Categoria: Cultura

  • A censura depois da escrita, séculos antes do Estado Novo e de Zuckerberg

    A censura depois da escrita, séculos antes do Estado Novo e de Zuckerberg

    Sempre cheia de boas intenções, como o inferno, a Censura é uma das armas do poder para controlar e dissuadir o livre pensamento, e para orientar as sociedades. Cada vez mais actual nos dias de hoje, com a censura de órgãos de comunicação social e nas redes sociais, na verdade a Censura sempre existiu. A Biblioteca Nacional mostra, em exposição, como se fazia entre os séculos XV e XIX.


    Censura, nos dias de hoje, remete de imediato para o bloqueio de informação no conflito russo-ucraniano. O Governo de Putin já censurou a actividade de órgãos de comunicação social independentes da Rússia e do estrangeiro; por sua vez, no Ocidente fez-se o mesmo sobre alguma imprensa russa.

    Censura também foi aquilo que se aplicou, nos últimos anos, a tudo aquilo que se considerou desinformação, ou fake news, tanto na imprensa como sobretudo nas redes sociais, com fact-checkers a determinarem os textos que deveriam ser suprimidos dos olhares mais “sensíveis”. No Facebook, por exemplo, algumas palavras ou imagens davam origem a “castigos” aplicados por algoritmos ou por operadores humanos inalcançáveis e sem paradeiro conhecido.

    A palavra Censura tem também sobretudo em Portugal uma conotação política, que nos transporta para o período anterior à democracia instaurada: o Estado Novo. Não é estranho que assim seja, uma vez que muitos portugueses se lembram ainda de sentirem na pele a repressão daquele período.

    Se se fizer uma análise cronológica, a Censura não foi inventada nem agora nem por Zuckerberg nem por Salazar. As suas origens remontam vários séculos atrás, obrigando a uma grande viagem no tempo. E é isso mesmo que nos quer fazer a Biblioteca Nacional na exposição “Bibliotecas Limpas”, patente até 23 de Abril próximo, e que percorre os ínvios caminhos da censura literária sobretudo entre os séculos XV e XIX.

    magnifying glass near gray laptop computer

    Que a Censura ainda é mais antiga do que os livros impressos, isso bem se sabe. No século XIII já o poder, sobretudo associado à religião, controlava o acesso à informação, e mesmo sabendo-se que poucas pessoas sabiam ler, já existiam listas de livros proibidos.

    Em todo o caso, foi com a instituição do Tribunal do Santo Ofício (ou da Inquisição), chegado a Portugal na primeira metade do século XVI, durante o reinado de D. João III, que a Censura se “profissionalizou”. Vigorou durante quase três séculos, até ser extinto em 1821.

    A Inquisição, instaurada essencialmente para evitar a disseminação de ideologias contrárias ao catolicismo – como o judaísmo e, mais tarde, os movimentos protestantes – foi uma das estruturas eclesiásticas mais opressoras da História da Europa. Apesar de ser um órgão religioso, era dotada de poder jurídico, tendo legitimidade para condenar hereges a penas de prisão ou mesmo à morte por estrangulamento e/ou pelo fogo.

    Mas além desta tenebrosa função, a Inquisição era um dos braços da censura dos livros; na verdade, constituída por três até aos tempos do Marquês de Pombal que, em 1768, instituiu a centralizadora e mais politizada Real Mesa Censória.

    Além dos inquisidores do Santo Ofício, que passaram a exercer o exame de livros a partir de 1536, uma outra instância, o denominado Ordinário (ligado à Igreja), já o fazia desde 1517. Uma tríade de “vigilantes da pureza” foi completada em 1576 com os revisores do Desembargo do Paço, uma mão mais política.

    Qualquer obra tinha uma revisão prévia, antes de ser impressa, e depois, para ser comercializada, passava de novo pelos revisores para apurar se cumprira todas as eventuais alterações. Os textos das censuras nos livros aprovados eram quase sempre publicados, integrados nas obras, sendo que, em muitos casos, serviam também como elogios aos autores.

    Compilação das obras de Gil Vicente, editadas em 1586, tiveram partes expurgadas por indicação da Censura em 1624.

    A Censura nem sempre era total, ou seja, não se aplicava pela simples proibição integral da obra, denominada macrocensura.

    Também havia, porém, a microcensura, que eliminava e impunha correcções apenas em partes, na maioria dos casos após a impressão das obras, realizada à mão (riscando palavras, frases ou imagens) por iniciativa sobretudo de religiosos. É nesta segunda linha que a exposição Bibliotecas Limpas se debruça.

    Hervé Baudry, curador desta exposição e investigador na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa diz haver “uma ironia latente nesta denominação, pois as bibliotecas estavam sujas”, explicando que “por um lado, sujas pela tinta com que os censores tingiam as palavras, frases ou páginas consideradas heréticas, mas metaforicamente esta sujidade a ser limpa representa a repressão e a punição, perpetradas em nome da moralidade e da ortodoxia católica.”

    Este tipo de limpeza dos censores consistia, assim, em expurgar passagens ou palavras para que os livros pudessem ser lidos sem afectar o seu autor. Assim, “a correção não era das almas e dos corpos, como nos processos da Inquisição sobre pessoas, mas sim das palavras”, como se adianta no catálogo da exposição.

    Neste processo, os censores substituíam ou acrescentavam palavras, como se mostra nos exemplares expostos na exposição. Noutras situações, como numa edição de 1524 em latim de Ovídio, obviamente para leitura de religiosos, era dada a orientação expressa de “não se poder ler sem a permissão dos superiores” se a obra não estivesse expurgada de partes consideradas sensíveis.

    Os nomes de Erasmo de Roterdão e Thomas More foram suprimidos em obras.

    Existem até casos muito curiosos de censura nem sempre se discernindo a causa. Por exemplo, numa edição de Heródoto de 1592 surge o nome do impressor ilegível, descaracterizando cada letra. Noutros casos são feitas colagens com papel sobre passagens de textos ou mesmo o nome de autores, como acontece numa edição de 1535 de uma obra do filósofo grego Luciano de Samósata com comentários de Erasmo de Roterdão e Thomas More.

    No entanto, o mais comum era o expurgo através de tinta ou a simples retirada de páginas, através de rasgos, como se pode observar na meia centena de obras expostas, que incluem livros de Horácio, Santo Agostinho, Copérnico, Erasmo de Roterdão e Voltaire, bem como dos portugueses Gil Vicente, Amato Lusitano, Garcia de Orta, Garcia de Rezende, Sá de Miranda e Luís de Camões. Note-se que estes livros tinham tido a sua impressão autorizada, mas, por razões várias, e por vezes décadas mais tarde, acabavam por ser erróneos ou possuindo conteúdos inaceitáveis.

    Por exemplo, o Cancioneiro Geral, de Garcia de Rezende, publicado originalmente em 1516, teve expurgos décadas depois. É um dos exemplos onde se verifica diferenças nos critérios da Inquisição na Península Ibérica, uma vez que a vizinha Espanha não o suprimiu. A explicação? Os espanhóis estariam mais interessados na censura política do que na literária.

    Saliente-se também que a posse de livros proibidos – mesmo que tivessem tido circulação autorizada anteriormente – foi, durante a primazia da Inquisição, um crime considerado de extrema gravidade. Por exemplo, Cristóvão Francisco, um lisboeta de 25 anos, foi executado em finais do século XVI por deter um livro reprovado pelo Catálogo do Concílio Tridentino por conter superstições e blasfémias, segundo consta nos arquivos da Direcção-Geral do Livro.

    Mesmo livros médicos acabaram por ter as “partes íntimas” manchadas.

    Os livros proibidos eram listados e compilados, com indicações por vezes muito precisas sobre as partes a retirar, como sucedeu em 1624 com o Index auctorum damnatae memoriae, onde também se incluíam instruções para corrigir centenas de obras. Feitos os ajustes necessários, os títulos poderiam então voltar a circular com a seguinte inscrição: tutto lege.

    Os cidadãos comuns não eram os únicos a serem perseguidos. Alguns dos maiores nomes da História nacional viram as suas obras censuradas pela máquina burocrática inquisitória. Foram os casos de Luís de Camões e Bocage. A expressão “cagando ao vento”, de um poema de Bocage, foi reprovada pelos censores. Já Os Lusíadas, considerada a obra-prima da literatura portuguesa, terá tido algumas correcções na edição original, e uma edição espanhola de 1639 chegou a ser proibida pela Inquisição de Coimbra por “conter muitas coisas escandalosas e ofensivas para a Religião Católica”.

    Muitas vezes, a Censura pretendia um efeito dissuasor. Acontecia nos casos em que, embora os textos tivessem passagens rasuradas, a tinta não impossibilitava que se percebesse o que estava escrito. Nessas situações, Baudry explica que, ao verem que aquele conteúdo estava proscrito, as pessoas não liam. Recorde-se que ler ou ter um denominado “livro defeso” era suficiente para se ser condenado. Na Torre do Tombo encontram-se vários processos inquisitoriais desta natureza. O último caso conhecido foi o do frade Francisco de Santa Ana, em 1817, por ler Voltaire.

    Se as palavras podiam representar um perigo para a moral e os bons costumes, as imagens também. A nudez, especificamente, não tinha espaço nos conteúdos permitidos, fossem de natureza científica ou artística. Numa obra de Ambroise Paré, um cirurgião francês, que ilustra a extracção de cálculos na bexiga, a genitália do paciente aparece tapada por uma mancha branca.

