Categoria: Opinião

  • Porto 4.1

    Porto 4.1


    Cheiinho de razão estava o espanhol Ortega y Gasset, que, apesar do nome, era um só: “Eu sou eu e a minha circunstância, e se não a salvo a ela, não me salvo a mim”. De facto, também eu sou a interdependência entre mim e o ambiente que me rodeia. Por muito que me jugue capaz, eu, tal como os demais, sou moldado, condicionado e influenciado pelas circunstâncias em que vivo, ou seja, pelo contexto social, histórico, cultural e material em que me insiro. Isto, no geral; porque, no particular, sou mais moldado, condicionado e influenciado por pequenos acasos, pequenas circunstâncias, pequenos condicionalismos, pequenos nadas.

    Por exemplo, se por natureza tenho uma inclinação, que muito me prejudica, em andar a correr atrás do tempo – isto é, a lutar in extremis para não chegar atrasado –, hoje está cheguei bem cedo aqui à Varanda da Luz, mas por razões circunstanciais associadas, hélas, a um atraso. Quer dizer: na perspectiva do Benfica, cujos (simpáticos) serviços consideraram que eu me atrasara no envio no pedido de acreditação, e na troca de e-mails do dá ou não dá, e investido do Estatuto de Jornalista na mão, como um Camões de manuscrito de ‘Os Lusíadas’ na mão, decidi vir para os lados de Benfica para, se necessário fosse, tirar desforço. Não valeu a pena, porque, enfim, me enviaram, entretanto, mensagem electrónica confirmando a acreditação, donde se conclui que, por força de um (alegado) meu atraso, as circunstâncias precipitaram uma chegada antecipada. E mesmo assim dando tempo – ou seja, aproveitando o tempo, para não o perder noutra circunstância – de ir antes do jogo à Estrada de Benfica por mor de uma investigação em curso… sairá na próxima edição, assim espero.

    Por esta (afinal) feliz circunstância de chegar mais cedo (uma hora), garantido está que não vou perder, em princípio, qualquer golo, como amiúde sucede quando me agacho para meter a ficha do computador na tomada, já no decurso do jogo. Já perdi dois golos, pelo menos, à conta disso… Hoje, já está tudo a carregar bem carregado… Também estou com fé por ter entrado, desta vez, pela via do Colombo, e não pelo Alto dos Moinh. Pelo menos, a ‘paisagem’ foi diferente.

    (… e, entretanto, começou o jogo…)

    Por falar em dois golos: como é possível o Sporting de Braga ter estado a ganhar por dois golos a zero, e depois levantar quatro ‘secos’ do Sporting na segunda parte? Credo! Ainda bem que o Ruben Amorim vai para as terras de Manchester! E já vai tarde…

    E por falar em dois golos e no Sporting…

    (goloooooooo. Benficaaaaa: Alvaro Carreras, o espanhol, com um belo remate, antecedido de um passe de trivela, estranho pela posição, de Tomás Araújo; assim já can um!)

    Isto já está a animar. Mas continuemos…

    Estava eu a falar – ou, melhor dizendo, a escrever – sobre golos desperdiçados e sobre o Sporting, e isto é um déjà vu: há dias, enfim, fui até Alvalade, esperando ser presenteado com uma sandes de leitão de Negrais, enquanto assistia a uma cabazada fornecida aos lagartos por Bernardo Silva & Ca., para assim me rir na cara do Carlos Enes, mas tudo se esfumou por obra e graça de Santo Amorim’. Não, a sandes, que essa, afinal, nunca chegou. Aquilo que se esfumou foi a possibilidade de assistir in loco, a uma reviravolta épica sob a batuta de um benfiquista. E tudo porque não houve sandes de leitão, coisíssima nenhuma, nem uma bolachita de água e sal.

    Aliás, aqui me penitencio, desde já, por andar, há muito, a ironizar, com sarcasmo, em redor do famigerado farnel do futebol (FFF), ofertado pelo Benfica aos jornalistas, e que, de ordinário (no sentido, de ser vulgar ou comum), consiste numa sande de conteúdo interior (relativo ao panificado) nem sempre identificável, em uma singela peça de fruta (hoje foi maçã), de uns acepipes (hoje saiu batata frita em pacote pequenino) e garrafinha de água (de pH básico, próximo da lixívia).

    (chiça! Mas o Otamendi agora lembra-se que jogou no Porto, e faz mais uma fífia de tudo o tamanho; e sai um golo para os tripeiros)

    E chega o intervalo, e continuemos…

    Ora, aqui, com o FFF, não corro, digo já, o risco aqui no Estádio da Luz de ter de sair para comprar umas asas de frango a um qualquer McDonald’s, como sucedeu com o Carlos Enes. Resultado: perdemos dois golos, porque não deu para fazer todo o percurso antes do início da segunda parte. Hoje, não vou perder nenhum. Mas tenho esperança de que o resultado seja similar: 4-1, depois estar também 1-1 ao intervalo.

    (e recomeça o jogo)

     … E estou aqui a ver que não vamos repetir o feito do Amorim. Já passaram quase 10 minutos, e nada…

    (… e golooooooo. Angel Di Maria!!! Já está!!!)

    E eu hoje, estou como estive noutros jogos, com pouca vontade de escrever e com mais vontade para assistir… Vou ver se isto agora vai encarreirar…

    (… e encarreirou!!! Bastaram seis minutos, e já entrou mais um; nem sei se foi golo do Benfica ou auto-golo do Porto; pouco interessa: já está 3-1)

    Deixa-me ver se encontro no WhatsApp o especialista do PÁGINA UM também em comentário desportivo, sobretudo do Benfica, corrosivo quando correm mal: Tiago Franco…

    Estou já a meter-lhe uma cunha…

    … e está garantido um textinho, a ser metido aqui nesta crónica. Posso então meter o computador no saco… Ou não. Tenho de meter aqui o próximo golo do Benfica, para meter o treinador do Porto com o ‘melão’ do Pep Guiardiola em Alvalade…

    (e é penalty para o Benfica… Di Maria para marcar e… marca: 4-1. Caramba, espero ainda mais!)

    Mas não houve mais, embora pudesse haver. Uma noite perfeita, muito similar aos quatro ‘secos’ metidos ao Atlético de Madrid, não fosse a fífia do Otamendi.

    Concedamos, então, agora, o merecido espaço à análise do Tiago Franco, que percebe da poda muitíssimo mais do que eu, o que não seria difícil, uma vez que eu percebo zero… Por isso mesmo, disfarço com estas crónicas…

    Esta era a noite do primeiro grande teste a Bruno Lage. A Liga dos Campeões permite alguns fogachos aos clubes portuguese, que, na melhor das hipóteses, terminam nos quartos de final. Portanto, é no campeonato e, em especial, contra o maior rival deste século, que se vê o que se pode esperar desta equipa.

    Vítor Bruno deu uma ajuda a Bruno Lage, deixando Pêpê no banco, e apresentando um 11 onde o perigo se resumia a Samu e Galeno. O Benfica apareceu com o seu melhor 11 e dominou do princípio ao fim, ficando a dever a si próprio a possibilidade de uma goleada histórica. O golo de Samu surge de um erro de Otamendi, e depois de uma pausa de jogo forçada, num momento em que o Benfica carregava na área do Porto…

    Aqueles adeptos especiais, que lançam tochas, quando a sua equipa está por cima do jogo, deveriam ter direito a um subsídio do Governo para a compra de capacetes e esponja de parede.

    Falando em gente especial: sempre que vejo este miúdo Carreras a correr, driblar adversários, marcar golos e iniciar jogadas de ataque, lembro-me de tempos não muito distantes em que ele se sentava naquele banquinho, ali ao lado, a ver o Morato a chutar contra os adversários. Bruno Lage não é o meu treinador de eleição, mas é um treinador, algo que já não havia na Luz há dois anos. Tem um plano de jogo, estuda os adversários, mexe a partir do banco. Passou o teste, era este o teste.

    Vítor Bruno com um plantel fraco, tal como Sérgio Conceição, não mostra a mesma arte deste em meter aquela gente a espumar da boca mal avistam o Colombo. O Porto joga pouco, as soluções não abundam. O Benfica também não enche o olho, convenhamos, mas tem uma equipa consideravelmente melhor e, parece-me, mais competência no banco.

    Di Maria é, na realidade portuguesa, ainda um extraordinário jogador.  O trio de meio-campo é este, com Florentino na recuperação e Kökçü e Aursnes na saída. Não é preciso inventar, basta meter os 11 melhores. Foi o que Bruno Lage fez, mas com uma chamada de atenção a Otamendi: está a precisar de banco, e o Benfica está mesmo a pedir aqueles dois miúdos no centro da defesa.

    Uma nota final para dizer que, embora o Porto seja o tradicional rival neste século e portanto, a vitória é saborosa, a competição este ano será contra o Sporting. E esses, até ver, estão uns furos acima de Benfica e Porto. Rezemos pelo fim do efeito Ruben. Sem acento.

    E em Dezembro há mais.


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  • All night long: Especial eleições nos States

    All night long: Especial eleições nos States

    Espelho meu, espelho meu, diz-me quem é que gosta mais de bater nos media do que eu.

    É claro que o meu smartphone (espelho) ficou calado.

    E cá estou eu numa aula de boxe. Onde é que está o Rodrigo Guedes de Carvalho? Olha, dizem que fugiu da aula e não está para calçar as luvas. Mas cuidado que ele é mau.

    Talvez ande por aí o Germano de Sousa… Olha, dizem que está em casa lavado em lágrimas gritando por Káaamala em frente ao televisor.

    Mas o que é isto? Agora o Rui Calafate depois de saber que perdeu, já diz mal da senhora Harris e casca na pouca influência da Beyoncé nos consumidores-eleitores. Bolas, Rui, deixa ao menos passar umas horas. Pode ser que não percas o emprego, mas da forma como as coisas marcham, parece infelizmente que isso pode ser uma possibilidade. Mas estar indignado pode ser bom… Por uns dias.

    Estava a brincar, claro.

    Eles é que não pareciam andar muito para brincadeiras sempre que aparecia alguém a criticar subtilmente a candidata democrata mesmo que, segundo as regras do marketing, o contraditório seja bom para vender o produto.

    Por muito que alguns soubessem tratar-se de um guião vindo da cantera globalista sempre com o kit completo dentro da mala a acompanhar a venda, outros acreditavam mesmo naquilo que iam dizendo sempre cheios de humanismo prêt-à-porter e até rangiam os dentes quando tinham de proferir a palavra maldita começada por T antecedida por um nome de desenho animado da Disney. Ao pé desse até o Bush já era bom.

    Mas as coisas não são assim tão simples, como costuma dizer-me um primo meu, bastante simplório, até por sinal, quando se refere à política. 

