Banco de Portugal vai gastar meio milhão de euros em ‘cápsulas telefónicas’ de luxo

A man sitting in a chair in a room

A privacidade sem barulho das chamadas telefónicas no Banco de Portugal vai ter um ‘custo fixo’: 484.620 euros. É este o preço que a entidade liderada por Mário Centeno está disposta a gastar na compra de cabines acústicas. Mas não serão umas cabines banais; estas serão uma espécie de ‘cápsulas telefónicas’ de luxo, porque não apenas insonorizam como são anti-sísmicas, estofadas com tecido de lã, ao melhor estilo italiano, e equipadas com luz LED e pré-instalação de TV. Pode cair o mundo ou haver ‘festa rija’ em ambiente ‘open space’, mas a privacidade está garantida.

Recorde-se que o Banco de Portugal começará a transferir, a partir de Março, cerca de mil trabalhadores do Edifício Portugal, na Avenida Almirante Reis, em Lisboa, para o Edifício Marconi. Enquanto no actual edifício muitos dos trabalhadores estão instalados em gabinetes, no novo local vão passar a trabalhar em ambiente ‘open space’. Aliás, como o PÁGINA UM noticiou, o Banco de Portugal contratou uma consultora por ajuste directo para, entre outras tarefas, ajudar os funcionários a ‘mentalizarem-se’ para o trabalho em ‘open space’.

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O Banco de Portugal vai adquirir, no mínimo, cabines acústicas similares à da foto. No total, a ‘privacidade’ dos seus trabalhadores quando fazem telefonemas vai custar até 484.000 euros. / Foto: D.R.

O concurso público para a compra das cabines acústicas está ainda em curso e no caderno de encargos o Banco de Portugal afirma pretender adquirir, no mínimo, 20 cabines, mas admite comprar mais unidades durante a vigência do contrato, que poderá ir até aos dois anos. No total, o Banco admite vir assim a gastar até 484.000 euros (com IVA incluído) na compra daqueles equipamentos. No mínimo serão adquiridas 20, mas a quantidade poderá aproximar-se das 35.

E o Banco de Portugal deixa claro o tipo de cabines que quer. Assim, diz que “pretende adquirir cabines acústicas Hybrid que permita proporcionar um espaço privado e funcional em ambientes profissionais, maximizando tanto o conforto como a produtividade dos utilizadores”, salientando que estas “são particularmente adequadas para ambientes de trabalho em ‘open-space’, proporcionando condições ideais para chamadas telefónicas, videoconferências ou trabalho individual em silêncio”.

As características técnicas não são tudo. A estética para o Banco de Portugal também vale como ouro. Assim, “além da sua elevada performance acústica e funcionalidade”, o caderno de encargos saliente que “os cantos [das cabines] deverão ser arredondados conferindo-lhes uma aparência moderna e elegante, em harmonia com o projecto de arquitectura de interiores”. Ou seja, “a escolha cuidadosa dos acabamentos exteriores, da alcatifa e dos revestimentos interiores desempenha um papel crucial na valorização da solução pretendida”, porque a “sua coerência estética está alinhada com o conceito global idealizado para o espaço”. Os dinheiros públicos devem assim ser gastos com elegância.

Os cerca de 1000 trabalhadores que o Banco de Portugal tem no Edifício Portugal, na Avenida Almirante Reis, vão ser transferidos temporariamente para o Edifício Marconi, em Entrecampos. Depois, irão ser, de novo, transferidos para o novo edifício que a instituição vai construir num terreno adjacente ao Edifício Marconi, onde antes ficava a Feira Popular. / Foto: PÁGINA UM

Segundo as exigências do Banco de Portugal, “as cabines pretendidas possibilitam a instalação de monitores com suporte VESA estando equipadas com uma mesa de trabalho ajustável em profundidade, garantindo uma adaptação às necessidades específicas de cada utilizador”. Terão ainda de ter iluminação LED para “proporcionar um ambiente confortável, e, além disso,
uma iluminação frontal facial favorável para videoconferências”. Apesar de anti-sísmicas, “as cabines acústicas deverão estar equipadas com rodas, permitindo uma fácil mobilidade e reposicionamento conforme necessário”.