    O Cancioneiro Geral, de Garcia de Rezende, chegou a ter mais de 90% do seu conteúdo rasurado.

    Embora a Inquisição tenha sido abolida no início do século XIX, a Censura nunca foi, e tem-se transmitido por várias formas, em função do regime político de cada país, ou mesmo por via da auto-censura, por vezes seguindo o politicamente correcto, mesmo quando se trata de Literatura, baseada na liberdade de pensamento e criação.

    Um dos casos mais evidentes em Portugal ocorreu em 2019 quando a Porto Editora decidiu rasurar três versos da Ode Triunfal de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, na edição de um livro escolar do 12º ano, por conter linguagem explícita e elogiosa à pedofilia.


    Bibliotecas Limpas – Censura dos livros impressos nos séculos XV a XIX

    EXPOSIÇÃO | 25 fev. – 23 abr. ’22 | Sala de Exposições da Biblioteca Nacional (Lisboa) – Piso 3 | Entrada livre

  • Para derrotar Putin temos de ostracizar a cultura russa? Ouvimos 29 escritores, representantes da Cultura em português

    Para derrotar Putin temos de ostracizar a cultura russa? Ouvimos 29 escritores, representantes da Cultura em português

    Demissões, boicotes e suspensão de cursos. A invasão de Putin à Ucrânia está a desencadear uma série de medidas contra a cultura de uma região que nos ofereceu escritores como Fiódor Dostoiévski, Lev Tolstói, Anton Tchékhov, Nikolai Gógol ou Vladimir Nabokov, cineastas como Serguei Eisenstein, Vladímir Menchov e Nikita Mikhalkóv, compositores como Piotr Ilitch Tchaikovski, Sergei Prokofiev e Igor Stravinsky, e tantos outros vultos da Arte. E mesmo outros de menor relevo. Mortos e vivos. Enfim, será legítimo culpabilizar todos os russos pela acção do Governo de um país onde nem sequer impera a democracia? Para derrotar Putin temos mesmo de ostracizar também a cultura russa? O PÁGINA UM foi recolher depoimentos de escritores de língua portuguesa.


    .Não é a cultura russa que se deve boicotar, mas o poder russo que em formato extremista e assassino quer acabar com a cultura que lhe é alheia. A censura é o oposto da cultura. A censura é contra-natura e contra-cultura. Não há culturas perfeitas – como não há culturas imperfeitas. Nem podemos equilibrar em dois pratos de balança uma cultura má comparando-a ao peso de uma cultura boa. Em cultura nada é assim tão bipolar ou dual. Não é expectável que uma cultura difira das outras, ou que possa simplesmente banir-se da pluralidade das culturas, porque essencialmente ela é a tendência para o ilimitado de quem a produz, sentindo-a, agindo-a, pensando-a no germe criativo que a originou. Do uno se faz duo e do duo um grupo, um coletivo, um universo cultural. Assim, a cultura não se promove como identidade, mas estimula afinidades. Assim se retrai como coisa local e coagulada, para correr livremente por cimas das fronteiras. Paul Hazard afirmou que a palavra nem tinha estatuto até ao final do século XVIII quando os alemães, em 1793, lhe dão honras de dicionário. Taylor terá sido o primeiro a empregar o termo, em 1871 quando publicou Primitive culture, onde confundia o termo com um outro que ainda hoje nos ocupa e preocupa: civilização. Confesso não saber o que definem os mestres da Universidade Estatal de Pyatigorsk ou do Instituto Pushkin, estudiosos de cultura. Sei que “actores, dramaturgos e directores de teatros estatais como o Bolshoi apelam ao fim da guerra e outros agentes culturais continuam a protestar internamente contra a invasão, cancelando exposições ou fechando museus”. Também sei que a cultura não é coisa que se uniformize, arme e treine para a morte, como não é feita para confinamentos, grades, prisões de consciência, corredores de morte. Sou contra a censura e ao boicote à cultura russa – porque uma cultura não se boicota e resiste, sobrevive sempre no seu âmago, na sua essência. Sou mais firmemente ainda contra a guerra, essa fórmula cobarde de querer vencer pela morte tudo o que é vida, a começar pela cultura.

    Alexandre Honrado, escritor e professor universitário


    (…) Tratando a cultura como um activo bancário, neste mundo ocidental apela-se ao boicote à cultura russa, como se a música, a literatura ou a arte não pertencessem àquela outra dimensão de património da humanidade. Foi suspenso um curso de Dostoiévski na Universidade de Milão; excluem-se cineastas russos da participação em festivais; maestros são impedidos de dirigir orquestras; pianistas substituídos.
    A cultura não se proíbe. Não se cala. Não se reprime (…). [Ler o depoimento completo AQUI]

    Alice Brito, escritora e advogada


    Quantos ucranianos seriam salvos se o descabelado boicote a Dostoiévski não tivesse sido parado? E quantos ucranianos serão salvos por se calarem as vozes e suspenderem as batutas? Nenhum. Era só.

    Ana Cristina Pereira Leonardo, escritora e cronista


    Aquilo que posso dizer é que vamos estrear De Luto pela Vida, a partir de A Gaivota, de Anton Tchekhov, com encenação de Hugo Tourita, dia 31 de Março, no Teatro do Bairro. Ninguém cancela Tchekhov.

    André Gago, actor e escritor


    A minha posição sobre esta guerra – invasão da Ucrânia pelo exército russo – segue a declaração da War Resister’s International feita a 24 de Fevereiro de 2022. É uma posição pacifista, que exige cessar-fogo e negociações imediatas. Caso a agressão dos militares e do governo russo continue, defendo, sempre seguindo a declaração daquela organização, uma proposta de defesa popular não-violenta, recorrendo aos métodos de desobediência civil, que tão bons resultados deram na luta contra o colonialismo inglês na Índia e na luta pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. Para mim não há guerras justas e qualquer guerra é um crime contra a humanidade. Não creio que a cultura russa nas suas manifestações artísticas, poéticas, éticas e filosóficas, onde há seres humanos tão exemplares, com uma ética tão elevada e tão humana, como Tolstoi ou Kropotkine, deva ser equiparada a Putin e aos militares russos. Ao invés, promover hoje os aspectos mais nobres dessa cultura é contribuir para uma consciência e uma cultura de paz.

    António Cândido Franco, escritor e professor universitário


    A sensação é a de que se tenta evitar a desgraça criando-se bodes expiatórios. Tempo estranho, esse que nos deram para viver – ou sobreviver. É muita insensatez em meio a uma realidade de violência, ameaçada pelo caos, a dar total atualidade ao Poema pouco original do medo, do meu saudoso amigo Alexandre O’Neill.

    Antônio Torres, escritor e membro da Academia Brasileira de Letras (cadeira nº 23)


    Dado que a minha opinião seria sempre sintética e portanto não poderia naturalmente corresponder ao sentimento profundo, ontológico e filosófico – às vezes até impossível de exprimir – relativamente a esse tipo de questões, prefiro que o meu silêncio público seja a minha forma de expressão. Tal não significa que eu não condene, liminarmente e sem qualquer dúvida este tipo de atitudes ou retóricas ostracizantes de natureza cultural.

    Cristina Carvalho, escritora


    Sou a favor da divulgação da cultura, mas abomino Putin, a queima dos livros e o silêncio imposto por ditadores. Neste momento de desespero, ostracizar uma das maiores expressões russas pode levar o povo russo a revoltar-se contra Putin.

    Cristina Norton, escritora


    (…) Todos os dias surge uma nova forma de boicote. É deprimente, mas não será por aí que Putin verga. O grande mistério radica na razão que terá levado Putin a desencadear uma guerra que terá consequências no quotidiano da população da Rússia, hoje completamente ocidentalizada, dependente do vasto arsenal de bens de consumo que moldam o dia-a-dia da geração pós-Perestroika (…). [Ler o depoimento completo AQUI]

    Eduardo Pitta, escritor


    (…) Dessa vertigem faz parte um desejo de castigar a Rússia com toda a estirpe de sanções. Ora, quanto a esse ponto, sendo a favor de sanções económicas, parecem-me todavia eticamente questionáveis as medidas de isolamento da Rússia em campos como a Cultura, o Desporto ou os meios de comunicação em geral (…). [Ler o depoimento completo AQUI]

    Fernando Pinto do Amaral, escritor e professor universitário


    Que génios russos como Tchaikovsky ou Dostoievski estejam a ser, no Ocidente, banidos da oferta cultural é ‒ sejamos sucintos ‒ uma mostra de reles exibicionismo. Eu explico.
    Os actuais “cancelamentos” em matéria de cultura nascem desta conjugação fatal: a da vaidade doentiamente exibicionista e do sentimento de inferioridade que entra pela cobardia. Esse transtorno mental conduz a leituras oportunistas do passado, satisfazendo alucinadas moralidades, acríticas até ao desumano.
    Importa rirmo-nos, olhos nos olhos, desses vaidosos. Fazer-lhes ver que mentes retorcidas não nos impressionam. Que a Arte não tem país, não tem fronteiras. nem sequer povo. Que os seus sorrisos contentinhos de nos terem sonegado o que nos faria, a todos, felizes, esses sorrisos são um esgar parado, fútil, inexpressivo. Que, ao contrário dos génios, deles, deles, nada ficará. Sim, a História é terrível. Porque sabe vingar-se.

