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  • Da vida na Dinamarca, das eleições ou da procissão da Santa Igreja do Covidismo

    Da vida na Dinamarca, das eleições ou da procissão da Santa Igreja do Covidismo


    Como outros países (Inglaterra e Finlândia, além da Suécia, que esteve sempre noutro campeonato), a fria Dinamarca decretou – é mesmo essa a palavra – o fim da pandemia e vai extinguir todas as restrições à vida normal. Está, neste momento, com cerca de 493 mil pessoas classificadas como casos activos de covid-19, o que representa 8,5% da população.

    Decidiu “saudar a vida que tinham antes”, porque os óbitos atribuídos ao SARS-CoV-2 são apenas 18 por dia – o que, sabendo-se serem os seres humanos mortais, constitui um valor normal, talvez mesmo de menor agressividade do que uma gripe comum.

    No ano passado, em período homólogo, este país escandinavo – que, durante a pandemia, nem registou qualquer período de particular gravidade –, estava com 26 mortes diárias, quando tinha apenas 0,2% da sua população infectada.

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    Faz todo o sentido, os dinamarqueses levantarem as restrições. Uma doença que há um ano apresentava uma taxa de letalidade de 1,07% – sempre foi baixa na Dinamarca –, não pode continuar a ser classificada agora como crítica só porque há uma “avalanche de testes positivos”: a taxa de letalidade nos últimos seis meses é de 0,09%.

    Nesta fase, parece-me irrelevante discutir – até porque é esgotante – se esta variação extraordinária se deve à menor agressividade da variante dominante (e lembremo-nos que foram identificadas quase 1.800 linhagens do SARS-Cov-2), se à eficácia das vacinas, se à imunidade natural ou se às melhorias no tratamento.

    Vou dar de barato que seja a conjugação de todas estas variáveis, e aguardo um veredicto definitivo pela Ciência quanto ao peso mais ou menos determinante de cada uma, quando, daqui a uns anos, os investigadores decidirem mostrar renovada maturidade e independência.

    Melhor sim, é recordar, nesta reflexão, que uma das características dos seres humanos, julgo, é a capacidade de raciocinar, de olhar para os factos, interpretar e agir em consonância dentro de uma lógica analítica.

    Os dinamarqueses parecem-me mostrar a sua humanidade na decisão de viver a vida – que, infelizmente, acaba em cada indivíduo com a morte, mas que precisa de ser perpetuada, com liberdade e alegria, dentro da sociedade.

    Quanto aos portugueses, já tenho algumas dúvidas.

    Em Portugal, vivemos tempos distópicos.

    No próximo domingo, quando formos votar, tenho dúvidas sobre se o acto eleitoral é para eleger deputados em Marte ou se num país terráqueo democrático e civilizado.

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    A Doutora Graça Freitas – a senhora que, à frente da Direcção-Geral da Saúde, mais esconde e manipula informação, nada dizendo sobre matérias sensíveis – deu-se ao trabalho de redigir um parecer técnico de nove longas páginas que dariam para rir se não constituíssem um desperdício de dinheiro (que alguém vai ganhar) e um exercício de fomento do pânico.

    Vejam como se devem paramentar as equipas de entrega e recolha de voto no domicílio dos eleitores confinados, e sobretudo os delegados dos partidos e membros das mesas de voto:

    a) Uma embalagem individual de produto desinfetante de mãos, devidamente legalizada no mercado nacional através de notificação submetida à Direção-Geral da Saúde;

    b) Máscaras cirúrgicas ou máscaras FFP2, certificadas e descartáveis;

    c) Batas com abertura atrás, de uso único e impermeável, manga comprida, punhos bem ajustados e que cubra toda a roupa.

    Pelo que sei, em muitos hospitais, este é o equipamento usado nas unidades de cuidados intensivos de doentes-covid; nas outras alas, recorre-se “apenas” às máscaras FFP2.

    Por pouco a DGS não mandava equipar os operacionais do acto eleitoral como Stormtroopers do Star Wars.

    Não consta que, nos transportes públicos ou mesmo em restaurantes e outros locais fechados, se andem com tantas alfaias e outros apetrechos como os estabelecidos e enumerados pela DGS para esta autêntica procissão da Santa Igreja do Covidismo em que se transformaram as eleições legislativas.

    E isto tudo, eis o paradoxo, numas eleições que teve uma campanha em que os principais partidos políticos nada disseram sobre a pandemia, sobre os impactes da pandemia, sobre a discriminação de cidadãos durante a pandemia, sobre a recuperação do desastre económico e social por via de uma gestão desastrosa da pandemia do ponto de vista da Saúde Pública.

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    A quase generalidade dos políticos negaram a existência da pandemia, o que mostra, mais uma vez, que somos um pouco diferentes dos dinamarqueses.

    Adiante. Vamos ser claros. A pandemia em Portugal, tal como na generalidade da Europa, terminou. Esta já terminou. Achar que pode surgir uma nova variante, um novo vírus, um meteorito, um Armagedão, e achar que se deve manter tudo como nos últimos dois anos, é insano; é loucura absoluta. Não é vida. Antes a morte que tal sorte – e quem o diz é alguém que esteve em situação grave.

    Notem: no ano passado, quando então estávamos em pleno pico pandémico – com as mortes atribuídas à covid-19 acima das 200 por dia, e a mortalidade total acima dos 700 óbitos –, as medidas “impostas” pela DGS nem por sombras tinham este espalhafato. Os membros das mesas de voto tinham de usar apenas uma máscara, preferencialmente do tipo cirúrgica, a ser substituída a cada quatro horas. Nada mais, para além do desinfectante.

    Estávamos então, em finais de Janeiro de 2021, com uma taxa de letalidade de 1,69% desde o início da pandemia. Agora, nos últimos seis meses, essa taxa desceu para 0,16%.

    Existe alguma racionalidade nisto?

    Não. Talvez, porque, na verdade, há povos que perderem a capacidade de raciocinar. Como os portugueses.

  • Da democracia podre, ou das alergias do doutor Miguel Guimarães

    Da democracia podre, ou das alergias do doutor Miguel Guimarães


    Comecemos com um pouco de História: a Ordem dos Médicos, criada em 1938, é uma associação pública profissional. Chama-se Ordem, mas é uma associação: aliás, herdeira da Associação de Médicos Portugueses, fundada em 1898. Uma associação defende os seus sócios, em primeiro lugar, mesmo que até seja filantrópica, ou mesmo que os seus sócios tenham feito sim o Juramento de Hipócrates, e não estejam apenas a fazer o favor de nos salvarem a vida. Há muitas profissões, aliás, que nos salvam a vida.

    Por vantagens mútuas, o Estado foi concedendo a esta associação diversos direitos especiais – que passam, de forma sucinta, por regular o exercício da profissão dos médicos, quer no seu reconhecimento e formação quer na sua disciplina e deontologia. Porém, esses direitos trouxeram-lhe também deveres perante a sociedade: a Ordem dos Médicos é uma pessoa colectiva de direito público, e sendo assim, é escrutável pelos cidadãos. Pelos jornalistas. A sua acção pode e deve ser questionada, inquirida, analisada, criticada. São os “males” da democracia. E pode também, e deve, ser elogiada, quando é merecedora.

    Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos.

    Não está nem nunca estará em causa – e muito menos num país civilizado e com um sistema democrático – o reconhecimento do papel fundamental dos médicos – e da sua Ordem – no bem-estar da sociedade, na melhoria da qualidade de vida, no aumento da longevidade.