    Mas o quê? O Elon Musk não faz parte do elenco? E agora é pela liberdade de expressão e é do Trump? Reconheço que para os mais incautos seja esquisito, está certo. O homem da Neuralink não parece de confiança e é o mais rico do mundo mas os seus projectos dão sempre para o torto. Investirão os contribuintes através do Estado assim tanto nele? É estranho.

    Mas o quê?… Agora o Zuckerberg já não apoia os democratas e até fala da censura a que foi sujeito durante a pandemia sobretudo durante o governo Biden?

    Um uber-boy de esquerda dirá que eles querem todos é dinheiro e que a culpa é do capitalismo. Um taxista do Chega dirá que eles são é todos filhos da p… e que só estão bem a mamar do contribuinte, ainda que agora tenha muito para dizer vomitando à vontadex para o caixote-do-lixo que já foi o Twitter. E onde pode dizer o que lhe apetecer como se fossemos os seus clientes do banco de trás.

    Os jornalistas e apresentadores contribuem hoje muito certamente, para o aumento do consumo de anti-depressivos e até de psicotrópicos em geral.

    A Pfizer gosta da SICK, já se sabe, basta ler o PÁGINA UM. Isto para fazer um jogo de palavras à antiga.

    A política e o desejo já coexistem e mantém uma relação há muito. E o Ser Humano é frágil, sabemos. Temos de perdoar, sendo essa acção, coisa um pouco cristã e por isso mal vista pela elite que não anda muito “caótica”, como se costuma dizer quando as coisas não andam a correr bem.

    Acontece que os media, ainda que não pareça, são compostos por pessoas, mesmo que ande também por lá a classe mais desrespeitada do momento — os jornalistas, claro.

    Uma coisa é comentário (aquilo que faço aqui), outra coisa é jornalismo (aquilo que não faço aqui).

    Nas televisões e jornais mainstream em geral, uma coisa confunde-se com a outra à grande e à americana.

    Durante meses assisti a uma campanha pelo partido democrata, apresentando sempre Donald Trump como um doido varrido, um mentiroso compulsivo, um ególatra e até pior.

    Ok, eu até posso achar isso, mas não sou jornalista.

    Mas também acho que Kamala é pouco mais que do piorio, basta investigar sobre ela.  Eu e muita gente, até hispânicos, negros e judeus que votam nos Estados Unidos. É assim. Temos direito de não gostar de ninguém.

    Mas venha de lá o menos mau. Sempre ouvi dizer.

    Acontece que o mundo político ja não se coaduna com essa perspectiva há muito.

    O delay ainda é mais evidente que numa trovoada.

    Há quem saiba disso. O Ricardo Costa que nada tem de idiota útil, julgo que sabe, até porque é irmão de António Costa, que já passou por mais ministérios que o Manuel Cajuda por clubes de futebol, mas é um ser humano e por isso também tem as suas fraquezas e de vez em quando lá vai a real politik dar uma volta até ao bilhar grande.

    Ele foi um daqueles enviados para os Estados Unidos que acompanhou a parte final das campanhas e tinha que “medir o pulso” às populações (como gostam de dizer os correspondentes) achando que quem votava em Trump era porque estaria desinformado, tipo não via a SIC, e depois ia dar uma volta até àquilo que eles chamam de América real e decepcionava-se porque os reais andavam desinformados. Às vezes dizem tratar-se da América profunda. As terminologias vão mudando conforme o “clima”.

    Vi-o ir ter com portugueses imigrantes que diziam quase todos votar no Trump e serem contra a emigração. Às vezes podia jurar ver o jornalista-irmão ficar com os óculos embaciados de tanta  realidade (irrealidade) ao mesmo tempo. Ou então eram os meus.

    O mesmo já se tinha passado em Portugal com o fenómeno do Partido Chega. Os media gostam do povo e por isso subestima-o. Pelo menos quando dá jeito lá vão eles ter com as pessoas, cada vez mais velhotas, é certo, mas que ainda conseguem achar piada ao “caçador” Miguel Sousa Tavares por exemplo e querem selfies com o Marcelo. Mas de boas intenções anda o cemitério cheio, como se diz na Turquia.

    O mundo não anda para brincadeiras mas uma parte do povo ainda não sabe mas já desconfia e anda farto de selfies e já não tem paciência assim tanto para bigbrothers.

    E quem irá ganhar com tanta desconfiança?

    Está-se mesmo a ver. E há uns por aí que não brincam em serviço e que são muito piores que o Orban. Basta apanhar o avião até à Alemanha.

    Alguém anda a brincar com fósforos e a querer aquecer o planeta confirmando assim que a acção humana contribui para as famosas alterações. 

    No entanto os de sempre é que ganharam com estas eleições, os media aqui são só peixe muito pequeno para a camioneta do Poder.

    Benjamin Netanyahu é um deles. As grandes famílias também saem sempre vitoriosas, e até há quem diga que financiam tanto vencedores como vencidos.

    Mas isto aqui não é o YouTube e eu tenho mais que fazer do que andar a vasculhar no abstrato.

    Cá por mim falo do que sei e tentarei assumir uma posição neutra quanto às opções políticas do momento, mas não deixarei de ser pouco neutro numa avaliação aos trapalhões do costume que são aqueles que vocês já sabem e que têm sido um alvo permanente deste órgão de informação (P1) que tem dívida zero e prescinde de uma visão ideológica, preferindo fazer aquilo que em tempos se chamou de jornalismo, trazendo um fogacho de esperança ao próprio meio. Ao copo que anda meio vazio mas cheio de si. 

    É só a minha opinião, calma. Estamos na zona da opinião.

    Qualquer dia e a ver pelas parcas audiências, esses são mesmo o ceguinho, e aí e por questões de ética já não vou poder bater, correndo ainda o risco de levar com umas bengaladas, mesmo que pouco pujantes e desprovidas de pontaria tipo a personagem Darryl Hanna quando tenta desesperadamente atingir Uma Thurman sem nada ver no Kill Bill.

    O que era mais estranho há uns dias mas não surpreendente, era ver indicadores que não as sondagens do New York Times ou do Washington Post, a mostrarem outra realidade como por exemplo as casa de apostas que tinham Trump como favorito muito à frente de Kamala Harris, ou mesmo as muito fracas prestações da candidata na CNN, ainda que levada ao colo e não serem comentadas. Como se na verdade pouco soubéssemos sobre o país em que as eleições iriam acontecer.

    Mais estranho ainda era o comportamento das televisões no plano inclinado como se os portugueses votassem nestas eleições.  Para quê perderem tanto tempo na campanha clara ao partido democrata se uma boa parte da população portuguesa nem mesmo cá vota.

    Cheguei mesmo a ver tudólogos a pedirem a morte de Trump, justificando que seria a única forma de nos vermos livres dele. Mas, Cara Ferreira Alves, já pensaste que muitos milhões de americanos não pensam assim. A ideia até pode ser boa mas têm de arranjar um puto que tenha mais pontaria que aquele caixa-de-óculos que parecia saído de um filme da saga Carry on.

    E pelos vistos, Beyoncé, Jennifer Lopez, Bruce Springsteen e sobretudo a influencer e cantora Taylor Swift já não conseguem mobilizar parte da juventude que se vê sem dinheiro nos bolsos e que já não suporta a conduta e as regras da ideologia woke (segundo estudos).

    Não parece que Trump tenha melhores soluções mas é o que há.

    Patriotas ou globalistas, parece não haver muitas opções ao centro, sobretudo a um centro que chegou a denominar-se por Tony Blair de radical. Mas também Tony Blair nunca enganou alguns com as suas políticas invasoras e cúmplices do Deep State.

    Se até ao ano 2000 ainda era fácil acreditar em esquerda e direita por exemplo, com a eleição de Bush que ganhou a Algore com recontagens dos votos umas atrás das outras, sendo, no entanto, verificável a diferença ideológica de ambos, paulatinamente de lá para cá as coisas foram-se aclarando ou até complexizando de forma a ter havido uma inversão até mesmo léxical, quanto aos sentidos para onde as coisas estavam a ir.

    E os media ou não percebiam nada, ou percebiam tudo e estavam a lutar no pódio da hipocrisia. As redes sociais como foram ficando cada vez mais anti-sociais viraram o feitiço contra o feiticeiro, mas a verdade é que o mundo foi sempre para a frente.

    Até ao Covid.

    Ruy Otero é artista media

    Ilustrações de Ruy Otero


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.


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  • O ‘dia da vergonha’ para a imprensa

    O ‘dia da vergonha’ para a imprensa


    Os norte-americanos deram um murro na mesa e elegeram Donald Trump para a Casa Branca. Será o 47º Presidente dos Estados Unidos. Mas a vitória de Trump não representa apenas a derrota de Kamala Harris, a candidata do Partido Democrata. Representa também a derrota da imprensa tradicional que, mais uma vez, nestas eleições, decidiu meter a ética jornalística debaixo do tapete. Na cobertura que fez da campanha de Trump nestas eleições, a generalidade da imprensa mainstream, incluindo a portuguesa, destilou ódio e desinformação em vez de fornecer ao público factos e rigor jornalístico.

    Essa cobertura enviesada criou uma opinião pública mal informada e com o ‘cérebro lavado’ de imagens de um Trump ‘fascista’ contra uma Harris ‘heroína’.

    Durante a campanha para a Casa Branca, a maioria dos jornalistas de grandes órgãos de comunicação social endeusou Harris, escolhendo as melhores fotografias, as poses mais favoráveis, as frases que ficavam mais ‘no ouvido’. E enterrou o passado de Harris, as frases comprometedoras, as gaffes, as gigantescas falhas.

    graffiti, trump, melbourne

    Em geral, os media, enterraram todos os ‘defeitos de Harris e exacerbaram os de Trump. Fingiram que Harris não tem sido número dois na administração Biden, sendo cúmplice das suas políticas, nomeadamente o envolvimento e apoio do país a conflitos armados e guerras. Fingiram que Harris não era a pró-censura e contra a liberdade de imprensa e de expressão. Fingiram que Harris era a democrata, a ‘boa’, e pintaram Trump como o ‘fascista’, o ‘mau’. E falharam. A imprensa escolheu um lado, violando o Jornalismo. E perdeu. Massivamente.

    O dia de hoje não foi apenas de vitória para Trump e para os republicanos. Foi um dia de despertar para muitos na imprensa, nomeadamente em Portugal. Falharam nas previsões. Falharam nas expectativas. Falharam, sobretudo, com o Jornalismo e com o público, os leitores, ouvintes e telespectadores. Mas ganharam no ódio, que é visível em algumas reacções ao resultado eleitoral na Internet.

    Ao mar de jornalistas e comentadores a destilar ódio e mentiras nos media, juntaram-se jornalistas e comentadores influencers a espumar raiva nas redes sociais. Dois exemplos, em Portugal, são casos como o de Mafalda Anjos e de Luís Ribeiro. A primeira foi directora da Visão até ao final do ano passado e actualmente é comentadora da CNN; o segundo continua a ser jornalista desta revista da Trust in News, desde 1999, e ainda comenta na SIC. Ambos lançam insultos recorrentes em publicações na rede X e alimentam assim uma rede de seguidores e ‘haters’ que sustentam a sua base de audiência e de ‘engagement’ naquela rede social (e isso pode trazer receita). Promovem o discurso de ódio constantemente e alimentam-se disso. São os vampiros desta era digital em que as redes sociais se tornaram um espelho do pior que pode haver nos seres humanos.

