Fui às praias dos arredores de Marbella, mas não meti o pé na água. Porque são as mesmas, onde se afogam milhares de irmãos africanos que apenas querem uma refeição e uns chinelos…
Após atravessarem o nosso mar comum: o Mediterrâneo!
Ouvi a notícia do resgate de 117 crianças desacompanhadas enviadas num barco tosco, onde estavam mais 203 africanos de olhos postos no paraíso europeu. Foram levados para o porto italiano de Taranto. Outras mil pessoas continuam em embarcações à deriva.
Houve tempos em que o Mediterrâneo era europeu. Roma de um lado, Cartago na Tunísia. Os próprios apóstolos de Cristo nunca escreveram epístolas aos berlinenses, londrinos ou mesmo lisboetas. Mas aos Coríntios, Romanos ou Efésios. Foi Carlos Magno que mudou o sentido da Europa.
Mas agora a Europa precisa de voltar-se também para o seu berço.
A população europeia envelhece e os recursos estão no norte da África, zona rica em gás, petróleo e com uma população ávida de consumir… uns pães, umas frutas, chocolates e de ter uma TV e um popó.
Em Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Egipto 40% da população têm menos de 23 anos de idade.
Para quem só vê dinheiro, é ” um mercado e pêras “.
E a abertura imediata ao desenvolvimento da margem sul do Mediterrâneo resolveria dois problemas: tornava as migrações desnecessárias e desenvolvia um sentido de coesão nos países magrebinos e mesmo no Próximo Oriente.
Melhor ainda, daria aos europeus da margem norte do Mediterrâneo a possibilidade de continuarem a ser um bom motor económico e um somatório civilizacional.
É muito triste ver pais a meter filhos em barcaças, pagando fortunas, para que eles possam ter “o pão nosso de cada dia”.
Nós europeus precisamos de uma ética séria.
Amigos do norte da África: sejam bem vindos à CCE, a Casa Comum Europeia.
José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
A partida de um comboio da China directo para a Europa é uma má notícia, ao contrário do que se poderia imaginar. O comboio, com 100 contentores carregados de mercadorias Made in China, está avaliado em 10 milhões de euros. Serão menos 10 milhões de euros de produtos fabricados na Europa.
A automatização e a deslocalização da produção matará em breve a matriz civilizacional europeia. Os europeus perderão ainda mais postos de trabalho e nem sequer terão dinheiro para pagar 1.5 euros por um jornal diário, como já acontece.
A China enviará 500 destes comboios por ano para Europa.
O cidadão comum bate palmas por poder comprar “pechisbeques” e certas indústrias comilonas rejubilam por adquirirem peças ao preço da uva mijona.
Europa tem de ser auto-sustentada.
O trabalho não é um direito vago. É um factor social agregador. Um elemento essencial para a saúde mental e sobretudo para a continuação de uma civilização notável de cariz judaico-cristão, com pitada de islamismo.
O comércio é necessário, claro! Os portugueses abriram até grandes rotas ao Mundo. Mas a Europa tem de procurar a sustentabilidade.
Caso contrário cairá no nosso fatídico buraco da crise de 1383-1385. Quando não tínhamos liderança, morríamos de peste, éramos invadidos de estranhos, definhávamos de fome e não sabíamos da esperança.
Mandemos de volta os comboios chineses. Deixamos de ser preguiçosos e também de sustentar meia dúzia de comilões sem pátria, que querem morrer podres de rico.
José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
A divulgação em massa de notícias recicladas, baseadas em agências noticiosas ou em comunicados de imprensa, é uma das chagas do jornalismo e um dos entraves a uma sociedade bem informada.
É como uma erva daninha que cobre todo o terreno dos media em Portugal.
A massificação das notícias é uma realidade. As mesmas notícias aparecem invariavelmente em todos os media. É o famoso corta-e-cola.
Uma notícia que surja na agência Lusa, por exemplo, é de imediato replicada e divulgada por todos os media. Um comunicado de imprensa – seja do Governo ou de uma empresa influente – é disseminado de imediato. Todos os órgãos de comunicação o replicam. Assim. Sem pensar. Sem verificar o rigor da mensagem que divulgam, na maior parte dos casos. Sem verificar dados. Nada. Sem fazer uma pergunta que seja. Sem questionar se está correta a informação, se é sequer… relevante para os leitores.
Aquilo que interessa é aumentar o número de conteúdos disponíveis e atrair o maior número de cliques para o site. Mas o caso alarga-se a televisões, a rádios, a jornais. Como uma praga.
O jornalismo do corta-e-cola – ou churnalism, como ficou conhecido no termo em inglês – é uma realidade e nem sempre os leitores se apercebem do que se passa. De onde surgem notícias, como surgem, como se disseminam tão rapidamente. O problema não é de hoje nem se cinge a Portugal.