    Podia aqui enumerar rácios e indicadores. Se quiserem, aconselho, a título de exemplo, a leitura de um artigo do PÁGINA UM sobre a evolução de indicadores de saúde de bebés, crianças e jovens ao longo das últimas décadas. Os médicos tiveram uma quota parte fundamental nestas melhorias.

    Porém, não devemos confundir a Estrada da Beira com a beira da estrada.

    Há médicos extraordinários, outros bons, alguns sofríveis e uns poucos maus. Todos se podem encontrar, embora em proporções bem distintas: aqueles que, miraculosamente, salvam vidas, e aqueloutros que, por vezes, de forma desastrada, acidental ou negligente (espero que nenhum por intencionalidade), deixam morrer ou causam danos desnecessários.

    Estamos fartos de saber isso. Num curto espaço de tempo podemos assistir a desgraças e a milagres perpetrados por médicos. Eu que o diga. Há uns meses, um médico do Hospital de São José – que ainda, enfim, não consegui que o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central o identificasse voluntariamente (embora eu até lhe tenha feito chegar um dos meus romances, de oferta, para o animar) – cometeu uma argolada, de má sorte que estive cinco dias com um fio-guia do cateter enrodilhado no coração. A probabilidade daquilo me suceder era de 1 em 10.000. Cinco dias depois, o dito fio acabou sacado, de forma miraculosa, sem me abrirem, por um cardiologista de intervenção do Hospital de Santa Marta. Cinco dias entre um erro e um acto extraordinário.

    Portanto, não estou aqui, agora, para avaliar nem médicos nem a prática de Medicina. Estou para avaliar pessoas. Comportamentos de cidadãos. Acções de concidadãos. Tenho esse direito como cidadão. Tenho o dever como jornalista.

    Nessa perspectiva, posso e devo olhar para o comportamento do senhor José Miguel Ribeiro de Castro Guimarães que, circunstancialmente, é presidente de uma associação pública profissional, de uma pessoa colectiva de direito público, que dá pelo nome de Ordem dos Médicos. Chamam-no bastonário – advém de bastão, o símbolo de antanho empunhado pelo líder de uma confraria.

    Página 2 do parecer da CADA destacando as afirmações da Ordem dos Médicos sobre o “comportamento” do director do PÁGINA UM

    Como tal, enfim, está ele – o senhor Miguel Guimarães, mais o seu bastão de confrade-mor– e ela – Ordem dos Médicos – sob escrutínio público, e sobretudo da imprensa, em pé de igualdade com um Governo, um Ministério, uma Secretaria de Estado, uma Direcção-Geral, um Instituto Público, uma entidade ou empresa pública, ou uma autarquia.

    Sendo assim, imaginemos, um autarca, um presidente de um instituto público, um director-geral, um secretário de Estado, um ministro, um primeiro-ministro escrever à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) a acusar um jornalista, que lhe solicita documentos administrativos, de estar, “desde há vários meses, (…) a adotar um comportamento suscetível de integrar a prática de crimes para com a Ordem dos Médicos, o Bastonário (…) e alguns dos médicos seus membros”.

    Imaginam? O senhor Miguel Guimarães, sim. Tanto assim, que o escreveu, ou mandou que escrevessem por ele. Acusou um jornalista de ser criminoso. Um jornalismo de ser criminoso.

    Ora, vejamos, quais são os crimes – nem sequer alegados – que eu tenho cometido, através do PÁGINA UM, “desde há vários meses”?

    Será o crime o ter escrito o artigo “Filipe Froes tem incompatibilidades para ser consultor da Direcção-Geral da Saúde”?

    Será o crime o ter escrito o artigo “Relatora da Ordem dos Médicos que quer condenar médica por ‘negacionismo’ tem ligações a farmacêuticas”?

    Será o crime o ter escrito o artigo “Parecer admite desconhecimento dos efeitos da vacina em crianças e usa estudos não publicados nem revistos”?

    Será o crime o ter escrito o artigo “Sociedade Portuguesa de Pneumologia teve ano de ouro em receitas de farmacêuticas com 370 mil euros da Pfizer”?

    Será o crime o ter escrito vários artigos revelando dados escondidos sobre o que se passa nos hospitais portugueses e sobre o obscurantismo da directora-geral da Saúde, uma médica?

    Será o crime eu ter escrito, e fundamentado, sobre a gestão da pandemia?

    Ou será antes o crime eu andar a investigar as sociedades médicas e as suas relações perigosas – sobre as quais escrevi já o artigo “Sociedade Portuguesa de Pneumologia teve ano de ouro em receitas de farmacêuticas com 370 mil euros da Pfizer”?

    Ou será antes o crime eu andar a investigar os donativos recebidos pela Ordem dos Médicos, entre as quais a Merck, e a aplicação de mais de 1,4 milhões em donativos numa campanha (pouco transparente) denominada Todos por Quem Cuida?

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    Como pode um bastonário da Ordem dos Médicos, comportar-se como um rajá, e ter a ousadia de escrever à própria CADA a garantir que se reserva “o direito de continuar o acesso à documentação” que eu lhe vier a solicitar [e que, aliás, solicitei ainda ontem à noite]?

    Como pode um bastonário da Ordem dos Médicos acusar um jornalista de pretender “instrumentalizar a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos para atingir os seus objectivos”? Eu? Eu, que escrevo críticas à CADA por se atrasar nos prazos de elaboração dos pareceres? Eu, que critico o carácter não vinculativo dos pareceres? Eu, que critico algum enviesamento da CADA em matérias mais sensíveis?

    Qual será, enfim, o meu crime? O crime de informar? O crime de indagar? O crime de analisar? O crime de criticar? O crime de não ser um pé de microfone? O crime de não ser um jornalista-fofinho?

    Eu confesso: seria um criminoso, certamente, como jornalista, se vivesse na China ou na Coreia do Norte, ou em outro qualquer país sem liberdade de imprensa, sem liberdade de investigar e questionar. Aí sim, nesses países, o senhor Miguel Guimarães até se alegraria de ser o meu carrasco.

    Aliás, arrisco dizer, ser esse o sonho do senhor Miguel Guimarães: encarcerar-me, silenciar-me. E nem precisa de ser bastonário na China ou na Coreia do Norte. Basta-lhe deixar a nossa democracia apodrecer um bocadinho mais. Falta pouco, senhor doutor: o senhor tem contribuído para isso, “desde há vários meses”.

    P.S. Estou em lamentável incumprimento de uma promessa, mesmo não sabendo ele que a fiz. Já passaram sete meses. Tenho mesmo de ir ao Hospital de Santa Marta deixar não um mas talvez todos os meus quatro romances ao Dr. António Fiarresga, o médico que retirou o fio-guia enrodilhado no meu coração.

  • Do grande poder da imprensa: o caso da reviravolta “urgente” na cedência dos meus dados clínicos

    Do grande poder da imprensa: o caso da reviravolta “urgente” na cedência dos meus dados clínicos


    Existe uma regra no jornalismo, e no próprio Código Deontológico, que prescreve que um jornalista não deve abordar assuntos sobre os quais possui um interesse directo.

    Essa regra, convém dizer, é teórica, porque qualquer jornalista tem, em princípio, e se for decente, que pugnar pela promoção ou defesa dos sistemas democráticos, pela paz, pela liberdade de expressão e de auto-determinação, pela justiça, pela equidade, pelo respeito dos seus concidadãos. Logo, como tem ele, em princípio, interesse directo em viver numa sociedade democrática, então a aplicação literal dessa norma implicaria que nunca ele poderia denunciar atropelos à democracia.