    Curiosamente, Mafalda e Luís são dois nomes associados a um grupo de media à beira da insolvência, a Trust in News. Não será coincidência. Ambos reflectem o pior que pode haver em ‘jornalistas’: proferem discurso de ódio contra os seus ‘alvos’; promovem uma cultura de polarização. Usam a sua posição como jornalistas e a sua carteira profissional para levar a cabo campanhas de raiva aproveitando para ganhar audiência com a polarização de seguidores e ‘haters‘.

    Estes dois influencers/jornalistas são exemplos do tipo de individualidades que vampirizam o ecossistema digital e que se alimentam do ódio e de um público polarizado, em parte, devido à actuação da imprensa  tradicional, que ao invés de informar, muitas vezes aposta na propaganda e na polarização.

    Estes influencers do ódio vivem das emoções das massas, manipulando-as; usam e abusam das mais básicas técnicas de bullying e assédio contra os seus ‘alvos’.  Muitas vezes, lendo algumas publicações, parecem ter sido escritas por adolescentes inseguros, com borbulhas e muito ódio aos pais, procurando desesperadamente a validação dos seus pares para se sentirem integrados e aceites num qualquer grupo.

    man in black suit jacket

    Curiosamente, a faixa etária que mais votou em Trump foi a dos adultos já mesmo adultos – entre os 45 e os 64 anos. E Trump conquistou também o voto popular. Na realidade, é o tipo de malta que não tem pachorra para tretas e merdas nem paciência para influencers digitais inseguros a espumar raiva e a debitar insultos.  

    Quando há adultos ‘na sala’, a opinião destes influencers/jornalistas vale menos que zero. Isto é válido para Portugal, com exemplos como o destes influencers/jornalistas, como nos Estados Unidos . E, na verdade, as notícias enviesadas e com discurso de ódio contra Trump até ajudaram à derrota de Harris.

    Com estas eleições, surge a visão de um mundo ocidental em que o Jornalismo se liberta desta imprensa tóxica que tem asfixiado o público e a verdade. Não admira que Jeff Bezos, dono da Amazon e do Washington Post, tenha apoiado a decisão do seu jornal de não recomendar o voto em nenhum dos candidatos à Casa Branca. O magnata assumiu, ele próprio, o declínio da credibilidade da imprensa mainstream. De resto, a perda de credibilidade tem crescido em paralelo com as campanhas de desinformação a que todos assistimos nos media, em temas como a pandemia, Ucrânia, inflação, Gaza, etc, etc..

    Estas eleições são um sinal de que a era destes vampiros/influencers do ódio tem os seus dias contados e que a sua popularidade está agora restrita a um nicho ‘dark’ e depressivo do ecossistema digital que vive da raiva e dos insultos. Uma minoria raivosa a espumar e a atirar pedras entre si.  

    Com estas eleições, pelo menos nos Estados Unidos, floresce a visão de uma Internet em que há liberdade de imprensa e de expressão, em que é aceite diversidade de opiniões. Enquanto isso, no resto do mundo ocidental paira a nuvem da censura e do fim da liberdade de imprensa e de expressão, designadamente na Europa e em países como o Brasil.

    Não duvido que estas eleições norte-americanas são também a pedra que marca agora a sepultura onde jaz a credibilidade da imprensa tradicional.

    Trump tem muitos defeitos. Bezos também. Mas ambos sabem quando um ‘produto’ está morto. E o motor da imprensa é a sua credibilidade. Sem ela, não há ‘produto’. A morte em definitivo do motor, da credibilidade da imprensa mainstream, dá esperança de que haja um futuro para o Jornalismo. Um futuro em que uma nova imprensa, com um novo motor, com credibilidade, se apresenta ao público para cumprir a sua missão de informar com rigor e seriedade. Porque esta imprensa tóxica, que tem alimentado mentiras e a polarização, defendido a censura digital e apoiado a indústria de guerra, se morrer, traz outra esperança: a de que há um futuro para a Democracia no mundo ocidental. E para a Paz.


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  • A vitória de Trump e a derrota dos órgãos de propaganda

    A vitória de Trump e a derrota dos órgãos de propaganda


    Esta madrugada, para espanto dos órgãos de propaganda – que, claro, apostaram todas as fichas no contrário –, Donald Trump não apenas venceu as eleições, mas fê-lo de forma contundente. Conquistou os 270 votos necessários no Colégio Eleitoral e, como se não bastasse, ainda venceu o voto popular, um feito que nenhum republicano alcançava desde 2004, com George W. Bush.

    Como se fosse pouco, os republicanos saíram triunfantes também nas disputas pela Câmara dos Representantes e pelo Senado, garantindo o controlo do poder executivo e legislativo. Uma vitória retumbante, para desespero de muitos.

    Como é de praxe em qualquer democracia moderna, a campanha foi um espectáculo de distracções: o acessório em primeiro plano, o essencial cuidadosamente guardado na sombra, para delírio dos órgãos de propaganda e dos seus inenarráveis comentadores de serviço.

    Quais distracções mereceram a sua atenção? Trump reencarnando Hitler, nada menos! Tudo porque o seu ex-chefe de gabinete, John Kelly, teve o infortúnio de soltar a pérola de que o líder nazi “fez algumas coisas boas”. A reacção? Instantânea: Trump foi prontamente elevado a fascista, tirano de primeira linha, sedento pelo poder absoluto.

    Tivemos também a curiosa acusação de senilidade, com Kamala Harris a informar-nos, num tom de genuína preocupação, que Trump estaria cada vez mais instável, um verdadeiro desequilibrado, inapto para cumprir um mandato sequer. Um diagnóstico curioso, especialmente vindo de quem, durante quatro anos, não demonstrou a mínima capacidade para perceber que o presidente Biden há muito estava xexé – ao ponto de ser quase impensável apresentá-lo às eleições, tamanha a debilidade evidenciada num debate com Trump.

    Não poderia faltar a ameaça à democracia, acusação perene de que Trump orquestrou o ataque ao Capitólio. Curioso, no entanto, que a única vítima mortal de um disparo naquele dia tenha sido Ashli Babbitt, apoiante de Trump, alvejada não por desordeiros ou manifestantes, mas pela própria polícia; tudo isto num país onde há mais armas que habitantes. Incitação à violência? Até hoje ninguém conseguiu encontrar a frase exacta em que Trump teria convocado o caos, na verdade, apenas realizou um apelo à manifestação, um direito que não parece tão absoluto quando o manifestante em questão não agrada aos guardiões da virtude.

    Como não poderia deixar de ser, assistimos às eternas acusações de racismo e misoginia, acompanhadas do ataque aos “direitos reprodutivos” – um eufemismo para descrever o acto de assassinar uma vida humana em gestação. O cenário, segundo os arautos do apocalipse, seria catastrófico: um país onde o aborto poderia ser restringido! Um golpe impensável contra a cultura de morte, agora tão apreciada pelo Ocidente em decadência.

    Não só Trump esteve na mira, os seus apoiantes também. Durante uma videoconferência com o grupo Voto Latino, Biden fez uma declaração que gerou polémica. Em resposta a uma piada racista, em que um comediante num comício de Trump chamou Porto Rico de “ilha flutuante de lixo”, Biden não titubeou: “O único lixo que vejo a circular por aí são os apoiantes de Trump.” Com o seu gosto característico pelo espectáculo, Trump aproveitou logo a deixa: apareceu no topo de um camião de recolha de lixo e realizou um comício devidamente vestido, reencarnando o “homem do lixo”. Enfim, uma lixeira absoluta e obviamente nauseabunda. 

    A cereja no topo veio da pena de Paulo Baldaia, uma figura que há décadas desfila por vários órgãos de propaganda, uns falidos, outros a caminho de o ser, e que nos brindou com esta obra-prima: “Se é dono de um Tesla ou tem conta no X pode estar a ajudar Trump a ser eleito.” Pois é, a ameaça, pasme-se, esconde-se agora atrás do volante de um carro eléctrico ou, ainda pior, no simples acto de possuir uma conta no X (outrora Twitter, para os menos informados). A conspiração é tão intricada que carregar a bateria do carro ou publicar uma fotografia numa rede social parece agora o princípio do apocalipse. Quem diria que o fim da democracia chegaria com um like e com uma bateria de um carro eléctrico a carregar!?

    Os putativos jornalistas da nossa praça – na realidade meros activistas políticos – fariam melhor em concentrarem-se em factos e notícias, em vez de praticarem propaganda descarada a favor de um candidato. Afinal, lembremo-nos que nenhum português vota nas eleições norte-americanas. Podiam, no mínimo, ter-nos alertado para um pequeno detalhe: nenhum dos candidatos ousou sequer mencionar o Banco Central norte-americano, a venerável Reserva Federal. Quando uma figura ou instituição se torna imune à crítica, é fácil entender quem realmente manda.

    Foi o Banco Central quem emitiu o dinheiro que inundou os lares norte-americanos com cheques durante a pandemia inventada, gerando a explosiva subida de preços que agora diz combater! Foi o Banco Central com as suas taxas de juros a 0% que confiscou as poupanças dos cidadãos comuns para beneficiar especuladores e classes ricas, detentoras de activos reais – acções, criptomoedas e imóveis. Foi o Banco Central que criou dinheiro do nada para enviar “ajudas” à Ucrânia, pondo o povo a pagar guerras sem fim através do chamado imposto silencioso: a inflação. Ao que parece, criticar tal poder é tabu – mas eis a verdadeira mão invisível que poucos ousam mencionar.

    Pois, além de não nos terem alertado para esse detalhe essencial, os cronistas deveriam também ter mencionado a subida galopante da dívida pública norte-americana em nada menos que 40%, saltando de 20 para quase 28 biliões de dólares (sim, com doze zeros), tudo durante o mandato de Donald Trump e sob o beneplácito da impressora mágica da Reserva Federal. Foi também na sua presidência que se inauguraram as famosas “guerras comerciais”, impondo taxas sobre importações – um tributo disfarçado que recai directamente sobre o consumidor norte-americano, servindo apenas para o empobrecer com um toque patriótico.

    E não nos esqueçamos do confinamento pioneiro na luta contra o vírus invisível – uma manobra que nem os mais talentosos escritores distópicos poderiam ter antecipado. Por fim, no final do mesmo mandato, surgiu a audaciosa Operation Warp Speed, uma iniciativa lançada em Maio de 2020 com o propósito declarado de acelerar as vacinas para a Covid-19. Ou melhor, para lançar substâncias experimentais de forma indiscriminada sobre a população.