O caso da agência Lusa é o mais paradigmático em Portugal: todas as notícias que são publicadas pela agência são automaticamente replicadas em minutos por todos os media. Mas não é caso único. Se um jornal publica uma notícia, os restantes media encarregam-se de a disseminar rapidamente. Porquê? Porque têm de ter as notícias que todos têm. Porquê? Para terem cliques, ou seja, mais audiência.
E nenhum órgão de comunicação social quer ficar de fora de toda a notícia que é massificada. Uma espécie de floresta de eucalipto sem qualquer biodiversidade. A pobreza daí resultante para o jornalismo e para a sociedade é evidente.
Os perigos deste tipo de prática são evidentes, a começar pela possível disseminação rápida e acelerada de eventuais notícias falsas, incorretas, imprecisas ou parciais. Quem esfrega as mãos de contente com esta praga são as agências de comunicação, empresas, o Governo e todos os que querem pôr alguma “mensagem” a circular. Hoje em dia, uma notícia rapidamente se espalha como sendo verdadeira em todos os órgãos de comunicação social. Sem perguntas incómodas nem “comos ou porquês”.
Os media “lavam as suas mãos” de eventuais incorreções ou disseminação de falsas notícias, falsas estimativas, falsas conclusões. Se a notícia é da Lusa, então a culpa é da Lusa. Se foi de um jornal, é desse jornal. Isto, quando se admite sequer publicamente o erro na notícia, na estimativa, no anúncio.
Esta desresponsabilização é grave e errada e incentiva a que qualquer notícia reciclada se instale como verdadeira, mesmo que o não seja. A pressa é uma das desculpas utilizadas pelos media para não verificarem as notícias que reciclam. As magras redações será outro dos argumentos. Mas não chega.
Os órgãos de comunicação social devem ser responsáveis por verificarem todas as notícias que divulgam junto dos seus leitores. Devem fazer perguntas e questionar.
Publicar notícias da Lusa atrás de notícias da Lusa, intervaladas por anúncios de empresas e comunicados do Governo, não é o objetivo no Jornalismo. Não pode ser.
Se todos os media tivessem de identificar a amarelo, por exemplo, todas as notícias que reciclam e todas as de que são meros papagaios, então o público, os seus leitores, teriam uma ideia da dimensão do problema. E da dimensão do perigo.
Imaginem que todos os media tinham de colocar um aviso em todas as notícias em que não verificaram as fontes, o rigor da informação, etc… O panorama seria bem diferente. E os leitores leriam aquelas notícias com outros olhos. Mas os media não o fazem. Não querem fazer. Têm horror a fazer.
Pergunta o leitor: então, mas e os diretores dos jornais, das televisões, das rádios? Onde estão? Não querem eles melhores notícias? Grandes cachas? Claro que querem.
O problema é que há diretores concentrados em ajudar a executar produtos comerciais e não editoriais. Há muitos anos, seria normal uma secretária de um diretor de jornal estar coberta de pilhas e pilhas de papéis, documentos e jornais. Agora, há diretores que nas suas secretárias têm, a par de jornais, um ou mais dossiers e conjuntos de pastinhas coloridas com micas, cada uma contendo um “contrato de parceria” a executar pelo jornal.
Antes, o diretor estava focado em ter o jornal com as melhores cachas e entrevistas. Agora, há diretores trans: têm carteira profissional, mas são também marketeers. Trabalham para os “clientes” do Grupo de media onde trabalham.
O objetivo confunde-se e já não é sempre o de fazer notícias, mas vender “oportunidades” aos clientes para divulgarem as suas mensagens, serviços e produtos aos leitores.
Assim, se a este “jornalismo” de clientela juntarmos o igualmente instalado churnalism, conseguimos perceber como os media chegaram ao ponto em que se encontram, com notícias invariavelmente iguais, sejam elas verdadeiras ou não, rigorosas ou não, imparciais ou parciais. Desde que não incomodem “clientes”.
Melhorar a literacia dos cidadãos em matéria do que são as boas e as más práticas em Jornalismo é crucial. Educar sobre Jornalismo (e o que não é Jornalismo) torna-se imperativo num mundo mediático cada vez mais ocupado por notícias recicladas – “eucaliptos” – e “notícias” com interesses comerciais envolvidos.
A solução passa também pelos próprios jornalistas e a oposição que devem demonstrar a esta prática persistente. Mais notícias próprias – em vez de recicladas – valorizam o trabalho dos jornalistas, bem como a sua imagem perante o público. Uma classe valorizada mais rapidamente vai exigir melhores condições de trabalho para um exercício da profissão com mais dignidade. Com mais dignidade e qualidade.
Até há cinco séculos, a promulgação de leis pelo Estado era algo pouco comum. Esperava-se que as pessoas fizessem o que era a prática comum numa dada comunidade e se abstivessem de fazer aquilo que as pessoas “pouco decentes fazem”.
