossa soberania monetária para garantir que um esquema piramidal europeu pudesse expandir-se e praticar a fraude da criação monetária em larga escala, chamada Banco Central Europeu (BCE). Foi assim que, quando Portugal faliu em 2011, o BCE ligou a impressora para nos “salvar” — empobrecendo-nos pela inflação, enquanto plutocratas bem relacionados se encheram à custa dessa manobra, comprando activos a preços irrelevantes (aeroportos, companhias de seguros, bancos…).

    Depois veio o “dinheiro grátis”: sempre que há uma crise (normalmente provocada pelos próprios), aparecem milagrosamente milhares de milhões de euros em “fundos de resgate”. Esse dinheiro, que simplesmente não existe, é inventado pelo BCE e pago pela população com inflação.

    A realidade é esta: Bruxelas é uma casta parasitária ainda mais cara que os nossos políticos locais. Não beneficiamos nada com a sua existência: tornaram-nos os pedintes oficiais da Europa, sempre a pedir subsídios e dívida mutualizada, enquanto se cultiva a ilusão de que nada pagaremos, tudo nos será dado sem esforço ou custo. No entanto, no fim, pagamos sempre a conta: seja por impostos, inflação ou pela destruição da actividade produtiva.

    Há cinco décadas que dois partidos socialistas têm o monopólio deste saque. Para quem trabalha e produz, a vida é um inferno de impostos asfixiantes, regulação absurda vinda de Bruxelas, burocracia sufocante que só beneficia os grandes negócios capazes de suportar tais custos. Para os parasitas do regime, basta uma agenda de contactos para que milhares de euros fluam como um rio. A política transformou-se, assim, numa carreira profissional: uma actividade onde se sobe não pelo mérito, mas pela aptidão na arte do parasitismo.

    Tomemos o caso da empresa de casinos Solverde, tão falada nos últimos tempos. Se houvesse liberdade de entrada no mercado de casinos, os clientes decidiriam qual prosperaria. Mas para quê contratar Luís Montenegro, se ele não detivesse o poder de conceder monopólios privados? É o controlo e o poder estatal que alimenta esta promiscuidade entre plutocratas e políticos.

    O mesmo se aplica à despesa pública. Se cada um de nós contratasse o seu hospital ou a sua escola directamente ao prestador de serviços, não haveria qualquer incentivo para subornar políticos. Mas, como o Estado português controla 133 mil milhões de euros — cerca de 12,5 mil euros por português —, esse maná precisa de ser dirigido para os bolsos “certos”: contratos camarários para amigos, assessorias jurídicas para filhos de políticos e subsídios para empresas onde os parasitas têm familiares.

    Este modelo, como é óbvio, é insustentável e está condenado a falir. Daí o crescendo do controlo social, pois é preciso espremer até à última gota de sangue os que ainda produzem alguma coisa. Por essa razão, a União Europeia tornou-se uma espécie de URSS moderna: se a população vota “errado”, retira-se o candidato das listas; se já não há como roubar mais, inventam-se pandemias ou ameaças externas para justificar mais impostos, mais impressão monetária e mais inflação. Todas as crises são pretexto para aumentar o controlo e esmagar os dissidentes. Necessitam, assim, de um sistema que determine onde podemos gastar o nosso dinheiro e como nos devemos comportar: daí o Euro Digital, a peça final do puzzle totalitário – já prometido para Outubro deste ano.

    Chegámos, enfim, à farsa final: novas eleições para um parlamento nacional que nada decide, apenas aqueles que terão o privilégio de repartir o saque. Enquanto os portugueses acreditam que estão a escolher o seu destino, apenas seleccionam o próximo grande parasita. Nada mais.

    Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A denúncia contra Bolsonaro, ou Estará Xandão impedido de julgá-lo?

    A denúncia contra Bolsonaro, ou Estará Xandão impedido de julgá-lo?


    Assim como o Sol que nasce todos os dias, toda a gente decente do país estava à espera da acusação de Jair Bolsonaro e do seu bando de golpistas. Depois de terem tentado acabar com o nosso regime democrático para instaurar uma ditadura, era apenas uma questão de tempo até que o Procurador-Geral da República o acusasse, bem como parte dos militares que se dispuseram a trair a farda e a pátria nessa empreitada. Agora, enfim, começa o jogo judicial. 

    Na última semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para 25 de Março o início do julgamento sobre a admissibilidade formal da acusação contra Jair Bolsonaro e os seus aliados. A acusação inclui crimes como associação criminosa, tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. São mais de oito mil páginas de provas, incluindo mensagens de WhatsApp, registos financeiros e depoimentos de militares arrependidos, nas quais se revela como um bando de arruaceiros tentou desferir um golpe de morte contra a democracia brasileira.

    Jair Bolsonaro

    Enquanto o STF avança, os apoiadores de Bolsonaro intensificam a retórica de vitimização. Nas redes sociais, circulam vídeos de manifestações em que seguidores juram “não aceitar a prisão do presidente”. Como de hábito, repete-se a mesma ladainha de sempre: “perseguição judicial”, “querem acabar com a direita neste país” e outras parvoíces do género. A isso soma-se a invocação indefetível do sentido deturpado da palavra “narrativa”, para desqualificar o meticuloso trabalho da Polícia Federal, ao reunir provas abundantes da conspiração que conduziu o país às portas de um golpe de Estado consumado. 

    De todas as “alegações” levantadas pelos bolsonaristas para tentar iludir a sua seita de seguidores, uma, contudo, é capaz de fazer erguer a sobrancelha mesmo entre quem não é suspeito de simpatias com a extrema-direita. Trata-se do suposto impedimento de Alexandre “Xandão” de Moraes para julgar o caso. 

    Como se sabe, exige-se de todo e qualquer juiz imparcialidade, isto é, o distanciamento necessário para julgar um litígio sem se inclinar de antemão para qualquer dos lados. Prevendo isso, o legislador estabeleceu duas hipóteses em que a parte pode recusar o julgamento por determinado magistrado: suspeição e impedimento. Se ambas se assemelham no propósito (afastar um juiz do processo), diferenciam-se na forma como se manifestam e na facilidade com que se prova cada uma dessas hipóteses. 

    Alexandre de Moraes

    Na suspeição, as hipóteses são subjectivas (amizade ou inimizade com uma das partes, por exemplo). É necessário, além de alegar a suspeição, provar que ela existe de facto e influencia a imparcialidade do julgador. No impedimento, as causas são objectivas (ser cônjuge de uma das partes ou ter actuado no processo como advogado, por exemplo). Basta demonstrar que a hipótese prevista existe para que a lei presuma, independentemente de qualquer outra prova, a falta de isenção do juiz para atuar no feito. 

