Categoria: Imprensa

  • Censura nas redes sociais: juiz recusa recurso da Administração Biden

    Censura nas redes sociais: juiz recusa recurso da Administração Biden

    Um recurso que tentava reverter uma decisão judicial do juiz Terry Doughty que proíbe o Governo dos Estados Unidos de solicitar a censura nas redes sociais foi já rejeitado em Tribunal. Para o juiz da Louisiana, nenhuma entidade estatal ou governamental, incluindo a Casa Branca, podem ordenar eliminação de publicações apenas por serem opiniões diferentes, as quais estão abrangidas pela liberdade de expressão garantida pela Primeira Emenda. Apenas em questões de segurança interna ou externa muito concretas o Governo está autorizado a estabelecer esses contactos.


    É mais uma derrota para o Governo norte-americano e a sua intenção de continuar a aplicar censura nas plataformas que operam redes sociais.

    O juiz distrital dos Estados Unidos Terry Doughty rejeitou ontem um recurso do Departamento de Justiça da Administração Biden que visava reverter a sua ordem anterior que proibiu o Governo, incluindo 11 departamentos de Estados e o próprio Presidente, além de outros funcionários públicos, de contactarem com as tecnológicas para remover conteúdo postados nas redes sociais.

    Para o juiz, os conteúdos divulgados nas redes sociais estão protegidos pela Primeira Emenda – excluindo obviamente conteúdos relativos a actividades ilegais, como pedofilia, conspiração, extorsão, ameaças à segurança do Estado ou de infraestruturas no estrangeiro.

    Joe Biden e a sua Administração não vão poder continuar a censurar meras opiniões contrárias à sua.

    Segundo o juiz, “é provável que os autores da acção [onde se incluem o Estados da Louisiana e do Missouri] provem que todos os Réus [Administração Biden e departamentos de Estado, além de funcionários] coagiram, encorajaram significativamente e/ou participaram conjuntamente com empresas de redes sociais para suprimir publicações de cidadãos norte-americanos que expressavam opiniões que eram contra as vacinas da covid-19, contra confinamentos, publicações que deslegitimaram ou questionaram os resultados das eleições de 2020 e outros conteúdos não sujeitos a qualquer exceção à Primeira Emenda”.

    O juiz frisou ainda que “estes itens estão protegidos pela liberdade de expressão e foram aparentemente censurados por causa dos pontos de vista que expressaram”. Salientou que “a discriminação de pontos de vista está sujeita a um escrutínio rigoroso”.

    Recorde-se que a decisão anterior deste juiz “apenas proíbe algo que os Réus não têm o direito legal de fazer: entrar em contacto com empresas de redes sociais com o objetivo de solicitar, encorajar, pressionar ou induzir, de qualquer forma, a remoção, exclusão, supressão ou redução de conteúdo que contenha liberdade de expressão protegida publicada em redes sociais”.

    Terry A. Doughty, tomou decisão histórica.

    O juiz deu provimento parcial a uma providência cautelar e proibiu, com efeitos a partir do simbólico dia 4 de Julho, que a Administração Biden e várias agências e organizações estatais façam acordos com gigantes tecnológicas – como o Twitter, o Youtube e o Facebook – para que sejam censurados ou restringidos conteúdos nas suas plataformas – uma prática que se normalizou durante a pandemia de covid-19.

    Além de Joe Biden, a proibição abrange quatro dezenas de pessoas associadas à Administração Biden e ainda 11 entidades públicas, entre as quais o National Institute of Allergy & Infectious Diseases – que foi presidido por Anthony Fauci, durante a pandemia –, o Federal Bureau of Investigation (FBI), o Centers for Disease (CDC), o Food & Drug Administration (FDA) e diversos departamentos federais.

    Todos ficam agora impedidos de contactar as plataformas digitais com “o propósito de incitar, encorajar, pressionar ou induzir de qualquer maneira a remoção, exclusão, supressão ou redução de conteúdo que contenha liberdade de expressão protegida”.

    Martin Kulldorff, Sunetra Gupta e Jay Bhattacharya são três eminentes investigadores que, por se oporem às medidas radicais aplicadas pelos Governos durante a pandemia, foram difamados e alvo de restrições com a participação activa e empenhada da imprensa e redes sociais.

    Nessa medida cautelar (preliminary injunction), revelada na terça-feira passada num documento de 155 páginas, o juiz determinou ainda a proibição de as agências governamentais “sinalizarem publicações específicas às plataformas digitais, ou solicitarem relatórios sobre os seus esforços para banir conteúdos”. No entanto, ficam excluídos desta decisão eventuais notificações sobre “publicações que detalhem crimes, ameaças à segurança nacional ou tentativas externas de influenciar as eleições”.

    A ordem de Doughty surge no seguimento de um processo interposto pelo procurador-geral do Estado da Louisiana, Jeff Landry, e o antigo procurador-geral do Estado do Missouri, Eric Schmitt. Os queixosos alegaram que o Governo Federal norte-americano violou sistematicamente a Primeira Emenda, tendo invocado, entre vários exemplos, casos de censura de publicações que visaram Hunter Biden, ou que defendiam a teoria da fuga de laboratório do SARS-CoV-2.

    No leque de queixosos estava também o bioestatístico sueco Martin Kulldorff e o norte-americano Jay Bhattacharya. Tal como outras personalidades, estes conceituados investigadores – o primeiro é professor da Harvard Medical School e o segundo professor da Universidade de Stanford – foram alvo de intensas campanhas de difamação e de censura nas redes sociais por apresentarem, com informação científica, opiniões contrárias às da Organização Mundial da Saúde.

  • Administração Biden proibida por juiz de pressionar Big Tech para aplicar censura

    Administração Biden proibida por juiz de pressionar Big Tech para aplicar censura

    Ontem, no Dia da Independência dos Estados Unidos, um juiz federal do Estado da Louisiana colocou um travão à censura nas redes sociais e determinou que o Governo não poderá pressionar nem estabelecer parcerias com as gigantes tecnológicas para retirar ou restringir publicações e conteúdos nas suas plataformas. Esta conduta intensificou-se, nos Estados Unidos e na Europa durante a pandemia de covid-19, sob o pretexto do combate à “desinformação”.


    Um juiz federal do Estado norte-americano da Louisiana proibiu, com efeito a partir de ontem, que a Administração Biden estabeleça acordos com as gigantes tecnológicas – como o Twitter, o Youtube e o Facebook – para que sejam censurados ou restringidos conteúdos nas suas plataformas – uma prática que se intensificou durante a pandemia de covid-19.

    A decisão do juiz Terry A. Doughty – nomeado durante a administração de Donald Trump em 2017 – concedeu razão aos apelos, como queixosos, dos Estados da Louisiana e do Missouri e ainda a cinco particulares, entre os quais o bioestatístico sueco Martin Kulldorff e o norte-americano Jay Bhattacharya.

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    Tal como outras personalidades, estes conceituados investigadores – o primeiro é professor da Harvard Medical School e o segundo professor da Universidade de Stanford – foram alvo de intensas campanhas de difamação e de censura nas redes sociais por apresentarem, com informação científica, opiniões contrárias às da Organização Mundial da Saúde.