    No caso de Kamala Harris, em vez de nos venderem a ideia de que assistíamos ao retorno de Cristo à Terra, poderiam, talvez, ter-nos alertado para o seu silêncio quanto às aventuras bélicas de Joe Biden ou para sua conivência tácita enquanto vice de Barack Obama – aquele mesmo que, após o Nobel da Paz de 2009, decidiu bombardear ou lançar guerras nos mais variados destinos: Afeganistão, Paquistão, Iémen, Líbia, Síria e Somália. Um currículo notável, sem dúvida.

    Não nos esqueçamos, claro, do golpe de Estado na Ucrânia em 2014, patrocinado pela dupla Obama-Biden, que conseguiu instalar um regime simpático a ideais nazis, e que, com entusiasmo, se dedicou a bombardear e massacrar milhares de civis no Donbas. O regime fantoche na Ucrânia, por sua vez, prontamente desrespeitou os acordos de Minsk, enquanto se armava até aos dentes para participar, com toda a solenidade, numa guerra orquestrada pelos EUA, com o objectivo final de enfraquecer a Rússia e preservar a hegemonia do Dólar norte-americano.

    E quanto à população ucraniana? Bem, essa pouco importou – afinal, submetida a dois exércitos de bandidos, serviu apenas como carne para canhão nesta grandiosa guerra de interesses globais. Tudo Kamala Harris ignorou, inclusive o genocídio perpetrado pelo regime psicopata de Israel. Tal como Trump, também fez explodir a dívida pública para pagar estas aventuras, generosamente oferecida pela impressora de notas do Banco Central. Dívida pública, défices e impressão de dinheiro sem fim, a mesma receita de Trump.  

    Mas também se esqueceram dos infames mandatos de vacinas sob a administração Biden-Harris? Uns tempos de “plena liberdade”, em que os cidadãos eram cordialmente convidados a vacinarem-se com uma substância experimental – caso contrário, um “até logo” ao emprego! Um verdadeiro acto de fascismo na sua forma mais pura.

    Por cá, também fomos presenteados com uma boa dose de terrorismo de Estado durante a pandemia inventada. Era ver esses putativos jornalistas a pavoneavam as suas virtudes confortavelmente atrás de um computador, enquanto o povo era submetido a experiências em massa e via a sua vida e negócios serem destruídos.

    A reacção à vitória de Trump por parte desta gente ainda nos deixou mais perplexos, mas foi hilariante. Desde atestados de burrice ao povo norte-americano – esquecem-se que pertencem a um povo que há poucos anos ainda tinha 5% de analfabetos e elegeu em tempos o Eng. Sócrates –, à derrota da democracia – quando o povo não vota como eles gostam! –, ao aparecimento de uma tríade de chalupas – a mesma que em tempos perguntava, num claro discurso de ódio: E agora, o que fazer com os chalupas? –, aos abalos no estado de saúde, tudo foi possível nas cabeças desta gente. Há algo que ainda não se deram conta: ninguém lhes liga! Tivemos, assim, a vitória de Trump e a derrota destes imprestáveis.

    Luís Gomes é empresário


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  • Da informação à manipulação: o caminho até ao desastre (como se viu nas eleições dos Estados Unidos)

    Da informação à manipulação: o caminho até ao desastre (como se viu nas eleições dos Estados Unidos)


    Nos últimos anos, o panorama mediático português, mimetizando a imprensa internacional que passou a ‘eleger’ temas e formas ‘correctas’ da sua abordagem – criando assim ‘narrativas’ –, tem-se deixado enredar num jogo perigoso. O distanciamento que antes marcava a sadia relação entre jornalistas e actores políticos (que não envolve apenas políticos), permitindo um espaço e tempo de reflexão crítica, deixou de existir: progressivamente, estamos perante um contínuo ‘campo de batalha’, onde se misturam convicções pessoais e posições ideológicas, convertendo-se, neste processo, a função primordial de informar numa plataforma de manipulação de opinião pública.

    O caso mais paradigmático, e até vergonhoso, sucedeu com as recentes eleições norte-americanas, onde se repetiu o erro colossal de uma avaliação ideológica por parte da esmagadora maioria de jornalistas, a tal ponto esmagadora que condicionou o mero acto de informar. O jornalismo lusitano quis mesmo imitar o modelo da imprensa norte-americana, abandonando a missão de ser um autêntico Quarto Poder para se arrogar como formador de opinião e, pior ainda, como orientador de voto. Em Portugal, de uma forma ainda envergonhada, já se tinha assistido a essa faceta nas eleições legislativas, com a ‘diabolização’ do Chega, que afinal até ‘cavalgou’ a onda da vitimização e da ausência de apreciação crítica por parte da imprensa aos falhanços clamorosos das políticas dos partidos tradicionais (e pouco criticados pelo seu desempenho). O populismo cresce quando a imprensa adormece.

    blue and white round plate

    Um ‘sinal dos tempos’, uma terrível tendência, a enraizar-se perigosamente nas sociedades ocidentais, tudo agora se bipolariza e se dramatiza, e maniqueiza-se, se reduz a uma visão dualista e simplista de bem versus mal, certo versus errado, com que se parte assim para a ostracização da outra parte, diabolização da outra parte e, claro, assim se justifica uma ‘benéfica’ censura da outra parte. Adjectiva-se sempre. Rotula-se ainda mais. Isola-se para eliminar.  

    Viu-se esta abordagem no caso da pandemia da covid-19. Na invasão da Rússia à Ucrânia. Nas eleições brasileiras de Outubro de 2022. No conflito (agravado) de Israel e da Palestina. E agora, de uma forma absurda, nas eleições norte-americanas, exacerbadas a um nível de mediatismo jamais visto. E bastou ver isso nas manchetes, nas reportagens, nos debates e nas redes sociais, onde, diria, praticamente todos os jornalistas mostravam uma veemente posição anti-Trump, como se esta fosse uma medalha de honra e prestígio, colocando-o numa luz inteiramente negativa, e favorecendo (endeusando) uma narrativa pró-Kamala Harris, posicionando-a como símbolo de mudança e progresso.

    As escolhas editoriais serão sempre inevitáveis em qualquer redacção; o problema não reside em reconhecer que cada jornal, e cada jornalista, tem os seus valores – mas sim na total falta de capacidade em discernir que um jornalista é mais do que a sua opinião; é sobretudo a sua função. Ele tem de saber distinguir entre a sua opinião – que pode dar – e a informação factual – que deve dar. Se assim não funcionar, como não funcionou no caso das recentes eleições nos Estados Unidos, o resultado será sempre uma visão distorcida da realidade.

    Hoje, depois dos resultados das eleições, não está em causa os perigos inerentes à recuperação do poder por parte de Trump nos Estados Unidos – um país que, em todo o caso, sendo uma federação sólida, possui ‘defesas’ ao despotismo que a União Europeia não tem perante os burocratas não-eleitos –, mas sim as tristes reportagens, as desoladoras análises e os desastrados estados de alma pessoais transmitidos por tantos jornalistas que, por estarem presos a análise subjectivas, falharam rotundamente. A realidade tratou de destratar as certezas absolutas dos jornalistas; e isso sucedeu porque eles quiserem moldar as suas convicções a uma realidade virtual que desejavam. E isso mostra-se dramático para a credibilidade da imprensa.

    Os últimos anos têm mostrado e demonstrado os erros da deriva da imprensa, que deixou de ser o watchdog (o vigilante sobre os excessos do poder) para se comportar como uma máquina ideológica amestrada (petdog), transformando-se numa força manipuladora que infantiliza o público, privando-o até de uma visão informada e multifacetada dos acontecimentos.

    Ao optarem por esta via, os jornalistas desrespeitam o princípio da imparcialidade – essencial para uma informação credível –, abrindo as portas para uma profunda desconfiança por parte do público.

    Este cenário mostra-se ainda mais grave quando se considera a formação de grande parte dos jornalistas e comentadores que dominam a imprensa mainstream e, especialmente, os canais de televisão. A proliferação de comentadores em espaços informativos sem preparação sólida ou conhecimento profundo dos assuntos abordados, que se repetem e são caixas de ressonância, constitui um fenómeno que agrava a componente enviesada dos jornalistas. Hoje, os comentadores são escolhidos não pela sua competência, mas pela sua capacidade de cativar a audiência quer com o seu estilo, quer com o seu visual, quer como um certo charme retórico.

    Esta seleção, que se baseia mais na forma do que no conteúdo, contribui também para uma erosão, para um crescente desgaste da qualidade da análise e da informação oferecida ao público. Em vez de especialistas ou vozes críticas, informadas e diversificadas, temos frequentemente comentadores que falam com a mesma confiança sobre política, economia ou desporto, como se todos os temas se reduzissem a uma opinião simplista e pessoal.

    Quando jornalistas, como Luís Ribeiro (Visão), perante eleições democráticas de um país com uma democracia sólida, observam tudo com um olhar maniqueísta, e o transmitem como jornalistas, a credibilidade da imprensa, e a sua função informativa e de watchdog, segue o seu curso a caminho do desastre.

    Além disso, ao se preferirem comentadores ideologicamente alinhados – e não apenas política ou ideologicamente falando –, que reforçam as mesmas narrativas, os meios de comunicação estão a cooptar vozes que, em vez de alargarem o debate, o limitam, alimentando uma espécie de câmara de eco onde apenas se ouvem as opiniões que confortam uma certa visão do mundo.

    Este círculo fechado de opiniões está a criar uma distorção da realidade que, inevitavelmente, afecta a percepção pública – e isto é manipulação, não informação. Quando o leitor ou espectador é confrontado somente com uma visão parcial e enviesada dos acontecimentos, perde-se a capacidade de analisar de forma independente e ponderada.

    Ao fim de algum tempo – como sucedeu com a pandemia ou agora com as eleições nos Estados Unidos –, o público começa a duvidar da veracidade da informação que consome, percebendo a falta de neutralidade e objectividade. Vira-se para as fontes alternativas. Se se critica as redes sociais – onde, aliás, pululam jornalistas e comentadores que criticam essas mesmas redes sociais, mesmo se estas os promovem –, por terem passado a ser uma fonte (pouco credível) de informação, tal se deve á contínua perda de credibilidade da imprensa tradicional.

    Capitol Hill, U.S.A.

    Para piorar, no decurso da campanha eleitoral nos Estados Unidos, até a imprensa portuguesa esboçou, talvez se preparando para uma mimetização de consumo interno, a postura de endossamento público de candidatos. Sendo algo comum na imprensa norte-americana, seria uma novidade em Portugal – e um grave erro estratégico e ético. Ao assumirem posições partidárias e, em alguns casos, ao endossarem explicitamente candidatos, os meios de comunicação colocam-se numa posição insustentável: como podem, depois, assumir-se como fiscalizadores de um Governo ou de uma política que anteriormente apoiaram?

