Autor: Elisabete Tavares e Pedro Almeida Vieira

  • Novo Banco, Impresa & Trust in News: o triângulo dos negócios de media que ‘assaltaram’ um Estado conivente

    Novo Banco, Impresa & Trust in News: o triângulo dos negócios de media que ‘assaltaram’ um Estado conivente


    Os amigos são para as ocasiões. Mas, na alta roda da imprensa nacional – ou melhor, em certos grupos de media –, haja, para além de amigos, um Estado amigo, ou mais prosaicamente, um Governo amigo.

    A história começa em 2017, quando um dos mais relevantes grupo de media em Portugal, a Impresa, fundado pelo antigo primeiro-ministro Pinto Balsemão, estava em grandes sarilhos financeiros. Longe estavam os momentos áureos da colocação em bolsa desta empresa de media – detentora do canal televisivo SIC e do semanário Expresso, e de mais de uma dezena de outras publicações.

    Em Junho de 2000, como líder incontestada no sector da comunicação social, Pinto Balsemão conseguira, com sucesso, uma oferta pública de venda (OPV) por um preço por acção a rondar os 5,6 euros (o valor de abertura em bolsa, ainda em escudos), encaixando uma verdadeira fortuna. Após essa operação financeira, e mesmo com uma posição minoritária de cerca de 30%, a família Balsemão manteve o domínio do grupo de media, e também os principais cargos (e salários) do Conselho de Administração. Mas, pouco tempo depois, o ‘sonho’ dos investidores foi colapsando. A Impresa nunca concedeu qualquer dividendo, e foi-se endividando. Sinal disso, em 2017, a cotação chegou abaixo dos 20 cêntimos, ou seja, cerca de 2% da OPV.

    Ainda chegaram a existir negociações com a Globo, mas como Balsemão não desejava ceder o controlo da Impresa, o grupo brasileiro recuou. As dificuldades de liquidez eram, porém, sufocantes. Para piorar, o banco que sempre apoiara a Impresa, o BPI, fora comprado no início de 2017 pelo catalão Caixa Bank, que terá fechado a ‘torneira do financiamento”, tanto mais que se estava então em plena crise financeira do sector bancário. O passo seguinte foi optar por uma emissão de obrigações para encaixar urgentemente 35 milhões de euros, junto de investidores institucionais. A oferta de subscrição decorreu entre 3 e 14 de Julho desse ano, mas houve um desinteresse absoluto, e a Impresa teve de desistir desta opção.

    O ano de 2017 viria a ser um annus horribilis para a família Balsemão, depois lucros de 4,0 milhões de euros em 2015 e de quase 2,7 milhões no ano seguinte: teve de reconhecer 23,2 milhões de euros em imparidades do goodwill (um activo associado ao valor dos órgãos de comunicação social). Resultado imediato: os prejuízos desse ano ascenderam aos 21,6 milhões de euros. Mesmo com a dívida em fase descendente, certo é que a Impresa quase estava então a trabalhar para os bancos: cerca de um terço das receitas serviam então para pagar juros.

    E é aqui que entra a Trust in News. Na verdade, o reconhecimento das imparidades nas contas de 2017 no valor de 23,2 milhões de euros resultou, de forma paradoxal para um leigo, de uma receita, ou seja, da venda de um portfolio de revistas – onde a Visão era o título mais sonante – que se viria a concretizar nos primeiros dias do ano de 2018. Luís Delgado – um antigo jornalista, ex-administrador da Lusa e comentador de política e que estivera no negócio da restauração (Time Out Market) – criara pouco tempo antes uma empresa unipessoal com um capital social de apenas 10 mil euros. Mas, mesmo sem mais nenhum investidor conhecido, prometia pagar à Impresa um total de 10,2 milhões de euros. Como antes da venda, nos activos da Impresa, as revistas estavam exageradamente valorizadas (33,4 milhões de euros), a venda resultou, no imediato, numa menos-valia de 23,2 milhões de euros, daí o reconhecimento das imparidades, que veio a afectar o resultado líquido, dando um prejuízo histórico nesse ano.

    Antes da venda em 2018 do portfolio das revistas à Trust in News, a Impresa, fundada por Francisco Pinto Balsemão, teve de reconhecer imparidades (prejuízos de 22 milhões de euros). A venda por 10,2 milhões de euros, nunca se concretizou por aqueles montantes e os investidores nunca foram previamente informados nem saber quanto a Impresa afinal recebeu de Luís Delgado

    Concretizado este negócio em 2 de Janeiro de 2018, não se sabe, no entanto, quanto dos 10,2 milhões de euros acabou por sair dos cofres da Trust in News para, efectivamente, saldar esta compra, porque nos sucessivos relatórios e contas da Impresa, a partir de 2018, esses montantes não são referidos. Fica-se apenas a saber de reiteradas renegociações dos planos de pagamento. Isto sem que a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que supervisiona as empresas cotadas em bolsa, se tenha mostrado interessada em esclarecer uma informação relevante para os investidores.

    Em todo o caso, pelos elementos do Portal da Transparência dos Media, deduz-se que alguns milhões de euros terão entrado na Impresa em 2018 via Novo Banco. Isto porque, nos registos respeitantes a 2018, a Trust in News admite que, além de manter então ainda uma dívida de 6,2 milhões de euros à Impresa – ou seja, terá pagado no primeiro ano, quatro milhões de euros – era devedora de 2,7 milhões de euros ao Novo Banco. Ou seja, tudo indica que a operação de compra de Luís Delgado tenha sido financiada pela instituição bancária que estava em processo de intervenção estatal.

    Em 2019, o Novo Banco ainda emprestaria mais dinheiro à Trust in News. No final desse ano, a empresa de Luís Delgado já devia 3,7 milhões de euros ao Novo Banco, ou seja, a dívida para esta instituição financeira aumentara cerca de um milhão de euros. No entanto, globalmente, os financiamentos bancários à Trust in News já ascendiam aos 4,5 milhões de euros.

    Além desses alguns milhões de euros (pelo menos quatro milhões) de encaixe líquido, vindo do Novo Banco, a Impresa também conseguiu aliviar a sua folha salarial, pois só em gastos com pessoal as revistas vendidas a Luís Delgado representavam (e ainda representam) cerca de oito milhões de euros por ano. Acresce, contudo, que a Trust in News ‘herdou’ um portfolio de revistas financeiramente ‘tóxicas’. E desse modo, a empresa de Luís Delgado aumentou, ao longo dos anos, o passivo de forma descontrolada, incluindo dívidas ao Fisco, à Segurança e ao Novo Banco. Mesmo a Impresa acabou já por assumir, nas suas contas de 2023, que a Trust in News não lhe vai pagar 2,5 milhões de euros ainda em dívida.

    Luís Delgado (à esquerda) comprou em 2 de Janeiro de 2018 à Impresa um conjunto de títulos, entre as quais a revista Visão, num negócio oficialmente envolvendo o pagamento de 10,2 milhões de euros a ser concretizado em dois anos e meio.

    E tudo isto se transformou num péssimo negócio para o Estado que, no decurso do Processo Especial de Revitalização (PER) da Trust in News que deu entrada no Tribunal de Sintra em Abril, só tem agora duas alternativas, ambas perdedoras: ou deixa cair a empresa de Luís Delgado para a insolvência, não havendo activos para recuperar as dívidas à Segurança Social e à Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA); ou então aprova o plano de recuperação, assumindo um perdão integral ou parcial. Nos dois casos, o contribuinte sai penalizado.

    No meio deste estranho negócio que está agora, ao fim de apenas seis anos, na antecâmara da insolvência, surpreende, ou não, o silêncio mudo em torno deste negócio entre a Trust in News e a Impresa, envolvendo o Novo Banco. Afinal, não é todos os dias – uma força de expressão para dizer que é absurdo suceder – que uma instituição bancária, ainda mais o Novo Banco que estava sob alçada do Fundo de Resolução, autorizar a concessão de um empréstimo de vários milhões de euros a uma empresa com um único sócio, um capital social de 10 mil euros e para um negócio que não tem sido assim tão rentável nos tempos recentes

    Mais estranho ainda é o silêncio do Governo, tanto do actual como do anterior, que assiste sem reacção visível – a não ser promessas de apoio aos media com o dinheiro dos contribuintes – ao facto de uma empresa com capital social de 10 mil ter aumentado as suas dívidas ao Estado, em apenas cinco anos, acima dos 11,4 milhões de euros. Um autêntico ‘milagre’ inalcançável para a generalidade das empresas.

    Mais estranho é observar que a família Balsemão não parece estar chateada com Luís Delgado por este não lhe ter pagado integralmente, nem pouco mais ou menos, os 10,2 milhões de euros oficialmente acordados em 2018. Afinal, Luís Delgado mantém presença frequente no canal da SIC, pertencente ao Grupo Impresa, como comentador político.

    (Foto: D.R./ Ministério das Finanças)

    Mas a utilidade do Novo Banco para a Impresa não se circunscreveu ao negócio das revistas com a Trust in News. Também em 2018, no mês de Junho, o Novo Banco comprou a sede do Expresso (e agora da SIC) à Impresa, por 24,2 milhões de euros, apesar de a banca estar, naquela altura, a livrar-se de activos imobiliários. Este negócio envolveu a locação financeira pela Impresa por um período de 10 anos.

    Ninguém pode duvidar que a entrada nos negócios da Impresa de um banco a ser capitalizado com empréstimos do Estado só podia ser possível com o aval do Ministério das Finanças e a anuência do Fundo de Resolução. Em resumo, a intervenção do Novo Banco na compra da sede – e na ‘injecção’ de liquidez imediata – mostra ser uma intervenção política que visou dar a mão a Balsemão num momento de aflição

    Ou seja, em um ano, o Novo Banco não apenas pagou 24,2 milhões de euros à Impresa, com um retorno pela locação (que nem, sequer se encontra plasmado nas contas do grupo de media), como financiou parte da compra da ‘carteira’ de revistas por parte de Luís Delgado, que só teve de meter 10 mil euros para ser dono de 17 revistas.

    Acresce que, se a Trust in News está à beira da falência (se o Estado não lhe der a mão), a Impresa não está melhor, apresentando um passivo de 222,6 milhões de euros em 2023, dos quais mais de 128 milhões em empréstimos de curto e longo prazos. E 70% dos seus activos são goodwill referentes aos títulos da imprensa escrita e televisão, que não valerão, tal como se evidenciou na operação das revistas a Luís Delgado, aquilo que surge no balanço.

    Quanto ao terceiro protagonista desta pouco dignificante história de negócios dos media em Portugal, o Novo Banco, prossegue como se nunca tivesse tido pés de barro, graças aos muitos fios de aço feitos de dinheiros públicos, que o foram segurando ao longo dos anos. Até porque as dezenas de milhões que acabaram por beneficiar a Impresa e a Trust in News, em negócios que arriscam a acabar mal, são uma gota de água – uma gota de água num ‘oceano’ de ajudas do Estado.

    Recorde-se que este banco, que ficou supostamente com os activos ‘bons’ do BES, foi vendido em 2017 ao fundo norte-americano Lone Star que ficou com 75% do seu capital social, ficando os restantes 25% no Fundo de Resolução bancário – que está na esfera do Estado. O acordo de venda previa injecções de capital até 3.890 milhões de euros para suprir necessidades de capital devido ao registo de perdas, nomeadamente com créditos ‘maus’ herdados do BES. Assim, mesmo depois da venda, o banco continuou a receber injecções de capital estatais.

    Ao todo, só entre 2014 e 2020, o Novo Banco engoliu mais de 11.200 milhões de euros, sendo que, deste total, mais de metade proveio do Estado. Os contribuintes emprestaram, assim, sem garantias absolutas de retorno, 6.030 milhões de euros ao Novo Banco, dos quais 3.900 milhões na sua constituição e 2.130 milhões de euros entre 2017 e 2020, ao abrigo do acordo de venda. Desde 2020 foram feitas novas injecções de capital ao abrigo deste acordo, o que elevou o valor global para cerca de 12.500 milhões de euros. Dos 3.890 milhões de euros do mecanismo para cobrir perdas herdadas do BES, o Novo Banco consumiu 3.400 milhões de euros. Acresce que o Fundo de Resolução bancário ‘forneceu’ 1.000 milhões ao Novo Banco em 2014 e mais 848 milhões de euros entre 2017 e 2020, num total de 1.848 milhões de euros.