    No caso do golpe planeado pelos bolsonaristas, uma das etapas da destruição democrática previa a morte do presidente eleito (Lula da Silva), do seu vice (Geraldo Alckmin) e do presidente do TSE (Alexandre de Moraes). Logo, a ser Xandão uma potencial vítima do delito, aplicar-se-ia o inciso IV do artigo 252 do Código de Processo Penal, segundo o qual: 

    “O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que […] for parte ou diretamente interessado”.

    Logo, Xandão não poderia julgar o caso, correcto? 

    Não. Errado. 

    Primeiro, quando os extremistas bolsonaristas planeavam matar Xandão, Lula e Alckmin, não se tratava de praticar três assassinatos isolados. O objectivo não era propriamente eliminar essas três figuras por desavenças pessoais ou políticas. Absolutamente. A ideia era a de remover os três principais obstáculos institucionais à consumação do coup. O crime aí investigado não é exactamente de homicídio, mas de golpe de Estado. A verdadeira vítima desse delito, portanto, não é nenhum desses três, mas a própria sociedade, que teria sido privada do direito de escolher os seus representantes eleitos. 

    Lula da Silva

    Segundo, mesmo que houvesse inimizade entre Xandão e Bolsonaro, isso por si só não seria suficiente para afastá-lo do caso. O artigo 256 do CPP estabelece que a suspeição “não poderá ser declarada nem reconhecida quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo para criá-la”. Foi exactamente isso que Bolsonaro tem feito e repetido desde 2019, quando o inquérito contra as chamadas fake news foi instaurado. Não nos esqueçamos de que, em 2021, Bolsonaro reuniu uma multidão na Avenida Paulista, em São Paulo, para insultar o ministro, chamando-o de “canalha”, e declarar que, como presidente, não cumpriria mais as suas ordens. Logo, não será por aí que se sustentará uma eventual suspeição de Xandão. 

    Haverá quem defenda que, neste caso específico, independentemente das questões técnicas, não conviria, de qualquer modo, a participação de Alexandre de Moraes no processo. Do ponto de vista puramente leigo, sempre se pode argumentar que seria melhor não ter um ministro tão directamente afectado pelos factos narrados na acusação a participar do julgamento. Contudo, duas considerações haveriam de ser feitas em contrapartida a essa visão. 

    A primeira é a de que o Supremo é um órgão de cúpula; não há nenhum outro tribunal judicial acima dele. Se os golpistas, por exemplo, planeassem matar todos os onze ministros do Supremo, nenhum deles poderia julgá-los? Os golpistas ficariam, então, impunes? 

    A segunda é que existe um brocardo latino milenar segundo o qual nemo auditur propriam turpitudinem allegans. O que, em bom vernáculo, significa dizer que ninguém pode alegar em seu benefício a própria torpeza. Caso se admitisse que Xandão estivesse impedido por ter sido descoberto um plano para assassiná-lo, doravante todos os criminosos do país planeariam matar todo e qualquer magistrado que julgassem ser desfavorável à sua absolvição. Não é necessário ser formado em Direito para imaginar o tamanho do problema de política judiciária e carcerária que tal entendimento implicaria. 

    Brazillian flag

    O caso transcende fronteiras e o exemplo norte-americano deixa claro o tamanho do problema que políticas de apaziguamento ou a ineficiência do sistema judicial podem causar quando se deixam golpistas impunes. O julgamento da tentativa de golpe de Estado no Brasil não é apenas (mais) um processo penal. É um teste à capacidade do Brasil e daquilo que se convencionou chamar de “Ocidente” de confrontar o seu passado recente e expurgar do jogo democrático aqueles que atentam contra ele. 

    Alexandre de Moraes não está impedido. Com a sua habitual coragem, terá a oportunidade de provar, mais uma vez, que a Justiça não se curva a ameaças. Espera-se que conduza o processo com a seriedade devida. Não estará em jogo apenas o futuro dos acusados. Estará em jogo o futuro do país. 

    Arthur Maximus é advogado no Brasil e doutorado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

  • Sondagens e a asinina indigência aritmética da ERC

    Sondagens e a asinina indigência aritmética da ERC


    Já em tempos aqui escrevi — na verdade, há cerca de uma semana, com o realismo que a democracia exige — que se impunha fixar os nomes dos membros da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC): Helena SousaPedro Correia GonçalvesTelmo GonçalvesCarla Martins e Rita Rola. Defendi essa exposição porque os actos do regulador, com especial destaque para as suas omissões e incoerências, não podem ser resguardados sob o biombo da institucionalidade abstracta, mas antes devem estar associados, com nome e sobrenome, às pessoas concretas que os praticam.

    É que, ao contrário das instituições — que, coitadas, por vezes são mal frequentadas ou representadas —, os cidadãos têm responsabilidade moral. E, quando ocupam cargos de regulação, essa responsabilidade deveria ser, como o próprio nome indica, reguladora — ou seja, ancorada num mínimo de exigência intelectual, num sentido apurado de justiça e, já agora, numa relação funcional com a realidade.

    Ora, uma nova (e sempre surpreendente, pelos mais motivos) deliberação da ERC — datada de 19 de Março — volta a exigir esse gesto de fixação nominal. Não por mera vaidade cívica, mas porque é absolutamente intolerável que, num país que se diz democrático e esclarecido, o órgão máximo de regulação dos media considere aceitável, sem motivos de crítica – uma sondagem política em que 400 inquiridos declaram em quem votarão “de certeza”, mas depois o somatório dessas respostas chega aos 1032 votos de certeza.

    Sim, leu bem: 1032 votos garantidos por apenas 400 pessoas. Uma impossibilidade não apenas democrática, mas também aritmética. Isto porque a sondagem da Pitagórica para a TVI e a CNN Portugal afinal permitia que cada pessoa pudesse ‘votar de certeza’ em mais do que um candidato. E assim, através desta sondagem cada candidato podia recolher com ‘certeza’ o voto de um inquirido que, afinal, também votara com ‘certeza’ em outros candidatos. E assim se fizeram notícias sobre as eleições presidenciais com base numa farsa, numa palhaçada, numa fraude, numa manipulação. E, no entanto, depois de uma participação bem sustentada do PÁGINA UM, em defesa do rigor, a ERC viu, analisou e — com serenidade burocrática — nada viu de mal.

    A Matemática é, para a ERC, uma ciência tão maleável como o Direito e a Política. Com erros metodológicos crassos e interpretações espúrias, aparentemente intencionais para conduzir a falsas conclusões, que levariam ao ‘chumbo’ de um qualquer aluno universitário, a ERC tratou de mitigar uma horrível manipulação da realidade e um ‘linchamento’ da semântica e da numeracia. Com a ERC ficámos a saber que “votar de certeza” em fulano é passível, em democracia, de votar também em beltrano e em sicrano, e já agora também em fulsicrano (junção de fulano e sicrano), em sicbeltrano (junção de sicrano e beltrano), fulbeltrano (junção de fulano e beltrano) e em fulsicbeltrano (junção de fulano, sicrano e beltrano). Se em democracia, tal é impossível; nos gabinetes da ERC, que regula sondagens, tudo se mostra agora possível.

