Categoria: Opinião

  • Carta do advogado do PÁGINA UM ao presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

    Carta do advogado do PÁGINA UM ao presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social


    No âmbito da deliberação ilegal pelo Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social – ao arrepio de todos os preceitos legais, cometendo actos absurdos e lesivos, atropelando a defesa do PÁGINA UM numa queixa contra a liberdade de expressão e o jornalismo feita pela Sociedade Portuguesa de Pneumologia, no decurso de um conjunto de artigos de investigação que levaria à abertura de um processo de contra-ordenação do penumologista António Morais e o seu afastamento de consultor do Infarmed –, decidimos divugar a carta integral do advogado Rui Amores enviada na passada sexta-feira ao regulador.

    Aguardamos serenamente uma resposta, sem prejuízo da tomada de medidas concretas e firmes, do ponto de vista legal, contra os quatro membros do Conselho Regulador, a saber: Sebastião Póvoas, Francisco Azevedo e Silva, Fátima Resende e João Pedro Figueiredo, que, independentemente do enquadramento criminal das suas posturas neste processo, claramente revelaram já não deterem condições éticas e morais para se manterem em cargos desta natureza e relevância num país democrático que constitucionalmente consagra a Liberdade de Imprensa.

    Pedro Almeida Vieira, director do PÁGINA UM


    EX.MO SENHOR
    PRESIDENTE DA ENTIDADE REGULADORA
    PARA A COMUNICAÇÃO SOCIAL

    Rui Amores, advogado com escritório em Portimão, na qualidade de mandatário do requerente, Pedro Almeida Vieira, vem expor e requerer conforme se segue:

    1 – Perante a apresentação de uma queixa por parte da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP) e tendo o nosso constituinte sido notificado dessa queixa no dia 25 de Março de 2022, veio o mesmo apresentar defesa escrita, o que fez dia 05 de Abril de 2022.

    2 – Neste momento processual da apresentação da defesa escrita, o nosso constituinte teve a oportunidade de, para além de se disponibilizar para a audiência de conciliação, requerer o exercício do direito de audiência prévia antes da tomada da decisão final, tal como consagrado nos artigos 121.º e 122.º, ambos do Código de Procedimento Administrativo.

    3 – Ao invés de no decurso do procedimento ser dada possibilidade ao nosso constituinte de ser ouvido previamente à tomada da decisão final, este vê-se confrontado com dois factos, deveras, inusitados, principalmente quando conjugados.

    4 – O primeiro foi a recepção no dia 2 de Agosto de 2022 de uma carta de V.Ex.as com o seguinte conteúdo:

    5 – Mas, mais inusitado foi o facto de o nosso constituinte ter descoberto, no dia 03 de Agosto de 2022, por consulta do processo junto dos vossos serviços, pasme-se, que a deliberação já está tomada. Está escrita, tem data de 13 de julho de 2022 e está assinada por todos os que nela participaram, a saber, Sebastião Póvoas, Francisco Azevedo e Silva, Fátima Resende e João Pedro Figueiredo.

    6 – Perante esta sucessão tão peculiar de acontecimentos / factos naquilo que é a gestão procedimental da queixa feita contra o nosso constituinte, são várias as questões que nos assaltam o espírito e nem todas elas de cariz jurídico.

    7 – Desde logo assalta-nos a necessidade de saber em que fase do processo estamos. Se existe uma deliberação tomada, qual a razão por que está a ser concedido prazo ao nosso constituinte para, em 10 dias, “apresentar documentos e outros elementos que considere pertinentes”.

    8 – Assalta-nos também a necessidade de saber qual dos actos é o acto “faz de conta”, se a deliberação, se a notificação para apresentar documentos e outros elementos que (o visado) considere pertinentes.

    selective focus photography of three books beside opened notebook

    9 – A sequência de acontecimentos deixa-nos igualmente estupefactos com a probabilidade, quase uma certeza, de terem sido violados princípios fundamentais do direito administrativo como são o respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, o princípio da imparcialidade, o princípio da boa-fé e o princípio da participação que nos diz que os particulares têm o direito de participar na formação das decisões que lhes digam respeito.

    10 – Até agora e naquilo que diz respeito à queixa apresentada contra o nosso constituinte e naquilo que são os direitos de defesa, assistimos a uma total violação daqueles princípios, o que não abona em favor dessa entidade que tem como uma das suas atribuições constitucionais “O respeito dos direitos, liberdades e garantias pessoais”, cf. alínea d) do n.º 1 do artigo 39.º da Constituição da República Portuguesa.

    11 – Após consulta do processo o nosso constituinte foi confrontado com uma deliberação que está tomada desde o dia 13 de Julho de 2022. Não é um projecto de decisão. É a decisão final do processo!

    12 – Embora não constituía notificação da decisão, o que é certo é que o nosso constituinte conhece a decisão que vai ser tomada. E perante este conhecimento, o que fazer?

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    13 – Impugnar desde já e, desse modo, trazer ao de cima toda a ilegalidade que constitui este processo e todas as nulidades de que o mesmo padece?

    Ou, em alternativa,

    14 – Compactuar com a farsa que é a notificação do dia 21 de Julho de 2022, já posterior à deliberação e apresentar novos elementos?

    15 – Ou ainda e novamente em alternativa, V.Ex.as darem sem efeito tudo o que foi realizado após apresentação da defesa escrita, no dia 05 de Abril de 2022, agendarem nova audiência de conciliação e, na sequência daquilo que for um projecto de decisão, permitem ao nosso constituinte que se manifeste antes de ser tomada a decisão final, em sede de audiência prévia.

    Ficamos a aguardar a vossa orientação a partir daqui face às ilegalidades que o processo padece até ao momento.

    E.D.

    O advogado

    RUI AMORES

    Mascarenhas, Amores & Associados – Sociedade de Advogados R.L

  • A China e o meu (e talvez o vosso) umbigo

    A China e o meu (e talvez o vosso) umbigo


    Dei por mim a pensar na caldeirada que se está a montar com a China, mas numa perspectiva mais umbiguista. Sim, em determinados momentos da vida, eu sou apenas um gajo prático que tem contas para pagar.