    Mas atenção: o Novo Banco poderá ainda ir buscar mais 180 milhões de euros ao Estado, depois de ter vencido disputas em tribunal arbitral com o Fundo de Resolução, como noticiou o Jornal Económico. Hoje, o Fundo de Resolução anunciou que vai pagar 128 milhões de euros ao Estado para comprar mais 4,14% do capital do Novo Banco, passando a deter 13,54% do capital. Na prática, o Fundo de Resolução compra os direitos de conversão de créditos fiscais, ao abrigo do regime dos impostos diferidos. Este regime tem permitido ao Estado deter uma posição no banco convertendo créditos fiscais em capital. Ou seja, sem esta compra do Fundo de Resolução, os contribuintes portugueses iriam reforçar a sua posição no Novo Banco. Assim, ‘encaixam’ 128 milhões de euros, pagos pelo Fundo de Resolução bancário que está na esfera estatal.

    two Euro banknotes

    O Novo Banco continuará a ser detido em 75% pelo Lone Star, o Fundo de Resolução sobe a sua posição, enquanto o Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro, dilui a sua fatia para 11,46%. Certo é que, no final de 2022, o Fundo de Resolução ainda devia mais de 6.000 milhões de euros ao Estado.

    E é neste cenário de muitos milhões, para aqui e para ali, que se vai esfumando o dinheiro dos contribuintes, e se fazendo negócios dos media, sempre com prejuízos. No final, o Governo Montenegro ainda anuncia mais ajudas para continuar a beneficiar o infractor.


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  • 2023 com mínimos históricos na taxa de mortalidade infantil em meninas

    2023 com mínimos históricos na taxa de mortalidade infantil em meninas

    A taxa de mortalidade infantil em Portugal tem-se mantido em níveis muito baixos nas últimas décadas, mas continuam a bater-se recordes. No ano passado, de acordo com dados revelados ontem pelo Instituto Nacional de Estatística, a taxa para o sexo feminino foi o mais baixo de sempre, aproximando-se da fasquia dos dois óbitos por mil nascimentos. Há cinco décadas, esta taxa era 40 vezes superior e há um século chegava a ser mais de 100 vezes superior. Apesar do bom ‘desempenho’ das meninas, a taxa de mortalidade infantil global em 2023 foi ligeiramente superior à registada em 2021, em plena pandemia. Por regiões, há diferenças: a Península de Setúbal registou a maior taxa, sendo que o Algarve mostrou os melhores números.


    Há um século, um em cada quatro bebés não chegava em Portugal ao final de um ano de vida; a esmagadora maioria finava-se em menos de dois meses. Uma época não assim tão longínqua em que o natural era os pais enterrarem os filhos. Há pouco mais meio século, o Estado Novo deixava uma situação um pouco melhor, mas ainda na cauda da Europa, com cinco em cada 100 recém-nascidos a falecerem antes dos 12 meses. A partir daí, as evoluções tecnológicas, as artes da Medicina e o desenvolvimento económico têm alcançado sucessos dignos, neste caso, de Primeiro Mundo. Ainda mais quando a margem de melhoria é agora bastante estreita face aos valores já muitíssimo baixos.

    Mas 2023 ainda trouxe motivos de festejo. De acordo com dados revelados ontem pelo Instituto Nacional de Estatística, no ano passado conseguiu-se que a mortalidade infantil no sexo feminino – que sempre foi mais baixo do que a registada em meninos – descesse o valor mais baixo de sempre: apenas 2,07 por cada mil crianças nascidas. Este dado representa uma descida ligeira face aos 2,43 em cada mil registados em 2022.

    No caso das crianças do sexo masculino, a taxa de mortalidade infantil situou-se no ano passado em 2,81, um ligeiro agravamento face aos 2,80 registados no ano anterior. O valor mais baixo de mortalidade infantil masculina observou-se em 2020 com 2,49 óbitos em cada mil.

    baby crawling on bed
    (Foto: D.R.)

    Apesar da situação favorável nas meninas, a taxa de mortalidade infantil global fixou-se em 2,45, ligeiramente acima do mínimo histórico de 2,43 observado em 2021. Essa situação deve-se também, em parte, ao facto de nascerem mais rapazes do que raparigas, geralmente numa proporção de 55/45. Ao longo de 2023 registaram-se, em termos absolutos, 215 óbitos de menores de um ano em Portugal. A maioria morreu nos primeiros 28 dias de vida – ou seja, mortalidade neonatal -, sendo que destes, 88 não sobreviveram para lá dos 7 dias após o nascimento. Em geral, são casos de malformações congénitas graves não detectadas durante a gestação ou já numa fase em que se se mostra legalmente impossível a interrupção da gravidez.

    Por regiões, foi na Península de Setúbal que se registou a maior taxa de mortalidade de recém-nascidos, com 3,3 óbitos por mil nascimentos. Seguiu-se a região do Alentejo, com uma taxa de 2,8, e a região Centro e a Madeira, com 2,3. Onde morreram menos recém-nascidos foi na região do Algarve, com uma taxa de 1,1, e do Norte, com 1,5.

    Evolução da taxa de mortalidade infantil em Portugal entre 1970 e 2023 para o sexo masculino (H) e feminino (M) e total (HM) /. Fonte: Instituto Nacional de Estatística (INE)

    Para o pediatra Jorge Amil Dias, que é também o presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, estes dados estatísticos entre anos devem sempre ser analisados sempre com cautela. “Nesta fase, são variações muito pequenas, não se podem tirar conclusões sérias”, afirmou em declarações ao PÁGINA UM.

    O pediatra destaca, por isso, que como em Portugal já se registam habitualmente valores muito baixos de mortalidade infantil, “ se houver qualquer variação” quer para cima quer para baixo, deve-se ser “prudente e não tirar conclusões de imediato” sem fazer uma análise dos casos.

    De acordo com os dados do INE, a taxas de mortalidade infantil e neonatal tem vindo a descer ao longo das décadas de forma sistemática, evidenciando a inexistência de crises sanitárias graves comoas existentes sobretudo até aos anos 50 do século passado, onde as diarreias e as gastroenterites causavam morticínios sobretudo nos meses de Verão e Outono, muito por via também da péssima qualidade de e fata de tratamento de esgotos e lixos. Os programas de vacinação também controlaram surtos de diversas doenças transmissíveis que causavam por anos algumas centenas de mortes até aos anos 70. Para haver um termo de comparação, em 1975, a taxa de mortalidade infantil global foi de cerca de 39 em cada mil, ou seja, quase 4%. No caso das meninas recém-nascidas foi de um pouco menos de 35 e no dos meninos de quase 43.

    Jorge Amil Dias, presidente do Colégio da Especialidade de Pediatria da Ordem dos Médicos.

    O acesso a melhores cuidados de saúde materno-infantil, as melhorias registadas ao nível do saneamento básico no país, cuidados de higiene e alimentação ajudam a explicar a forte redução da mortalidade infantil ao longo das últimas décadas, embora também a possibilidade de interrupção voluntária de gravidez por via de malformações letais contribuam para os valores bastante baixos.

    Em todo o caso, é quase impossível melhorara mais neste importante indicador de Saúde Pública. Nos últimos 10 anos, a taxa global de mortalidade neonatal apenas subiu acima dos 3 em cada mil em dois anos. Em 2016, atingiu os 3,24, o que compara com 2,92 no ano anterior. Depois, em 2018, aumentou para 3,3 de 2,66 um ano antes.


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  • Pandemia: Suicídios bem para cima em Espanha, mas para baixo em Portugal

    Pandemia: Suicídios bem para cima em Espanha, mas para baixo em Portugal

    Dados actualizados no início deste mês pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que se contabilizaram em Portugal menos suicídios em 2020 e 2021, face aos anos anteriores, embora informações do Eurostat mostrem que houve um aumento relevante nos menores de 25 anos. Porém, na Espanha a gestão da pandemia ‘bateu forte’, com um aumento de 28% no total das mortes auto-infligidas no biénio de 2020-2021 quando comparado com os dois anos anteriores à pandemia. Um estudo agora divulgado numa revista científica sobre a realidade espanhola disseca as causas e os grupos de risco, expondo os fortes danos causados por medidas que levaram ao isolamento social. Também uma recente revisão sistemática que analisou 34 estudos científicos recomenda uma análise mais aprofundada aos anos pós-pandemia para se avaliar os verdadeiros impactes das restrições impostas durante a pandemia, com perda de laços sociais e degradação da situação económica.


    Afinal, Portugal registou menos suicídios nos dois primeiros anos da pandemia, mantendo inalterada a tendência decrescente da última década, mas na vizinha Espanha – que foi alvo de um exaustivo estudo sociodemográfico agora publicado numa prestigiada revista científica – os números aumentaram, ultrapassando a fasquia das 4.000 mortes em 2021.

    Os dados portugueses foram agora actualizados pelo Instituto Nacional de Estatística, no passado sábado com a divulgação da causa de morte em 2021, e indicam que afinal foram 934 as pessoas que tiraram a sua própria vida. Estes números são ligeiramente mais baixos (menos 18 óbitos) do que os avançados pelo Instituto de Medicina Legal para o mesmo período, que em 2022 divulgou que, no ano anterior, se tinham registado 952 suicídios. Certo é que os números agora indicados pelo INE são os mesmo que constam no Eurostat. Os números de 2021 são também inferiores aos de 2020, que contabiliza 945. Comparando este biénio com o de 2018-2019, observa-se um decréscimo de 5,5%.

    angel statue

    Esta descida nos suicídios em território nacional ocorreu num período de confinamentos, encerrament0 de escolas e outras medidas políticas geraram um forte impacto negativo na saúde mental da população. Embora os dados do INE não mostrem informação por grupo etário, a base de dados do Eurostat revela que em Portugal tiraram a vida 80 jovens com menos de 25 anos no biénio 2020-2021, quando esse número se situou nos 66 no biénio 2018-2019. Recorde-se que Portugal optou por seguir a maior parte dos países europeus e impor fortes medidas restritivas, enquanto a Suécia manteve a sua economia a funcionar e, em geral, com ligeiras excepções, não impôs confinamentos, nem fechou escolas nem comércio e não recomendou o uso de máscara facial. Note-se que no caso da Suécia, o suicídio jovem (menos de 25 anos) diminuiu durante a pandemia, embora este seja um país tradicionalmente com uma muito elevada prevalência mortes auto-infligidas (oficialmente, cerca de três vezes superior à portuguesa=.

    A tendência observada pelos dados do INE está também em forte contraciclo com os suicídios registados em Espanha durante a pandemia. Segundo um estudo científico da edição do próximo mês de Maio, mas já online, da revista revista European Neuropsychopharmacology as mortes por suicídio em Espanha nos dois primeiros anos da pandemia foram de 3.941 em 2020 e de 4.003 em 2021. Estes são os números mais elevados pelo menos desde 2013, de acordo com a base de dados do Eurostat. Comparando 2020-2021 com os dois anos anteriores à pandemia, a subida é de 28%.

    O estudo sociodemográfico elaborado por uma equipa multidisciplinar de Espanha, Estados Unidos e México confirma “um número crescente de vítimas de suicídio na Espanha durante a pandemia”, concluindo que “a influência da covid-19 nos factores de risco de suicídio [por exemplo, falta de redes de apoio social] desempenha[ram} um papel crítico na tendência crescente de grupos sociodemográficos específicos”.

    Evolução do número de suicídios na Espanha (esquerda) e em Portugal (direita) entre 2013 e 2022. Fonte: Eurostat. Nota: A população espanhola é 4,59 vezes a portuguesa.

    Apesar de os investigadores terem observado “um aumento global, independentemente dos principais grupos sociodemográficos”, concluíram que se registou “um número significativamente maior de suicídios também foi observado para adultos de meia-idade, grandes áreas urbanas e pessoas solteiras”.

    Os investigadores destacaram ainda que, “as medidas de distanciamento social permitiram reduzir as oportunidades de fazer e fortalecer as redes sociais em pessoas solteiras”. Recordaram que “as medidas de distanciamento social foram mais rigorosas nas capitais de província e nas grandes áreas urbanas, aquelas com acesso limitado a espaços verdes ao ar livre”. Assim, “a implementação de medidas de distanciamento social levou definitivamente a uma redução drástica dos contactos sociais através do distanciamento físico, confinamentos domiciliários e o encerramento temporário de muitas atividades sociais nas grandes áreas urbanas (restaurantes, bares, ginásios,…)”.