    Além de Joe Biden, a proibição abrange quatro dezenas de pessoas associadas à Administração Biden e ainda 11 entidades públicas, entre as quais o National Institute of Allergy & Infectious Diseases – que foi presidido por Anthony Fauci, durante a pandemia –, o Federal Bureau of Investigation (FBI), o Centers for Disease (CDC), o Food & Drug Administration (FDA) e diversos departamentos federais. Todos ficam agora impedidos de contactar as plataformas digitais com “o propósito de incitar, encorajar, pressionar ou induzir de qualquer maneira a remoção, exclusão, supressão ou redução de conteúdo que contenha liberdade de expressão protegida”.

    Nesta medida cautelar (preliminary injunction), revelada num documento de 155 páginas, o juiz determinou ainda a proibição de as agências governamentais “sinalizarem publicações específicas às plataformas digitais, ou solicitarem relatórios sobre os seus esforços para banir conteúdos”. No entanto, ficam excluídos desta decisão eventuais notificações sobre “publicações que detalhem crimes, ameaças à segurança nacional ou tentativas externas de influenciar as eleições”.

    Terry A. Doughty, tomou decisão histórica.

    A ordem de Doughty surge no seguimento de um processo interposto pelo procurador-geral do Estado da Louisiana, Jeff Landry, e o antigo procurador-geral do Estado do Missouri, Eric Schmitt. Os queixosos alegaram que o Governo Federal norte-americano violou a Primeira Emenda, tendo invocado, entre vários exemplos, casos de censura de publicações que visaram Hunter Biden, ou que defendiam a teoria da fuga de laboratório do SARS-CoV-2.

    A acusação de censura imputada por Landry e Schmitt à Administração Biden teve eco nas palavras de Terry A. Doughty, que concluiu que “se as alegações feitas pelos queixosos forem verdadeiras, o presente caso provavelmente envolve o maior ataque contra a liberdade de expressão na História dos Estados Unidos”.

    De entre as organizações com as quais o Governo Federal norte-americano deixa de poder comunicar com o intuito de suprimir publicações nas redes sociais, estão entidades externas, como o Virality Project e o Stanford Internet Observatory, que já tinham sido alvo de escrutínio mediático aquando da divulgação dos Twitter Files.

    Martin Kulldorff, Sunetra Gupta e Jay Bhattacharya são três eminentes investigadores que, por se oporem às medidas radicais aplicadas pelos Governos durante a pandemia, foram difamados e alvo de restrições com a participação activa e empenhada da imprensa e redes sociais.

    De facto, os documentos internos da rede social divulgados com a autorização de Elon Musk, aquando da sua aquisição do Twitter no ano passado, avolumaram o debate em torno de um aparente conluio entre funcionários governamentais e a Big Tech para limitar a liberdade de expressão no mundo digital.

    Esta decisão em defesa da liberdade de expressão foi contestada por alguns círculos, mas aplaudida por outros, sobretudo jornalistas, cientistas e académicos que foram alvo de censura pelas suas opiniões sobre a pandemia. Nesta lista, constam Andrew Lowenthal e Paul D. Thacker, que foram, aliás, recentemente entrevistados pelo PÁGINA UM.

    No Twitter, Thacker respondeu a uma alegação da Casa Branca, que rejeitou ter pressionado as plataformas tecnológicas para censurar conteúdos. O jornalista, que participou na divulgação dos Twitter Files, aludiu especificamente a um e-mail de Rob Flaherty, no qual o funcionário da Administração Biden reagia de forma acesa e autoritária à recusa do Facebook em restringir algumas contas. “Vocês estão a falar a sério, porra? Eu quero uma resposta sobre o que aconteceu aqui e quero-a hoje”, recorda Thacker numa publicação partilhada.

    Para além dos procuradores-gerais, o processo foi também encabeçado por dois epidemiologistas que contestaram a gestão da pandemia, Jayanta Bhattacharya e Martin Kulldorff, Aaron Kheriatv, um professor demitido da Universidade da Califórnia pela sua recusa da vacina para a covid-19, Jill Hines, da associação Health Freedom Louisiana, e Jim Hoft, do site Gateway Pundit.

    As reacções à ordem de Doughty foram mistas, demonstrativas das fortes clivagens ideológicas, com os democratas a serem mais favoráveis a um melhor controlo daquilo que se convencionou chamar desinformação, mas que se transforma em mera censura como arma de silenciamento.

    Certo é que o procurador-geral da Louisiana apelidou a decisão como “histórica”, enquanto o procurador-geral do estado do Missouri festejou efusivamente no Twitter: “Feliz aniversário, América! Tens a tua Primeira Emenda de volta!”.

    O New York Times, que adianta que esta decisão judicial pode ter “implicações significativas na Primeira Emenda”, tentou obter comentários das plataformas mas sem sucesso. E diz também que a Casa Branca deverá recorrer da decisão.

  • CMVM lança alerta sobre empresa polémica promovida pela TVI

    CMVM lança alerta sobre empresa polémica promovida pela TVI

    O “polícia” do mercado de capitais português alertou hoje, em respostas ao PÁGINA UM, que a suposta empresa dbl.pt, publicitada numa reportagem polémica emitida pela TVI, não está autorizada a operar em Portugal. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários deixa ainda um aviso aos investidores e recomenda cautela em relação a promessas de lucros até 40% em investimentos, como os que são feitos pela dbl.pt, apresentada na reportagem como uma empresa de investimentos em criptoactivos liderada por um “jovem milionário português”, Renato Duarte Júnior. O Banco de Portugal já tinha confirmado ao PÁGINA UM que a dbl.pt não consta da lista de intermediários de activos digitais autorizados a operar no país, mas ainda se aguarda uma reacção do supervisor liderado por Mário Centeno ao caso que tem gerado queixas e polémica e já levou o regulador dos media e analisar a reportagem.


    O “polícia” do mercado de capitais português alertou, em respostas enviadas ao PÁGINA UM, que uma suposta empresa publicitada numa polémica reportagem da TVI sobre um “jovem milionário português” não está autorizada para operar em Portugal.

    A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários sublinha que a dbl.pt não pode operar no país e recomenda ainda cautela aos investidores em relação a promessas de lucros de até 40% em investimentos.

    A reacção da CMVM surge depois de o PÁGINA UM ter questionado os supervisores financeiros sobre a polémica gerada em torno da reportagem “Repórter TVI: Júnior, o milionário improvável”, protagonizada pela jornalista Conceição Queiroz, emitida na passada quarta-feira no Jornal Nacional, em horário nobre.

    “A entidade [dbl.pt] não está registada ou autorizada a operar em Portugal e, consequentemente, não pode prestar serviços de investimento”, refere o regulador nas respostas enviadas ao PÁGINA UM.

    A CMVM informa “ainda que os investidores devem ser especialmente cuidadosos com promessas de rendimento de 40% numa data futura porque não são conhecidos da CMVM instrumentos financeiros com essas caraterísticas ou entidades financeiras sujeitas à sua supervisão que garantam o capital e o rendimento nesses termos”.

    O regulador da bolsa “considera que, perante decisões de investimento, os potenciais investidores devem ser especialmente cautelosos ou procurar aconselhamento profissional”.

    Reportagem da TVI apresenta o negócio de Renato Duarte Júnior como um caso de sucesso, sem verificar sequer a existência legal da sua empresa e se opera de acordo com o mercado já bastante regulado da cripto-economia.

    O programa da TVI gerou várias queixas que chegaram ao regulador dos media, levando a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) a confirmar ao PÁGINA UM que está a analisar a reportagem.

