Autor: Elisabete Tavares

  • A nova era de ódio às mulheres

    A nova era de ódio às mulheres

    A Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) anunciou ontem que “apresentou queixa junto do Ministério Público e outras entidades públicas por factos que podem eventualmente configurar discurso de ódio e eventualmente incitamento ao ódio contra as mulheres, no sentido de apurar eventuais responsabilidades legais”.

    Em causa estão declarações proferidas nas redes sociais por um ‘influencer’. Segundo o Jornal de Notícias, o alvo será um personagem que se apresenta com o nome Numeiro.

    Por detrás da polémica estarão publicações que este ‘influencer‘ fez nos últimos dias, designadamente na rede X, sobre a questão da interrupção voluntária da gravidez e o papel da mulher. Num dos seus ‘posts‘ na rede X, Numeiro escreveu: “Aborto só devia ser permitido em casos extremos, tipo malformação do bebé ou engravidar uma amante”. Pensei que em 2025 já não existiriam ‘homens das cavernas’, mas existem.

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    Foto: Kristina Flour

    Este caso surge depois de um outro, que envolveu o empresário e ‘podcaster’ Miguel Milhão, uma espécie de Joe Rogan à portuguesa, que entrevista personalidades no seu programa. Milhão pagou para passar um anúncio na TVI supostamente ‘pró-vida’, condenando a interrupção voluntária de gravidez. O anúncio gerou uma onda de críticas e queixas junto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

    As acções de Numeiro e de Miguel Milhão demonstram, inequivocamente, um enorme desrespeito pela Mulher. Ignoram os direitos humanos alcançados por todas as mulheres ao longo de gerações. Enterram a Mulher e submetem-na a uma condição inferior de ser humano, cujo corpo não é efectivamente … seu.

    Os casos de Numeiro e de Milhão não surpreendem, infelizmente. Surgem num contexto e numa época em que há personalidades que promovem o culto do ‘homem de verdade’, a ideia de que ‘homem que é homem’ é ‘macho man‘, só que ultra vaidoso. Misógino, mas com abdominais bem definidos, cabelo bem cuidado e relógios caros. É um culto que vende a ideia da ‘libertação’ do homem, mas que não passa do oposto: destrói os homens. Por completo. Reduz os homens a uma condição básica que envergonharia homens com grandes feitos na História.

    Mas não só. O caso de Numeiro e de Milhão também não surpreendem porque surgem numa era em que o ódio contra a Mulher é promovido por Governos, organismos de Saúde e organizações de ‘defesa da Mulher’.

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    Foto: Klara Kulikova

    O ódio contra a Mulher foi institucionalizado. Tem sido colocado em Lei. Tem sido normalizado e ensinado nas escolas e vendido pelos media.

    Por isso, o anúncio da CIG sobre a queixa contra Numeiro deixa no ar um cheiro nauseabundo a hipocrisia.

    A CIG tem ajudado a criar ‘Numeiros’ e ‘Milhãos’. A CIG tem destruído a condição da Mulher. A CIG tem sido um dos carrascos dos direitos das mulheres em Portugal. E tem-lo feito de forma subliminar, enquanto espalha cartazes e iniciativas em defesa da Mulher. Salva-se a sua acção no combate à violência contra mulheres.

    A CIG sacrificou a Mulher no altar da ‘inclusão’. Aplaude políticas que eliminam a palavra ‘MULHER’ de documentos oficiais. Que defendem que meninas, jovens e mulheres sejam forçadas a partilhar casas-de-banho com pessoas que decidiram adoptar outro género. Como se a recusa das mulheres e meninas em fazê-lo fosse um mero ‘capricho’ feminino.

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    Foto: Katherine Hanlon

    Possivelmente, para a CIG, as mulheres e meninas que se queixam das suas ‘políticas de inclusão’ serão talvez transfóbicas, intolerantes, umas ‘terf‘. Enfim, têm caprichos e são umas histéricas. São ‘doentes’ ou sofrem de desvios. São, enfim, candidatas a internamento para que, com choques eléctricos, talvez, tenham recuperação. Onde (e quando) já vimos isto?

    Mais do que aplaudir, a CIG promove essas iniciativas. A CIG admira-se que a Mulher seja vista como não tendo direitos, como um ser humano inferior? Não sei como. A sua hipocrisia não tem fim.

    As políticas apoiadas e promovidas pela CIG, que abafam ‘as queixas’ das mulheres, foram ‘mensagens’ que acabaram por servir para validar pessoas como Numeiro. Foram mensagens claras, como a água cristalina da mais pura das fontes. E a mensagem foi esta: a Mulher tem direitos a não ser nas políticas de ‘inclusão’. Nesse caso, os direitos da Mulher valem tanto como merda.

    No fundo, a mensagem da CIG é de que a Mulher é inferior. Vale menos. Vale menos que todos os géneros. Tem menos direitos do que todos os géneros.

    Hoje, para a CIG, é normal que a Direcção-Geral da Saúde (DGS) elimine as mulheres das informações sobre Saúde. Não há mulheres que amamentam, ou que menstruam. Ou que fazem interrupções voluntárias de gravidez.

    A CIG tem ajudado a criar ‘influencers‘ como Numeiro que será, segundo o Jornal de Notícias, o alvo da queixa da CIG. Numeiro limita-se a fazer o que aprendeu: angariar seguidores copiando a moda da promoção da imagem de que ‘homem que é homem’ não é ‘o gajo bronco das obras’, mas o misógino, com abdominais bem delineados e relógios caros no pulso. / Foto: D.R.

    Todos os géneros têm direitos humanos. Todos os seres humanos têm o direito de escolher ser do género que quiserem, desde que sejam maiores de idade e, portanto, estejam plenamente conscientes e tenham a maturidade adequada para tomarem essa decisão, muitas vezes definitiva. (Ao contrário do que defende o polémico ‘guia’ da CIG que, entre as suas sugestões, exclui os pais de aceder a informação crucial e de darem o devido consentimento a questões relativas aos seus filhos).

    Se a ‘Maria’, adulta, nascida mulher, sentir e decidir que passa a ser o João, tem esse direito. E se o ‘João’ engravidar, tem o direito de pedir para que na maternidade seja endereçado como João e seja tratado como ‘ele’ e não ‘ela’. Mas jamais pode uma franja da população, como é o caso das pessoas que decidem adoptar um outro género, ditar o fim da Mulher e dos direitos de todas nós à existência enquanto tal, designadamente nos documentos oficiais sobre Saúde.

    São um insulto e uma ofensa às mulheres todas as políticas que a DGS está a seguir nesta matéria, de mão dada com a CIG. Mais do que absurdo, é um crime de ódio contra as mulheres.

    Ou seja, para não se ‘ofender’ ‘homens’ (nascidos mulher) ou ‘não-binários’ quando engravidam e menstruam, decidiu-se que é normal ofender as mulheres e eliminá-las da literatura de Saúde e materno-infantil. Isto é um crime de ódio. Puro.

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    A mulher não tem de se sentir culpada por ter espaços únicos para si, como casas-de-banho, onde tem garantias de segurança e privacidade. Nem tem de ser sentir com vergonha e medo de defender os seus direitos. A normalização da ‘blame and shame‘ da mulher nas políticas de inclusão é inaceitável. / foto: D.R.

    Dir-me-ão que são assuntos diferentes dos casos de Numeiro e de Milhão. Que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Que a DGS e a CIG estão é a promover a ‘inclusão’. Sim, excluindo a Mulher. Para sempre.

    Dir-me-ão que se tiver esta opinião sou ‘transfóbica’, ‘terf‘ ou intolerante. Que o digam. Sempre tive, desde o liceu, amigas e amigos ‘gay‘. Muitos deles defendem, há muito, exactamente o mesmo que eu: a tolerância e a inclusão não são um ‘passe’ para eliminar os direitos fundamentais de um grupo inteiro de seres humanos. Incluindo a liberdade de expressão. (E veja-se o caso das lésbicas que, em alguns países, estão a ser forçadas a receber nas suas organizações e reuniões homens que agora se afirmam como mulheres.)

    Nós, mulheres, já ouvimos de tudo ao longo das nossas vidas. Já tolerámos muito. Está na altura de dar um murro na mesa. Trabalhámos em ambientes misóginos, sexistas, patriarcais, homofóbicos e racistas. Aturámos assédio que fingimos não ver para não ficar sem trabalho. Vimos colegas homens ganhar mais do que nós, sem terem mérito.

    Rita Sá Machado, directora-geral da Saúde (ao centro) no programa ‘Praça da Alegria’, da RTP. Sob a sua batuta, a DGS tornou-se misógina e eliminou a palavra Mulher da terminologia de saúde feminina e materno-infantil, com a justificação da inclusão de outros géneros. / Foto: D.R. / RTP

    Mas, hoje, em Portugal, a ideia de que a Mulher não merece existir tem sido promovida pela CIG. E pela DGS. E pela UMAR. E por organizações que têm beneficiado de fundos financeiros (incluindo comunitários) que pagam programas e iniciativas que tenham a palavra ‘género’ ou ‘inclusão’. Por psicólogos, médicos, personalidades e ‘influencers‘ que têm lucrado com a indústria do género e em torno da suposta promoção da inclusão. É de uma indústria que se trata.

    (E mesmo na inclusão, a CIG e outras entidades têm trabalho a fazer. Quando, a 13 de Novembro de 2024, o PÁGINA UM noticiou o aumento de violência doméstica sobre homens — alguns possivelmente agredidos pelo parceiro homem —, a CIG minimizou o assunto e a APAV-Associação Portuguesa de Apoio à Vítima nem se dignou a responder ao nosso pedido de comentário e de sugestão de medidas de apoio às vítimas.)

    Será que se, de repente, houver mais fundos comunitários e de fundações para apoiar projectos de defesa da Mulher, a CIG e todas as associações e psicólogos não mudariam as suas estratégias e ‘guias’?