    O impacte da gestão da pandemia nas doenças mentais e na promoção de factores de risco do suicídio tem vindo a merecer uma reforçada atenção da investigação científica. Por exemplo, uma recente revisão sistemática, publicada em Fevereiro passado na revista Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology concluiu, após analisar 34 estudos realizados em mais de 40 países e regiões, que “nenhuma mudança significativa nas taxas de suicídio foi observada durante a pandemia de covid-19 de uma perspectiva global para os períodos examinados”. Mas os autores do estudo intitulado sugeriram que fosse realizado “um acompanhamento mais longo pode fornecer informações adicionais sobre essas tendências de suicídio globalmente”.

    Para a psicóloga Joana Amaral Dias, ainda é prematuro tirar conclusões destes dados divulgados pelo INE relativos a Portugal. “Como investigadora e especialista, não confio nos novos dados. Por um lado, sabemos que foram baralhadas as mortes por covid-19 com as mortes por outras causas. Por outro lado, os dados estiveram escondidos e demoraram tempo a ser divulgados”, afirmou em declarações ao PÁGINA UM.

    Primeira página do artigo científico da edição de Maio da revista European Neuropsychopharmacology, já disponível online desde o mês passado, aborda em detalhe o forte impacte da pandemia nos suicídios em Espanha durante a pandemia.

    Salientando que a aparente tendência de descida dos suicídios em Portugal na pandemia, indicada pelos números oficiais, não batem certo com a epidemia de doenças do foro mental, a psicóloga relembra que “as pessoas foram sujeitas a pressão sobre a sua saúde mental devido às restrições impostas”. “Houve um acréscimo brutal de casos de ansiedade e depressão na população, que é a base que leva aos suicídios”, salientou.

    Para Joana Amaral Dias defende a necessidade de aguardar pelos dados de 2022 e 2023 para se poder tirar alguma conclusão, referindo que em 2020 e 2021 a população entrou em “modo de sobrevivência devido ao medo imposto, nomeadamente através da comunicação social”, havendo consequências que demoram a surgir. “É como quando estamos a correr e caímos e magoamos o joelho. Inicialmente, porque o corpo está quente, conseguimos levantar e andar e quase não sentimos dores. Mas, quando ficamos frios, aí as dores surgem e vamos dar-nos conta dos reais danos”. No caso dos suicídios em Portugal, “temos de esperar pelos dados de 2022 e 2023 para ver o que realmente aconteceu na pandemia”. Para a psicóloga, os dados divulgados pelo INE “são insuficientes para se traçar um perfil” do que sucedeu na pandemia em matéria de evolução dos suicídios.

    Por outro lado, Joana Amaral Dias recordou que muitos portugueses recorreram ao consumo de álcool ou de estupefacientes para lidar com os confinamentos e as fortes restrições impostas à população. “Disparou o consumo de antidepressivos e ansiolíticos e somos campeões no consumo de benzodiazepinas”, lembrou.

    Com efeito, um relatório do Conselho Internacional de Controlo de Narcóticos colocou Portugal no grupo de países com maior consumo de psicotrópicos, como o diazepam, que começou a ser comercializado sob a marca Valium. Já o relatório anual deste organismo da Nações Unidas refere que, em 2022, o Uruguai registou o maior nível de consumo de zolpidem (um fármaco hipnótico) a nível mundial, seguido de Portugal. O mesmo relatório aponta que de acordo com dados sobre a cetamina (um anestésico não barbitúrico) detectada nas águas residuais, as quantidades mais elevadas foram encontradas em cidades da Dinamarca, Itália, Portugal e Espanha.

    Joana Amaral Dias (Foto: Júlia Oliveira/PÁGINA UM)

    Quanto ao consumo de estupefacientes, o relatório anual de 2022 sobre ‘A Situação do País em Matéria de Drogas e Toxicodependência‘, o número de casos de overdoses em 2021 atingiu o valor mais alto deste 2009, tendo ocorrido 81 mortes em 2021, mais 29% do que em 2020, o valor mais elevado dos últimos sete anos. E destacou ainda que, “em relação aos 339 óbitos registados em 2021 com a presença de substância ilícita ou seu metabolito e atribuídos 119 a outras causas de morte (acidente, morte natural, homicídio e suicídio), a cannabis foi predominante, tendo sido detectada em 159 casos (47%)”.

    Já os dados referentes a 2022, referem que as outras mortes com a presença de drogas (367) – atribuídas a morte natural (41%), acidentes (26%), suicídio (15%) e homicídio (6%) – têm vindo a aumentar desde 2016, atingindo em 2022 o valor mais alto desde 2008.

    Também no consumo de álcool, as medidas impostas acabaram por ter consequências na saúde mental e comportamentos aditivos. Segundo o relatório anual de 2022 sobre ‘A Situação do País em Matéria de Álcool‘, “vários indicadores ultrapassaram já em 2021 os níveis pré-pandémicos, entre eles, os readmitidos em tratamento por problemas relacionados com o uso de álcool (o valor mais elevado desde 2012), os internamentos hospitalares com diagnóstico principal ou secundário atribuíveis ao consumo de álcool e as sinalizações e diagnósticos de exposição de crianças/jovens a comportamentos relacionados com o consumo de bebidas alcoólicas que afetam o seu bem-estar e desenvolvimento (ambos com os valores mais altos dos últimos cinco anos)”.

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    (Foto: D.R.)

    Para Joana Amaral Dias, além de ser relevante uma maior transparência nos dados sobre suicídios divulgados em Portugal, também sublinha a importância de se debater publicamente o tema para melhorar o nível de literacia da população e melhor prevenir os suicídios. A psicóloga classifica de “completamente idiota a posição de não se divulgarem os casos de suicídio na comunicação social por receio de serem copiados”. “Tudo é contágio social! É preciso perceber que o próprio temor induzido pelos media na covid-19 causa contágio social”, alertou.

    Segundo a psicóloga, “não se noticiar e não se falar no tema causa mais prejuízo, porque é preciso desmistificar” e também defende a “criação de uma política pública mais responsável de abordar o tema de forma séria”.


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  • Censura: Brasil prestes a juntar-se à Coreia do Norte na proibição de acesso ao X

    Censura: Brasil prestes a juntar-se à Coreia do Norte na proibição de acesso ao X

    Num braço de ferro cada vez mais forte com Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), o Brasil abriu a porta para entrar na lista de países com regimes totalitários, como a China e a Coreia do Norte, que promovem a censura e que proibiram aquela rede social de funcionar nos seus territórios. Após a recusa de Musk em continuar o bloqueio de contas sem justificação plausível exigida pelo Supremo Tribunal Federal, o juiz Alexandre de Moraes abriu de imediato um processo ao empresário por obstrução à justiça, inclusive em associação crminosa, e por incitação ao crime, havendo já o cenário de proibir o acesso ao X no Brasil. O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) terá já instruído as principais operadoras do Brasil para, caso surja uma ordem judicial de suspensão do serviço, seja cumprida imediatamente. Apesar das ameaças, Elon Musk não se amedrontou e sugeriu hoje uma alternativa em caso de bloqueio desta rede social no Brasil, através de VPN, uma rede privada virtual que protege a navegação na Internet. E até goza com Alexandre de Moraes, alcunhando-o de Darth Vader, o vilão da Guerra da Estrelas, e esta tarde imaginou-o num consultório de psicanalista.


    O Brasil, liderado por Lula de Silva, poderá ser, em breve o quinto país a integrar a lista de nações que proíbem que os seus cidadãos acedam à rede social X (antigo Twitter). Alexandre de Moraes, juiz do Supremo Tribunal Federal do Brasil, terá já auscultado a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) sobre os procedimentos necessários para proibir o Twitter no país.

    Segundo a jornalista Andreza Matais, do UOL, o presidente do regulador cas telecomunicações, Carlos Baigorri, terá instruído as principais operadoras brasileiras para que estejam prontas caso surja uma ordem judicial de proibição de acesso ao X, para que a ordem “seja cumprida imediatamente”. O contacto com a Anatel foi feito, alegadamente, através do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que tem como presidente Alexandre de Moraes desde Agosto de 2022.

    A ser executado este bloqueio, o Brasil irá juntar-se às ditaduras da China, Irão, Coreia do Norte e Turquemenistão na lista de países que proíbem o acesso ao X nos seus territórios.

    Alexandre de Moraes (Foto: Carlos Moura/SCO/STF)

    Entretanto, Moraes também abriu um inquérito para que seja feita uma investigação ao dono da Tesla e do X e também incluiu Musk na lista dos investigados no inquérito já existente das denominadas “milícias digitais”. Esta decisão surgiu na sequência da recusa de Musk em acatar mais as ordens de Moraes para bloquear contas pessoais.

    Segundo o comunicado oficial sobre a decisão anunciada hoje, Alexandre de Moraes determinou que “o dono da rede social X (ex-Twitter), Elon Musk, seja incluído como investigado no inquérito das milícias digitais (INQ 4874)”. O juiz “também instaurou inquérito para apurar as condutas de Musk quanto aos crimes de obstrução à Justiça, organização criminosa e incitação ao crime”.

    Na decisão, é argumentado que “na data de 6/4/2024, o dono e CEO (Chief Executive Officer) da provedora de rede social “X” – anteriormente “Twitter” -, ELON MUSK, iniciou uma campanha de desinformação sobre a atuação do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL e do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL”.

    Ainda segundo a decisão, a mesma acção de Musk “foi reiterada no dia 7/4/2024, instigando a desobediência e obstrução à Justiça, inclusive, em relação a organizações criminosas (art. 359 do Código Penal e art. 2º, § 1º, da Lei 12.850/13), declarando, ainda, que a plataforma rescindirá o cumprimento das ordens emanadas da Justiça Brasileira relacionadas ao bloqueio de perfis criminosos e que espalham notícias fraudulentas, em investigação nesta SUPREMA CORTE”.

    O juiz determinou ainda aplicar uma multa diária de 100 mil reais por cada perfil que a rede X recuse bloquear. Recorde-se que Elon Musk denunciou ontem que as autoridades judiciais brasileiras, lideradas por aquele juiz, deram ordens ao X para bloquear contas sem sequer identificarem os motivos para o bloqueio.

    Roberto Barroso e Alexandre de Moraes. (Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF)

    Além de ter recusado a cumprir a censura e bloquear contas de utilizadores, Musk acusou Alexandre de Moraes de trair “descaradamente a Constituição” brasileira, chegando mesmo a declarar que o juiz devia “renunciar ou ser demitido”. Além disso, Musk ameaçou que, em breve, divulgará as exigências de Alexandre de Moraes.

    Hoje, para salientar que esta não é uma ‘batalha’ de um só juiz, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, deixou um aviso a Musk e ao X. Respondendo à recusa do dono do X em acatar as ordens de bloqueio de contas, numa nota oficial Barroso declarou que as “decisões judiciais podem ser objeto de recursos, mas jamais de descumprimento deliberado”. Também frisou que “toda e qualquer empresa que opere no Brasil está sujeita à Constituição Federal, às leis e às decisões das autoridades brasileiras”.

    Contudo, sem mostrar qualquer recuo na sua decisão de enfrentar a política de censura no Brasil, Musk encorajou os utilizadores do X a recorrerem a redes privadas virtuais (VPN) para contornar a proibição que possa ser implementada. Num tweet publicado hoje com um vídeo explicativo de como se pode usar uma VPN, Musk escreveu: “Usar uma VPN é muito fácil”.

    Ontem, como o PÁGINA UM noticiou, de um modo formal, a X Corporation – a empresa dona da rede social – informou que “foi forçada por decisões judiciais a bloquear determinadas contas no Brasil”, mas que nem sequer sabem “os motivos pelos quais essas ordens de bloqueio foram emitidas” nem sequer “quais postagens [que] supostamente violaram a lei”. Além disso, a rede social está também proibida de informar “qual tribunal ou juiz [que] emitiu a ordem, ou em qual contexto”, e nem sequer podem listar publicamente as contas afectadas.