    Nas suas respostas, a CMVM recorda que “os mercados de criptoativos não se encontram ainda sujeitos a regulação/supervisão”, os prestadores de serviços relacionados com ativos virtuais “já se encontram sujeitos a registo junto do Banco de Portugal, mas apenas na vertente relacionada com a prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo”. Ou seja, mesmo sabendo-se que a CMVM é o supervisor dos intermediários financeiros, este regulador considera que a responsabilidade de controlo cabe, por agora, em exclusivo ao Banco de Portugal.

    Apesar das insistências do PÁGINA UM, ainda se aguardava, à hora da escrita desta notícia (18h30) uma reacção formal do Banco de Portugal, a entidade responsável pelo registo dos intermediários de activos digitais. Ao PÁGINA UM, o supervisor liderado por Mário Centeno já tinha confirmado que a dbl.pt não se encontra na lista das 10 empresas de criptoactivos autorizadas a operar em Portugal.

    Mário Centeno, governador do Banco de Portugal.

    A reportagem da TVI causou indignação e tem sido alvo de fortes críticas na comunidade portuguesa de profissionais de criptomoedas e criptoactivos, enquanto nas redes sociais e fóruns de debate online chovem palavras de condenação e insultos ao canal de TV, junto com apelos a uma intervenção da ERC.

    Na reportagem, o canal de TV entrevista o português Renato Duarte Júnior, de 29 anos, que aparenta viver uma vida de luxo no Dubai, sendo apresentado como presidente-executivo (CEO) da empresa dbl.pt. Ao longo da reportagem, são feitas diversas entrevistas em iates e mostrados cenários compatíveis com uma vida de luxo.

    A reportagem, que está disponível na plataforma na TVI, dá o “jovem milionário” como “um exemplo de quem conseguiu singrar no mercado da moeda virtual”.

    Mas existem muitas dúvidas sobre a alegada empresa dbl.pt, que é apontada como tendo sede no Dubai e muitas das afirmações de Renato Júnior são lidas pela comunidade de cripto-economia como duvidosas, como a sua afirmação de que faz 18.000 dólares por segundo, por exemplo.

    Como noticiou anteontem o PÁGINA UM em exclusivo, a Federação das Associações de Cripto-Economia (FACE) alertou que o conteúdo da reportagem e a “imagem errada” transmitida de enriquecimento fácil e rápido, através de um suposto investimento em activos digitais, pode levar investidores ao engano.

    Num comunicado divulgado ontem, aquela Federação denuncia que “as associações da FACE receberam
    dezenas de mensagens que indicam uma procura elevada pelos serviços da DBL por parte dos
    espectadores – algo também evidenciado nas redes sociais – comprovando que, direta ou
    indiretamente, esta peça acabou por promover um negócio que exige uma investigação profunda”.

    Um e-email enviado pelo PÁGINA UM para o endereço info@dbl.com, que se encontra no site da suposta empresa, veio devolvido. A TVI ainda não respondeu e não foi possível até, ao momento, pedir um comentário a Renato Júnior, sobre o qual não se encontram contactos disponíveis, nomeadamente na Internet.


    Nota: Notícia actualizada aqui.

    ão aqui.

  • Federação das Associações da Cripto-Economia lança alerta sobre reportagem da TVI

    Federação das Associações da Cripto-Economia lança alerta sobre reportagem da TVI

    Profissionais do sector da economia baseada na tecnologia blockchain criticam e demarcam-se da reportagem emitida pela TVI na quarta-feira passada sobre um alegado jovem português milionário, Renato Duarte Júnior, apresentado como CEO de uma empresa de investimentos. A Federação das Associações de Cripto-Economia critica a reportagem, bem como a “imagem errada” de enriquecimento fácil e rápido dada, e teme que leve investidores ao engano. O “jovem milionário” é um desconhecido na comunidade de criptomoedas portuguesa e a sua empresa nem consta da lista de entidades de criptoactivos autorizadas pelo Banco de Portugal a operar no país.


    Uma reportagem da TVI sobre um “jovem milionário português” está a gerar uma forte onda de críticas sobre a estação de televisão por parte da comunidade de profissionais do sector das criptomoedas e criptoactivos em Portugal.

    A Federação das Associações de Cripto-Economia (FACE) alerta que o conteúdo da reportagem e a “imagem errada” transmitida de enriquecimento fácil e rápido, através de um suposto investimento em activos digitais, pode levar investidores ao engano.

    Para Nuno Lima Luz, presidente da Associação Portuguesa de Blockchain e Criptomoedas (APBC) – que integra a FACE –, a ideia passada pela reportagem “é perniciosa”. “Ficámos surpreendidos com a reportagem que passou em horário nobre. Na comunidade, todos nos manifestamos contra as ideias transmitidas pela reportagem, as quais não representam o sector”, disse ao PÁGINA UM. “Estranhamos este tipo de reportagem que promove este tipo de actividades em horário nobre”, afirmou. Acrescentou que a FACE está a preparar um comunicado à imprensa com críticas e alertas sobre a reportagem.

    Na reportagem “Repórter TVI: Júnior, o milionário improvável”, o canal de TV entrevista o português Renato Júnior, de 29 anos, que aparenta viver uma vida de luxo no Dubai, sendo apresentado como presidente-executivo (CEO) da empresa dbl.pt. Ao longo da reportagem, são feitas diversas entrevistas em iates e mostrados cenários compatíveis com uma vida de luxo.

    A reportagem, que está disponível na plataforma na TVI, é acompanhada de um pequeno texto de resumo onde se pode ler: “Tem 29 anos e é um exemplo de quem conseguiu singrar no mercado da moeda virtual. Deixou a escola para trás e aos 17 anos emigrou para o Canadá, onde foi trabalhar nas obras”.

    O texto da promoção da reportagem prossegue: “Com o dinheiro que amealhou investiu num computador e num telemóvel e esta foi a porta de entrada para o mundo do dinheiro digital.”

    Segundo a reportagem, Renato Júnior “começou com um investimento de 100 euros” e “atualmente, vive no Dubai e é de lá que gere um negócio de milhões”.

    O empresário e investidor apresenta-se assim: “Eu sou o Júnior. Venho de uma família humilde e aos 17 anos emigrei para o Canadá. Trabalhei na construção, mas sempre assumi que um dia ia fazer muito dinheiro.”

    A comunidade portuguesa de cripto-economia desconhece quem é Renato Júnior. Na reportagem, o único rosto familiar no sector em Portugal é o de Fred Antunes, CEO da RealFevr e ex-presidente da APBC, o qual foi entrevistado pela TVI para a reportagem, e que prestou comentários gerais sobre o sector.

    Consultado o site do Banco de Portugal, verifica-se que a empresa dbl.pt não consta da lista de 10 entidades que estão actualmente autorizadas pelo regulador para intermediar investimentos em criptomoedas e activos digitais no país.

    Pesquisando na Internet, encontra-se um site de uma empresa com o endereço dbl.pt, o qual não dispõe de contactos nem de informação sobre a sociedade, os seus proprietários ou gestores. Ao entrar na página, é mostrado um aviso relativo a phishing e é pedido ao utilizador que verifique sempre se está a usar o endereço dbl.pt.

    Na área de respostas a perguntas frequentes, a dbl.pt refere que tem dois tipos de produtos: um promovido como sendo “seguro”, estando o investimento alegadamente garantido e com promessa de lucros até 40%; e no segundo produto o capital investido já não é garantido, embora sejam prometidos lucros que, diz-se no site, podem ir até os 1.894%. Neste caso, no reverso da medalha, há a possibilidade de o investimento se perder na totalidade.

