Afinal, a Trust in News, dona da revista Visão, não é a única empresa do comentador e empresário Luís Delgado que tem dívidas e acções de execução. Uma outra sociedade do seu universo empresarial acaba de ser alvo de um processo de execução na Justiça por parte do Millennium bcp. O processo também pede que Delgado, que é gerente da empresa, seja executado.
O banco deu entrada com uma acção no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa no passado dia 4 de Outubro a visar a empresa ‘Regula & Acerta’, bem como o próprio Luís Delgado. Em causa está uma dívida de 108 mil euros.
Luís Delgado. / Foto: D.R.
A empresa em questão foi criada por Delgado em 2014 como uma sociedade unipessoal com um capital social de apenas 100 euros. Em 2017, passou a ser uma sociedade por quotas e o capital social foi aumentado em um euro, passando a mulher de Delgado, Ana Delgado, a deter essa quota.
A sociedade opera com o CAE 56220 relativo a “actividades de serviço de fornecimento de refeições por contrato e outras atividades de serviços de alimentação” e tem sede na morada que Delgado indica como sendo a sua residência: Rua Gil Vicente, 64, rés do chão, em Lisboa.
Trata-se de uma empresa que já não apresenta contas desde o exercício de 2022.
Foto: Captura de imagem do Portal Citius.
Além desta acção de execução, em Julho passado, o empresário foi alvo de um processo para ser executado por uma dívida de 453.978,62 euros da Trust in News à Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia de Lisboa. Trata-se de uma dívida relacionada com rendas não pagas pela empresa de media, que acumulou dívidas superiores a 30 milhões de euros, designadamente ao Fisco e à Segurança Social. Os seus credores aprovaram, no início deste mês, a cessação da actividade da empresa de media.
Recorde-se que Luís Delgado está a cumprir uma pena suspensa de cinco anos pelo crime de abuso de confiança fiscal na forma agravada por dívidas contraídas ao Fisco nos primeiros anos de actividade da Trust in News. Se não pagar o montante em dívida, de 828 mil euros, arrisca ir para a prisão. O mesmo sucede com os outros dois gerentes da Trust in News, que estavam em funções na altura em que o crime foi cometido.
O plano de insolvência da TIN, apresentado por Delgado, era a sua última ’tábua de salvação’ perante diversas acções de execução em curso por parte de credores de TIN, designadamente a AT e a Segurança Social. Apesar de ter um capital social de apenas 10 mil euros, esta unipessoal criada em 2017, acumulou, estranhamente, dívidas superiores a 30 milhões de euros sobretudo junto do Estado, mas também junto do Novo Banco e da Impresa.
Agora, a somar ao descalabro da TIN, Luís Delgado enfrenta novas acções de execução mas por dívidas de uma das suas restantes empresas.
Está na moda falar em “defesa da democracia” e na importância de existir uma “imprensa livre”. Ainda bem. Afinal, ninguém no mundo Ocidental quer mergulhar numa era de condicionamento da imprensa nem em regimes autoritários. Portugal já viveu em ditadura e sabe o preço que acarretou para as liberdades fundamentais e para os jornalistas.
O problema é que, até pode estar na moda “defender a democracia” e a “imprensa livre”, mas soa cada vez mais a falso. Parecem palavras ocas num mundo em que a comunicação social se confunde com uma indústria de conteúdos para alimentar as massas de smartphone na mão. E para servir os clientes e parceiros de negócios, que pagam para terem promoção e publicidade, seja através de eventos, seja através de conteúdos pagos mais ou menos disfarçados de informação.
Foto: D.R.
Afinal, o que é isto de “imprensa livre”? Será um mantra para acalmar os receios, perante os sinais de que o passado de autoritarismo no continente europeu ainda deixou sementes que progridem a olhos vistos?
Esta quinta-feira, a partir das 9h00, o director deste jornal vai, de novo, estar sentado no banco dos réus para a segunda sessão de um julgamento que nem deveria estar a decorrer, não fosse pela acção do Ministério Público que se esqueceu que Portugal é um país em que (ainda) existe liberdade de expressão e liberdade de imprensa.
Pedro Almeida Vieira está a ser acusado de mais de três dezenas de crimes de difamação, entre os quais de ter criticado um péssimo poema de Gustavo Carona.
Mas este não é o único julgamento que o director do PÁGINA UM vai ter ainda este ano. Há já datas para as sessões de mais um julgamento. Mais uma tentativa de intimidação e silenciamento.
O facto de se aceitarem sequer estas acções de perseguição judicial para silenciar e intimidar jornalistas (conhecidas como SLAPP) alimenta o “sonho” de outros que almejam esmagar o jornalismo livre, o verdadeiro.
Voltando à questão sobre o que é “imprensa livre”, a resposta é simples. Se alguém tiver dúvidas sobre o que é, basta seguir o rasto dos processos judiciais, as migalhas das ameaças, os e-mails de intimidação.
O jornalismo verdadeiramente livre não teme estas tentativas de silenciamento. Pelo contrário, esses esforços para calar reforçam ainda mais a vontade de se investigar e escrutinar.
O jornalismo verdadeiramente livre é aquele que é respeitado e também temido por aqueles que têm algo a esconder.
Hoje, o jornalismo não é temido. Está, em geral, domesticado. Parece livre, mas não é. Não verdadeiramente.
A imprensa verdadeiramente livre questiona, investiga, escrutina. Exige acesso a informação que deve ser pública. Exige transparência de quem tem de prestar contas à população. Avança com processos na justiça, se necessário, para que a transparência e a lei se cumpram, libertando informação que nunca deveria estar fechada num cofre por ser pública.
É isso que o PÁGINA UM tem procurado fazer. E, por isso, o seu director se senta no banco dos réus. Não porque “difama” ou emite informação falsa. Mas porque faz o que muitos não estão habituados a ter: escrutínio.
A defesa da democracia só é verdadeira se também se defender a verdadeira imprensa livre, a que não serve “clientes” nem “parceiros comerciais”.
Até porque uma imprensa verdadeiramente livre é, em simultâneo, o termómetro da democracia e a bússola que aponta o caminho. Para que não se caia na tentação de seguir por atalhos e desvios que levam ao passado, ao tempo em que a imprensa existia mas tinha um ‘polícia’ a dizer o que se podia investigar e escrever.
Uma campanha de informação sobre o uso de drogas, lançada este mês pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), acabou por se tornar tão tóxica que foi eliminada das redes sociais.
Em causa estão publicações do SNS nas redes sociais, designadamente no Facebook e Instagram, com informação sobre o uso de substâncias, como canábis e cocaína. A polémica estalou porque a campanha mencionava os “efeitos” provocados pelas drogas e que arriscavam servir de incentivo ao consumo das substâncias, por parecerem até ser positivos.
Foto: Os “slides” polémicos que faziam parte da campanha de informação do SNS ainda estão disponíveis na Internet, tendo como referência a página do SNS no Facebook.
A campanha de informação do SNS sobre cada substância era composta por quatro “slides” com informações separadas e o objectivo, no último slide, era facultar os contactos para quem precisasse da ajuda do Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD), a entidade pública identificada na campanha. O principal problema é que, separado dos restantes, um dos slides destacava os efeitos ou alegadas ‘virtudes’ dos estupefacientes, o que poderia induzir à experimentação.
No caso da campanha sobre o uso de canábis, publicada no início deste mês, o SNS referia que os efeitos do consumo da substância incluem: relaxamento; alteração da percepção do tempo; aumento do apetite; e euforia leve.
Já na campanha de informação relativa ao uso de cocaína, publicada no dia 10 de Outubro, o SNS destacava que os efeitos do consumo da droga incluem: euforia; aumento de energia; sociabilidade; e diminuição da fadiga. Este slide em particular está a ser partilhado nas redes sociais, separado dos restantes slides, para criticar o SNS pelo conteúdo da campanha de sensibilização.
O director-executivo do SNS, Álvaro Almeida (em baixo, o segundo a contar da esquerda), e os membros do conselho de gestão do SNS (da esquerda para a direita): Francisco Matos, Ana Oliveira, Ana Rangel, Helder Sousa e Fernando Pereira. / Foto: D.R.
A campanha, apurou o PÁGINA UM, foi elaborada pelo SNS e validada pelo ICAD, em termos científicos, mas não recebeu criticas positivas dos utilizadores das redes sociais que viram nos “slides” polémicos o risco de servirem como incentivo ao consumo daquelas substâncias que causam dependência.