    Em suma, a imprensa sempre que quiser ser agente político – como quis ser um agente de saúde pública na pandemia – perde, em toda a linha, a sua independência crítica, tornando-se prisioneira de alianças ideológicas que comprometem a sua capacidade de escrutínio. A eventual transição de uma imprensa informativa para uma imprensa orientadora de voto é de uma extrema gravidade para a sustentação democrática, pois compromete a relação de confiança entre os jornalistas e o público.

    Se o jornalismo no século XXI insistir em ser uma espécie de ‘educador’ ou ‘orientador moral’ da sociedade – como o Estado Novo fez com a criação do Secretariado de Propaganda Nacional (SPN) e depois com o Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo (SNI) – coloca-se numa posição que desrespeita a inteligência e a autonomia dos cidadãos, tratando-os como incapazes de formar as suas próprias opiniões.

    a microphone that is sitting on a stand

    Ora, dos cidadãos, os jornalistas só têm de saber que lhes exigem um trabalho de rigor e de objectividade, que lhes permitam estar informados e capazes de formar opiniões fundamentadas e consequentes acções daí derivadas. Por isso, nunca será de mais avisar que quando o jornalismo falha nesse papel, e se torna um actor ideológico, corre o risco de perder a sua essência.

    A imprensa deve ser um espaço de liberdade e de questionamento, onde todas as vozes têm lugar, e não uma arena de proclamações e julgamentos morais. A missão de informar implica responsabilidade, somente possível com distanciamento crítico, imparcialidade e o compromisso com a verdade. Substituir esses valores por convicções pessoais e por uma postura militante é desvirtuar a própria natureza da profissão. Muitos jornalistas já nem percebem isso, porque nunca ‘encarnaram’ essa função.


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  • A filantropia de fachada, ou a derrota do Estado Social

    A filantropia de fachada, ou a derrota do Estado Social


    Há um novo ‘desporto nacional’ sustentado nas redes sociais, por vezes tão abominadas pelas cliques, mas por elas usadas para auto-promoção: a filantropia dos ‘influencers’, supostamente sérios – isto é, comentadores da imprensa –, usando o dinheiro dos outros para auto-promoção. A mais recente campanha é protagonizada por Helena Ferro de Gouveia, uma ex-jornalista, ex-administradora da Lusa por via de uma empresa (Global Notícias, que era uma das principais devedoras dessa mesma empresa pública), comentadora televisiva e assessora da presidente da autarquia de Almada.  

    Lançou ela, por estes dias, uma campanha de angariação de fundos para apoio ao motorista da Carris, de nome Tiago, vítima dos tumultos após a morte de Odair Moniz. E vai de vento em popa, tendo mesmo já ultrapassado o objectivo inicial de arrecadação fixado nos 33 mil euros, contando, a meio da tarde, mais de 1.600 donativos.

    white ceramic mug on white table

    Nada tenho, muito pelo contrário – até porque o PÁGINA UM nasceu e mantém-se através de financiamentos voluntários –, qualquer aversão a este tipo de campanhas, mas causam-me, por um lado, estupefacção, e por outro, aversão, quando se direccionam para o apoio a vítimas.

    A estupefacção advém do facto de, sendo eu defensor do Estado Social, não possa conceber para os infelizes e lamentáveis casos como os do motorista da Carris que o Estado possa faltar ou possa sequer ser ineficiente. No seu sofrimento, que jamais poderá ser compensado, acredito eu (e tenho quase a certeza, porquanto o contrário seria uma desilusão imensa) que a sustentabilidade financeira deste motorista da Carris (e a da sua família) só pode já estar mais do que assegurada pela função social e solidária do Estado, sem necessidade de peditórios públicos nem de ‘esmolas’ protagonizados por influencers ou outros entes.

    Acredito – e isso é extensível a outros trabalhadores – que exista um seguro com uma indemnização suficientemente avultada para compensar de forma decente e justa o motorista da Carris por aquilo que lhe sucedeu, independentemente do apuramento de responsabilidade civis e criminais sobre os autores. E mesmo que o seguro privado não seja suficiente, deve o Estado, e genericamente as entidades públicas, garantir-lhe a compensação devida. Concebo o Estado sobretudo para esta função – e saber que ela existe e é exercida ajuda-me a compreender a justeza dos impostos e da máquina burocrática do Estado.

    Por esse motivo, uma angariação de fundos desta natureza, para apoiar vítimas, protagonizada por pessoas como Helena Ferro de Gouveia (e o mesmo se aplicaria se fosse a Madre Teresa de Calcutá) causa-me estupefacção: a sua própria existência significa uma fortíssima percepção de que, para os cidadãos e contribuintes, o Estado Social não dá respostas dignas, eficazes e rápidas, e que tem de ser a iniciativa ‘privada’ a fazer aquilo que o Estado e Governo são incapazes de fazer. Não podemos sentir isso do Estado nem é admissível que os representantes do Estado – ou seja, um Governo – o permitam.

    Já a minha aversão a este tipo de campanhas advém mais, neste caso, das pessoas que a protagonizam e também, em casos concretos, às pessoas que fazem donativos. Por exemplo, ver Helena Ferro de Gouveia como ‘protagonista’ isolada desta campanha causa-me ‘urticária’, porque a sua visão da vida humana – esparramada nos seus comentários televisivos e nas redes sociais nos últimos anos – não ‘casa’ com uma angariação de fundos de cariz humanitário. A intolerância e o enviesamento das suas opiniões são o azeite que não se consegue misturar na água. Por outro lado, fico abismado por ver, entre os doadores, e de entre aqueles que não quiseram manter-se no anonimato, um senhor chamado Marco Belo Galinha, nada mais nada menos do que o líder da Global Notícias, a empresa de media que no ano passado devia 10 milhões de euros ao Estado. Deu 200 euros.

    Se calhar, digo eu, se os senhores Marcos Belos Galinhas desta vida quiserem mesmo ajudar o Estado a ser Estado Social, talvez o passo fundamental seja pagar os impostos que devem. Depois disso, podem ficar de consciência tranquila e com os 200 hipócritas euros no bolso.

    P.S. O Chega está, cada vez mais, numa estratégia de abutre. Cada morte envolvendo um acto de violência, que possa envolver directa ou indirectamente questões étnicas, lhe serve para galgar um discurso de radicalização, que já ultrapassa os limites da contenda política. Mas também aqui, tal como sucede com as campanhas de angariação em relação ao Estado, não deve ser uma petição de milhares de pessoas a fazer com que o Ministério Público intervenha; deve ser a Procuradoria-Geral da República, com eficácia e rapidez, a determinar por motu proprio se é ou não susceptível de penalidade criminal aquele tipo de (lamentável) linguagem.


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  • Três poemas de Miklós Radnóti (act.)

    Três poemas de Miklós Radnóti (act.)


    É o sono da memória

    que gera o sono da razão

    Stefano Carral,

    La traversata del Gobi*


    Quando no início de Novembro de 1944 aqueles corpos foram atirados para a vala comum em Abda, junto ao rio Rába, nenhum dos presentes podia imaginar que, no bolso das calças de uma daquelas vinte e duas pessoas acabadas de executar, houvesse alguma coisa digna de verdadeira nota.

    Só dois anos depois, terminada a guerra, com a exumação dos corpos, viria a ser descoberto um caderno[1] de papel quadriculado, de quinze centímetros de altura por dez de largura, em cuja primeira página (escrita em húngaro, inglês, alemão, francês e servo-croata) estava escrito: Por favor, entregue este caderno, que contém poemas do poeta húngaro Miklós Radnóti, ao Sr. Gyula Ortutay, professor da Universidade de Budapeste. Antecipadamente grato.

    Apesar de reconhecido como um dos maiores tradutores húngaros[2], apesar dos sete livros de poemas que publicara em vida, apesar do doutoramento em Filosofia e dos prémios que já recebera[3], esse caderno com apenas dez poemas viria a tornar-se a peça mais extraordinária do legado (literário, histórico e humano) daquele judeu húngaro de 35 anos, que quisera receber o Baptismo no ano de 1943 e que recusara a fuga que a tempo lhe fora oferecida.

    Todavia, a 30 de Outubro de 1944, ou seja, a escassos dias da morte com um tiro na nuca, um jornal de Temesvár (hoje, Timisoara, na Roménia), o Déli Hírlap, publicou dois dos poemas que também estavam escritos nesse caderno (A Sétima écloga e A la recherche), num artigo intitulado “Poetas atrás do arame farpado”. Isto, porque o poeta, em Outubro desse derradeiro ano, conseguira passar a um dos condenados, entretanto libertado do campo pelos partisans jugoslavos, Sándor Szalai, cinco poemas (um dos quais aqui apresentado, escrito a 15 de Setembro).

    Cumprindo-se agora 80 anos destes episódios, pretendi lembrar neste texto os últimos seis meses da vida de Miklós Radnóti, através da oferta aos leitores deste jornal de uma versão possível de três poemas seus[4], o primeiro escrito ainda em Budapeste (O perseguido), antes de ser arrancado à cidade, o segundo já no campo de concentração de Bor, na ex-Jugoslávia (Marcha Forçada), e o último dos que escreveu em vida (Bilhete Postal 4).

    Reprodução da parte superior do retrato do poeta da autoria de Armando Alves
    (retrato avulso inserido na obra editada no Porto, em 1982: “Poemas de Miklós Radnóti”)

    1. UMA DESCOBERTA CADA VEZ MENOS ESTRANHA

    O presente exercício seria descabido se em Portugal houvesse, como era previsível que existisse, um satisfatório cultivo das Letras.

    Infelizmente, não é assim.

    Desde logo, no plano da Universidade – “um estado de coisas” (Vasco Pulido Valente) agravado pela “funcionalização” imposta por Bolonha e pela imparável “mercantilização” do espírito, do processo e do produto. Na verdade, em nenhuma das nossas Faculdades de Letras (ou em qualquer outra) se encontra uma obra de Miklós Radnóti, uma obra sobre Miklós Radnóti, uma dissertação ou uma tese acerca de Miklós Radnóti.

    E se, no mês passado, era o panorama do ensino, da investigação e da prática em Psiquiatria que nos estarrecia, agora – já mais aclimatados a esta periférica tristeza –, é o estreito horizonte da Poesia a intimar-nos.

    Mas também é assim no plano da sociedade, no caso, no plano editorial. Apesar das proclamações em contrário – do género: “a geração mais preparada de sempre!” –, as duas únicas edições portuguesas de alguns poemas de Miklós Radnóti têm mais de 40 anos[5] e nenhum desses (pequenos e deficitários) livros, há muito esgotados, se encontra sequer disponível na Biblioteca Nacional.

    E tudo isto mesmo depois da rara exaltação do poeta feita pelo Papa Francisco.

    Capa da obra editada por Tereza Balté e Zoltán Rózsa em 1982

    2. OS POEMAS

    Os três poemas que a seguir apresentamos, exemplos de bucólicas “in extremis”[6], além das suas múltiplas versões em inglês, estão igualmente traduzidos em diversas outras línguas (com destaque para a italiana), incluindo a castelhana[7] e a portuguesa[8].