De certa forma, essa noção ainda hoje persiste. Os polícias, por exemplo, tendem a ver os criminosos em geral não exactamente como infractores da lei, mas como pessoas que fazem coisas que pessoas decentes não fazem: “Eu não saio por aí a roubar coisas”.
Os sistemas jurídicos anglo-saxónicos ainda preservam essa tradição: a Common-law. Os casos são resolvidos através de um caso anterior semelhante e, em seguida, estendendo a decisão precedente sobre a nova situação aparentemente relacionada.
Funcionou bem para as pequenas comunidades, muito unidas e com poucas diferenças, mas com sociedades crescentemente complexas, isto é, com grupos sociais com distintas culturas, aquilo que parece óbvio para um grupo social pode ser um absurdo para outro.
O sistema legal romano foi outra abordagem que existiu no passado, criado com um vasto império, de pessoas e culturas amplamente diferentes. Nele, não havia lugar para o direito comum: tudo o que se proíbe está escrito; tudo o que não é proibido é permitido.
É assim que os sistemas judiciais funcionam na maior parte do Mundo nos nossos dias. No entanto, com uma diferença importante: os juízes eram bastante livres para interpretar a lei escrita à sua maneira. Desta forma, a lei, no sistema romano, acabava por não ser algo a ser obedecido literalmente, mesmo que tal literalidade fosse possível. As leis eram directrizes e não obrigações morais, onde o costume determinava se uma determinada lei era compreendida e aceite pela sociedade em geral.
Com o advento do Estado Moderno, onde as burocracias imperam, começou a tratar-se a lei escrita como algo divino, aquilo que denominamos por “positivismo”, pois as leis promulgadas são chamadas de “direito positivo”, em contraste com o direito consuetudinário – construção jurídica baseada em costumes a partir das tradições dos povos de determinado local e que passaram a ser aceites como norma.
A actual teoria do Estado todo-poderoso surgiu no momento em que um monge martelou um pedaço de papel na porta de uma igreja – na noite das Bruxas, nada menos! –, altura em que se viviam importantes revoltas sociais no norte da Europa.
A criação de Frei Martinho Lutero de uma religião totalmente nova não foi uma causa, mas uma consequência da sua martelada na porta de uma igreja. Ele desejava desafiar uma pessoa do seu bairro que andava a angariar fundos para a construção da Basílica de São Pedro, em Roma, para debater com ele a legitimidade das suas “técnicas de venda”.
A véspera de Todos os Santos foi o momento perfeito para pregar as suas propostas na porta daquela igreja em particular, já que no dia seguinte seria realizada a maior exposição de relíquias sagradas de todo o norte da Europa, garantindo a propagação da sua mensagem a milhares de peregrinos.
Lutero, um professor que conhecia as Sagradas Escrituras, desafiava uma pessoa que provavelmente conhecia as Sagradas Escrituras apenas do que escutava nas suas idas às missas, com as seguintes regras: todo e qualquer argumento deveria ser extraído das Escrituras – algo justo!
A religião era então, e ainda é – seja o cristianismo, o islamismo, o budismo ou o moderno ateísmo –, a lente através da qual vemos, a lógica com a qual interpretamos, o mundo ao nosso redor.
Naquela época, na Europa, a religião significava uma coisa, e apenas uma coisa, em todos os lugares. Não apenas os seus princípios morais formavam a estrutura de comportamento aceitável, mas o tempo religioso – o calendário litúrgico – deu às pessoas a própria noção de tempo.
As práticas religiosas – por exemplo, as peregrinações àquela igreja onde Lutero martelou as suas propostas – eram essencialmente universais e partilhadas por todos; a autoridade religiosa era a base da autoridade civil, e assim por diante.
A autoridade religiosa não significava que um rei fosse considerado um procurador de Deus. Muito pelo contrário. Na verdade, significava que o trabalho de qualquer governante podia e devia ser comparado com o que era então universalmente aceite como vindo de Deus; governaria como representante do povo. Não de Deus: do povo.
A voz do povo era a voz de Deus, e, muitas vezes, era a visão do povo sobre o que era certo e o que era errado, dentro do contexto de um consentimento religioso absolutamente unânime, que manteria ou deporia reis e príncipes.
A autoridade de um governante, portanto, dependia de como ele usava a sua – bem pequena – autoridade. Ele realmente tinha o poder de aprovar algumas leis positivas, mas a lista de requisitos era bastante vasta. Entre outras coisas, não podia aprovar uma lei que não fosse útil ou que fosse contra o costume estabelecido. O rei era uma espécie de velho patriarca que não diria aos seus filhos e netos como governar as suas próprias casas, mas cuja autoridade seria respeitada para resolver disputas.
Além disso, toda a sua autoridade vinha de compromissos: ele teria que proteger cada uma das pessoas que viviam nos “seus” territórios, enquanto o povo teria que alimentá-lo, tal como aos seus exércitos privados – ridículos em comparação com os exércitos modernos. Ele era um servo da terra, o mais baixo servo, pois seria o último a abandonar o território.