Apesar de terem sido apagadas das redes sociais, as imagens da campanha do SNS ainda se encontram espalhadas na Internet. Fazendo uma pesquisa nos motores de busca, encontram-se as imagens, que remetem para a página do SNS no Facebook. Mas quando se clica nas imagens, já não se encontram na página do SNS naquela rede social. Ou seja, existem indícios de que estiveram no perfil oficial desta entidade.
O PÁGINA UM confirmou junto de uma fonte oficial que a campanha sobre o uso de canábis e cocaína é verídica e que as publicações foram eliminadas das redes sociais pelo SNS, para serem alvo de “reflexão”.
Foto: Os quatro “slides” que constituem a campanha do SNS sobre o uso de cocaína e que ainda se encontram disponíveis na Internet, apesar de terem sido apagadas da página do SNS no Facebook.
Para o psiquiatra Luís Patrício, um dos pioneiros no tratamento das toxicodependências em Portugal e autor da página ‘Mala de Prevenção‘, “felizmente, tendo em conta o conteúdo, foi apagado” das redes sociais. Mas, salientou que, “infelizmente, está na rede [Internet]”.
O especialista recordou “um outro disparate dos anos 90, quando também nos serviços do Ministério da Saúde foi publicada uma informação também disparatada” sobre heroína, em que foi usada uma frase similar a esta: “a gota sedutora que escorre”. Ora, a heroína, é “um produto/droga de consumo abusivo, geradora de intensa dependência”.
“Estes factos devem-nos fazer pensar que algo tem de mudar em termos de exigência e de competência”, defendeu o psiquiatra.
No caso da campanha que agora foi apagada das redes sociais, Patrício alertou que, quem vir apenas o slide sobre os efeitos do uso das drogas, “de forma isolada, pode pensar não se tratar de uma informação no âmbito da prevenção sanitária social, mas de um slide integrado numa campanha com perspectivas geopolíticas económicas”.
Foto: D.R.
O psiquiatra observou que quem publicou a campanha “ou não valorizou, porventura, o risco, no âmbito da educação para a saúde/prevenção, na perspectiva sanitária e social, ou teria apenas talvez alguma boa intenção”.
Luís Patrício salientou que, com o slide polémico, “quem não sabe [quais são] os efeitos, fica a saber” e, “alguém menos informado ou mais frágil, até pela vivência grupal, queira comprovar os efeitos da “gulosa” assim é o nome em calão [para a cocaína]”. Por outro lado, “quem esteja em sofrimento directo ou indirecto relacionado com cocaína, poderá sentir alguma tristeza ou até revolta dados os estragos provocados pela cocaína nos que, sem desejarem, ficaram agarrados, dependentes”.
O psiquiatra destacou que, na sensibilização sobre o uso de drogas, “um dos equívocos reconhecidos foi, nos anos 70 e 80, serem publicitados os efeitos da substância no âmbito da prevenção” que causou um “efeito contrário ao desejado”. Mas, “porventura, em Portugal, ainda há quem não tenha sido ensinado ou compreendido”.
Foto: D.R.
Defendeu que “é preciso repensar a prevenção em Portugal”, com “mais competência, mais exigência, mais profissionalismo” porque “as boas vontades são simpáticas, mas não chegam”.
Em resposta a questões do PÁGINA UM, fonte oficial do SNS indicou “que a direcção executiva do Serviço Nacional de Saúde não tem intervenção nessas campanhas, nem na publicação dos conteúdos das redes sociais do SNS”. Formalmente, o ICAD não comentou a polémica. O PÁGINA UM fez também várias tentativas de contacto com a porta-voz da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, para obter um comentário, mas até ao momento não nos foi comunicada qualquer resposta.
A par da campanha sobre o uso de canábis e de cocaína, o SNS também publicou recentemente uma campanha nas redes sociais a alertar para os riscos do consumo de álcool, mas, neste caso, a publicação do SNS não deixou rasto tóxico e mantém-se disponível.
A Justiça administrativa em Portugal pode ler lenta, com processos a desenrolar-se por anos, e inacessível a muitos, já que as custas são proibitivas, mas não se pode acusá-la de retrógrada: o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF) prepara-se para lançar um canal de televisão em regime de streaming com conteúdos jurídicos – e esta até poderá acessível aos cidadãos comuns, pagando uma subscrição. Não se sabe é se o valor será indexado à famosa Unidade de Conta (UC).
O lançamento do canal JAF TV, que tem estreia marcada para o segundo semestre de 2026 será financiado com verbas retiradas de um projecto de digitalização do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). O CSTAF tem disponíveis, por agora, 422,8 mil euros de um ‘bolo’ de 950 mil euros que recebeu para “a melhoria das condições de contexto de funcionamento do sistema de Justiça da República Portuguesa, nas vertentes legal, procedimental, de gestão do conhecimento e do paradigma tecnológico”.
Foto: D.R.
Em concreto, o projecto não fala especificamente num canal televisivo, mas sim em investimentos em plataformas digitais dos Tribunais Administrativos, incluindo a contratação de recursos tecnológicos, hardware e software. Grande parte dos investimentos (55,5% do total) deste financiamento global foi já gasto na aquisição de hardware e de software, incluindo de inteligência artificial.
Não se pense que este canal servirá para a transmissão de actos processuais como já sucede com o Tribunal de Justiça da União Europeia, até porque são raras as audiências nos tribunais administrativos, que funcionavam à base de requerimentos e despachos escritos. Na verdade, a JAF TV serve para auxiliar na formação certificada especializada dos magistrados da jurisdição administrativa e fiscal, disponibilizando essa formação a quem, na área do direito, tenha interesse em pagar o acesso. Mas também terá uma componente mais aberta, prevendo-se quatro rubricas e ainda um podcast mensal.
A ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, e o juiz conselheiro Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia, que tomou posse como presidente do CSTAF em Outubro de 2024. / Foto: D.R.
Já desde sexta-feira que o PÁGINA UM preparava uma notícia sobre o lançamento deste canal e enviou questões ao CSTAF, designadamente sobre como será financiado o canal, tendo-nos sido enviadas respostas na segunda-feira. Mas só ontem, após novo contacto telefónico, recebemos a resposta final sobre a origem concreta do financiamento. Em paralelo, sem nada indicar no contacto telefónico feito com o PÁGINA UM, o CSTAF emitiu um comunicado público para anunciar o lançamento do canal, antecipando-se à notícia do PÁGINA UM.
Antes, nas respostas escritas enviadas ao nosso jornal, o CSTAF esclareceu que as entidades cofundadoras da JAF TV “serão estabelecimentos de ensino superior, instituições públicas e associações de magistrados que acrescentarão qualidade à componente formativa do canal”, disse fonte oficial do CSTAF em resposta a perguntas do PÁGINA UM. Mas poderão alugar por um valor simbólico, a determinar, “os meios tecnológicos e humanos da JAF TV para a realização e transmissão de eventos próprios que se alinhem com a missão do canal”.
Também não são ainda conhecidos os preços de subscrição da JAF TV, os quais “estão a ser definidos de acordo com o estudo económico financeiro que está a ser elaborado para o canal”. Mas é certo que “qualquer interessado, seja individualmente ou através de uma pessoa coletiva, pública ou privada, pode subscrever e aceder aos conteúdos do canal JAF TV”.
O que se sabe é que o canal de TV vai ter um “serviço por assinatura” que “consiste no pagamento de uma quantia periódica – mensal, trimestral ou anual – que confere ao utilizador acesso ilimitado a todos os conteúdos da plataforma, incluindo seminários, congressos, ações de formação, entrevistas e podcasts, no período subscrito”. A criação desta “modalidade visa proporcionar uma receita previsível para o canal e incentivar o consumo contínuo de conteúdo por parte dos subscritores”.
Também vai disponibilizar o pagamento por conteúdo, que “permite ao utilizador pagar um valor único para aceder a um conteúdo singular e específico, como um seminário, um congresso ou um curso específico, sem a necessidade de uma assinatura contínua”.
A JAF TV terá descontos para entidades parceiras cofundadoras, as quais “beneficiam de um desconto automático de 35 % em todos os serviços e de condições especiais para a utilização do canal para os seus próprios eventos”. Também “serão estabelecidos descontos de 25 % para estudantes de direito, mestrado ou doutoramento, mediante comprovativo de inscrição”.
(Da esquerda para a direita) O presidente do STA e do CSTAF, juiz conselheiro Jorge Aragão Seia, a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, o secretário de Estado-Adjunto e da Justiça, Gonçalo Cunha Pires, e a juíza-secretária, juíza desembargadora Eliana Almeida Pinto, a qual vai liderar o novo canal JAF TV. / Foto: D.R.