    Helena Sousa, Pedro Correia Gonçalves, Carla Martins, Telmo Gonçalves e Rita Rola, membros do Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

    E tudo é possível apesar de a Lei das Sondagem — e do bom senso — determinar que devem ser observadas diversas regras, entre as quais se destacam a necessidade de as perguntas serem “formuladas com objectividade, clareza e precisão, sem sugerirem directa ou indirectamente, o sentido das respostas”; e de “a interpretação dos resultados brutos deve[r] ser feita de forma a não falsear ou deturpar o resultado da sondagem”.

    Os erros e a pura aldrabice desta sondagem, promovida pela empresa Pitagórica para a TVI e CNN Portugal, e divulgada depois pela generalidade da imprensa, é, na sua essência, uma violação da lógica elementar. Não se exige sequer conhecimentos avançados de estatística para detectar a trafulhice. Basta, neste caso, saber somar. E saber que, num sufrágio, um cidadão só pode votar, de certeza, num único candidato. Mas, pelos vistos, os inquiridos da Pitagórica puderam votar com certezas múltiplas. E o regulador, qual monge beneditino da pós-verdade, aceitou com fleuma e talvez até com reverência aquilo que se poderia descrever, com precisão orwelliana, como a novilíngua da estatística deformada: a verdade é soma, e a soma é fé, não precisão.

    É aqui que devemos introduzir Roland Barthes, com o seu conceito de “grau zero da escrita”. A ERC — perdão: Helena SousaPedro Correia GonçalvesTelmo GonçalvesCarla Martins, sendo que Rita Rola faltou — encarna, na perfeição, o “grau zero da regulação”: um lugar onde, quando não se pretende incomodar certas elites mediáticas, o conteúdo desaparece, a crítica dissolve-se e o acto regulador se converte numa forma vazia de autoridade sem sentido.

    Podemos ir mais longe. Estamos também no terreno daquilo que Pierre Bourdieu designava como a reprodução simbólica do poder através da linguagem autorizada. A ERC autoriza-se a si própria como detentora de um juízo mediático, mas exerce essa função, neste caso, baseando-se numa operação matemática de uma forma tão asinina que dificilmente se admitiria numa criança de sete anos.

    Aquilo que se passou com esta sondagem — e sobretudo com esta deliberação — é, em qualquer democracia funcional, um escândalo. Um escândalo simples, evidente, quantificável, objectivo. Mas escândalos numéricos parecem não existir quando os números são tratados como fetiches e não como factos. George Orwell, que já nos avisara sobre os perigos da linguagem como instrumento de manipulação, teria provavelmente dedicado um capítulo especial a esta sondagem: a liberdade é a soma dos votos garantidos — ainda que os votantes não existam. Não se trata aqui de margens de erro ou de métodos de ponderação obscuros. Trata-se, tão-só, de somar. E de perceber que 400 pessoas não podem garantir 1032 “votos de certeza” aos diferentes candidatos.

    Nem se exigiria à ERC que discutisse fórmulas de amostragem complexas para sondagens. Exige-se apenas que saiba distinguir uma metodologia válida de um disparate aritmético. Aquilo que torna esta deliberação ainda mais inquietante é a dúvida que ela suscita: não quiseram ver ou não souberam ver? E confesso: não sei qual das hipóteses é mais grave.

    Se não quiseram ver, então temos uma ERC cúmplice da manipulação informativa. Se não souberam, então temos uma ERC composta por adultos de meia-idade que desconhecem os fundamentos do sistema eleitoral e da matemática básica, até de simples aritmética. Ambas as hipóteses são inaceitáveis, minam o Jornalismo e a Democracia, e mostram que, em sondagens, estamos no campo do vale-tudo. Ambas são motivo suficiente para exigir não só a revisão desta deliberação, mas também a renovação da própria ERC.

    TVI e CNN Portugal apresentaram, em Janeiro, resultados de uma sondagem fraudulenta como se fossem intenções de voto. Apesar de haver apenas 400 inquiridos, contabilizaram-se 1032 votos ‘de certeza’, o que significa que cada inquirido atribuiu, de forma convicta, uma média de 2,6 votos pelos proto-candidatos. Assim, uma parte dos 28% dos 400 inquiridos que garantiram que votariam ‘de certeza’ em Gouveia e Melo terão também votado ‘de certeza’ noutros proto-candidatos. A ERC achou que não houve qualquer ilegalidade. ‘Carta branca’ para o vale-tudo.

    Repito: neste caso, nem estamos perante um erro de interpretação. Estamos perante uma indigência matemática em estado puro, que faria corar de vergonha um aluno da escola primária. Bem sei que os modernos e mais humanizados métodos de pedagogia o desaconselham a crianças, mas os membros da ERC — Helena SousaPedro Correia GonçalvesTelmo GonçalvesCarla Martins, sendo que Rita Rola faltou — mereceriam um par de orelhas de burro bem pontiagudas, de cartolina resistente e uso prolongado. Que as usem com a dignidade que a ocasião exige — e com o silêncio de quem já não tem contas para apresentar.

    Não faltará quem veja neste texto uma reacção desproporcionada. Dirão que não se fazem guerras por uma mera sondagem. Mas a questão é exactamente essa: não é apenas uma sondagem política. É um instrumento de influência sobre a opinião pública sobre a qual a ERC anuncia implicitamente que vale tudo. É uma peça que integra o jogo democrático, e que, se for viciada, transforma esse jogo num simulacro.

    Quando se admite — com indiferença — que um erro deste calibre passe incólume, estamos a normalizar a fraude informativa. Estamos a declarar, com todas as letras, que a quantificação da vontade popular pode ser uma charada — desde que sirva certos propósitos.

    Diz-se muitas vezes que a democracia morre aos poucos, de forma insidiosa. Eu diria que, entre nós, ela se esvai aos números, entre gráficos mal feitos e somas impossíveis, legitimadas por entidades cuja única missão deveria ser impedir esses abusos. Mas talvez seja já tarde. Talvez estejamos mesmo num país onde reguladores não regulam, jornalistas não questionam e cidadãos já não contam. Pelo menos, não a contar. Porque, como bem se viu, os números já não são o reflexo da realidade — são o seu encobrimento.

    E por isso volto a insistir: fixem-se os nomes dos membros do Conselho Regulador da ERC: Helena SousaPedro Correia GonçalvesTelmo GonçalvesCarla Martins e Rita Rola. Que não se escondam por detrás da sigla. Que sejam lembrados, não por actos de coragem regulatória, mas pela sua indigência matemática e pela complacência com o inaceitável. O seu legado está agora cravado numa operação aritmética que nem o acaso conseguiria fabricar. Que se saiba, no futuro, quem foram estes lamentáveis rostos de uma soma impossível.