    O PÁGINA UM encontrou um outro site digitando www.dbl.pt, mas aqui surge uma mensagem de erro “503 – serviço temporariamente indisponível”.

    Ainda não foi possível obter um comentário de Renato Júnior ou da dbl.pt, nem da TVI.


  • Reuniões autárquicas: Comissão Nacional de Protecção de Dados e Entidade Reguladora para a Comunicação Social com visões antagónicas

    Reuniões autárquicas: Comissão Nacional de Protecção de Dados e Entidade Reguladora para a Comunicação Social com visões antagónicas

    Gravar som e/ ou imagens de sessões públicas de órgãos autárquicos, para transmitir online, pode expor a vida privada de quem nem sequer piou. Por isso, tem de ser pedida autorização expressa sem a qual nada feito. Esta é a visão redutora de uma orientação da Comissão Nacional de Protecção de Dados, mas que entra em conflito com uma deliberação praticamente da mesma data da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, para quem as restrições para usar equipamentos de gravação se equipara à denegação do exercício do direito a informar.


    Dois pareceres com poucos dias de distância – o primeiro da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e o segundo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) – ameaçam causar interpretações antagónicas para a captação de imagens e sons de reuniões de órgãos autárquicos quer por parte do público quer por parte sobretudo dos jornalistas.

    Em Abril passado, uma orientação da CNPD, a pretexto de vários pedidos de esclarecimento sobre a transmissão na Internet das reuniões camarárias e de Juntas de Freguesia considerou que “a transmissão áudio e vídeo em direto e online das reuniões dos principais órgãos autárquicos corresponde a um tratamento de dados pessoais (…) por implicar a recolha e divulgação de informação relativa a pessoas singulares identificadas ou identificáveis”.

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    Para este organismo, com uma visão extremamente lata sobre o conceito de dados nominativos, em causa está “não apenas a imagem das pessoas, o que revela ainda o local e contexto em que se encontram em determinado momento, como também o conteúdo das suas declarações, as quais podem expor, entre outros dados pessoais, aspetos da vida privada dos declarantes ou de terceiros e revelar convicções políticas, filosóficas ou de outra natureza.”

    A CNPD considera que a transmissão dessas imagens e mesmo das opiniões que possam ser transmitidas durante uma reunião autárquica “pode ainda promover ou facilitar a estigmatização e discriminação das pessoas cujos dados sejam assim divulgados, tendo em conta o risco de reutilização dos dados pessoais expostos na Internet”, concluindo que “a exposição da vida privada é irreversível”.

    Na orientação, a CNPD defende que as reuniões autárquicas são distintas das sessões na Assembleia da República, uma vez que naquelas os participantes “não o fazem na qualidade de cidadãos para expor as suas necessidades ou as suas perspetivas pessoais quanto às necessidades públicas”, mas sim “em termos que facilmente resultam na exposição da vida privada e familiar”.

    Fotografia: Médio Tejo

    Nessa medida, a CNPD considera que deve ser obtido “o consentimento prévio e expresso de todos as pessoas abrangidas pela filmagem e transmissão”, devendo todos serem alertados “especificamente para o facto de as imagens e som, uma vez disponibilizados online, serem suscetíveis de reutilização e difusão por terceiros”.

    A interpretação da CNPD vai não apenas a quem faça declarações como aqueles que lá estejam a assistir, incluindo os “trabalhadores que prestem apoio durante a reunião”.

    Esta visão absolutamente restritiva – que acabará por abranger a captação de imagens e sons por profissionais da comunicação social, quer para transmissão em directo quer para uso noticioso – entra assim em conflito com o direito de acesso à informação por parte dos jornalistas, que inclui captação de som e imagem sem autorização específica nas reuniões autárquicas por se realizarem em locais públicos.

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    E é nesse contexto que a ERC se debruça numa deliberação aprovada em 27 de Abril, mas apenas divulgada esta semana, a pedido de esclarecimento do jornal regional Notícias LX sobre se “será legítima a proibição de recolha de sons e imagens em reuniões públicas de órgãos autárquicos”.

    Na sua deliberação, a ERC defende que, “como princípio de ordem geral, e no âmbito das reuniões públicas de um órgão autárquico, será inadmissível o estabelecimento, por iniciativa do órgão promotor da reunião, de toda e qualquer limitação que objetivamente contenda com o regular desempenho da atividade profissional aí exercida por um jornalista, e que, simultaneamente, não se revele estritamente necessária ou adequada a assegurar o normal funcionamento de tais reuniões.”

    Na sua exposição, este regulador acrescenta que “por princípio, não devem ser colocadas quaisquer restrições injustificadas à captação, reprodução e divulgação do conteúdo com relevo informativo derivado da realização de uma reunião pública de um órgão autárquico”, acrescentando que “restrições ou proibições de recolha de sons e imagens (…) apenas em circunstâncias excecionais e devidamente justificadas será de tolerar, por contender com aspetos essenciais da própria cobertura informativa do evento em causa”.

    E diz mesmo que existe sim “o direito que os órgãos de comunicação social têm de utilizar os meios técnicos necessários ao desempenho da sua atividade (…) para efeitos de efetivação do exercício do seu direito de acesso a locais públicos para fins de cobertura informativa”, pelo que “vedar a jornalistas o acesso ou a permanência a locais públicos para efeitos de cobertura informativa ou proibir-lhes a utilização nesses mesmos locais dos meios técnicos e humanos necessários ao desempenho da sua atividade, representam condutas juridicamente equiparáveis, pela negativa, do ponto de vista de denegação do exercício do direito a informar e, em última instância, da própria liberdade de informação.”

    Aliás, o Conselho Regulador da ERC recorda até que “preenche o tipo de crime de atentado à liberdade de informação ‘quem, com o intuito de atentar contra a liberdade de informação, apreender ou danificar quaisquer materiais necessários ao exercício da atividade jornalística pelos possuidores dos títulos previstos na presente lei ou impedir a entrada ou permanência em locais públicos para fins de cobertura informativa’, que pode ser punido com prisão até um ano ou com multa até 120 dias”.

    E, por fim, a ERC até reitera “a particular valorização conferida, no contexto apontado, à obediência estrita ao imperativo constitucional de ausência de discriminações em matéria de direito de acesso, frequentemente violado através da imposição de condicionamentos arbitrários, intuitu personae, a agentes de informação considerados hostis pelos organizadores de eventos abertos à comunicação social.”

  • #TwitterFiles: Universidade de Stanford foi o epicentro de uma tenebrosa máquina de censura

    #TwitterFiles: Universidade de Stanford foi o epicentro de uma tenebrosa máquina de censura

    É mais um episódio tenebroso da gestão da pandemia da covid-19. A Universidade de Stanford liderou um projecto para “caçar” textos nas redes sociais, indicando mesmo pessoas e também temas que deveriam ser banidos, mesmo que não fossem falsos. Os Twitter Files revelam agora que as universidades, que deveriam ser o primeiro reduto da liberdade de expressão e de questionamento, funcionaram afinal como uma máquina de censura.


    Virality Project – assim se chamava o projecto liderado pela Universidade de Stanford, iniciado em Maio de 2020, em colaboração com a Tandon School of Engineering, o Center for an Informed Public, o Centre for Social Media and Politics, o National Conference on Citizenship, a Graphika e a DFRLab. Mas em vez de apenas estudarem comportamentos sociais, o projecto acabou por se transformar numa “máquina de censura”, sobretudo quando, a partir do início de 2021, encetaram uma colaboração directa com o Twitter e outras redes sociais. 