O canal será dirigido pela juíza-secretária do CSTAF, a juíza desembargadora Eliana Almeida Pinto, que assumirá a função de diretora-geral, a quem caberá definir “a estratégia editorial e institucional do canal”, com a supervisão do presidente do CSTAF.
A criação de um canal de streaming não foi a única mudança recente aprovada pelo CSTAF. Na mesma sessão em que foi aprovada a criação da JAF TV foi também aprovada a criação de um Gabinete de Relações Internacionais, um Gabinete de estudos e um Gabinete de apoio ao presidente do CSTAF e juiz-secretário.
As eleições autárquicas realizam-se no próximo Domingo, mas há autarcas que nem esperam pelos resultados eleitorais para fechar contratos chorudos. Foi o que fez Isaltino Morais, edil de Oeiras, que a poucos dias de ir a votos, garantiu a entrega de 174 mil euros a uma empresa para prestar serviços de assessoria de comunicação à autarquia de Oeiras durante um ano.
A escolhida foi a First Five Consulting (F5C), consultora de comunicação polémica gerida por João Tocha — socialista e maçom —, e que foi fundada por José Manuel Rodrigues, então advogado de André Figueiredo, chefe de gabinete do antigo primeiro-ministro socialista José Sócrates. Este contrato, assinado esta quinta-feira, com o município de Oeiras é o maior de sempre celebrado pela F5C com entidades públicas.
Foto: D.R.
Recorde-se que João Tocha é um dos principais visados num caso em que a Polícia Judiciária investiga suspeitas de concertação de preços e corrupção em concursos públicos de serviços de assessoria de comunicação, segundo noticiou o Observador em Julho de 2024. Um outro empresário investigado foi Luís Bernardo, dono da empresa Wonderlevel Partners (WLP). Em Julho, os empresários e autarquia do Barreiro foram alvo de novas buscas pela Polícia Judiciária no âmbito da Operação Concerto.
Em Julho do ano passado, uma investigação do PÁGINA UM aos contratos públicos de comunicação revelou que, desde 2008, a F5C tinha celebrado 131 contratos públicos no valor total de 4,96 milhões de euros, estando na segunda posição, atrás da LPM (120 contratos de 6,24 milhões de euros). Na terceira posição estava a F5C com 101 contratos no valor global de 3,9 milhões de euros. Meses mais tarde, em Março deste ano, o Expresso e a SIC contabilizara os contratos apenas associados com autarquias, concluindo que a F5C e a WLP conseguiram perto de metade do total.
A única outra empresa que concorreu a este concurso foi a Plot e Print – Publicidade e Design, com sede em Coimbra, uma sociedade por quotas gerida por António Luís da Conceição Ferreira Henriques. Esta empresa não tem, no seu objecto social, qualquer actividade relacionada com comunicação ou relações públicas.
João Tocha, gestor da F5C. / Foto: Captura de imagem a partir de vídeo do canal Now
O contrato tem como objecto a “aquisição de serviços especializados em consultoria de comunicação, assessoria de imprensa e marketing digital”, remetendo os detalhes para o caderno de encargos, o qual, como é habitual, não está disponível para consulta, contrariando as melhoras práticas de transparência na contratação pública.
Contudo, num dos anexos do programa do concurso, consultado pelo PÁGINA UM, são apontadas as especificidades técnicas dos serviços a contratar e inclui a “definição de estratégia e plano de comunicação, por forma a aumentar a notoriedade e a reputação positiva do município e do executivo municipal”.
A F5C também vai prestar “apoio na selecção e criação de conteúdos para suportes de contacto com os munícipes, nomeadamente: boletim municipal, folhetos, cartas do presidente aos munícipes”.
Câmara Municipal de Oeiras. / Foto: D.R.
Dois consultores seniores da F5C irão desempenhar funções nas instalações do município de Oeiras, a tempo inteiro, num contrato que corresponde a uma despesa mensal de 14.500 euros para o município. Ficarão “responsáveis pela consultadoria de comunicação e assessoria de imprensa e coordenação do núcleo de marketing digital, em articulação com o gabinete da presidência e com o gabinete de comunicação”.
Entre os serviços a prestar, estes dois consultores terão ainda de fazer a “antecipação, prevenção e gestão de crises” da autarquia.
Este contrato é 144º que a F5C ganha junto de entidades públicas, segundo dados do Portal Base. Ao todo, a empresa já facturou perto de 5,5 milhões de euros em contratos públicos, desde 2008. Somando o IVA, foram mais de 6,7 milhões de euros que entraram nos cofres da F5C em dinheiro dos contribuintes.
Contratos adjudicados pelo município de Oeiras à F5C publicados no Portal Base.
Este ano, a consultora ganhou oito contratos públicos, na maioria com autarquias ou entidades municipais, mas também um contrato com a Universidade Nova de Lisboa, no valor de 88.560 euros. Mas o contrato agora obtido com Isaltino Morais é o maior do ano e o maior de sempre.
No total, a F5C assinou já quatro contratos com o município de Oeiras. Em Março deste ano, ganhou um contrato por ajuste directo referente à “aquisição de serviços de branding – Oeiras Life Sciences Campus”, no valor de 14.760 euros. Antes, ganhou um contrato em 2021, no valor de 87.822 euros, através de um procedimento de consulta prévia, para prestar serviços de assessoria de comunicação. Em 2018, tinha ganho um contrato similar, de 88.560 euros, com a autarquia, através do modelo de ajuste directo.
Na adolescência e juventude, tive o privilégio de poder ler jornais, graças à minha mãe que me proporcionava semanalmente esse “luxo”. Gostava do Expresso e do Público de Domingo, com a revista que não perdia. Adorava a Colóquio/Ciência, da Gulbenkian. Quando nasceu a Fórum Ambiente, não perdia uma edição.
Na minha juventude, os meios de comunicação social e revistas especializadas eram uma janela para o mundo. Hoje, o mundo é um “livro aberto”. Não há “intermediários”. Na altura, era diferente. Por exemplo, se quisesse saber mais sobre as práticas abusivas e maus tratos na criação de animais para a indústria alimentar, tinha de investigar. Hoje, encontra-se facilmente todo o tipo de informação. Em segundos.
Foto: D.R.
O mundo ainda precisa de jornais e de jornalistas? Acredito que sim, mais do que nunca. Mas num mundo como o de hoje, em que a informação é um universo descentralizado, por que motivo irão adolescentes e jovens querer ler jornais, ouvir rádio ou ver TV? Que valor lhes trazem os media de hoje?
Escrevo este artigo a propósito do balanço do programa estatal que prometia oferecer jornais digitais a jovens entre os 15 e os 18 anos e que foi divulgado pelo PÁGINA UM. Sem surpresas, este programa iniciado há cinco meses, é um fiasco: dos 418.682 potenciais leitores, até agora só 4.442 aceitaram “a prenda” — um em cada 100. Lançado em Maio, o projecto queria fomentar a “literacia mediática”.
Será que o problema está nos jovens e adolescentes? Ou está nos media?
O primeiro erro, a meu ver, é pensar-se que os adolescentes e os jovens são ignorantes e que precisam ser “ensinados”, “educados”. Esta visão encaixa numa outra: a da infantilização dos adultos nas sociedades ocidentais. Trata-se o adulto como alguém que “coitado, precisa de ser ensinado e guiado” por alguém que “sabe” o que é melhor para ele.
Foto: D.R.
Na verdade, é o oposto. Num mundo em que os leitores e consumidores de informação têm acesso a fontes primárias, os jornais e as TVs parecem … obsoletos. Ou mesmo … burros. Sim, burros. Quantas vezes lemos nos jornais ou vemos nas TVs notícias com informação errada ou desactualizada?
Sobretudo, existe, há muito, um divórcio entre as redacções e a população. Dos jornais, às rádios e TVs. Os canais de TVs estão cheios de política, futebol, novelas e reality shows decadentes. Nas horas que restam na programação, estão cheios de comentadores de… política, futebol e reality shows decadentes. Nos jornais, as manchetes oscilam entre política e … política. O Jornalismo e a informação têm sido substituídos em massa por uma indústria do entretenimento informativo de má qualidade.
Além da escassa diversidade temática e pluralismo, falta hoje algo fundamental ao sector dos media: confiança e credibilidade. E isso também se deve à entrada dos interesses comerciais e políticos nas empresas de comunicação social. Mas não só. Também se deve a um outro fenómeno: a entrada da ideologia e do activismo em força nas redacções. Esse activismo veio sobrepor-se ao papel nobre de ser jornalista.