    A empresa alegou que foi ameaçada com multas diárias se não cumprir as ordens de Moraes e prometeu que vai agir legalmente, por tais medidas judiciais serem contrárias ao Marco Civil da Internet e à Constituição do Brasil.

    Apesar da tensão, Elon Musk mantém um estilo provocador e até gozou com Alexandre de Moraes – que tem conta no X com mais de 1,1 milhões de seguidores -, apodando-o de “Darth Vader do Brasil“, o vilão da Guerra das Estrelas. E esta tarde ‘fixou’ um publicação onde encena uma reunião com o juiz brasileiro num psicanalista em busca de uma entidade, e pergunta: “Tell me, Alexandre, is the disinformation in the room with us now?” (Diz-me, Alexandre, está a desinformação na sala connosco agora?).


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  • ‘Doce centenário’: sem concurso público, Portimão paga quase um milhão para programa cultural

    ‘Doce centenário’: sem concurso público, Portimão paga quase um milhão para programa cultural

    A socialista Isilda Gomes quis, o município sonhou e as comemorações do centenário da cidade de Portimão estão a avançar com um custo de 910 mil euros. Tudo sem concurso público, e atropelando as mais elementares normas de transparência e de livre concorrência no criativo e competitivo mundo cultural. Alegando ser a única entidade capaz de executar a programação para os 100 anos da cidade, a autarquia de Portimão celebrou um contrato por ajuste directo com a cooperativa algarvia Lavrar o Mar, fundada e liderada pelo italiano Giacomo Scalisi, e para contornar a abertura de um concurso público invocou uma norma de excepção do Código dos Contratos Públicos apenas usada para a compra de uma obra de arte ou a aquisição de um simples espectáculo. Além disso, a edilidade acaba por confessar que Giacomo Scalisi já está a prestar serviços desde Outubro do ano passado, embora o contrato só tenha sido celebrado quatro meses depois.


    Um chorudo ajuste directo, sem concorrência, de mão-beijada. Para programar eventos culturais do primeiro centenário da cidade de Portimão, a autarquia local contratou a cooperativa algarvia Lavrar o Mar, presidida pelo encenador italiano Giacomo Scalisi, por um valor de 740 mil euros, que ascende a 910 mil euros com IVA incluído. O contrato celebrado no final de Fevereiro, e divulgado no início da semana passada, invoca um falso argumento previsto pelo Código dos Contratos Públicos, para um ajuste directo desta natureza, porque equipara a programação e gestão de 38 eventos culturais e festivos – que se iniciaram no passado mês, e se prolongam até ao final do presente ano – à aquisição (compra) de obra de arte, contratação de um artista ou de um espectáculo.

    De acordo com o registo inserido no Portal Base – que omite a proposta da Lavrar o Mar, apesar de se salientar “fazer parte integrante deste contrato” –, a decisão de contratar por ajuste directo a cooperativa sediada em Aljezur, e criada em 2014 por Giacomo Scalisi e Madalena Victorino, ocorreu em 6 de Dezembro do ano passado, invocando-se critérios materiais para contornar a abertura de um concurso público, ademais tendo em conta o elevado montante em causa.

    A socialista Isilda Gomes é presidente da Câmara Municipal de Portimão desde 2013. (Foto: D.R./PS)

    O uso de ajustes directos para a “criação ou aquisição de uma obra de arte ou de um espetáculo artístico” costuma ser uma prática banal e legal, embora discutível, mas aquilo que, no caso do centenário da cidade de Portimão, está em causa não é a mera aquisição de espectáculos ou a contratação de artistas, mas sim a “criação e execução de projecto artístico” com a duração de 397 dias.

    De acordo com o programa já disponível, apenas dois dos espectáculos são produzidos pela Lavrar o Mar: o primeiro, em Outubro, é de Scalisi; e o outro será um espectáculo que combina dança e música da autoria da bailarina e coreógrafa Madalena Victorino, co-diectora artística da cooperativa. Dos restantes eventos, que decorrem entre Fevereiro e Dezembro de 2024, encontram-se concertos, espectáculos circenses, exposições e outros eventos com a produção executiva ou organização por outras entidades, que foram programados pela cooperativa a partir do ajuste directo.

    Em respostas a questões colocadas pelo PÁGINA UM, o município liderado por Isilda Gomes, que dirige a autarquia há mais de uma década, limitou-se basicamente a reafirmar a fundamentação invocada no contrato bem como o objecto do concurso: “o desenho e operacionalização de um programa de comemorações” do centenário da cidade.

    Na verdade, ninguém parece esconder que a função da Lavrar o Mar nos eventos associados às comemorações é a de programação. Ainda hoje, o diariOnline Região Sul, anunciava “o primeiro espetáculo da programação artística criada e apresentada pela Lavrar o Mar Cooperativa Cultural para assinalar esta importante efeméride [centenário da cidade], com diversos momentos a decorrer até ao final do ano, numa parceria estabelecida com o Município de Portimão”. O espectáculo nada tem a ver com a cooperativa, uma vez que tem “a produção executiva da Unnica Arts”, conforme revela o jornal algarvio. E, obviamente, não se trata de uma parceria, mas sim de uma prestação de serviços.

    Madalena Victorino e Giacomo Scalisi, da cooperativa Lavrar o Mar.
    (Foto: Captura de imagem a partir de entrevista no YouTube)

    O próprio município não esconde ao PÁGINA UM que a Lavrar o Mar tem funções de programador e de gestor, e que tudo foi antecipadamente negociado com o director artístico Giacomo Scalisi, o que imediatamente deveria retirar a possibilidade de se invocar o ajuste directo por critério material para justificar um ajuste directo de 910 mil euros.

    Segundo a autarquia de Portimão, “todos os encargos inerentes à execução do projecto que venha a ser aprovado serão da responsabilidade da entidade a contratar”, sendo acompanhadas pelo município através de reuniões regulares com o diretor artístico da Lavrar o Mar, e pela “apresentação de relatórios e memorandos escritos”. Ou seja, uma mera prestação de serviços que dificilmente se enquadra nos critérios materiais de criação ou aquisição de uma obra de arte ou de um espetáculo artístico.

    A autarquia de Portimão defende que a escolha da Lavrar do Mar teve como pressupostos “o desenho e operacionalização de um programa de comemorações [que] exige que o mesmo seja acompanhado artisticamente por uma entidade de reconhecida competência no domínio da programação artística, visando assegurar a articulação entre os vários setores da produção e o acompanhamento de públicos em coerência com o programa artístico a conceber”, e também a necessidade de que a entidade escolhida possuísse “um conhecimento profundo não só de programação, mas também das companhias e artistas que possam vir a integrar o programa das Comemorações do centenário da Cidade de forma a potenciarem as interações artísticas e formativas entre os artistas e os públicos”.

    Mesmo estando em causa a eventual violação do Código dos Contratos Públicos – e a eventual fiscalização do ajuste directo pelo Tribunal de Conta pode vir a declarar mesmo ilegalidades e nulidades –, o município de Portimão insiste ter sido esta a melhor opção, embora tal seja difícil de provar quando se trata de um adjudicatário escolhido a dedo, sem concorrência.

    Fonte oficial do município disse ainda ao PÁGINA UM que “considerando que Giácomo Scalisi aceitou pensar connosco o passado e desenhar num programa artístico, o futuro cultural para a cidade, através das festividades do seu centenário (…), afigura-se-nos que a [única] entidade que poderá colaborar, com valor acrescentado, face a outras eventuais opções, na conceção e operacionalização do projecto artístico de comemorações declinando-o através de um planeamento adequado num conjunto de tarefas de conceção, pré-produção e produção que lhe caberá, depois, coordenar, será a entidade Lavrar o Mar”, concluindo que, desse modo, o “serviço pretendido apenas pode ser confiado a esta entidade”.

    A autarquia liderada por Isilda Gomes até admite que a Lavrar o Mar começou a desenvolver o projecto artístico para as comemorações em Outubro do ano passado, ou seja, quatro meses antes da assinatura do contrato por ajuste directo, algo que constitui uma outra evidente ilegalidade.

    (Foto: Captura de imagem de reportagem da TVI)

    Antes deste ‘jackpot‘ de 910 mil euros, o contrato com entidade pública de valor mais elevado que a cooperativa Lavrar o Mar tinha obtido foi um do município de Odemira, em 2018, no valor de cerca de 112 mil euros (IVA incluído), relativo à “aquisição de serviço de espectáculos e workshops pedagógicos”.

    Para o município de Portimão, este ajuste directo corresponde ao quarto maior contrato de sempre feito sem concurso. O maior ajuste directo foi adjudicado em 2011 para a construção da nova escola EB 2,3 na zona da Bemposta, no valor de quase cinco milhões de euros. O segundo maior, efectuado em 2010, no valor de 4,3 milhões de euros, destinou-se à “Ampliação e beneficiação do Centro Escolar do Pontal”. O terceiro maior ajuste directo, em 2018, foi efectuado com a EDP, para o “fornecimento de energia eléctrica para as instalações alimentadas em MT, BTE, BTN e BTN – Iluminação Pública”, no montante de 756 mil euros.


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  • Universidade Católica saca 700 mil euros em assessoria a banco estatal por urgência imperiosa… em serviço para três anos

    Universidade Católica saca 700 mil euros em assessoria a banco estatal por urgência imperiosa… em serviço para três anos


    A plataforma da contratação pública, o Portal Base, exige a divulgação de informação detalhada sobre contratos, mas no caso daquele que foi celebrado no dia 23 de Fevereiro e divulgado na passada sexta-feira entre o Banco Português de Fomento (BPF) e a Universidade Católica aquilo que se destaca mais é o que não se mostra.

    Assinado por dois administradores executivos do banco estatal, cujos nomes são intencionalmente apagados – e sabendo-se que a presidente da comissão executiva do BFP, Ana Carvalho, é uma alumna da Católica -, o ajuste directo de 700 mil euros tem um objecto ignoto, sobretudo porque documentos essenciais não constam no Portal Base, apesar de expressamente serem parte integrante do contrato. Assim, de acordo com o clausulado, o contrato “tem por objecto principal a aquisição de serviços de assessoria financeira, nas condições do Caderno de Encargos”, mas o Caderno de Encargos nem vê-lo. Aliás, a cláusula 2ª diz, de forma clara, que o Caderno de Encargos faz “parte integrante do contrato”, bem como a proposta adjudicada, mas nada disto foi colocado no Portal Base.

    Por outro lado, nem sequer se sabe ao certo que tipo de serviços a Universidade Católica irá desempenhar, uma vez que estes alegadamente estarão definidos num “Anexo A”, indicado na cláusula 5, mas que não foi anexada ao contrato disponibilizado publicamente, como deveria.

    Mais estranho ainda é o motivo alegado para se entregar um chorudo contrato de serviços de consultadoria à Universidade Católica sem os incómodos de um concurso público, numa área em que existe bastante concorrência. O BPF invocou, para o contrato de mão-beijada, escolhendo a dedo a Católica, uma norma de excepção que permite o ajuste directo “na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante, não possam ser cumpridos os prazos inerentes aos demais procedimentos, e desde que as circunstâncias invocadas não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante”.

    Ora, esta norma de excepção serve quando, por exemplo, existe uma derrocada ou uma emergência pública e se mostra necessário uma intervenção imediata sem a qual existiriam constrangimentos graves. Em todo o caso, difícil se mostra também compreender como uma alegada “urgência imperiosa” necessita de serviços que duram três longos anos.

    Ana Carvalho, presidente da comissão executiva do Banco Português de Fomento. (Foto: D.R./BPF)

    O ajuste directo entregue pelo BPF constitui o quarto de valor mais elevado de sempre, sendo que os três maiores foram adjudicados à mesma entidade: a consultora Oliver Wyman. De acordo com o contrato com a Universidade Católica, a factura para o banco público poderá ser ainda superior, uma vez que os 700 mil euros (a que acresce IVA) não inclui outras despesas que sejam necessárias para a execução do serviço, as quais serão pagas à parte.

    Desde que foi fundado em Agosto de 2020, com a missão de promover a modernização das empresas e o desenvolvimento económico e social – e por via da fusão da Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD) e da PME Investimentos na Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua – o BPF tem sido sobretudo um manancial de contratos públicos. De acordo com o Portal Base, esta instituição já celebrou 367 contratos que englobam mais de 21,1 milhões de euros, sendo que uma parte substancial se referem a serviços de consultadoria financeira ou jurídica e ainda serviços e equipamentos informáticos.

