Não são pequenas nem remediadas as empresas que atribuem avenças à Spinumviva, a consultora criada por Luís Montenegro e gerida, na sua casa de Espinho, pela sua mulher e dois filhos. Os irmãos Violas – donos da Solverde e da CLIP – e Fernando Pinho Teixeira – dono da Ferpinta – estão no top 30 das maiores fortunas nacionais. E a Rádio Popular, de dois irmãos de Vila Nova de Gaia, é uma cadeia de lojas de electrodomésticos em franca projecção financeira.
Mais do que olhar para esse status financeiro, aquilo que maior estranheza pode causar é a necessidade de estes empresários recorrerem aos serviços externos de um político no activo – e ainda mais de uma empresa familiar de um primeiro-ministro – se o objectivo fosse somente executar uma simples tarefa de encarregado de protecção de dados. A proximidade geográfica aparenta ser uma explicação, o que configura uma teia de influências também pessoais.
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De entre as clientes da Spinumviva, a que chama mais atenção é a Solverde. Mas embora seja uma empresa bastante lucrativa, com cerca de 14 milhões de euros de resultados líquidos positivos em 2023, este valor acaba por se ‘diluir’ no colosso da ‘casa-mãe’, o Grupo Violas – a SGPS que consolida as contas das dezenas de empresas dos irmãos Manuel e Rita Violas.
De acordo com as contas consolidadas referentes aos dois últimos exercícios – as contas de 2024 ainda não foram concluídas –, consultadas pelo PÁGINA UM, o Grupo Violas registou uma facturação superior a 962 milhões de euros em 2023, que resultou num lucro de 84,4 milhões de euros. Juntando os dois anos, o grupo familiar acumulou lucros de 163 milhões de euros, com resultados operacionais que ascenderam a quase 362 milhões de euros. Os resultados, contudo, poderiam ainda ser melhores se não fosse o elevado endividamento das diversas empresas, que ‘obrigaram’ a despender mais de 35 milhões de euros em juros em 2022 e 2023, dos quais 21 milhões neste último ano. Todo o Grupo Violas conta com 3725 trabalhadores.
Os irmãos Manuel e Rita Celeste, cuja fortuna está avaliada em cerca de 939 milhões de euros, encontram-se na 14ª posição da lista dos mais ricos da Forbes Portugal. Só no capital próprio do grupo – detida em partes iguais pelos dois irmãos – estão contabilizados 710 milhões de euros, que obviamente excluem eventuais distribuições de dividendos e recebimentos como administradores. Tamanho desempenho do grupo deve-se ao conglomerado de negócios e dezenas de participações directas e indirectas em empresas de diversos sectores: dos casinos, às bebidas, passando pelo imobiliário e pela educação, sendo que 53% dos lucros de 2023 vieram de empresas não controladas.
Apesar da gestão discreta destas actividades empresariais, os dois irmãos de Espinho têm sido atingidos por algumas polémicas. Em 2021, o Expresso revelou que os irmãos Violas surgiam nos ‘Pandora Papers’ como dono da empresa Marplex Enterprises Limited, criada em 2010 nas Ilhas Virgens Britânicas. Segundo o jornal, a base de dados dos ‘Pandora Papers’ apontava que a Marplex tinha dois beneficiários: Manuel Violas e a irmã Rita Celeste Violas.
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Na altura, o Expresso questionou o empresário de Espinho, através da assessoria de comunicação do grupo Solverde, mas sem qualquer sucesso. Desconhece-se, assim, se o alegado uso de uma off-shore tinha algum objetivo de optimização fiscal. Em todo o caso, acrescente-se que o Grupo Violas apresenta, nas contas consolidadas de 2022 e 2023, o pagamento de impostos (IRC) de 54,7 milhões de euros ao Estado.