Peguemos no exemplo da cobertura jornalística de políticas repressivas e de censura em países no Ocidente. No Reino Unido, políticas distópicas estão a levar cidadãos, humoristas e políticos, a serem interrogados e até detidos por causa de posts online ou por publicarem piadas ou memes. Em geral, a cobertura que os media tradicionais têm feito destes casos de repressão são favoráveis à perseguição e censura. Há mesmo jornalistas a justificar as detenções e condenações com a narrativa usada pelo governo britânico, de que se trata de crimes de “discurso de ódio ou desinformação”. Certamente que na China o governo também diz que censura, prende e persegue só “os maus cidadãos” e “por bons motivos”.
Foto: D.R.
Os media também têm sido benevolentes com as políticas autoritárias levadas a cabo pela Comissão Europeia, liderada por Ursula von der Leyen, para restringir a liberdade de imprensa e de expressão. Quem acompanhe o tema apenas através dos media, irá pensar que aquelas políticas e leis até são “amigas” e foram feitas “para o bem” do Jornalismo. Nada mais errado. Veja-se também a polémica medida “Chat Control” que acaba com a privacidade nas mensagens encriptadas.
Quem lê apenas as notícias da imprensa, desconhece que o reforço do autoritarismo e do poder de políticos no continente europeu está em marcha acelerada, bem como o fim de direitos fundamentais. Se à legislação repressiva juntarmos a intenção de implementar à força o cartão de identidade digital (no Reino Unido) e a introdução do euro digital, não é preciso ser vidente para se perceber que é séria e real a ameaça de se instalar na Europa um regime autoritário com recurso ao policiamento digital. Daí, é um pequeno passo para a sociedade transmutar para um sistema de créditos, similar ao chinês, em que os cidadãos “desobedientes” serão facilmente punidos com um clique, ficando sem acesso ao seu dinheiro e à Internet.
Pavel Durov, fundador e presidente-executivo da plataforma de mensagens encriptadas Telegram, alertou hoje, numa mensagem difundida online, para esse caminho distópico que já se vive na Europa. “Um mundo negro e distópico aproxima-se rapidamente — enquanto dormimos. A nossa geração arrisca ficar na História como a última que tinha liberdades — e que permitiu que elas fossem eliminadas.”
Parte de uma mensagem divulgada hoje pelo CEO do Telegram em que alerta que está em marcha a criação de um regime distópico no Ocidente, em que as liberdades fundamentais estão a ser eliminadas progressivamente.
Também Meredith Whittacker, que preside à plataforma de mensagens encriptadas Signal, tem feito alertas sobre a gravidade de políticas em curso. “Estamos muito aliviados por ver a Alemanha reafirmar sua oposição à perigosa proposta ‘Chat Control’ — que exigiria a monitorização em massa das comunicações. Há muito tempo que a Alemanha é uma firme defensora da privacidade, e a notícia de que estava a considerar apoiar a vigilância em massa foi alarmante.”
Mas, da Europa para os Estados Unidos, a cobertura noticiosa de muitas políticas de censura e repressão tem falhado redondamente. Veja-se um exemplo: os media perceberam, de repente, que perseguir um opositor político usando meios do Estado é uma ameaça à democracia. Mas só perceberam isso quando um republicano está na Casa Branca. Não perceberam isso quando democratas estavam na Casa Branca e usaram meios do Estado para … perseguir judicialmente, difamar e censurar opositores.
Foto: D.R.
Um jornalista pode “adorar” Biden ou o partido democrata e pode “odiar” Trump ou o partido republicano. Mas um jornalista não deve trair o Jornalismo em prol das suas preferências políticas, ideológicas ou religiosas. O facto de, nos Estados Unidos, jornalistas terem fechados os olhos às políticas antidemocráticas dos democratas constituiu uma ameaça para o futuro do Jornalismo no país e ainda ajudou Trump a regressar à Casa Branca.
A censura e perseguição de opositores e vozes “dissidentes” executadas por Biden foram gravíssimas. Está tudo comprovado em e-mails que foram tornados públicos e as próprias empresas donas das grandes plataformas online confirmaram isso mesmo. A mais recente foi a Google, que confirmou que o YouTube silenciou vários utilizadores a pedido da Casa Branca de Biden, não porque tivessem difundido “desinformação” ou violado as políticas da plataforma, como alguns media alegam. Essa tem sido a desculpa para calar vozes vistas como incómodas em diversos países.
E o que fizeram os media quando irrompeu o chamado “Russia hoax” e o escândalo do laptop de Hunter Biden? E o que fizeram os media quando se tornou evidente que a Casa Branca estava sem presidente, por Biden se encontrar num sério declínio de saúde, com sinais de demência? Já para não falar dos escândalos de Obama ou em torno de Hillary Clinton, designadamente o caso dos e-mails. E o caso do misterioso enriquecimento de alguns democratas, como a família Biden ou Nancy Pelosi?
Foto: D.R.
Nestes casos, os media assobiaram para o lado. Tal como no caso do criminoso sexual e traficante de raparigas, Jeffrey Epstein. Os media ignoraram praticamente a sua condenação em 2008 e o escandaloso acordo judicial de que beneficiou, e também olharam para o lado sobre a sua proximidade a figuras como Bill Gates e Bill Clinton. Só perante a nomeação de nomes como Trump ou Elon Musk — que afirma ter recusado um convite de Epstein — é que os media se “interessaram” pelas ligações do criminoso sexual que se suspeita poder ter sido um potencial “activo” a soldo de serviços secretos para manter operações de chantagem sobre figuras públicas e poderosas.
O público acaba por perceber que este enviesamento existe e isso alimenta os partidos e os políticos que são vítimas do enviesamento dos media.
A democracia está em perigo nos Estados Unidos, na União Europeia e no Reino Unido. Mas não apenas pela elevada corrupção, a censura, as acções repressivas e a perseguição judicial de opositores feita por governantes. Porque nas sociedades democráticas, as acções de políticos, sendo relevantes, enfrentam um escrutínio público e jornalístico.
A democracia está em perigo no mundo ocidental porque jornalistas se demitem de fazer o seu trabalho para se tornarem actores políticos.
Foto: D.R.
A vitória dos conservadores nas últimas presidenciais norte-americanas surgiu depois de anos de mentiras, escândalos, censura e repressão. Mas os media estiveram calados e quietos e serviram para mostrar caras sorridentes de democratas na Casa Branca. Já para não falar num dos piores escândalos: os jornalistas pactuaram com a censura e a repressão na pandemia. É nas crises que se vê a saúde do Jornalismo e das democracias. A crise da pandemia serviu para ver a gigantesca crise existente nos media: deixaram de fazer Jornalismo e tornaram-se fantoches de políticos.
Em Portugal, não tem sido diferente. É só ver a forma como os media tratam jornalisticamente os diferentes partidos. A gritante falta de democracia no Livre é tratada com ligeireza. Uma polémica no PCP é temporária. Um escândalo no PS era gerido com pinças, com comentadores “amigos” dos socialistas e editoriais mansos nos jornais. Já se envolver o PSD, CDS-PP ou, sobretudo, o Chega, cai o Carmo e a Trindade. Este último partido tem sido a maior vítima de enviesamento dos media em Portugal. E isso alimenta-o.
A este enviesamento jornalístico juntam-se outras vozes, como a da historiadora Raquel Varela, que apelou publicamente ao desrespeito por valores democráticos fundamentais. Varela exige que os partidos boicotem os candidatos do partido Chega nos debates, acusando o partido de ser “extrema-direita”. E defende que “nenhum jornalista deve publicar, entrevistar, [fazer] qualquer notícia sobre o Chega“.
Acontece que Varela pode não gostar do Chega, mas é hoje o maior partido da oposição e chegou lá com os votos de portugueses. Ou será que a historiadora pensa que os portugueses que votam no Chega também deviam ser alvo de um qualquer boicote? Uma coisa é certa: as palavras de Varela, a concretizarem-se, seriam a morte em definitivo de Abril e da Revolução dos Cravos.
Foto: D.R.
A cobertura enviesada dos partidos políticos pela imprensa e o incitamento ao boicote a um partido democraticamente eleito feito por personalidades, como Raquel Varela, têm alimentado os votos no Chega. Não foi por acaso que, na entrevista a André Ventura que publicámos em Fevereiro de 2024, escolhi como título: “Vejo-me como primeiro-ministro, mas depende dos portugueses, não de mim“. Sempre foi evidente, a meu ver, que quanto mais se ostracizar o Chega nos media, mais depressa Ventura será eleito primeiro-ministro (ou Presidente). É matemático.