  • Fixem estes nomes: são os carrascos do jornalismo

    Fixem estes nomes: são os carrascos do jornalismo


    Fixem estes nomes: Helena Sousa, Pedro Correia Gonçalves, Telmo Gonçalves, Carla Martins e Rita Rola. Ficarão para a História como os carrascos do Jornalismo Livre e Isento em Portugal.

    É da mais elementar justiça que as responsabilidades sejam pessoais, quando as consequências dos seus actos são devastadoras. Estas cinco pessoas são membros do Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e têm nas mãos a obrigação constitucional de defender a Imprensa, como entidade fundamental da Democracia, e os princípios da ética e da transparência no jornalismo.

    Tem sido uma entidade, que pela sua natureza associada ao poder político, raramente exerce essas funções com isenção. Mas piorou nos últimos anos. Se muitas vezes critiquei, com virulência, o mandato de Sebastião Póvoas, a ERC com Helena Sousa afundou-se para um grau de indigência e de desonestidade intelectual – desculpem o eufemismo.

    Helena Sousa, Pedro Correia Gonçalves, Carla Martins, Telmo Gonçalves e Rita Rola, membros do Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

    Hoje, a ERC, com estas três senhoras e estes dois senhores no seu Conselho, não apenas mostra uma inércia regulatória como, quando ‘obrigados’, mostram uma condescendência fatal, dando mostras de que preferem não ver para não ter de agir. E isso fá-los cúmplices de um sistema que permitiu a degradação da imprensa portuguesa, não por falta de meios, mas por falta de vergonha.

    A recente deliberação que sancionou o Expresso por promiscuidade entre jornalismo e publicidade é uma encenação para inglês ver – e, como todas as farsas mal encenadas, revela mais do que esconde. A coima de 2.000 euros à Impresa Publishing é uma anedota de mau gosto, quando estavam em causa valores de contratos promíscuos de elevados valor (basta olhar para as várias páginas dos indigentes ‘Projetos Expresso’, onde se mercadeja jornalismo à descarada). Não só pelo valor ridículo – um preço de saldo por violar a Lei de Imprensa –, mas porque sugere descaradamente que há um tarifário para a promiscuidade mediática.

    Uma multa tão simbólica não é punição: é um incentivo. Um convite à reincidência. Ou pior: ao alargamento de um negócio vergonhoso, legalizando o Jornalismo como mercadoria a ser oferecida a quem tiver mais dinheiro.

    A ERC transformou-se no facilitador institucional da promiscuidade entre os media e o poder político e económico. Ao demorar dois anos para sancionar um caso que remonta a 2021, e ao ignorar deliberadamente outros contratos escandalosos, este regulador revela-se um exemplo de cobardia e irresponsabilidade. E há que dizê-lo sem eufemismos: a ERC de Helena Sousa, Pedro Correia Gonçalves, Telmo Gonçalves, Carla Martins e Rita Rola normalizou a ‘prostituição informativa’.

    Estes cinco reguladores serão recordados como os comissários que abriram caminho para que a imprensa se financie à custa da mentira e do engano, vendendo aos leitores publicidade mascarada de notícia, desde que nos cadernos de encargos não conste expressamente que o adjudicatário (a empresa de media) não tem obrigação de publicar uma notícia paga, mesmo que depois seja publicada uma notícia, que somente existe por haver uma relação comercial. Na prática, a ERC deu aval para que os jornalistas se tornem agentes comerciais ao serviço de entidades públicas e privadas. E o resultado está já à vista sem esperança para os jornalistas assim pressionados pelas direcções e administrações para fazerem fretes: uma imprensa desacreditada, um público desconfiado e um jornalismo moribundo.

    A forma como a ERC se debruçou sobre este caso da Impresa Publishing antecipa o resultados de outros processos de contra-ordenação que envolvem mais seis órgãos de comunicação social:  PúblicoExpressoDiário de NotíciasJornal de NotíciasTSFVisão e SIC, no decurso de uma investigação do PÁGINA UM, publicada em Maio de 2022. Tudo era mais que confirmável, mas a ERC limita-se a aplicar uma coima simbólica, sugerindo, ainda por cima, que há um modo de escapar a futuras punições: basta não colocar a previsão explícita da publicação das “notícias” nos contratos.

    Notícia paga por uma entidade tutelada pelo Ministério do Ambiente, então liderado por Duarte Cordeiro, estava prevista ser publicada no Expresso num contrato de 19,500 euros. A ERC nem se dignou a querer ver o caderno de encargos, onde a exigência está expressa, absolvendo o jornal.

    Além disso, a ERC encontrou uma forma de fechar os olhos às promiscuidades. Embora tenha poderes legais para exigir cadernos de encargos das entidades públicas não mexeu uma palha para esclarecer outros contratos promíscuos. Limitou-se a usar a desculpa do ‘in dubio pro reo’, esquecendo-se que o seu papel não é o de um juiz indiferente, mas de regulador proactivo. Preferiu a preguiça ao rigor; a complacência à coragem. Em vez de defenderem os cidadãos e os leitores, defenderam os interesses dos poderosos. E a democracia, que necessita de uma imprensa livre, ficou mais pobre.

    A imprensa portuguesa não foi destruída pelo avanço das redes sociais, nem pelo desinteresse dos leitores. Tem sido traída por dentro, com o aval de um regulador que se recusa a regular. Enquanto jornalistas e directores venderem a sua independência, e enquanto a ERC se mantiver surda, muda e cega, o jornalismo continuará a morrer. E não há democracia que sobreviva à morte do jornalismo.

    Os membros deste Conselho Regulador da ERC não podem dizer que não sabem. E que nada do que fazem influencia o rumo qualitativo da imprensa numa época de crise financeira. Sabem e sabem muito bem. Sabem que permitem que conteúdos publicitários sejam publicados como se fossem notícias. Sabem que jornalistas foram transformados em comissários de relações públicas ao serviço de ministérios e empresas. Sabem que estas práticas corroem a credibilidade da imprensa como um ácido corrói o ferro. Sabem tudo isto, mas não se importam. Ou pior: importa-lhes manter o sistema tal como está.

    E qual foi, é e será a consequência directa deste laxismo regulatório? Também se sabe. O maior erro estratégico da imprensa portuguesa nos últimos anos tem sido acreditar que a sustentabilidade financeira se garante enganando os leitores com publicidade travestida de informação. Em vez de apostar em jornalismo isento e rigoroso para conquistar a confiança dos leitores e atrair anunciantes legítimos, optou-se pela batota. Preferiu-se vender a credibilidade por um prato de lentilhas. E hoje, temos quase todas as empresas de media de grande dimensão em colapso ou próximo disso, como são os casos da Trust in News, da Global Media e da própria Impresa, dona da SIC e da Impresa Publishing. Nem a promiscuidade é sustentável. Muito pelo contrário.