    As sanções à Rússia – vendidas como uma medida para acabar com a guerra – serviram apenas para empobrecer quem estava do lado de cá. A estas seguiram-se os aumentos das taxas de juro e a redução dos salários por cortes directos ou pela via da inflação.

    woman holding tummy

    Pessoalmente, já tinha levado um corte salarial de 5% durante a pandemia (nunca reposto), e agora, por causa do “aumento dos custos causados pela guerra”, levei outro. Ou seja, desde 2020 que trabalho mais mas acabo a vender o meu esforço por menos, sem que o lucro dos meus empregadores se reduza. É uma matemática peculiar que me leva a pensar que estes dois anos e meio de confinamentos e guerras serviram, essencialmente, para reduzir o valor da mão-de-obra.

    Mas não devo generalizar. Aquilo que aconteceu, a mim e demais camaradas da minha área, aqui em Gotemburgo, pode não ser um mal global. Quiçá, a maioria de vós, vai-se a ver, foi aumentado para lá da inflação. Oxalá que sim.

    Mas dizia, estes dois anos e meio serviram, pelo menos, para piorar a qualidade de vida e reduzir o preço a que vendemos o nosso trabalho. No meu caso, isso é particularmente preocupante, porque não tenho, nunca tive, emprego para a vida. Tenho contratos de trabalho de 6 ou 12 meses, que são renovados consoante o meu desempenho e o estado da Economia. Como eu, estão uns quantos milhares ou milhões – não serei certamente o “inventor da roda”.

    Ora, em primeiro lugar, aborrece-me que lutas entre impérios me deixem a fazer contas de cabeça sobre o mês que se avizinha.

    man holding box

    Eu condeno a invasão russa e, de seguida, condeno as medidas cegas impostas pela União Europeia a mando dos Estados Unidos, que, essencialmente, prejudicaram os povos europeus.

    A Rússia, que se financiou na União Europeia durante anos, agora vende para a Ásia; portanto, o negócio segue, e nós, que não temos nada a ver com o Donbass, ficamos a pagar a factura na energia, nos combustíveis, nos salários e na inflação.

    Fosse eu um pouco mais nortenho e mandava o Putin, o Biden, o Zelensky e a von der Leyen para a puta que os pariu, mas, como tudo o que consegui foi um avô de Braga, prefiro conter-me nos impropérios.

    E enquanto vamos todos fazendo uma ginástica monstruosa para compensar as decisões de uma elite milionária que nos dirige, resolvem abrir nova frente com a China, a troco de mais umas vendas aos senhores da guerra.

    No caso da costa oeste sueca, do hub tecnológico que por lá se desenvolve há 10 anos, essencialmente assente em investimento chinês, isto é o prenúncio do apocalipse.

    photo of assorted-color Chinese lanterns inside room

    Pensando assim, de repente, nas empresas chinesas ou com capital chinês que operam em Gotemburgo, conto mais de 20 mil empregos, estando outras a chegar à região e a construir centros de desenvolvimento.

    A última coisa que quero é passar os próximos anos a repetir 2020 ou 2022, porque uma cambada de velhos ricos querem brincar às cortinas de ferro com vidas humanas e abarbatar mais uns hectares de matérias-primas. Se os chineses em vez de construírem centros de engenharia e pontes em África, começarem a produzir tanques e bazucas para responder ao chamamento dos americanos, passaremos todos a ter problemas bem maiores do que ouvir o Froes a gritar por mais vacinas ou o Milhazes a ensaiar as narrativas dos 40 anos de solidão.

    Reparem, aliás, no detalhe das crises. Não as vivemos todos da mesma forma. Na Alemanha, os sindicatos paralisam tudo e exigem aumentos acima da inflação – vejam a Lufthansa, por exemplo. E isto num país onde o corte de energia da Rússia está a deixar a indústria em risco. Mesmo assim, os trabalhadores são a voz mais forte. Nós, em Portugal, vamos apenas perdendo direitos, salários e condições de vida. Vamo-nos acomodando às sobras. Portanto, não estamos, nem nunca estivemos, todos no mesmo barco.

    Mas se é para rebentar tudo, e largarmos os empregos e as vidas ditas normais, em nome do Apocalipse, então, se não se importam, eu gostava de decidir com quem quero ser solidário. A quem quero oferecer o esforço de ter que abdicar da vida pela qual trabalhei.

    brown wooden dock on body of water during daytime

    Escolheria que fôssemos bater às portas dos israelitas e mostrássemos a nossa solidariedade para com os palestinianos. Depois seguíamos a mesma estrada de pó e íamos dar uma mão aos curdos para se ver se lhes arranjávamos umas fronteiras.

    Agora, para quem Taiwan fornece os chips, se a Rússia fica com a península que outrora deu como presente, ou se o gás do banho dos alemães vem pelo Nord Stream ou em barcos enviados de Boston, interessa-me muito pouco.

    Em resumo, se pudessem parar de matar gente em nome dos interesses financeiros de uma elite – e, pelo caminho, arrefecer essa sede de nos irem ao bolso –, já não ficaria a faltar tudo.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A água de Almaraz

    A água de Almaraz


    Uma parte da água que Lisboa bebe todos os dias também serviu para arrefecer os reactores da central nuclear espanhola de Almaraz. Há mais de 40 anos.

    Pior, os reactores dessa central já deviam estar desligados porque ultrapassaram o prazo de vida segura.

    As gigantescas turbinas de Almaraz fornecem 10% da electricidade de Espanha. E pertencem agora a um consórcio de três empresas: Iberdrola, Endesa e Naturgy.

    Os políticos ignoram Almaraz. E os jornalistas também não pegam no assunto, porque a central fica em Cáceres, longe das portas das redacções e os orçamentos são muito curtos.

    Em rigor, 75 % da água que Lisboa bebe vem da barragem de Castelo do Bode, onde se anda de barco e se toma banho. Os restantes 25% vêm da captação em pleno rio Tejo, em Valada. Está tudo explicado no site da EPAL.

    A água que chega a Valada, veio de Almaraz, e passou também pelas fábricas de celulose e pelos vinhedos e lagares de azeite da Beira Baixa e Ribatejo.

    A EPAL garante que é boa água depois de tratada, mas não se sabe se tem teste de radioactividade.

    Em Almaraz tem havido pequenos acidentes e avarias.

    Não parece prudente arrefecer centrais nucleares com água que depois se vai beber.

    Um dia, a meio da noite, acordamos com a cabeça transformada numa lâmpada de 25 watts.

    Ou nem acordamos…

    José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Nós?! Somos mesmo nós os responsáveis?