Mas, além do enviesamento noticioso estar a ter impacto no sentido de voto, está a destruir a credibilidade dos jornalistas. Possivelmente, serão vários os motivos para jornalistas destruírem o Jornalismo: ideologia, fanatismo, financiamento, comportamento de rebanho, medo de represálias, busca de fama…
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Seja como for, a queda do Jornalismo no mundo ocidental constitui a maior de todas as ameaças à Democracia. Porque um partido ou outro podem ter tiques de autoritarismo, como aconteceu desde 2020, com vários atentados graves aos direitos humanos e civis e às leis fundamentais em países como Portugal. Mas se houver um Jornalismo saudável e a funcionar, a sociedade está alerta.
O Jornalismo tem falhado com a população. Os jornalistas têm, em geral, falhado com a população. E isso inclui os adolescentes e jovens. O resultado foi inevitável. Jornalistas são, hoje, em geral, vistos como meros fantoches ao serviço de interesses ou contaminados com ideologia.
Os jornalistas têm de procurar — independentemente das suas preferências pessoais ideológicas ou religiosas — fazer um trabalho isento. Mas tem havido pouco disso. Precisa haver mais.
Foto: D.R.
É como se, numa fábrica de sapatos, os trabalhadores passassem, de repente, a produzir almofadas. E os patrões lhes dissessem que, sim, que continuassem a fabricar almofadas porque era mais lucrativo. Os consumidores continuam a pensar que estão a encomendar sapatos. Só que, quando abrem as caixas, saem-lhes almofadas… Daquelas fofinhas, para logo adormecerem e nem repararem que, um dia acordam, e a Democracia desapareceu. Tal como o Jornalismo, que morreu, asfixiado por tantas “almofadas fofinhas” produzidas. Mas, em todo o caso, o que interessa isso? É que, sem leitores jovens, quem vai ler os jornais no futuro?
Numa sociedade guiada por valores materiais e ‘status’, um banqueiro tem de “parecer bem” e não pode ser visto num carro de gama baixa. Mas em Portugal basta ser director intermédio de um banco estatal, mesmo pequeno, para almejar sorte similar. Para quê ser austero quando se pode conduzir um topo de gama pago pelo erário público?
Talvez tenha sido esse princípio de ouro da hierarquia social, de mostrar que se tem “status”, que fez com que o Conselho de Administração do Banco Português de Fomento (BPF), que é um banco estatal, lançasse um concurso público para encomendar, através de um contrato de aluguer de longa duração (ALD) de um total de 23 viaturas SUVs para a sua direcção de topo.
Foto: D.R.
O BPF é um banco estatal de apoio ao investimento, mas de pequeníssima dimensão face à mastodôntica Caixa Geral de Depósitos. Apesar de serem instituições financeiras muitíssimo distintas, basta dizer que a CGD teve um lucro de 1.735 milhões de euros no ano passado, enquanto o BPF teve resultados positivos de de 18 milhões de euros.
Mas isso pouco parece importar na hora de mostrar ‘status’. O BPF vai desembolsar perto de 1,2 milhões de euros (981 mil euros, acrescido de IVA) para o aluguer de longa duração de 21 viaturas para dirigentes de topo, por cinco anos, e mais duas de luxo, por quatro anos, que incluirão vários extras.
O concurso do banco público está, neste momento, a decorrer até finais deste mês, encontrando-se divido em cinco lotes, o que significa que pode ser entregues a diferentes empresas.
Uma das viaturas que o BFE pretende alugar será da categoria deste Mercedes. / Foto: D.R.| Mercedes
Segundo o caderno de encargos, consultado pelo PÁGINA UM, não são esquecidos alguns pormenores de luxo e distinção. O primeiro lote a concurso refere-se à encomenda de “uma viatura tipo SUV, com motorização híbrido plug-in/gasolina, tração integral, cinco portas” com uma potência combinada de 455 cavalos, de cor “preto ónix”.
O equipamento mínimo obrigatório inclui “lotação máxima: sete lugares; cinco portas; depósito combustível 71 litros, pintura metalizada, tecto panorâmico, câmara 360º, vidros traseiros escurecidos”. A cor interior exigida é “nórdico acolchoado em carvão, jantes 21″ com 5 raios múltiplos pretos, corte em diamante”.
Só este veículo terá um custo base de aluguer de 62.400 euros (76.752 euros com IVA), ou 1.600 euros por mês. A este valor acresce a despesa 3.150 euros com custos administrativos e operacionais.
Foto: D.R.
O lote 2 abrange a encomenda de uma viatura sedan/limousine de cor “metalizada preto Obsidian”, com motorização híbrido plug-in/gasolina, de cinco portas, e potência de 280 kw – 381 cv. O custo desta viatura será de 65.067 euros, com uma renda mensal de 1.356 euros, a que se somam custos administrativos e operacionais de 2.600 euros.
As especificidades mínimas obrigatórias incluem “pintura metalizada, jantes liga leve 18″, Apple car play, bancos dianteiros ajustáveis eletricamente”. Os interiores têm de ser em “couro Artico/microcut preto”. A encomenda exige ainda como extras um “pack desportivo premium, jantes 5 raios 18”, vidros traseiros escurecidos”.
O lote 3 abrange 16 viaturas “tipo SUV, motorização híbrido plug-in/gasolina, cinco portas”. O custo será de 767.520 euros, com rendas mensais por viatura de 799 euros, num total de 12.784 euros, a pagar durante cinco anos.
Estas viaturas têm de ter transmissão automática de oito velocidades, tracção às quatro rodas, barras de tejadilho (talvez para meter pranchas de surf, bicicletas ou caiaques), volante desportivo e bancos dianteiros também desportivos. Presume-se que são os “essenciais” para qualquer profissional “financeiro”. Como extras obrigatórios, o BFE exige ainda um “pack desportivo e vidros com protecção solar”.
Das 16 viaturas, oito terão de ser de cor “cinza prata Space” e oito de cor “preto Sapphire metalizada”, enquanto os interiores ostentarão uma “combinação de Alcantara M/Veganza, preto/pesponto de contraste em azul”.
Este novo modelo da Volvo encaixa nas exigências do BFE para uma das viaturas que vai alugar. / Foto: D.R.
O lote 4, por sua vez, diz respeito a quatro veículos tipo SUV, de motorização híbrido/gasolina, com cinco portas, pintura metalizada e equipadas com sensores de estacionamento, cruise control adaptativo, jantes de liga leve de 17 polegadas, Apple Car Play, faróis led, câmara de assistência ao estacionamento, caixa automática e barras de tejadilho. Duas serão de cor “cinza Vapour” e duas de cor “preto Ónix”. Os interiores já serão mais “baratinhos”, apenas revestidos com “tecido antracite”. No caso deste lote, a despesa ficará em 191.880 euros, com uma renda global de 3.198 euros.
Por fim, o lote 5 abrange uma viatura “SUV, híbrido/gasolina, cinco portas, sete lugares” com um custo de 47.970 euros e uma renda mensal de 799 euros. As especificidades mínimas obrigatórias incluem “pintura metalizada, barras de tejadilho, sistema de estacionamento traseiro e câmara traseira, vidros eléctricos condutor e passageiro, ar condicionado automático, luzes de circulação diurna em led, limpa vidros automático, faróis led e jantes de liga leve”.
Como é habitual, o ALD de viaturas por entidades públicas é feito com o argumento de que a despesa engloba encargos com seguros, impostos e serviços de manutenção. Contudo, os veículos não ficam na posse do Estado, não podendo assim ser disponibilizados a outras entidades públicas após alguns anos de uso.
Numa sociedade orientada para o “estatuto”, qualquer executivo que se preze conduz um carro topo de gama, mesmo que o mesmo seja pago pelo erário público. / Foto: D.R.
Note-se que a despesa que o BPF pretende agora fazer com aluguer de viaturas para dirigentes contrasta com os 599.335 euros que o banco público gastou nos últimos cinco anos para o mesmo tipo de contratação, segundo dados do Portal Base.
Com efeito, em 2021, o BPF gastou 165.970 euros (sem IVA) num contrato de aluguer de nove viaturas para os seus quadros. Em 2023, efectuou três contratos de 130.216 euros, 140.006 eurose 19.800 euros. Por fim, em 2024, fez um novo contrato para o aluguer de uma viatura de 31.272 euros. No total, estes contratos resultam na soma de 599.335 euros (com IVA).