    Em abono da verdade, um jornalista “apenas” pode e deve defender causas comuns. Ponto. E jamais deve, por isso, de prescindir do seu poder efectivo – ele existe, de facto, e tenho essa experiência, sobretudo dos tempos em que fui jornalista do Expresso ou da Grande Reportagem –, independentemente de ser um agente envolvido ou um mero observador.

    Deve, porém, esse assunto que lhe diga respeito estar integrado num interesse colectivo; não pode ser um interesse somente seu, ou do seu “clube”. Deve o jornalista, sim, usar a sua influência e as suas vivências para, relatando de forma objectiva e explicitando o seu interesse também particular, alertar ou denunciar situações que não o afectam apenas a si, mas que atinjam negativamente outros. E até mais os outros.

    Envelope registado no dia 20 de Janeiro, contendo elementos clínicos solicitados em Julho do ano passado.

    Assim, quando no dia 18 passado escrevi sobre a recusa do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC) em ceder o meu processo clínico integral, eu sabia que não estava somente a representar-me, a denunciar algo sobre o qual tinha um interesse exclusivo.

    Estava eu, sim, a acusar um problema frequente: o obscurantismo da Administração Pública.

    O obscurantismo, ou falta de transparência do Estado, é, para mim, um dos mais graves sintomas da falta de sentido democrático de um país. E tenho a percepção – diria mesmo a certeza plena – que, se esse mal comigo sucede, sucede a milhares de pessoas. Nesse aspecto, não me considero diferente dos demais concidadãos nem alvo de particular flagelação, embora por vezes pareça.

    Com efeito, por exemplo, o facto de o PÁGINA UM ter já apresentado cerca de uma dezena de queixas na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) por recusa de informação pública, ou a ausência de respostas da Direcção-Geral da Saúde às inúmeras questões que tenho colocado, não é um problema estritamente pessoal. É sim algo intrínseco, ou até inato, que está na “massa do sangue” de políticos e, sobretudo, de funcionários públicos mais preocupados em servir um Governo, ou um partido, do que servir os seus concidadãos. Esconder, esconder, esconder: mostrar dá trabalho, e por vezes chatice. A divulgação de informação e o escrutínio sempre foram uma chatice, excepto em sistemas não-democráticos, onde essas “excentricidades” não se mostram deveres para as autoridades.

    Na verdade, não é o Estado, coitado, que é obscuro, ou que fomenta e vive na penumbra, enquanto ostensivamente deixa os cidadãos na ignorância, até em relação a informação que lhe diz muito respeito, como a saúde. O Estado, ou a máquina do Estado, são pessoas. São funcionários públicos. São servidores públicos. Ou do público. De todos nós.

    Devem ser nomeados sempre que recusam executar as suas funções.

    Por esse motivo, o meu artigo de opinião do passado dia 18, intitulado “Eu e a covid-19: como sobrevivi e a minha aventura nos meandros burocráticos da obscura negligência”, tinha de ter nomes. Tinha eu a obrigação de dizer aquilo que eu fizera: um pedido no dia 15 de Julho do ano passado, o qual não obtivera resposta cabal do CHULC, e que cerca cinco meses depois, a CADA emitira um parecer instando ao cumprimento do meu pedido. E tinha a obrigação de escrever aquilo que o CHULC fizera: nada ainda, passadas mais de três semanas.

    Quase seis meses depois do pedido, mas somente um dia após o meu artigo de opinião, a solicitação acabou classificada como URGENTE.

    Mas tinha de nomear uma responsável. A Administração Pública são pessoas, que têm obrigações. Exijamos que as cumpram. Exijamos que as nomeemos se não as cumprirem. Os jornalistas têm esse direito e esse dever, o de denunciar comportamentos contrários à democracia e à gestão da res publica.

    Por isso mesmo, como jornalista, eu tinha o direito e o dever de recordar publicamente quem era a responsável máximo do CHULC. Quem era a presidente do Conselho de Administração deste centro hospitalar: a senhora Rosa Matos Zorrinho, que não é uma pessoa qualquer (e mesmo que fosse), porquanto foi presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (2016-2017) e do Alentejo (2005-2011), secretária de Estado da Saúde (2017-2018) e é casada com o eurodeputado e ex-dirigente socialista Carlos Zorrinho.

    Se pessoas com experiência e responsabilidades políticas como ela não têm, ou não incutem nos funcionários públicos, uma cultura de transparência, o que podemos esperar da democracia no futuro, e mesmo no presente?

    Daí o papel fundamental de uma imprensa independente, apenas dependente em prestar serviço público àqueles que a alimentam: os cidadãos. A denúncia é a mais nobre função do jornalismo. O questionamento do poder, também.

    Até porque, cumprindo o papel de (bom) denunciante, de (bom) inquisidor, o jornalista independente consegue resultados eficazes.

    Deste modo, não sei se este artigo deveria ser assinado pelo jornalista Pedro Almeida Vieira, ou antes pelo paciente e cidadão Pedro Alexandre de Almeida Vieira.

    Sei sim que o paciente Pedro Alexandre de Almeida Vieira deveria mesmo agradecer, se não fosse isso um acto algo esquizofrénico, ao jornalista Pedro Almeida Vieira por aquele artigo de opinião, escrito no dia 18 de Janeiro de 2022, que teve rápidos resultados: no dia a seguir, o CHULC classificou a solicitação como URGENTE, e logo a seguir, e em carta registada, enviou os documentos pedidos pelo dito (im)paciente há mais de seis meses.

    Uma coincidência, dirão muitos.

    Eu direi antes ser este um sinal do nobre poder do jornalismo: fazer aumentar as coincidências.

  • Quatro lições sobre o caso da morte da criança vacinada (incluindo um ‘engasganço’ do Expresso), se formos todos parvos

    Quatro lições sobre o caso da morte da criança vacinada (incluindo um ‘engasganço’ do Expresso), se formos todos parvos


    Não existem 100% de certezas, mas a simples comunicação ao Infarmed de um potencial efeito adverso da vacina da Pfizer da gravidade de uma morte de criança, deveria ter levado já à suspensão da vacinação neste grupo etário.

    Não há urgência justificável para se manter um programa vacinal em crianças, ademais sabendo que no grupo dos 5 aos 11 anos ainda não morreu qualquer uma por covid-19. Além disso, em plena fase de “avalanche” de casos positivos (só ontem foram mais 56.426), a peregrina ideia de os netos poderem “proteger” os seus avós já vacinados, ainda faz menos sentido. Na verdade, pelos números de infectados com menos de 20 anos disponibilizados pela Direcção-Geral da Saúde (164.262 casos positivos nos menores de 10 anos; e 236.844 no grupo dos 10 aos 19 anos), estimo que quase 130 mil crianças dos 5 aos 11 anos já tiveram contacto com o vírus desde o início da pandemia. Zero mortes em 130 mil casos. Onde está a urgência?

    Após a autópsia da malograda criança, e antes mesmo de qualquer certeza que os exames toxicológicos e anatómicos tragam, há já quatro lições a retirar:

    1 – A pergunta retórica e demagógica do vice-almirante Gouveia e Melo – “Uma hora de vida de um idoso é menos importante do que uma hora de vida de um jovem?” – deveria ter tido uma resposta unânime: “Sim”.

    “Uma hora de vida de um idoso é menos importante do que uma hora de vida de um jovem?” Sim.