Entretanto, uma mosca feia, gorda e peluda presa na pomada da sociedade estava a surgir: o dinheiro. Mais especificamente, o facto de que havia uma presença cada vez maior do dinheiro na sociedade, apesar de não haver então lugar para ele.
De acordo com a Lei – isto é, com o costume –, alguém que nascesse guerreiro ou agricultor teria para sempre tal estatuto na sua vida terrena. A única escolha real era o ingresso na vida eclesiástica, uma espécie de terceira via.
O dinheiro não fazia diferença: um guerreiro rico ainda deveria ser um guerreiro, arriscando o seu pescoço pelos outros; um agricultor teria de continuar a lavrar a terra e não podia comprar ou vender terras. Todo o dinheiro do Mundo não podia transformar um guerreiro num agricultor, ou vice-versa.
O comércio começou a enriquecer algumas pessoas. A maioria vinha de famílias de agricultores. Não havia lugar para os ricos na sociedade, mas eles conseguiram esculpir um lugar para si, usando o seu dinheiro em benefício dos militares. Não é uma novidade, algumas dessas pessoas continuaram a fazê-lo até aos nossos dias. O principal fabricante de armas da Alemanha em ambas guerras mundiais foi a Krupp, um conglomerado familiar que começou naquela época como um negócio familiar.
Antes que os ricos chegassem à cidade, não havia tal coisa. Havia castelos com fossos, mas, infelizmente, sem dragões, e terras em redor. Quando havia guerra, os civis entravam no castelo e os militares saíam, mas em tempos normais era o contrário.
Com o dinheiro, surgiu algo novo. Os novos ricos começaram a financiar os muros, cada vez maiores, ao redor das muralhas iniciais do castelo e, por sua vez, construíram casas e lojas dentro das novas muralhas.
O nome dessas cidades comerciais que se desenvolveram entre as muralhas originais e as novas e maiores do castelo era o Burgo – a fortificação que servia de abrigo às populações situadas fora das muralhas. Os seus habitantes ficaram conhecidos como a “burguesia”.
Obviamente, os militares e a burguesia “tornaram-se amigos”, em detrimento dos pobres, que continuavam fora das muralhas originais – e do burgo. Na época de Lutero, as revoltas dos camponeses estavam a começar a ser comuns em todos os lugares, mas os militares (os nobres) estavam de mãos atadas, por essa desagradável tradição de obedecer a Deus. A revolução de Lutero forneceu-lhes a escapatória.
Mais do que isso, instalou-se uma nova autoridade religiosa que diria aos príncipes como lidar com os camponeses revoltados: “Contra as hordas assassinas e saqueadoras molho minha pena em sangue, seus integrantes devem ser estrangulados, aniquilados, apunhalados, em segredo ou publicamente, como se matam os cães raivosos”.
“Como se matam cães raivosos” foi estendida a todas as seitas que não se juntavam ao seu novo governo – a Igreja Luterana – aprovado pelo Estado (ou melhor, aprovado pelos governantes locais; os Estados eram muito pequenos e ainda sem importância, e, acima de tudo, o poder era 100% pessoal: o Estado era o seu rei).
É por isso que todas as denominações protestantes de hoje podem traçar as suas linhagens institucionais e teológicas até uma ou duas das três seitas protestantes aprovadas pelo Estado do século XVI: luterana, calvinista e anglicana. Todas as outras opções que surgiram de diferentes interpretações da Sola Scriptura foram obviamente eliminadas – “como se matam os cães raivosos”.
De certa forma, algo bastante semelhante já tinha acontecido alguns séculos antes, quando a seita gnóstica dos cátaros surgiu no sul de França e Norte de Itália. Ao tornar-se um cátaro, a pessoa libertava-se de todos os compromissos e obrigações anteriores, a base da então ordem social. As pessoas começaram a persegui-los e a matá-los, nomeando-se ao mesmo tempo juízes e carrascos, algo intolerável para a Igreja Católica. Foi assim que a Inquisição surgiu: para libertar os falsamente acusados.
O sul da França, na época dos problemas cátaros, era o centro do mundo; o norte da Europa no tempo de Lutero era o deserto, os arredores da civilização. Foi assim que a nova religião conseguiu tempo suficiente para obter massa crítica e, desta forma, sobreviver muito mais tempo do que o catarismo.
O calvinismo – apoiado diretamente pela burguesia de Genebra – era então um fenómeno local, que sobreviveu tanto pelo caos completo no Norte quanto pela falta de importância da Suíça na época. O facto de os suíços serem tão ferozes, a ponto de todos quererem contratá-los como mercenários, ajudou a protegê-los.