Assim, nos últimos cinco anos, somando todos os contratos, o BPF assumiu uma despesa de mais de 1,8 milhões de euros no aluguer de veículos para os seus quadros.
Tenho abordado aqui, no PÁGINA UM, a temática das notícias falsas ou enviesadas divulgadas pelas agências noticiosas e pelos media ditos de referência, não só portugueses mas também internacionais.
Se jornalistas difundem notícias falsas ou distorcidas, obviamente que tem impacto e as consequências são devastadoras, sobretudo para os próprios jornalistas e para os meios onde divulgaram essa desinformação. A sua credibilidade fica posta em causa. E e confiança e credibilidade são a “moeda”, o valor do negócio da comunicação social. Mas também tem impacto na opinião pública.
Foto: D.R.
Mas qual o impacto e as consequências que surgem quando um historiador decide partilhar informação falsa ou distorcida?
Vem este artigo a propósito de uma publicação que a historiadora portuguesa Irene Pimentel fez na rede social Facebook, na sequência do homicídio, nos Estados Unidos, do jovem conservador e cristão Charlie Kirk.
Na sua publicação [cujo link opto intencionalmente por não colocar aqui, para não espalhar informação falsa], a prestigiada historiadora faz acusações falsas e cita afirmações truncadas e fora de contexto.
Publicação da historiadora Irene Pimentel no Facebook.
Pimentel escreveu que Kirk era um “simpatizante nazi”, o que é obviamente falso. Kirk jamais apoiou a causa nazi ou o que defendia. Ademais, Kirk era um cristão devoto e os valores cristãos estavam presentes no seu discurso e no seu pensamento. Defendia a igualdade e a tolerância e promovia o diálogo com todos.
Mas o que mais chocou foi ver a historiadora a atribuir a Kirk uma ideia falsa e uma frase truncada. Pimentel afirmou que Kirk era contra a democracia. Escreveu isso por má-fé ou porque nem sequer foi à fonte, como deve fazer qualquer historiador mediano. Na realidade, num interessante debate de ideias (que pode ser visto em baixo), aquilo que Kirk afirmou foi que a palavra “democracia” não consta na Constituição dos Estados Unidos.
Esse diálogo é, aliás, um exemplo fascinante daquilo que Kirk promovia: o confronto entre concepções distintas, neste caso do governo nos Estados Unidos: uma baseada no republicanismo clássico e outra no ideal democrático moderno. E Kirk está, neste debate, a ser factual: do ponto de vista técnico, a Constituição dos Estados Unidos nunca utiliza a palavra democracia. De facto, “Founding Fathers“, sobretudo James Madison e Alexander Hamilton, alertaram repetidamente contra a democracia pura, que associavam ao domínio das massas, à instabilidade e à tirania da maioria.
No Federalista n.º 10, ensaio dedicado à salvaguarda de facções e insurreições domésticas, Madison distingue claramente entre “democracia pura” (em que os cidadãos decidem directamente) e república, que define como um sistema de representação e deliberação destinado a proteger as minorias e promover decisões ponderadas.
Assim, o modelo preferido pelos fundadores dos Estados Unidos era o de uma república constitucional, estruturada com freios e contrapesos, federalismo e separação de poderes, de forma a conter os impulsos majoritários. Foi isso que Charlie Kirk disse e manifestou que era “a favor de um governo representativo”, ou uma democracia representativa, como a que existe nos Estados Unidos e em Portugal. Irene Pimentel preferiu ignorar tudo isto, transformando alguém que trocava ideias, mesmo que de forma assertiva, num radical anti-democrata. Um absurdo.
Pimentel também chamou Kirk de “misógino, racista e criminoso”, o que é falso, e acusou-o de ser um organizador da invasão do Capitólio. Mas Kirk era um pacifista. Defendia a igualdade e a tolerância. Era cristão e conservador.
Pergunto-me: de onde vem o ódio expressado por esta historiadora por um jovem de 31 anos que deixa um legado em prol do diálogo e da paz entre pessoas com diferentes visões do mundo?
Quando li a publicação de Irene Pimentel surgiu-me, de imediato, a seguinte questão: como é que um historiador ignora os factos, trunca frases, faz acusações falsas?
Pensei na gravidade do caso e também questionei o seguinte: será que a reputada historiadora cometeu os mesmos pecados no desempenho do seu trabalho?
Porque Irene Pimentel não é uma historiadora qualquer. Foi galardoada com o Prémio Pessoa em 2007. É investigadora do Instituto de História Contemporânea, da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. É doutorada em História Institucional e Política Contemporânea e mestre em História Contemporânea (século XX). O seu trabalho centrou-se, sobretudo, sobre a ditadura e o Estado Novo. É também autora de vários livros, incluindo um sobre “Informadores da PIDE”.
Charlie Kirk, à esquerda na foto, promovia o debate com estudantes e co-fundou a organização Turning Point USA, em 2012. Cristão devoto e conservador, Kirk era pai casado e pai de dois filhos pequenos. Foi alegadamente assassinado por um jovem radicalizado e que tinha uma relação com um homem transgénero quando participava em mais um debate numa universidade. / Foto: D.R.
Então, como é que uma historiadora tão experiente e prestigiada confunde um cristão devoto e conservador com um “simpatizante nazi”. Ou será que, hoje, um cristão e conservador é “um simpatizante nazi” na visão de alguns?
Kirk não era da extrema radical. Nem da extrema-direita. Não era racista, nem misógino. Todas as frases que vi nos media, incluindo no The Guardian, e que eram citadas como “prova” de que ele era racista, homofóbico ou misógino, estavam truncadas ou foram retiradas do seu contexto. Qualquer jornalista verifica facilmente as frases de Kirk. Há muitos vídeos dos seus debates disponíveis na Internet e também estão disponíveis os vídeos do seu programa.
Se para um cidadão comum é fácil verificar isso, para um jornalista também é. E também para um historiador.
A pergunta sobre se Irene Pimentel também reflectiu no seu trabalho passado as mesmas falhas que a levaram a difamar Kirk, ficou a ressoar na minha mente. E outras perguntas surgiram, como esta: e no caso de outros historiadores, será que sucede o mesmo; será que a sua ideologia ou religião os “desvia” na sua busca e análise de factos históricos?
Irene Flunser Pimentel. / Foto: D.R.
Um jornalista espalhar informação falsa é grave. Mas pode ser um erro ocasional ou falta de tempo na investigação jornalística. Mas se um historiador faz o mesmo, tem toda uma outra dimensão e implicações. Faz-nos questionar a metodologia do seu trabalho. Afinal, não sabe aplicar a metodologia rigorosa exigida a um cientista? Não sabe que deve apenas usar fontes credíveis e, de preferência, primárias, caso seja possível?
Será que os cientistas, estudiosos e “guardiões” do nosso passado colectivo contaminaram o seu trabalho — e a nossa visão de acontecimentos históricos — com falhas na análise de fontes?
Ou será que, hoje, ser cristão e ser conservador é ser um “ditador, simpatizante nazi”? Será que existe uma febre anti-cristã e anti-conservadora? Uma espécie de nova histeria colectiva de caça às bruxas, em que conservadores e cristãos são “os maus nazis a abater”?
Os valores cristãos estavam presentes no pensamento e no discurso de Charlie Kirk. / Foto: D.R.
Não concordo com muitas das ideias de Kirk, mas tendo assistido a muitos dos vídeos dos seus debates, compreendo que o seu pensamento se enquadrava numa visão cristã e conservadora do mundo.
Acontece que a democracia vive da diversidade de pensamento, do diálogo e da fundamental liberdade de expressão. Se historiadores querem tornar “ilegal” e começar a atribuir o carimbo de extremista a cada cristão e conservador do mundo ocidental, então temos um sério problema. Um problema de radicalismo, pensamento anti-democrata que incentiva uma nova caça às bruxas ao desumanizar uma significativa parte da população. Se a historiadores, juntarmos jornalistas tornados activistas, políticos e comentadores, então enquanto sociedade democrática e plural, temos mesmo um sério problema.
O regulador da Bolsa e a Euronext Lisbon avaliam a suspensão da negociação das acções da Impresa amanhã na abertura da sessão bolsista.
A deliberação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e da gestora da Bolsa só deverá ser tomada esta segunda-feira de manhã e surge perante a expectativa criada de que a empresa dona da SIC e do Expresso deverá vir a ser alvo de uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) por parte da MediaforEurope, o maior grupo de TV aberta da Europa. Com operações de televisão aberta em Itália, Espanha, Alemanha, Áustria e Suíça, este grupo é controlado pela família Berlusconi, através do Fininvest Group.