    Fernando Venâncio, linguista e tradutor


    Putin é um louco e com loucos não se negoceia. Não é possível. A forma que o mundo encontrou para isolar Putin – a das sanções – vai ser eficaz. Já está a ser eficaz, pois já está a criar descontentamento junto dos oligarcas russos. Levar essas sanções ao mundo da cultura e do desporto faz parte da mesma lógica de criar um descontentamento interno e generalizado. Ontem vi um atleta russo, muito jovem, subir ao pódio, com a insígnia da Ucrânia, desafiando claramente Putin. É importante, sim, não confundir o povo russo com Putin. A cultura e as grandes manifestações desportivas sobrevivem a todas as sanções e castigos. É histórico!

    Helena Trindade Lopes, escritora e professora universitária


    A Rússia não é Putin. Putin é, em parte, um produto do Ocidente. Não se emendam mais de duas décadas em duas semanas. E não se emendam com ignorância (esquecer a biografia de Dostoièvski, por exemplo), hipocrisia (procurar petróleo na Venezuela) e cancelamentos moralistas e muito cómodos. A cultura russa pode salvar-nos dos autoritarismos. Basta não ostracizar o que não conhecemos bem.

    Jerónimo Pizarro, editor, crítico literário e professor


    (…) Os fins justificam tragicamente os meios e, por muito doloroso que seja para criadores, artistas e desportistas russos, o isolamento deve ser ostensivo. Público e notório. Doloroso. Sem tréguas olímpicas. O país agressor deve ser tratado como um pária, até porque outras camadas pós-Ucrânia se seguirão. De outras geografias vizinhas falo (..). [Ler o depoimento completo AQUI]

    João Lopes Marques, escritor e jornalista


    Muitas vezes sinto que a sociedade se divide entre os pensadores e os “salivadores”. Os que pensam defendem coisas boas e coisas más. Ainda assim, pensam. Em cada caso, lá terão as suas razões e os seus argumentos. Agora, os que apenas salivam – do ponto de vista Pavloviano – não pensam, são fruto de reflexos condicionados. Apenas reagem. Até podem reagir bem, ainda assim, não pensam.
    Perdoem-me se cito Ivan Pavlov, um médico russo do início do século XX. É que agora, os “salivadores” estão condicionados para atacar tudo o que é russo. E porque vão todos em turbas de um lado para o outro, na sua cegueira, por vezes atropelam o que é mais elementar. Quando se cancelam espectáculos do Ballet Bolshoi de Moscovo, se proíbe o hino russo a atletas que subam ao pódio, se proíbe a participação de artistas plásticos russos em mostras de arte, se boicotam filmes russos em competições… então estamos a confundir a árvore (Putin) com a floresta (o povo russo), e estes agentes culturais estão perante uma discriminação por motivos étnicos e políticos. Acaso, não é isso que condenamos? Alguém acredita que vai derrotar Putin, acabando com o curso de Dostoievski na Universidade de Milão? Ridículo.
    Há coisas mais importantes a fazer, do que ostracizar a cultura e ressuscitar o Santo Ofício. Era bom pensar mais e “salivar” menos.

    João Morgado, escritor


    A arte é, por definição, um grito de liberdade. Boicotar a literatura, a música, o cinema ou os próprios artistas russos equivale a boicotar a resistência ao totalitarismo, por oposição ao totalitarismo. Eu diria que é como atirar fora o bebé com a água do banho, se não corrêssemos o risco de o velho Fiódor ser o primeiro a apaixonar-se pela imagem.

    Joel Neto, escritor


    Esta guerra é um horror, e Putin o responsável por ela. Qualquer boicote à cultura russa é disparatado e contraproducente.

    Julieta Monginho, escritora


    Em plena Guerra Colonial, Amílcar Cabral, o mais notável dos líderes independentistas, várias vezes sublinhou que a guerra se travava contra o regime vigente em Portugal e não contra o povo português. Nessa mesma linha, condenar (como eu condeno) a invasão da Ucrânia é condenar um regime e o seu líder, Putin. Não pode ser condenar o povo russo e a sua cultura.

    Manuel Alberto Valente, poeta e editor


    Não me parece que ostracizar a cultura russa seja a melhor forma – e a mais sensata – de criticarmos e de manifestarmos a nossa oposição a um conflito bárbaro. Criticar convictamente a invasão da Ucrânia é imperioso e fundamental, mas essa crítica não pode, do meu ponto de vista, levar ao restabelecimento de um novo Index Librorum Prohibitorum. Retirar da estante e atirar pela janela como forma de protesto os clássicos russos que sempre apreciámos seria, quanto a mim, um sinal de retrocesso civilizacional.
    A cultura russa não tem culpa do que fazem os dirigentes políticos russos. Vamos rasgar os bilhetes do concerto da Galina Gorshakova a que assistimos com enorme prazer? A Anna Netrebko (nem sei se ainda é russa…) deixará de passar na Antena 2? Sejamos sensatos… Não foi por razões similares que criticámos a destruição de Budas pelos talibãs? Por isso, o russo Gogol, que nasceu em actual território ucraniano e é um dos meus escritores favoritos, vai continuar a ser lido e relido – independentemente de as suas histórias se passarem em S. Petersburgo ou não –, tal como Tchékhov – russo, que passava férias na agora sacrificada Crimeia e onde escreveu algumas das suas histórias. Como não deixarei de considerar A fome, do Knut Hamsun, um dos mais maravilhosos livros que já li, independentemente de ele ter oferecido ao sanguinário Goebbels a medalha do Nobel que recebera.
    Durante o dia, enquanto trabalho, tenho o hábito de ouvir música, e Mussorgsky e Glinka são companhias frequentes. Penso continuar a ouvi-los, sem que tal diminua o que penso desta invasão: um acto bárbaro e cruel.

    Marcelo Teixeira, editor e escritor


    Estou completamente contra a censura das obras russas e o boicote dos maestros e profissionais oriundos da Rússia. Deve-se distinguir o que é a guerra (que é da autoria do governo de Putin) do ataque generalizado às obras russas, que nada têm a ver com os ataques de Putin. Sou apologista das sanções económicas à Rússia por uma questão de estratégia política, mas absolutamente contra a censura.

    Maria João Cantinho, escritora e professora


    Há tão pouco que possamos fazer contra a monstruosidade do regime de Putin que nos precipitámos a castigar, a cancelar ou proibir tudo o que venha da Rússia. É importante diferenciar o regime que oprime do povo que é oprimido, muitos russos opõem-se a Putin, muitos foram presos e muitos vivem com medo. As sanções às representações oficiais russas são uma forma de pressão que, embora comportando alguma injustiça, pode atingir o regime e fazer pressão sobre ele. A russofobia e o boicote à arte russa (seja ela do passado ou do presente) é contraproducente e é um ataque à liberdade que deveríamos defender.

    Nuno Camarneiro, escritor e professor universitário


    De todas as medidas que se podem tomar contra a Rússia (ou deveríamos escrever “contra Putin?”), o chamado cancelamento cultural será a pior delas. Muitas vezes, a resistência intelectual foi a única a fazer frente às ditaduras, aos autoritarismos, e os escritores, os cineastas, os criadores em geral, estão talhados para esse papel. Veja-se (leia-se) a forma como Gogol punha a nu o absurdo dos poderes. E mesmo que não haja uma resistência explícita, engajada, digamos, é sempre errado parar a fruição cultural em nome de algo. Lá diz o chavão, nos lugares onde se queimam livros, acaba-se a queimar pessoas. Mesmo que simbolicamente.

    Pedro Vieira, escritor e apresentador


    O monstro da guerra entrou pelas portas da Ucrânia adentro. É um facto. Putin e a sua entourage prepararam esta festa de sangue, firmemente decididos em que nenhum regime democrático nasça à sua volta. Cortar-lhe todas as fontes de lucro é a maneira mais rápida de, por um lado, secar os apoios ao regime e, por outro, agitar a massa entorpecida de russos, habituados ao silêncio. Não me parece necessário isolar também a cultura ou o desporto russos. É provavelmente entre os primeiros que estará a maior fonte de contestação. Como em todo o lado, é no meio de escritores e outros artistas que se vislumbrará as decisões de Putin com mais clareza. Sou contra, portanto. Mas, confesso que no meio do som das bombas a cair sobre a população ucraniana tenho alguma dificuldade em me centrar no drama de exposições canceladas e concertos adiados, temporariamente. A cultura russa sobreviverá, porque é antiga e forte. Quem não se levantará com vida serão os homens, mulheres e crianças caídas na fuga.

    Possidónio Cachapa, escritor


    A invasão de um país soberano como a Ucrânia é lamentável a todos os níveis.
    Mas é notória a falta de racionalidade e bom senso na resposta dada pelos actores mais importantes. A primeira resposta é a opinião pública, de novo condicionada ao exagero para haver só uma solução, só um mau-da-fita, só uma vítima e um agressor.
    Não estamos perante um jogo de Benfica e Sporting, há nuances, cinzentos que a comunicação social não só não discute, como faz questão em ignorar. Nessa onda de bandeiras e “vamos em força para a 3ª Guerra Mundial”, é importante ficar à tona e continuar a nadar na PAZ, é o único objectivo que interessa, apesar da indústria do armamento já se estar a babar com os lucros e os seus lacaios com as sobras.
    Não existem bons e maus nesta história, só maus. E os povos, sobretudo o povo ucraniano mas por arrasto todos nós com estas sanções que não nos atingem como bombas, ainda, mas como a continuação de extremas dificuldades que temos vivido, são os sacrificados. Os líderes, esses riem-se com o jogo de xadrez da hipocrisia.
    Quanto às sanções culturais. Que dizer?… Onde está o respeito pelos russos, as maiores e mais corajosas vítimas de Putin?

