Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 14 contratos, dos quais sete por concurso público, um ao abrigo de acordo-quadro e seis por ajuste directo.
Ontem, dia 27 de Setembro, no Portal Base foram divulgados 697 contratos públicos, com preços entre os 13,82 euros – para aquisição de material clínico, pelo Instituto Português de Oncologia de Lisboa, ao abrigo de acordo-quadro – e os 5.139.783,42 euros – para fornecimento de refeições escolares, pelo Município da Figueira da Foz, também ao abrigo de acordo-quadro.
Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 11 contratos, dos quais oito por concurso público, um ao abrigo de acordo-quadro, um por consulta prévia simplificada e um por ajuste directo.
Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 11 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: dois do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (um com a Enzifarma, no valor de 1.290.900,00 euros, e outro com a Drager Portugal, no valor de 148.982,10 euros); dois do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (um com a Bayer, no valor de 470.600,00 euros, e outro com a Pierre Fabre, no valor de 178.442,10 euros); três do Hospital de Braga (um com a Philips, no valor de 294.523,80 euros, outro com a Marka Lda., no valor de 119.487,00 euros, e outro com a Escala Braga – Sociedade Gestora do Edifício, no valor de 108.782,44 euros); Centro Hospitalar de Setúbal (com a Roche Farmacêutica, no valor de 264.350,00 euros); Município de Celorico de Basto (com a Transdev Norte, no valor de 186.830,07 euros); Município de Lisboa (com a Crope Engenharia, no valor de 132.250,00 euros); e a Escola Básica e Secundária de Santa Maria (com a Porto Editora, no valor de 107.836,41 euros).
TOP 5 dos contratos públicos divulgados no dia 27 de Setembro
Depois de uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa e de um acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, o Conselho Superior da Magistratura acabou por permitir a consulta do célebre inquérito à distribuição da Operação Marquês. Mas 638 dias depois do pedido, o CSM insiste agora em não cumprir uma sentença que lhe causará engulho, e expurgou, para já em cópias disponibilizadas ao PÁGINA UM, partes do relatório do inquérito, algo que a sentença não lhe permite. Além disso, o CSM impede agora o PÁGINA UM de fotografar as páginas do processo. A alternativa é pagar mais de 500 euros ao CSM pela fotocópia de cerca de mil páginas do processo, mas sem garantias de virem imaculadas.
Esta foi a primeira intervenção do FUNDO JURÍDICO do PÁGINA UM, e ainda não acabou. Tem sido um longo calvário de 638 dias, exactos 21 meses, hoje com resultados positivos, embora ainda parciais, para a transparência democrática e uma prova da eficácia de um jornalismo independente e persistente: o PÁGINA UM tem, desde hoje, cópia do inquérito final do Conselho Superior da Magistratura (CSM) à distribuição da denominada Operação Marquês, o mega-processo, que ainda aguarda julgamento, que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates.
Tudo começou em 2 de Novembro de 2021. Perante a sistemática recusa do CSM em divulgar o inquérito de distribuição da Operação Marquês junto da comunicação social, o PÁGINA UM, então ainda em preparativos para a sua abertura, apresentou um requerimento para, ao abrigo da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos (LADA) para acesso e “eventual obtenção de cópia (analógica ou digital), aos documentos administrativos elaborados e/ou apresentados pelo Sr. Inspetor Judicial Coordenador Juiz Desembargador Dr. Paulo Fernandes da Silva no Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 4 de Maio p.p., bem como a sua proposta formulada no relatório relativo à denominada Operação Marquês.”
Sede do Conselho Superior da Magistratura, esta tarde, quando o director do PÁGINA UM se deslocou para consultar um processo pedido há 21 meses, após um parecer da CADA, uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa e um acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul. Mesmo assim, o CSM não quer cumprir a sentença na íntegra, colocando obstáculos ao acesso integral e transparente.
Iniciava-se, naquele preciso momento, um calvário de 638 dias em busca da transparência.
Numa primeira fase, o CSM recusou essa pretensão ao PÁGINA UM – como até já fizera inicialmente com Sócrates. Em 21 de Dezembro de 2021, a juíza Ana Sofia Wengorovius – adjunta do CSM – emitiu um parecer alegando que o acesso por um jornalista àqueles documentos violaria ou afectaria “os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”, salientando que, para alguém poder consultar o inquérito, teria obrigatoriamente de invocar um “interesse atendível ou legítimo”.