    Nós?! Somos mesmo nós os responsáveis?


    Durante dois anos, António Costa e Marta Temido implementaram em Portugal medidas sem base científica, moralmente inaceitáveis e irresponsáveis, constitucionalmente reprováveis e censuráveis, mas que estão, ainda assim e mesmo assim, a dar gordos lucros a empresas, indústrias, e a consultores, médicos, académicos e “especialistas”.

    Fizeram-no na função de cúmplices de uma Comissão Europeia que traiu os europeus e a Europa. Os resultados das medidas estão à vista nos óbitos e nas doenças, sobretudo dos mais vulneráveis, e na Economia e poder de compra dos portugueses.

    silhouette of woman holding rosary while praying

    Agora, com a ajuda de alguns órgãos de comunicação social, está em curso nova “lavagem cerebral” aos portugueses: convencê-los de que a crise na Saúde é um “falhanço” da sociedade. De todos nós. Como se fôssemos TODOS responsáveis pelas mortes. Pois. Não e não! Não somos!

    Nos meses mais recentes, os media andaram, em geral, a assobiar para o lado enquanto o PÁGINA UM denunciava problemas e deficiências no Serviço Nacional de Saúde (SNS) e no excesso de mortalidade por todas as causas. Mais de 10.000 mortos meses e meses seguidos. Nove, para ser mais precisa. Três recordes absolutos nos últimos três meses: Maio, Junho e Julho.

    Sem nunca citar o PÁGINA UM, lá alguns media começaram a pegar no tema, mas procurando seguir as explicações “oficiais”, falando em “ondas de calor” e dando a palavra a “especialistas”, que nunca falavam em números com base científica para justificar as suas “teses”, e fingindo que não sabiam do desaparecimento de dados públicos, denunciados pelo PÁGINA UM.

    Os óbitos em excesso exigem uma investigação imediata e urgente do Ministério Público. E não. Não foram apenas as ondas de calor, a covid e a “long covid” a explicar tudo. E se tiverem sido, que fique provado. Com dados e factos apurados de forma independente. A investigação é inadiável e necessária para se saber como travar esta onda de mortes e para apurar responsáveis pela situação.

    [Aliás, sobre a “long covid”, chamo a atenção à campanha institucional a nível europeu que está em curso e que se vai intensificar nos próximos meses. Existe o grave risco de a “long covid” ser usada pelos gabinetes de comunicação para justificar muitos problemas de saúde dos europeus e crise na saúde em Portugal. Convém ter a abertura para estudar todas as hipóteses. E não meter culpas logo na hipótese mais “conveniente”. Há que exigir provas e estudos independentes.]

    Esta tendência, para “a culpa é de todos”, não é nova. Tem sido aliás uma linha ideológica em voga baseada na “culpa” e no “pecado”, muito da cultura católica, para exigir expiação, submissão e punição. Uma ideologia assente, por outro lado, na desresponsabilização daqueles que são os verdadeiros responsáveis, porque se assumem como sentenciadores e repressores de todos, de todos nós, os “culpados”.

    Aconteceu na pandemia, com a culpa sobre as crianças, jovens, pessoas sem vacina… por serem os grandes “transmissores” do vírus. Mentiras constantemente transmitidas, que se inculcaram na mente das pessoas como verdades.

    Mitos, como demonstrou a Ciência – a verdadeira, não a “nova ciência” feita religião, baseada na crença da sapiência da “nova trindade” formada por farmacêuticas, governos e media.

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    Está em vias de acontecer com as alterações climáticas, com a dupla Governos e indústrias a espalharem a mensagem de que, mais uma vez, a culpa é sobretudo de todos nós e do nosso modo de vida.

    Como se as alterações climáticas não tivessem nada a ver com as políticas e o conluio de governos e empresas poluentes, ao longo de décadas e décadas, em detrimento do ambiente, da saúde e do bem-estar das populações.

    Também acontece com os aumentos dos preços dos bens e da energia – e a consequente redução dramática do poder de compra dos portugueses (dos europeus) – que são hoje vendidos como sendo sobretudo “culpa do Putin”.

    Putin é como as ondas de calor, a “long covid” e as alterações climáticas: todos são parte do problema, mas estão também todos a servir para branquear os verdadeiros responsáveis pelas graves crises sanitária, energética e económica que atravessamos. E assim se escapam os decisores políticos, os que implementam medidas e fazem leis, e agem.

    No caso da crise na saúde dos portugueses e nos aumentos dos preços, dois anos de medidas absurdas e irresponsáveis para “combater” a pandemia estão a mostrar os seus reais efeitos.

    E não. Não tiveram efeito a diminuir a epidemia. Aliás, os países com mais confinamentos e violações dos direitos humanos e civis – como a Austrália e a Nova Zelândia – estão agora a sentir os efeitos das suas políticas desastrosas. Tal como Portugal.

    woman inside laboratory

    Na crise da energia, quem decidiu aplicar medidas – como sanções à Rússia – que, obviamente, prejudicam gravemente os cidadãos europeus?

    Que haja campanhas de lavagem de imagem por políticos – e seus gabinetes de comunicação, de propaganda e “gestão de crise” pagos pelos contribuintes –, sabemos que é normal. E até expectável, embora seja uma prática própria de uma política doentia e tóxica.

    Agora, que haja órgãos de comunicação social a ajudar nesta “lavagem de imagem” e no branqueamento de responsabilidades, é simplesmente inaceitável. Inconcebível. Inadmissível. E também, por tudo isso, uma grave violação dos deveres de qualquer jornalista.

    Querem convencer-nos agora que “somos todos” – que é “A SOCIEDADE” – os responsáveis pelos que morrem. Que temos de ser TODOS a pagar pela crise energética. Sermos “agentes de poupança energética”, até metermo-nos na vida dos vizinhos – sermos “bufos” – como se fez durante a pandemia para sermos todos “agentes de saúde pública”.

    Querem convencer-nos agora que teremos TODOS (mais uma vez) de “obedecer” a medidas “excecionais” e de emergência, sob a ameaça de pagarmos multas. Onde já vimos isto?

    group of person walking on road

    Mas o que acontece a quem decidiu medidas e exigiu seguir caminhos irresponsáveis, e agora lava as mãos? A quem colaborou, apoiou, aplaudiu as medidas, quem aceitou ser “agente de saúde pública”? A quem apoiou medidas de segregação e discriminação? A quem entrou na propaganda infantil de que “tudo e mais um par de botas” é culpa da guerra na Ucrânia e de Putin?