    Não possuindo conhecimentos da língua húngara, além do apoio pessoal pontual a que recorri, a opção foi a de confrontar as diversas propostas, particularmente na sua consistência literária, tendo no final optado pela tradução das seguintes versões: no primeiro poema, a tradução foi feita a partir da versão inglesa oferecida por Thomas Ország-Land, no site Visegrad Literature; no segundo e no terceiro poemas, a tradução foi feita a partir das versões italianas disponibilizadas pelo Professor Alessandro Fo, no seu estudo «Sogno pastorale e drammi della Storia: fra Mantova e Bor», publicado inicialmente em 2014[9].

    O perseguido

    Da minha janela vejo uma encosta,

        mas ela não me vê;

    estou quieto, o poema destila da minha caneta

        mas nada importa ao escondido;

    ainda que não possa entendê-la,

        vejo essa solene graça antiga:

    como sempre, a lua surge no céu

        e a cerejeira explode em flor

    9 de Maio de 1944

    Bujdosó

    Az ablakból egy hegyre látok,

        engem nem lát a hegy;

    búvok, tollamból vers szivárog,

        bár minden egyre megy;

    látom de nem tudom mivégre

        e régimódi kegy:

    mint hajdan, hold leng most az égre

        s virágot bont a meggy.

    Marcha Forçada

    É louco aquele que, tombado, de novo se levanta e se encaminha,

    e com dor errante move joelhos e tornozelos,

    e ainda assim vai pela estrada como se tivesse asas,

    a vala chama por ele em vão, não tem coragem de ficar,

    e se lhe perguntares por que não? talvez ainda te responda

    que uma mulher está à sua espera, uma morte mais sábia, uma morte bela.

    Todavia é louco, o manso, porque lá ao longe sobre as casas

    há muito não volteia mais do que um vento abrasador,

    a parede desabou, despedaçada está a ameixieira[10]

    e o medo é o manto das noites lá na pátria.

    Ah, se eu pudesse acreditar: não só trazer no coração

    tudo o que ainda tem valor, e haverá uma casa para onde voltar?

    se houvesse! e como outrora na varanda fresca

    a abelha pacífica zumbisse, enquanto o doce de ameixa arrefece,

    e o silêncio do final do Verão se banhasse ao sol nos jardins sonolentos,

    e os frutos nus balançassem por entre os ramos,

    e Fanni estivesse à minha espera loira em frente à sebe

    e lentamente a manhã lenta a desenhar a sombra –

    talvez ainda seja possível? a lua hoje está tão redonda!

    Não passe por mim, amigo, grite-me! e eu levanto-me!

    Bor, 15 de Setembro de 1944

    Erőltetett menet 

    Bolond, ki földre rogyván      fölkél és újra lépked,

    s vándorló fájdalomként      mozdít bokát és térdet,

    de mégis útnak indul,      mint akit szárny emel,

    s hiába hívja árok,      maradni úgyse mer,

    s ha kérdezed, miért nem?      még visszaszól talán,

    hogy várja őt az asszony      s egy bölcsebb, szép halál.

    Pedig bolond a jámbor,      mert ott az otthonok

    fölött régóta már csak      a perzselt szél forog,

    hanyattfeküdt a házfal,      eltört a szilvafa,

    és félelemtől bolyhos      a honni éjszaka.

    Ó, hogyha hinni tudnám:      nemcsak szivemben hordom

    mindazt, mit érdemes még,      s van visszatérni otthon;

    ha volna még! s mint egykor      a régi hűs verandán

    a béke méhe zöngne,      míg hűl a szilvalekvár,

    s nyárvégi csönd napozna      az álmos kerteken,

    a lomb között gyümölcsök      ringnának meztelen,

    és Fanni várna szőkén      a rőt sövény előtt,

    s árnyékot írna lassan      a lassú délelőtt, –

    de hisz lehet talán még!      a hold ma oly kerek!

    Ne menj tovább, barátom,      kiálts rám! s fölkelek!

    Bilhete Postal 4

    Caí ao lado dele[11], o corpo estava virado,

    rígido como a corda a romper.

    uma bala na nuca, – Também vais acabar assim, –

    murmurei – deixa-te ficar estendido, calmamente.

    Agora da paciência floresce a morte –

    “Der springt noch auf”[12], ouviu-se por cima de mim.

    E lama misturada com sangue secava no meu ouvido.

    Szentkirályszabadja, 31 de Outubro de 1944

    Razglednicák 4

    Mellézuhantam, átfordult a teste

    s feszes volt már, mint húr, ha pattan.

    Tarkólövés. – Így végzed hát te is, –

    súgtam magamnak, – csak feküdj nyugodtan.

    Halált virágzik most a türelem. –

    Der springt noch auf, – hangzott fölöttem.

    Sárral kevert vér száradt fülemen.

    Paper Slips – A cycle of songs to poems by Miklós Radnóti
    (do compositor húngaro Bozay Attila – 1965)

    Desenho de Miklós Radnóti num dos seus cadernos. Ver aqui.

    José Melo Alexandrino é professor universitário

    Agradeço, penhorado, à minha amiga Nora Kiss o ter-me dado a conhecer o poeta Miklós Radnóti, bem como todos os reparos e observações que nestes dias comigo teve a disponibilidade de partilhar.


    Actualização (4 de Novembro de 2024)

    No seguimento do atento e cuidado reparo feito pelo escritor e poeta Ernesto Rodrigues acerca das obras de Miklós Radnóti – nome pelo qual é habitualmente citado e conhecido, apesar de, como refere, a ordem dos seus nomes ser a inversa – existentes na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, no dia 4 de Novembro (precisamente aquele em que se completam 80 anos da morte daquele grande poeta húngaro), ficou igualmente disponível o acesso à nova versão do Serviço de Pesquisa Bibliográfica da Universidade de Lisboa. Aquando da redacção do artigo publicado a 31 de Outubro, a pesquisa então feita no catálogo não registava a existência dos livros (nem dos artigos de revista) de e sobre Miklós Radnóti que agora figuram efectivamente como existentes na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
    Agradecidos a Ernesto Rodrigues pela oportuna observação, minorada por esta razão a tristeza referida no ponto 1 do referido artigo, aqui deixamos aos leitores do PÁGINA UM o devido esclarecimento, extensível ao registo de se deverem igualmente a Ernesto Rodrigues traduções portuguesas de alguns dos poemas de Miklós Radnóti, designadamente dos que foram integrados nas obras Antologia da Poesia Húngara, Lisboa, Âncora Editora, 2022, e Hungarica, Lisboa, CLEPUL, 2022.


    * A citação de Stefano Carral foi colhida no artigo, mais adiante referido, «Sogno pastorale e drammi della Storia: fra Mantova e Bor», do Professor Alessandro Fo.

    [1] Apesar de lamentavelmente não estar publicado entre nós, o caderno em questão tem o nome de Caderno de Bor, “Cuaderno de Bor” (em castelhano), “Bor notebook” (em inglês), “Taccuino di Bor” (em italiano), etc.

    [2] Desde Safo a Hölderlin, passando, entre muitos outros, por Catulo e Brecht (cfr. Cecilia Malaguti, «“Descensus Ad Inferos”, Il viaggio di Miklós Radnóti negli abissi dell’anima», in Rivista di Studi Ungheresi, III (2004), p. 1.

    [3] No sítio da Academia Húngara das Ciências, pode ver-se a biografia de Miklós Radnóti.

    [4] As versões originais em húngaro estão disponíveis a partir do seguinte Catálogo Electrónico <http://mek.niif.hu/hu/>.

    [5] São elas: Poemas de Miklós Radnóti, trad. de Zoltán Rózsa e versões de Tereza Balté, Porto, O Oiro do Dia, 1982; Zoltán Rózsa (org.), Poetas Húngaros – Antologia, Lisboa, Moraes, 1983, pp. 141-151.

    [6] Sobre o tema, Seamus Heaney, «Egloghe “in extremis”, la capacità di resistenza della pastorale», trad. italiana do original inglês de Gabriella Morisco, in Roberto Andreotti (ed.), Resistenza del Classico, Milano, BUR Rizzoli, 2010, pp. 61-78.

    [7] Destaque merece ser aqui dado à relativamente recente edição do Cuaderno de Bor, com tradução de Susana Lajtaváry e Peter Kiss, Rosário, Miércoles14Ediciones, 2020 (em edição bilingue e no formato original de 15cm x 10 cm).

    [8] Os três poemas aqui oferecidos encontram-se traduzidos na obra Poemas de Miklós Radnóti, cit., pp. 23, 32 e 33, respectivamente; os dois últimos figuram igualmente, em idêntica tradução, na obra organizada por Zoltán Rózsa, Poetas Húngaros – Antologia, cit., pp. 149 e 151; os poemas Marcha Forçada  e Bilhete Postal 4 foram traduzidos por Paulo Schiller e publicados na revista Ilustríssima da Folha de São Paulo, em 14 de Maio de 2014, disponíveis aqui (para assinantes); o poema Bilhete Postal 4 foi também traduzido por Luís Naves e divulgado no blogue Delito de Opinião (disponível aqui).

    [9] Alessandro Fo, «Sogno pastorale e drammi della Storia: fra Mantova e Bor», in Bvllettino Sennese di Storia Patria, CXXI (2014), pp. 213-223, disponível aqui e também aqui.

    [10] É pacífico o entendimento de estar aí presente o símbolo fundamental (a faia despedaçada) da IX Écloga de Virgílio (sobre o assunto, com outras indicações, Alessandro Fo, «Sogno pastorale…», cit., p. 221).

    [11] O corpo era o do violinista Miklós Lorsi, «também ele um “manso”, crescido nas ilusões e nos confortos da beleza» (cfr. Alessandro Fo, «Sogno pastorale…», cit., p. 222).

    [12] A passagem em alemão, glosadíssima dentro e fora da Hungria, pelas suas implicações literárias, políticas, religiosas, rácicas e identitárias, pode ser traduzida deste modo: “este ainda saltita”.


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  • Feyenoord 1.3 (seguido de Rio Ave 5.0)

    Feyenoord 1.3 (seguido de Rio Ave 5.0)


    No Benfica aplica-se a máxima: “quem se se levanta primeiro, calça os chinelos”, de sorte que, enfim, remetido fui hoje, por via da acrescida procura, para a ala esquerda, já algo de esguelha, da Varanda da Luz, que aparentemente é para onde ‘exilam’ os jornalistas estrangeiros – digo eu, pois, aqui ao derredor, vejo ‘olheiros’ da polaca Telewizia Polska, da alemã Sportbild Hamburg e da norte-americana ESPN.