O PÁGINA UM apresentou então uma queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), que em Fevereiro do ano passado concedeu um parecer favorável ao acesso. Mas o CSM reiterou a recusa, recordando que os pareceres daquela entidade “não são vinculativos”, e desafiava “o requerente [director do PÁGINA UM] querendo, intentar respetiva acção especial de acesso a documento administrativo”.
Primeira página do relatório final do inspector Paulo Fernandes da Silva sobre a legalidade da distribuição do processo da Operação Marquês em 2014. Até o nome desse juiz foi expurgado das cópias disponibilizadas pelo CSM, e em algumas das páginas a mutilação é quase total.
Com o apoio dos seus leitores, através do FUNDO JURÍDICO – este seria o primeiro processo de intimação, conduzido pelo advogado Rui Amores –, a intimação do PÁGINA UM foi bem-sucedida. Em 30 de Junho do ano passado, o juiz Pedro de Almeida Moreira, do Tribunal Administrativo de Lisboa, fez uma sentença a intimar o CSM, “no prazo de 10 dias, facultar-lhe [ao director do PÁGINA UM] o acesso aos documentos por aquele solicitados”.
Isto sucedeu depois deste juiz ter exigido que o CSM enviasse o relatório da inspecção em envelope selado para averiguar se os seus argumentos relacionados com uma alegada existência de dados nominativos tinham razão de ser.
Contudo, o juiz Almeida Moreira, após consultar o relatório do inquérito, concluiu que “compulsada a informação remetida pelo Requerido [CSM] em envelope selado, considera este Tribunal, à semelhança do que entendeu o[a] CADA, no douto parecer elaborado, que em causa estão unicamente dados atinentes ‘aos intervenientes no procedimento de distribuição processual, atuando no exercício das funções públicas que lhes estão por lei cometidas, não abrangendo qualquer informação relativa à dimensão da vida privada’ (…), não se identificando, como tal, motivos para cercear a regra geral do livre acesso a documentos administrativos”.
E acrescentou ainda o juiz que, “e ainda que assim não se entendesse – id est, que os documentos que o Requerente [director do PÁGINA UM] aqui procura obter consubstanciassem documentos nominativos em sentido próprio, porquanto continentes de dados pessoais, nos termos e para os efeitos do RGPD [Regulamento Geral de Protecção de Dados] –, considera este Tribunal, em face da concreta informação ali vertida, que sempre deveria prevalecer o direito de acesso do Requerente aos referidos documentos face à protecção de tais dados, no âmbito de um juízo ponderativo de proporcionalidade.” Ou seja, o direito à informação e o direito de um jornalista informar era mais relevante.
Porém, nem assim o CSM desistiu e recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul. Mais uma vez – pela terceira vez –, não lhe deram razão.
No passado dia 29 de Junho, num acórdão demolidor, aprovado por unanimidade por três desembargadores e com o apoio do Ministério Público, deliberaram que a sentença do juiz Almeida Moreira tinha de ser mantida em toda a linha, concluindo que não houve qualquer “erro de julgamento da não pronúncia sobre a não indicação da finalidade do acesso solicitado, nem sobre a natureza pré-disciplinar da informação”, além de não ter havido qualquer “erro de julgamento de falta de fundamentação do juízo de proporcionalidade efectuado”.
Volumes dos inquéritos ao processo de averiguação, fotografados antes da ordem de não ser permitido continuar a fotografar.
O acórdão mostrou-se particularmente importante por também clarificar a questão da suposta protecção de dados nominativos, que tem estado a ser levado ao extremo, através da recusa de acesso ou à eliminação até do nome de funcionários públicos em documentos administrativos, como se tem observado no Portal Base com os contratos públicos.
Nessa linha, os desembargadores salientam que essa presunção devia ter sido efectuada, nos termos da lei [o referido nº 9 do artigo 6º da LADA], pelo CSM, “enquanto entidade administrativa que recebeu o pedido (…) e conhece o teor dos documentos em referência, sabendo ou podendo verificar que não respeitam a origem étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, dados genéticos, biométricos ou relativos à saúde, ou dados relativos à intimidade da vida privada, à vida sexual ou à orientação sexual de uma pessoa, titular/es dos dados pessoais neles constantes”. E, nessa linha, defenderam os desembargadores, o CSM tinha a obrigação de permitir desde logo o acesso.