    Inclusão é receber o outro, sem nos anularmos a nós. É integrar e abrir os braços ao diferente, mantendo os nossos direitos. Sem eliminar o que se conquistou com sangue e sofrimento.

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    Nos últimos anos, tem havido um recuo nos direitos das mulheres e na sua protecção. Nos pódios do desporto feminino, as mulheres e raparigas foram substituídas por pessoas que nasceram com o sexo masculino, e que têm óbvias vantagens físicas. Em alguns países, deixaram até de ter casas-de-banho e vestiários exclusivos, colocando em risco a segurança de meninas e mulheres. Até foram substituídas em concursos de beleza. Contudo, quem tem ousado falar sobre estes temas e defender os direitos das mulheres, é alvo de insultos, ameaças, censura e até violência e perseguição. Sobre isto, nem uma palavra das entidades que promovem a ‘inclusão’. / Foto: Sam McNamara

    A Mulher tem direito a existir. Tem direito a decidir sobre o seu corpo. Tem soberania sobre o seu corpo. Sobre o que entra e toca no seu corpo. E sobre o que quer para si e para a sua saúde, física e psicológica. Sobre o que quer para a sua vida. A Mulher é soberana. E tem direito a sentir-se segura. E respeitada.

    Numeiro é claramente alguém que percebeu como atrair seguidores. Milhão é alguém que defende que a Mulher não deve ser soberana sobre o seu corpo e alguém que defende que sejam retirados direitos humanos a todas as mulheres.

    Já a DGS e a CIG querem eliminar a Mulher, por completo. Não ao murro, à estalada, à facada, como fazem maridos e namorados agressivos e criminosos. Mas ao abrigo das leis que ajudam a criar. Querem eliminar a Mulher e já o fizeram, ao excluir o nome Mulher da terminologia de Saúde feminina.

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    Foto: Reed Naliboff

    A CIG e a DGS institucionalizaram o ódio contra a Mulher. Que Numeiro e Milhão se achem no direito de fazer anúncios e publicações misóginas é muito mau e condenável. Que entidades públicas o façam, a coberto da ‘inclusão’, é um crime.

    Numeiro e Milhão são meros alunos. A CIG e a DGS têm sido as professoras. A CIG e a DGS são as Mentoras nesta nova vaga de ódio à Mulher em Portugal.

    Além da CIG, há que salientar o papel de organizações como a UMAR-União de Mulheres Alternativa e Resposta, na tarefa de varrer a Mulher para debaixo do grande tapete da ‘inclusão’.

    O acto de a CIG apresentar queixa contra Numeiro não a iliba das suas culpas na criação dos ‘Numeiros’. Esta queixa não espia a culpa que a CIG tem no cartório. Só a torna mais evidente.

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    Foto: D.R.

    Jamais seria capaz de fazer uma interrupção voluntária de gravidez. Para mim, o momento da concepção é divino e, desde o primeiro momento, um ser humano existe. Mas defendo o direito de outras mulheres terem a opção de fazer essa escolha e de a exercer de forma segura, sem serem presas e condenadas.

    A CIG quer ser o carrasco de Numeiro. Mas enquanto a CIG existir como existe agora, mais Numeiros nascerão. Porque o ódio às mulheres vive e prospera. Através da CIG e da DGS. E isso é, infelizmente, evidente para todas, nós. Mulheres.

  • Imparável: após buscas, Nininho Vaz Maia já ganhou mais 200 mil euros em concertos com autarquias

    Imparável: após buscas, Nininho Vaz Maia já ganhou mais 200 mil euros em concertos com autarquias

    Mesmo depois de ser constituído arguido e com rumores da sua ‘expulsão’ de mentor do The Voice, programa de talentos da RTP, a carreira do cantor Nininho Vaz Maia, vai de vento em popa. As buscas de foi alvo, no passado dia 6 de Abril, relacionadas com tráfico de droga e lavagem de dinheiro, não esmoreceram a vontade de autarcas em contratarem o popular cantor, que afirma estar inocente. No espaço de um mês, após as buscas, Nininho ‘assinou’ mais quatro contratos com autarquias num valor global de 205 mil euros para dar concertos ‘grátis’ à população. E há mais a caminho.

    Os quatro municípios que adjudicaram contratos ao cantor, sempre por ajuste directo, foram: Castelo de Paiva, Sertã, Reguengos de Monsaraz e Arouca. Três dos contratos foram efectuados através da Gigs on Mars, que representa o artista, e um foi feito através da empresa unipessoal Iconikourage, segundo a consulta que o PÁGINA UM fez à plataforma de registo dos contratos públicos, o Portal Base.

    A polémica em torno do artista não beliscou o apetite de autarcas em contratar o popular cantor nascido numa família cigana, que se tornou numa das coqueluches do panorama musical nacional e esgotou duas noites no MEO Arena. A tendência confirma que Nininho Vaz Maia se tornou um fenómeno musical, sendo até imune a polémicas, como o PÁGINA UM antecipou. Além da popularidade, a polémica em torno do cantor surgiu num contexto em que a cena política ‘lucra’ com posições a favor ou contra minorias.

    O município da Sertã liderado pelo socialista Carlos Miranda adjudicou, no dia 21 de Maio, um contrato referente à contratação de um espectáculo do cantor no valor de 43.665 euros. O cantor tem assim presença confirmada no dia 19 de Julho no ‘Festival de Gastronomia do Maranho‘ de 2025, que decorre de 17 a 20 de Julho.

    Seguiu-se um contrato adjudicado à Iconikourage, Unipessoal, no dia 23 de Maio, pelo município de Castelo de Paiva presidido pelo social-democrata José Rocha no montante de 74.722,5 euros referente à aquisição de um “espectáculo, produção e gestão da produção do espetáculo musical de Nininho Vaz Maia – Festas de S. João”. O cantor será o cabeça-de-cartaz das festividades e irá actuar na noite de S. João, a 23 de Junho.

    Na passada terça-feira, dia 3 de Junho, o cantor ganhou mais dois contratos por ajuste directo, assinados pela Gigs on Mars com os municípios de Reguengos de Monsaraz e Arouca.

    Nininho Vaz Maia é o cabeça-de-cartaz das Festas de Santo António em Reguengos de Monsaraz.
    / Foto: D.R.

    No caso do município alentejano, o valor do contrato ficou por 46.125 euros para contratar Nininho Vaz Maia para actuar  nas Festas de Santo António de 2025, que decorrem entre 12 e 15 de Junho. O cantor vai estar em palco às 23 horas no dia 12 de Junho.

    O quarto contrato foi adjudicado pelo município de Arouca, por um valor de 41.364,9 euros. O cantor vai actuar na ‘Feira das Colheitas, Edição 2025’ marcada para entre 25 e 28 de Setembro. O músico vai actuar no dia 26 de Setembro, depois de ter sido “o mais votado no âmbito do inquérito online que a Câmara Municipal lançou para recolha de sugestões de artistas para a 81.ª edição da Feira das Colheitas”, segundo um anúncio da autarquia nas redes sociais, cujo prazo de resposta terminou a 15 de Abril, antes das buscas.

    Curiosamente, este contrato foi adjudicado por uma autarca, a socialista Margarida Belém, que foi condenada em 2023 pelo crime de falsificação de documentos, tendo-lhe sido aplicada uma pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa por igual período. Em 2024, o Tribunal da Relação do Porto negou provimento ao recurso da autarca e confirmou a sentença aplicada na primeira instância.

    Mas a lista de contratos públicos adjudicados a Nininho Vaz Maia não deverá ficar por aqui. É que o artista terá 17 concertos agendados até ao final do ano de Norte a Sul do país, segundo alguns sites com agendas de eventos. Assim, ainda haverá contratos por assinar com autarquias para concertos que serão ‘grátis’ para a população, sendo pagos pelos contribuintes. Por exemplo, Nininho Vaz Maia vai actuar na ‘Festa do Emigrante 2025’, em Agosto, em Vila Real, que celebra este ano o seu centenário.

    Nos últimos dias, surgiram rumores de que Nininho Vaz Maia não irá continuar como ‘Mentor’ no programa de talentos ‘The Voice Portugal’, da RTP, mas não há nenhuma informação oficial sobre o tema. O artista integrou a lista de ‘Mentores’ da última edição do programa, ao lado de de Sónia Tavares, Sara Correia e Fernando Daniel. / Foto: D.R.| RTP

    Ainda hoje foi publicado no Portal Base um contrato no valor de 21.525 euros referente à “aquisição de serviços para o aluguer de som, luz, vídeo, efeitos especiais e material de DJ para o espetáculo do artista Nininho Vaz Maia, inserido na Festa do Emigrante 2025”. De resto, note-se que a despesa com concertos ‘grátis’ contratados pela autarquia de Vila Real em 2025 já iam, no final de Março, perto do meio milhão de euros, segundo um levantamento feito pelo PÁGINA UM. Um custo que ‘sobra’ para os contribuintes e que, em ano de eleições autárquicas, cai que nem ‘mel na sopa’ dos autarcas de todo o país, de ‘olho’ em novo mandato. Nininho é apenas mais um dos artistas com concertos ‘grátis’ que ‘animam’ a festa.

    Na página da Gigs on Mars, agente do artista, constam 11 concertos agendados entre os dias 21 de Junho e 27 de Julho. Já na página oficial do cantor na Internet, a área dedicada a agenda encontra-se vazia, surgindo a mensagem: “de momento não há eventos programados”.

    A agenda recheada do cantor, vem mostrar que a condição de arguido não o afasta dos palcos. Pelo contrário. Recorde-se que, tal como o PÁGINA UM noticiou, no próprio dia em que foi alvo de buscas, o cantor ganhou novo contrato público, com o munícipio de Anadia.