A segunda cliente mais importante da família Montenegro, o Grupo Ferpinta, pertence ao empresário Fernando Pinho Teixeira com uma fortuna avaliada em cerca de 493 milhões de euros, o que o levou a ocupar, no ano passado, a 26ª posição da lista dos mais ricos da revista Forbes Portugal.
O denominado ‘rei do aço’ tem o negócio em Oliveira de Azeméis, também no distrito de Aveiro, tendo, nos últimos anos, alargado os negócios para Espanha e África (Costa do Marfim e Guiné-Bissau) e para o sector dos equipamentos agrícolas e para o turismo, já com dois resorts no arquipélago da Madeira. A facturação em 2023, de acordo com as contas consolidadas analisadas pelo PÁGINA UM, rondou os 305 milhões de euros, mas os lucros cifraram-se nos 16,6 milhões de euros, uma queda de 61% face a ano anterior. Em todo o caso, os activos da Ferpinta atingem os 317 milhões de euros e os capitais próprios aproximam-se dos 272 milhões.
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Também discreto, o empresário esteve envolvido numa polémica familiar e fiscal ao ter sido condenado a pagar 2,7 milhões de euros por esconder a fortuna ao Fisco. A condenação surgiu depois de o milionário ter sido apanhado por ter realizado uma operação financeira, que envolveu a passagem para os filhos do domínio do Grupo. Tudo para evitar que a actriz Marina Santiago, nascida de uma relação extramatrimonial, fosse reconhecida como filha. A actriz tinha iniciado uma acção de investigação da paternidade em Janeiro de 2006, situação que recebeu forte oposição do empresário.
Apesar disso, em 2016, o comendador foi declarado pelo Supremo Tribunal de Justiça como pai da actriz e o milionário viu recusada a pretensão de ser retirado à filha o direito de ser sua herdeira. Nesse processo, o principal acionista da Ferpinta faltou por cinco vezes à realização de testes de ADN no Instituto de Medicina Legal do Porto, e apenas anuiu por ordem do Supremo Tribunal de Justiça. O teste de ADN confirmou a filiação.
A terceira grande cliente da família Montenegro é a Rádio Popular, com sede na Maia, a conhecida cadeia de 61 lojas de venda de electrodomésticos, detida pelo Grupo Hipotenusa, dos irmãos Ilídio e Edgar Oliveira e Silva. A sede do grupo é em Arcozelo, no concelho de Vila Nova de Gaia, mas os dois irmãos também têm interesses empresariais em Espinho, uma vez que são proprietários da imobiliária Promoespinho.
Apesar de não serem tão ricos como os irmãos Viola e o comendador Fernando Pinho Teixeira, os irmãos Oliveira e Silva não se podem queixar. Em 2023, a Rádio Popular facturou, de acordo com a análise do PÁGINA UM, cerca de 266 milhões de euros, apresentando lucros de 11,7 milhões de euros. O capital próprio da empresa atingia então os 39 milhões de euros, quase quatro vezes o valor investido pelos dois irmãos accionistas.
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Por fim, a quarta cliente da família Montenegro – se se considerar que o Grupo Violas agrega a CLIP e a Ferpinta – é a Lopes Barata Consultoria e Gestão, menos conhecida e aparentemente menos desafogada. Fundada em 2016, a empresa tem sido em Arcozelo, no concelho de Vila Nova de Gaiam, sendo detida por Gustavo Barata e a mulher.
Exercendo actividade no comércio por grosso de produtos farmacêuticos – durante a pandemia chegaram a vender 50 mil euros em equipamentos de protecção individual ao município do Porto –, ignora-se a situação financeira da empresa, porque esta simplesmente nem deposita as contas desde 2017. Em todo o caso, segundo apurou o PÁGINA UM, Gustavo Barata detém sete farmácias e uma parafarmácia, nos distritos do Porto e Braga, através da empresa unipessoal Lopes Barata Unipessoal. A empresa, contudo, não apresentou a Informação Empresarial Simplificada relativa ao ano de 2023.