    Raquel Ochoa, escritora


    Sim. Afinal, para que serve a cultura senão como arma de guerra? Eu já queimei os meus livros de Tolstoi e Dostoièvski. E também os do Isaac Asimov. Ia queimar o Bulgakov, mas a minha mulher lembrou a tempo que, embora escrevesse em russo, nasceu na Ucrânia. E estou muito arrependido de ter visto os filmes do Tarkovski. Em minha defesa, adormeci sempre.

    Rui Zink, escritor e professor universitário


    Se sou o que sou devo-o em parte à cultura russa. Não seria o mesmo hoje caso não tivesse lido Dostoievski, Tolstoi, Tchékhov; sem ter ouvido Rachmaninoff, Stravinski; sem ter visto os filmes de Tarkovski, as pinturas de Rublev. E por aí adiante. Condenar veementemente esta invasão e guerra, estar contra um louco facínora como Putin, mas ao mesmo tempo estar de acordo com o amordaçar da cultura russa, tornando-a num lobo mau, parece-me um gesto absurdo, estúpido. Uma aproximação perigosa ao fascismo e a um regime ditatorial contra o qual devemos supostamente lutar.

    Sandro William Junqueira, escritor


    Em vez de silenciar a voz pujante da soprano Anna Netrebko, quero ir a um concerto de Anna Netrebko e, nos encores, gritar palavras de ordem contra Putin. Em vez de cancelar o Bolshoi, quero ver uma das melhores companhias de bailado em palco e, no fim, levantar-me com cartazes proclamando “Glória à Ucrânia”. Não é a riquíssima cultura russa que quero silenciar, é o ditador Putin. Eu não seria quem sou sem as minhas referências culturais russas, sem Dostoievski, Anna Karénina, Tchékhov. Eu não seria quem sou sem as minhas paixões russas, sem Rudolf Nureyev, Mikhail Baryshnikov, Maia Plisetskaia, Maxim Vengerov, Grigory Sokolov, sem o concerto para violino de Tchaikovsky, sem o concerto para piano nº 3 de Rachmaninov. O povo russo não é Putin. Combatamos Putin e os oligarcas, deixemos a cultura em paz. Porque a cultura é um dos caminhos para a paz. E, assim como uma invasão é uma invasão, censura é censura.

    Tânia Ganho, escritora e tradutora


    Dostoievski costumava dizer que os russos eram metade homens, metade ursos. A metade ursa (Misha) tende a prevalecer quando toca a lideranças. Putin é uma variante de czar torcionário, mais do que um revivalismo estalinista, cujo mando de um circo de feras já estava em curso, bem antes de dirigir as garras contra o quintal da Ucrânia. As sanções, externas e internas, políticas, económicas ou culturais, só tenderão a atiçar os costumes bravios. Nunca, porém, um criador russo opositor do regime deixou de levar avante a sua luta individual. Soljenitsine ou Chalamov são exemplos felizes de resistência do fado totalitário eslavo. Do outro lado da barricada, os herdeiros de Nestor Maknó sobreviverão, pois debaixo das terras do valioso quintal está uma índole de teutões indomáveis.

    Tiago Salazar, escritor


    O desafio aqui é encontrar uma resposta para o pouco que podemos fazer em relação à agressão russa sem desencadear uma resposta que precipite uma guerra para a qual ninguém está preparado. Os poucos meios de que dispomos são de carácter não bélico e de eficácia por ora impossível de determinar. Podemos – e devemos – aplicar sanções, que são uma forma de condicionar o povo russo a colocar-se do lado oposto ao governo de Putin. Sendo que a Rússia não é de todo uma democracia e não dispõe de liberdade de imprensa, não sabemos como estas medidas serão interpretadas pela população e não estamos em condições de antecipar a sua eficácia. Já vimos também que os muitos russos que se vêm manifestando pela paz acabam por pagar muito caro o seu apoio ao povo ucraniano. É um xadrez muitíssimo complicado e temos a sensação de que qualquer passo em falso pode, no mínimo, encobrir o futuro da europa e, num caso limite que ninguém quer conceber, o futuro do mundo e de toda a vida na terra.
    Quanto à censura concertada relativamente à cultura ou à arte russa, é preciso separar aquilo que é a Rússia promovendo-se a si mesma por interposta pessoa dos seus artistas ou dos seus atletas e, nesse caso, ser absolutamente intransigente na recusa em receber delegações russas e os artistas ou atletas russos cuja único «pecado» é terem nacionalidade russa; a esses naturalmente, nada lhes deve ser barrado. Quanto aos livros de Dostoievski ou à música de Tchaikovsky, aparentemente alvo de censura aqui e ali por parte de alguns invertebrados permanentemente com medo de não estarem do lado certo da ética sem saberem, no entanto, soletrar a própria palavra, é dar-lhes a mesma importância que aos censores moralistas de qualquer religião ou as muito contemporâneas vagas de escândalo em que as pessoas se entretêm a doutrinar-nos sobre o que devemos ler e como o devemos fazer. No fundo, é passar por eles e mandá-los à merda.

    Valério Romão, escritor

  • Guerra e paz

    Guerra e paz


    Derrotar Putin é por estes dias uma prioridade. Não pode haver tibiezas, nem qualquer subterfúgio semântico. Não pode haver adversativas, nem eufemismos. É preciso, é urgente a ingente tarefa de derrotar o gangster.

    À hora do almoço, enquanto descascamos uma laranja à sobremesa, assistimos em directo ao grande espectáculo da guerra. Gomo a gomo a laranja vai sendo deglutida. A guerra continua até ao café.

    Desligamos depois a televisão e regressamos ao trabalho. De vez em quando, sempre que possível, numa qualquer pausa, aproximamos o ouvido das notícias. A guerra continua lá. Está sempre lá, onde quer que seja.

    Agora é na Ucrânia e aí a coisa fia mais fino. A Europa, a velha Europa, a sofisticada Europa sente o chão tremer com o estrépito das bombas. Em paz há mais de setenta anos, depois de uma guerra insana que ainda não esqueceu, o velho continente sente-se ameaçado, humilhado, recordando invasões antigas.

    Abre fronteiras até agora fechadas a sete chaves a outros povos em idênticas aflições. As fronteiras estão abertas. Seria demasiado atroz a visão de gente bombardeada e perseguida sem poder sair do local da carnificina. Não nos esqueçamos, porém, de todos os outros que em vão pediram que as portas lhes fossem abertas.

    Os comboios a abarrotar de gente aflita encaminham-se pelo meio da neve a países limítrofes, também eles em aflição.

    Numa sinistra reedição da guerra fria, o perigo nuclear reaparece.

    O chamado Ocidente responde com sanções económicas. O rublo deprecia-se a olhos vistos. As transações internacionais são bloqueadas. Congelam-se os ativos do Banco Central russo, excluindo-se também outras entidades bancárias do sistema financeiro internacional. Congelam-se as contas da oligarquia.

    Bate-se em Putin, onde dói a Putin. Tudo certo.

    E podíamos ficar por aqui. Mas não.

    Tratando a cultura como um activo bancário, neste mundo ocidental apela-se ao boicote à cultura russa, como se a música, a literatura ou a arte não pertencessem àquela outra dimensão de património da humanidade. Foi suspenso um curso de Dostoiévski na Universidade de Milão; excluem-se cineastas russos da participação em festivais; maestros são impedidos de dirigir orquestras; pianistas substituídos.
    A cultura não se proíbe. Não se cala. Não se reprime.

    Esta visão míope, maniqueísta, censória, reflecte a apropriação da arte e da cultura como se se tratasse de uma mercadoria que se pode fechar num qualquer armazém a cadeado.

    Não. Não pode. Putin, dentro da pobre Rússia oprimida, exerce uma censura obscena sobre tudo o que possa cheirar a comunicação ocidental. Num superlativo gesto de violência proíbe palavras. Guerra ou invasão deixaram de existir no léxico russo.

    Os que agora querem proibir arte, cultura ou a imprensa russa de livremente circular pelo mundo igualam-se a Putin na fúria censória. A música, o teatro e a literatura não pertencem ao gangster. São de todos nós.

    Escritora e advogada

  • Cultura highbrow como arma de guerra?

    Cultura highbrow como arma de guerra?


    Perguntam-me se Putin pode ser derrotado pelo ostracismo da cultura russa. Admitindo que a cultura russa estivesse a ser ostracizada pelos adversários de Putin (e não me parece que esteja), o tema não afecta o quotidiano da larga maioria do povo russo, elites de Moscovo e São Petersburgo incluídas.

    As quebras de contrato que atingiram a soprano Anna Netrebko e o maestro Valery Gergiev, a primeira afastada do Metropolitan Opera de Nova Iorque, o segundo da Filarmónica de Munique, são desaires que afectam a carreira de ambos, artistas de reputação planetária. Mas nenhum deles detém o monopólio da cultura russa.

    Dir-me-ão que não são casos isolados. Pois não: atletas russos foram impedidos de participar nas Paraolimpíadas de Pequim, universidades de prestígio cancelam cursos de literatura russa, cineastas russos são afastados de festivais de cinema para os quais haviam sido convidados, e até a Federação Felina Internacional proibiu gatos russos de participarem nas competições agendadas para este ano.

    Todos os dias surge uma nova forma de boicote. É deprimente, mas não será por aí que Putin verga. O grande mistério radica na razão que terá levado Putin a desencadear uma guerra que terá consequências no quotidiano da população da Rússia, hoje completamente ocidentalizada, dependente do vasto arsenal de bens de consumo que moldam o dia-a-dia da geração pós-Perestroika.