    Actualizando os valores, com os quatro contratos agora ganhos, eleva-se para 697.828 euros a facturação do cantor em 14 contratos com entidades públicas só em 2025. Este valor compara com os 20 contratos ganhos em todo o ano de 2024 e os 12 obtidos em 2023, num valor global 798.940 euros e 326.811 euros, respectivamente.

    Nininho Vaz Maia vai actuar na ‘Festa do Emigrante 2025’ em Vila Real, integrando assim o número de artistas que este ano darão concertos ‘grátis’ à população no âmbito das celebrações do centenário da elevação a cidade. / Foto: D.R.

    No total, desde Janeiro de 2023, quando ganhou o seu primeiro contrato público, o cantor já facturou mais de 1,8 milhões de euros com entidades públicas, incluindo 41 autarquias.

    O cantor tem feito também um percurso fora do circuito dos contratos públicos, sendo exemplo disso a Queima das Fitas e, sobretudo, espectáculos comerciais, com entradas pagas. Por exemplo, há menos de três meses, esgotou duas noites no MEO Arena, em Lisboa.

  • Impresa e Novo Banco: não  há aqui corrupção?

    Impresa e Novo Banco: não há aqui corrupção?

    Foi hoje divulgado pelo Correio da Manhã que o Ministério Público decidiu que não encontrou indícios de crime em negócios feitos desde 2018 entre a Impresa e o Novo Banco. O anúncio da decisão de arquivamento do inquérito foi tornado público na página no Departamento Central de Investigação e Acção Penal de Lisboa no passado dia 26 de Maio, mas só hoje saltou para o palco mediático. Segundo o comunicado, a investigação partiu de uma denúncia anónima que levantava suspeitas sobre a legalidade dos negócios feitos entre o Grupo de Pinto Balsemão e o Novo Banco, sucedâneo do BES.

    No centro das suspeitas estão dois negócios em concreto: a venda e posterior compra do edifício-sede da Impresa; a venda de um portólio tóxico de publicações à Trust in News (TIN), uma empresa unipessoal criada, à medida do negócio, por Luís Delgado, e que está em processo de insolvência.

    António Ramalho (à esquerda) era o presidente-executivo do Novo Banco quando a instituição, que se encontrava a receber injeções de capital estatais, através do Fundo de Resolução, deu uma ‘mão’ a vários negócios da Impresa. Em 2018, o Novo Banco não só comprou o edifício-sede da Impresa por 24,2 milhões de euros, como financiou Luís Delgado na compra das revistas do grupo de Balsemão. Além disso, fez uma parceria comercial com o Expresso e a SIC Notícias, que incluiu a presença de Ramalho em diversos eventos públicos, como este, moderado pelo jornalista José Gomes Ferreira, da SIC.

    O comunicado é omisso quanto à data em que foi feita a denúncia anónima, mas o inquérito tem o Número Único de Identificação do Processo Criminal (NUIPC) 44/25.0TELSB, como consta do comunicado do DCIAP, indicando que terá sido aberto já este ano.

    Estes negócios entre a Impresa e o Novo Banco, que foram alvo de inquérito pelo Ministério Público, já tinham sido investigados e noticiados pelo PÁGINA UM, que encontrou sobretudo uma cortina de opacidade em torno daquelas operações. A estranheza prendeu-se, sobretudo, com o facto de estar envolvido um banco que, à época dos negócios, estava a receber injecções estatais, através do Fundo de Resolução.

    Recorde-se que os negócios remontam a 2018. A Impresa tinha falhado, meses antes, uma emissão de obrigações e estava numa situação financeira difícil. Por outro lado, o seu banco ‘amigo’ de longa data, o BPI, tinha sido comprado pelo espanhol Caixabank e já não estava disponível para novos financiamentos à Impresa. A Caixa Geral de Depósitos (CGD) estava a receber injecções estatais e estava ‘fora de jogo’. Foi aí que entrou em cena o Novo Banco, quando era liderado por António Ramalho, actual presidente da Lusoponte. Foi sob a liderança de Ramalho que foram permitidos os dois negócios que foram feitos graças a dinheiro que saiu dos cofres do banco.

    Francisco Pinto Balsemão (ao centro) numa visita às novas instalações da SIC, no edifício-sede da Impresa, com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. / Foto: Captura de imagem a partir de vídeo da SIC

    O primeiro negócio, em Janeiro de 2018, foi a oficialização da venda de um portfólio tóxico de publicações da Impresa, incluindo a revista Visão e a Exame, a uma empresa unipessoal criada à medida por Luís Delgado — a Trust in News. Esta empresa, que tem capital social de apenas 10.000 euros, está hoje em situação de insolvência, tendo as principais marcas, como a Visão, penhoradas desde 2020, como o PÁGINA UM noticiou.

    O negócio foi anunciado com pompa e circunstância no site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e indicava um valor de venda de 10,2 milhões de euros, sem mencionar como seria feito o pagamento. O Novo Banco emprestou 4.000.000 euros a Delgado e as restantes verbas foram pagas de várias formas, incluindo através de créditos que a TIN tinha na MEO e no jornal Público.

    Hoje, o Novo Banco é um dos principais credores da Trust in News e arrisca perder mais de 3,5 milhões de euros. Nos documentos internos do banco referentes aos empréstimos, as garantias que se encontram são uma mão-cheia de quase nada, designadamente uma livrança em branco avalizada por Delgado. Agora, foi aprovado um plano de recuperação da TIN, que envolve a promessa de Delgado de injectar 1,5 milhões na sua empresa unipessoal, sem ser claro de onde virá o dinheiro para essa injecção.

    Ora, quantas empresas com um capital social de apenas 10.000 euros, e a operar num sector de actividade em crise, teriam acesso a um empréstimo bancário de milhões de euros, dando como principal garantia uma livrança em branco avalizada pelo gerente?

    Luís Delgado (na foto), e os outros dois gerentes da Trust in News (TIN), foram condenados a uma pena suspensa de cinco anos pelo crime de abuso de confiança fiscal na forma agravada, sob condição do pagamento de mais de 800 mil euros que ficaram em dívida ao Fisco logo nos primeiros anos de existência da TIN .

    O Novo Banco ainda tentou penhorar os principais títulos de publicações da TIN, mas já foi tarde e teve de se pôr na fila, pois já estavam penhorados pela Segurança Social e a Autoridade Tributária desde 2020 por dívidas ao Estado.

    O Novo Banco ainda fez um levantamento de património de Delgado para eventual execução, mas só encontrou um pequeno apartamento num prédio em Alcântara, o qual já estava sob hipoteca e… penhora.

    Ao financiar a TIN, que transferiu assim dinheiro para a Impresa, o Novo Banco fez algo que não era aconselhável a nenhum banco, sobretudo a um que estava a receber injecções estatais: financiar um negócio de risco elevado e emprestar dinheiro a uma empresa que acabara de comprar um portfólio de publicações num sector em queda livre.

    Francisco Pedro Balsemão, presidente-executivo da Impresa, tentou convencer o Município de Oeiras a vender ao grupo um terreno adjacente ao seu edifício-sede. Mas o terreno seria pago pelo Novo Banco, o qual ficaria o efectivo dono do terreno. / Foto: D.R.

    O segundo negócio envolvendo o Novo Banco, que também beneficiou a Impresa em 2018, foi o da venda do edifício-sede do Grupo de Balsemão. O anúncio da venda também foi feito com grande destaque e direito a divulgação no site da CMVM. A Impresa encaixou 24,2 milhões de euros e ficou com direito a arrendar o imóvel durante 10 anos, numa operação denominada ‘sale and leaseback‘.

    Neste negócio, o Novo Banco fez o que não era recomendado a nenhum banco naquele momento, muito menos a um banco a receber injecções de capital estatais: investir em imobiliário. Certo é que, com a saída de Ramalho do Novo Banco, o banco desfez-se do imóvel, vendendo-o de novo à Impresa antes dos 10 anos chegarem ao fim. E fê-lo a um valor inferior ao da venda, supostamente tendo sido descontadas rendas pagas. O empréstimo foi celebrado com uma taxa de juro anual de 9%, a que acresce 3% de juros de mora em caso de atraso no pagamento de mensalidades, o que revela o risco que a Impresa representa para a banca. Assim, o banco não se livrou do risco, já que vendeu o edifício à Impresa mas com um empréstimo… do Novo Banco.

    Recentemente, houve novos desenvolvimentos: a Impresa anunciou que vai vender o edifício-sede, de novo. O Novo Banco irá, assim, em definitivo, livrar-se do empréstimo e de risco de eventual incumprimento por parte da Impresa. Mas nada se sabe publicamente sobre: se a Impresa pagou todas as rendas ao Novo Banco; se a Impresa tem em dia as prestações do empréstimo ou se tem havido reestruturação do crédito.

    Amadeu Guerra, Procurador-Geral da República. / Foto: D.R.

    Observando todos os factos, várias discrepâncias saltam à vista, quando confrontadas com as conclusões do Ministério Público sobre o inquérito a estes negócios.

    O Ministério Público sugere que o Novo Banco não foi prejudicado nestes negócios. No negócio de financiamento da TIN, fundamenta a sua conclusão com o facto de o Novo Banco ter apenas financiado 33% da operação e de ter tido garantias.

    Acontece que, na prática, não foram de imediato pagos os 10,2 milhões de euros à Impresa, porque o acordo entre Balsemão e Delgado previa o pagamento do valor global em duas tranches, uma inicial e outra remanescente, a qual seria paga em prestações mensais, segundo documentos da Impresa consultados pelo PÁGINA UM. Acresce que, foram ainda ‘descontados’ aos 10,2 milhões de euros um valor referente a stock de papel, o valor de renovação das marcas e uma dívida da Impresa.