    Na mira dos académicos estava a “moderação” de uma ampla variedade de discursos em redor da pandemia, desde as teorias da imunidade natural e da alegada fuga do SARS-CoV-2 do laboratório de Wuhan, até “piadas preocupantes” e casos reais de efeitos adversos às vacinas anti-covid. Relatos de países que tivessem proibido algumas vacinas, ou de mortes de celebridades após a vacinação também estavam incluídos.

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    Na prática, o projecto consistiu numa rede de censura de todas as publicações que pudessem beliscar a confiança da população face às vacinas contra a covid-19 – mesmo que estivessem em causa informações factuais e verdadeiras. O Virality Project registou uma actividade visível a partir de 2021, e deixou de ser actualizado em Agosto do mesmo ano.

    A acção de censura do Virality Project orquestrada por universitários – homens da Ciência, portanto – é o mais recente episódio dos Twitter Filles, ontem divulgado por Matt Taibbi, um dos jornalistas independentes que tem tornado públicas as práticas daquela rede social durante a pandemia, e antes da sua compra por Elon Musk.

    Na fachada, de acordo com o seu site oficial, o Virality Project era “uma coligação de entidades de pesquisa focada em apoiar a troca de informações em tempo real entre a comunidade de pesquisa, autoridades de saúde pública, agências governamentais, organizações da sociedade civil e plataformas de social media“, com o objectivo de “detectar, analisar e responder a incidentes de desinformação sobre a vacina contra a covid-19 em ecossistemas online e, finalmente, mitigar o impacto de narrativas que, de outra forma, prejudicariam a confiança do público na segurança desses processos nos Estados Unidos”. Mas foi muito mais do que isso.

    Os Twitter Files continuam a revelar um mundo tenebroso de censura e controlo de informação durante a pandemia.

    A parceria entre o Twitter e o Virality Project teve início pouco tempo depois da tomada de posse de Joe Biden, em Fevereiro de 2021. Nesse mês, a rede social recebeu o primeiro relatório semanal sobre “desinformação anti-vacinas” que, no entanto, continha “inúmeras histórias verdadeiras”, como salienta Matt Taibbi.

    Até as preocupações com a perda de direitos e liberdades com a eventual criação de um certificado digital de vacinação foram consideradas como informações imprecisas, como se lê num relatório endereçado à equipa do Twitter.  De facto, a veracidade, ou falta dela, não importava: desde que fosse susceptível de “promover hesitação vacinal”, qualquer conteúdo poderia ser considerado “malinformation” e, assim, alvo de censura. Ao contrário da “desinformação”, o termo malinformation designa informações que, sendo factuais, são veiculadas com o propósito de causar dano a um cidadão, país ou organização. 

    Para além do Twitter, o Virality Project colaborava ainda com o Facebook, Instagram, Google, Youtube, Tiktok e o Pinterest.  Segundo Taibbi, o projecto depressa ganhou também “visibilidade” junto de outras plataformas alternativas, como o Telegram e o Parler.

    O Virality Project teve autonomia para classificar entidades como suspeitas. Assim, por exemplo, o Worldwide Rally for Freedom – uma iniciativa organizada via Telegram, que abrangeu várias manifestações em dezenas de países contra as medidas anti-covid – ficou descrita como sendo uma fonte de “desinformação”.

    Num dos relatórios enviados ao Twitter, alertava-se aquela rede social para a data em que estava previsto o próximo protesto, acrescentando-se a hashtag utilizada para as publicações sobre o evento, #WewillALLbethere, e o facto de estar a “ganhar tracção online entre os principais influencers cépticos da covid-19, tanto na Inglaterra como na França”.

    Outro relatório do Virality Project versava sobre os comprometedores e-mails de Anthony Fauci, o antigo director do National Institute of Allergy and Infectious Diseases (NIAID) divulgados legalmente no âmbito do Freedom of Information Act em Junho de 2021. Os e-mails, que abordavam as directrizes para as máscaras e a fuga de laboratório, foram vistos pelo Partido Republicano como uma prova de que Fauci “enganou o público americano”, referia-se no relatório. 

    Colaboração iniciou-se em Fevereiro de 2021.

    Por exemplo, neste caso foi até identificado um denominado “influenciador anti-vaxxer”, Alex Berenson, antigo jornalista do The New York Times e conhecido escritor norte-americano. Berenson chegou a ter a conta suspensa em Agosto de 2021, apenas sendo restabelecida no início de 2022 num acordo extra-judicial.

    Noutros casos, são identificados “reiterados infractores” (repeat offenders), os quais deveriam ser vigiados por ser expectável que viessem a escrever sobre temas delicados. Neste grupo constava o advogado Robert F. Kennedy Jr..

    O projecto da Universidade de Stanford considerou, de forma completamente abusiva, que referências ou alegações sobre os e-mails de Fauci também configuravam desinformação, já que “fomentavam desconfiança”.

    Matt Taibbi refere que até no seu último relatório, o Virality Project qualificava como desinformação a tese de que “a vacina não prevenia a transmissão, ou que os Governos planeavam implementar passaportes digitais”. “Ambas [as teses] se revelaram verdadeiras”, salienta agora o jornalista.

    A hipótese, que agora é assumida pelo FBI, foi classificada como desinformação pelas redes sociais por influência da Universidade de Stanford.

    A colaboração com o Virality Project marcou, conforme se consta agora neste episódio dos Twitter Files, um ponto de viragem nos critérios da rede social sobre os conteúdos afectos à covid-19 que pudessem ser “sinalizados”. Até Julho de 2020, ainda nas primeiras fases da pandemia, o Twitter somente “cortava” informações que fossem “comprovadamente falsas” sobre a covid-19. 

    Depois dessa data, a plataforma tecnológica então liderada por Jack Dorsey, sucumbiu aos padrões impostos pelo Virality Project, cujo principal objectivo era não melindrar os cidadãos norte-americanos no que dizia respeito à vacinação anti-covid.

    Embora os documentos agora revelados pelos Twitter Files sejam apenas sobre esta rede social – e já não se apliquem sobre os seus utilizadores –, mostra-se fortemente plausível que as outras redes sociais também tenham sido seduzidos pelo Virality Project. Aliás, o Facebook ainda censura e aplica “castigos” aos seus utilizadores, mesmo sobre matérias já comummente aceites como verdadeiras. Esta semana, mesmo referências feitas pelo PÁGINA UM às declarações do ministro da Saúde alemão, Karl Lauterbach, foram abusivamente eliminadas pela rede social de Mark Zuckerberg.

    Leia aqui toda a cobertura dos “Twitter Files” feita pelo PÁGINA UM.

  • Estados Unidos: Combate à desinformação estrangeira serviu para censurar americanos

    Estados Unidos: Combate à desinformação estrangeira serviu para censurar americanos

    Uma organização criada no último ano da presidência de Barack Obama, o Global Engagement Center (GEG), que visa alegadamente o combate a desinformação estrangeira, está no centro da nova polémica revelada pelos chamados “Twitter Files” – Parte 17. Aquela entidade, habitualmente classificada como departamento estatal, financia diferentes organizações em vários países para o alegado combate a desinformação. Entre as organizações que financia, está alegadamente uma britânica que “classifica” órgãos de comunicação social por níveis de “risco”, o que gera menos receitas publicitárias para os media considerados com pior classificação. Mas há mais. Os Estados Unidos financiaram, através do GEG, organizações que criaram listas negras de contas no Twitter, incluindo de cidadãos norte-americanos comuns.