    Aparentemente, terá julgado que a ocupação da Ucrânia durava umas horas, graças a hordas de ucranianos russófilos desejosos de afastar Zelensky. Nada disso aconteceu. No trágico ínterim em que todos estamos mergulhados, o povo russo descobre, estupefacto, estar a um passo de regredir cinquenta anos.

    A classe trabalhadora russa não quer saber da visibilidade internacional da sua cultura highbrow. Quer saber se vai poder continuar a manter o padrão de vida dos povos das nações industrializadas, a começar pelos seus vizinhos da Finlândia.

    Escritor

  • Os fins justificam tragicamente os meios

    Os fins justificam tragicamente os meios


    Não há uma fórmula exacta para deter Putin e as suas ambições de redesenhar o mapa de alianças pré-1999, ano em que República Checa, Polónia e Hungria aderem à NATO. O Artigo 5.º da NATO dá uma segurança relativa aos 30 membros da Aliança Atlântica, mas a grande batalha — e da minha opinião falo, vivi 12 anos na Estónia (membro desde 2004) e por lá tenho três filhos menores — será a capitulação de Vladimir Putin perante os próprios 144 milhões de russos.

    De resto, o traçado geopolítico euroasiático do Sr. Putin para um futuro próximo, e para outro mais longínquo, e excluindo acasos como a sua improvável derrota neste conflito ou um colapso inesperado (cair da cadeira, por exemplo), só poderá ser travado num de dois cenários: a) Um putsch congeminado no seio da própria Federação Russa, um pouco à imagem da misteriosa morte de Estaline (falar do hipotético papel de Lavrenti Beria neste âmbito seria perder o foco); b) Ou uma crescente onda de indignação do patriótico povo russo, que desde há décadas, endossa taxas de popularidade pouco escrutinadas ao Sr. Putin.

    E é neste contexto que vislumbro eventual eficácia, pelo menos na forma tentada, nas sanções culturais e desportivas à Federação Russa — como complemento às de índole económico-financeira, de mobilidade ou no âmbito logístico, entre outras. Há demasiados anos que uma certa classe média, média-alta ou alta da Federação Russa se move pelo Planeta Terra bebendo, paradoxalmente, o melhor de dois mundos: o conforto nacionalista e identitário que Putin lhes proporciona; e praticando, não obstante, um estilo de vida free-flow ocidental e ocidentalizante que não tem respaldo na lógica puramente apparatchick kremliniana dos czares incumbentes.

    grayscale photo of people walking on street

    Ora é aqui que o isolamento, ou apertando o cerco, pode surtir efeito: as sanções, que serão sempre temporárias, servirão de alerta para uma Rússia prepotente e pseudo-auto-suficiente. Desde 1991, data do colapso da URSS, que o Ocidente acumulou erros, como por exemplo a humilhação precoce dos derrotados da Guerra Fria, mormente na década de 90.

    Porém, imaginar que Putin pode(rá) ter mão livre doravante para reverter esferas de influência perdidas é uma autêntica “Caixa de Pandora” — e, sim, sim e sim, os ucranianos foram enganados triplamente, seja por muitos dos seus oligarcas corruptos, seja pelo Ocidente, sejam as mentiras, obsessões e sede de vingança de Putin.

    Hoje por hoje, os ucranianos usam o seu corpo como escudo humano, são carne para canhão para o que pode ou não daqui advir. E muito provavelmente será o domínio russo da Ucrânia, numa lógica de Estado-vassalo.

    Muitos mártires decerto emergirão. E a Cultura, afinal, a razão maior deste solicitado comentário? Os fins justificam tragicamente os meios e, por muito doloroso que seja para criadores, artistas e desportistas russos, o isolamento deve ser ostensivo. Público e notório. Doloroso. Sem tréguas olímpicas. O país agressor deve ser tratado como um pária, até porque outras camadas pós-Ucrânia se seguirão. De outras geografias vizinhas falo.

    Daí a necessidade de consciencialização da opinião pública doméstica russa: com o Sr. Putin, a Federação Russa não pertence, nunca poderá pertencer, a esta civilização ocidental de que os mais influentes patriotas e produtores de cultura russos tanto adoram. Será que não a poderem fruir por uma temporada, longa ou nem por isso, acelerará a pressão sobre o Kremlin? Quão forte será a pressão nesta panela? Fá-la-á explodir?

    Cair por dentro, quiçá: esta seria, sem qualquer dúvida, a mais épica e patriótica das implosões. De outra maneira: até que ponto a Cultura se pode assumir como arma híbrida de destruição maciça? A pós-modernidade é deveras desafiante.

    Escritor e jornalista

  • Isolamento, exclusão, nacionalismos

    Isolamento, exclusão, nacionalismos


    Passaram 10 dias sobre o início da invasão da Ucrânia, desencadeada pela Rússia como reacção àquilo que alguns vêem como uma humilhação histórica acumulada desde o fim da Guerra Fria.

    No entanto, por mais que a Alemanha tivesse sido humilhada em Versailles (1919), isso não a legitimou para o que fez em 1939, e à Rússia o mesmo se aplica: por mais razões de queixa que os russos tenham desde o final da Guerra Fria – e têm certamente algumas –, isso não os legitima nem os desculpa para o que estão a fazer na Ucrânia, e a resistência dos ucranianos é uma lição que tão cedo não esqueceremos: tudo isto está a mudar-nos como europeus, fazendo-nos cair de súbito numa realidade que o nosso snobismo cosmopolita remetera para os nacionalismos do século XIX, fechados num baú de que tínhamos perdido a chave.

    religious sculpture

    Em boa verdade, esse baú já fora aberto na ex-Jugoslávia, nos anos 1990, ao longo de um conflito sangrento aliás parecido com este, com uma Sérvia humilhada a desempenhar o papel da Rússia e a reagir de maneira também violenta, sofrendo uma derrota que veio alterar as fronteiras da Europa com a criação do Kosovo em 2008.

    Mas nos Balcãs não houve um envolvimento russo directo, como houve, por exemplo, na Tchetchénia, cuja capital, Grozni, ficou reduzida a escombros, com dezenas de milhares de mortos e atrocidades sem fim – a que a Europa fechou os olhos. Só que a Ucrânia não é a Tchetchénia, perdida nas montanhas do Cáucaso e habitada por muçulmanos: a Ucrânia fica mais perto, é mais sentida como Europa, suscita a comoção de toda a Europa, incluindo da Rússia: muitos russos não desejam a guerra, manifestam-se contra a guerra, não querem continuar a guerra.

    Ainda assim, continua a assistir-se a uma escalada de parte a parte, com duras sanções de um lado e ameaças nucleares do outro, numa espiral de confronto cujo mecanismo psicológico me assusta, como se em certos momentos uma estranha vertigem de ódio assaltasse a cabeça de algumas pessoas, obedecendo a hormonas específicas ou a neurotransmissores que excitam nos humanos um obsessivo ódio ao outro, ao “inimigo”.

    Dessa vertigem faz parte um desejo de castigar a Rússia com toda a estirpe de sanções. Ora, quanto a esse ponto, sendo a favor de sanções económicas, parecem-me todavia eticamente questionáveis as medidas de isolamento da Rússia em campos como a Cultura, o Desporto ou os meios de comunicação em geral.

    Um triste exemplo dessa cancel culture foi o bloqueio imposto pela Europa a partir de 1 de Março às emissões do canal RT / Russia Today em inglês. Como retaliação, deixará de ser possível ver na Rússia, via satélite, canais como a BBC, a CNN ou outros meios ocidentais emitidos em russo.

    Toda esta lógica de exclusão me entristece, encarando-a como mais um resultado do pensamento binário e maniqueísta a que também assisto nas redes sociais, num processo de simplificação em que tudo passa a resumir-se a um conflito entre “nós”, que somos sempre os bons, e “eles”, que são sempre os maus e que, por definição, estão sempre contra “nós”.

    Bem-vindos ao novo mundo, todo pintado a preto-e-branco e regido pela Censura digital. Bem-vindos à nova Inquisição, que a partir de agora controlará cada imagem que virmos ou cada palavra que dissermos, eliminando as que não se enquadrarem no modelo considerado mais correcto pelos inquisidores que espreitam, invisíveis, atrás de cada écran.

    group on people inside building

    Olho para o mundo em 2022 e sinto cada vez mais que esta polarização maniqueísta em grupos, em tribos, em clãs, só tende a radicalizar uns e outros, numa lógica de mútua exclusão que qualquer estratégia de isolamento só vem acentuar e que, em última análise, conduz à perpetuação da guerra, como forma extrema de exclusão do outro – assim funcionam os nacionalismos.

    No pouco tempo que me restar, gostaria de viver num mundo em que os russos pudessem ver canais ocidentais e em que aqui, no Ocidente, pudéssemos ver canais russos, chineses e de todo o planeta – e o mesmo para os livros, a música, as artes. Só conhecendo melhor o outro poderemos tentar compreendê-lo – ou então desistimos de qualquer esforço de compreensão e prosseguimos por este caminho sem saída: fechamo-nos em nós, olhamo-nos ao espelho e repetimos todos os dias que os outros não existem. Mesmo sabendo que não é verdade, talvez o nosso narcisismo precise dessa ilusão.