    Mais de dois em cada três destes contratos (252 em 367) são ajustes directos, que totalizam quase 11,1 milhões de euros. O recurso a concurso público é uma minoria: apenas 68 contratos envolvendo um total de pouco mais de 6,8 milhões de euros.

    O maior ajuste directo contratado pelo BPF beneficiou a consultora Oliver Wyman, com um valor de 1,2 milhões de euros e foi efectuado em 2021. Mas, no total, esta empresa sacou mais três ajustes directos de valor ‘chorudo’: em 2021 consta um de 895 mil euros, e no ano anterior outro de 749 mil euros. No total, a consultora norte-americana, com escritórios em Lisboa, ganhou, só nestes três contratos, 2,8 milhões de euros, mas a sua ligação ao Governo vem desde 2016 quando foi contratada pelo Ministério das Finanças para tratar do Fundo de Resolução do Novo Banco.

    Tendo em consideração que o PÁGINA UM detectou este caso apenas ao final da tarde de hoje, no decurso da habitual elaboração do Boletim P1 sobre contratação pública, não foi possível contactar ainda o BPF e a Universidade Católica Portuguesa para obter mais esclarecimentos sobre o ajuste directo de 700 mil euros. Saliente-se, contudo, que a filosofia subjacente ao Portal Base é de que a informação aí constante, a começar pelo clausulado nos contratos, seja suficientemente clara para evidenciar a forma como se gerem os dinheiros públicos.

    O contrato celebrado pelo BPF e a Universidade Católica integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 8 e 10 de Março de 2024. Desde Setembro de 2023, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    ET / PAV


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    Nos últimos três dias, de sexta-feira até ontem, no Portal Base foram divulgados 823 contratos públicos, com preços entre os 52,50 euros – para aquisição de medicamentos, pelo Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, ao abrigo de acordo-quadro – e os 6.201.029,20 euros – para aquisição de medicamentos, pela Unidade Local de Saúde de Santa Maria, também ao abrigo de acordo-quadro.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 17 contratos, dos quais 11 por concurso público, dois ao abrigo de acordo-quadro e quatro por ajuste-directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 17 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: três do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (um com a Novartis Farma, no valor de 1.855.141,00 euros, outro com a Vertex Pharmaceuticals, no valor de 482.364,72 euros, e outro com a Dh Hps, no valor de 102.072,59 euros); Unidade Local de Saúde de São João (com a Alexion Pharma, no valor de 1.570.752,80 euros); Banco Português de Fomento (com a Universidade Católica Portuguesa, no valor de 700.000,00 euros); Município de Santo Tirso (com a Transdev Norte, S.A., no valor de 692.914,30 euros); dois do Estado-Maior-General das Forças Armadas (um com a Endesa Energia, no valor de 435.786,34 euros, e outro com a Interlimpe Facility Services, no valor de 275.871,20 euros); dois do Instituto dos Registos e do Notariado (um com a Fine Facility Services, no valor de 364.256,14 euros, e outro com a Eipeople, Lda., no valor de 197.999,98 euros); Unidade Local de Saúde da Região de Leiria (com a Beckman Coulter Portugal, no valor de 270.925,20 euros); Instituto Politécnico de Portalegre (com a Reerguer – Reconstrução e Construção de Imóveis, no valor de 251.842,38 euros); Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil (com a Bristol – Myers Squibb, no valor de 198.746,00 euros); Centro Hospitalar de Setúbal (com a várias farmacêuticas, no valor de 114.020,91 euros); Unidade Local de Saúde de Almada-Seixal (com a Interlimpe – Facility Services, no valor de 105.958,80 euros); Lisboa Ocidental, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana (com a RIOBOCO – Serviços Gerais, Engenharia e Manutenção, no valor de 104.930,00 euros); e o Instituto do Turismo de Portugal (com a C-More Sustainability, no valor de 100.100,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 8 a 10 de Março

    1Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de Santa Maria

    Adjudicatário: Biogen Portugal

    Preço contratual: 6.201.029,20 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)


    2Aquisição de serviços de telecomunicações

    Adjudicante: Município de Lisboa

    Adjudicatário: Vodafone Portugal

    Preço contratual: 2.996.405,72 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    3Aquisição de equipamentos de protecção individual para combate a incêndios

    Adjudicante: Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil

    Adjudicatário: Dragontrophy II          

    Preço contratual: 2.695.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    4Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos

    Preço contratual: 1.855.141,00 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    5Aquisição de serviços de varredura mecânica para limpeza de arruamentos

    Adjudicante: Município de Oeiras

    Adjudicatário: ECOAMBIENTE – Serviços e Meio Ambiente

    Preço contratual: 1.686.056,97 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 8 a 10 de Março

    1 Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Novartis Farma – Produtos Farmacêuticos

    Preço contratual: 1.855.141,00 euros


    2Aquisição de medicamentos

    Adjudicante: Unidade Local de Saúde de São João

    Adjudicatário: Alexion Pharma Spain

    Preço contratual: 1.570.752,80 euros


    3Aquisição de serviços de assessoria financeira

    Adjudicante: Banco Português de Fomento

    Adjudicatário: Universidade Católica Portuguesa

    Preço contratual: 700.000,00 euros


    4Aquisição de serviços de transporte regular de passageiros

    Adjudicante: Município de Santo Tirso

    Adjudicatário: Transdev Norte S.A.

    Preço contratual: 692.914,30 euros


    5Aquisição de medicamentos e outros produtos farmacêuticos

    Adjudicante: Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central

    Adjudicatário: Vertex Pharmaceuticals

    Preço contratual: 482.364,72 euros


    MAP

  • Lixos: Gondomar entrega sem concurso 13 milhões de euros a réu do processo ‘Ajuste Secreto’

    Lixos: Gondomar entrega sem concurso 13 milhões de euros a réu do processo ‘Ajuste Secreto’


    Num negócio milionário, a autarquia de Gondomar está a atribuir desde Julho de 2022 sucessivos contratos de aquisição de serviços de recolha de resíduos sólidos urbanos, sem concurso, à mesma empresa: a Rede Ambiente – Engenharia e Serviços, que integra o Grupo Terris, com sede naquele concelho nortenho e que é ré no processo ‘Ajuste Secreto’. O próprio CEO do Grupo Terris, e ex-presidente da Rede Ambiente, viu em 2019 o Tribunal de Santa Maria da Feira decretar-lhe o arresto preventivo de bens.

    O processo Ajuste Secreto, cujo julgamento se iniciou em Novembro passado no Tribunal de Espinho, teve início em 2016, envolvendo sobretudo a Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis e o seu ex-presidente Hermínio Loureiro, antigo dirigente da Federação Portuguesa de Futebol, mas os indícios criminais estenderam-se também às autarquias de Estarreja, Albergaria-a-Velha, Matosinhos e Gondomar.

    (Foto: Câmara Municipal de Gondomar. D.R.)

    Estão a ser julgadas 65 pessoas e empresas, entre as quais se contam a própria Rede Ambiente e Paulo Renato Reis, sócio e presidente-executivo do Grupo Terris e antigo membro do conselho nacional do PSD, bem como o ex-deputado social-democrata João Moura de Sá, que foi também administrador da Rede Ambiente. Além destes réus, com ligações à autarquia de Gondomar (funcionários ou ex-funcionários) estão também envolvidos neste processo judicial mais três pessoas: José Leonel Ramos, José Diogo Ferreira da Silva e Joaquim Castro Neves.

    Apesar das fortes suspeitas sobre a Rede Ambiente, o município gondomarense, liderado pelo socialista Marco Martins, tomou a decisão de escolher esta empresa para lhe entregar, desde Julho de 2022, três contratos de ‘mão-beijada’ para recolha de resíduos que já totalizam cerca de 12,9 milhões de euros, de acordo com dados disponíveis no Portal Base, a plataforma de registo de compras públicas. [N.B. No Portal Base constam quatro ajustes directos, mas um deles está duplicado).

    Estes ajustes directos sucedem a um contrato ganho por concurso público pela Rede Ambiente e EGEO em 2012, em consórcio, pelo valor de 35,8 milhões de euros. No concurso saíram derrotadas a Suma, a RRI e a Luságua. O prazo de execução foi de 10 anos, o que equivalia a um pagamento médio de quase 3,6 milhões de euros em cada ano de contrato. Mas a autarquia de Gondomar aceitou em Junho de 2021 fazer uma alteração contratual em simultâneo com a cedência de posição contratual por parte da EGEO. Assim, em acordos assinados em Junho de 2021 pelo vice-presidente Luís Araújo, a Câmara Municipal de Gondomar aceitou acrescentar mais cerca de 5,4 milhões de euros ao contrato inicial. Ou seja, o município, em 10 anos de recolha de lixos, pagou 41,2 milhões de euros, mais 15% do inicialmente contratado.

    Marco Martins, presidente da Câmara Municipal de Gondomar.
    (Foto: Câmara Municipal de Gondomar. D.R.)

    Na verdade, pagou mais, porque na adenda do contrato, a autarquia concordou em antecipar o término do contrato. De acordo com a cláusula da adenda de 2021, diz-se que “o prazo de vigência inicialmente fixado em dez anos, que terminaria em Março de 2023, será reduzido para Julho de 2022, sendo esta a data previsível do seu término, podendo cessar em momento anterior se for consumido o preço contratual”.

    Em suma, se em 2021 a Câmara de Gondomar pensava gastar, através de concurso público, 35,8 milhões de euros ao longo de 120 meses, afinal acabou por pagar 41,2 milhões de euros por 112 meses. Contas feitos, no contrato inicial (de 2012), cada mês custaria aos cofres autárquicos cerca de 300 mil euros; afinal, custaram quase 368 mil em cada mês. Portanto, um aumento das receitas da Rede Ambiente com este contrato próximo dos 23%.

    Mas além deste acréscimo, a Rede Ambiente teve mais benesses, porque a autarquia de Gondomar não se preocupou em abrir concurso público com vista à recolha de resíduos para o período posterior a Julho de 2022. E começaram então os contratos de ‘mão-beijada’.

    Para justificar a atribuição destes ajustes directos à Rede Ambiente, a autarquia presidida pelo socialista Marco Martins, mesmo sabendo-se que teve 10 anos para preparar novo concurso público, invocou alegados “motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis pela entidade adjudicante”, isto é, pela Câmara Municipal de Gondomar. Convém referir que o Código dos Contratos Públicos somente permite essa solução se a culpa pela “urgência imperiosa” não for da entidade adjudicante. Ora, é impossível crer que a autarquia de Gondomar não saberia prever a necessidade de continuar a recolher os resíduos e limpar as ruas do município.

    Paulo Renato Reis, CEO do Grupo Terris, dono da Rede Ambiente, é um dos arguidos no processo ‘Ajuste Secreto’.

    Além disso, a norma de excepção refere que os ajustes directos por “motivos de urgência imperiosa” só se justificam na “medida do estritamente necessário”, e o município liderado pelo socialista Marco Martins já vai com três ajustes directos à mesma empresa, desde Agosto de 2022, sendo que o mais recente, celebrado na passada sexta-feira, no montante de 4.325.704,91 euros, se prolongará até Setembro deste ano de 2024.

    O anterior ajuste directo, no montante de 6.118.993,73 euros, foi celebrado a 29 de Dezembro de 2022, para a “aquisição de Serviços de Recolha de Resíduos Urbanos”, por um prazo de um ano.

    E o primeiro deste contratos de ‘mão-beijada’ saíra no final de Julho de 2022, ao preço de 2.488.015,00 euros.  

    Assim, no total, através de três ajustes directos, sem qualquer concorrência, a Rede Ambiente vai encaixar por dois anos de prestação de serviços (Agosto de 2022 a Setembro de 2024) um total de 12,9 milhões de euros, o que dá uma média de 537 mil euros por cada mês. Recorde-se que, com as alterações contratuais, entre Março de 2012 e Julho de 2022, a Rede Ambiente encaixara 368 mil euros por mês, Portanto, os ajustes directos têm um ‘desvio’ para cima de 46%. Coisa pouca.