    Bem sei que cheguei ‘resvés Campo de Ourique’, com o apito do árbitro a apanhar ainda a meio da escadaria de mochila às costas e o famigerado farnel do futebol (FFF) na mão, mas sempre poderia o Benfica proceder como os ‘lagartos’ do outro lado da Segunda Circular: reservar posições fixas. Ah, já agora, fornecer uma sandes de leitão de Negrais: dei agora mesmo uma trinca nesta espécie de carcaça e consegui identificar um ligeiro sabor a carne na fatia posta – e não colocada [estás a ver, Manuel Monteiro?] – no pão aberto.

    Enfim, culpem-me também por esta minha pouca inclinação para a pontualidade britânica – e não por considerar os ingleses snobs, que mereçam ser maltratados, como opina o ‘nosso’ almirante Gouveia e Melo –, mas a vida não anda fácil quando, no mesmo dia, se tem de lidar com as bicicletas disfuncionais da EMEL, com umas consultas de processos na ERC, com reclamações na Decathlon por uma encomenda não entregue e já paga [o que valeu uma devolução e um cliente perdido]. No meio disto, restou pouco tempo para avançar com a edição. E como podem, deste modo, aperceber-se, não estou hoje particularmente bem disposto…

    (Golo do Feyenoord, grande porcaria! Isto não estava previsto; logo aos 11 minutos, com uma facilidade enorme)

    Agora ainda menos… TSe calhar, mais valia ter-me atrasado ainda mais. O raio do tempo, esse tirano invisível que insiste em reger a nossa existência, mesmo, ou sobretudo, no futebol, que tudo se passa em noventa minutos mais os descontos. Para alguns, o relógio é uma bússola moral, um farol que os guia entre os perigos do caos, para outros uma imoralidade. O Kant, por exemplo, via a pontualidade como uma virtude, quase uma obrigação moral, um acto de respeito pela humanidade, uma espécie de imperativo categórico de quem entende que o tempo do outro também tem valor. Eu sei, e flagelo-me tanto, pelos meus atrasos.

    (ena, c’um caraças, segundo golo do Feyenoord, e isto depois de um outro golo ter sido anulado; está lindo hoje)

    Até porque nunca sequer usufruo da deliciosa arte de se chegar atrasado. E, se as há: as vantagens! Quem disse que o mundo é feito apenas para os que respeitam o relógio? Nietzsche defendeu, dizem-me, porque confesso que nunca li qualquer passagem a esse respeito, que a obediência cega ao tempo era uma das formas mais subtis de opressão. A liberdade verdadeira, essa sim, é a de quem chega quando bem entende. Chegar atrasado, sejamos sinceros, é uma afirmação de poder, uma espécie de grito silencioso contra a rigidez da vida moderna, sendo, contudo, que tenho dúvidas se a UEFA autorizaria que este jogo somente começasse quando eu chegasse…

    Se eu tivesse chegado apenas às 22 horas, como dono do meu próprio tempo, senhor do meu destino, livre das correntes invisíveis que prendem os outros, não estaria agora impaciente, roendo as unhas, zangado por esta péssima primeira parte; ao invés, no desconhecimento e ignorância estaria a gozar de uma serenidade aristocrática, como se o universo simplesmente tivesse ajustado a sua cadência para se alinhar apenas para não me causar qualquer dano.

    Chega o intervalo, entretanto, e nem sequer vale muito a pena fazer balanços. Foi mau em demasia. Avancemos para o intervalo…

    E que já passou. Veremos como corre esta segunda parte. Vou estar um pouco mais atento nestes próximos minutos… Aliás, só vou escrevere novamente quando o Benfica marcar…

    Isso estou eu agora a dizer porque neste momento sinto-me um existencialista, como Sartre, porque a liberdade de quem não se prende ao relógio pode rapidamente virar angústia. Estás tão livre, tão fora de qualquer compromisso temporal, que de repente percebes que a vida, sem as amarras do tempo, pode parecer um vasto vazio, onde até o prazer perde o gosto. Agora, na verdade, estarei nesta segunda parte agarrado ao relógio para saber se ainda vamos, hélas, a tempo de corrigir na segunda parte do tempo de jogo o mal que se fez na primeira.

    Nisto, meto Epicuro: nem tanto ao mar, nem tanto à terra – o ideal será o equilíbrio. Obviamente, chegar sempre atrasado pode fazer-nos sentir uma espécie de semi-deus – por exemplo, eu poderia nem vir ver o jogo –, mas deste modo não aproveitaria o prazer, que por agora é pouco, de estar aqui. Já aquele que vivem agarrados ao relógio podem acabar sem ter vivido, sempre correndo de um compromisso para o outro, sem parar para sentir o prazer do momento.

    (Goloooooo! Goloooooo! É do Benfica!)

    E agora a pressa…

    Ah, agora a pressa, essa fiel companheira da esperança e dos desesperados. Não há nada como o apelo dramático da sofreguidão quando tudo está prestes a desabar, mas há ainda uma réstia, um lampejo de ventura, que nos possa debelar o sofrimento, Schopenhauer já advertia que a vida é essencialmente sofrimento e se o sofrimento ainda se tornará maior depois de esgotado o tempo de jogo, porque aí a eventual derrota se mostrará irreversível, então o relógio mostra-nos como a esperança se escapa pelos dedos ao som de um tiquetaque, ainda mais quando, lá em baixo, não se anda sequer em correrias desenfreadas.

    Em todo o caso, a pressa e a sofreguidão também nunca foram boas conselheiras nestes momentos, e nem seria desejável que agora, lá em baixo, os jogadores do Benfica se portassem como aqueles trabalhadores de olhos esbugalhados e cabelos desgrenhados, correndo de uma tarefa para outra com a sofreguidão de quem acredita piamente que a pressa resolverá tudo. A pressa, na verdade, nunca se deve confundir nem ser um sinal de desespero. Para Nietzsche, a pressa era mais uma manifestação, uma revolta contra a falta de controlo que temos sobre o mundo. No caso, deste jogo, a pressa advém de, para se pontuar, pelo menos, o Benfica precisa de marcar mais um golo sem sofrer qualquer outro (válido) antes do árbitro apitar pela derradeira vez.

    Aliás, precisamos de um pensamento cartesiano, racional, um “penso, logo existo’ aplicado à bola. E não é um “corro, logo existo’ nem um ‘chuto, logo existo’, mas sim um «penso, logo ganho’. Um jogador perdido em campo, sem direcção, ou a passar para trás, como o João Mário, não ‘existe’ de todo. Mas se apenas pensa, e não corre nem chuta que está ali a fazer? Nada. Na melhor das hipóteses, melhor estaria a escrever crónicas, sem préstimo, ou pouco.

    Enfim, como se anunciam agora seis minutos de desconto, já pouco me importam as congeminações filosóficas: cada passe, cada decisão táctica, pode ser cartesiana ou raquidiana; interessa sim que o Benfica marque…

    Com os seis minutos de desconto, já pouco me importam reflexões: cada passe, racional ou instintivo, que resulte em golo!

    (… mas é o Feyenoord que marca)

    Pronto, guardemos a guitarra. Pela primeira vez desde que subo à Varanda da Luz, vejo o Benfica perder. Aceitemos o amor fati: tanto o sucesso como a derrota são etapas da vida. Nietzsche diria que são necessárias para o espírito. Mas eu só penso no tempo que perdi com esta derrota.

    O ritmo moderno parece pedir-nos pressa a todo o custo, esquecendo a importância de parar e pensar. Agimos por impulso, sempre contra o relógio. A pressa tem sua utilidade, mas é um remédio de efeito breve. Corremos porque acreditamos que isso resolverá tudo, mas, no final, acabamos exaustos, como num labirinto sem saída.


    Felizmente, o meu regresso à Varanda da Luz, quatro dias depois, foi mais feliz. Fiz gazeta apenas para apreciar o jogo, tirar umas fotos e, enfim, vingar-me do Provedor do Adepto do Rio Ave, o ex-presidente de infausta memória do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas… Cinco ‘secos’. Agora, o regresso aqui à Luz, depois das visitas ao Algarve e a Munique (ai Jesus), será com o Porto! Carrega, Benfica! Ou não.


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  • Odair: onde tropeçam as revoluções

    Odair: onde tropeçam as revoluções


    Miguel Sousa Tavares meteu em palavras simples aquilo que todos pensamos, mesmo que não o digamos em voz alta.  Não foi por conduzir embriagado, fugir à polícia, abalroar outros carros depois de se despistar e muito menos por, alegadamente, ter tentado agredir um polícia, que Odair Moniz foi morto, baleado por um agente da PSP. Era preto e vivia num bairro social – e foi isso que facilitou o puxar do gatilho.

    Não precisamos sequer de ir ‘por opiniões’; basta olharmos para os números. Em Março de 2024, um estudo apresentado pela antropóloga Ana Rita Alves dava conta que ciganos e negros tinham uma maior probabilidade de serem mortos pela polícia: 43 e 21 vezes mais, respectivamente, para ser mais preciso.

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    Entre 2002 e 2013, mais de uma dezena de jovens negros (médias de idades a rondar os 19 anos) foram mortos pela polícia. A lista de agressões é muitíssimo mais extensa e não caberia aqui. Também não é preciso explicar que estas mortes, agressões e tratamento diferenciado por parte das autoridades não acontecem na Lapa, nas Avenidas Novas ou no Chiado. Ocorrem na Cova da Mora, na Quinta do Mocho, Bela Vista, Quinta da Princesa, entre outras zonas das quais nada sabemos até a polícia lá entrar.

    O racismo estrutural de uma sociedade vê-se, em parte, pelas reações a crimes deste tipo. Antes sequer de sabermos o que aconteceu, já chovem críticas assumindo que o, neste caso, morto,  fez por merecer o destino. É preto, vive na Cova da Moura e tem cadastro. Um tiro da polícia será, para muitos dos que me estão a ler neste momento,  a coisa mais natural e expectável.

    Reparem que em momento algum desta tragédia ouvimos falar em investigações para se tentar perceber, com algum bom senso, o que falhou. A polícia apressou-se a inventar desculpas para escudar a corporação e transferir responsabilidades para um morto. Primeiro era um carro roubado, depois uma faca. Nada que fosse verdade e, muito menos, que justificasse uma morte.

    Até poderíamos cair no erro humano: um polícia inexperiente, uma reacção precipitada, um tiro falhado. Mas é difícil, cada vez mais difícil, acreditar nas autoridades quando estas mostram uma necessidade constante de fugir às próprias responsabilidades.

    A revolução partiu dos bairros, pela morte de Odair,  e tomou as ruas. A partir daí formaram-se as barricadas. Ouvi falar mais no custo de um autocarro do que nos familiares que Odair tinha deixado para trás. Tal como em Gaza e Beirute em contraponto com Telavive e Kiev, também em Portugal as vidas não têm o mesmo valor. A morte de um preto está em saldo, não dá sequer para os pneus de um autocarro da Carris.