    Escritor e professor universitário

  • Estante P1: Fevereiro de 2022

    Estante P1: Fevereiro de 2022

    Título

    Conta-me como foi

    Autor

    Rui Cardoso

    Editora

    Casa das Letras

    Sinopse

    Na História de Portugal, encontramos mitos para todos os gostos. Desde a escola náutica de Sagres que nunca existiu, ao pioneiro Viriato, que, em boa verdade, andou mais pela Andaluzia do que pela Serra da Estrela. Já para não falar da padeira de Aljubarrota, tão façanhuda como insubstancial.

    As inverdades e mentiras na nossa História são, elas próprias, uma história sem fim, que se estende até tempos bem mais recentes. Ainda hoje há quem acredite que, em 1975, Portugal esteve à beira de uma guerra civil e que só a vitória das forças democráticas no golpe militar de 25 de Novembro desse ano reconduziu o pais ao bom caminho.

    Só que esta tese é tão historicamente informada como dizer que Portugal começou com um filho a bater na mãe… Viajemos, pois, ao encontro dos mitos da Historia de Portugal.

    Título

    Um amor incondicional

    Autor

    Francine Rivers

    Editora

    ASA

    Sinopse

    Califórnia, 1850. Um lugar e uma época impiedosos em que os homens vendem a alma por um punhado de ouro e as mulheres vendem o corpo por um lugar para dormir.

    Angel era apenas uma criança quando foi vendida como prostituta. Rapidamente aprendeu a não esperar nada de ninguém… apenas traição. Ao longo dos anos, o único sentimento que a tem alimentado é o ódio por todos os que lhe roubaram a inocência e a deixaram com um irreparável vazio interior.

    Um dia, porém, conhece um homem diferente de todos os outros. Michael Hosea busca o divino em todas as coisas e vê em Angel algo que nem ela própria se permite ver. Michael ama-a incondicionalmente e, aos poucos, vai conquistando um lugar cada vez maior no seu coração.

    Mas com a chegada inesperada desse amor, Angel é tomada por sentimentos incontroláveis de medo e desprezo por si mesma. Há muito que aceitara não haver salvação para a sua alma devastada. Resta-lhe fugir de volta para a escuridão do mundo em que cresceu.

    Título

    Um cão deitado à fossa

    Autor

    Carla Pais

    Editora

    Porto Editora

    Sinopse

    Uma serração. Dois irmãos. Dois pesos e duas medidas. A um deles, o mais frágil, o pai tudo dá. Ao outro, reserva toda a sua indiferença e despeito. E entre o barulho da serra, que não para nunca, e o silêncio do pai, cresce Urbano, atrás da sombra da mãe, que se verga, submissa, ao marido.

    O homem e a mulher. O macho e a fêmea. O pai e a mãe. O papel de cada um nesta «ruralidade fechada nos seus próprios fantasmas» a que Carla Pais empresta a voz, num romance que, em última análise, lança uma luz sobre a incapacidade de se ser feliz. 

    Título

    A América e os americanos

    Autor

    John Steinbeck

    Editora

    Porto Editora

    Sinopse

    John Steinbeck foi um escritor comprometido com o seu tempo, atento à política, às mudanças sociais, ao mundo à sua volta. Durante trinta anos, a par dos seus famosos romances, escreveu vários trabalhos curtos de não ficção, que foram sendo publicados em jornais e revistas no seu país e no estrangeiro, e através deles construiu um singular registo de uma era.

    A presente antologia reúne mais de cinquenta destes textos, desde artigos que serviram de inspiração para o célebre romance As Vinhas da Ira até ao último livro que publicou, A América e os Americanos, de 1966. 

    Nestas páginas preciosas encontra-se o olhar do jornalista, cobrindo a Grande Depressão norte-americana, a Segunda Guerra Mundial, o Vietname; o testemunho do cidadão, preocupado com o ambiente, com a pobreza, com o racismo; as confidências de um homem, refletindo sobre os lugares onde viveu e recordando os amigos queridos.

    A América e os Americanos e Outros Textos é um retrato essencial de John Steinbeck e um documento inestimável para melhor compreender o seu país.

    Título

    Doce amargura

    Autor

    Paul Lapperre

    Editora

    Casa das Letras

    Recensão

    Doce Amargura: Vida e morte do império açucareiro Hornung na Zambézia (1888-1988) é a história da Sena Sugar Estates e da aliança anglo-portuguesa entre John Peter Hornung (Pitt) e Laura de Paiva Raposo que lhe deu origem.

    John Peter Hornung, um ousado jovem inglês de origem húngara, introduziu, no final do século XIX, o cultivo comercial da cana-de-açúcar no Baixo Delta do Rio Zambeze, numa aventura pioneira de criação de várias plantações de açúcar, que se pautou pela introdução de maquinaria industrial, novas técnicas, investigação e modernização das práticas agrícolas, lançando as bases para aquela que acabou por se tornar não apenas na maior empresa açucareira de Moçambique, mas também numa das maiores do mundo.

    Numa história que cobre 100 anos da história de África e da Europa, a Sena Sugar Estates evoluiu ao longo de décadas alcançando vitórias e sofrendo contrariedades; e convivendo com as políticas económicas e sociais de Portugal e Moçambique que mediaram os finais do século XIX e a I Guerra Mundial; com o Estado Novo e as políticas mercantilistas e coloniais desenvolvidas por António de Oliveira Salazar; a Grande Depressão; a Segunda Guerra Mundial; a Guerra Colonial e o alvorecer da liberdade na África Portuguesa; e o conflito RENAMO-FRELIMO, até à destruição do sonho de Pitt Hornung.

    Título

    Strindberg – neste Mundo fui apenas um convidado

    Autor

    Cristina Carvalho

    Editora

    Relógio d’Água

    Recensão

    Strindberg: neste Mundo fui apenas um convidado é o novo romance biográfico de Cristina Carvalho, desta feita sobre o escritor sueco August Strindberg, autor de peças como Menina Júlia e de romances como O Salão Vermelho.

    Título

    Pirilampos

    Autor

    Ricardo Gil Soeiro

    Editora

    Assírio & Alvim

    Sinopse

    Um pirilampo e uma mão humana: o gesto luminoso e o ato de criação. Será a carcaça do inseto que se metamorfoseia, ou o corpo do ser que se transhumaniza? Pirilampos é a estreia poética de Ricardo Gil Soeiro na Assírio & Alvim, um livro que tenta responder à questão fundamental: “Quem foi que deixou os pirilampos acesos?”

    Título

    Pensamento Branco

    Autor

    Lilian Thuram

    Editora

    Tinta da China

    Sinopse

    Este livro conta a história do pensamento branco, da sua origem e do seu funcionamento, da forma como cria divisões e se espalhou pelo mundo até se tornar universal, ao ponto de contaminar o próprio ar que respiramos.

    O pensamento branco é, há séculos, uma norma, uma fossilização de hierarquias, de esquemas de dominação, de hábitos que nos são impostos. Diz aos brancos e aos não‑brancos o que devem ser, qual o lugar que ocupam.

    Tal como o longo domínio dos homens sobre as mulheres, o pensamento branco está profundamente enraizado nas nossas mentalidades e manifesta‑se quotidianamente. É fundamental que o questionemos se queremos avançar para outro paradigma.

    Não se trata de culpabilizar ou de acusar, mas sim de compreender os mecanismos do pensamento branco, de estarmos conscientes e construirmos novas formas de solidariedade. Não estará na hora de alargarmos os nossos pontos de vista para nos considerarmos todos, finalmente, seres humanos?

    Título

    Bons sonhos

    Autor

    Anders Roslund

    Editora

    Porto Editora

    Sinopse

    Um banco habitualmente vazio, num cemitério… Ewert Grens, o solitário polícia, costuma ali sentar-se sempre que a vertigem da realidade se torna demasiado alucinante até para um velho e duro superintendente da polícia aguentar.

    Porém, numa dessas ocasiões, uma mulher senta-se junto dele. Está ali por causa de uma criança, enterrada numa campa sem nome.

    Uma campa vazia.

    Grens sente-se chamado a investigar não só este misterioso desaparecimento como um outro, ocorrido no mesmo dia. Ambas as meninas tinham apenas quatro anos. E a segunda está prestes a ser declarada oficialmente morta.

    Tentando perceber como é que os dois casos estão relacionados, Grens implora, uma vez mais, auxílio a Piet Hoffmann, que se recusa terminantemente a sair da reforma – até que um detalhe importante o desvia das suas melhores intenções.

    Forçados pelas circunstâncias a trabalharem de novo juntos, Grens e Hoffmann penetram no mais sombrio e abjeto reduto da criminalidade, naquele que constituirá um teste radical às suas capacidades profissionais – e à sua humanidade.

    Título

    O Delírio Nazi

    Autor

    Heather Pringle

    Editora

    Casa das Letras

    Sinopse

    Heinrich Himmler, o segundo homem mais poderoso da Alemanha nazi, estava convencido de que a ciência ignorava os feitos heroicos de uma raça primordial: os arianos.

    A convicção do líder das SS, povoada por homens e mulheres louros e de olhos azuis, não passava de pura fantasia – mas era inabalável.

    Em 1935, Himmler fundou um instituto de investigação no âmbito das SS destinado a produzir alegadas provas arqueológicas dessa e de outras ficções do III Reich: o Ahnenerbe.

    Para alcançar o objetivo, que mais não era do que reescrever a história da Humanidade, o arquiteto da Solução Final recrutou uma mistura bizarra de aventureiros, místicos e, também, mais de uma centena de respeitáveis cientistas e académicos alemães.

     As finalidades de tão excêntrica missão, que passaria por expedições a lugares como o Tibete, o Iraque ou a Finlândia, eram decididamente políticas – e, como não tardaria a verificar-se, teriam efeitos criminosos a uma escala até então impossível de conceber.