    Depois, após meia dúzia de alterações ao acordo de venda, por conta de aditamentos ao contrato, a factura da TIN acabou ainda por ser paga, em parte, através da MEO e do jornal Público, do grupo Sonae. Como? Através de créditos futuros detidos pela TIN junto daquelas duas empresas.

    Assim, dizer que o Novo Banco apenas financiou 33% do negócio, sendo parcialmente correcto, omite um facto: foi o único banco que financiou as tranches a pagar pela TIN à Impresa. Mais concretamente, o Novo Banco emprestou 4,0 milhões de euros a Delgado em 23 de Setembro de 2019 para “liquidação de responsabilidades futuras”. O contrato de financiamento foi alterado… sete vezes, a última em 24 de Novembro de 2023.

    Luís Delgado (à esquerda) ficou com o portfólio de revistas da Impresa, activos que se revelaram tóxicos. O valor acordado foi de 10,2 milhões de euros, tendo o Novo Banco estranhamente financiado a arriscada operação. (Foto: D.R.)

    Outra fundamentação do Ministério Público que cai por terra, como um castelo de areia, é o facto de alegar que o financiamento de 4,0 milhões de euros à TIN foi feito mediante “garantias e cláusulas usuais no comércio bancário”. Sendo a afirmação correcta, omite vários factos de relevo. As garantias aceites pelo Novo Banco foram: uma livrança em branco subscrita pela TIN e avalizada por Delgado; o penhor das quotas equivalentes aos 10.000 euros do capital social da TIN; uma conta de depósito a prazo de valor mínimo de 45.000 euros; penhor em primeiro grau das marcas Jornal de Letras, Exame Informática e mais cinco marcas de menor valor da TIN. O banco tinha ainda como garantia o penhor em segundo grau das marcas mais valiosas da empresa.

    Sobre o negócio envolvendo o edifício-sede da Impresa, presume-se que o Ministério Público pediu para consultar informação interna do Novo Banco, que provam o pagamento das rendas, quando o edifício pertencia ao banco, e que demonstram o regular pagamento das prestações do empréstimo concedido pelo banco para que o imóvel deixasse a sua carteira de passasse para as mãos da Impresa, sem reestruturações de crédito pelo meio. É que a conclusão do Ministério Público, também neste caso, é que o Novo Banco não foi prejudicado. Mas o Ministério Público falha um ponto essencial: o Novo Banco nunca se poderia ter envolvido num negócio imobiliário do género, para começar. Muito menos em 2018. Se fosse outra empresa, António Ramalho teria dado o ‘sim’ a uma operação do género?

    Revista Visão. (Foto: PÁGINA UM)

    Além destes dois negócios, a Impresa tentou ainda convencer o Município de Oeiras a vender-lhe um terreno adjacente ao do edifício-sede. Mas quem iria pagar e ficar dono do terreno seria o… Novo Banco. Ou seja, o presidente-executivo da Impresa tentou fazer um negócio servindo como intermediário do Novo Banco, em nome do banco.

    Há ainda a notar, em 2018, o patrocínio do Novo Banco a eventos do grupo Impresa, nos quais António Ramalho surgia como protagonista. No mesmo ano, em Novembro, António Ramalho, foi apontado como um dos escolhidos por Francisco Balsemão para integrar o restrito grupo de fundadores de um novo clube, apelidado como a versão portuguesa do secreto grupo Bilderberg, segundo noticiou o Público.

    Posto isto, reunindo todos os factos, será que ficam dissipadas todas as dúvidas sobre os motivos que levaram um banco que estava a receber injecções estatais a meter-se em negócios de elevado risco? Certamente que não. Será que Ramalho teria dado a mão a outra empresa em Portugal, em negócios similares? Não saberemos. Mas isto significa que houve corrupção e tráfico de influências nestes negócios entre a Impresa, a TIN e o Novo Banco? Cabe ao Ministério Público dizê-lo, após uma investigação profunda e reunindo todas as provas. Para já, entendeu que não.

    Interior do edifício-sede da Impresa, em Paço de Arcos. / Foto: D.R.

    Será que a Impresa foi beneficiada em 2018 com estes negócios? Claramente que sim. E o Novo Banco, saiu beneficiado? Claramente que não no caso da TIN, onde arrisca perder 3,5 milhões de euros. E nos negócios com o edifício-sede da Impresa? Não sabemos a resposta sem ter acesso a provas que demonstrem o regular pagamento das rendas e, posteriormente, das prestações do empréstimo, sem reestruturações do crédito.

    Quanto a António Ramalho, nem foi beliscado. Em 2018, o gestor viu o seu salário aumentar 16% para 382,4 mil euros. Já o Novo Banco fechou o exercício de 2018 com um prejuízo de 1.412 milhões de euros. No ano anterior, o banco tinha registado perdas colossais de 2,3 mil milhões de euros. Quanto ao Fundo de Resolução, liderado por Luís Máximo dos Santos, encerrou o ano de 2018 com um ‘buraco’ de 6,1 mil milhões de euros nos seus recursos próprios devido às injecções no Novo Banco.

    O que sobra é um cenário em que a Impresa encaixou milhões de euros que vieram directamente dos cofres do Novo Banco, num dos casos, passando pela TIN. Isto quando o banco estava a cobrar ao Estado injecções para cobrir perdas, designadamente com créditos tóxicos.

    O que sobra é a exposição do Novo Banco a um crédito tóxico – à TIN – e a um empréstimo a um grupo que está em situação financeira difícil – a Impresa.

    Por que motivo mais nenhum outro banco ‘privado’ deu a mão a Balsemão em 2018? Na banca, há algo que sabemos: se o negócio for bom, todos os bancos o querem.

    Mas, uma insolvência depois, para o Ministério Público, os negócios com a Impresa eram bons. Pelo menos, para o Novo Banco…

    Pois, segundo a nota do Ministério Público, “da investigação efetuada, concluiu-se, assim, que as operações em causa se enquadraram nas práticas comerciais e financeiras usuais do setor, não evidenciando indícios da concessão de vantagens indevidas pelo Novo Banco ao Grupo Impresa ou da instrumentalização daquele Banco em benefício deste Grupo, com violação de deveres funcionais por parte dos intervenientes”.

    A CMVM tem estado em silêncio sobre a falta de informação sobre a evolução de alguns negócios feitos pela Impresa. Até os detalhes do acordo milionário entre a SIC e Cristina Ferreira foram escondidos dos investidores e do mercado de capitais. / Foto: PÁGINA UM.

    Seja como for, desde 2018, nunca mais se viu uma linha de informação sobre estes dois negócios no site da CMVM e o polícia da Bolsa nunca obrigou a Impresa a actualizar a informação de forma clara e transparente aos seus investidores.

    Para os investidores em acções da Impresa, o cenário tem sido dantesco: as acções do grupo desceram ao mínimo histórico em Abril passado, para 0,085 euros por acção. Entretanto, a cotação recuperou, com ordens de compra com volume considerável, ‘milagrosas’, e ainda de origem desconhecida, que tiraram a cotação do mínimo de sempre, mas ‘estacionou’ na casa dos 0,13 euros. A subida ocorreu depois de ter sido divulgado que a família Soares dos Santos se prepara para investir no grupo supostamente para ajudar a Impresa a reembolsar uma emissão de obrigações que vence em breve. Mas este último dado é incorrecto, pois a Impresa não tem nenhuma emissão a vencer em breve.

    Isto depois de a Impresa ter sido foi forçada a contabilizar, nas suas contas de 2024, uma reavaliação dos seus activos, o que gerou um prejuízo recorde de 66,2 milhões de euros.

    Captura a partir de vídeo da SIC

    Assim perante rumores de novo investidor, a expectativa recai também sobre a entidade financeira que vai aceitar comprar, de novo, o edifício-sede da Impresa, eventualmente em troca de rendas. Sem Ramalho, o Novo Banco deverá ficar de fora deste negócio. Mas a estatal CGD está ‘livre’ para ‘dar a mão’ a Balsemão, o que a acontecer não será bem visto por muitos contribuintes.

    Seja como for, a decisão anunciada pelo Ministério Público servirá como uma espécie de ‘salvo-conduto’ e ‘garantia’ de que a revenda do edifício-sede da Impresa será um ‘bom negócio’. Pelo menos para Balsemão.

  • Cartel dos fogos: Força Aérea já gastou este ano mais de 181 milhões no aluguer de meios aéreos

    Cartel dos fogos: Força Aérea já gastou este ano mais de 181 milhões no aluguer de meios aéreos

    Onde há fumo há fogo. E onde há contratos chorudos ganhos pelas mesmas empresas de sempre, há suspeitas de corrupção e cartelização. No caso da indústria de combate aos incêndios rurais, só o negócio de aluguer de meios aéreos já envolveu, desde o início do ano, 16 contratos de valor global superior a 181 milhões de euros.

    Estes contratos são adjudicados pelo Estado-Maior da Força Aérea e o ‘bolo’ tem sido dividido por meia dúzia de empresas, incluindo a Agro-Montiar, uma subsidiária da empresa espanhola Titan (ex-Avialsa), condenada este ano em Espanha no âmbito do processo do ‘Cartel del Fuego’, como o PÁGINA UM noticiou em primeira mão, em Março passado.

    Foto: D.R.

    Não surpreende assim que a Polícia Judiciária (PJ) tenha hoje executado 28 mandados de busca a domicílios, sedes de empresas (não identificadas) e organismos públicos numa operação policial que decorreu de norte a sul do país. A operação ‘Torre de Controle’, levada a cabo pela “Unidade Nacional de Combate à Corrupção, em inquérito titulado pelo DCIAP”, segundo o comunicado da PJ, já levou à constituição de diversos arguidos, entre “pessoas singulares e coletivas”.