    A vida de um jovem, de uma criança, tem um valor incomensuravelmente superior à de um idoso, porque com a sua perda se desmoronam esperanças, sonhos e experiências que os mais velhos tiveram oportunidade de usufruir. A solidariedade intergeracional faz uma sociedade ser civilizada. Aliás, muitos dos problemas ambientais com que nos deparamos (e não são somente as alterações climáticas) advêm da ausência de solidariedade entre gerações, entre os velhos perante os jovens, entre os políticos que decidem em relação ao futuro das crianças que não têm ainda voto na matéria.

    Sim: as crianças merecem mais horas de vida do que um idoso.

    Notícia do Expresso de 18 de Janeiro de 2022, colocando a “hipótese# de “poder ter sido” um engasgamento a causa da morte da criança

    A resposta do vice-almirante foi possível, e elogiada, porque vivemos na era do populismo. E esse populismo enraizou-se porque se coloca tudo numa visão maniqueísta de escolha de um lado ou de outro. Recordo, aliás, uma frase do ex-presidente Ramalho Eanes, por sinal outro militar, no início da pandemia: “Se necessário, [nós, os idosos] oferecemos o ventilador ao homem que tem mulher e filhos”. Parecendo postura heróica, na altura pensei que um país decente não poderia permitir que um idoso tivesse necessidade de oferecer a vida para salvar um jovem; um país decente deveria salvar ambos.

    2 – A comunicação social, com excepção do Correio da Manhã (saliente-se), enveredou sempre, em relação ao fatídico caso da criança, por uma tese desculpabilizante do Governo, da Direcção-Geral da Saúde e dos membros da Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC).

    Na verdade, independentemente da causa da morte desta criança ser atribuída à vacina, andaremos sempre sob uma espada de Dâmocles: o programa de vacinação destinada às crianças portuguesas dos 5 aos 11 anos não conseguirá salvar uma vida sequer pelo simples facto de, em quase dois anos, não morreu nenhuma. Por isso, qualquer morte por causa da vacina colocará logo o programa de vacinação numa situação de ser pior a cura do que a doença. E isto é insustentável. Não tem “margem de manobra”, ao contrário do que sucede com os mais idosos, onde a letalidade elevada da covid-19 pode “encaixar” perdas colaterais devidas à vacina.

    3 – O trabalho de certos jornalistas da imprensa mainstream mostrou-se, mais uma vez, em todo o seu esplendoroso servilismo. A extraordinária notícia do Expresso de anteontem – elaborada por uma jornalista que não é naif, porque escreve sobre assuntos de Saúde há mais de 20 anos –, sob o título “Engasgamento com comida ou objeto pode ter sido causa da morte de menino de seis anos”, foi um atirar de areia para olhos da opinião pública. Hoje o “pode ter sido” serve para tudo. Teve este artigo, porém, o desejado objectivo de lançar a confusão necessária para que o Governo e, em particular, o Partido Socialista evitassem sequer ter de prestar declarações. Ajudou também uma campanha eleitoral em que a pandemia se mostra tema tabu, como se aquela não se tivesse embutido nas nossas vidas nos últimos dois anos.

    Notícia da RTP “desmentindo” posteriormente a notícia do Expresso.

    Vamos ser claros, e sem ingenuidades: alguém acredita que, se a tese do engasgamento fosse plausível, os médicos que assistiram a criança teriam sido assim tão lestos a informarem o Infarmed sobre um potencial efeito adverso da vacina? Será que um jornalista com dois dedos de testa não saberá que, ao longo de um ano, já morreram largas dezenas de pessoas, sobretudo idosas, que tinham sido vacinadas, mas cujos óbitos, na sua quase totalidade, facilmente se atribuiu a outras causas (que não as vacinas)?

    Agora, mesmo com o desmentido do próprio Hospital de Santa Maria, como só haverá conclusões sobre a causa da morte da malograda criança daqui a um mês, o “serviço” do Expresso foi consumado com sucesso. Parabéns!

    4 – Pela postura de certos especialistas, e em particular da Ordem dos Médicos – que apelou para “que se mantenha a serenidade que uma situação destas exige” e que é “necessário aguardar pelas conclusões da equipa forense, nomeadamente pelos resultados da autópsia médico-legal e potenciais exames toxicológicos” –, fica-se com a perfeita noção da dissonância cognitiva dos gestores da pandemia.

    Note-se que, no caso das mortes contabilizadas pela pandemia, a Direcção-Geral da Saúde sempre tudo contabilizou: pessoas com ataques cardíacos, AVC, quedas de cama, suicídios, acidentes rodoviários e outras bizarrices, se tivessem um teste positivo as suas mortes foram catalogadas automaticamente, e sem qualquer dúvida, por covid-19. Existe mesmo uma norma que determina que em lares com surtos as mortes sejam sempre classificadas como causadas pelo SARS-CoV-2 até prova em contrária. Como não houve autópsias, nunca essa prova contrária surgiu.

    Saliente-se também que, nos casos de miocardites ou da síndrome inflamatória multissistémica – que já existiam antes da pandemia –, os mesmos especialistas não têm dúvidas de estas raras afecções estarem associadas à covid-19 no caso de crianças com teste positivo anterior, mas já colocam reticências sempre que surjam após a toma da vacina.

    Estas são as tristes lições que temos de aprender. Se formos todos parvos.

  • Eu e a covid-19: como sobrevivi e a minha aventura nos meandros burocráticos da obscura negligência

    Eu e a covid-19: como sobrevivi e a minha aventura nos meandros burocráticos da obscura negligência


    Consta por aí, pelos mentideros – palavra castelhana que significa lugar onde se agrupam pessoas para conversar, mas que aportuguesando passa a ser sítio onde se propagam boatos e mentiras –, que sou negacionista da covid-19. Basicamente – e, nessa querela, jamais interessa dirimir argumentos, porque os epítetos servem para rechaçar o debate –, porque sempre contestei a estratégia de gestão da pandemia; sempre defendi que a gravidade da doença dependia de diversas variáveis – sendo a idade, o sexo (mulheres mais fortes) e certas morbilidades as principais – e que, nessa linha, face às características, “juventude” e limitações das vacinas, os programas de inoculação deveriam depender da necessária ponderação entre precaução, risco, benefício e incerteza.

    Em seriedade – que hoje, num mundo maniqueísta, já é palavra vã –, ninguém jamais me poderia acusar de negacionismo. Mas acusaram. E muito menos depois de Junho do ano passado. Mas acusam. E mesmo depois daquilo que estou a escrever, também me acusarão.

    person in white jacket wearing blue goggles

    Pois bem, que seja.

    Talvez seja o meu segredo mais mal guardado – porque nunca neguei nem nunca confirmei, embora ainda há poucos dias falei en passant –, mas é mesmo verdade: já tive covid-19. Não é algo surpreendente: se considerarmos apenas os casos positivos, já foi atingida quase 20% da população portuguesa. Presumo, pelo que foram mostrando algumas estimativas com base em estudos serológicos, que poucos serão hoje os portugueses ainda “virgens”.

    Enfim, mas apanhei mesmo: foi no ano passado, em finais de Maio.

    Não estava vacinado.

    Nessa altura, não tinham ainda chamado as pessoas da minha idade (51 anos).

    Não vou ser hipócrita: não ponderava vacinar-me.

    Não por negar os benefícios das vacinas em geral, nem por não defender que podem ser uma das “ferramentas” de combate, sobretudo nas populações mais idosas, em função de uma análise risco-benefício.