    Cabe-nos a todos estar atentos e exigir que a verdade seja apurada e os verdadeiros responsáveis sejam responsabilizados. Tanto pela crise na saúde, pelos mortos, pela crise energética, pela crise económica e o aumento dos preços. Cabe-nos exigir que se apure a verdade para se conseguirem adotar medidas para travar mais mortes. Para impedir que governos e (ir)responsáveis políticos arrastem os europeus e a Europa para uma crise profunda.

    Para isso, sim, é nossa a responsabilidade. Não fiquemos à espera que os media em geral – cativos de interesses e reféns de ‘parcerias comerciais’ – o façam por todos nós. Não. Não o irão fazer. Não irão pedir investigações independentes às mortes, nem clamar pelo Ministério Público.

    Temos de ser nós, os cidadãos. A pedir responsabilidades comprovadas e baseadas em factos. A garantir que a História dos últimos dois anos não será branqueada. A assegurar que o que tem acontecido desde 2020 não será alvo de esquecimento. A exigir justiça para os que têm morrido. A impedir que, sob o pretexto de uma crise energética e económica, se eliminem ainda mais direitos civis, se rasgue mais uma ou duas páginas da Constituição e se coloque mais uma pá de terra sobre a Democracia.

    Cabe-nos a todos rejeitar mais ameaças, mais multas, mais leis de “exceção”, mais medidas “temporárias”, que, a pretexto de uma crise energética, visam enfraquecer a Democracia e subjugar a população ao poder político e económico, enquanto as grandes empresas e o Estado lucram como nunca.

    Todos devemos procurar gerir bem os recursos de que dispomos – da água à energia. Todos devemos atuar na prevenção da transmissão de todo o tipo de doenças contagiosas. Mas não é isso que está em causa, mais uma vez.

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    No próximo Outono/Inverno, ao regresso eventual de medidas ineficazes sob o pretexto de “combate” à pandemia, vai somar-se um novo condicionamento psicológico e social em torno da poupança energética. Abriu-se a caixa de Pandora e – entre vírus e crises variadas – a sede por subjugar a população e instalar uma ditadura apresenta hoje ventos favoráveis.

    Temos um caminho pela frente, até porque foram implementadas, desde 2020, leis e tratados internacionais perigosos e que, obviamente, terão de ser revertidos por atentarem contra a Constituição, a Democracia e a soberania do país.

    E o caminho começa já.

    Por exigir que estes 10.000 óbitos mensais não fiquem sem responsáveis verdadeiros.

    Por garantir que não haverá mais atropelos à verdade dos factos nem manipulação da opinião pública. Não no nosso “turno”. Não na nossa vez de “escrever a História”.

    Por isso, sim, por garantir isto, somos todos responsáveis. Todos mesmo. Mesmo os que foram colaboradores da ditadura sanitária insana que nos trouxe até aqui.

  • Da Suécia, com amor. De Portugal, com estupor

    Da Suécia, com amor. De Portugal, com estupor


    Desde o início da pandemia, a Suécia foi eleita pelos media do mundo ocidental como o “patinho feito”, indiciado como o “cisne negro” desumano e frio, que permitiu, na primeira fase da pandemia – com um acréscimo inicial de mortes –, consolidar a narrativa da eficácia de medidas restritivas draconianas, independentemente da sua cientificidade.

    O populismo e o alarmismo – e acrescento agora a hipocrisia – “crucificaram” no pelourinho público uma verdadeira estratégia de Saúde Pública. Recordo aqui as palavras de Ann Linde, a ainda ministra dos Negócios Estrangeiros deste país nórdico, em Maio de 2020: “Isto não é um sprint; é uma maratona”.

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    Mas pouco importou. A despeito da existência de problemas iniciais nos seus lares – que, na verdade, se evidenciaram porque existe uma cultura de transparência e responsabilização; aqui em Portugal simplesmente esconde-se –, a estratégia da Suécia sempre foi olhada com desdém pelos políticos e media ocidentais. Quem, em Portugal ou fora da Suécia, concordasse com as estratégias daquele país nórdico era rotulada de negacionista, egoísta e desumano.

    E qual era essa estratégia? Recuperemos as palavras da ministra sueca: “[A nossa estratégia] baseia-se numa perspectiva de longo prazo sobre como podemos salvar vidas, proteger o nosso sistema de saúde e garantir que nossa sociedade e a população saiam o mais ilesas possível”.

    Um dia a História demonstrará, por certo, os erros e os crimes (por negligência ou intencionalidade, por razões políticas e de negócio) que se foram cometendo desde 2020, e que estão a resultar naquilo que certa imprensa nacional diz ser um mero “falhanço da sociedade”, e ainda por cima “de todos”, como diz uma notícia de hoje do Expresso.

    apple fruit with plastic syringes

    Não é de todos, não. É de alguns. É dos políticos. É das políticas. É de certa (quase toda a) comunicação social que, há dois anos, vilipendiava a desumana Suécia ao mesmo tempo que patrioticamente cantava hosanas ao “milagre português” entronizado por Marcelo Rebelo de Sousa na Primavera de 2020.

    Em Portugal, nunca se pensou no médio prazo nem no longo prazo, nem de como sairíamos disto depois disto acabar [se calhar, não se quer formalmente acabar para evitar “fazer contas”]. Pensou-se no dia-a-dia, no “salvar o coiro”, no encontrar “bodes expiatórios” (o frio, o calor, o próprio vírus, os não-vacinados; os irresponsáveis em geral) em vez de implementar soluções.

    Pessoalmente, não me surpreende agora, mais de dois anos após o anúncio da pandemia – com o SARS-CoV-2 perfeitamente em estado endémico –, o estado em que estamos na “maratona” falada pela ministra sueca.

    Nove meses consecutivos de mortalidade sempre acima dos 10 mil óbitos. Recordes absolutos no número de óbitos em Maio, Junho e Julho.

    E nem me surpreende já o modo impávido e sereno como se assiste a um gerontocídio sem precedentes, bem pior do que o do ano passado. O Governo esconde vergonhosamente dados; luta no Tribunal Administrativo – com toda a sua máquina jurídica e as suas tentaculares ligações – para não ser obrigado a revelar informação comprometedora.