    Título

    Teorias da Conspiração

    Autor

    Fernando Neves

    Editora

    Oficina do Livro

    Sinopse

    As histórias mais inacreditáveis, os seus protagonistas e as suas origens. Neste livro vamos tentar encontrar explicações sobre o que são, quem são os seus protagonistas e, sobretudo, como se propagam estas Teorias da Conspiração, feitas de histórias mais ou menos fantasiosas que são passadas de boca em boca e que têm atravessado gerações, marcando a nossa forma de ver o mundo.

    Atribuir a origem de um determinado problema a uma entidade externa, a um ser inatingível, invisível aos nossos olhos, é muitas vezes uma solução, na falta de outras explicações mais simples. Procurar alguém em quem colocar as culpas de tudo o que de mau acontece à nossa volta é altamente tentador.

    A explicação mais simples é sempre a mais provável, como dizia a escritora Agatha Christie, mas nem sempre uma explicação é satisfatória ou vai ao encontro do nosso imaginário, podendo mesmo não contemplar uma resposta que permita compreender ou solucionar o dilema, o que leva à criação de teorias mais e menos imaginativas.

    Título

    Mortal e rosa

    Autor

    Francisco Umbral

    Editora

    Tinta da China

    Sinopse

    Em Mortal e Rosa, uma surpreendente e terna elegia à infância, Francisco Umbral evoca a morte de seu filho. Desde a inóspita revelação da perda, o escritor constrói um longo monólogo em que a morte do filho converte o seu pesadelo humano numa força catártica e libertadora.

    Umbral procura o reencontro na evocação e cada sensação narrada é um superar da existência inerte, cada objecto uma desculpa para a reflexão: “…cadeiras de verga infantil, espreguiçadeiras graves, cavalos de crina celeste perguntam por ti…”.

    Com “…esta corporalidade mortal e rosa onde o amor inventa o seu infinito” – verso de Pedro Salinas que preludia este texto – o escritor aborda uma cantata de beleza e originalidade máxima, que transborda todos os rancores, porque, como assinala numa frase que bem poderia glosar a obra: “O filho é um relâmpago de futuro que nos deslumbra por um instante. Por ele, pelo meu filho, vi mais além, mais fundo e mais longe, e talvez, aí, isso me baste”.

    Título

    Quando o tempo parou

    Autor

    Ariana Neumann

    Editora

    Penguin Random House

    Sinopse

    Quando era criança, Ariana Neumann gostava de brincar aos detectives. Na ausência de mistérios verdadeiros para resolver, começou a observar secretamente o pai, Hans Neumann, um brilhante industrial e filantropo que acordava à noite a gritar numa língua desconhecida.

    Numa caixa que o pai lhe deixa depois de morrer, Ariana encontra um documento de identidade com a fotografia dele quando jovem, mas com o nome de outra pessoa.

    Essa é a primeira pista sobre um homem que nunca falou do seu passado. Ariana decide ir à procura das suas raízes, descobrindo a origem judaica do pai e as memórias chocantes que ele escreveu quarenta anos depois de fugir de uma Praga ocupada para se esconder, sob uma identidade falsa, no epicentro do poder nazi: Berlim.

    Abrangendo quase noventa anos e dois continentes, este é um livro inesquecível sobre resiliência, esperança e amor no meio da tragédia.

    Título

    A Cláusula Familiar

    Autor

    Jonas Hassen Khemiri

    Editora

    Penguin Random House

    Sinopse

    Duas vezes por ano, um “pai que também é avô” regressa à Suécia para cuidar dos seus interesses e visitar a filha e o filho, que abandonou. Este avô é uma pessoa difícil, ocasionalmente preconceituosa, constantemente crítica, e a sua visita parece ser mais motivada por questões práticas do que por afeto: um acordo tácito vincula o filho a ocupar-se dele a cada regresso e a manter um apartamento em seu nome, para assim ele poder escapar-se aos impostos no seu país de origem.

     Mas agora que este filho se tornou também pai, debatendo-se com o cansaço de uma licença de paternidade, a sua vontade é libertar-se dessa cláusula familiar. Também a irmã, já mãe e novamente grávida, está a contas com a vida. Serão dez conturbados dias de visita que obrigarão cada um dos membros desta família a enfrentar os fantasmas do passado e as tensões do presente.

    Escrito com humor e um olhar atento, A Cláusula Familiar é o retrato divertido, doloroso e verdadeiro das relações familiares nas nossas sociedades modernas e multiétnicas, nas quais um forte desejo de individualismo se conjuga com os valores ancestrais de identidade e pertença.

    Título

    História de uma fraude

    Autor

    E. Lockhart

    Editora

    ASA

    Sinopse

    Imogen é herdeira de uma fortuna, uma cozinheira talentosa e uma hábil impostora.

     Jule é atleta, uma lutadora e um fascinante camaleão social.Entre elas, há uma amizade intensa. Quase obsessiva. O verão que passam juntas é feito de revelações e mistérios.

    Mas isso foi antes… Agora, alguém desapareceu. Algo de fundamental mudou. E uma rapariga brilhante vive em segredo o seu Sonho Americano.

    A autora do inesquecível Quando éramos mentirosos brinda-nos agora com um romance de suspense psicológico – a história de uma jovem que se recusa a ser quem em tempos foi.

    Título

    Breve História do Afeganistão de A a Z

    Autor

    Ricardo Alexandre

    Editora

    Oficina do Livro

    Sinopse

    Com uma linguagem simples e directa, o jornalista Ricardo Alexandre explica-nos o complexo puzzle afegão num livro que resulta de uma pesquisa intensa, de diversas entrevistas e do trabalho do autor enquanto repórter no terreno.

    Recuando a tempos imemoriais, mas focando-se essencialmente no tumulto constante das décadas mais recentes – desde o golpe que derrubou a monarquia de Cabul em 1973 ao regresso dos Talibãs já em 2021, passando pela ocupação soviética e o consequente advento dos mujahedin nos anos 80 – Breve História do Afeganistão é um documento elucidativo que nos ajuda a compreender um país fascinante, profundamente marcado pela guerra e com uma importância estratégica fundamental.

    Título

    A última curva do caminho

    Autor

    Manuel Jorge Marmelo

    Editora

    Porto Editora

    Sinopse

    Retirado do fragor apressado da capital e das obrigações mundanas, um velho professor jubilado prepara-se para morrer. Olhando a ruína da casa dos avós a partir da última curva do caminho que ali conduz, recorda o garoto que foi e tudo o que lhe sucedeu depois: o triciclo que teve em África, a primeira bicicleta, o charco dos girinos, os livros que escreveu e as mulheres que amou.

    Partindo de uma pícara lenda familiar e do lento mergulho nas coisas do passado, o catedrático Nicolau Coelho constrói uma narrativa íntima e nostálgica, durante a qual não deixa de ponderar, com certa ironia, sobre a intolerável velocidade das coisas do presente, como a da chamada inteligência artificial.

    Mais do que um romance, A Última Curva do Caminho constitui um acto de resistência e um manifesto em defesa da lentidão, da liberdade individual e do direito à eutanásia, com um enredo marcado pelo processo de envelhecimento, pela doença, pela solidão e pela perplexidade diante da inevitabilidade da morte.

    Título

    Festa pública | Orlando em tríptico e aventuras | Rainhas cláudias ao domingo

    Autor

    Virgílio Martinho

    Editora

    Companhia das Ilhas

    Sinopse

    O singular percurso literário de Virgílio Martinho ficou marcado pela relação próxima que teve com Mário Cesariny e com o “movimento surrealista” do Café Gelo nas décadas de 50 e 60 do século XX (Alexandre O’Neill, António José Forte, António Maria Lisboa, Cruzeiro Seixas, Herberto Helder e Mário-Henrique Leiria outros).

    Em 1958, publicou a novela, de pendor fantástico, Festa Pública, na colecção “A Antologia em 1958”, dirigida por Cesariny Mário Cesariny. O apodo de “surrealista”, que ainda hoje muitos teimam em lhe colar, tem aqui um momento marcante. Na mesma linha, seguiram-se os contos de Orlando em Tríptico e Aventuras (1961), e, noutro registo, Rainhas Cláudias ao Domingo (1972) – três títulos que se reúnem neste volume com que a Companhia das Ilhas inicia a publicação das obras de Virgílio Martinho.

    Em 1970, deu início a uma vertente que se tornará dominante na sua obra, o teatro, com a publicação da peça Filopópulus, na revista Grifo (texto encenado por J. Benite em 1973), seguiram-se dezenas de outros no Grupo de Teatro de Campolide, actualmente Companhia de Teatro de Almada.

    Virgílio Martinho resistiu, com uma bonomia desconcertante, a modas, escolas e movimentos. Quem conviveu com ele lembrar-se-á sempre do seu riso casquinado, cerveja numa mão e cigarro noutra. É isso. Agora, deitamos novas luzes sobre os seus textos. Palcos novos para uma obra que será sempre livre.

    Título

    Almanaque dos espelhos | Os segredos da Jacinta | Brinquedo electrónico essencial

    Autor

    Manuel João Gomes

    Editora

    Companhia das Ilhas

    Sinopse

    É, pois, muito natural que no caleidoscópico Almanaque dos espelhos publicado em 1980 – e que inaugura este presente volume – esteja muito presente todo esse lastro anterior, bem como as marcas inconfundíveis de uma erudição esclarecida que convoca a inspiração de autores aparentemente díspares para os colocar em diálogo. Entre si e com o próprio, a pretexto de umas variações narcísicas.