    É mais uma polémica a juntar às que já foram criadas com a divulgação dos chamados “Twitter Files”, que têm vindo a expor as antigas práticas de censura da rede social Twitter.

    Na edição número 17 dos “Twitter Files”, o jornalista Matt Taibbi revela que uma organização criada no último ano da presidência de Barack Obama para alegadamente combater a desinformação estrangeira, Global Engagement Center (GEC), mantinha listas “negras” de contas a censurar naquela rede social que incluíam utilizadores que eram norte-americanos comuns.

    Uma das entidades financiadas pelo GEC, um laboratório de investigação forense digital, pediu ao Twitter que censurasse 40 mil contas por alegado comportamento suspeito e apoio ao partido do primeiro-ministro indiano Narendra Modi, o Partido do Povo Indiano, e ao nacionalismo hindu.

    Em Junho de 2021, Andy Carvin, um analista da Atlantic Council’s Digital Forensic Research Lab (DFRL), enviou à plataforma tecnológica a lista dos utilizadores, que julgava ser de “funcionários pagos ou voluntários” do Partido do Povo Indiano [BPJ, na sigla em inglês].

    No entanto, Taibbi revelou que, entre as contas supostamente duvidosas, constavam apenas muitos cidadãos americanos comuns sem conexões à Índia e alheios à política do país.

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    Na altura, Yoel Roth, então responsável do departamento de Confiança e Segurança do Twitter, respondeu a Carvin: “verifiquei uma data de contas, e quase todas parecem ser de pessoas reais”. O Twitter acabaria mesmo por manter muitas das contas activas.

    O DFRL é financiado com o dinheiro dos contribuintes americanos através do GEC, cujo mandato consiste em “reconhecer, compreender, expor e combater desinformação estrangeira”. No entanto, Taibbi argumenta que a missão de limitar o alcance e influência de organizações terroristas se transformou, a partir das eleições presidenciais de 2016, numa luta contra o “fantasma” da desinformação nas redes sociais, banindo as contas de pessoas comuns.

    Como Taibbi adianta, inicialmente o GEC teve como parceiras várias agências de inteligência que incluem o FBI, a CIA e a NSA.

    Segundo Matt Taibbi, o GEC chegou a solicitar ao Twitter que colocasse 499 contas na sua lista negra devido a desinformação estrangeira. Os motivos do pedido? Algumas utilizavam a aplicação Signal para comunicar e faziam publicações acompanhadas da hashtag #IraniansDebateWithBiden [IranianosDebatemComBiden].

    O GEC também suspeitava que 5500 contas alegadamente chinesas estavam a incorrer em “manipulação coordenada” em nome do Estado chinês. Curiosamente, a lista continha várias contas de governos ocidentais e pelo menos três membros da CNN fixados no estrangeiro.

    Tal como outras informações divulgadas pelos “Twitter Files” já tinham dado conta, a Rússia é um dos países que mais preocupação tem merecido das agências americanas de informação e segurança.

    Taibbi cita um relatório especial do GEC que circulou em 2020, intitulado Russian Pillars of Desinformation and Propaganda, em que a organização defendia que, para além de intervenientes diretamente ligados ao Estado, grupos independentes não deviam ser excluídos de suspeitas de um “ecossistema” de propaganda.

    Matt Taibbi adianta que um dos relatórios que o GEC enviou ao Twitter, sobre a França, “atribui a participação no movimento dos coletes amarelos a um alinhamento com a Rússia”, de acordo com uma afirmação de Aaron Rodericks, um funcionário da rede social.

    Além disso, Rodericks terá ainda dito que o relatório do GEC relativo à China “igualava tudo o que fosse pró-China, mas também tudo o que fosse contra a China em Itália, como parte da estratégia russa”.

    Encontrando pouco respaldo no Twitter, o GEC terá tentado instrumentalizar a comunicação social para que pressionassem a gigante tecnológica sobre contas suspeitas de semear desinformação a mando da Rússia.

    O jornal Politico, por exemplo, deu eco a um relatório da New Knowledge, uma agência constituída por antigos funcionários da NSA, que visava cinco contas alegadamente russas. Algo que o Twitter contrariou, esclarecendo que duas das contas eram apenas de “spam comercial”, e uma delas era americana e não era de todo suspeita.

    Taibbi refere ainda que seguir contas de diplomatas chineses ou partilhar memes iranianos a favor da libertação da Palestina pode ser suficiente para fazer soar os alarmes das agências de inteligência no que toca à desinformação. E comprova-o com uma mensagem que Samaruddin Stewart, Conselheiro Técnico Senior do GEC, enviou a uma funcionária do Twitter.

    As revelações dos “Twitter Files” surgiram da vontade de Elon Musk, que concluiu em Outubro de 2022 a compra do Twitter, de divulgar documentos e mensagens internos da empresa que demonstram as antigas práticas de censura que eram praticadas na rede social pela anterior equipa de executivos. Musk decidiu confiar a análise e divulgação dos “Twitter Files” a jornalistas independentes.

    Dois dos jornalistas que têm estado a divulgar os “Twitter Files”, Matt Taibbi e Michael Shellenberger, vão testemunhar na Câmara dos Representantes norte-americana, no dia 9 de Março, numa audiência sobre a conduta do FBI durante a administração anterior da rede social.

    Leia aqui toda a cobertura dos “Twitter Files” feita pelo PÁGINA UM.

  • Onze “puxões de orelhas” e seis coimas depois, a ERC ainda faz “descontos” à SIC por infracções reiteradas

    Onze “puxões de orelhas” e seis coimas depois, a ERC ainda faz “descontos” à SIC por infracções reiteradas

    A Entidade Reguladora para a Comunicação Social demorou mais de 44 meses para decidir aplicar uma coima à SIC por não colocar intérpretes gestuais nos debates televisivos para as eleições europeias em 2019, após uma queixa do então deputado André Silva, porta-voz do PAN. O Grupo Impresa tem sido reincidente em infracções (17, no total, desde 2011), mas até agora só apanhou admoestações e seis coimas, das quais quatro já transitaram em condenações nos tribunais.


    Tudo começou em Maio de 2019. E termina agora, quase quatro anos depois, com uma coima de 45 mil euros à Impresa, mas com um estranho e apreciável desconto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) à dona da SIC e SIC Notícias.

    Em 9 de Maio de 2019, o então porta-voz do PAN, André Silva, insurgiu-se por a SIC, no debate para as eleições do Parlamento Europeu, não ter contado com intérprete de língua gestual. Queixa à ERC, e o regulador haveria de confirmar o desrespeito pelas regras das emissões televisivas que estipulavam que os “debates entre candidatos aos diversos atos eleitorais que ocorram durante os períodos de pré-campanha e campanha deverão ser integralmente objeto de interpretação por meio de língua gestual”.

    Debate de André Silva (PAN) e de António Costa (PS), em 11 de Maio de 2019, já contou com intérprete de linguagem gestual. Dois dias antes, o dirigente político queixara-se à ERC de falhas que levaram agora à aplicação de uma coima de 45 mil euros.

    A decisão de abrir um processo de contra-ordenação foi extremamente rápida para os padrões da ERC: entre a queixa, em 9 de Maio, e a deliberação a confirmar a ilegalidade passaram apenas 32 dias, uma vez que a deliberação foi tomada em 10 de Junho daquele ano. No total foram detectadas quatro infracções à Lei da Televisão, considerada, cada uma, “contraordenação grave punível com coima mínima de 20.000 euros e máxima de 150 000 euros”.