    O Conselho Regulador da ERC tem-se tornado cúmplice activo desta fraude. E, assim, a imprensa portuguesa continuará a afundar-se num pântano ético do qual dificilmente sairá enquanto Helena Sousa, Pedro Correia Gonçalves, Telmo Gonçalves, Carla Martins e Rita Rola permanecerem em funções. São eles os rostos da falência moral do jornalismo em Portugal. Fixem estes nomes, portanto, porque um dia hão-de figurar nos anais da Imprensa Portuguesa como os coveiros da informação livre e honesta.

  • Montenegro, ou a vitória dos valdevinos

    Montenegro, ou a vitória dos valdevinos


    Portugal é, há muito, um terreno fértil para o florescimento de valdevinos. Não nos enganemos com a suavidade do termo: valdevinos são, na substância, os artífices das pequenas e grandes vigarices da nossa vida pública, indivíduos que fazem da arte de iludir e beneficiar-se do erário público um modo de vida respeitável — ou, pelo menos, tolerado. Mas o caso de Luís Montenegro eleva esta triste linhagem a um novo patamar, um grau superior de desfaçatez e de desprezo pela ética republicana e democrática.

    Aquilo que agora sabemos – e já não se pode negar – é que o ainda primeiro-ministro criou, em 2020, uma empresa de consultoria, a Spinumviva, sem rosto nem corpo, sem escritório conhecido (a sede era na casa de Montenegro), sem uma página electrónica onde se pudesse ler sequer uma linha da missão ou qualquer descrição de serviços para angariação de clientes. Não há registo de empregados, nem de qualquer estrutura que mereça o nome de empresa. No entanto, esta ‘entidade-fantasma’ facturou mais de 650 mil euros em dois anos e margens operacionais absurdamente elevadas, como o PÁGINA UM revelou em primeira mão em 16 de Fevereiro, antes da outra imprensa. Continuou a facturar mesmo após Montenegro assumir a liderança do Governo. E só após semanas de hesitações, meias verdades e omissões é que se ficou a saber quem eram os seus clientes, por revelações da imprensa: entre outros, empresas como a Solverde e a Rádio Popular, cuja dimensão dispensa apresentações, mas cuja real necessidade de serviços de “consultoria” de Montenegro permanece uma incógnita para qualquer espírito minimamente exigente.

    Noutros tempos, noutras geografias políticas, este simples facto seria motivo mais do que suficiente para a demissão de um primeiro-ministro, e aquilo que deve causar admiração é ter sido necessário uma moção de confiança no meio do circo parlamentar. Não porque tivesse sido provado algum ilícito penal – embora isso possa ainda vir a acontecer -, mas porque em democracia se exige que os governantes não apenas sejam sérios, como também o pareçam.

    Um homem que, de forma obscura e opaca, com as suas responsabilidade, cria e depois mantém uma empresa familiar sem qualquer lastro, apenas para receber avenças por serviços que ninguém consegue explicar ou justificar, não pode ser primeiro-ministro de um país que se pretenda civilizado e europeu.

    A questão de fundo não é, reitere-se, se Montenegro cometeu um crime. A questão é de decência e de respeito pelas regras mínimas da ética pública. Se a Spinumvia fosse uma sociedade reconhecida no mercado, com equipa consolidada, provas dadas e resultados publicamente conhecidos, poderíamos, talvez, admitir que Montenegro estava apenas a exercer a sua actividade de consultor com dignidade. Mas não. Trata-se de uma microempresa familiar – cujos beneficiários são os seus filhos e a sua mulher – criada para canalizar rendas e avenças, funcionando como veículo de oportunidades que só o conhecimento de bastidores e a influência política permitem captar. E jamais saberíamos para o que viria a servir no futuro. Aliás, basta observar o caso Manuel Pinho.

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    Que a Solverde ou a Rádio Popular tenham sentido necessidade de contratar uma empresa sem rosto, sem currículo e sem presença no mercado para a prestação de serviços de consultoria deveria, por si só, levantar as maiores suspeitas. Que Montenegro não tenha visto neste arranjo qualquer inconveniente ético, e tenha continuado a esconder os clientes semanas a fio, revela uma preocupante falta de noção sobre o que é ser governante em democracia.

    Num país onde a democracia estivesse plenamente consolidada, a demissão de Montenegro seria um sintoma de saúde institucional. Não haveria drama, nem precipício, nem vácuo de poder: o PSD escolheria outro líder, o Governo prosseguiria com outro rosto, e os cidadãos sentir-se-iam minimamente protegidos pela exigência ética imposta aos seus representantes. Mas o que assistimos é precisamente o contrário.

    No seio do próprio PSD, não houve uma única voz de peso que se erguesse para contestar a manutenção de Montenegro na liderança. Com a única e paradoxal excepção de Ângelo Correia, ninguém se mostrou incomodado com a degradação ética a que o partido foi submetido. Mais grave ainda: nem sequer se colocou a hipótese de que Montenegro pudesse ser substituído por outro social-democrata no Governo, ou que para as eleições antecipadas de Maio fosse escolhido outro candidato. O silêncio cúmplice do partido e o amolecimento da opinião pública revelam que, no Portugal de hoje, o padrão de exigência ética dos eleitores e dos eleitos atingiu um dos seus pontos mais baixos.

    De resto, a forma como a imprensa dominante tem abordado o caso – ora relativizando, ora desviando o foco para outros temas -, e como as sondagens continuam a projectar Montenegro como potencial vencedor, deveria preocupar qualquer cidadão que se preze. Não há um sobressalto cívico. Não há uma indignação genuína. A banalização da promiscuidade entre política e negócios atingiu tal ponto que um primeiro-ministro apanhado em esquemas obscuros de avenças familiares não só se mantém em funções, como ainda é visto como vencedor provável das próximas eleições.

    Se Montenegro vencer as eleições de Maio, será uma vitória dos valdevinos. Será a consagração pública de um modelo de fazer política que permitirá aos governantes criar empresas de fachada para canalizar rendas, disfarçar negócios e beneficiar de ligações de bastidores sem qualquer escrutínio efectivo. Será um salvo-conduto para que, no futuro, qualquer político possa fazer o mesmo, escondendo os clientes, omitindo os fluxos financeiros, e depois, apanhado em flagrante, alegar que está tudo bem.

    A democracia portuguesa está a ser reduzida a uma Economia de Estado onde se alimentam empresas, empresários e políticos que se confundem entre si. O Estado, com as autarquias, continuam a ser o maior motor da Economia nacional – pelo menos para uma franja empresarial relevante –, mas quando se analisam os contratos públicos, os ajustes directos e os espectáculos efémeros de que se enche o calendário, torna-se evidente que se pratica cada vez mais um jogo de pão e circo — expressão que, segundo os manuais de História, provém da Roma decadente e corrupta dos imperadores que compravam o apoio do povo com grão e divertimentos. Por outro lado, as empresas privadas querem sempre estar de bem com o poder e os políticos, mesmo que não tenham tenham contratos públicos, porque a ‘mão do Estado’ decide na regulação, nas concessões, na fiscalização e aprovação de financiamentos.