    Para o meu caso em concreto, baseava-me então numa livre escolha de base científica e probabilística, tendo ademais em consideração a impossibilidade de imunidade de grupo, a incerteza sobre efeitos adversos a longo prazo da vacina. Conhecia, além disso, com detalhe, o “perfil” da doença, e não me considerava com comorbilidades relevantes, excepto ser ex-fumador (com sete anos de abstinência) e estar com um pouco de colesterol em excesso (efeitos da sedentarização pandémica).

    Como sempre tive acesso a informação relevante, sabia que das cerca de 5.100 pessoas da minha idade que tinham apanhado covid-19, desde o início da pandemia até Maio de 2021, 10% tinham necessitado de internamento (510) – embora em muitos casos por causa de outras maleitas – e 0,6% acabaram por falecer (31).

    Não se pense que é valor demasiado elevado: o quociente de mortalidade (por todas as causas) de homens da minha idade é, segundo o Instituto Nacional de Estatística, de quase 0,52%, ou seja, o risco de morte no prazo de um ano é de 1 em 200. Tem de se saber viver com esse risco – e felizes os que vivem sem o conhecer. Se se considerar a população masculina da minha idade (cerca de 70 mil homens), então a taxa de mortalidade por covid-19 afigurava-se bastante reduzida: 31 homens caídos em cerca de 70 mil dá apenas 0,044%.

    depth of field photography of man playing chess

    Enfim, o melhor que se pode fazer, nestes casos, é tentar não estar do lado dos mais vulneráveis – cuidando da saúde o melhor possível sem demasiados pecadilhos – e ter algumas precauções para evitar os azares da vida.

    Enfim, mas apanhei com o SARS-CoV-2 antes de ter de tomar a decisão, pelo que o meu desfecho seria, presumo, igual em qualquer dos casos.

    Terei, pelo que desconfio, sido infectado em finais de Maio, pois comecei com sintomas em 2 de Junho. Ao dia 4 telefonei para o SNS24, desconfiando da maleita. Porém, como mantive olfacto e paladar, descartaram a possibilidade de ser covid-19. Ben-u-ron para cima. Não passou. Entretanto, era 6 de Junho e já não podia em mim – com dores, alguma tosse e um quadro de alguma confusão –, e veio por fim a confirmação de um caso positivo de amigo próximo, com quem estivera. Novo telefonema para o SNS24, marcação de testes para o dia seguinte. Da Rua de São Lázaro, no centro de testagem, já nem fui a pé para o Hospital de São José.

    Só em 7 de Julho, salvo erro, regressei à vida civil, depois de estadia para o Hospital Curry Cabral – onde até escrevi posts sem me recordar como –, regresso ao Hospital de São José, para cuidados especiais, e uma última passagem, já em recuperação, no Hospital dos Capuchos. Só praticamente nesta última unidade de saúde recuperei completa consciência de mim. Dos outros dias, apenas vos posso dizer que fiquei com experiências entre o terrífico e surreal. Não guardo dores nem traumas; pelo contrário. Se tivesse partido, seguia sem dores.

    Segundo consta, nos momentos de consciência, entre a lucidez e a loucura, portei-me mal e bem, agradeci e maldisse muita gente que me tratava, fiquei com a plena consciência que quem faz mexer os hospitais são os enfermeiras e enfermeiros, bem como os auxiliares. Médicos vi-os pouco, mesmo sabendo que muitos contribuíram para me salvar.

    grayscale photo of man in suit

    Salvaram-me todos da covid-19?

    Sim, oficialmente, sim. Se tivesse morrido, seria essa a causa do meu certificado de óbito.

    Porém, do hospital público teriam, porventura, esquecido de informar a minha família e amigos que, ao 11º dia de internamento (e ao 16º dia de infecção), me descobriram uma pneumonia bacteriana causada por Staphylococcus aureus. Foi infecção nosocomial, mas, não sendo incomum, ainda hoje pergunto porque demoraram tanto tempo a fazer análises a outras tantas coisas para saber a razão do agravamento do meu estado de saúde.

    Do hospital público também teriam, porventura, esquecido de informar a minha família e amigos que um médico interno (estagiário), não devidamente supervisionado, se esqueceu de retirar o fio-guia do cateter quando aplicou a técnica de Seldinger, nem notou que não o tinha nos “despojos”, e assim andei – ou deitado estive – com o dito literalmente enrodilhado entre aurículo e ventrículo por meia dúzia de dias, até que um TAC ao coração o detectou, e um excelente médico de intervenção do Hospital de Santa Marta o lá foi buscar sem necessidade de me abrir. Pelo que soube muito mais tarde, fui um dos dois desafortunados em 10.000 pacientes que já ficaram com um fio-guia do cateter a passear-se pelo interior do coração.

    Enfim, não estou aqui a escrever para me queixar de erros médicos – que os há, e muitos que os sofrem nem podem escrever já sobre eles –, porque estes, a terem existido no meu caso, não foram suficientes para se sobreporem aos bons procedimentos clínicos ministrados, de sorte que, aqui estou, ainda por cima sem long covid, contrariando as “estatísticas” do Doutor Filipe Froes.

    Estou aqui, sim, a queixar-me porque, na verdade, o Estado – na pessoa da presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central Rosa Matos Zorrinho, que até já foi secretária de Estado da Saúde (2017-2018), e é casada com o eurodeputado socialista – acha que não tem nada que me disponibilizar os meus dados clínicos nem assumir quem e como me foram prestados cuidados médicos em unidades do Serviço Nacional de Saúde.

    Faço este relato, porque considero inadmissível esta postura. Diria mesmo criminosa, de ocultação.

    E faço esta denúncia porque desconfio ser esta uma prática comum de encobrimento de actos de negligência médica, que funcionam sobretudo se os visados não conhecem os mecanismos de defesa dos seus direitos.

    Vamos então relatar como se tem portado o CHULC, e mais a sua principal responsável, em relação à cedência de informação que me pertence por direito.

    Fiz um primeiro requerimento à CHULC em 15 de Julho de 2021, solicitando cópia de todos procedimentos médicos com “indicação precisa em termos cronológicos”.

    No dia seguinte, o CHULC envia um e-mail para que preencha um formulário, onde me exigem que preencha um formulário em que indique o “destino da informação”. Uma das opções seria “Processo Judicial”. Respondo que não tenho de justificar o motivo para aceder aos meus dados clínicos, de acordo com a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos.

    Enrolaram. Não me deram os dados requeridos. Apenas a nota de alta, que nada refere em concreto sobre o que se passara durante o internamento.

    Apresento queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos em 9 de Agosto.

    Por pressão da CADA, o CHULC enviou alguns documentos, mas em linguagem quase sempre codificada, e sem referir pormenores identificativos dos intervenientes do famigerado fio-guia no coração. Mesmo sobre a infecção nosocomial, muito pouco ou quase nada.

    Volto a insistir com a CADA, informando que a informação está absolutamente incompleta.

    Finalmente, no dia 20 de Dezembro – quase quatro meses e meio depois da minha queixa –, a CADA concedeu o seu parecer sobre o meu caso, referindo que “deverá a entidade requerida [CHULC] facultar a informação solicitada existente que esteja por facultar”, e acrescentando que isso deveria ser comunicado “no prazo de 10 dias”.

    Que fez o CHULC e a sua presidente do Conselho de Administração?

    Nada! Ainda.

    Um país decente, ou não, vê-se pela forma como trata estes “pormenores”.

    Seguem-se, em breve, mais capítulos, mas por aqui se entende as razões para a culpa em Portugal morrer tantas vezes solteira.