Pier Silvio Berlusconi, presidente-executivo da MFE, antiga Mediaset, o maior grupo de
Na sexta-feira, a Impresa fechou em Bolsa a cotar nos 12,6 cêntimos por acção, valendo cerca de 21,2 milhões de euros, a preços de mercado. A Impresa tem como principal accionista a holding Impreger, controlada pela família Balsemão.
Dadas as expectativas de que venha a haver uma OPA, as acções da Impresa deverão atrair forte procura, havendo necessidade de consolidação de ofertas, sobretudo na abertura do mercado bolsista, amanhã, para estabilização de preços.
Segundo o jornal italiano Il Messaggero, no conselho de administração da MFE que aprovou as contas semestrais na passada quarta-feira, o CFO Marco Giordani informou sobre a retoma das negociações para uma entrada na Impresa, o grupo de media fundado por Francisco Pinto Balsemão e actualmente em situação financeira difícil. O jornal italiano menciona que “a conclusão [do negócio] está prevista para o final do ano” e que “o preço não será alto, mas terá que incluir uma Oferta Pública de Aquisição” sobre a Impresa.
Francisco Pedro Balsemão, presidente-executivo da Impresa. / Foto: D.R.
Perante a ausência de informação completa da Impresa, o PÁGINA UM colocou questões à CMVM e voltou hoje a questionar o regulador sobre a ausência de informação, designadamente sobre estar a ser negociada uma operação que envolverá o lançamento de uma OPA.
Ao final desta tarde, a Impresa, pressionado pela CMVM, fez novo comunicado ao mercado onde admite que “no âmbito das negociações tornadas públicas com o grupo MFE não se encontra afastada a possibilidade da aquisição por este de uma participação relevante (direta ou indireta) para efeitos de controlo na Impresa, reiterando que, nesta data, não existe qualquer acordo vinculativo para o efeito”.
Contudo, esta informação continua a ser insuficiente já que a notícia do jornal italiano menciona dados importantes, como a data prevista de conclusão do negócio, bem como o facto de que “o preço não será alto, mas terá que incluir uma Oferta Pública de Aquisição” sobre a Impresa.
Segundo comunicado divulgado pela Impresa sobre as negociações com o MFE.
Perante a expectativa de uma OPA, as acções da Impresa poderão registar uma elevada procura. O facto de a Impresa ter hoje, tardiamente, confirmado a existência de negociações para que o MFE passe a controlar o grupo coloca as acções no centro das atenções dos investidores.
Importa recordar que, de acordo com o Regulamento Abuso de Mercado da União Europeia, as empresas cotadas ou emitentes de dívida têm a obrigação de esclarecer o mercado sempre que circulem rumores ou notícias susceptíveis de influenciar a cotação dos seus títulos. Mas a Impresa só fez um primeiro comunicado, incompleto, ao mercado pelas 00H59 de hoje. O segundo comunicado, ainda incompleto, foi divulgado hoje pelas 17H16 de hoje.
Nota: O PÁGINA UM colocou questões à CMVM no Sábado e no Domingo, designadamente sobre se iria haver suspensão da negociação das acções da Impresa na abertura da Bolsa na segunda-feira. Apesar do silêncio do regulador, o PÁGINA UM apurou oficialmente que a suspensão da negociação estava na mesa e foi-nos indicado que a decisão definitiva de suspensão seria tomada na manhã de segunda-feira, antes da abertura da Bolsa.
De facto, só depois da abertura da Bolsa é que a CMVM publicou no seu site, pelas 08H51, um comunicado indicando que o seu conselho de administração tinha decidido suspender a negociação da Impresa em Bolsa, “para permitir ao mercado absorver a informação entretanto divulgada”. Mas a CMVM apontou que a decisão foi tomada no dia 26 de Setembro pelas 19H40. Isto apesar de a Impresa só ter divulgado um comunicado com escassa informação no site da CMVM pelas 00H59 do dia 27 de Setembro. O grupo de media fez ainda um segundo comunicado no Domingo, pelas 17H16.
Numa era de profuso acesso a muitas fontes de informação e conteúdos, o papel do jornalista torna-se ainda mais crucial. Afinal, como profissional de informação, conhece as técnicas para saber quais as fontes seguras credíveis e também para verificar se informações que circulam estão correctas.
Assim, numa era em que os leitores se podem perder no meio de tanta informação e conteúdos, o Jornalismo pode e deve ser, ainda mais, uma bússola. Pode e deve ser um farol que evita que os consumidores de informação fiquem atolados em informações falsas.
Foto: D.R.
E, hoje, os próprios jornalistas têm mais ferramentas para poder confirmar dados e informações quase de modo instantâneo. Existem excepções, claro. Como quando entidades oficiais escondem bases de dados e informações de relevo, como tem acontecido em Portugal, o que tem levado o PÁGINA UM a accionar, por diversas vezes, mecanismos legais para forçar a divulgação dessa informação e a disponibilização do acesso a dados.
Neste contexto, se é hoje muito mais fácil para os jornalistas confirmarem informações, quando todos os grandes meios de comunicação social fazem notícias similares sobre o mesmo tema, conclui-se que deve ser mesmo verdade.
Mas esse não tem sido o caso na cobertura de muitos temas. E isso levanta um problema aos jornalistas que detectam as mentiras desses órgãos de comunicação social ditos de referência.
Foto: D.R.
Os jornalistas que ainda seguem as boas práticas jornalísticas de verificação de fontes e factos são colocados, em algumas ocasiões, numa posição muito estranha: o que relatam não coincide com as “notícias” de outros jornalistas de outros media.
Assim, a maioria dos jornalistas tende simplesmente a repetir o que os media de referência “noticiam”. Se o The Guardian ou, em Portugal, o Expresso, escrevem que “é assim” então não pode “ser assado”. Deste modo, dá-se um fenómeno de “manada” em que todos os media de referência dão notícias similares sobre os mesmos temas.
O que falo não é nestes casos. Falo de outro fenómeno, em que os jornalistas não querem ser a “ovelha negra” que escreve uma notícia “diferente” das dos colegas. Assim, mesmo sendo mentira, se um colega do The Guardian escreve uma mentira e o pivot da SIC diz exactamente a mesma mentira, qual vai ser o jornalista a ter coragem de verificar os factos e dizer algo diferente?
Por exemplo, quando, recentemente, pesquisei informação sobre Charlie Kirk, deparei-me com um artigo no The Guardian que continha afirmações chocantes alegadamente proferidas pelo jovem cristão conservador, fundador da organização Turning Point USA, que foi assassinado quando participava em mais um debate numa universidade.
Lendo o artigo do The Guardian, qualquer um fica zangado e revoltado com Kirk. O racismo, a misoginia, a xenofobia, a homofobia são conceitos hediondos. Em outras notícias de outros grandes meios, sucedem-se as citações atribuídas a Kirk que chocam qualquer um.
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O problema é que uma breve pesquisa — com recurso à fonte de origem das afirmações atribuídas a Kirk — revela uma verdade escondida pelo The Guardian e pelos restantes media de referência. É que as frases são totalmente retiradas do seu contexto.
Por exemplo, numa das frases chocantes citadas pelo The Guardian, Kirk afirmou: “If I see a black pilot, I’m going to be like, boy, I hope he’s qualified (se vir um piloto negro, vou pensar, espero que tenha qualificações)”. Lida assim, é obviamente uma frase chocante e concluímos que Kirk era efectivamente racista. Só que há um senão: foi dita num diálogo em que o objectivo de Kirk era alertar para o perigo de haver racismo causado pelas políticas discriminatórias de contratação nos Estados Unidos.
No diálogo, ocorrido em 2024 no The Charlie Kirk Show, Kirk concluía que as políticas discriminatórias levavam pessoas a questionar se algumas minorias estavam nos seus empregos por serem boas no que fazem ou se por terem sido favorecidas por políticas de “inclusão”. Ou seja, Kirk sugeria que essas políticas tinham o potencial de retirar mérito e levar outros a pensar que a pessoa que pilotava um avião podia estar lá apenas porque a sua contratação dava jeito para a empresa preencher “quotas” de certos grupos de pessoas. E considerava que isso era negativo.
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Este é um exemplo. Mas há muitos mais. Mas o leitor não tem de acreditar no que escrevo aqui. Vá ouvir Kirk e tire as suas conclusões. Porque é verdade que Kirk pode ser visto como provocatório, dado que não alinhava com a forma de falar politicamente correcta — venerada hoje pelos media, em geral.