    Segundo a PJ, “em causa estão factos suscetíveis de integrar os crimes corrupção ativa e passiva, burla qualificada, abuso de poder, tráfico de influência, associação criminosa e de fraude fiscal qualificada, através de uma complexa relação, estabelecida pelo menos desde 2022, entre várias sociedades comerciais, sediadas em Portugal, e que têm vindo a controlar a participação nos concursos públicos no âmbito do combate aos incêndios rurais em Portugal, no valor de cerca de 100 milhões de euros”.

    O esquema criminoso envolverá, alegadamente, “concursos públicos [que] incidem na aquisição de serviços de operação, manutenção e gestão da aeronavegabilidade dos meios aéreos próprios do Estado, dedicados exclusivamente ao Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR), com a intenção de que o Estado português fique com carência de meios aéreos e, dessa forma, se sujeite aos subsequentes preços mais elevados destas sociedades comerciais”.

    Foto: D.R.

    Ora, só este ano, num levantamento do PÁGINA UM, os contratos referentes a aluguer de meios aéreos no âmbito do DECIR superam os 181 milhões de euros, valor ao qual há que ser acrescentado o IVA. Foram sete as empresas que beneficiaram destes contratos: Agro-Montiar, Helibravo Aviação, HTA Helicópteros, Gesticopter Operations Unipessoal ligada a familiares do ministro da Presidência, conforme revelou a SIC Notícias , Airworks Helicopters, Avincis Aviation Portugal e Shamrock.

    A empresa que mais facturou este ano com estes contratos foi a Agro-Montiar, subsidiária da Titan, que ganhou mais de 59 milhões de euros através de três contratos obtidos através de concurso público, como o PÁGINA UM noticiou em Março.

    Segue-se a Helibravo, que facturou mais de 47 milhões de euros em quatro contratos ganhos num concurso público, segundo uma análise do PÁGINA UM, que consultou os contratos. A empresa ganhou três lotes daquele concurso, tendo os contratos sido assinados a 4 de Abril.

    Um dos contratos, no montante de 12.860.005,40 euros, diz respeito ao aluguer de cinco helicópteros ligeiros por um período de quatro anos, no âmbito do dispositivo aéreo do DECIR 2025-2028. Um segundo lote, no valor de 13.241.995 euros, abrange o aluguer de mais cinco helicópteros ligeiros pelo mesmo período. Um terceiro lote ganho pela empresa, no montante de 13.292.000 euros, envolve o aluguer de outros cinco helicópteros ligeiros, até 2028.

    Helicóptero da Helibravo em operações de combate a incêndios. (Foto: D.R.)

    A Helibravo ganhou ainda um quarto contrato por concurso público, assinado no passado dia 7 de Maio, no valor de 7.737.201,12 euros para a locação de quatro helicópteros ligeiros no período de 15 de Maio a 30 de Setembro até 2027.

    A terceira empresa que mais facturou este ano com contratos no âmbito do aluguer de meios aéreos para o combate aos fogos é a HTA que já ganhou quatro contratos que superam os 37 milhões de euros.

    Três dos contratos foram obtidos num concurso público, tendo a assinatura dos documentos ocorrido a 13 de Março. O primeiro contrato, para o aluguer de dois helicópteros ligeiros até 2027, custou ao Estado 11.156.959,52 euros. O segundo, no valor de 2.951.546,87 euros, visou o aluguer de um helicóptero ligeiro de 1 de Junho a 31 de Outubro, até 2027. O terceiro contrato, no montante de 9.230.447,18 euros, assinado na mesma data, é relativo à locação de três helicópteros ligeiros até 2027. Esta empresa ganhou ainda um quarto contrato, no dia 2 de Abril, no valor de 13.807.929,20 euros, mas o documento não é público.

    A Gesticopter teve ligações a um irmão e a um cunhado do ministro da Presidência, António Leitão Amaro. / Foto: D.R.

    Outra empresa beneficiada, foi a Gesticopter, que, segundo a SIC Notícias, tem ligações a um irmão e a um cunhado do ministro da Presidência, António Leitão Amaro. Esta empresa facturou 16.375.617 euros num contrato assinado no passado dia 7 de Maio e que envolve a locação de três helicópteros pesados até 2027.

    A Gesticopter foi constituída a 8 de Março de 2024 com um capital social de apenas cinco mil euros, com sede em Macedo de Cavaleiros. A empresa era detida pela Gestifly e tinha três gerentes: Pedro Alexandre Fernandes dos Santos Bento, Nuno Alexandre Pinto Coelho Torres de Faria e Luís Manuel Gil Pires Ferreira.

    Mas, no passado dia 8 de Abril, a totalidade das quotas passou para as mãos da espanhola Helifinance Asset Management, com sede em Madrid, e mudou a sede para Monfortinho, Castelo Branco, segundo o registo consultado pelo PÁGINA UM.

    Outra empresa que não se pode queixar é a espanhola Airworks, com sede em Salamanca, que ganhou este ano dois contratos de aluguer de meios aéreos para combate aos incêndios. O primeiro, datado de 12 de Março, no valor de 5.671.680 euros, é relativo à locação de dois helicópteros ligeiros até 2027. O segundo, no montante de 10.060.864 euros, foi assinado a 2 de Abril, e visa o aluguer de quatro helicópteros ligeiros até 2028.

    Segue-se a Shamrock, com sede em Carnaxide, que facturou 2.988.000 euros num contrato adjudicado no passado dia 7 de Maio relativo ao aluguer de dois aviões ligeiros de reconhecimento até 2027.

    Por fim, o contrato mais recente, assinado no dia 8 de Maio, que foi adjudicado à Avincis Aviation Portugal, com sede em Loures, com um valor de 2.349.937,08 euros. Este contrato visa a locação de um helicóptero ligeiro de 15 de Maio a 15 de Outubro até 2027.

  • Gouveia e Melo acusado de ‘prepotência’ pela Associação de Praças da Marinha

    Gouveia e Melo acusado de ‘prepotência’ pela Associação de Praças da Marinha

    A Associação de Praças acusou hoje Gouveia e Melo de “prepotência” pela forma como conduziu, como Chefe do Estado-Maior da Armada, o caso do navio de patrulha NRP Mondego, aplicando sanções que foram consideradas ilegais e inconstitucionais. Num comunicado em reacção à recente sentença do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que anulou as sanções, a Associação afirma que “ficou provado que o NRP Mondego não tinha as condições mínimas para navegar.

    No comunicado com o título ‘Os 13 Bravos do NRP Mondego“, a Associação de Praças deixa palavras duras contra a cúpula da Marinha, destacando mesmo, em sublinhado, o nome completo do actual candidato a Presidente da República, “Almirante Henrique Eduardo Passaláqua de Gouveia e Melo”.

    Gouveia e Melo viu o Supremo Tribunal Administrativo arrasar a sua decisão de sancionar os militares do NRP Mondego. / Foto: D.R.

    “Temos o direito de ver nesta decisão [do STA] aquilo que sempre defendemos: não é pela prepotência, pelo desrespeito pelas regras nem pelo “quero, posso e mando”, que a disciplina se impõe”, refere a Associação no comunicado.

    Adianta ainda que “aqueles 13 Homens, defenderam aquilo que tinham o direito de defender, ao contrário de quem se imiscuiu na sua posição e no seu poder, tentando a todo o custo passar para cima de outros a sua responsabilidade como chefe máximo da Marinha”.

    E recorda que, já em 2023, a Associação de Praças tinha defendido “os 13 Bravos, a Marinha e Portugal que está acima de tudo e de todos. Sem exceção!”. E numa referência ao almirante agora na reserva que confirmou esta semana ser candidato à Presidência da República, o comunicado é duro ao apontar o dedo ao que, “com mais poder, apenas tentaram defender algo que nestes tempos já está totalmente ultrapassado: a prepotência e a obediência cega”, acrescentando que “obedecer não é ser subserviente”. E lançam mais um ‘torpedo’ a Gouveia e Melo: “o que se deve exigir a um chefe militar é a defesa dos seus subordinados”, sendo esse “o dever de tutela como conforme está inscrito no Regulamento de Disciplina Militar!”.

    O navio patrulha NRP Mondego. / Foto: D.R./Marinha

    A Associação conclui o comunicado afirmando que “se houve, em todo este processo, quem defendeu acerrimamente a disciplina, o dever de preservar o meio naval e a integridade física dos Homens e Mulheres embarcados naquele meio naval, foram aqueles 13 Bravos!”. E diz que “não podemos aceitar, muito menos corroborar, que quaisquer interesses pessoais sejam colocados à frente daquilo que deve ser a defesa de Portugal e da Instituição Militar!”.

    Recorde-se que o caso teve início a 11 de Março de 2023, quando quatro sargentos e nove praças do NRP Mondego recusaram embarcar numa missão de vigilância a um navio russo ao largo do Porto Santo, alegando falta de segurança da embarcação. Dezasseis dias depois, nova missão falhou.

    Os militares foram sancionados e Gouveia e Melo ainda lhes deu uma reprimenda pública, com a comunicação social presente. Mais tarde, o antigo Chefe do Estado-Maior da Armada indeferiu o recurso hierárquico apresentado pelos militares, confirmando os castigos impostos pelo Comandante Naval.

    Foto: D.R. / Marinha

    No acórdão, o Supremo Tribunal Administrativo foi demolidor para a cúpula da Marinha e anulou todos os processos disciplinares que castigaram 11 militares do navio de patrulha NRP Mondego.

    Os juízes consideram inválido o processo desde a sua origem, apontando múltiplas ilegalidades e violações de direitos fundamentais, incluindo o direito à defesa, à produção de prova e à imparcialidade do processo.

    Também consideraram que o Tribunal Central Administrativo do Sul agiu de forma correcta quando declarou nulo um despacho de 1 de Julho de 2024 de Gouveia e Melo, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado pelos militares.