    Focus Photo of Yellow Paper Near Trash Can

    O PÁGINA UM questionou a Câmara Municipal de Gondomar sobre o porquê da não realização de concurso público para a escolha de um prestador de serviços de recolha de resíduos, a partir de 2022, ano em que terminou o contrato em vigor com a Rede Ambiente. Também indagou o município sobre como foi definido o preço que consta nos contratos feitos por ajuste directo, mas até à hora de publicação deste artigo, o município não enviou respostas.

    A Rede Ambiente – Engenharia e Serviços é uma sociedade anónima presidida agora por Lília Maria Matias da Costa, e tem a sua sede num armazém na freguesia de Santa Cruz/ Trindade e Sanjurge, no concelho de Chaves, segundo dados da sociedade no portal do Ministério da Justiça onde constam os registos societários.

    Já o Grupo Terris, a holding onde se integra a Rede Ambiente, tem sede em Gondomar, e controla também a Ecorede, a Vector Estratégico e a Finis.

    De acordo com o Portal Base, desde 2010 a Rede Ambiente facturou 135 milhões de euros com entidades públicas em 89 contratos . Nos últimos dois anos, a maioria dos contratos públicos desta empresa foi após um procedimento de consulta prévia ou concurso público. Nos ajustes directos, além dos que conseguiu com o município de Gondomar, contam-se dois com municípios, mas por valores muitos mais baixos e de curta duração: com a autarquia de Santo Tirso, no valor de 677.806, por 150 dias, e com a freguesia de Ermesinde, no montante de 75 mil euros, por apenas 92 dias

    (Foto: Câmara Municipal de Gondomar. D.R.)

    O maior contrato obtido pela Rede Ambiente em 2023 foi com a autarquia de Amarante, num “concurso limitado por prévia qualificação”, para o fornecimento de serviços por 10 anos, num valor de 27,1 milhões de euros, tendo ganho este procedimento em parceria com a Ecorede.

    O terceiro maior contrato, foi angariado junto do município do Barreiro, através de concurso público, gerando uma receita de 3,960 milhões de euros, em prestações de serviço a efectuar por dois anos.

    Mesmo assim, a Ecorede é a empresa do Grupo Terris que encaixou mais com entidades públicas: os 182 contratos valeram-lhe já 159 milhões de euros.

    O mais recente contrato entre a Rede Ambiente a o município de Gondomar integra o Boletim P1 da Contratação Pública e Ajustes Directos que agrega os contratos divulgados entre os dias 29 de Dezembro de 2023 e 1 de Janeiro de 2024. Desde Setembro, o PÁGINA UM apresenta uma análise diária aos contratos publicados no dia anterior (independentemente da data da assinatura) no Portal Base. De segunda a sexta-feira, o PÁGINA UM faz uma leitura do Portal Base para revelar os principais contratos públicos, destacando sobretudo aqueles que foram assumidos por ajuste directo.

    ET / PAV


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    Nos últimos quatro dias, de sexta-feira passada até ontem, no Portal Base foram divulgados 1479 contratos públicos, com preços entre os 2,50 euros – para aquisição de medicamentos, pela Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, através de ajuste directo – e os 30.850.000,00 euros – para melhoria das condições de segurança e circulação do IP8 (EN259), pela Infraestruturas de Portugal, através de concurso público.

    Com preço contratual acima de 500.000 euros, foram publicados 32 contratos, dos quais 16 por concurso público, 13 ao abrigo de acordo-quadro e três por ajuste directo.

    Por ajuste directo, com preço contratual superior a 100.000 euros, foram publicados 29 contratos, pelas seguintes entidades adjudicantes: Município de Gondomar (com a Rede Ambiente – Engenharia e Serviços, no valor de 4.325.704,91 euros); Metro Mondego (com a Etac – Empresa de Transportes António Cunha, no valor de 719.982,25 euros); Metropolitano de Lisboa (com a SISCOG – Sistemas Cognitivos, no valor de 554.273,13 euros); dois do Centro Hospitalar Tondela-Viseu (um com a Petrogal, no valor de 499.604,00 euros, e outro com a PharmaKern Portugal – Produtos Farmacêuticos, no valor de 121.500,00 euros); Município de Odivelas (com a Ronsegur – Rondas e Segurança, no valor de 489.996,36 euros); Cascais Dinâmica – Gestão de Economia, Turismo e Empreendorismo (com a PSG – Segurança Privada, no valor de 467.240,34 euros); Universidade do Porto (com a Ex Libris (Deutschland) GmbH, no valor de 406.832,86 euros); Universidade Aberta (com a UNIwise, no valor de 228.472,00 euros); Município de Constância (com a Petrogal, no valor de 224.996,35 euros); Município de Rio Maior (com a Ambiobra, Lda., no valor de 207.365,00 euros); Município de Cascais (com a Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados – Sociedade de Advogados, no valor de 203.000,00 euros); Serviços Sociais da Administração Pública (com a Eurest Portugal, no valor de 197.285,76 euros); Infraestruturas de Portugal (com a Geira, S.A., no valor de 190.000,00 euros); Estado Maior da Força Aérea (com a Dassault Aviation Business Services, no valor de 186.556,64 euros); Município de Portimão (com a Ramos Preto, Abreu Rodrigues e Associados – Sociedade de Advogados, no valor de 180.000,00 euros); dois do Município de Almada (um com a Interlimpe – Facility Services, no valor de 166.245,00 euros, e outro com a Prestibel – Empresa de Segurança, no valor de 121.270,77 euros); Universidade Nova de Lisboa (com a Quidgest, no valor de 150.000,00 euros); Instituto de Informática (com a Unipartner IT Services, no valor de 141.950,00 euros); Município de Loulé (com a Pixelevolution, Lda., no valor de 140.000,00 euros); Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (com a Biogen Idec, no valor de 132.253,63 euros); Instituto Politécnico de Leiria (com a Ex Libris (Deutschland) GmbH, no valor de 132.169,00 euros); dois do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (um com a Unicam, Sistemas Analíticos, no valor de 124.785,00 euros, e outro com a Werfen Portugal, no valor de 122.529,96 euros); dois do Município de Torres Vedras (um com a Biofrade – Agropecuária, no valor de 120.840,47 euros, e outro com a Sogenave, no valor de 109.352,33 euros); Hospital da Horta (com a Baxter Medico Farmacêutica, no valor de 116.783,16 euros); e os Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento dos Municípios de Oeiras e Amadora (com a Submarit – Subempreitadas e Trabalhos Marítimos, no valor de 116.000,00 euros).


    TOP 5 dos contratos públicos divulgados no período de 29 de Dezembro a 1 de Janeiro

    1Realização de empreitada para melhoria das condições de segurança e circulação do IP8 (EN259)

    Adjudicante: Infraestruturas de Portugal

    Adjudicatário: Tecnovia – Sociedade de Empreitadas; Construções J.J.R. & Filhos         

    Preço contratual: 30.850.000,00 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    2Aquisição de energia eléctrica em regime de mercado liberalizado – Lote 4

    Adjudicante: Município de Tavira

    Adjudicatário: EDP Comercial

    Preço contratual: 4.909.357,85 euros

    Tipo de procedimento: Ao abrigo de acordo-quadro (artº 259º)     


    3Aquisição de serviços de recolha de resíduos urbanos e de resíduos de construção e demolição

    Adjudicante: Município de Gondomar

    Adjudicatário: Rede Ambiente – Engenharia e Serviços     

    Preço contratual: 4.325.704,91 euros

    Tipo de procedimento: Ajuste directo


    4Fornecimento de energia eléctrica e gás natural

    Adjudicante: Município de Miranda do Douro

    Adjudicatário: EDP Comercial

    Preço contratual: 3.061.882,47 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    5Empreitada de construção designada “DOMUS CACI”

    Adjudicante: Fundação Beatriz Santos

    Adjudicatário: JRC – Construção e Obras Públicas

    Preço contratual: 2.415.649,58 euros

    Tipo de procedimento: Concurso público


    TOP 5 dos contratos públicos por ajuste directo divulgados no período de 29 de Dezembro a 1 de Janeiro

    1 Aquisição de serviços de recolha de resíduos urbanos e de resíduos de construção e demolição

    Adjudicante: Município de Gondomar

    Adjudicatário: Rede Ambiente – Engenharia e Serviços     

    Preço contratual: 4.325.704,91 euros


    2Prestação de serviços de transporte rodoviário de passageiros em alternativa ao Ramal da Lousã entre 1 de Janeiro e 31 de Maio de 2024

    Adjudicante: Metro Mondego

    Adjudicatário: Etac – Empresa de Transportes António Cunha       

    Preço contratual: 719.982,25 euros


    3Plataforma Plago – Aquisição de licenciamento RTD (Real Time Dispatcher)

    Adjudicante: Metropolitano de Lisboa

    Adjudicatário: SISCOG – Sistemas Cognitivos

    Preço contratual: 554.273,13 euros


    4Fornecimento de gás natural – Janeiro e Fevereiro de 2024

    Adjudicante: Centro Hospitalar Tondela-Viseu

    Adjudicatário: Petrogal

    Preço contratual: 499.604,00 euros


    5Prestação de serviços de segurança e vigilância humana e electrónica

    Adjudicante: Município de Odivelas

    Adjudicatário: Ronsegur – Rondas e Segurança

    Preço contratual: 489.996,36 euros


    MAP

  • Covid-19: Reforços vacinais são irrelevantes, conclui estudo austríaco

    Covid-19: Reforços vacinais são irrelevantes, conclui estudo austríaco


    A estratégia de vacinar constantemente a generalidade da população contra a covid-19, através de sucessivos reforços, foi posta em causa por um estudo científico que tem como co-autor o mais prestigiado epidemiologista mundial, o norte-americano John Ioannidis. Baseado num estudo observacional realizado na Áustria, os investigadores concluíram que a eficácia da quarta dose de vacina para impedir a morte por covid-19 não é significativa, além de conferir uma imunidade muito transitória e em rápida quebra. Além disso, o estudo salienta que “a imunidade natural pode ser um determinante principal da proteção imunológica numa população”, pelo que, atendendo ao risco-benefício, as vacinações adicionais deixam de ser uma opção aceitável na fase endémica da covid-19.


    Um estudo científico desenvolvido na Áustria e com participação do norte-americano John Ioannidis, o mais prestigiado e citado epidemiologista mundial, questiona a estratégia de se vacinar sucessivamente a população, em geral, com novos reforços de vacina contra a covid-19.  

    Publicado no European Journal of Clinical Investigation, e contando com a participação de 10 investigadores, sobretudo de universidades da Áustria (Viena, Graz e Insbruck), o estudo analisou epidemiologicamente a população daquele país europeu em função do estatuto vacinal e da ocorrência de infecção prévia por SARS-CoV-2, e concluíram que a eficácia de uma quarta dose para prevenir a morte por covid-19 era fraca. Além disso, constataram que a eficácia relativa de uma quarta dose para impedir infecções era transitória e revertia no médio prazo.

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    Os investigadores também observaram que “infeções repetidas anteriores e infecções mais recentes por SARS-CoV-2 foram ambas associadas a reinfeções significativamente reduzidas”. Daí os investigadores aproveitaram para questionarem “se as recomendações para reforços vacinais repetidos contra o SARS-CoV-2 são atualmente justificadas para grandes partes da população em geral com uma história de infeções anteriores”.

    No entanto, de uma forma prudente, salientam que “isso não contradiz o benefício para a saúde das vacinações iniciais de populações desprotegidas na fase inicial da pandemia de covid-19 e das vacinações de populações de muito alto risco a qualquer momento”.

    Em concreto, os investigadores procuraram neste estudo – financiado pelo Austrian Science Fund – estimar “o risco de mortes por covid-19 e infeções por SARS-CoV-2, de acordo com o status de vacinação em indivíduos previamente infetados na Áustria”, com base em dados recolhidos em Novembro e Dezembro de 2022, comparando principalmente indivíduos com quatro doses de vacina versus três doses. Os investigadores fizeram também uma análise prolongada entre Janeiro e Junho do ano passado.

    Assim, comparando com três doses de vacina, os investigadores concluíram que “aqueles com menos ou nenhuma vacinação não diferiram em relação à mortalidade por covid-19, mas tiveram risco reduzido de infeções por SARS-CoV-2”.