Porém, “não o fez”, como escrevem os desembargadores, “recusando o acesso requerido com fundamento de que os documentos eram nominativos e, sustentando no recurso, que têm de ser cumpridos os princípios plasmados no RGPD (Regulamento Geral da Protecção de Dados], como sejam a demonstração e concretização da finalidade do acesso aos dados pessoais contidos em tais documentos e do interesse pessoal e directo no mesmo.”
Páginas 20 e 21 do relatório final concluído em 3 de Dezembro de 2018 sobre a distribuição do processo da Operação Marquês ao juiz Carlos Alexandre.
Os desembargadores concluem que o CSM não poderia ter decido assim, uma vez que o PÁGINA UM, “ao abrigo do direito de acesso a informação não procedimental, pretend[ia] saber o que consta dos documentos e não apenas os dados pessoais, não tendo aquele que observar o que consta do RGPD, mas sim na LADA, até em decorrência do disposto no artigo 26º da Lei da Protecção de Dados Pessoais.”
Mas nem assim o CSM parece ter aprendido. Esta tarde, tendo o director do PÁGINA UM se deslocado à sede do CSM para consultar o processo de averiguação à distribuição da Operação Marquês – constituídos por três volumes com um total de 1.024 páginas – foi confrontado com alguns impedimentos ilegais e com a recusa de cumprimento das determinações da sentença.
Com efeito, além de o director do PÁGINA UM ter sido impedido, a partir de uma determinada fase da consulta, de obter a reprodução por fotografia das páginas do processo de averiguação – uma prática legal, que tem sido sistematicamente corroborada pela CADA em já, pelo menos, quatro deliberações –, as cópias disponibilizadas do relatório final estão mutiladas a tinta negra, apagando tanto os nomes dos intervenientes como também a discriminação de eventos, como seja número de processos, data de distribuição, o tipo de distribuição ao juiz e o escrivão que interveio em cada processo.
Antes de ser impedido de continuar a fotografar o processo, o director do PÁGINA UM conseguiu obter o testemunho integral do juiz Carlos Alexandre neste processo.
Em alguns casos, as rasuras a negro ocupam partes substanciais ou mesmo quase a totalidade das páginas, e nunca estão em causa mais do que nomes ou referências a processos judiciais, Não há, aliás como bem salientava o Tribunal Administrativo de Lisboa, qualquer dado nominativo.
Por exemplo, no interrogatório que o instrutor do processo de averiguação ao juiz Carlos Alexandre não consta qualquer dado nominativo, e até o endereço indicado foi o profissional, que não é considerado dado nominativo para efeitos de protecção de dados.
Apesar de essa informação ser acessível no processo original em papel, mas cuja reprodução fotográfica foi impedida, a obtenção dessa informação por meios manuais seria particularmente penosa. Além disso, a obtenção de fotocópias – além de o CSM poder, se não cumprir a sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, mutilar as partes que não quer mostrar – teria um custo exorbitante.
Com efeito, e como o CSM teve o cuidado de avisar o PÁGINA UM com antecedência, de acordo com o Regulamento de Emolumentos, a reprodução por fotocópia simples de cada folha, com anverso e reverso (ou seja, duas páginas), tem o custo de 1/50 unidades de taxação (UT), sendo que cada UT corresponde a um décimo (1/10) do indexante dos apoios sociais (IAS), que este ano está fixado em 480,43 euros.
Mesmo considerando que as 1.024 páginas de todo o processo de averiguações – que inclui, por exemplo, os depoimentos do juiz Carlos Alexandre – coubessem em 512 páginas, o custo total que o PÁGINA UM teria de suportar ascenderia aos 492 euros.
Na verdade, deverá superar os 500 euros, uma vez que haverá páginas que, no processo, não têm reverso.
Foi apresentado de imediato um requerimento à juiz secretária do CSM, que alegadamente deu ordens para que não fosse permitido ao director do PÁGINA UM continuar a fotografar o processo de averiguações que resultou no inquérito à distribuição da Operação Marquês.
O requerimento do PÁGINA UM foi manuscrito com o que havia à mão: umas simples folhas brancas A5. Legalmente, é válido, e aguarda-se agora a resposta, até para saber se se mostra necessária nova intervenção do Tribunal Administrativo de Lisboa.
N.D. Os processos de intimação do PÁGINA UM só são possíveis com o apoio dos leitores. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados através do FUNDO JURÍDICO. Neste momento, por força de 18 processos em curso, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras.