    O problema é que, em Portugal, o pão já escasseia e o circo já nem sequer diverte. As grandes obras são inauguradas com pompa e circunstância para meia dúzia de beneficiários, os eventos culturais e festivais servem para encher os bolsos das mesmas empresas do costume, e se há concursos públicos são muitas vezes desenhados para um dos concorrentes ‘pré-seleccionado’ possa vencer. Os benefícios aos cidadãos, quando existem, são residuais. Hoje, há uma rede de cliques e clientelas que gravita em torno do poder.

    Por muito que me custe reconhecê-lo, e mesmo admitindo que as alternativas não sejam mais virtuosas, uma vitória de Luís Montenegro nas eleições de Maio seria um péssimo sinal para a democracia portuguesa. Seria a legitimação do valdevinismo como método legítimo de ascensão e manutenção no poder. E se um país aceita como normal que o seu primeiro-ministro tenha um passado e um presente de opacidade e promiscuidade, então é porque está disposto a aceitar tudo.

    Num tempo em que, com meio século de democracia, a dar sinais de doença, se exigiria cada vez mais rigor, transparência e ética na governação, Portugal arrisca-se a ser olhado como um país que não aprendeu as lições básicas. Se Montenegro permanecer no poder, não será por mérito seu, mas pelo colapso moral de uma sociedade que se habituou a tolerar tudo. E um povo que tolera tudo, arrisca-se a perder tudo – inclusive a dignidade.

  • Lusa e as ‘cerca de 10 pessoas’ anti-Musk

    Lusa e as ‘cerca de 10 pessoas’ anti-Musk


    Alterações Mediáticas, podcast da jornalista Elisabete Tavares sobre os estranhos comportamentos e fenómenos que afectam o ‘mundo’ anteriormente conhecido como Jornalismo. No 19º episódio, analisa-se o fenómeno bizarro que afectou a cobertura dos media de um protesto contra Musk em Lisboa. Também se analisa uma ‘fake news‘ sobre o traçado do TGV, a hipocrisia de um jornalista do Polígrafo e ainda a decisão do Expresso de fazer duas primeiras páginas nesta edição.

    Acesso: LIVRE, mas subscreva o P1 PODCAST com um donativo mensal de 2,99 euros. Ajude o PÁGINA UM a amplificar o seu trabalho.

  • Foi você que pediu o rearmamento europeu?

    Foi você que pediu o rearmamento europeu?


    A Europa, essa entidade amorfa que oscila entre a tecnocracia despótica e a incompetência institucionalizada, decidiu, uma vez mais, sacrificar o cidadão comum no altar das suas ilusões megalómanas.

    Recentemente, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que ninguém elegeu para coisa alguma, anunciou, com o fervor de uma sacerdotisa do destino europeu, que a União precisa de se rearmar urgentemente.

    Se o tom não é de histeria, é pelo menos de um fervor messiânico, como outrora aconteceu quando a mesma burocracia exigiu que todos fossem inoculados a uma velocidade vertiginosa com uma substância experimental, sob a ameaça de segregação social e de perda de direitos fundamentais. Agora, a urgência não é uma suposta pandemia, mas uma guerra que, como todas as tragédias europeias, tem as suas raízes na incompetência crónica dos mesmos líderes que agora nos exigem sacrifícios.

    Qual é, exactamente, a natureza desse novo imperativo existencial? Ao que parece, a Europa precisa de se defender de Putin e dos russos, que, depois de décadas a vender gás aos europeus, passaram a encarnar o mal absoluto. O mesmo continente que, até há poucos anos, celebrava efusivamente contratos de fornecimento energético com a Rússia, construía gasodutos, organizava campeonatos mundiais de futebol e estreitava laços comerciais, caiu agora numa amnésia conveniente e decidiu que a única solução é a guerra.

    Para essa guerra, propõe-se assaltar-nos em 800 mil milhões de euros, canalizados para o rearmamento e para os bolsos da casta não eleita em Bruxelas, sem que se levantem grandes questões sobre o impacto deste endividamento colossal. Como se a União Europeia não estivesse já atolada em problemas económicos e sociais, nem enfrentasse, em simultâneo, uma invasão silenciosa vinda do terceiro mundo, promovida e incentivada pelos mesmos que agora exigem que se levantem exércitos para travar um inimigo externo.

    A ironia é grotesca: enquanto se financia o caos dentro de casa, exige-se que os cidadãos paguem uma nova cruzada bélica que não lhes diz respeito. A incongruência atinge proporções quase teatrais quando se observa o súbito desinteresse pelas normas de responsabilidade orçamental que, até há pouco tempo, eram o evangelho inquestionável da União.

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    Durante anos, venderam-nos a austeridade como um dogma incontornável. Cortaram na saúde, na educação, nas pensões, no investimento público, tudo para garantir que os orçamentos se mantinham alinhados com os preceitos sagrados de Bruxelas. Claro está que, para um libertário, toda esta retórica era uma falácia, um mero eufemismo para justificar a pilhagem fiscal e o desvio dos recursos da população para os bolsos de burocratas e plutocratas.

    Ironicamente, nem sequer mantêm a coerência desse discurso: passaram da austeridade pregada em tom de sermão à mais descarada orgia de despesa pública, onde o dinheiro corre como água em direcção à indústria de armamento e às engrenagens do Estado belicista.

    Os que, há três anos, impunham prisões domiciliárias e encerravam negócios em nome da protecção de vidas humanas, são agora os mesmos que falam com frieza burocrática sobre a necessidade de enviar jovens para a carnificina de um campo de batalha na Ucrânia.

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    Aqueles que nos disseram que deveríamos viver trancados em casa porque poderíamos matar os velhinhos ao transmitir-lhes o vírus invisível, são agora os que dizem que vale a pena sacrificar gerações inteiras para manter o sonho delirante de um império europeu armado até aos dentes. A dicotomia é tão absurda que não pode ser explicada sem uma referência à hipocrisia estrutural da elite política europeia, que ora se veste de humanitarismo tecnocrático, ora se assume como máquina de guerra sem escrúpulos.

    Nada disto estaria completo sem um toque de ironia ecológica. Durante anos, disseram-nos que o CO2 era o grande inimigo da civilização, que era urgente transformar as nossas vidas num exercício permanente de penitência ambiental.

    Fomos proibidos de usar carros a combustíveis fósseis, obrigados a comprar veículos eléctricos, sujeitos a restrições energéticas para salvar o planeta. Agora, essa mesma elite que nos impôs estas limitações vem exigir uma corrida armamentista que, por um capricho técnico, não será feita com tanques eléctricos nem com caças movidos a energia solar. Não, o exército europeu de Ursula von der Leyen continuará, sem dúvida, a operar com os mesmos combustíveis fósseis que foram interditos aos cidadãos comuns.