    Porém, depois disto, como habitualmente o Conselho Regulador da ERC presidido pelo juiz conselheiro Sebastião Póvoas, andou a marinar o processo de contra-ordenação, que somente foi agora concluído no passado dia 4 de Janeiro, embora divulgado apenas esta semana. Confirmando todos os factos, a ERC aplicou quatro coimas de 30 mil euros, que assim totalizariam 120 mil euros. No limite, se aplicado o limite máximo, a Impresa sujeitava-se a uma coima de 600 mil euros.

    Mas a ERC acabou por ser ainda mais benevolente com a dona da SIC, aplicando-lhe o regime de cúmulo jurídico, que acabou assim numa coima única de 45 mil euros, ou seja, um “desconto” de 62,5% pela prática de quatro infracções reiteradas em dias distintos por ocasião de quatro debates políticos.

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    Embora o cúmulo jurídico seja uma norma bastante usual em processos contra-ordenacionais – e também até em processos penais –, na avaliação da “multa” a pagar é também ponderado se as infracções cometidas são pontuais ou não. Ora, no caso concreto dos canais da Impresa, a ERC até acaba por elencar todas as admoestações e infracções cometidas anteriormente por falhas e lacunas deste género.

    E, por isso, acaba por ser algo surpreendente que, após 11 admoestações por infracções à Lei da Televisão (quatro em 2011, duas em 2012, três em 2013 e duas em 2015), mais duas coimas (no valor total de 23.750 euros) e mais quatro condenações em tribunal com trânsito em julgado (com pagamento de mais de 67 mil euros, no total), o Grupo Impresa ainda beneficie de um desconto por reiteradas infracções. Ainda por cima nas “barbas de políticos”, porquanto a falta de intérprete de linguagem gestual ocorreu em debates políticos.

  • ERC leva três anos e meio para decidir que se pode dizer “filho da puta” na TV em horário diurno

    ERC leva três anos e meio para decidir que se pode dizer “filho da puta” na TV em horário diurno

    A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) arquivou uma queixa contra o Programa da Cristina onde, numa emissão, em Junho de 2019, o comentador Hernâni Carvalho usou a expressão “filho da puta” em duas ocasiões, perante a passividade da apresentadora, Cristina Ferreira. O programa, emitido em directo e durante o dia, está abrangido por regras específicas para proteger públicos sensíveis, como as crianças e os adolescentes. Para o canal de TV do grupo Impresa, “de nenhuma forma pode a SIC admitir que a emissão deste programa é (ou foi) suscetível de influir de modo negativo na formação da personalidade de crianças e adolescentes“.


    Pode-se dizer “filho da puta” na televisão portuguesa sem qualquer risco de se sofrer uma sanção por parte do regulador dos media, mesmo que seja dito num programa emitido durante o dia, e visto por crianças e adolescentes.

    O Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) decidiu arquivar uma queixa contra o ‘Programa da Cristina’ na SIC, de 28 de junho de 2019, no qual o jornalista e comentador Hernâni Carvalho usou por duas vezes a expressão “filho da puta”.

    Hernâni Carvalho, jornalista e comentador.

    O programa, emitido em directo e durante o dia, pertence “à categoria de entretenimento, e destinado a todos os públicos, sem restrições, constitui uma situação que apela necessariamente à avaliação da observância dos limites à liberdade de programação”, segundo a ERC. Está, por isso, abrangido por regras específicas que visam a proteção dos públicos mais sensíveis, em particular crianças e adolescentes.

    O regulador demorou três anos e meio para proferir a decisão de arquivamento. A decisão foi tomada no dia 14 de Dezembro passado, mas divulgada apenas hoje no site do regulador.

    Para a ERC, “a expressão não foi destinada a ninguém em particular, indivíduo ou grupo de pessoas, e constitui uma citação relacionada com uma pronúncia judicial”. O regulador considerou que “a expressão não é, assim, ofensiva, para efeitos da aplicação do normativo legal em causa”.

    A ERC deliberou “arquivar a presente participação, por se considerar que a mera citação de uma expressão vernacular, no âmbito de um debate sobre um tema de interesse geral não pode, em si mesma, ser considerada ofensiva, nem atentatória dos direitos de outrem”.

    Cristina Ferreira, apresentadora.

    Para o regulador, não houve qualquer violação dos critérios para avaliação do incumprimento do disposto nas regras criadas para proteger públicos sensíveis.

    Para a estação de televisão do grupo Impresa, “de nenhuma forma pode[ria] a SIC admitir que a emissão deste programa é (ou foi) suscetível de influir de modo negativo na formação da personalidade de crianças e adolescentes”.

    Na base da deliberação, está uma queixa enviada à ERC no próprio dia da emissão do programa. O queixoso alegava que o comentador da rubrica Crónica Criminal, inserida no Programa da Cristina, disse em direto “filho da puta” e que “a autora do programa, Cristina Ferreira, nem reagiu e nem “apresentou um pedido de desculpas às audiências”.

    O primeiro caso apresentado naquela emissão na rubrica dedicada a crimes debruçou-se sobre uma situação de violência doméstica. Hernâni Carvalho disse então que “ninguém é preso em Portugal por causa disso”, e que “até há uma procuradora que diz que chamar filho da puta a um agente da PSP não tem mal nenhum”, concluindo que “é um grito de revolta”.

    Cristina Ferreira questionou então “como é que uma procuradora diz que alguém chamar nomes aos elementos da polícia, ou o que quer que seja, é apenas um ato de revolta”. Mais à frente no programa, Cristina Ferreira afirmou que “às vezes é preciso ter um bocadinho de cuidado com as frases que são ditas”. E Hernâni Carvalho retorquiu: “no meu tempo, quando eu cresci, disseram-me que não se chama filho da puta a ninguém, muito menos a um agente da autoridade”.

    A SIC considerou, em resposta à queixa, que o uso daquela expressão não é negativa nem tem impacto nas crianças e jovens. “Apenas se poderia falar de efeitos negativos para a personalidade de crianças e jovens se a linguagem utilizada o fosse de forma a ofender ou atentar contra os direitos fundamentais de outrem ou se o calão fosse usado de forma frequente e descontextualizada ou gratuita”, o que, segundo a SIC, não sucedeu.

    Os responsáveis do canal da Impresa sustentaram ainda que, “quando enquadradas no contexto e lógica da rubrica, as palavras de Hernâni Carvalho são antes de desincentivo à utilização de linguagem agressiva e de apelo ao respeito pela integridade moral de todos, incluindo e sublinhando a das figuras de autoridade”.

    Defendeu ainda que a postura de Cristina Ferreira, na ocasião, se justificou, defendendo que apresentadora procedeu bem, pois “não interrompeu ou procurou silenciar o convidado, ao contrário do pretendido pelo queixoso”.

    Mas a SIC reconheceu que “a televisão, no contexto social atual, pode e deve, como importante peça da vida pública, contribuir para uma sociedade mais digna, a que não são alheios – antes são fundamentais – o desenvolvimento da identidade e a formação do caráter dos mais jovens”.

    E garantiu que “não deixará de retirar as devidas consequências desta situação, designadamente sensibilizando a produtora do programa para os cuidados a observar relativamente à utilização de linguagem mais agressiva”.