    P.S. Em breve saberão quais foram os motivos para nunca ter usado o certificado digital de recuperado e porque não me vacinei entretanto. Não foi por negacionismo; foi por Ciência.

  • Do invocar a independência em vão

    Do invocar a independência em vão


    Não pode, ou não deveria pelo menos, o Diário de Notícias, ou a sua directora Rosália Amorim, invocar a independência deste centenário jornal, e depois expor uma vassalagens pornográfica ao poder político e empresarial no dia do aniversário.

    Está lá tudo na reportagem da efeméride: o Diário de Notícias “homenageou Carlos Moedas”, “distinguiu o vice-almirante Gouveia e Melo”, “agraciou Joe Biden” (o homem deve estar fora de si de contente), e houve ainda “mensagens do Presidente da República” e de um ministro de um Governo de gestão.

    O conceito de independência ao poder é aqui similar à evocação da castidade como estilo de vida pelos clientes num bar de alterne.

    E, ó deuses do sétimo céu, independência com uma festa de aniversário onde nem faltaram os patrocínios da Altice, Fidelidade e Santander? Terão os cheques sido entregues por administradores vestidos de Melchior, Gaspar e Baltazar?

    Talvez. Não sei. Não confirmo. Nas fotografias da festança não deu para identificar muita gente, por graça do patrocínio da empresa Portuguese Mask, que já agora tem à venda um Winter Pack bem catita para a época natalícia…

    Não sei bem se as festas do Diário de Notícias no tempo do Salazar tiveram tanta subserviência ao poder político e tanta bajulação ao capital.

    Dúvidas também possuo sobre se as gentes e os dirigentes editoriais da Global Media estão apenas em dissonância cognitiva, ou se afinal estão apenas a tentar mudar o conceito de independência, transmutando o real sentido do termo para o oposto –como muitos fizeram, por exemplo, com palavra “despoletar”, que significando retirar a espoleta de uma granada, afinal nada desencadeia, porque sem espoleta não há explosão.


  • Do crime de Graça Freitas: a divulgação de dados clínicos sigilosos

    Do crime de Graça Freitas: a divulgação de dados clínicos sigilosos


    Foi divulgado ontem a morte de uma jovem de 19 anos com síndrome de Dravet – uma encefalopatia progressiva rara, de origem genética e incurável. Uma em cada cinco pessoas que sofre desta doença acaba por morrer até ao início da fase adulta, em muitíssimos casos por acidentes durante crises epilpléticas ou por morte súbita.

    A jovem tinha estado cinco dias antes no Hospital de Braga com febre alta, e testara positivo ao SARS-CoV-2. Fora mandada para casa com recomendação para tomar paracetamol. A sua morte terá sido atribuída à covida-19. E, segundo a generalidade da comunicação social, a Direcção-Geral da Saúde (DGS divulgou que a jovem “não estava vacinada”.

    Ora, a Direcção-Geral da Saúde – que esconde deliberadamente informação fundamental, mesmo quando jornalistas requerem dados anonimizados, ou seja, sem menção ao nome – mandou agora às malvas a ética e a deontologia, que até está consagrada em diploma legal.

    Graça Freitas, directora-geral da Saúde

    O Código de Conduta Ética da DGS estipula, por exemplo, que os seus colaboradores, entre os quais Graça Freitas, “estão sujeitos ao sigilo profissional relativamente a matérias a que tenham acesso no desempenho das suas funções ou por virtude das mesmas, com preponderância para a proteção dos dados pessoais, e que, pela sua efetiva importância, por legítima decisão da DGS ou por força da legislação em vigor, não devam ser do conhecimento geral.” Isto não se aplica somente à pandemia nem à covid-19, mas a todo o tipo de dados clínicos.

    Anda toda a gente distraída, ou entramos num mundo distópico. Divulgar dados clínicos de uma pessoa, ainda mais oficialmente e através da comunicação social, é crime. Ponto. Não poderia jamais a DGS divulgar a situação vacinal – ainda mais nas actuais circunstâncias de uma morte – daquela jovem.
    Nunca! Não apenas porque jamais poderia revelar dados clínicos individuais sem autorização da própria pessoa (ou neste caso, dos familiares), mas também por não ser sua competência nem sequer enquadrar os motivos (que até poderiam ser clínicos) para a jovem não estar eventualmente vacinada. De forma subliminar, a DGS quis mostrar que a vacina poderia alterar o desfecho, incutindo assim uma mensagem crítica aos pais, quer aos pais da malograda jovem, quer a todos os pais de adolescentes e crianças. Isto chama-se bullying estatal.

    Aliás, a Doutora Graça Freitas saberá, por certo (mas eu já tenho dúvidas), que esta síndrome tem uma elevadíssima taxa de mortalidade até ao início da idade adulta, e que sucede muitas vezes de forma repentina num evento de convulsões. Ou seja, como sucedia com outras infecções respiratórias, a jovem tem uma elevada probabilidade de ter morrido com covid-19 – e não de covid-19.

    Na verdade, é nojento e abjecto a DGS usar uma sempre lamentável morte, independentemente da causa, para alimentar uma campanha de pânico, para “forçar” pelo medo – e não por vantagens em termos de saúde pública – a vacinação em adolescentes e crianças. Continuando a ignorar aspectos básicos: aqueles são grupos etários onde, se não existirem comorbilidades, o risco de morte é virtualmente nulo.
    A Doutora Graça Freitas começa a parecer-me uma personagem sinistra.

    Numa sociedade decente, a Doutora Graça Freitas ia já para o olho da rua. Mas aqui, agora aqui, não. E nunca com a imprensa mainstream, que se virará até contra os pais da falecida jovem, por não a terem vacinado. Haverá quem até os venha a criticar de negacionistas, a propor até, hélas, que se venha a promover a acção da Comissão Nacional de Crianças e Jovens (CNCJ) contra os pais que neguem vacinar os seus filhos. Estamos perto desse cenário.

    Enfim, vivemos tempos obscuros.

    Na verdade, até sobre os meus dados clínicos eu acho que já muita gente não autorizada os terá visto. E serão usados se os seus caprichos e fins assim o determinarem e advirem vantagens para o “bem comum”.

    A confiança no Estado torna-se nula com esta gente.


  • Do jornalismo ao Estraca, terminando em José Mário Branco

    Do jornalismo ao Estraca, terminando em José Mário Branco


    Um jornalista que se preze tem duas obrigações: informar e não ser ridículo. Geralmente, o ridículo encontra-se intimamente associado à ignorância. E à maldade. João Amaral Santos, jornalista da Visão, talvez não seja completamente ignorante, mas não informa e é ridículo. E é mau. Mau jornalista. E má pessoa, uma pessoa para quem os meios mais escroques justificam os seus “beatíficos” fins.

    Num texto publicado hoje no site da Visão – catalogado na secção Sociedade, mas que se assume claramente como artigo de opinião, embora dissimulado –, o escriba Santos, que recebeu a carteira profissional 7544, mas jamais deve ter lido o Código Deontológico, avisa ao que vem no título: “Movimentos negacionistas e antivacinas usam Hip Hop para espalhar teorias da conspiração em Portugal”. O pretexto: a música “Jornalixo”, do rapper Estraca, nome artístico de Carlos Guedes, 24 anos.