Ontem, dia 21 de Setembro, no Portal Base foram divulgados 667 contratos públicos, com preços entre os 31,42 euros – para prestação de serviços de seguros, pelo Colégio de São Gonçalo de Amarante – Escola Católica, através de concurso público – e os 6.829.999,90 euros – para aquisição de equipamentos de rádio, pela Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, através de ajuste directo.
Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 16 contratos, dos quais nove por concurso público, três por consulta prévia, três por ajuste directo e um ao abrigo de acordo-quadro.
Em causa está o acesso ao inquérito sobre a distribuição da Operação Marquês, e o PÁGINA UM foi o único órgão de comunicação de Portugal que não aceitou um NÃO do todo-poderoso Conselho Superior da Magistratura. E foi à luta pelos direitos de acesso à informação. Primeiro, na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. Venceu, mas o CSM recusou. Segundo, no Tribunal Administrativo de Lisboa. Venceu, mas o CSM recorreu. E o PÁGINA UM viu agora três desembargadores darem-lhe razão. Terceira vitória. Haverá novo despique, agora no Supremo Tribunal Administrativo, para um provável 4-0, ou o CSM vai aceitar que se vive numa democracia?
A sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, anunciada em Junho do ano passado era já claríssima: “Em face do que antecede, julgo a presente acção intentada por Pedro Almeida Vieira [director do PÁGINA UM] procedente e, em consequência, intimo o Conselho Superior da Magistratura [CSM] a, no prazo de 10 dias, facultar-lhe o acesso aos documentos por aquele solicitados através do seu requerimento de 2 de Dezembro de 2021”.
Este deveria ter sido o corolário de sete meses de legítima pressão do PÁGINA UM – consubstanciada na Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e da Lei da Imprensa – sobre o CSM para a obtenção do célebre inquérito à distribuição do processo da Operação Marquês em 2014 – então entregue sem sorteio ao juiz Carlos Alexandre, e que culminaria então com a detenção do ex-primeiro-ministro, José Sócrates.
Conselho Superior da Magistratura quis sempre manter secretismo sobre os meandros da Operação Marquês.
Mas não foi, Na verdade, foi preciso mais um ano, muito mais papel, mais um parecer do Ministério Público, e um acórdão de três juízes desembargadores de 23 páginas para fazer cumprir um direito óbvio de acesso a documentos administrativos e ao exercício da liberdade de imprensa.
O “caso” foi espoletado pelo PÁGINA UM em finais de 2021, mas era uma história antiga. Sistematicamente, o CSM recusava a divulgação do famoso inquérito à entrega ao juiz Carlos Alexandre do mais famoso processo judicial em tempos de democracia, a Operação Marquês. Este inquérito tinha feito já correr muita tinta, incluindo um processo judicial de José Sócrates contra o Carlos Alexandre, que acabou arquivado pelo Tribunal da Relação em Maio do ano passado.
Porém, nunca este inquérito viu a “luz do dia”, como se fosse um segredo de Estado, e não um episódio fundamental para percebermos os bastidores da Justiça em Portugal.
O PÁGINA UM não aceitou e foi dar luta ao CSM onde se deve fazer num Estado de Direito: nos palcos da lei e a ordem, enfrentando uma das cúpulas da Justiça – ou seja, exercendo a nobre função do Jornalismo
Primeira página do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul concedendo o direito de acesso ao PÁGINA UM.
Primeiro, pedindo formalmente os documentos, corria o mês de Dezembro de 2021. Em 21 desses mês, a juíza Ana Sofia Wengorovius, adjunta do CSM, recusou liminarmente, emitindo um parecer alegando que o acesso por um jornalista àqueles documentos violaria ou afectaria “os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação”, salientando que, para alguém poder consultar o inquérito, teria obrigatoriamente de invocar um “interesse atendível ou legítimo”.
O PÁGINA UM recorreu então à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), presidida pelo juiz conselheiro Alberto Oliveira, que viria a dar razão ao PÁGINA UM em 17 de Fevereiro de 2022.
Mas nem assim o CSM se disponibilizou a ceder os documentos do inquérito, advogando que o parecer da CADA não era vinculativo, acabando mesmo por “convidar” o PÁGINA UM a recorrer para o Tribunal Administrativo de Lisboa.