  • Amadeu Guerra gasta 613 mil euros em nove carros

    Amadeu Guerra gasta 613 mil euros em nove carros

    A Justiça em Portugal nem sempre é célere. Mas se, em muitos casos, a lentidão da Procuradoria-Geral da República (PGR) tem sido criticada, a partir de agora os magistrados do Palácio dos Duques de Palmela, junto ao Largo do Rato, não se podem sequer queixar da falta de bons meios de locomoção: a PGR acaba de contratar, em regime de aluguer operacional (AOV), nove viaturas ‘novinhas em folha’ para acelerar em serviço. Quantia gasta: 613.455 euros, uma média de 68 mil euros por veículo.

    A despesa foi efectuada através de um concurso público, distribuído por três lotes, todos ganhos pela mesma empresa de Santarém, a PPL Car, sendo que os contratos foram assinados anteontem, com uma duração de seis anos. No final desse prazo, os carros serão devolvidos à PPL Car, que os pode revender no mercado de veículos usados.

    Um dos lotes destinou-se à contratação de duas viaturas topo de gama que, por exigência da PGR, têm de estar equipadas com estofos em pele de cor preta, vidros traseiros escurecidos, faróis LED, assistente de estacionamento e um ‘pack premium plus’, segundo o caderno de encargos do procedimento.

    gray vehicle rim with tire
    / Foto:D.R.

    Assim, neste caso, a PGR contratou duas viaturas novas híbridas ‘plug in’, da categoria ‘Superior I’, por 176.234 euros (IVA incluído), resultando num preço médio por viatura de 88.117 euros. Nas especificações técnicas, além de terem de ter quatro portas, estas duas viaturas têm ainda de ter entre 1.900 e 2.500 centímetros cúbicos de cilindrada e uma carroçaria ‘Sedan’.

    Embora o contrato não explicite a marca, os preços e especificações são compatíveis com o BMW 530e, um modelo de luxo que atinge os 230 quilómetros por hora, ou alguns modelos da gama Mercedes GLC, que se fica pelos 220 quilómetros por hora, bem como o Lexus ES Luxury.

    No segundo lote, a PGR alugou quatro viaturas novas híbridas, de categoria média inferior, pelo preço de 235.569 euros, uma média de quase 59 mil euros por veículo. A carroçaria destas viaturas tem de ser ‘Sedan’ ou ‘Berlina’ com 1.300 a 1.800 centímetros cúbicos de cilindrada. Têm de vir equipadas com faróis LED e câmara traseira, entre outros acessórios.

    Num terceiro lote que foi a concurso público, a PGR contratou três viaturas novas da categoria ‘médio superior III’ por 201.651 euros, com o preço médio a rondar os 67mil euros. A cilindrada destas viaturas de quatro ou cinco portas deve situar-se entre os 1.350 e os 2.500 centímetros cúbicos e vir apetrechadas com faróis LED, câmara traseira, sistema de navegação e ar-condicionado em três zonas.

    O Lexus ES é um dos modelos que cumpre os requisitos exigidos pela PGR para duas das viaturas agora contratadas pelo preço médio de 88.117 euros. / Foto: D.R./Lexus

    Neste tipo de aluguer de viaturas, o fornecedor tem de prestar “serviços obrigatórios associados ao fornecimento dos veículos”, designadamente, os serviços de gestão de encomenda, de entrega e de documentação, bem como a gestão de manutenção preventiva e correctiva. Tem também de fazer a gestão de pneus, de veículos de substituição, de seguro automóvel, de sinistros, e do Imposto Único Automóvel durante o período de vigência do contrato de ‘renting’, que neste caso é de 72 meses.

    Segundo os requisitos da PGR, “os veículos são fornecidos em estado novo com o máximo de 100 quilómetros registados, com
    exceção dos casos em que a distância entre o concessionário e o local de entrega seja superior, não podendo ultrapassar os 400 quilómetros”.

    As viaturas “deverão ser entregues nas instalações da PGR, sitas em Lisboa na Rua da Escola Politécnica, 140, no prazo máximo” de 60 dias, no caso do lote 1, e 90 dias, nos dois restantes lotes contratados.

    Amadeu Guerra tomou posse como Procurador-Geral da República a 12 de Outubro de 2024. / Foto: D.R./PGR

    Para a PPL Car, que venceu os três concursos públicos lançados pela PGR, este foi o seu maior negócio com entidades públicas. A empresa tem vindo a acelerar a sua presença no sector público nos últimos dois anos.

    Até 2024, a empresa de Santarém ganhava poucos contratos junto de entidades públicas. O primeiro foi em 2015, seguiu-se outro em 2016 e outro em 2017. Em 2020, ganhou dois e em 2022 venceu um. Até então, todos os contratos foram obtidos por ajuste directo. Em 2023, a empresa obteve dois por consulta prévia.

    A maré mudou em 2024, quando a PPL Car ganhou seis contratos públicos dos quais dois através de ajuste directo, um por consulta prévia, um por concurso e dois através do procedimento ‘Setores especiais – isenção parte II’, junto da AS – Empresa das Águas de Santarém.

    Procuradoria-Geral da República. / Foto: D.R./PGR

    Este ano, em cinco meses, a PPL Car já venceu nove procedimentos por concurso público e um por ajuste directo. Ou seja, dos 26 contratos públicos que a empresa tem registados no Portal Base numa década, 16 foram obtidos apenas nos últimos dois anos.

    Os outros contratos públicos que a PPL Car conseguiu este ano foram com a EDM – Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S. A., a Entidade Nacional para o Setor Energético, a ADENE – Agência para a Energia, os municípios de Vagos e de Catanhede, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, e a Metro do Porto, com a qual a empresa conseguiu fechar três contratos.

    No caso dos três lotes colocados pela PGR a concurso público, ficaram pelo caminho as outras duas concorrentes, a Leaseplan Portugal e a Locarent-Companhia Portuguesa de Aluguer de Viaturas, que perderam a corrida contra a empresa de Santarém. Até porque a PPL Car apresentou um valor global abaixo do máximo previsto no caderno de encargos dos três lotes que previa uma despesa de 639 mil euros.

    Ainda assim, os contribuintes vão ficar com um encargo mensal de 8.520 euros para suportar o aluguer destas nove viaturas agora contratadas pela PGR.

  • Nininho Vaz Maia recebe 1,5 milhões em contratos públicos desde 2023

    Nininho Vaz Maia recebe 1,5 milhões em contratos públicos desde 2023

    A crescente popularidade do cantor Nininho Vaz Maia, que foi esta semana constituído arguido no âmbito de uma operação de combate ao tráfico de droga, tem causado uma ‘corrida’ das autarquias à sua contratação. Apenas desde Janeiro de 2023, em 41 contratos públicos, já facturou perto de 1,5 milhões de euros. Este ano, em pouco mais de quatro meses, a fasquia aproxima-se do meio milhão de euros..

    O contrato mais recente, adjudicado como habitualmente por ajuste directo, foi celebrado com o município de Anadia, no distrito de Aveiro, na passada terça-feira, no mesmo dia em que o popular cantor foi alvo de buscas e acabou constituído arguido no âmbito de uma operação da Polícia Judiciária denominada SKYS4ALL.

    Nininho Vaz Maia / Foto:D.R.

    Num comunicado citado pela imprensa, o artista alegou estar inocente: “importa deixar absolutamente claro que o Nininho está inocente e que confiamos plenamente na Justiça. Estamos certos de que tudo será esclarecido com brevidade […]”.

    Para já, a acusação criminal não parece ter arrefecido a requisição do cantor, já que se mantém no cartaz para encerrar hoje o festival da Queima das Fitas do Porto 2025, organizado pela Federação Académica do Porto.

    Resta saber se o cantor vai continuar a ser tão solicitado por autarquias como tem sido nos últimos dois anos. Segundo um levantamento feito pelo PÁGINA UM, constam na plataforma de contratos públicos, o Portal Base, um total de 41 contratos feitos por entidades públicas para a contratação de Nininho Vaz Maia. O primeiro foi assinado em Janeiro de 2023, com o município de Vila Nova de Foz Côa, no valor de 26 mil euros. e o mais recente na passada terça-feira com o município de Anadia.

    Neste recente contrato com autarquia da Bairrada, o cantor receberá 40.590 euros por um concerto de 90 minutos na ‘Feira da Vinha e do Vinho’, agendado para o dia 18 de Junho. O contrato foi efectuado com a Gigs on Mars, detida em partes iguais por Pedro Pontes, agente do cantor, e pela empresa Lemon Ibéria, controlada por António Vilas Boas, fundador dos Pólo Norte.

    De entre os 41 contratos encontrados desde 2023 – antes desse ano, não existem outros -, 40 foram feitos através de ajuste directo e apenas um pelo procedimento de contratação excluída, o que, na prática significa o mesmo: o cantor foi ‘escolhido a dedo’.

    Nininho Vaz Maia afirmou estar inocente, num comunicado enviado à imprensa. / Foto: D.R.

    Ao todo, foram 36 autarquias e quatro entidades municipais que contrataram o popular cantor nascido numa família cigana, que se tornou numa das coqueluches do panorama musical nacional.

    O montante dos contratos oscila entre os 22.140 euros e os 217.132 euros, sendo que neste último caso se tratou de um espectáculo que abrangeu ainda performances de Profjam e a Festa M80 num contrato com a autarquia de Vila do Conde.

    Em média, excluindo o montante mais elevado dos contratos, o valor pago por autarquias para contratar o cantor rondou os 33.320 euros, com IVA incluído, sendo evidente que os cachets têm aumentado. Nos contratos estabelecidos este ano (Abrantes, Góis, Olhão, Estremoz, Vila Real, Alter do Chão, Marinha Grande e Azambuja), que atingem os 4.711 euros, o valor médio é já de cerca de 47 mil euros por concerto.