Mas há outro factor de relevo escondido pelos media: Kirk era um cristão devoto. E isso é relevante, por exemplo, no tema do aborto. Ou seja, o seu pensamento assenta nos princípios cristãos e “na Palavra”.
Se fosse um muçulmano devoto (ou até fundamentalista), os media teriam tratado Kirk como sendo um “racista, misógino, homofóbico, nazi e fascista”? Sabemos que não. Apenas o fizeram porque Kirk era cristão. Apenas não assumem isso. E ao fazê-lo legitimaram o seu assassinato.
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O certo é que as mentiras e as citações sem contexto propagadas pelo The Guardian e outros media de dimensão espalharam-se. Ao ponto de gerarem uma onda de protestos na Internet devido à cobertura maliciosa que os media estavam a fazer sobre Kirk, manchando o seu nome.
Várias personalidades saíram em defesa de Kirk, como o comediante Terrence K. Williams, que condenou os que acusaram o jovem de ser racista. “Charlie Kirk não era racista e eu não vou ficar de braços cruzados a permitir que as pessoas espalhem essa mentira. Dei os meus parabéns ao Charlie Kirk no ano passado e agradeci-lhe por ter ajudado centenas de jovens negros a receber um convite para a Casa Branca em 2019. Ele ajudou a pagar a maioria dos voos e hotéis deles porque viajar custava muito [dinheiro] e ele não queria que eles perdessem essa oportunidade. Ele proporcionou-lhes uma experiência e uma oportunidade única na vida e, sim, ele também me ajudou a receber um convite. Vou sentir tanto a sua falta!”
O mesmo se repete em relação a outras mentiras dos media sobre Kirk. Em Portugal, além das notícias falsas que acusam Kirk de racista, misógino e de pertencer à extrema-direita, há ainda as mentiras espalhadas por comentadores, como Filipe Santos Costa. Este ex-jornalista tem repetido na CNN, impunemente, a mentira de que Kirk defendia o apedrejamento até à morte de homossexuais. Kirk jamais defendeu tal atrocidade. Aliás, qualquer jornalista verifica, numa breve pesquisa, que Kirk, era tolerante e defendia o diálogo e a tolerância. Num dos debates numa universidade, Kirk afirmou que, não concordava com “esse estilo de vida” (homossexualidade) mas frisou isto: o mais importante na identidade de uma pessoa não deve ser o que faz na intimidade, no quarto.
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Além de jornalistas e comentadores, académicos também fogem aos factos. A historiadora portuguesa Irene Pimentel escreveu na rede social Facebook, da Meta, que Kirk era “um simpatizante nazi”, o que é obviamente falso.
Na mesma publicação [cujo link não coloco aqui para não promover discurso de ódio e desinformação], a historiadora também atribuiu a Kirk afirmações descontextualizadas. Por exemplo, Pimentel afirmou que Kirk era contra a democracia. Na realidade, o que ele afirmou foi que a palavra “democracia” não consta na Constituição dos Estados Unidos, mas que ele era “a favor de um governo representativo”, ou uma democracia representativa, como a que existe nos Estados Unidos e em Portugal. Pimentel também chamou Kirk de “misógino, racista e criminoso”, o que é falso. Kirk defendia a igualdade e a tolerância. Era cristão, conservador e um pacifista.
Mais uma vez, este tipo de acusações difamatórias acabam por desumanizar o alvo e facilitar e até legitimar os ataques e as agressões contra personalidades que não sendo “racistas”, “nazis” nem “fascistas” sofrem campanhas de desumanização.
Na realidade, Kirk não falava a linguagem woke tão amada por académicos seguidores de ideologias de esquerda, da extrema-esquerda. E, acresce, que era cristão, portanto era crítico de alguns temas e odiado por aqueles que hoje vêem no Cristianismo uma ameaça.
Perante tantos jornalistas e personalidades a atirar pedras ao nome e reputação de Kirk, quantos jornalistas arriscam hoje escrever a verdade sobre ele? Poucos.
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A onda de desinformação criou uma imagem falsa de Kirk. É fácil desmontar as mentiras? É. Qualquer pessoa faz isso em segundos. Qualquer jornalista. Mas falta a vontade. Falta vontade de fazer Jornalismo isento. Sem ideologias. Sem preconceitos. Falta a vontade de seguir o método que obriga a ir à fonte e verificar qual é a verdade. Sem os óculos do wokismo, sem os óculos dos ateus e das correntes em voga que ostracizam o Cristianismo.
É preferível pensar que é uma questão de “falta de vontade” ou de “preguiça”. Porque a alternativa é impensável: foi por maldade e má-fé.
Como jornalista, observam-se os factos. Pode não se concordar com as posições cristãs e conservadoras de Kirk. Pode não se apreciar a linguagem directa e assertiva, nada politicamente correcta. Pessoalmente, partilho uma visão diferente da dele em muitos temas. Mas isso não é relevante quando estou a exercer a minha profissão de jornalista e a cumprir o meu dever de informar com isenção e profissionalismo.
Um jornalista pode ser ideologicamente de extrema-esquerda e ser ateu ou agnóstico, e mesmo assim ser um bom jornalista, que faz uma cobertura noticiosa dos eventos de forma isenta e rigorosa. Ou um jornalista pode ser ideologicamente da ala conservadora e muçulmano e ser um excelente profissional.
Foto: D.R.
O preço a pagar sempre que jornalistas mentem é que toda a classe perde credibilidade. Isso voltou a acontecer, agora, com o homicídio de Kirk. Já tinha acontecido em muitas outras situações. O preço a pagar pelas mentiras é o desaparecimento do Jornalismo enquanto bússola e farol no mar sem fim de informação que temos hoje. E o mar está revolto, há ondas brutais e rochas afiadas que ameaçam a navegação.
A esperança está nos jornalistas, nos profissionais que recusarem seguir as “manadas” e as mentiras em direcção ao naufrágio. A esperança está nos jornalistas que seguirem as boas práticas de verificarem as fontes e as informações, que são as velas e o leme que podem levar a bom porto qualquer trabalho jornalístico. E aí, é lançada a âncora — a verdade.
Tendo começado a carreira de jornalista no tempo pré-Internet e smartphones — em que verificar dados e fontes dava mais trabalho e levava mais tempo — digo isto: nada mudou, no que toca ao básico em Jornalismo. Há mais ferramentas e meios, mas o básico mantém-se e há que procurar as fontes primárias, as fontes seguras e fiáveis para conseguir responder às questões simples que uma boa cobertura noticiosa exige. Quem? O quê? Onde? Quando? Como? Porquê?
Não basta serem fontes oficiais. Há que verificar se as fontes, mesmo as oficiais, têm interesses conhecidos ou escondidos, sejam económicos ou políticos, e deve ter-se isso em conta.
Hoje não é fácil um jornalista seguir estes princípios. Um jornalista que “se atreva” a “sair da linha” e a escrever “algo diferente” do que está a ser dito pelo The Guardian e similares, arrisca ser insultado, envergonhado publicamente. Arrisca ser catalogado de “nazi” e “fascista”.
Foto: D.R.
Porque acredito que os tempos são de desafio moral e espiritual, e não apenas sobre os factos ou as boas práticas, concluo este texto com uma sugestão a todos os jornalistas: não tenham medo. Nunca tenham medo. Porque o que conta é estarmos em paz com a nossa consciência, enquanto profissionais e seres humanos.
Se um jornalista tem medo de escrever com base nos factos e se receia investigar, é porque vive num regime de ditadura. E isso sente-se hoje, esse peso da censura e dos “linchamentos” na praça pública perpetrados por aqueles que chamam outros de … “fascistas” e “nazis”. São esses os verdadeiros antidemocratas do nosso tempo.
O Jornalismo é um eterno aliado da democracia. O “jornalismo de manada”, usado para desumanizar e difamar, é uma arma poderosa que ameaça destruir a democracia e favorecer os que querem censura, pensamento único e opressão. Cabe aos leitores ver a diferença.
Nota: Texto actualizado no dia 28 de Setembro, às 17H50, para acrescentar outras acusações difamatórias que a historiadora portuguesa Irene Pimentel fez a Kirk e também para clarificar que Pimentel não afirmou que o jovem cristão e conservador era “nazi”, mas sim “um simpatizante nazi”. Esta e as restantes acusações difamatórias feitas por Pimentel numa publicação na rede Facebook são obviamente falsas.