Assim, começaram as Guerras Religiosas Europeias e, por gerações e gerações, a Europa tornou-se um vasto campo de batalha onde os seguidores da Antiga e da Nova Religião tentavam obter vantagem para libertar os outros do jugo das suas horríveis heresias e superstições. Cem anos de derramamento de sangue.
Qual foi a solução? O Tratado de Vestfália. Pode ser resumido ao seguinte: a religião de cada pequeno governante seria imposta a todos os seus súbditos. Por outras palavras, enquanto antes da revolução Luterana todos concordavam sobre o que Deus queria que um governo fizesse, e a sua autoridade repousava na conformidade a essa visão comum, depois da Vestfália cada governante local ganhou autoridade para decidir, por conta própria, qual seria a verdade de Deus.
Os reis foram, de facto, colocados acima de Deus, recebendo o direito de julgar se o que sempre foi considerado por todos, em todos os lugares, como Revelação Divina se era ou não verdade.
Para implementar a “nova verdade”, iniciou-se a propaganda de estado em grande escala. Iniciou-se pela interpretação das Escrituras Sagradas da seita vencedora, obviamente imposta pelo Estado, através da criação da “educação pública”, uma invenção protestante. Doutrinar a versão correcta era o lema.
Hoje, a doutrinação das crianças no sistema escolar alcança níveis nunca imaginados, temos como exemplos a “civilização e progresso decorrentes do pagamento de impostos” – até existe um livro, a Joaninha e os impostos –, a “ideologia de um conjunto de letras sem fim” ou mesmo a nova “ciência emanada da DGS”. Um sem-fim de programas escolares destinados a criar um homem-novo – o comunismo também se propunha a tal.
A revolução Luterana abriu caminho para o direito divino absolutista; por cá, o expoente máximo foi o Rei D. José e o seu “carrasco”, o Marquês de Pombal. Apesar de terem sido “déspotas esclarecidos” não tinham o poder, longe disso, que um Estado moderno hoje possui. Algum cabeleireiro naquele tempo teria que pedir uma licença estatal para abrir ou inscrever-se nas finanças assim que abre actividade?
O passo lógico surgiu depois: do rei absoluto passámos ao povo absoluto, surgindo essa entidade metafísica denominada colectivo. O colectivo até passou a escrever constituições – o contrato social. Sempre achei divertidas as entrevistas a dirigentes do Partido Comunista, onde todos invariavelmente afirmavam não serem responsáveis por nada, tudo tinha sido decidido pelo colectivo!
O Estado, tendo absorvido o poder supostamente cedido “pelo colectivo”, tornou-se ainda mais absoluto do que qualquer monarca absoluto. Afinal, enquanto um rei ou uma rainha absolutista podia ignorar a vida real do “seu” povo, a ponto de acreditar que “dar-lhes brioches” seria a solução para a falta de pão, um Estado moderno tem olhos sem fim.
Hoje em dia, com toda a tecnologia que um Estado pode colocar a seu serviço, o seu problema não é ignorar o que realmente significa a falta de pão, mas analisar todo o vasto fluxo de dados que lhe chega. Ele ouve cada palavra falada em cada telemóvel, mas necessita descobrir o que vale a pena ouvir. Ele vê em tempo real as pessoas que circulam pelas cidades, mas necessita descobrir quem observar. Ele necessita de nos impor um passaporte sanitário para circular numa fronteira ou entrar num restaurante, mas necessita saber como identificar os dissidentes que não se vacinaram.
A revolução Luterana não trouxe apenas a tirania absoluta do Estado, que se concentra agora numa tentativa de estabelecer um governo global, através de instituições globais que definem a nova religião, onde um conjunto de sacerdotes pretende governar em nome da Humanidade, do Clima e do Planeta.
Luís Gomes é gestor (Faculdade de Economia de Coimbra) e empresário
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
Houve tempos em que os senhores metiam o seu automóvel numa garagem semelhante a um quarto, na Rua da Junqueira, em Lisboa, num palacete há anos em ruínas.
Dançava-se então foxtrot e os miúdos dançariam depois yé-yé para mostrar o popó às amigas.
O eléctrico passava à porta, mas era para o povo.
O consumo e, mais tarde, a Liberdade, deram ao povo dinheiro e o povo também comprou popós.
E os senhores? Abalaram nos seus popós para sítios cada vez mais longe do povo-com-popós.
E povo? Foi morar para longe, porque assim podia ter casa e popó.
E agora? Agora há popós por todo o lado e muitas casas abandonadas em Lisboa.
E o foxtrot? Tornou-se nome de bar, onde às vezes também se dança tango. Mas os senhores já não dançam.
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
Ontem, relatei exaustivamente, a novela envolvendo o meu singelo pedido para obtenção dos relatórios e ficheiros informáticos relacionados com as estimativas do impacte das festas populares e dos festivais em Junho na transmissão da covid-19.
Como se sabe, a notícia começou por ser divulgada pela Lusa, que alegou ter tido acesso ao relatório, mas do relatório nada se conhece.