O órgão superior de gestão e disciplina dos juízes dos tribunais judiciais portugueses considerou então, através da também juíza Ana Cristina Chambel Matias que “o Requerente [director do PÁGINA UM] não invocou, nem demonstrou que o acesso aos documentos constantes do processo de averiguações em causa são necessários para a tutela de um qualquer seu direito ou interesse legalmente protegido para que lhe seja conferido o direito a esse acesso”, acrescentando que “apesar de notificado por mais de uma vez pelo CSM, não concretizou cabalmente os elementos pretendidos dentro das condicionantes próprias do procedimento e não esclareceu qual a finalidade do acesso e da recolha de tais documentos”.
Na verdade, o PÁGINA UM sempre alegou que o estatuto de jornalista era suficiente, tendo sim recusado justificar se a consulta se consubstanciaria em notícia ou não.
O PÁGINA UM decidiu então seguir para a verdadeira luta judicial: o Tribunal Administrativo, naquele que viria a ser o primeiro processo de intimação financiado pelos seus leitores, através do FUNDO JURÍDICO,
Em sede de contestação, o CSM insistiu na tese da existência de “dados nominativos” nos documentos do inquérito. Porém, em vez de acreditar piamente no CSM, o juiz do Tribunal Administrativo de Lisboa, Pedro Almeida Moreira, exigiu que lhe fosse enviado “em envelope selado, cópia dos documentos a que o Requerente [director do PÁGINA UM] pretende aceder, de molde a permitir a este Tribunal aquilatar se os mesmos contêm ou não ‘múltiplos dados pessoais’ e, ‘se a isso se chegar, tecer um juízo de proporcionalidade concernente aos interesses que aqui se encontram concretamente em jogo’”.
A sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa, em 30 de Junho do ano passado, foi o primeiro revés para o CSM, uma vez que o juiz Pedro Almeida Moreira considerou, consultando o inquérito à distribuição da Operação Marquês, que este “não configura um documento nominativo, em sentido próprio”, uma vez que “em causa estão unicamente dados atinentes aos intervenientes no procedimento de distribuição processual, atuando no exercício das funções públicas que lhes estão por lei cometidas, não abrangendo qualquer informação relativa à dimensão da vida privada”.
O juiz do Tribunal Administrativo de Lisboa tecia mesmo duras críticas às alegações do CSM, considerando que “a vingar a interpretação que aqui é propugnada pelo Requerido [CSM], isso significaria que o mero nome de um funcionário público que tenha intervindo num qualquer procedimento administrativo apenas poderia ser tornado acessível aos interessados após a ponderação dos interesses em jogo no âmbito de um juízo de proporcionalidade, o que não se mostra aceitável em face das exigências de transparência que impendem sobre a Administração, nos termos constitucional e infraconstitucionalmente consagrados.”
Mas o CSM não se deu por vencido com a opinião da CADA e do Tribunal Administrativo de Lisboa, recorrendo – e obrigando o PÁGINA Um a suportar mais encargos judiciais – para o Tribunal Central Administrativo Sul. E o acórdão demorou, mas saiu no final da passada semana. E é um acórdão demolidor.
Más notícias, portanto, para os conselheiros do CSM.
Mas óptimas notícias para a transparência pública e para a liberdade de imprensa num sistema democrático.
Sentença do juiz Pedro Almeida Moreira foi “validada” por três desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, que lançam críticas à atitude do Conselho Superior da Magistratura.
O acórdão, votado por unanimidade pelos desembargadores Lina Costa (que foi a relatora), Catarina Vasconcelos e Rui Pereira em 29 de Junho passado, arrasa em toda a linha a argumentação que o CSM usou para evitar o acesso ao inquérito.
E até aborda em detalhe o argumento do CSM de que o director do PÁGINA UM não tinha justificado – porque se recusou a justificar, por ser óbvio aquilo que um jornalista faz – a finalidade dos documentos requeridos.
Para os desembargadores, a sentença inicial do juiz Pedro Almeida Moreira é para manter em toda a linha, concluindo que não houve qualquer “erro de julgamento da não pronúncia sobre a não indicação da finalidade do acesso solicitado, nem sobre a natureza pré-disciplinar da informação, além de não ter havido qualquer “erro de julgamento de falta de fundamentação do juízo de proporcionalidade efectuado”.
O acórdão mostra-se, aliás, particularmente importante por clarificar a questão da suposta protecção de dados nominativos, que tem estado a ser levado ao extremo, através da recusa de acesso ou à eliminação até do nome de funcionários públicos em documentos administrativos, como se tem observado no Portal Base com os contratos públicos.