    A maioria dos contratos foi adjudicada a Nininho Vaz Maio através da empresa Gigs on Mars, Lda, mas também há contratos através de outras entidades, sobretudo quando outros artistas estão envolvidos, designadamente com as empresas Music Mov, Miguel Castro Oliveira Unipessoal, Lda – IAM Event Production & Brand Consultancy e José Manuel Rodrigues Caetano, Unipessoal, Lda.

    Se, para já, não há sinais de estar a abrandar a procura de serviços do artista, as críticas já fazem ouvir sobre a sua contratação e presença em espectáculos, designadamente no encerramento da Queima das Fitas do Porto, apesar de o cantor não ter sido ainda condenado na Justiça.

    Saliente-se, aliás, que como fenómeno musical, Nininho Vaz Maia tem feito também um percurso fora do circuito dos contratos públicos, sendo exemplo disso a Queima das Fitas (esteve no ano passado em Coimbra) e sobretudo espectáculos comerciais, com entradas pagas. Por exemplo, há menos de dois meses esgotou duas noites no Meo Arena, em Lisboa.

    De resto, o facto de o cantor ter nascido numa família pertencente a uma minoria pode mesmo pesar a seu favor e mitigar o facto de ser arguido num processo de tráfico de droga, podendo evitar que Nininho Vaz Maia perca o seu ‘allure‘ numa época em que a etnia ou a origem e nacionalidade são factores usados politicamente, tanto por partidos da esquerda, como da direita.

    De facto, Nininho tornou-se num dos símbolos de homenagem à cultura cigana e de defesa das minorias, perante o crescimento de discursos hostis à sua comunidade e também a imigrantes, numa altura em que em Portugal se assiste a um cada vez maior aprofundamento da desigualdade económica e social.

    Foto: D.R.

    Em ano de eleições legislativas e autárquicas, mesmo estando acusado, Nininho Vaz Maia pode encontrar alguma ‘imunidade’ e continuar a ser requisitado por autarquias, graças à sua origem familiar, e mediante o aproveitamento ideológico das minorias — de forma positiva ou negativa — pelos partidos tanto de esquerda como de direita.

    Assim, apesar de estar acusado, talvez o popular artista consiga continuar a facturar com contratos com entidades públicas, lucrando com a crescente polarização política em torno das minorias.

  • EDP terá perdido 1,5 milhões de euros com ‘apagão’

    EDP terá perdido 1,5 milhões de euros com ‘apagão’

    O ‘apagão’ eléctrico que afectou a Península Ibérica no passado dia 28 de Abril deixou também um ‘vazio’ de pelo menos 1,5 milhões de euros nas receitas da EDP devido a consumos de energia que não ocorreram. A estes prejuízos há ainda que juntar os custos que a empresa teve de suportar com a reposição do serviço na rede.

    De acordo com cálculos feitos pelo PÁGINA UM, com base nos indicadores económicos do último relatório e contas da EDP, só na perda de receita devido à ausência de consumos de energia durante as quase nove horas que durou o ‘blackout‘ a empresa não viu entrar nos seus cofres cerca de 1,4 milhões de euros de lucro bruto que poderia ter recebido se não tivesse existido o ‘apagão’.

    Sede da EDP, em Lisboa / Foto:D.R.

    Esta estimativa é conservadora, já que o período em que ocorreu o ‘blackout‘, entre as 11h33 (hora de Lisboa) e as cerca da 20h00, coincidiu com as horas em que o consumo de electricidade, por força da actividade de empresas, comércio e indústria. Por outro lado, a EDP não terá tido alguns dos custos inerentes ao fornecimento de energia, embora, por outro lado, terá mantido, em princípios, as receitas interentes à disponibilização de potência aos seus clientes.

    Segundo o relatório e contas da EDP de 2024, a empresa recebeu 1.136 milhões de euros de lucro bruto com o negócio de venda de electricidade em Portugal, com o valor a corresponder às receitas obtidas descontado o montante dos custos com a operação. Nos seus negócios em Espanha, o lucro bruto da EDP em Espanha no sector eléctrico foi de 449 milhões de euros.

    Além disso, segundo estimativas do PÁGINA UM, consultando especialistas no sector, a empresa terá incorrido em custos com a reposição de electricidade após o ‘apagão’, no chamado ‘black start’ que ascenderão a 200 mil euros.

    Miguel Stilwell d’Andrade, presidente-executivo da EDP. / Foto: D.R.

    O PÁGINA UM colocou questões por e-mail ao director de comunicação do grupo EDP sobre estas matérias, mas até à publicação deste artigo ainda não recebeu respostas.

    Recorde-se que Portugal e Espanha viveram no dia 28 de Abril um ‘apagão’ eléctrico histórico, ainda com origem desconhecida, que deixou sem luz a Península Ibérica desde as 11h33, hora de Lisboa, até ao final da tarde, tendo o serviço começado a ser reposto gradualmente nos dois países.

    Em Portugal, as redes de comunicações ficaram sem serviço e as redes de transportes foram afectadas, designadamente a rede ferroviários e o metro. As disrupções também atingiram os aeroportos, indústrias, comércio e serviços. O único meio de comunicação e informação que ficou disponível foi a rádio.

    photo of truss towers

    Segundo dados divulgados hoje pelo Banco de Portugal, a actividade económica sofreu uma quebra de quase 15% devido ao ‘apagão’, de acordo com um indicador diário de actividade económica referente à semana terminada a 4 de Maio.

    Contudo, este indicador não permite aferir o verdadeiro impacto económico, porque apenas “cobre diversas dimensões correlacionadas” com a atividade económica em Portugal, entre as quais “tráfego rodoviário de veículos comerciais pesados nas autoestradas, consumo de eletricidade e de gás natural, carga e correio desembarcados nos aeroportos nacionais e compras efetuadas com cartões em Portugal por residentes e não residentes”.

    Assim, não reflecte a realidade do prejuízo económico, tanto macroeconómico como microeconómico, e não só, causado a nível global pela falha na disponibilização de electricidade em todo o país.

    Como o PÁGINA UM noticiou em primeira mão, o ‘apagão’ em Portugal sucedeu num contexto de dependência artificial das importações de Espanha. No momento em que ocorreu o ‘blackout‘ no país vizinho, Portugal estava a importar cerca de 30% do seu consumo, pelo que a quebra abrupta de produção em Espanha ‘contagiou’ o sistema eléctrico nacional. Também o PÁGINA UM foi o primeiro a informar e a explicar que a reposição da rede eléctrica — processo designado por black start — poderia demorar várias horas

    Indicador diário de actividade económica. / Fonte: Banco de Portugal

    A reposição de electricidade demorou longas horas, mais do que sucedeu em Espanha, provando que a REN-Redes Energéticas e a EDP foram apanhadas desprevenidas. Aliás, para activar a barragem de Castelo de Bode, a EDP teve de levar um gerador que não se encontrava no local, segundo noticiou o jornal Expresso.

    De resto, segundo apurou o PÁGINA UM, a EDP chegou mesmo a contactar antigos funcionários da empresa, já reformados, para pedir auxílio e tirar dúvidas em relação aos procedimentos necessários para voltar a repor o serviço. A EDP também não comentou esta informação.

  • “As pessoas estão cansadas de ataques e casos. Querem soluções, ideias”

    “As pessoas estão cansadas de ataques e casos. Querem soluções, ideias”

    Filipe Sousa, 60 anos, foi co-fundador do partido madeirense Juntos Pelo Povo (JPP), que é hoje a segunda força política na Madeira e o líder da oposição, tendo ultrapassado o Partido Socialista.

    Nestas eleições legislativas antecipadas, Filipe Sousa, cabeça-de-lista do JPP, está bem colocado para se tornar num dos novos deputados eleitos para o parlamento, pelo círculo da região Autónoma da Madeira.

    A acontecer, será uma estreia do JPP na Assembleia da República e um marco de relevo. Trata-se de um partido regional, o único partido com origem na Madeira, fundado em 2015 por dois irmãos — Filipe e Élvio — a partir de um movimento de cariz cívico. De resto, Filipe Sousa opunha-se à criação de um partido político, mas essa era a condição a preencher se o movimento quisesse reforçar a sua posição no panorama político na Madeira.

    Isto porque o também presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz trazia na bagagem uma experiência na política que o desiludiu, pois, antes da criação do JPP, tinha sido deputado eleito na Assembleia Regional da Região Autónoma da Madeira, durante seis anos, pelo PS e foi membro deste partido até 2007.

    Filipe Sousa na redacção do PÁGINA UM, em Lisboa. / Foto: PÁGINA UM

    O madeirense, natural de Gaula — motivo pelo qual os dois irmãos são chamados de ‘gauleses’, como referência ao Asterix — foi presidente da Junta de Freguesia de Gaula entre 1997 e 2007. Foi vereador da Câmara Municipal de Santa Cruz, tendo sido eleito presidente do mesmo município, em 2013, com maioria absoluta, quando se apresentou como cabeça-de-lista pelo movimento que deu origem ao JPP. Em 2017, renovou o mandato à frente da autarquia, mas pelo JPP, feito que repetiu em 2021.

    Nesta entrevista, realizada a 3 de Abril na sede do PÁGINA UM, em Lisboa, Filipe Sousa criticou os principais partidos históricos na Madeira de “elitismo” e de tratarem primeiro dos seus interesses ao invés de encontrarem soluções para os problemas do português comum.

    Filipe Sousa também aproveitou para comentar a polémica em torno da investigação judicial, anunciada em 2019, por causa de contratos feitos por ajuste directo pelo município de Santa Cruz com a sociedade de advogados Santos Pereira & Associados (SPA), liderada por Miguel dos Santos Pereira (colaborador do PÁGINA UM). O caso acabou por levar a uma auditoria do Tribunal de Contas que enviou para a autarquia liderada por Filipe Santos um conjunto de recomendações para colmatar os atropelos cometidos ao Código dos Contratos Públicos.