    John Ioannidis, conceituado epidemiologista e professor de Medicina na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos.

    E salientam que “os grupos menos vacinados também produziram um risco de infeção por SARS-CoV-2 significativamente menor em comparação com o grupo de quatro doses da vacina em 2023, uma descoberta que se encaixa bem com um estudo de acompanhamento de relativamente longo prazo do Catar”.

    Os autores do estudo lembram ainda que os dados do mesmo estudo no Qatar “sugerem que a imunidade natural confere uma proteção muito forte contra covid-19 grave sem evidência de redução de imunidade, uma conclusão que é suportada por uma revisão sistemática e meta-análises”.

    Assim, os dados observados neste estudo na Áustria levaram à conclusão de que “na população geral da Áustria com história de infeção por SARS-CoV-2 não observámos uma eficácia relativa da vacina (ERV) significativa para uma quarta dose da vacina para mortes por covid-19 durante um período com risco absoluto já muito baixo para este desfecho”.

    Quanto a infecções, os investigadores documentaram “uma ERV transitória para infeções por SARS-CoV-2, mas este efeito foi revertido durante o acompanhamento prolongado (dos sujeitos) em 2023”.

    Assim, “até 30 de junho de 2023, um total de 536.376 indivíduos tinham recebido a quarta dose da vacina, com relativamente poucas quartas vacinas adicionais em 2023”, e observou-se que “a ERV da quarta vacinação versus todos os grupos menos vacinados diminuiu gradualmente de novembro de 2022 a junho de 2023”.

    Segundo os investigadores, as suas “descobertas encaixam-se bem na hipótese de diminuição de eficácia e, assim, na mudança das relações risco-benefício de vacinações adicionais durante a transição da pandemia de covid-19 para sua fase endémica.”

    Salientam que “tendo em vista a forte proteção imunológica em toda a população devido a infeções e vacinações anteriores, é tentador especular que as infeções por SARS-CoV-2 já podem assemelhar-se, em 2023, a outros coronavírus humanos”. 

    Explicam ainda que “as infeções e/ou vacinas por SARS-CoV-2 contribuíram para a transição desta pandemia de covid-19 para a endemicidade com taxas de letalidade muito baixas, conforme documentado na nossa investigação”. Frisam que “a magnitude das alterações no risco de infeção em função do tempo decorrido após a última infeção anterior sugere que a imunidade natural pode ser um determinante principal da proteção imunológica numa população”.

    Deste modo, os autores do estudo destacam que “a contribuição relativa para esta proteção contra a mortalidade por covid-19 por imunidade natural e/ou induzida por vacina, pelas características da variante Omicron, pelos avanços no tratamento de covid-19 ou por outros fatores, continua a ser especulativo”.

    white thermometer at 36 degrees celsius

    Os investigadores terminam salientando que os seus dados “exigem confirmação em outras populações nacionais e são importantes para decidir futuras políticas de saúde pública e vacinas contra a covid-19”. Mas sublinham que os seus dados “também ressaltam o papel crítico da vigilância nacional ativa da saúde durante uma pandemia”.

    Em Portugal, as vacinas contra a covid-19 são grátis (suportadas pelo Estado) e recomendadas para os grupos mais vulneráveis, incluindo os maiores de 65 anos e os portadores de doenças de risco, entre os seis meses e os 59 anos de idade, e ainda para os profissionais que tenham contacto com pacientes e as grávidas.

  • Universidade do Porto ‘presa’ a uma tenda de 4.000 euros por mês

    Universidade do Porto ‘presa’ a uma tenda de 4.000 euros por mês


    A Universidade do Porto está a pagar mais de 4.000 euros por mês pelo aluguer de uma tenda instalada nos jardins de um palacete de que é proprietária, a Casa do Primo Madeira, onde funciona o Círculo Universitário do Porto. O aluguer, iniciado no ano passado e que poderá durar pelo menos até 2025, vai orçar em cerca de 245 mil euros, mas a Reitoria achou por bem assumir esse encargo que beneficia uma empresa de dois netos do fundador da Mota-Engil, Manuel António da Mota. Para justificar os contratos por ajuste directo à Saiotes & Etc, a Reitoria alega nos dois últimos contratos, o mais recente assinado na segunda-feira passada, que não existe concorrência por “motivos técnicos”.


    Sem concurso, alegando inexistência de concorrência por “motivos técnicos”, a Universidade do Porto vai pagar uma pequena fortuna para alugar uma tenda montada nas suas próprias instalações, no jardim do Círculo Universitário do Porto. A Universidade diz que precisa do equipamento, nomeadamente para o subalugar para a realização de eventos, sobretudo casamentos, mas a forma como justifica um ajuste directo por suposta ausência de concorrência, mostra sobretudo uma estória com algumas pontas soltas.

    O contrato adjudicado por ajuste directo, assinado na passada segunda-feira, prevê que, até ao final de 2025, a Universidade pagará mais de 4.000 euros por mês à Saiotes e Etc – Festas Lda., proprietária do equipamento. No total, a Universidade poderá desembolsar 112.634,38 euros neste aluguer, se houver a prorrogação prevista para 2025, que também incluiu mais de 11 mil euros para manutenção preventiva e corretiva. Ou seja, estamos perante um aluguer de uma tenda nos terrenos que pertencem ao ‘inquilino’, sendo que o ‘inquilino’, além da renda, paga os arranjos da tenda.

    O pavilhão alugado pela Universidade do Porto é propriedade da Saiotes & Etc. – Festas e foi instalado no jardim do Círculo Universitário do Porto em 2016 pela antiga concessionária do Círculo, com autorização da Universidade.

    A justificação da Universidade para a atribuição deste negócio sem concurso é de que não existe uma alternativa, ou seja, uma outra empresa no mercado que instale e alugue um pavilhão-tenda equipado com as mesmas características, embora o mercado seja abundante neste tipo de estruturas.

    Mas a Universidade do Porto garantiu ao PÁGINA UM que a única empresa a quem pode alugar um equipamento similar é mesmo só a Saiotes & Etc – Festas Lda., uma vez que esta empresa já seria a detentora de pavilhão-tenda entretanto montado naquele espaço universitário.

    A empresa em causa é uma sociedade por quotas, organizadora de eventos, que tem a particularidade de ter como sócios-gerentes os irmãos Maria Clara Mota de Meireles Mendes e António Mota de Meireles – netos do fundador da construtora Mota-Engil, Manuel António da Mota. Maria Clara Mendes é, aliás, uma das administradoras da Fundação Manuel António da Mota no mandato de 2022-2025, sendo também sócia-gerente, com o irmão, da Verotâmega, uma sociedade Imobiliária detida em parceria com a mãe e irmã.

    Fachada do palacete do Círculo Universitário do Porto. Nos jardins foi autorizada a instalação de uma tenda desde 2016. A Reitoria agora paga uma renda mensal de mais de 4.000 euros.

    Este aluguer não é o primeiro pela Universidade do Porto à empresa Saiotes & Etc, mas é aquele que consolida um ‘facto consumado’. Em Fevereiro do ano passado, as duas partes tinham celebrado um contrato de aluguer por três meses, no valor de 15.200 euros, mas aí a fundamentação para o ajuste directo foi por estar abaixo dos 20 mil euros. Em Junho seria celebrado outro contrato, com uma renda mensal de 3.750 euros acrescidas de despesas de manutenção, que se prolongou até finais de Outubro deste ano. Neste caso, o ajuste directo já passou a ser justificado por ausência de concorrência por “motivos técnicos”.

    Mas afinal quais são os “motivos técnicos” que impedem a realização de um concurso público pela Universidade do Porto, com a possibilidade de outras empresas fazerem propostas mais aliciantes? Ou qual o motivo para a Universidade do Porto não assumir os custos da instalação da tenda e depois a concessionar, em vez de optar por alugar um espaço nos seus próprios terrenos?

    Segundo o director de comunicação da Reitoria da Universidade do Porto, Raul Santos, “o aluguer ou a aquisição permanente de outra estrutura semelhante implicaria custos superiores a este contrato”. Aos olhos da Universidade do Porto, o aluguer da tenda é essencial se quiser obter receitas com o subaluguer do espaço para a realização de casamentos, festas e outros eventos, já que o pavilhão/tenda tem capacidade para 400 pessoas e está já equipado.

    Maria Clara Mota Mendes, sócia-gerente da Saiotes & Etc. – Festas e administradora
    da Fundação Manuel António da Mota.

    De acordo com a mesma fonte, a origem do pavilhão da Saiotes & Etc remonta a 2016, quando então existia uma concessão dos espaços do Círculo Universitário a um empresa privada, a Silva Carvalho. Na altura, a montagem da estrutura da tenda da Saiotes & Etc obteve “autorização da Universidade” e “tem licença de utilização”. Porém, não existe qualquer contrato para a instalação da tenda disponível no Portal Base, visto que o negócio acabou por ser realizado entre duas entidades privadas, não se sabendo, por isso, os moldes em que foi feito. Aparentemente, a Universidade do Porto não salvaguardou os interesses para a situação, que se veio a verificar, de assumir novamente a gestão do Círculo Universitário.

    Na altura da montagem da tenda em 2016, o objectivo da empresa concessionária (Silva Carvalho) foi substituir uma outra já existente mas em mau estado. O Círculo era então gerido pela Associação de Estudantes e que “estava em mau estado”. Mas durante a sua gestão pela Associação, o Círculo Universitário do Porto entrou em grave crise financeira com suspeitas de fraude, e a Universidade acabou por assumir a posse e as dívidas, tendo então decidido concessioná-lo até Novembro de 2021. Depois dessa data, a Reitoria assumiu a sua gestão.

    A opção pela compra de uma tenda colocou-se, mas de acordo com Raul Santos, “uma consulta ao mercado demonstrou que, atualmente, a aquisição de um pavilhão semelhante representaria um investimento superior a 280 mil euros, acrescido de IVA e do custo associado às respetivas infraestruturas necessárias para o funcionamento do espaço, nomeadamente: fundações, cozinha, instalações sanitárias, redes de saneamento, redes elétricas, entre outras”.

    Por outro lado, acrescenta a mesma fonte, “a desmontagem e a construção de um novo pavilhão, traduzir-se-ia em lucros cessantes para a Universidade, uma vez que obrigaria à paragem da atividade do Círculo Universitário [durante algum tempo], o que representaria um prejuízo de receita, na medida em que este espaço tem vindo a ser rentabilizado através do aluguer para eventos privados, existindo uma calendarização considerável de eventos já contratualizados”, justificou. Em todo o caso, saliente-se, com os três contratos por ajuste directo (alegando em dois dos casos uma norma de questionável aplicação (ausência de concorrência por “motivos técnicos”) já ascendem a quase 245 mil euros, IVA incluído, e quando chegar ao final de 2025. E novo aluguer terá de ser concretizado se a Reitoria quiser continuar a ter uma tenda no Círculo Universitário.

    Ricardo Magalhães, director-executivo da Saiotes & Etc disse ao PÁGINA UM que a compra do equipamento pela Universidade do Porto “já esteve em cima da mesa”, mas “o negócio não foi para a frente”. Até porque a compra da tenda equipada só faria sentido se a estratégia da Universidade passasse por manter o negócio de a alugar para a realização de eventos, o que não é certo. O responsável pela empresa garantiu ainda que se a Universidade optar por não usar a tenda a desmontagem será fácil, sendo necessário retirar apenas também os contentores que compõem a cozinha e WCs de apoio.

    Além dos três contratos já efectuados com a Universidade do Porto, a Saiotes & Etc tem apenas mais um contrato registado no Portal Base, com o Instituto de Emprego e Formação Profissional, no valor de 19.988 euros. Neste último caso, o contrato, também por ajuste directo, diz respeito a “aquisição de serviços de apoio, promoção e suporte técnico” do ‘Fórum Social do Porto’.

    O Círculo Universitário do Porto está instalado num palacete oitocentista, denominado Casa do Primo Madeira, localizado na Rua do Campo Alegre. Nos anos de 1980 foi sujeita a obras de reabilitação pelo arquitecto Fernando Távora, que lhe valeu o Prémio João de Almada, para recuperação do património arquitectónico da cidade do Porto, quando já estava então na posse da Universidade.