Na base das recusas em ceder os dados brutos – um acto banal e corriqueiro em Ciência – por parte de um dos investigadores, Henrique Oliveira, e depois da assessoria de imprensa do Instituto Superior Técnico, pensei estar um “dia mau”, uma sexta-feira aziaga.
Afinal, não. Está entranhada na cúpula.
Henrique Oliveira, Rogério Colaço, Miguel Guimarães e Filipe Froes na sede do Ordem dos Médicos, em Julho do ano passado, aquando da apresentação do plano de acompanhamento da pandemia. O Instituto Superior Técnico recusa divulgar os estudos e os dados.
Depois de ter reagido, via e-mail, com surpresa ao teor da recusa pelo seu gabinete de imprensa, desceu esta tarde, do Olimpo, Sua Excelência o Senhor Presidente do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa Professor Doutor Rogério Anacleto Cordeiro Colaço, e não perdeu a oportunidade de disparar do seu Galaxy a seguinte sentença:
“Senhor Pedro Vieira,
O sr André Pires [assessor de imprensa] respondeu exatamente de acordo com as instruções dadas por mim. O pedido formal ao presidente do IST está respondido e a resposta é negativa”.
Nem mandou cumprimentos, o Senhor Presidente do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa Professor Doutor Rogério Anacleto Cordeiro Colaço.
Sucede que o Senhor Presidente do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa Professor Doutor Rogério Anacleto Cordeiro Colaço esquece elementares regras em Democracia – para além de todas as regras deontológicas em Ciência, que não cumpre, porque se recusa a comprovar afirmações de uma gravidade colossal sem provas (mortes em número concreto associadas directamente a festas populares e a festivais de música).
Resposta de recusa do presidente do Instituto Superior Técnico ao PÁGINA UM, via e-mail.
Esquece ele, o Senhor Professor Doutor, por muitos canudos e artigos científicos que merecidamente detenha pelo seu intelecto, uma regra democrática elementar: ele não é proprietário, mesmo se circunstancialmente presidente dessa instituição, da informação e dos documentos em posse e realizados sobre a égide do Instituto Superior Técnico. São documentos públicos, que devem ser publicitados, sobretudo quando publicamente foi vincada a participação daquela instituição.
Pode o Senhor Professor Doutor pensar que o seu grandioso poder lhe permite usar um Galaxy e dizer que a resposta para o pedido de um jornalista é negativa. E ponto final.
Pode e pode bem, como fez.
Tal como pode um jornalista, como eu, director do PÁGINA UM, achar essa sua postura lamentável, e que não pode fazer mais “escola” em Portugal. Até porque é ilegal. Até porque é anti-Ciência.
E, nesse linha, não pode o Senhor Professor Doutor ficar agora surpreendido por ter de responder formalmente, sem ser por Galaxy, a um pedido formal ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos, ficando, desde já ciente, como avisado foi, de que uma recusa o sujeitará a ter de se justificar junto do Tribunal Administrativo de Lisboa, e eventualmente a ser obrigado por um juiz (que não recebe recusas por Galaxy) a divulgar mesmo os relatórios e os dados, e a dizer como se processou o acordo estabelecido com a Ordem dos Médicos.
Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico. Quando foi solicitado o envio de dados em bruto sobre estimativas sob sua supervisão, o seu gabinete de imprensa respondeu que “o Técnico não faculta mais informação sobre esta matéria para além daquela que já é do conhecimento público”. Por Galaxy reiterou secamente a recusa.
Há pessoas, como Sua Excelência o Senhor Presidente do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa Professor Doutor Rogério Anacleto Cordeiro Colaço, que não pensam que vivem num regime democrático. Ora, enquanto ele ainda existir, o PÁGINA UM quer recordar-lhes que isso lhes dá direitos e também deveres.
O pedido formal foi esta tarde feito. Aguardam-se 10 dias úteis. Se não houver resposta favorável, segue para Tribunal Administrativo.
Entretanto, o fim-de-semana pode fazer bem ao Senhor Professor, e fazê-lo portar-se como um cidadão exemplar, e como um cientista exemplar.
N.D.: O PÁGINA UM tem uma postura intransigente e inflexível perante a falta de transparência e a recusa de acesso a documentos administrativos, estando a recorrer, por sistema, ao Tribunal Administrativo, para petições para intimação de entidades públicas. Esta é, no entanto, uma tarefa complexa e onerosa, do ponto de vista financeiro, que tem estado a ser suportado pelo FUNDO JURÍDICO apoiado pelos leitores através da plataforma MIGHTYCAUSE. O vosso apoio é fundamental para quebrar este tipo de obscurantismo por isso apelamos ao vosso contínuo e generoso apoio. Obrigado.
Um gigantesco prédio moderno de nove pisos está abandonado, há dez anos, ao início da Avenida da República, em Lisboa, como se fossemos todos ricos.