    E a Suécia? A Suécia, ora, ora, esse país hasteado como exemplo da desumanidade e do egoísmo.

    Sim, e a Suécia? Sim, a Suécia, minhas senhoras e meus senhores? A Suécia, senhores políticos… A Suécia, meus camaradas jornalistas? Como vai a Suécia, nesta maratona?

    people sitting on bench near brown concrete building during daytime

    Regressou à normalidade. Mortalidade total perfeitamente em linha – e por vezes mesmo abaixo dos níveis da pré-pandemia, e sem todas as consequências sociais, económicas e de Saúde Pública que países como Portugal estão e estarão a sofrer.

    No gráfico que aqui apresento, produzido através de dados oficiais tanto de Portugal como da Suécia, comprova-se as consequências no nosso país das péssimas políticas de Saúde Pública e os efeitos de uma comunicação social que as apoiou acriticamente. Dois anos depois, quando a covid-19 apresenta já uma taxa de letalidade ao nível da gripe, e quando tudo já deveria estar normalizado, Portugal apresenta, desde finais de Fevereiro deste ano, um aterrador excesso de mortalidade acima do período pré-pandemia (2015-2019).

    A partir de Maio, esse excesso esteve quase sempre acima de 20%, e quando o tempo ficou mais quente supero os 40% e mesmo os 50%.

    Variação (défice ou excesso, em média móvel de sete dias), em percentagem, da mortalidade diária em 2022 face ao período pré-pandemia (2015-2019) em Portugal e na Suécia. Fonte: SICO (Portugal); SCB (Suécia)

    [Aliás, sobre as ondas de calor: obviamente estas causam um acréscimo de mortalidade (se não forem tomadas medidas de proteção), mas o factor mais determinante acaba por ser o estado de maior ou menor vulnerabilidade das pessoas; por exemplo, se eu aumentar a pressão sobre um ferro, ele pode manter-se “impávido”; mas se em vez do ferro houver um frágil pedaço de madeira, este pode quebrar com o aumento da pressão]

    E agora, vai “ficar tudo bem”? Está tudo bem? Vai-se continuar a culpar a guerra da Ucrânia, as alterações climáticas, o infortúnio? Ninguém se preocupa com o obscurantismo do Governo? Nem com a inércia da Procuradoria-Geral da República? Nem com a tentativa de descredibilização perpetrada pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social contra o jornalismo independente que denuncia que o “rei vai nu”?

    Vai-se continuar a chamar estupores aos suecos, enquanto se glorifica o país do senhor Gouveia e Melo para quem todas as vidas contavam, mas que, afinal, as deixa partir que nem tordos?

    Para onde deve ir o nosso amor e o nosso estupor?

  • Prostituída e violada, mas generosa

    Prostituída e violada, mas generosa


    O nosso planeta – a Terra Mãe – atingiu um estado irreversível.

    Falhámos como sociedade e, como se não bastasse, permitimos a mentira, aceitamos que nos escondam verdades e envolvemo-nos conscientemente em orquestrações prejudiciais, das quais nos tornamos cúmplices.

    Possuir parece ser razão de prazer que justifica a luta de uma vida inteira – possuir terra, casas, carros, árvores, empresas, dinheiro, roupa, pessoas.

    outer space photography of earth

    Ao deter o olhar no passado, facilmente percebemos que não fomos capazes de viver ao sabor do natural, perfeitamente integrados na Natureza, razão pela qual acabámos por moldar tudo o que nos rodeia à nossa medida. Em nome da prosperidade, do progresso, da evolução, das ideias e ideais que prometiam a edificação de um mundo melhor, destruímos e transformámos a Terra num lugar pior.

    Fomos e somos descarados.

    Pode ser que se viva, hoje, melhor do que noutros tempos: habitam-se casas mais confortáveis, vive-se em espaços mais limpos, tem-se mais medicamentos disponíveis, tem-se cada vez mais tempo. Mas, estas evidências nunca estiveram ao alcance de todos.

    large tree in middle of forest during daytime

    Hoje, nesta Era Global, tudo tem impacto à escala mundial e, por essa razão, lutamos por direitos universais, viajamos e conhecemos todos os cantos da Terra, chegamos a todo o lado, estamos em toda a parte. Sentimo-nos omnipresentes, omniscientes e omnipotentes. Todavia, estamos conscientes de que trouxemos o nosso planeta a um estado de exaustão inqualificável.

    A nossa Mãe Natureza, que tudo nos deu – até a inteligência –, esperava certamente mais de nós, muito mais. Mais amor, mais respeito, mais dedicação.

    Estamos a prostituí-la, estamos a violá-la até às entranhas. As inundações a que assistimos são fruto das suas lágrimas de dor. As tempestades e os terramotos são gritos e espasmos amargurados de tanto sofrimento. As altas temperaturas e os incêndios nada mais são do que a cólera de um corpo quente, suado, saturado e doente, inflamado, vilipendiado…

    blue and gray rolling chair

    Chegámos ao fim de um mundo. Estamos prestes a acabar. Por tua culpa. Por minha culpa. Por nossa culpa. Chegámos ao aparente fracasso das religiões, das filosofias, da política, da educação. Este podia ser o momento de ressurgir, mas não queremos.

    Peço, por isso, desculpa aos meus filhos e a todas as crianças que jamais conhecerão aquilo que um dia eu conheci. Se o ser humano é capaz do melhor e do pior, resta-nos acreditar nas crianças, acreditar que sejam capazes de fazer bem melhor do que nós.

    No entanto, para a nova geração, deixou de existir o direito à liberdade de cuidar ou não do nosso planeta. Ficou o dever, por isso temo que tão cedo ninguém volte a ser livre.

  • O porteiro da Secreta dorme em serviço

    O porteiro da Secreta dorme em serviço


    A recente venda de milhares de imóveis do Novo Banco ao desbarato continua a deixar uma interrogação sobre a utilidade dos serviços secretos portugueses.

    O SIS nasceu com uma mãozinha do MI-5 inglês e da Mossad israelita, e é uma agência muito considerada internacionalmente. Não é um organismo policial. Assim como o “Caso BES” também não é um caso de polícia.

    Os negócios do Novo Banco têm deixado boquiabertos milhares de portugueses, que não conseguem pagar as rendas ou as prestações das suas casas.

    person holding white and red card

    Mas nada se sabe dos esforços das secretas, nada se sabe dos esforços para desvendar o rasto dos muitos mil milhões de euros desaparecidos.