  • Máscaras em crianças: afinal, ‘provas’ de protecção estavam enviesadas

    Máscaras em crianças: afinal, ‘provas’ de protecção estavam enviesadas


    Estudos utilizados por políticos para impor o uso de máscara por crianças durante a pandemia, por supostamente impedir a transmissão do vírus, sofrem de enviesamento que implicou conclusões incorrectas. Na conceituada revista Archives of Disease in Childhood, do Grupo BMJ, uma revisão sistemática de artigos saídos no auge da pandemia (e das restrições políticas) conclui que, afinal, “dados científicos não apoiam o uso de máscara em crianças para proteção contra a covid-19”. Os investigadores destacam sobretudo os prejuízos no desenvolvimento emocional e da linguagem das crianças pela imposição das máscaras em crianças, sentenciando que “na Medicina, novas intervenções com benefícios desconhecidos, mas riscos conhecidos ou potenciais, não podem ser eticamente recomendadas ou aplicadas até que a ausência de danos seja demonstrada”. Recorde-se que em Portugal, a Direcção-Geral da Saúde impôs a obrigatoriedade do uso de máscara a crianças com mais de 10 anos, nas longas horas de aulas na escola, nos estabelecimentos de saúde e nos transportes. Recomendou ainda “fortemente” o uso de máscara por crianças entre os seis e os nove anos”, no interior e no exterior.


    Foram meses infindáveis de imposições de restrições sobre crianças e jovens durante a pandemia, que implicou o encerramento de escolas, a imposição de máscaras faciais e um afastamento social, que incluiu, até a ‘invenção’ de chapéus que impedia a aproximação. As ‘medidas’ foram então, desde 2020 até 2022, justificadas como necessárias para controlar a covid-19 e fundamentadas supostamente na Ciência. Foi erro, assim conclui uma revisão sistemática publicada na revista científica Archives of Disease in Childhood, do grupo editorial BMJ, assinado por seis investigadores dos Estados Unidos, Reino Unido e Dinamarca, incluindo um professor da prestigiada Universidade de Stanford.

    Mas a Ciência não é infalível, porque feita por homens e mulheres com virtudes e defeitos, e nem sempre aquilo que inicialmente sai é infalível; pode ter erros (involuntários e intencionais) ou enviesamentos que originam más conclusões, e que serão depois corrigidos, com mais tempo e maior ponderação, pela própria Ciência. Sendo natural tal processo, o pior é quando a Ciência quer dar respostas imediatas e insofismáveis porque há uma ‘narrativa política’ que precisa de sustentação de cientistas. E houve muitos que se predispuserem a fazer ‘má Ciência’, e acabaram agora por ser ‘arrasados’ pelo artigo publicado na semana passada sob o título “Child mask mandates for COVID-19: a systematic review“.

    People Wearing DIY Masks

    Recordando que ainda existem países e entidades governamentais que continuam a recomendar o uso de máscaras, os investigadores salientam que isso “parece ser inteiramente baseado em dados observacionais que encontram associações com taxas de casos mais baixas em indivíduos mascarados versus não mascarados, mas não leva em conta as potenciais consequências adversas, especialmente em crianças pequenas, incluindo, mas não se limitando, ao impacto na fala, linguagem, aprendizagem, saúde mental e factores fisiológicos”. Os investigadores relembram que “o reconhecimento das expressões faciais é fundamental para a capacidade das crianças de comunicar, compreender e demonstrar emoções”, além de que “o uso da máscara também pode causar dificuldades respiratórias, dores de cabeça, dermatite, desconforto geral e dor”.

    Mas se estes efeitos adversos eram já reconhecidos, embora sempre minimizados pelas autoridades, entre as quais a portuguesa Direcção-Geral da Saúde, a grande novidade deste artigo científico publicado na passada semana acaba por ser a descoberta de que os estudos observacionais usados para impor as máscaras em crianças continham erros científicos graves.

    A partir de uma análise preliminar de quase 600 artigos científicos sobre máscaras, os investigadores identificaram um total de 22 estudos observacionais, concluindo que “16 estudos não encontraram nenhum efeito do uso de máscara na infecção ou transmissão [por covid-19]”. Quanto aos restantes seis estudos “que relataram uma associação entre o uso de máscara infantil e menor taxa de infeção ou soropositividade para anticorpos”, cinco apresentaram um risco crítico de viés e um sofria de risco grave. “Todos os seis [estudos] foram potencialmente confundidos por diferenças importantes entre os grupos mascarados e não mascarados e dois demonstraram ter resultados não significativos quando reanalisados”, frisam.

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    Nos 16 estudos científicos que não encontraram uma correlação significativa entre o uso de máscara por crianças e a infecção e transmissão do vírus, um (6,3%) tinha um potencial risco de enviesamento “crítico”, 10 (62,5%) tinham um risco grave e cinco (31,3%) tinham um risco moderado, baixo ou nenhum.

    Os investigadores são, por isso, taxativos: “como os benefícios do uso de máscara para covid-19 não foram identificados, deve-se reconhecer que as recomendações de máscara para crianças não são suportadas por evidências científicas”. “Nesta revisão sistemática, não encontramos nenhuma evidência de benefício de mascarar crianças, para se proteger ou aqueles ao seu redor, da covid-19”, afirmam os investigadores.

    “A eficácia no mundo real dos mandatos de máscaras infantis contra a transmissão ou infeção por SARS-CoV-2 não foi demonstrada com evidências de alta qualidade. O actual conjunto de dados científicos não apoia o uso de máscara em crianças para proteção contra a covid-19”, concluem ainda.

    Segundo o artigo científico, os estudos observacionais que relataram “uma associação negativa entre o uso de máscara e taxas de covid-19 não conseguiram demonstrar um benefício quando factores que provocam confusão foram adequadamente considerados”. Já estudos observacionais maiores, “incluindo uma análise de regressão-descontinuidade e uma reanálise mais robusta de uma publicação anterior bem como outros estudos observacionais, não encontraram benefício do uso de máscara contra a covid-19”.

    Além das máscaras, foi imposto o afastamento, havendo mesmo ‘invenções’ como chapéus que não permitiam a proximidade entre as crianças. Esta foto foi divulgada em Junho de 2020 pela autarquia de Arcos de Valdevez.

    Estudos observacionais em adultos, adiantam ainda os investigadores, “também falham repetidamente em se ajustar adequadamente para factores que provocam confusão para evitar enviesamento”. Apontam também que um estudo observacional de Boston afirmou que se poderia inferir causalidade entre o levantamento dos mandatos de máscara escolar e o aumento nos casos [de covid-19] de alunos e funcionários usando um método de controlo de ‘antes e depois’. “No entanto, uma reanálise subsequente questionou a metodologia e os resultados deste estudo e não encontrou a mesma associação ao expandir a população para incluir todo o Estado ou usar análises estatísticas diferentes, e também descobriu que os resultados do estudo inicial provavelmente foram confundidos por diferenças nas taxas de infeção prévia”, salientam.

    Os investigadores referem, de igual modo, que “estudos observacionais também não conseguiram encontrar uma associação entre o uso voluntário de máscara entre adultos nas escolas e menores hipóteses de haver covid-19 na escola ou entre mandatos de máscara ou uso de máscara e transmissão reduzida”. “Além disso, uma revisão sistemática mostrou uma taxa de infecção secundária 10 vezes menor nas escolas em comparação com ambientes comunitários/domésticos”.

    Em Portugal, na pandemia de covid-19, a Direcção-Geral da Saúde, então liderada por Graça Freitas, impôs a obrigatoriedade do uso de máscara a crianças com mais de 10 anos, nomeadamente nas longas horas de aulas na escola, nos estabelecimentos de saúde e nos transportes. “Nas crianças com idade entre seis e nove anos, e para todas as que frequentam o 1.º ciclo do ensino básico independentemente da idade, a utilização de máscara comunitária certificada ou máscara cirúrgica é fortemente recomendada, como medida adicional de proteção, em espaços interiores ou exteriores”, indicaram as normas da DGS durante a pandemia.

    Além de não existirem benefícios associados, os autores do artigo de revisão sistemática, salientam que o uso de máscara por crianças pode ter afectado “o desenvolvimento emocional, do discurso e da linguagem”, podendo incluir ainda “desconforto físico, contribuindo para a redução do tempo e da intensidade do exercício e das atividades de aprendizagem”, sendo “os efeitos a longo prazo demasiado precoces para serem medidos”.

    Os investigadores salientam ainda, nos efeitos adversos, que se “descobriu também que o uso de máscara leva a um rápido aumento no teor de CO2 [dióxido de carbono] no ar inalado – maior em crianças do que em adultos – e a níveis acima dos padrões de segurança aceitáveis para trabalhadores adultos saudáveis, que podem aumentar ainda mais com o esforço físico”.

    “Em resumo”, continuam, “a obrigatoriedade de uso de máscara em crianças falha numa análise básica de risco-benefício”, concluindo que “recomendar o uso de máscara infantil para evitar a propagação da covid-19 não é suportado pelos dados científicos actuais e é inconsistente com as normas éticas aceites que visam fornecer proteção adicional contra danos para populações vulneráveis” numa pespectiva social, ademais sabendo-se que a covid-19 tinha uma taxa de letalidade virtualmente de zero em crianças saudáveis.

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    Os investigadores recomendam assim que “os adultos que trabalhem com crianças devem ser educados sobre a falta de benefícios claros e os potenciais danos de colocar máscaras em crianças, e não há evidências científicas que apoiem uma recomendação para o uso de máscara nessas profissões”.

    Também recomendam que médicos e enfermeiros sejam “educados sobre a ausência de dados de alta qualidade que apoiem o uso de máscara para reduzir os riscos de infeção e transmissão por SARS-CoV-2”.

    Para realizar este artigo científico, os investigadores pesquisaram e analisaram bases de dados até fevereiro de 2023. Os estudos seleccionados foram alvo de uma análise de risco de enviesamento realizada por dois revisores independentes e julgada por um terceiro avaliador.

    No total, foram selecionados 597 estudos e incluídos 22 na análise final. Os investigadores relataram que não houve estudos clínicos randomizados e controlados em crianças para avaliar os benefícios do uso de máscara para reduzir a infeção ou transmissão por SARS-CoV-2.

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    No caso dos adultos, o artigo científico recorda que “há apenas um número limitado de estudos randomizados publicados de uso de máscara e prevenção da covid-19”. O estudo “DANMASK-19 não conseguiu encontrar uma redução de 50% nas infeções por covid-19 em utilizadores de máscaras cirúrgicas na comunidade”.

    Um outro estudo randomizado no Bangladesh “não encontrou nenhum efeito do uso comunitário de máscara de pano em infeções por covid-19, nenhuma redução do uso de máscara cirúrgica para qualquer pessoa com menos de 50 anos e apenas uma redução marginal entre pessoas de mais de 50 anos e no contexto do distanciamento físico imposto por observadores, uma associação que foi considerada insignificante após a reanálise”.

    Num outro estudo, “predominantemente de adultos, de quase 40.000 participantes a partir dos 10 anos (mas não relatado por faixa etária e, portanto, não incluído em nossa revisão sistemática), não houve diferença na doença ou mortalidade semelhante à covid-19 entre grupos mascarados e sem máscara”.

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    Os investigadores lembram ainda que uma revisão sistemática feita pela prestigiada Cochrane, publicada em 2011, ou seja muito antes do surgimento do SARS-CoV-2, já constatara de forma semelhante que o uso de máscaras cirúrgicas e respiradores em adultos tem “pouco efeito na transmissão de vírus respiratórios, enquanto os efeitos colaterais incluíram desconforto”. Na versão atualizada de 2023 dessa revisão, que incluiu covid-19, essas conclusões permaneceram inalteradas.

    O artigo científico sentencia, por fim, que “na Medicina, novas intervenções com benefícios desconhecidos, mas riscos conhecidos ou potenciais, não podem ser eticamente recomendadas ou aplicadas até que a ausência de danos seja demonstrada. Em vez disso, o padrão aceite é que uma intervenção só deve ser empregada depois de ter sido demonstrado o benefício, idealmente através de um estudo clínico randomizado, juntamente com dados de segurança para garantir que os benefícios comprovados superam os danos”, sendo “o ónus da prova de que uma intervenção é segura e benéfica é da responsabilidade da pessoa, instituição ou organismo que executa e recomenda essa intervenção”.