    E foi quando essa revolução partiu para se fazer notada que, definitivamente, os extremismos políticos tiveram a prancha que faltava para surfar a onda. André Ventura, antes sequer de saber o que tinha acontecido, já pedia medalhas e condecorações para o polícia que tinha morto Odair. Nas suas palavras, o polícia tinha “dado o corpo às balas”. Quais balas, André? Se ele tivesse, de facto, dado o corpo às balas, o morto não tinha sido o homem que estava desarmado. Já Pedro Pinto, o líder parlamentar sem autorização para falar pela bancada, tal o limite intelectual apresentado, disse que, “se a polícia atirasse mais a matar, talvez o país estivesse mais na ordem”. 

    (Foto: D.R./Chega)

    Foi a este tipo de gente que os habitantes dos bairros sociais foi dar alimento quando, sem qualquer propósito, desataram a partir propriedade alheia. A sociedade que os coloca de lado em cada momento do dia e que não sabe sequer da sua existência, dificilmente apoia uma luta de carros destruídos e trabalhadores queimados.

    O caso do Tiago, condutor da Carris, queimado e a lutar pela vida numa cama de hospital, é exactamente o contrário do que uma luta contra o racismo e repressão policial deve ser. É colocar trabalhadores contra trabalhadores, pobres contra pobres. E foi nesse momento que a revolução falhou e fracassou, permitindo que a extrema-direita tivesse o que precisa: ódio.

    A forma certa de chamar a atenção para os problemas que afectam os mais desfavorecidos e marginalizados é aquela que aconteceu, há uns dias, com a descida da Avenida da Liberdade por milhares de pessoas, pacificamente a gritarem palavras de ordem, enquanto, na rua ao lado, André Ventura e umas dezenas de rapazes se humilhavam desfilando com mostras de racismo e xenofobia.

    light bulbs, light, idea

    Associações, sindicatos, anónimos, partidos. Todos juntos mostrando que a sociedade se consegue mexer e unir para defender as causas justas. A morte de Odair é inaceitável e, por não ser a primeira vez que tal acontece, as forças de segurança têm que responder por isso. Já são vezes a mais em que as condições que levam a estas mortes são, no essencial, as mesmas. Se queremos que Portugal não seja, de facto, considerado um país racista, estruturalmente, então a culpa não pode continuar a morrer solteira.

    A violência a que foi sujeito o Tiago, um trabalhador da Carris, são igualmente inaceitáveis e mancham, por um bando de marginais, a luta justa pela visibilidade e melhoria de vida nos bairros problemáticos do país. Espero que melhore rapidamente e possa seguir a sua vida, de alguma maneira.

    Portugal continua a ser um país seguro com óbvios problemas de inserção social e demasiados bairros problemáticos. Os números existem e, por mais que a extrema-direita berre, eles não mudam. 

    Somos um país de diversidade étnica e de imigração. A tendência é para aumentar e, portanto, é bom que nos habituemos a isso e compreendamos que, até do ponto de vista económico, Portugal beneficia com esse fluxo de pessoas. Em vez de andarmos a discutir como fechar a porta, matar mais gente ou mandar para outro lado qualquer, devemos é perceber a razão da revolta e do esquecimento dos bairros sociais onde, já agora convém dizer, maior parte das pessoas que por lá vivem, trabalham e pagam impostos.

    selective focus of man smiling near building

    Não se vive num subúrbio, num bairro social ou num gueto, por opção. Vive-se porque a vida nunca mostrou outra possibilidade.

    Os partidos políticos devem fazer o esforço para contribuir para a integração destas pessoas como parte do seu trabalho permanente. Por exemplo, nas políticas de trabalho. É esse o primeiro passo para que alguém pertença a uma sociedade: trabalho. A dignidade humana começa também aí. 

    Deixar estas pessoas por sua conta e esperar pelas desgraças para aparecer serve, essencialmente, para que o fogo que a extrema-direita precisa para existir aumente exponencialmente.

    A morte do Odair poderia ter sido evitada. E o ataque ao Tiago também. O polícia que foi incompetente (estou a dar o benefício da dúvida) não voltar tão cedo às ruas será, na minha opinião, o primeiro passo para demonstrar que se percebeu alguma coisa.

    Uma última nota, num texto que já vai longo, deixo um abraço ao nosso leitor Carlos Maia, um dos primeiros a seguir o PÁGINA UM, que me fez pensar um pouco na relação com quem está desse lado. Conhecemo-nos virtualmente num encontro promovido entre o jornal e os seus leitores onde, educadamente, me explicou como discordava de muito do que eu aqui escrevia. Não há nada melhor do que discordarmos uns dos outros. Sem debate não há ideias novas, progresso e evolução. Sem educação é que não há sequer hipótese de chegarmos a esse ponto. Percebi, ao ver um leitor real, que é para pessoas como o Carlos que opto por escrever. Um abraço para ele e, já agora, felicidades para o seu (nosso) Benfica que, finalmente, se livrou daquele emplastro alemão.

    Tiago Franco é engenheiro de desenvolvimento na EcarX (Suécia)


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.


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  • Estado Social: o ‘Robin dos Bosques’?

    Estado Social: o ‘Robin dos Bosques’?


    Um dos grandes mitos – ou melhor, uma das mais longevas farsas do regime vigente, há mais de meio século em operação – é a suposta missão de fazer o papel de ‘Robin dos Bosques’: roubar os ricos para dar aos pobres.

    Na realidade, essa pretensão não passa de mais um artifício de propaganda insidiosa, destinado a convencer-nos de que os bandidos organizados atrás de partidos políticos estão, de algum modo, ao serviço do povo, em particular dos pobres. A verdade? Servem-se, sem o menor pudor, do nosso suor e sacrifício, mantendo-se confortavelmente a viver à custa do saque institucionalizado.

    Analisemos, pois, a extorsão praticada pelo actual regime sobre os trabalhadores em Portugal que auferem o salário mínimo, actualmente fixado em 820 euros mensais. Repetidamente, assistimos ao lançamento de vitupérios sobre o sector privado por parte destes parasitas, acusando-o de pagar mal, quando, na verdade, o verdadeiro culpado por essa desgraça é essa entidade amorfa e invisível chamada Estado, dirigida por salteadores eleitos por uma minoria da população.

    Segundo o inquérito do INE às despesas das famílias para o período 2022/2023, a despesa dos agregados familiares estava desagregada segundo a Figura 1.

    Desagregação da despesa total anual média por agregado (2022/2023); Unidade: %; Fonte INE (página 21)

    Em primeiro lugar, o grupo despesas com a habitação representa praticamente 40% das despesas totais anuais. Que despesas são aqui consideradas?

    • Rendas: representam 79%; neste caso, o senhorio que arrenda a casa é tributado a uma taxa liberatória de IRS de 28%, inflacionando, desta forma, o valor das rendas;
    • Electricidade e gás: representam 12% deste grupo das despesas; aqui, incidem vários impostos e taxas: (i) Taxa de Exploração e Tarifa de Acesso à Rede; (ii) Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético; (iii) Imposto Especial de Consumo; (iv) Taxa do audiovisual para “financiar” o canal de propaganda estatal; e (v) o inevitável IVA. Assim, o peso da mão do meliante está em torno de 35%;
    • Manutenção, segurança e reparação: representa 3%, incidindo cerca de 19% em tributos sobre a despesa total (IVA a 23%).
    • Conclusão: neste grupo de despesas, o mais importante, o grande batedor de carteiras – conhecido por Estado – leva aproximadamente 29% das despesas das famílias para o seu bolso.

    Por fim, sem entrarmos em detalhes enfadonhos – os detalhes podem ser consultados aqui –, listemos o respectivo saque para cada uma das despesas (ver Figura 2).

    Estimativa das taxa e impostos sobre os valores pagos pelas famílias nas diferentes despesas; Unidade: %; Fonte: análise do autor

    Aqui, importa destacar a extorsão praticada sobre o tabaco (80%), bebidas alcoólicas (50%) e transportes (36%). No caso da saúde, serviços financeiros e serviços de educação, apesar de existirem impostos (imposto de selo nos serviços financeiros), por uma questão de simplificação optou-se por 0%.

    Segundo o estudo do INE, a despesa anual média de um agregado para o 1º quintil (página 33), os mais pobres, foi de 16.294 euros para 2022/2023; assumindo uma subida nas despesas de 8% – sim, a inflação publicada pelo INE é uma farsa –, temos 17.600 euros para uma família, ou seja, aproximadamente 8.800 euros de despesas anuais por pessoa. Temos, assim, o valor de despesas de alguém que recebe o salário mínimo.

    Se multiplicarmos este valor pela percentagem que cada grupo de despesas representa no total e respectiva taxa de extorsão (ver Figura 2), temos o valor do assalto parcial a alguém que recebe apenas 820 euros brutos por mês. A título de exemplo, para o tabaco seriam 70 euros (8.800 euros × 1% × 80%). Fazendo o cálculo global para todos os grupos temos 2.023 euros anuais a favor do grande gatuno.

    Por fim, vamos analisar o que o empregador despende com alguém que recebe o salário mínimo. Tendo em conta que são 14 pagamentos, apesar de apenas 11 meses trabalhados, temos um total de 11.480 euros anuais (820 euros × 14). Sobre isso vai incidir 23,75% de Segurança Social do empregador, ou seja, um custo total de 14.207 euros anuais.

    Por outro lado, sobre o salário bruto do trabalhador incide 11% de segurança social, ou seja, 1.263 euros. Tendo em conta os impostos e taxas supra detalhados, que representam 2.023 euros por ano, temos um salário líquido de apenas 8.278 euros (ver Figura 2), cerca de 58%, enquanto para o Estado seguem 42%!

    Estimativa da repartição de um salário mínimo entre o Estado e o Trabalhador que aufere o salário mínimo; Unidade: euros por ano; Fonte: análise do autor

    Em conclusão, vivemos sob este regime de fantasia, onde se tenta ludibriar os incautos sobre a verdadeira natureza desta máquina de extorsão chamada Estado. E ainda há quem diga, com um quê de ingenuidade: “Mas a segurança social não são descontos que, um dia, nos serão devolvidos?’” Doce ilusão!

    Nada disso; trata-se de mais um imposto, cuidadosamente disfarçado de “desconto”. Não existe nenhum porquinho no qual se guarda o dinheiro para o trabalhador se servir no futuro; na realidade, este está apenas a financiar as pensões dos idosos, num autêntico esquema em pirâmide, tipo Dona Branca ou Madoff. Aliás, os próprios órgãos de propaganda já nos deram a pista, ao proclamarem, sem pudor, que os “descontos” da invasão de terceiro mundo são “lucros” do grande meliante, mais conhecido como Estado.

    Quando um regime justifica a sua extorsão sob o pretexto de “ajuda aos pobres”, o que faz, na realidade, é um assalto sub-reptício, sem o menor pudor ou vergonha na cara. Repito: 42% do salário de um trabalhador a receber o salário mínimo vai directo para onde? Para o bolso do ladrão! Eis, portanto, um regime que se apresenta como o ‘Robin dos Bosques’, mas que, num toque de ironia perversa, age precisamente ao contrário.

    Luís Gomes é empresário


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