  • Incentivo ao ódio: ERC faz participação ao Ministério Público contra membro da Academia Brasileira de Letras dispensado pelo Diário de Notícias

    Incentivo ao ódio: ERC faz participação ao Ministério Público contra membro da Academia Brasileira de Letras dispensado pelo Diário de Notícias

    A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) leu literalmente um artigo de opinião irónico e cáustico do escritor brasileiro Ruy Castro, recém eleito membro da restrita Academia Brasileira de Letras, escrito no rescaldo do assalto ao Capitólio em Janeiro de 2021. E decidiu agora enviar uma participação ao Ministério Público por alegado incitamento ao ódio, além de considerar que promove o suicídio. O Diário de Notícias, onde o também jornalista brasileiro de 74 anos colaborava semanalmente desde 2018, não só o dispensou como retirou o polémico texto de linha. Ao PÁGINA UM, Ruy Castro reagiu, dizendo que “nunca me imaginei tão letal – ou que Trump e Bolsonaro fossem tão idiotas.”


    Distinguido em Outubro do ano passado como um dos 40 membros da restrita Academia Brasileira de Letras – na gíria literária, classificados como “imortais” –, o escritor e jornalista Ruy Castro foi acusado pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) de usar expressões de ódio e de incentivo ao ódio contra Donald Trump e Jair Bolsonaro num artigo publicado no Diário de Notícias há dois anos.

    A deliberação do regulador dos media portugueses foi aprovada por unanimidade em finais de Novembro, mas apenas esta semana divulgada. O Conselho Regulador – presidido pelo juiz conselheiro Sebastião Póvoas, que estará de saída de funções – remeteu ainda a deliberação e uma participação ao Ministério Público, “uma vez que a peça [de Ruy Castro] pode eventualmente configurar a prática de um crime de incitamento ao ódio e à violência, nos termos do artigo 240º do Código Penal”, sancionável com pena de prisão de seis meses a 5 anos.

    Ruy Castro, além de jornalista, é autor de mais de duas dezenas de obras, e um dos 40 membros da prestigiada Academia Brasileira de Letras, fundada em 1897 por Machado de Assis.

    Além disto, a ERC recomenda que o Diário de Notícias deveria “doravante exercer um maior cuidado na selecção e edição de artigos de opinião, de forma a acautelar a publicação de textos com as características” do texto do académico brasileiro.

    Em causa está um texto, extremamente acintoso mas também irónico de Ruy Castro – que é actual colunista permanente do Tal&Qual desde este mês –, publicado em simultâneo no Folha de São Paulo e no Diário de Notícias no dia 10 de Janeiro de 2021, intitulado “Conselho a Trump: mata-te”. Este foi, aliás, o último artigo do escritor brasileiro de 74 anos no periódico da Global Media, com o qual colaborava desde 2018. Este polémico texto já nem está, aliás, no histórico da coluna do Diário de Notícias, tendo sido retirado de linha, estando assim apenas disponível em sistema de arquivo.

    Ruy Castro – autor de celebradas biografias sobre Nélson Rodrigues, Carmen Miranda e Garrincha, e de vários romances, tendo mais de 20 obras editadas em Portugal –  confirmou ao PÁGINA UM que a sua “colaboração no Diário de Notícias [foi] encerrada por causa desse artigo”, dizendo ainda sentir-se “maravilhado de saber que um obscuro cronista brasileiro pode induzir o homem então mais poderoso do Mundo, Donald Trump, e seu carbono brasileiro Jair Bolsonaro a se matarem”. E surpreende-se, de forma irónica, com o alcance do seu escrito: ”Nunca me imaginei tão letal – ou que Trump e Bolsonaro fossem tão idiotas.”

    Diário de Notícias dispensou escritor após a publicação de artigo contra Trump e Bolsonaro. Ruy Castro colaborava desde 2018, e este é o único artigo que foi retirado de linha.

    No seu texto escrito há dois anos, no rescaldo ao ataque ao Capitólio de 6 de Janeiro daquele ano, Ruy Castro apontava baterias ao antigo presidente norte-americano, dizendo que Trump instigara “o seu gado a tomar o prédio do Congresso e pressionar os congressistas a dar-lhe a vitória”, e que, perante o insucesso, conjecturava que poderia ainda usar os seus poderes presidenciais para “desfechar uma última vingança contra os adversários que o reduziram àquilo que ele mais temeu desde que nasceu: ser chamado de perdedor.”

    Num estilo corrosivo, mas dentro daquilo que se considerava as balizas alargadas da opinião, Ruy Castro especulava, em tom de desprezo, sobre a possibilidade de Trump, como perdedor, “querer jogar uma bomba nuclear no Irão […] para complicar a vida de Biden”. Mas propunha uma solução, ou melhor apresentava uma recomendação, “a única atitude capaz de fazer dele, aí sim, um ícone, um símbolo, uma bandeira a ser desfraldada para sempre por seus seguidores idiotizados. E essa atitude seria: matar-se.”

    Ruy Castro dizia mesmo que “nós, brasileiros, adquirimos uma certa prática no assunto”, remetendo para o suicídio do então presidente Getúlio Vargas em 1954. O então colunista do Diário de Notícias escreveu que “Trump poderia fazer exatamente como Getúlio”, ou seja, “o tiro na coração, e não na cabeça”, uma vez que “o tiro na cabeça faz uma grande lambança, com sangue, miolos e cacos de osso espalhados pelo aposento”, enquanto “o tiro no peito é absolutamente clean. Mantém o rosto intacto, apto a ser fotografado e servir de modelo para uma máscara mortuária, útil na confeção dos futuros bustos e estátuas – como os que Getúlio tem por todo o Brasil.” E conclui: “Seria uma saída honrosa para Trump, e com a vantagem de nem lhe desfazer o penteado.”

    people walking on sidewalk near white concrete building during night time
    Ataque ao Capitólio em 2021 suscitou artigo de opinião cáustico e irónico do Ruy Castro, levado à letra pelo Diário de Notícias, que o dispensou, e pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social, que remeteu uma participação ao Ministério Público por incitação ao ódio.

    Os três últimos parágrafos do polémico artigo de opinião – que também suscitou celeuma no Brasil – foi dedicado a Jair Bolsonaro, que Ruy Castro brinda de “genocida”. Castro recomendava-lhe similar solução – o suicídio –, “mas que não esperasse pela derrota na eleição, e sim que fizesse isto já, agora, neste momento [Janeiro de 2021]. Até porque, fechava, “nenhum minuto sem Bolsonaro será cedo de mais para o Brasil”.

    A análise da ERC a este texto aparenta ter sido feita em sentido literal, mesmo nas alusões à questão do suicídio. Na fundamentação, o regulador diz que “tem vindo a acompanhar e a expressar a sua preocupação com a proliferação nos media de mensagens ofensivas e de discriminação étnica e racial, de incitamento ao ódio e à violência, entre outras, seja nas caixas de comentários das diferentes peças editadas online e nas respetivas páginas das redes sociais, seja no contexto da emissão de programas de informação e debate, sobretudo na área do desporto.”

    E acrescenta ainda a deliberação do regulador que “embora a peça em apreço não seja uma notícia, mas sim um artigo de opinião, não deixa de ser relevante, no quadro de uma publicação de um órgão de comunicação social generalista, de cobertura nacional, o especial cuidado que se deve ter aquando da menção a comportamentos suicidas, bem como de discurso que possa ser entendido como enaltecedor do suicídio”.