    João Amaral Santos não tem qualquer relevância no meio jornalístico, e o seu percurso na imprensa nada tem de assinalável. Porém, exactamente por esse motivo merece este destaque: a maldade surge a partir da mediocridade. Ele constitui, à falta de qualquer cume qualitativo abonatório, o expoente de uma forma de estar no jornalismo de hoje: o jornalismo dogmático e securitariamente ideológico, com posturas missionárias, inquisitoriais e populistas, usando execrável manipulação e falsificação, cimentadas pela inanidade, fruto da ignorância e impreparação técnica e científica das escolas de Jornalismo e Comunicação.

    Ele, João Amaral Santos de nominata, corporiza o jornalista mediano da nossa imprensa. Mediano,, no sentido estatístico do termo; medíocre no sentido qualitativo, devido ao actual estado da classe.
    São jornalistas como João Amaral Santos – e a ausência de uma comissão deontológica séria e interventiva – que fazem proliferar a má imprensa, o “jornalixo” retratado por Estraca, que medram um “jornalismo de merda”. Ameaçam-nos eles, no mínimo, de ficar na História como um lastimável e lamentável episódio da vida em democracia. Mas temo que, na pior das hipóteses, venham a contribuir para minar e destruir as democracias ocidentais, tornando a liberdade individual e o livre arbítrio em direitos maléficos, a serem coarctados em prol de um imaginário bem comum, que beneficiará somente elites políticas e financeiras.

    Estamos no prelúdio de um paraíso de democratas com sonhos ditatoriais: a aceitação pacífica de uma felicidade sanitária colectiva aliada à infelicidade individual; a imposição ordeira da versão século XXI da biopolítica e do biopoder teorizadas por Foucault. E os jornalistas serão os teólogos e missionários deste novo mundo.

    Não desejo, contudo, fugir muito ao tema que suscitou a escrita desta opinião. Nem vou sequer perder demasiado tempo a dissertar, e muito menos em direcção a “periodistas” do quilate de João Amaral Santos, por que motivo um jornalista decente jamais pode catalogar como negacionistas os críticos e contestatários da gestão da pandemia.

    Nem mesmo quem nega a existência do vírus merece uma denominação de conotação tão depreciativa e específica para um período negro da História da Humanidade. E muito menos se pode catalogar como negacionista quem apela para a transparência da informação das autoridades políticas; quem aponta alternativas; quem denuncia incongruências; quem crítica o uso de certificados supostamente sanitários como instrumentos de segregação; quem abomina que vacinas (com tão pouco tempo de “vida”) sejam utilizadas sem ponderação; e/ou quem defenda que estas sejam aplicadas em função de dois princípios básicos: o da precaução e o do risco-incerteza-benefício.

    Na verdade, a questão essencial no artigo de opinião de João Amaral Santos é a sua inata e intrínseca maldade. Maldade nas suas diversas acepções. Somente por maldade, pela mais sublime má-fé, pode João Amaral Santos escrever o seguinte: “Com letras que incluem os chavões e as teorias da conspiração de sempre, artistas como Estraca ou Penhx recorrem a uma amálgama de palavras e frases cantadas, onde se incluem acusações a políticos, jornalistas ou médicos e enfermeiros, entre outros, e se fala de corrupção, pedofilia ou satanismo – uma retórica próxima da utilizada pelos norte-americanos QAnon.”

    Eis a alusão à extrema-direita agora como cereja em cima do bolo da retórica jornalista contra quem contesta e crítica. O poder nem precisa de opinar nem criticar quem os critica. Há sabujos e jagunços dispostos ao servicinho: os jornalistas. Salazar não fez, não faria melhor. Sempre! Sempre a merda da extrema-direita! Isto já não apenas chateia; faz perder as estribeiras.

    Enfim, só um jornalista calaceiro, imberbe e maldoso – ou seja, só se sendo um João Amaral Santos – pode ignorar o estilo e forma das canções de intervenção, desde os tempos dos tempos. Desde, recuemos à História Pátria, os tempos do pós-25 de Abril. Como pode alguém então, sem cair no ridículo, e manter amanhã a carteira profissional de jornalista, considerar que são “amálgamas de palavras e frases cantadas” isto aqui em baixo que Estraca canta?

    Estraca, nome artístico de Carlos Guedes (n. 1997)

    E hoje é puros contra impuros
    São cultos contra incultos
    Estudos, estudos e mais estudos para te fazerem mais burro
    Grupos, grupos e mais grupos, medo forma novos surdos
    Questionar o questionável é conversa de malucos
    Então eu sou louco, assumidamente louco
    Se loucura é questionar aquilo que injetam no meu corpo
    Sim, então eu sou louco
    Conclusivamente louco
    Só existem duas escolhas: homem livre ou homem morto
    Eu escolhi ser livre e lutar pela liberdade
    Dignidade pela vida ou vida pela dignidade
    Escolhas dignas de injustiça, tempos de desigualdade
    Ataque a direitos base e crimes contra a humanidade
    Regras e novas medidas anti-constitucionais
    Querem passes sanitários mas com direitos iguais
    Sinais que fazem lembrar tempos ditatoriais
    Até miúdos viram escudos para proteger os pais.

    Contudo, no meio da diatribe que é o texto (chamemos assim por convenção) de João Amaral Santos, causa-me ainda maior fúria – e eu não sou o Estraca – a colagem do rapper a teorias conspirativas de extrema-direita.

    Associar Estraca à extrema-direita é como tentar misturar a decência com o João Amaral Santos: temos, de um lado o azeite, do outro a água.

    Questiono-me, aliás, como pode uma anémona sequer pensar que Estraca pode estar ao serviço de interesses de extrema-direita quando, no seu magistral “Terra Nostra”, escrito no início do ano passado, ele se expõe assim:

    Chega de aventuras dum Ventura partidário
    E de um comentário CM pa’ fascista parlamentário
    Marcelinho nosso querido, muito pouco autoritário
    A passear pelo país com os impostos do meu salário.

    Enfim, estará sim ele, João Amaral Santos, ao serviço de um propósito, que não a decência, e esse propósito não é digno do Jornalismo. Ele e muitos jornalistas, e infelizmente são mesmo muitos – e um bastaria para ser demais – justificam plenamente a música de intervenção de Estraca. As suas reacções justificam cada palavra do rapper. E mereciam mais ainda de mim, para além destas que acabei de escrever. Tivesse eu melhor arte.

    E já que estamos numa de abordar canções de intervenção, deixo-vos uma das minhas passagens preferidas de “FMI”, do José Mário Branco, escrita “de um só jorro, numa noite de Fevereiro de 79”, como ele cantou, e que estranhamente, ou talvez não, se encaixa, perfeita, na realidade dos nossos distópicos dias:

    José Mário Branco (1942-2019)

    Vá mandem-me lavar as mãos antes de ir para a mesa
    Filhos da puta de progressistas do caralho da revolução que vos foda a todos!
    Deixem-me em paz porra, deixem-me em paz e sossego
    Não me emprenhem mais pelos ouvidos caralho
    Não há paciência
    Não há paciência
    Deixem-me em paz caralho
    Saiam daqui
    Deixem-me sozinho, só um minuto
    Vão vender jornais e governos e greves e sindicatos e polícias e generais para o raio que vos parta!
    Deixem-me sozinho
    Filhos da puta
    Deixem só um bocadinho
    Deixem-me só para sempre
    Tratem da vossa vida que eu trato da minha
    Pronto, já chega
    Sossego porra
    Silêncio porra
    Deixem-me só, deixem-me só, deixem-me só
    Deixem-me morrer descansado.


  • Da música de intervenção

    Da música de intervenção


    Silenciar pelo ostracismo, através da censura popular, e não pela opressão policial, é o sonho húmido do autoritarismo.