    Os Segredos da Jacinta traz-nos tudo isso, e mais alguma coisa: porventura um acentuado tom de paródia. Esta sátira do nosso sátiro é publicada em 1982, o ano em que o Papa veio a Fátima (sem revelar o terceiro segredo) em missão de agradecimento por haver sobrevivido a um atentado cometido no ano anterior, em Roma, por um extremista turco – para sobreviver a novo atentado em solo português, desta vez cometido por um padre extremista espanhol. E também o ano em que o porta-contentores Tollan, naufragado em pleno Tejo em Fevereiro de 1980, continua de quilha voltada para o céu mesmo em frente ao Terreiro do Paço, agora já volvido em inédita atracção turística e em parque de estacionamento para gaivotas. Não admira assim que a Jacinta encontre por ali o Peixomem, como o leitor verá.

    Curiosamente foi entre a publicação de um e outro volume, mais exactamente em 10 de Junho de 1981, que ocorreu a tragédia do pequeno Alfredo Rampi. Um caso inolvidável. A RAI esteve em directo durante 18 horas consecutivas, com audiências recorde, o presidente italiano deslocou-se ao local, sucederam-se os voluntários e as tentativas de resgate, mas a cada nova tentativa o pequeno Alfredo apenas caía mais e mais. E aí temos o mote do Brinquedo electrónico essencial (abreviatura de um título consideravelmente mais extenso, como se descobrirá na ocasião) que foi publicado em 1985 e remata este tríptico com glosas, e até personagens, dos volumes anteriores, por entre esquiroletas, serpentelos e sapombas.

    Título

    A liberdade dos futuros – ecorrepublicanismo para o século XXI

    Autor

    Jorge Pinto

    Editora

    Tinta da China

    Sinopse

    Outrora sinónimo exclusivo de emancipação, a ideia de liberdade tem sido corrompida por uma visão que a concebe apenas como não-frustração e não-limitação — uma concepção egoísta que deve ser contestada.

    Este livro recupera, à luz dos desafios do século XXI, a ideia republicana de liberdade enquanto não-dominação. E propõe uma política ecorrepublicana que promova o florescimento humano através da construção de uma república não dominadora e ecologicamente sustentável.

    Título

    Beber pela garrafa

    Autor

    Cláudia Lucas Chéu

    Editora

    Companhia das Ilhas

    Recensão

    Beber pela garrafa é o quinto livro de poesia de Cláudia Lucas Chéu. Encontra-se dividido em duas partes: Consanguinidade e Bastardia.

    A primeira parte, é composta por narrativas poéticas de temática familiar; e a segunda, por poemas de amor e desgosto, na ambiência da metrópole e do subúrbio.

    Título

    Poemas em prosa

    Autor

    Stéphane Mallarmé

    Editora

    Assírio & Alvim

    Sinopse

    Os textos que aqui se traduzem configuram a primeira parte de Divagações, livro publicado em 1897.

    Nestes escritos a que o autor gostava de chamar “poemas críticos”, ou “anedotas”, a linguagem, ritmo e prosódia de cada palavra comunicam entre si.

    Partindo da narração de episódios tão poéticos quanto prosaicos – um passeio de coche em direcção a uma feira, o som de uma palavra e suas sombrias analogias –, Mallarmé, nunca nomeando directamente o objecto da sua reflexão, mas aludindo aos seus matizes e atmosfera, coloca o papel activo de decifrar as imagens de cada historieta no próprio leitor.

    Caberá a ele fruir das longas frases que invertem a sua ordem natural e se desdobram numa lógica sinuosa, absorvendo lentamente a música e o sentido desta poesia.

    Título

    O caminho do burro

    Autor

    Paulo Moreiras

    Editora

    Visgarolho

    Sinopse

    O Caminho do Burro é uma antologia dos melhores contos escritos por Paulo Moreiras, entre 1996 e 2017, que andavam dispersos por diversas publicações, algumas hoje esquecidas ou de difícil acesso.

    Contos onde o picaresco e a malícia do povo português andam de braço dado com as invejas e as cobiças de gente ruim e sem escrúpulos. Uns à procura de uma vida melhor, do amor, da amizade e outros a engendrar estratagemas a fim de estragar os bons planos do vizinho.

    Um retrato irónico, mordaz e cheio de humor sobre as grandezas e misérias de ser português, com os seus toques de malandro, pinga-amor e desenrascado. Tudo embrulhado pela riqueza vocabular a que Paulo Moreiras já nos habituou. Contos para comer, beber e rir por mais, que assim se dizem as verdades.

    Título

    A afirmação negra e a questão colonial

    Autor

    Mário Domingues (coord. José Luís Garcia)

    Editora

    Tinta da China

    Recensão

    Foi em 1919, há mais de um século, que Mário Domingues publicou num jornal o seu primeiro texto em defesa dos negros, intitulado “Colonização”.

    Jornalista, cronista, escritor, nascido em S. Tomé e Príncipe, atento ao activismo do movimento negro por todo o mundo, foi construindo a partir daí, e até 1928, uma precursora obra de «rebeldia negra» na imprensa em Portugal.

    Este livro recupera a maioria dos textos de Mário Domingues, injustamente esquecidos, onde este escreve, muito à frente do seu tempo, sobre a condição dos negros, o racismo e a colonização, denunciando de forma arrojada preconceitos e discriminações, e expondo corajosamente a violência do colonialismo e de todas as formas de subjugação.

    Além disso, José Luís Garcia, que reuniu estas crónicas, apresenta-nos um ensaio introdutório sobre a obra, a vida e o contexto de Mário Domingues, “um dos maiores símbolos da passagem do negro de uma condição de subalternidade na sociedade portuguesa para autor da sua vida”, e um verdadeiro “antecessor da afirmação negra”.

    Título

    Vidas seguintes

    Autor

    Abdulrazak Gurnah

    Editora

    Cavalo de Ferro

    Sinopse

    Após fugir da aldeia onde nasceu, numa região fustigada pela pobreza, pela fome e pela doença, o jovem Ilyas chega a uma pequena cidade costeira onde assiste a um desfile da Schutztruppe, a feroz tropa de protecção da África Oriental Alemã.

    Anos mais tarde, perante a iminência de uma grande guerra entre Britânicos e Alemães, que estalaria em Tanga, em 1914, Ilyas decide juntar-se a esse mesmo exército de mercenários africanos, prometendo à sua irmã mais nova voltar muito em breve.

    A promessa fica por cumprir, e o paradeiro desconhecido do irmão ensombra a vida de Afiya até que ela conhece Hamza, um desertor generoso e sonhador que conseguiu escapar aos horrores da guerra. Entre ambos nascerá uma história de amor improvável que ligará as duas famílias, e os continentes africano e europeu.

    Entrelaçando história e ficção, Vidas seguintes é um romance lúcido e trágico sobre África, o legado colonial e as atrocidades da guerra, bem como as infinitas contradições da natureza humana.

  • A Cultura no Página Um

    A Cultura no Página Um


    Não será necessário, julgo, explicar ao leitores do PÁGINA UM a relevância e importância da Cultura, nem das Artes nem da Ciência e do Conhecimento.

    A Cultura é aquilo que nos faz humanos, mesmo no meio da desumanidade. A Cultura nos separa dos animais, mesmo quando, ou sobretudo quando, a selvajaria nos rodeia.

    Este projecto jornalístico não poderia, assim, descartar-se da Cultura.

    Até por ser ter um lugar especial no meu coração, no meu cérebro, em todo o meu corpo e alma.

    Durante uma fase importante da minha formação como pessoa, sobretudo entre os 35 e os 45 anos, dediquei-me com paixão à escrita, publicando quatro romances e três livros de crónicas de carácter histórico. E, além de ensaios na área do Ambiente, fiz algo que muito me honra: redescobri, para a História da Literatura, o pioneiro do romance moderno português, o injustamente esquecido Guilherme Centazzi, com o seu O Estudante de Coimbra.

    Mesmo se, nos últimos anos, por vicissitudes e escolhas várias, me “ausentei” da escrita literária, a Cultura tem-me acompanhado, nem que seja através da minha biblioteca e dos ensinamentos para a vida.

    Por esse motivo, a Literatura será um dos temas fortes da secção de Cultura do PÁGINA UM.

    Além da Estante de novidades que as diversas editoras nos enviam, farei pessoalmente uma selecção daquelas obras que considero mais relevantes, podendo estas serem novidades ou reedições.

    De igual modo, e tendo em consideração o meu carinho especial pelo romance do género histórico, procurarei revelar obras e autores que o foram praticando desde o século XIX. Tenho, para tal, uma vasta bibliografia que me dará para mais de mil títulos e centenas de autores.

    O PÁGINA UM tem também o prazer de contar já com diversos colaboradores neste secção para a recensão de livros (ficção e não-ficção), a saber: Ana Luísa Pereira, Bruno Anselmi Matangrano, Conceição Carneiro, Isabel de Almeida, Luís Serpa e Zuraida Guedes.

    Em breve serão publicadas as primeiras recensões, algumas também da minha safra.

    Na medida das possibilidades, e da abertura das actividades culturais à normalidade, o PÁGINA UM tentará também fazer a divulgação e “análise” em outros sectores.

    Nessa medida, esta secção de Cultura do PÁGINA UM também é vossa; e assim estamos desde já abertos à colaboração daqueles que se considerarem úteis e capazes.

    Obrigado por nos acompanharem.