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    As preocupações ambientais evaporam-se quando se trata de mobilizar frotas de navios de guerra ou de despejar bombas sobre cidades distantes. A preservação do planeta é um fardo exclusivamente nosso, os otários de sempre, enquanto os militares, os fabricantes de armamento e a quadrilha que orquestra este teatro continuam a “poluir” impunemente.

    A justificação para esta nova corrida armamentista baseia-se numa narrativa cuidadosamente construída sobre a suposta ameaça russa. Aqui, surge outro detalhe que mereceria um prémio de cinismo: durante décadas, os líderes europeus não só negociaram alegremente com Putin como fizeram da Europa um refém energético da Rússia. Foram eles que financiaram os gasodutos, que construíram infraestruturas para garantir o fluxo de gás barato, que promoveram acordos comerciais estratégicos com Moscovo.

    Agora, esses mesmos líderes afirmam estar surpreendidos com as acções do Kremlin, como se nada do que aconteceu nos últimos anos tivesse sido previsível. A guerra, longe de ser uma fatalidade inevitável, foi alimentada por anos de irresponsabilidade geopolítica e arrogância ocidental. A solução proposta é a escalada, em vez da negociação. O diálogo, que noutros tempos era considerado um pilar da diplomacia europeia, foi descartado em favor de uma retórica belicista que só beneficia as indústrias que lucram com a destruição.

    Vladimir Putin e Ursula von der Leyen na Conferência sobre a Líbia, em Berlim, em Janeiro de 2020.
    / Foto: D.R.

    O que nos resta então? A factura será paga por todos aqueles que, à semelhança do que aconteceu durante a putativa pandemia, acreditam que os sacrifícios impostos pelos governantes são sempre necessários e justificados. O cidadão comum, que já viu o seu poder de compra dizimado pela inflação, que já enfrenta um custo de vida insustentável, terá agora de suportar uma nova onda de inflação – tudo será pago com a impressora do Banco Central Europeu (BCE) –, impostos e de perda de liberdade em nome da segurança colectiva.

    Tal como aconteceu durante a suposta crise sanitária, qualquer resistência será tratada com desprezo e hostilidade. Os que questionaram a narrativa da pandemia foram apelidados de negacionistas, perigosos para a sociedade. Agora, os que se opõem à escalada militarista serão inevitavelmente rotulados como agentes do Kremlin, putinistas, traidores da democracia, alvos a abater no grande jogo da propaganda política.

    O ciclo repete-se com um cinismo avassalador. O mesmo cidadão europeu que aceitou ser coagido a receber injecções experimentais, que aceitou ser trancado em casa e impedido de trabalhar, que aceitou a destruição da economia em nome da protecção da saúde pública, aceitará agora mais esta impostura.

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    Aceitará pagar a factura da guerra, aceitará a militarização da sociedade, aceitará ser um peão descartável num jogo de poder que não compreende e que em nada o beneficia. Tudo porque, no final, continua a acreditar nas mesmas elites e na sua propaganda que o desprezam e que, sem qualquer vergonha, conduzem o continente à ruína enquanto garantem para si próprios um futuro confortável entre os corredores de Bruxelas e os conselhos de administração das empresas de armamento.

    Bem-vindos à nova normalidade. O circo prossegue, os holofotes brilham, a música toca. Como sempre, os palhaços somos nós.

    Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • O silêncio de Gouveia e Melo

    O silêncio de Gouveia e Melo


    Depois de presente no palco mediático quase diariamente ao longo de quatro anos, Gouveia e Melo (GM) anda recolhido este ano. GM invocou férias e também falta de liberdade. Mesmo quem não notou que andou no palco mediático desde 2021 acha que ele está em silêncio, só interrompido por um artigo no Expresso e uma fugaz aparição com um banal e inócuo comentário sobre estabilidade política. Este silêncio parece artificial; será uma tática para o protocandidato a Presidente da Republica (PR) evitar ser questionado. Mas pode ser mais do que tática. Dadas as exibidas vaidade e necessidade de vedetismo e aplauso será um silêncio que lhe custará aguentar.

    Poucos dias após deixar o comando da Armada, revelaram-se nos media alguns apoiantes. Primeiro, foram dois destacados maçons, logo desautorizados, sem GM dar a cara, talvez visando mostrar-se independente da maçonaria. Seguiram-se Ângelo Correia e Isaltino Morais, que não foram desautorizados, e que merecem uma observação mais incisiva.

    Esperava o apoio de Isaltino Morais, desde que GM o condecorou com a medalha de “Vasco da Gama” (por despacho, quando o decreto-lei 49052 atribui a competência a ministro e por portaria). O Correio da Manhã destacou o facto, uma e outra vez. Ninguém reagiu a este uso de recursos públicos; só o PÁGINA UM e o jornal que dá mais palco mediático há anos a GM notaram o facto – que interessa a todos os cidadãos, pois contraria a alegada probidade do protocandidato. Está muito bem escrutinar políticos; e não interessa saber como GM gastou recursos públicos, por exemplo, em condecorações? Ou em ajustes diretos?

    Isaltino Morais também ganhará circunstancialmente com este apoio, pois chateará o PS e o PSD, e quiçá sobretudo Luís Marques Mendes. Como o voto é secreto, duvido que se venha a saber se Isaltino Morais concretizou no voto este apoio verbal a GM.

    O apoio de Ângelo Correia pede mais atenção. Também em entrevista televisiva, pareceu ser um mentor mais do que só um apoiante. Parece que gosta de ser mentor; mas não lhe vejo sucesso. Com o estilo habitual que aparenta conhecimento e segurança sobre o que está a dizer, mas basicamente retórico, disse que distribuir vacinas foi um “ato político”, indiciando a origem da frase de GM de que “não era qualquer militar que fazia aquilo”, e parecendo revelar a ideia que sustentará a sua campanha – afinal é político… Disse que o conhece “há muitos anos”: e quer dizer o quê? Disse que a candidatura “não é contra os partidos, é para fortalecer os próprios partidos políticos”, que GM “sabe criar poderes compartilhados”, ou promover consensos: só me faz rir! Será que conhece GM além da “guerra do croquete”?

    Além de revelar a vulgar superficialidade sobre a interpretação de sondagens, destaco uma frase favorita dos populistas: GM “vai apoiar-se no povo, não vai apoiar-se nas elites” – como se GM visasse uma mole de pessoas manipuláveis e sem instrução. Mas escolheu o Expresso para apresentar o seu manifesto político…

    Mas o que é “o povo”? Há quem defenda “GM a presidente e Ventura a primeiro-ministro”; há quem queira votar em José Sócrates; há quem queira “algo diferente”. Todos se queixam dos “maus políticos”. Mas não percebem a superficialidade da sua conduta: é por escolherem com base na imagem e na propaganda – que exaltam a diferença – e não na conduta e na substância do passado dos candidatos, que são eleitos “maus políticos”. A superficialidade confirma-se no facto de os mesmos insistirem em não aprender com as más escolhas.