    Eric Clapton lançou há três meses uma música de protesto sobre a gestão da pandemia: “This Has Gotta Stop” foi, porém, ostracizada, e rapidamente se quis desenterrar supostos males e defeitos do músico britânico. A generalidade dos músicos – receosos de perder os benefícios do marketing num mundo que se tornou agora politicamente correcto e sem questionar o poder – não me surpreendeu.

    Por exemplo, em Portugal a dependência de músicos e outros artistas dos subsídios e contratos com o Estado e autarquias é medonha.

    Estraca, nome artístico de Carlos Guedes (n. 1997)

    Não admira assim que, perante a “mensagem oficial” e o ambiente de um “unanimismo artificial”, e imposto pela imprensa mainstream, uma parte se auto-silencie, enquanto a outra se auto-eleva ao estatuto de “fariseus dos costumes”, ou “de samaritanos da hipocrisia”, dando bordoada pública (porque em público vale a dobrar) em quem ergue a cabeça para dizer nem que seja um “mas…”.

    Todos estes “nogueiras de pacotilha” conseguiram, durante a pandemia, manter os seus “financiamentos” para fazer “coltura da TV, da rádio e da cassete-pirata”, e ainda receberem medalhas de bom comportamento cívico.

    Os muitos poucos que dizem “mas…”, e os raros que agora clamam por mais do que “mas…”, têm pedras por caminho.

    Mas a estratégia de “silenciar” os músicos rebeldes ou incómodos mostra que, afinal, o poder tem muito receio das suas consequências. A mensagem de uma canção entra sem filtros, matraqueia, faz pensar.
    Isto a pretexto de “Jornalixo”, do rapper Estraca, que, com uma mensagem sibilina mas muito directa, dá “murros” ao jornalismo, ao poder, e a nós todos.

    Em quatro dias conta já com 130 mil visualizações e está em 4o. lugar nas tendências musicais do YouTube em Portugal.

    Claro que a imprensa mainstream vai ignorá-lo, e é isso mesmo que fará a sua mensagem passar, e começar a fazer mais pessoas pensarem por elas.


  • O circo Ómicron: das variantes ao absurdo

    O circo Ómicron: das variantes ao absurdo


    De repente, uma nova linhagem (variante) do SARS-CoV-2 foi detectada, em 11 de Novembro, e o Mundo entrou em redobrada histeria. Com “nome científico” de B.1.1.529, rapidamente esta linhagem, originária da África do Sul e Botswana, lançou nova vaga de pânico, até nos mercados internacionais, justificando encerramento de fronteiras e maiores restrições.

    Num ápice, a variante foi baptizada Ómicron pela Organização Mundial da Saúde (OMS) – estatuto apenas reservado para linhagens consideradas perigosas e ou de preocupação –, pese embora não existam ainda estudos nem conclusões sobre se estamos perante um maior risco de transmissibilidade e de letalidade.

    Na verdade, em declarações à BBC, a médica sul-africana Angelique Coetzee, a primeira pessoa a identificar as mutações da variante Ómicron, já referiu que os doentes apresentavam sintomas ligeiros.

    Indiferente a este cenário, a África foi logo marcada como um berço de novas variantes – perigosas, claro –, apontando-se como causa a baixa taxa de vacinação naquele continente.

    Curiosamente, na Europa, os Governos e a imprensa de muitos países têm estado a apontar as armas para os não-vacinados, classificando-os de “reservatórios potenciais” de mutações do SARS-CoV-2. Estão mesmo a ser implementadas maiores restrições aos não-vacinados (incluindo os recuperados), numa clara política de discriminação.

    Mas, pretendo agora, de forma muito breve, desmistificar uma falsa ideia sobre as mutações do SARS-CoV-2. De facto, a comunicação social induz que as mutações são um fenómeno raro e relacionadas com factores como o processo de vacinação ou estados de desenvolvimento, e que as linhagens ou variantes são em número reduzido, pelo que quando aparece uma, então as coisas ficam mal.

    Vamos a factos. A OMS apenas seleciona algumas variantes, nomeando-as por letras gregas. Muito poucas. Ou, diria mesmo, quase nenhumas. Por isso, somente conhecemos, umas mais do que outras, e além da agora famosa Ómicron, a Alpha (detectada no Reino Unido, em Fevereiro de 2020), a Beta (na África do Sul, em Março de 2020), a Delta (na Índia, em Maio de 2020), a Eta (de origem geográfica indefinida, em Março de 2020), a Gamma (no Brasil, em Janeiro de 2020), a Iota (em Nova Iorque, em Janeiro de 2020), a Lambda (no Peru, Chile, Estados Unidos e Alemanha, em Julho de 2020), a Mu (na Colômbia, em Outubro de 2020), a Theta (nas Filipinas, em Janeiro de 2021) e a Zeta (no Brasil, em Abril de 2020). Portanto, são apenas 11.

    Mas são assim tão poucas as mutações e as linhagens? Claro que não. Segundo o sistema internacional de nomenclatura das linhagens do SARS-CoV-2, centralizado no site cov-lineages.org, foram já identificadas 1.794 linhagens distintas em todo o Mundo. Repita-se: 1.794 linhagens.

    A Ómicron (B.1.1.529) é apenas a mais recente, mas com estranhas honras de pular para as parangonas da imprensa e da própria OMS. Com efeito, a variante Alpha demorou cerca de 10 meses desde a sua identificação até ser baptizada com a letra grega (sinal de preocupação), a Beta nove meses, a Delta 11 meses, a Gamma 12 meses e a Mu 10 meses. As variantes Eta, Iota, Theta e Zeta deixaram de constar na lista da OMS como de preocupação ou de interesse.

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    E o que sucedeu com a variante Ómicron? Ora, decidiu-se logo dar-lhe um trampolim: em menos de duas semanas foi identificada e transformou-se num “ai Jesus”. Ainda nem sequer se conhece uma pessoa que tenha morrido com essa nova variante. É obra! Ao fim de se detectarem 1.794 variantes, há uma que, antes sequer de matar alguém, salta para a ribalta mundial, criando uma onda de pânico antes de constituir um perigo real.

    Na verdade, a história das variantes – e as suas origens e causas, que são múltiplas e desconhecidas em toda a sua dimensão – mostram sobretudo como a opinião pública tem vindo a ser manipulada pelos Governos, auxiliados diligentemente pela Imprensa e por alguns “peritos” com agendas próprias, e acompanhados todos por uma indústria farmacêutica diligente, na sombra.

    A mais recente moda de apontar ao continente africano a causa de novas variantes devido às baixas taxas de vacinação carece de justificação. Indicar que os países menos desenvolvidos possam ser “berços” de mutação, também carece de qualquer rigor científico. Efectivamente, sobre essa matéria, a Europa tem siso o berço de centenas de variantes. E, curiosamente, até mesmo em Portugal: de acordo com o registo internacional atrás referido, já foram identificadas 20 linhagens do SARS-CoV-2 com origem no nosso país, a saber: AJ.1; AM.1; AY.124; AY.22; AY.5.1; AY.5.2; B.1.91; B.1.135; B.1.1.88; B.1.1.394; B.1.1.401; B.1.1.410; B.1.1.421; B.1.177.32; B.1.177.72; B.1.177.85; B.23; B.44; C.16; e Y.1.

    Portugal é um país de apenas 10 milhões de habitantes num planeta com mais de 7 mil milhões.
    Mas isso não interessa nada, não é? O Circo Ómicron está montado. And the show must go on. Até quando?