    Dizia-me um juiz que é apenas uma questão de vontade política!

    O sector bancário tornou-se opaco. Tem custado rios de suor aos portugueses. Trabalha-se mais horas e paga-se mais impostos para assim tapar buracos financeiros.

    O património do Novo Banco foi vendido, segundo consta, a um accionista… do Novo Banco (um fundo de pensões americano), que pediu parte do crédito ao… Novo Banco. Bonito!

    Têm-se afirmado que não se sabe bem quem são os verdadeiros accionistas do tal fundo americano.

    person using magnifying glass enlarging the appearance of his nose and sunglasses

    Em boa verdade, não há Governo que tome decisões difíceis sem ouvir os “zunzuns” do Conselho de Segurança. Em Portugal, nessa mesa, sentam-se a GNR, Polícia Judiciária, PSP, SEF e, obviamente, o SIEDM (Serviço de Informações Estratégicas e Defesa) e o SIS (Serviço de Informações e Segurança).

    Os serviços secretos podem não ter abordado o assunto com clareza na reunião, mas o director do SIS já terá esclarecido o primeiro-ministro.

    As relações económicas são, desde há muito, o verdadeiro objectivo das secretas em todo o Mundo. Paulo Portas foi até mais longe. Pediu aos diplomatas para serem “antenas” de Portugal em qualquer país onde metessem os pés.

    A Economia escapou ao controle político em todo o Mundo, mas não escapa ao controle da comunidade das secretas.

    O mundo inteiro está sobre escuta. Nos telefones, SMS e Internet.

    white and black water pipe

    O gigantesco big-wacth tem até um nome: Echelon. Uma rede de vigilância global operada pelos signatários do Tratado de Segurança UK-USA.

    Há mais de 10 anos, o antigo eurodeputado Carlos Pimenta fez perguntas sobre o Echelon. Sem se perceber porquê.

    Eles sabem tudo. Escutam todos.

    E se disserem que não, a culpa será do porteiro do SIS, apanhado a dormir em serviço.

    José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • O Mário amuou…

    O Mário amuou…


    Mário Ferreira amuou e já não quer os 40 milhões do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Disse, numa declaração à imprensa, que a campanha levada a cabo por Catarina Martins e Ana Gomes tinha sido indecente. Embora nenhuma delas seja a fiel destinatária do meu voto, o que fizeram, em especial Catarina Martins, foi perguntar aquilo que qualquer um de nós, se tivesse voz pública, perguntaria.

    Ora, a empresa de Mário Ferreira garante agora que irá fazer o aumento de capital com fundos próprios em vez de recorrer ao empréstimo do PRR. A verdadeira questão é então: porque não o fez logo de início?

    Por que razão decide um milionário gastar 28 milhões para ir 11 minutos ao espaço e depois recorre, sem qualquer pejo ou vergonha, a um empréstimo estatal de 40 milhões para financiar a sua empresa? A resposta é simples: porque pode.

    Em Portugal, o risco do empreendedorismo é um mito. Histórias como a de Mário Ferreira, os empresários que estão sempre no sítio certo e desde sempre com os contactos certos, vão-se repetindo e raramente descobrindo. Não há nada ilegal, é o argumento repetido. Mas não precisa de ser ilegal para ser imoral.

    Tal como nos negócios do BES, sobre os quais Salgado diz não se recordar.

    O lucro foi sempre privado, o prejuízo sempre público. Luís Filipe Vieira terá sido o caso mais emblemático. Contraía empréstimos monstruosos, construía prédios e vendia os apartamentos. Beneficiava da especulação imobiliária e do acesso fácil ao dinheiro do BES para enriquecer ou, nas palavras dele, para ser um “homem que subiu a pulso”.

    No dia em que tudo rebentou, a dívida foi dividida por 10 milhões de pessoas. Um daqueles jantares em que, comendo sardinha ou bifanas, todos pagámos lagosta.

    É esta a essência portuguesa dos milionários do regime: o acesso a fundos que o comum dos cidadãos não tem. Se o BES me emprestasse 500 milhões, como fez ao Vieira, mesmo sem ter uma construtora, julgo que também o conseguia multiplicar. Sem sair de Lisboa, diga-se.

    Interessa-me pouco que Mário Ferreira concorra a apoios públicos. Aliás, até percebo que o faça. Quem é que quer arriscar dinheiro do seu bolso quando pode usar o que é de todos?

    Preocupa-me, isso sim, que a tão afamada comissão que ia controlar o destino dos dinheiros da bazuca, ache normal dar metade do orçamento previsto para o turismo a um só empresário, que, por acaso, tinha esses fundos em capital próprio.

    Se não fosse o escândalo da viagem ao espaço e toda a celeuma pública, Mário Ferreira teria embolsado tranquilamente um empréstimo estatal, deixando várias pequenas e médias empresas sem nada.

    Como é que isto acontece, quem é que controla os dinheiros da bazuca, como é que é possível que este empréstimo tivesse sequer sido aprovado e por que admirável coincidência o grosso dos dinheiros públicos aparecem sempre na órbita de empresários amigos?

    Bem sei, perguntas que jamais serão respondidas enquanto os governos se alternarem na distribuição dos fundos.

    A sociedade civil fez barulho, e Catarina Martins capitalizou-o. E fez bem, acrescente-se. O problema português nunca foi a falta de dinheiro, mas sim a forma como este é canalizado. Ao fim de 30 anos de subsídios europeus (ou empréstimos), continuamos a usar esses rios dourados para enriquecer uma pequena elite e alimentar uma clientela fixa, enquanto o português médio continua pobre. O salário médio em Portugal é um salário miserável à escala da Europa que se encaixa no Primeiro Mundo. Repito: o salário é miserável.

    people holding shoulders sitting on wall

    Enquanto isso, os Mários Ferreiras, bem colocados, vão usando os milhões próprios para brincarem aos Bezos, e o Estado, com dinheiro de todos nós, vai alimentando as suas empresas.

    Resta-nos desejar boa viagem ao Mário e rezar pelos sucessos da Douro Azul. Tanto está garantida a magia dos 11 minutos que aguardam o Mário no espaço como é elevada a probabilidade de nos chamarem a pagar quando a coisa descambar.