Nessa linha, os desembargadores salientam que “essa presunção devia ter sido efectuada, nos termos da lei [o referido nº 9 do artigo 6º da LADA], pelo Recorrente, “enquanto entidade administrativa que recebeu o pedido (…) e conhece o teor dos documentos em referência, sabendo ou podendo verificar que não respeitam a origem étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, dados genéticos, biométricos ou relativos à saúde, ou dados relativos à intimidade da vida privada, à vida sexual ou à orientação sexual de uma pessoa, titular/es dos dados pessoais neles constantes”, o CSM deveria ter permitido logo o acesso.
Porém, “não o fez”, como escrevem os desembargadores, “recusando o acesso requerido com fundamento de que os documentos eram nominativos e, sustentando no recurso, que têm de ser cumpridos os princípios plasmados no RGPD (Regulamento Geral da Protecção de Dados], como sejam a demonstração e concretização da finalidade do acesso aos dados pessoais contidos em tais documentos e do interesse pessoal e directo no mesmo.”
Os desembargadores concluem que o CSM não poderia ter decido assim, uma vez que o PÁGINA UM, “ao abrigo do direito de acesso a informação não procedimental, pretend[ia] saber o que consta dos documentos e não apenas os dados pessoais, não tendo aquele que observar o que consta do RGPD, mas sim na LADA [Lei do Acesso aos Documentos Administrativos], até em decorrência do disposto no artigo 26º da Lei da Protecção de Dados Pessoais.”
O CSM foi ainda condenado a pagar as custas do processo, mas pode ainda recorrer para a última instância para o Supremo Tribunal Administrativo. Essa opção implicaria novo atraso num processo que é considerado urgente – mas que já vem de 2021 – e mais custos para o PÁGINA UM.
Mas, se tal suceder, o CSM arrisca também perder uma quarta vez, depois de uma deliberação da CADA, de uma sentença do Tribunal Administrativo de Lisboa e deste recente acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul.
N.D. Os processos de intimação do PÁGINA UM só são possíveis com o apoio dos leitores. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados através do FUNDO JURÍDICO. Neste momento, por força de 18 processos em curso, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras.
Ontem, dia 20 de Setembro, no Portal Base foram divulgados 757 contratos públicos, com preços entre os 6,84 euros – para aquisição de material de consumo clínico, pela Administração Regional de Saúde do Alentejo, ao abrigo de acordo-quadro – e os 5.159.800,00 euros – para empreitada de alteração e ampliação de um lar, pela Santa Casa da Misericórdia do Fundão, através de concurso público.
Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 11 contratos, dos quais nove por concurso público e dois ao abrigo de acordo-quadro.
Pedro Almeida Vieira e Luís Gomes reencontram-se no 17º episódio de Os economistas do diabo. Em cima da mesa, além de muitos assuntos paralelos, as “bolhas” das farmacêuticas no mercado de capitais, seguindo-se os últimos acontecimentos (violentos) em redor da TAP e, por fim, o regresso de Cavaco Silva à cena política.
Na rubrica Memórias de elefante, recordamos os tanques Leopard e que há uns meses supostamente iriam ter um contributo relevante no conflito da Ucrânia, enquanto agora se apresentam os aviões F-16 como o novo trunfo para a guerra.
Nos últimos três dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 858 contratos públicos, com preços entre os 1,20 euros – para a aquisição de medicamentos, pelo Hospital Dr. Francisco Zagalo, através de consulta prévia – e os 11.972.313,00 euros – para o fornecimento de refeições escolares, pelo Município da Maia, através de concurso público.
Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 16 contratos, dos quais 13 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro e um por ajuste directo.
Pedro Almeida Vieira e Luís Gomes reencontram-se no 15º episódio de Os economistas do diabo. A demissão (e não-demissão) de João Galamba e o estado do (des)Governo são o assunto central, mas rapidamente a conversa “descamba” na carga fiscal (excessiva?) e no papel do Estado Social, tendo como contexto a proposta da Iniciativa Liberal para a aplicação do sistema de flat tax.
Na rubrica Memórias de elefante destacamos como a imprensa tem estado a passar uma esponja sobre a pandemia, esquecendo os alertas falhados dos especialistas (sobre a “prometida” tripla pandemia de Inverno), dos contratos milionários das vacinas e dos seus efeitos secundários.