    Os referidos apoiantes de GM pouco disseram de objetivo nos media, mesmo sobre vacinas. Parece que é assim que acham que chegam ao “povo”. Nenhum referiu, por exemplo, que GM foi acusado por um tribunal superior por crime praticado em serviço, ou que o Tribunal de Contas o acusou de excesso de ajustes diretos. O que nem um apoiante de GM consegue explicar é: como pode alguém com um perfil executivo e sem formação nem experiência política exercer bem o cargo menos executivo e mais político do regime? Instados a explicar, ouvem-se castelos no ar ou um ensurdecedor silêncio – acham que assim convencem mais do que as dezenas de convencidos que alimentam as sondagens? Aliás, que fariam sem estas sondagens?

    No fim, Ângelo Correia falou mais de si próprio do que de GM (alguém se surpreendeu?); mostrou o que ele acha, mas não mostrou que GM é um moderado e menos ainda que é um moderador, conhecedor e cumpridor da Constituição (CRP). Como pode ser um moderador, em especial dos partidos, se busca e tem mais apoios entre quem despreza os partidos, como se vê nas redes sociais? Quiçá “mentor” e protocandidato sonham com o apoio de um ou mais dos grandes partidos. Apesar dos esforços, até para lhe darem um CV académico, Chega e CDS não dão sinal de apoiar GM; talvez percebam que é contranatura.

    Acho que não foi por acaso que surgiu nos media o mito de que nada se conhece sobre o pensamento político de GM. Desde logo, Ângelo Correia contrariou esse mito, com a ideia de que distribuir vacinas foi um ato político… De facto, GM já tomou posições políticas, o que entendo que violou o dever de isenção, que vincula os militares no ativo; é só googlar e lá estão. Mas o esforço do apoiante foi demolido pelo protocandidato no artigo no Expresso, que mostrou com exuberância a falta de preparação política e as ambições despropositadas, pontos evidenciados por reputados especialistas, que o analisaram (por exemplo, António José Seguro, Henrique Monteiro, Vital Moreira, e Teresa de Melo Ribeiro).

    Este mito parece ter sido plantado nos media pela agência de comunicação, informal ou formal, que guia GM, pois desvia a atenção da conduta e do passado ao longo de décadas – que revela a pessoa, que é o que importa num órgão político e unipessoal – para um cenário futuro que se pode construir, através da propaganda e da imagem. Se não houver agendas ocultas e a superficialidade mediática não prevalecer (concretizada em meia-dúzia de buscas no Google e de declarações de amigos), haverá jornalistas a escrutinar o passado de GM, com rigor e objetividade, e eleitores interessados em se informarem.

    Sem querer ser exaustivo, nem ir muito atrás, é de recordar que GM recusou expressamente entrar na política, dizendo até “Se isso acontecer, deem-me uma corda para me enforcar”; e confirmou a posição um ano depois e dois anos depois. Em janeiro, recusou um jantar numa tertúlia em Alcochete, sendo citado sem desmentido com a declaração de “O meu nome não é para andar a vender bilhetes”. Porém, está marcado para março no Hotel Sheraton, um almoço do ICPT, cuja inscrição custa €52, contra os €30 da tertúlia. Então GM vai-se apoiar no povo e não nas elites… Mais graves são as suas contradições sobre a conscrição até pelo alarme social que causaram. Estão à vista a integridade e a preparação política de GM…

    GM disse que era “impiedoso com os malandros”, revelando-se polícia, acusador e juiz num só. Creio que custará a Ângelo Correia ensinar a GM o que é “autoridade democrática”; que um democrata é tolerante à crítica; ou que usar os tribunais para perseguir quem diverge dele torna improvável que GM cumpra a CRP e o juramento presidencial. Aliás, a atitude autoritária, que evidenciou ao longo de 45 anos de vida militar, de não tolerar quem dele discorda aumenta o medo que Ângelo Correia diz hoje existir na sociedade portuguesa, medo que mata a democracia. E apoia quem alimenta tal medo, que mata a democracia…

    E estará aqui a explicação do silêncio de GM: um mentor e um especialista de imagem têm de ensinar GM a “mudar de farda”; isto é, têm de ensinar-lhe muitas frases bem-sonantes, e técnicas de propaganda para afastar aquilo que eram “medalhas” do passado e que agora lhe dará jeito esquecer, para agarrar “o povo”. Pelo manifesto no Expresso, tem muito para aprender… Há quem diga que se ensina a CRP numa semana… já para debater com António Vitorino, nem Ângelo Correia mostrou estar convencido de poder correr bem a GM…

    Uma das lições aprendidas com o mandato do atual PR, e que alguém ensinará a GM, é que o modelo de inconstitucionalidade de normas, estabelecido na nossa Constituição, confere ao PR um amplo espaço de atuação, no qual ele até pode violar o espírito, senão até em alguns casos a letra, da CRP, com impunidade. Penso que isso vai GM aprender depressa.

    Como previ, GM é só a carranca da barca. Já se sabe quem lhe “leciona” a “Introdução à Política”. Falta saber quem o está a ensinar propaganda política e a fazer podcasts. E falta saber o que vão inventar para persuadir a maioria dos eleitores de que GM é moderado e vai ser o moderador a que a Constituição, e bem, vincula o Presidente da República.

    Jorge Silva Paulo é doutorado em Políticas Públicas


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Os jornalistas soldados de Ursula

    Os jornalistas soldados de Ursula


    Alterações Mediáticas, podcast da jornalista Elisabete Tavares sobre os estranhos comportamentos e fenómenos que afectam o ‘mundo’ anteriormente conhecido como Jornalismo. No 18º episódio, analisa-se o fenómeno bizarro que afectou os media na cobertura do anúncio de que a Comissão Europeia quer que União Europeia leve a cabo uma despesa recorde na compra de armamento. Também se analisa um caso de ‘cegueira’ do jornal Sol que publicou um artigo de opinião sobre a pandemia de covid-19 disfarçado de notícia.

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  • Expresso e a ‘manchete-panfleto político’

    Expresso e a ‘manchete-panfleto político’


    Alterações Mediáticas, podcast da jornalista Elisabete Tavares sobre os estranhos comportamentos e fenómenos que afectam o ‘mundo’ anteriormente conhecido como Jornalismo. No 17º episódio, analisa-se o fenómeno bizarro que levou o Expresso a fazer manchete com um manifesto de campanha política de um eventual candidato às presidenciais. Também se analisa uma deliberação recente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista sobre uma queixa de um pivot da CNN/TVI.

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