    Cada um nasce para o que nasce. Estudassem – ou tivessem andado na jotinha certa.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)

    P.S. Senti alguma vergonha alheia quando ouvi Mário Ferreira a dizer que todos os portugueses deviam ter orgulho nele. Pergunto…porquê? Por ser um utlizador da tecnologia desenvolvida por outros? Por ser um turista de luxo num tipo de “charter” aberto apenas a uma pequena elite? Por pagar para andar? Ou por ter a sua própria televisão a cobrir o “feito”?

    Só existe em todo aquele processo um “feito” e esse foi conseguido pelas equipas de engenharia que desenvolveram os foguetões. De resto, são apenas recursos e mais recursos gastos por uma elite de milionários, em viagens absolutamente insignificantes, e pagas a um preço que nos deveria envergonhar: há crianças ainda a morrerem à fome no Planeta que, durante 10 minutos, os Mários vão observar ao longe.

    E sim, o dinheiro é dele, faz o que quiser e até o pode gastar a acender charutos, que a ninguém diz respeito. Desde que seja, de facto, dinheiro dele e não sacado ao erário público, é-me absolutamente indiferente. Mas por amor da santa, endeusar um gajo que pagou para andar num carrossel de luxo e comparar a “epopeia” à do Fernão de Magalhães, está ao nível daquele orgulho luso, apenas porque, nos jardins da Casa Branca, os Obama passeavam um cão de água português.


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Uma Lisboa dividida em duas

    Uma Lisboa dividida em duas


    O actual ministro das Finanças, Fernando Medina, deixou uma Lisboa dividida entre ricos e remediados. Não interessa se ele é socialista ou não. Carmona Rodrigues já tinha pré-anunciado o mesmo quando fez futurologia sobre as bicicletas em Lisboa.

    Carmona Rodrigues era então presidente da Câmara de Lisboa, e eu, repórter, perguntei: “E então o senhor passa a vir de bicicleta para o seu gabinete, aqui, na Praça do Município, a subir e a descer? “

    A resposta foi um “rtahtfdrts” – uma coisa incompreensível, como seria de esperar.

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    Há hoje duas Lisboas: as que têm estacionamento para residentes e as que não têm. O estacionamento reservado a residentes concentra-se nas zonas mais endinheiradas: nas Avenidas Novas ou no Bairro Azul, e parece feito para enxotar os remediados. Já no Bairro dos Olivais, o estacionamento é para quem o apanhar. E o local é igualmente concorrido, por exemplo, a volta do shopping Spacio.

    Foi por coisas destas – e pela Margarida da Abraço, que fazia compras de uma forma muito especial – que Fernando Medina perdeu as eleições em Lisboa… depois de andar a estreitar todas as ruas e a ajardinar quase apenas o eixo principal Restauradores-Entrecampos.

    Entretanto, na Avenida Defensores de Chaves duplicou a ciclovia que já existia, em paralelo, na Avenida da República. E não contente, espetou-se com um estacionamento para residentes numa artéria com prédios em ruínas e semi-habitada.

    Essa é uma das muitas ratoeiras que se espalhou pela cidade.

    Os automobilistas chegam, têm o imposto de circulação em dia, estacionam o veículo, pagam o talão de parqueamento e… zás!, não repararam que a placa central é para residentes… que escasseiam.

    São “paletes” de lisboetas a cair nestas ratoeiras.

    E mais. A muito odiada EMEL explica-me que os estacionamentos e a sua marcação são da inteira responsabilidade da Câmara de Lisboa.

    Bonito! Vamos ver, como tratará as mordomias de trânsito, Carlos Moedas, que já foi eleito há quase um ano.

    José Ramos e Ramos é jornalista (CP 214)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Um pantanal chamado ERC, ou a podridão só tem uma solução: a demissão

    Um pantanal chamado ERC, ou a podridão só tem uma solução: a demissão


    Em inglês chama-se SLAPP – acrónimo, que faz lembrar estalo (slap), para Strategic Lawsuit Against Public Participation. Consiste em processos de intimidação, perseguição e silenciamento, quase sempre recorrendo a processos judiciais ou similares, não apenas para desacreditar vozes independentes como para lhes causar danos patrimoniais.

    Esta estratégia, muito em voga em diversos países, teve já em Portugal um infeliz momento, quando o então presidente (de “má memória”) do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento, moveu mundos e fundos (públicos) para levar à condenação do então director do Público, José Manuel Fernandes, por um artigo de opinião em 2006. A República Portuguesa acabaria condenada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por esta decisão que teve contornos kafkianos e pouco abonatórios de um país que defende a liberdade de imprensa na sua Constituição.

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    Ora, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) parece querer agora introduzir um novo patamar no SLAPP lusitano, predispondo-se a ser uma “plataforma” para silenciar, desacreditar e intimidar vozes independentes e incómodas do jornalismo português.

    Para resumir: como se sabe, a ERC aceitou em Abril passado uma queixa do senhor António Morais, circunstancialmente presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), por o PÁGINA UM ter publicado diversos artigos de investigação sobre a promiscuidade desta associação perante os interesses das farmacêuticas durante a pandemia. Dados públicos, exactos. Tentativa de ter contraditório, foi feita; impossível por a SPP se ter sempre recusado a dar informações.

    O senhor António Morais, circunstancialmente presidente da SPP, escreveu mesmo que os artigos do PÁGINA UM tinham “consequências [negativas] para a Saúde Pública“.

    Na verdade, as consequências eram apenas para o senhor António Morais e seus apaniguados.

    António Morais, ao centro, numa foto durante a cerimónia de posse como presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia em Janeiro de 2019. Investigação do PÁGINA UM levou à sua saída de consultor do Infarmed e à abertura de um processo de contra-ordenação, mas a Entidade Reguladora para a Comunicação Social aprestou-se para uma “farsa” em seu apoio.

    De facto, no mais puro e nobre jornalismo de investigação e de denúncia – em qualquer lado democrático –, as notícias do PÁGINA UM tiveram consequências, mas mais ao nível da “limpeza ético-atmosférica”: o senhor António Morais está a ser alvo de um processo de contra-ordenação, depois de um processo prévio de averiguação, pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde, e foi entretanto “chutado” por evidentes incompatibilidades pelo Infarmed como consultor.