A confusão entre mercado imobiliário especulativo e Economia tem embaraçado a Câmara Municipal de Lisboa, que não expropria o edifício em esqueleto para o levar a leilão. Para um privado o repor no mercado.
O edifício pertence, segundo consta, à Sonangol, e tem um erro de construção para escritórios: o pé-direito é baixo e não permite tecto falso para cabos.
Este enorme elefante atesta que os “xico-espertos” podem esbanjar recursos. E depois ignorar as leis mais simples do capitalismo em Lisboa: quem tem dinheiro compra, quem não tem vende.
Os donos daquele esqueleto, que é uma ferida profunda na cidade, preferem ter um depósito bancário a céu aberto, porque o dinheiro no banco… não rende nada!
José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
Contemplar uma mãe que amamenta é repousar o olhar num acto de beleza incomparável. A naturalidade com que uma mulher o faz, não sugere qualquer tom sexual. Trata-se, aliás, de uma imagem bastamente romanceada que inspirou artistas de todo o Mundo e faz parte do leque de sonhos que muitas jovens desejam concretizar.
Na constante tensão entre o que consideramos ser bom, porque nos dá prazer, e o que tem de ser feito, porque é nosso dever, está o eixo em torno do qual se desenvolve o nosso carácter.
Se o egoísmo produz um efeito deletério sobre o desenvolvimento da sociedade, o altruísmo evoca o que de melhor existe no ser humano para viver em comunidade.
Atente-se na imagem da mãe que amamenta. Para lá da ideia redutora da amamentação como um acto romântico, pode estar um cenário de dor, repulsa e ansiedade.
Esta experiência de sacrifício dá lugar à comunhão entre dois seres. Esta conversão de dor em alimento é regeneradora e estabelece laços. Porque a Humanidade é uma família, é dever de cada um preocupar-se com o bem-comum e com a felicidade coletiva.
Compete-nos, por isso, libertar a nossa sociedade materialista da idealização romântica da vida, revendo comportamentos e critérios a fim de se saber julgar o que é o bem, o bom e o dever.
O gesto filantrópico arrasta consigo um mundo de beleza, que é vivido individualmente, e que se distingue de pessoa para pessoa. Importa, porém, recordar que uma coisa é viver para solidariedade e outra é viver à custa da solidariedade. Aquela manifesta-se uma extensão do bem, enquanto esta – perversa – se revela de natureza suspeita.
O que não falta são associações de cariz solidário. As motivações distinguem-se particularmente não pelos seus estatutos, que se regem por uma lei geral e comum, mas pela forma como os sócios e respectivos órgãos sociais fazem a justa gestão dos bens que lhes são confiados.
Se alguns o fazem para merecer o céu, outros há que enchem o seu coração por ver a felicidade de quem se alegra com tão pouco. Uns matam a solidão pelo envolvimento social, e outros ainda esperam o reconhecimento do alheio. Tudo isto faz parte desta missão que tanto tem de belo como pode ter de perverso.
Numa interpretação diferente da que se popularizou, Rómulo e Remo, fundadores de Roma, teriam sido alimentados por uma prostituta, e não por uma loba, já que “lupa” tem duplo significado. Quem sabe se o leite desta mulher pertencia ou não a algum filho que nunca tenha chegado a ver a luz do dia. Deu-lhes tudo quanto tinha, confortou-os com o alimento do corpo e da alma. Contudo, talvez por ser mais poética, a imagem de uma loba veio a vingar.
Hoje, tal como passado, continuam a surgir as meretrizes da caridade alheia. Apenas, em vez de alimentarem os que têm fome, estas enfartam-se até lamberem os próprios dedos, julgando assim esconder os vestígios da sua imundície.
O Hotel Tivoli Expo – hoje Hotel Tivoli Oriente – esteve durante 11 anos registado como um simples terreno.
O grupo Espírito Santo vendeu o Hotel Tivoli-Expo em Outubro de 2005, como se fosse um terreno, por 33,7 milhões de euros, ao Fundo Imosocial.
Em 2006, o Relatório do Fundo publica foto do edifício, como propriedade do Imosocial, revela o “recebimento” do reembolso de IVA de 4,5 milhões de euros, referente à aquisição do Hotel Tivoli Tejo e que se encontrava a ser reclamado desde 2005”. Um ano antes da compra?
O Hotel Tivoli-Expo tem 23 andares foi inaugurado em 2001. Seis anos mais tarde passa pela Conservatória de Freixo de Espada à Cinta. Dois dias depois por Boticas. Quatro anos depois, por Serpa, onde a notária do negócio GES-Imosocial iniciou funções. Seis meses depois, é a vez de Ferreira do Alentejo, onde uma notária das relações da primeira nasceu.
Em 2011, o Hotel Tivoli apareceu no Fundo Imosocial, um dos sete fundos incluídos no Fundo Select do Grupo Mello.