    “Nós privilegiamos o concurso público […] salvo excepções. Não podia lançar um concurso público para contratar advogados e ainda bem que o legislador prevê o ajuste directo, até um determinado valor, ou a consulta prévia. Optámos pela consulta prévia com a SPA, e ainda bem, até hoje”, disse o autarca.

    O que é certo é que o JPP é hoje o principal partido da oposição na Madeira. “Mas não é para ter mordomias”, garantiu, criticando o facto de haver “banquetes enquanto há pessoas [a viver] na miséria”. “Nós fugimos a tudo isso”, frisou.

    Sobre as expectativas em relação às legislativas, o candidato do JPP disse que espera ser eleito e ainda que “quem ganhar não terá maioria, irá sempre precisar de fazer alguma coligação”.

    Élvio Sousa na tomada de posse na Assembleia Legislativa da Madeira. Out 2023 (Foto: D.R./JPP)

    Questionado, disse que o JPP estará disponível para negociar. “Tudo o que for no interesse da Madeira e no interesse nacional, eu acho que sim [estaremos disponíveis para negociar]”. E defendeu que “na politica, temos que olhar para o interesse colectivo”.

    Nesta entrevista, deixou elogios ao antigo primeiro-ministro socialista António Costa, considerando que “foi um bom governante”. Também acredita que o partido Livre vai crescer nestas eleições.

    Sobre se a possível estreia do JPP na Assembleia da República poderá reverter a crescente desilusão da população face à classe política, reflectida na alta abstenção, afirmou que “uma andorinha não faz a Primavera”. “Mas que seja uma. Elas vão crescer, com certeza”.

  • ‘A chave da descarbonização não é na Europa que se decide; é nos outros países mais poluidores’

    ‘A chave da descarbonização não é na Europa que se decide; é nos outros países mais poluidores’



    A propósito do ‘apagão’ eléctrico que Portugal sofreu no dia 28 de Abril de 2025, o PÁGINA UM republica esta entrevista a Paulo Carmona, director-geral da Energia e Geologia, que foi publicada originalmente em 19 de Fevereiro. O gestor foi nomeado para o cargo em regime de substituição em Agosto do ano passado. Poderá ser substituído em breve, na sequência de um novo concurso para a escolha de um novo director-geral, que terminou no dia 14 de Abril. Paulo Carmona tem liderado a DGEG numa altura em que Portugal, como outros países, de deparam com o ‘trilema energético’, tendo de gerir a transição da descarbonização, a par de garantir a soberania, independência e segurança energética, e, ao mesmo tempo, levar a cabo essas duas metas sem sobrecarregar os consumidores. Até porque “Portugal é um país pobre” e há que pensar nos consumidores. Muitos vivem em situação de pobreza energética, sem aquecimento.

    À beira dos 60 anos, e perto da reforma, Paulo Carmona recebeu o convite inesperado para ser director-geral de Energia e Geologia. Foi nomeado para o cargo no final de Agosto do ano passado.

    A vista do seu gabinete, em Entrecampos, é um espelho do cenário que se vive no sector energético, de transição e transformação. Vê-se o ‘velhinho’ Edifício Marconi que tem, em frente, em construção, o novo edifício da Fidelidade; no quarteirão ao lado, onde estava parte da Feira Popular, está o terreno vazio que será preenchido com um novo edifício do Banco de Portugal.

    O telefone tocou diversas vezes durante a entrevista. Deu para sentir a azáfama de quem tem muitas solicitações.

    Logo no início da entrevista ao PÁGINA UM, no início de Janeiro, Paulo Carmona confessou que aceitou o convite para este cargo por querer “retribuir” ao país e à sociedade o que de bom recebeu na vida. “Como tive sorte, como fui feliz nesse aspecto, em várias frentes — pessoais, familiares, profissionais — só tenho de estar agradecido e de devolver à sociedade o que fez por mim”. E acrescentou: “é preciso levantarmo-nos do sofá, da zona de conforto, e ir lutar por aquilo que acreditamos”. “É um país fantástico. Pelo menos, digo aos meus filhos: estou a fazer algo pelo vosso futuro”. Isto, apesar de dois dos seus três filhos residirem actualmente no estrangeiro.

    Paulo Carmona no seu gabinete na sede da Direcção-Geral de Energia, em Lisboa. / Foto: PÁGINA UM

    Mas o ter aceite o convite faz parte da postura que adoptou na vida, de se render perante as oportunidades. Foi também, assim, que antes de chegar à liderança da DGEG, aceitou ser coordenador na Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projetos de Energias Renováveis 2030. “Nada na minha vida foi planeado. A minha vida é uma sucessão de acasos”, disse.

    Antigo dirigente da Iniciativa Liberal, António Carmona, de 59 anos, é licenciado em gestão, administração e gestão de empresas pela Universidade Católica e concluiu ainda programas avançados na Kellogg School of Management e na AESE Business School.

    Trabalhou como gestor e consultor, e, entre os vários cargos que desempenhou, foi presidente do Fórum dos Administradores e Gestores de Empresas. Na área de energia, foi ‘chairman’ na National Oil Reserves Agency Association e presidiu à Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis. Mais recentemente, também fundou a Associação Portuguesa dos Contribuintes, que teve de ‘por de parte’ para de dedicar às suas novas funções. Teve também de abdicar de cargos como administração não executivo em quatro empresas nacionais e ao cargo de vice-presidente da Associação Empresarial de Portugal, dona do Centro de Congressos de Lisboa.

    Apesar de lamentar ter de deixar os diversos cargos que ocupava em empresas e organizações, pensa que valeu a pena. “Foi por uma boa causa, espero eu”, disse. “As coisas que me acontecem, acontecem sempre por bem, pela positiva”. Como sou uma pessoa com alguma sorte, se vim para aqui é porque os deuses, Deus, a mística (o quis)” , disse.

    Foto: PÁGINA UM

    Na DGEG, antecipa muito trabalho e a sua prioridade é “organização”. “Não funciona mal, pode funcionar melhor e pode ir no caminho da excelência que é isso que estamos a fazer; a tentar transformar, ao nível de pessoas, ao nível da formação, digitalização, com algum apoio do PRR-Plano de Recuperação e Resiliência, mas sobretudo com organização”, afirmou.

    Paulo Carmona garantiu que, para já, não está na mesa a criação de um super-organismo que concentre as várias entidades do sector da energia e da geologia em Portugal. “Estava no programa eleitoral” e, quando Paulo Carmona foi nomeado, “falou-se nisso”, até porque foi gestor. “Mas, para já não está nada, não existe nada, não fui contactado para nada; esse projecto – não digo que está parado – mas não existe, nesta altura, esse conceito de fusão”, asseverou. “Acredito que, mais tarde ou mais cedo possa acontecer”. Mas há muitos outros temas mais “urgentes e prioritários”, como a organização da DGEG.

    Lidera a DGEG numa altura em que Portugal, como outros países, de deparam com o ‘trilema energético’, tendo de gerir a transição da descarbonização, a par de garantir a soberania, independência e segurança energética, e, ao mesmo tempo, levar a cabo essas duas metas sem sobrecarregar os consumidores. Até porque “Portugal é um país pobre” e há que pensar nos consumidores. Muitos vivem em situação de pobreza energética, sem aquecimento.

    Foto: PÁGINA UM

    Por isso, defende a posição do actual Governo que está “entusiasmado” com o Plano Nacional de Energia e Clima 2030, mas não está “excitado”, como o anterior governo de António Costa. “Estar entusiasmado não é estar excitado ao ponto de ficar cego”. disse.

    Nesta entrevista, falou também sobre o primeiro leilão de energia eólica offshore do país e sobre a meta de Portugal duplicar a electricidade renovável até 2030, pelo que a DGEG terá de acelerar o licenciamento. E lembrou que “grande parte da nossa política energética é decidida em Bruxelas”.

    Mas garantiu: “em termos de políticas energéticas, vamos construir um futuro que será melhor para os portugueses, mas com mais bom-senso, mais ligado à terra.”

    Para Paulo Carmona, prosseguir com a descarbonização da economia portuguesa e europeia só faz sentido se a política for acompanhada pelos países que são grandes poluidores, como a China e a Índia. Lembrou que “somos responsáveis por 0,12% das emissões a nível mundial”. Assim, “estamos na linha da frente dos países com mais redução de emissões nos últimos anos”. Também “somos um país com poucas emissões per capita, dentro da Europa, que, por sua vez, no mundo é das das zonas com menores emissões per capita“.

    Contudo, defendeu que tem de haver uma maior solidariedade por parte dos grandes poluidores — a China, a Índia, alguns países em África — e que dominam o mercado de matérias-primas. “Temos de nos preocupar mais com o tema da solidariedade mundial porque até poderíamos, eventualmente, descarbonizar tudo em Portugal; seria difícil, com custos […] mas conta com 0,12% das emissões mundiais”, lembrou. “Basta a China abrir uma daquelas mega fábricas de produção de electricidade à base de carvão, lá vão todos os esforços de Portugal em 2 ou 4 anos”, salientou.

    Foto: PÁGINA UM

    Disse ainda que os manifestantes a favor da descarbonização, “em vez de andar a fazer manifestações ou andarem a pinchar as coisas, deviam fazer manifestações em frente à embaixada dos outros países que poluem mais”.

    “O planeta está a ser salvo, aqui na Europa. É onde estão a ser feitos maiores esforços no caminho da transição energética e descarbonização. Não podemos ficar sentados e quietos, não é isso. A chave da descarbornização e transição energética não é na Europa que se decide; é nos outros países mais poluidores, e que nós temos da nossa parte, ou ajudá-los, ou fazer pressão para que deixem de ser poluidores”. No caso de Portugal, “se reduzirmos tudo, 0,12%, o planeta nem nota”.