    Basicamente, o senhor António Morais – que, entretanto, por exemplo, andou a fazer publicidade ao Paxlovid, da farmacêutica Pfizer – só podia ser simultaneamente consultor de um organismo público e presidente da SPP se esta última entidade recebesse menos de 50 mil euros por ano das farmacêuticas. A SPP recebeu mais de 800 mil no último quinquénio. No ano passado recebeu 1,3 milhões de euros do sector do medicamento. Havia dinheiro a rodos; os leitores poderiam tirar as suas conclusões; é esta a função essencial do jornalismo.

    Mas, SLAPP:  a ERC – já muito incomodada pelas questões que o PÁGINA UM lhe tem andado a colocar – decidiu fabricar uma farsa e arranjar para si o papel principal: farsante, travestindo-se de regulador para vir em defesa da carcomida honra de certos respeitáveis senhores doutores.

    Por aceitar a queixa da SPP? Não. Ora essa! Por quem sois!

    Ofício da ERC com a notificação, no âmbito de audiência prévia, para juntar elementos a um processo que, afinal, estava já concluído.

    Pode a ERC sempre aceitar queixas, embora tenha o dever de as analisar previamente, e definir de forma clara uma acusação (ou um arquivamento), e não simplesmente solicitar uma defesa obrigatória, sem a qual (segundo os seus absurdos Estatutos) se está perante uma assumpção da culpa (é mesmo assim).

    Ou seja, a ERC tem a obrigação de proteger os bons cidadãos da má imprensa, mas deve proteger também a boa imprensa dos maus cidadãos. Caso contrário está-se perante o consumo de recursos (tempo e dinheiro) em sucessivas defesas de obtusas acusações. E, nessa medida, um verdadeiro regulador da comunicação social deveria ser, de igual modo, um instrumento para contrariar a estratégia do SLAPP.

    Ora, mas onde está então a farsa encenada pela ERC? Está em ter composto um processo falsamente justo e imparcial, que, por tão mal engendrado, acaba por ser mais triste do que trágico.

    Na passada terça-feira, dia 2 de Agosto, mais de três meses após a instauração do processo, recebi um ofício da ERC com um convite para ir às suas instalações no “prazo de 10 (dez) dias úteis contados a partir do dia seguinte ao dia de recepção da presente notificação para, querendo, vir ao processo apresentar documentos e outros elementos que considere pertinentes”.

    E lá fui eu, diligente, à ERC no dia 3 de Agosto, ontem, portanto.

    E o que vi?

    Primeiro, uma dificuldade inicial para consultar o processo, que apenas se desbloqueou quando comecei a manuscrever uma exposição de protesto.

    Depois, lá tendo conseguido que o processo ficasse disponível, abriu-se o pano para uma má peça de teatro – por maus actores.

    Assim, ao longo de 134 páginas, em vez de surgir no final um projecto de deliberação – que basicamente poderia ser contestado com depoimento, acréscimo de documentação ou mesmo indicação de testemunhas –, encontrava-se, hélas, já devidamente assinada na página final e rubricada em todas as outras, por todos os membros do Conselho Regulador da ERC, a Deliberação ERC/2022/225 (CONTJOR-NET)… Uma Deliberação. Uma decisão final formalmente assumida.

    Em termos práticos, imaginem uma sessão de julgamento, com réus e advogados e testemunhas, e um juiz muito atento, a ouvir todos e a fazer perguntas, e debaixo da secretária com a sentença já escrita.

    E pior ainda: a Deliberação ERC/2022/225 (CONTJOR-NET) não foi aprovada nem ontem nem anteontem. Foi aprovada já no (longínquo) dia 13 de Julho. Quase três semanas antes da minha ida para supostamente conhecer a “acusação” e acrescentar elementos à minha defesa.

    Reparem: o ofício da ERC convidando-me a juntar elementos ao processo tem a data de 21 de Julho (oito dias depois da já feita Deliberação), sendo que eu fui notificado apenas no dia 2 de Agosto.

    Primeira página (de um total de 21 páginas) da Deliberação ERC/2022/225 (CONTJOR-NET), assinada e rubricada pelos membros do Conselho Regulador. A “sentença” já estava feita antes do processo estar concluído, mesmo convidando-se o “réu” a apresentar novos elementos de defesa.

    Na verdade, tudo correu mal à ERC (porque até para se ser bom farsante tem de haver arte), porque alguém se “esqueceu” de retirar aquelas folhas do processo – contendo a Deliberação já feita, assinada e rubricada. Se lá não estivesse a “sentença” – que não revelarei, mas que obviamente é um “presente” para senhores como o senhor António Morais –, eu iria até pensar que estava ali, muito bem, perante um “julgamento” imparcial e sério, onde os meus direitos de defesa estavam salvaguardados.

    Assim, não – descobriu-se a careca, facilmente; revelou-se uma fraude. E a fraude chama-se Conselho Regulador da ERC.

    Por isso, não obstante as nulidades do processo – que ainda incluem outros elementos “estranhos” como uma numeração não cronológica dos documentos e a “retirada” de pareceres do Departamento de Análise de Media da ERC –, tem de haver outra consequência.

    A podridão revelada pelas torpes condutas do senhor Sebastião Póvoas (ainda por cima juiz conselheiro), do senhor Francisco Azevedo e Silva, da senhora Fátima Resende e do senhor João Pedro Figueiredo – nas suas vãs tentativas de desacreditar e pôr na lama investigação jornalística verdadeiramente independente –, só tem uma solução: a demissão.

    Nos tribunais, eu ainda poderia, além de alegar nulidade processual, suscitar um incidente de suspeição, de modo a me serem atribuídos novos juízes, verdadeiramente imparciais e idóneos. Mas como não há outros “juízes” na ERC, a não ser estes quatro, não vejo como podem eles manter-se no cargo, nestas circunstâncias, e julgarem-me ou julgarem outros.

    Podem manter-se no cargo depois desta farsa, claro – que nada é escandaloso o suficiente em tempos de desavergonha. E, mantendo-se eles, podem censurar-me uma, duas, três mil vezes.

    Porém, no caso de se manterem como membros da ERC, aviso já: não me defenderei enquanto as decisões partirem do senhor Sebastião Póvoas (ainda por cima, um juiz conselheiro), do senhor Francisco Azevedo e Silva, da senhora Fátima Resende e do senhor João Pedro Figueiredo. As suas censuras, para mim, serão medalhas. E a História reservar-lhes-á, por certo, um lugar no Panteão da Vergonha.