Em ‘cima da mesa’ estará, assim, a aquisição de dois tipos de cabines acústicas existentes no mercado, embora a instituição ponha a hipótese de só comprar um dos modelos. No caso da “cabine acústica com suporte de monitor (Cabine A)”, o preço unitário base fixado pelo caderno de encargos é de 13.530 euros (com IVA incluído). Já a “cabine acústica sem suporte de monitor (Cabine B)” tem o preço base de 13.407 euros.

Desenho do modelo da cabine acústica ‘A’ conforme o caderno de encargos do concurso público que está em curso. / Foto: D.R.

Nada foi esquecido no detalhe. Por exemplo, a cabine acústica ‘hybrid’ com suporte deverá vir equipada com as seguintes características: “painéis interiores estofados em tecidos tipo ‘WOOL’; faixas de iluminação facial adicionais com intensidade ajustável; redução do nível de voz a 26,4 décibeis para assegurar a privacidade das conversas; sistema de ventilação automática e iluminação LED para máximo conforto; rodas integradas para facilitar o transporte da cabina transporte”.

Em termos de dimensões no exterior, deverá medir 223 centímetros (cm) de altura por 124,4 cm de largura e 90 cm de profundidade, mas o interior é mais acanhado. Para quem sofra de claustrofobia, a altura é razoável, mas não tanto a largura e profundidade.

Em todo o caso, as cabines não serão ‘bunkers’. Em matéria de acabamentos exteriores, exige-se uma “placa alveolar de 3 camadas, 38 milímetros (mm) de espessura, ambas as faces revestidas a melamina, na cor branca de série, com acabamento em tecnologia laser”. Os vidros das cabines serão em laminado acústico com camada intermédia de vinil, havendo ainda de ter a “opção de autocolante de privacidade”.

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Foto: D.R.

Para cabines de 13 mil euros, o Banco de Portugal exige que os painéis interiores sejam em “LDF de alta densidade (HDF) com 3 mm de espessura, revestidos com espuma de poliuretano não inflamável, estofados”, e com um “sofá de dupla face em forma de caixa com assento estofado, encosto e apoio de braços”.

Já os puxadores e dobradiças de portas terão de ser em alumínio pintado de preto, enquanto o tampos das mesas serão de aglomerado de melamina de três camadas, laminado em branco. E para conforto dos funcionários do Banco de Portugal, os estofos serão “tipo ‘WOOL’ na cor ‘BISCUIT’ (TBI)”, com uma composição que terá 70% de lã, ou seja, ao nível dos tecidos italianos de elevada qualidade.

No chão, a alcatifa terá de ser “na cor GRAPHITE”, explicitando-se que deverá ser semelhantes ao que é usada em “quartos de hotel, suite de hotel, boutique, loja, restaurante, receção, [e] escadas”. Cada cabine estará equipada com uma mesa de trabalho. Tanto o sistema de ventilação de ar, como a iluminação serão activados “por sensor de movimento”.

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Foto: D.R.

Este modelo de cabine virá equipado com um “suporte VESA para monitor/computador” e ainda “pré-instalação da infraestrutura da TV devidamente embutida no painel frontal”, bem como “faixas de luz faciais adicionais com intensidade ajustável”.

O concurso público decorre até ao próximo dia 10 de Março e o vencedor garantirá a adjudicação de um contrato pelo prazo de um ano, podendo ser renovado “automaticamente por igual período, até ao máximo de dois anos”.

Prevê-se que no final desse mês os trabalhadores do Banco de Portugal irão receber as cabines ‘privadas’, em princípio no Edifício Marconi. Isto enquanto não se mudam para o novo edifício que o Banco de Portugal pretende construir na antiga Feira de Popular. Aí será possível que haja gabinetes e que as cabines de quase meio milhão de euros possam ser descartadas.