A Câmara não sabia dos 23 pisos? Houve certidão de habitabilidade? E os certificados obrigatórios de segurança?
O Hotel Tivoli-Expo foi um hotel fantasma, com reconhecimento “complexo” por diversos cartórios notariais, e que merecia a atenção de quem deslinda complexos como o juiz Carlos Alexandre. Para que fiquemos esclarecidos.
José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)
N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.
Tenho um lema de vida que raramente me desilude – e que, aliás, se mostra relativamente simples, tanto que pode ser levado à prática por qualquer cidadão menos dado a “bandeiras da vida”: ler o Henrique Raposo no Expresso e fazer o contrário.
Tal como as gaivotas em terra anunciam tempestade no mar, as crónicas do Raposo anunciam um jovem arquitecto Saraiva em potência.
Não falha, por uma vez que seja, esta teoria. Ao fim de quatro frases escritas pelo Henrique Raposo, penso como será o seu contrário, e de imediato dou com o senso comum. É maravilhoso.
Desta vez, juntando-se ao coro do momento, o Henrique questionou como seria possível que os artistas portugueses continuassem a actuar na
Desta vez, juntando-se ao coro do momento, o Henrique questionou como seria possível que os artistas portugueses continuassem a actuar na “Festa do Putin”, nome por ele atribuído à Festa do Avante.
“Festa do Putin”, nome por ele atribuído à Festa do Avante.
Há aqui dois pontos interessantes para análise.
Primeiro, o Avante deixou de ser, desde 2020 pelo menos, um evento que marca a reentré política em Setembro, para passar a ser tópico de discussão entre Maio e o Outono. Ou porque em 2020 e 2021 era um sítio óptimo para apanhar covid-19, ou, em 2022, porque passou a ser a Festa do Putin.
O segundo ponto de análise é que, certo como o destino, quem por norma tenta boicotar o Avante com acusações de apoio a ditaduras, faz, ele próprio, a política de cancelamento e quer promover a anti-democrática censura.
Eu acho isto bastante interessante. O conceito de democracia feito à medida das nossas necessidades.
Mas atenção especial ao ligeiro toque a hipocrisia nas narrativas escolhidas.
Durante anos, longos anos, a União Europeia fez todo o tipo de negócios com a oligarquia russa. A Alemanha, por exemplo, motor europeu, escolheu ser parceira no sector energético enquanto lhes vendiam armas. Quem não se lembra do nosso Sócrates a fazer jogging na Praça Vermelha? Ou do nosso Paulinho das Feiras (Portas) a vender Vistos Gold para cidadãos russos? Ou até, do nosso Cotrim de Figueiredo, presidente do Turismo de Portugal nos idos de 2014, a anunciar a aposta no mercado russo e na atracção de rublos, enquanto o Donbass era invadido por separatistas apoiados por Putin?
Mas… o PCP é que apoia Putin.
Adivinhem lá, quem é que foi contra os Vistos Gold em 2012 – quando PSD/CDS os criaram – e voltou a pedir o seu fim em 2022? Acertaram! Foi o tal PCP, aquele que dizem que apoia Putin, mas não queria dar borlas a cidadãos russos, dois anos antes da invasão do leste ucraniano. Isto há coincidências…
O centrão político português, e alguma direita, andaram com o regime de Putin ao colo. Tal como todos os países da União Europeia. Ou tinham interesse em receber gás e petróleo, ou queriam investimento russo nas suas cidades ou, em última análise, procuravam charters de russos no Verão junto às suas praias.
Durante esse período o regime de Putin calou os chechenos, roubou a Ossétia e Abecássia à Geórgia, invadiu a Crimeia e o Donbass. Ninguém quis saber, business as usual.
Acordaram todos em 2022, a tempo do Avante. Podia ser pior.
Ontem vi Vitorino Salomé a ser interrogado na SIC Notícias pelo “crime” de ir actuar na Festa. A jornalista tentou fazer a mesma pergunta de 10 maneiras diferentes. Vitorino não abanou e disse-lhe: “O Avante sempre esteve aberto a todas as correntes. Eu penso pela minha cabeça, eu sou o meu próprio comité central”.
Mas a moda está lançada. Passou por Dino Santiago, seguem-se as declarações dos Mão Morta e as ameaças à cantora brasileira Bia Ferreira. Tudo em nome da verdadeira democracia e da liberdade de expressão, como se compreenderá.
Depois de embarcar no coro anti-Avante – a tendência da semana –, Henrique Raposo presenteia-nos, portanto, com mais uma brilhante crónica, agora sobre a varíola dos macacos. Diz o vate que, para nos protegermos, devemos afirmar que é uma doença de homossexuais, ou, “paneleirices lá deles” como queria escrever, mas o editor do Expresso não deve ter deixado.
Não falha o Henrique. Nunca. Raposo para um lado, bom senso para o outro.
Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)
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