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  • Comissão Europeia e imprensa: entre a protecção e o controlo

    Comissão Europeia e imprensa: entre a protecção e o controlo

    A proposta da Comissão Europeia para a criação de uma nova legislação para o setor dos media apresenta-se como benigna, visando a proteção da liberdade de imprensa e a salvaguarda do pluralismo. Mas a proposta, que terá ainda de ser aprovada pelos Estados-Membros e o Parlamento Europeu, está a levar alguns a torcerem o nariz. Entre os receios que existem, surge à cabeça a possível tentativa de Bruxelas de querer, com as novas regras, reforçar o seu poder e obter controlo sobre o setor da comunicação social. A Comissão Europeia negou que tenha essa intenção. Mas, apesar de a proposta ter recebido muitos elogios, as dúvidas sobre as reais intenções de Bruxelas persistem.


    “De boas intenções está o Inferno cheio”. É este ditado que vem à memória quando se ouvem algumas críticas sobre a nova regulação que pode vir a ser adotada para os media europeus.

    As novas regras para o setor dos media propostas pela Comissão Europeia deixam dúvidas, incluindo sobre se se trata de uma tentativa de Bruxelas de obter poder para controlar o setor.

    A proposta da nova legislação denominada “European Media Freedom Act” (EMFA) foi apresentada no dia 16 de Setembro e já mereceu muitos elogios mas também críticas. Sobretudo, fica no ar a questão sobre quais são as reais intenções da Comissão Europeia com este novo pacote legislativo para regular um setor tão crítico e fundamental para a democracia.

    Segundo a Comissão Europeia, “o objetivo da Lei Europeia da Liberdade dos Meios de Comunicação é proteger o pluralismo e a independência dos meios de comunicação social no mercado único da União Europeia, onde os meios de comunicação social podem operar mais facilmente além-fronteiras sem interferências indevidas”.

    A Comissão considera que “as questões relacionadas com os meios de comunicação social têm sido tradicionalmente da competência dos Estados-Membros, mas tal é a ameaça à liberdade dos meios de comunicação social que se tornou necessária uma acção à escala da União Europeia para proteger os valores democráticos”.

    A proposta de nova legislação visa responder a sinais de ameaças à liberdade de imprensa em países como a Hungria e a Polónia, e pressões sobre jornalistas em países como Malta, Grécia e Eslovénia. A iniciativa vem complementar a recomendação recentemente aprovada sobre a proteção, segurança e capacitação dos jornalistas e a diretiva para proteger os jornalistas e os defensores dos direitos de litígios abusivos (pacote anti-SLAPP).

    Segundo a Comissão, “os quatro principais pilares da EMFA são: salvaguardar a prestação independente de serviços de comunicação social no mercado interno; reforçar a cooperação regulamentar e a convergência; assegurar um mercado funcional dos serviços de comunicação social; assegurar uma alocação transparente e justa dos recursos económicos”.

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    A proposta, que vem acompanhada ainda de um pacote de “Recomendações” sobre “boas práticas”, coloca na mesa a criação de um regulador europeu para o setor. O “European Board for Media Services” (Conselho Europeu de Serviços de Media) composto pelos reguladores nacionais do setor.

    Este regulador, a ser criado, irá garantir a implementação e cumprimento das novas regras europeias e opinar sobre operações de concentração entre empresas de media no espaço europeu. Mas também vai ter um papel “específico na luta contra a desinformação, incluindo interferência externa e manipulação de informação”.

    Para ser adotada, a nova legislação terá de ser aprovada pelo Parlamento Europeu e ter luz verde do Conselho Europeu.

    Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia

    Apesar das publicitadas boas intenções deste “European Media Freedom Act” há quem desconfie que a Comissão Europeia possa pretender ter controlo sobre o setor dos media e o jornalismo produzido no espaço europeu.

    Para a Civil Liberties Union for Europe, a proposta da Comissão Europeia, “na sua forma atual, não aborda adequadamente os problemas mais prementes, incluindo ameaças crescentes à independência das autoridades nacionais de media e emissoras públicas, a falta de um banco de dados transparente e disponível ao público sobre a propriedade da media e o papel dos auxílios estatais tóxicos e subsídios estatais”.

    Para empresas do setor, as novas regras cheiram a possível intromissão no setor por parte dos políticos e burocratas de Bruxelas. “Os reguladores de mídia agora podem interferir na imprensa livre, enquanto os editores estão afastados de suas próprias publicações”, disse Ilias Konteas, diretor executivo da European Magazine Media Association e da European Newspaper Publishers Association ao jornal Politico.

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    Num comunicado conjunto, um grupo alargado de organizações europeias pela defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos – incluindo o Centro Europeu para a Liberdade de Imprensa e dos Media e a Federação Europeia de Jornalistas – , considerou que a iniciativa legislativa é bem-vinda.

    Contudo, alertaram que “para que o EMFA se torne eficaz na luta pela garantia do pluralismo dos meios de comunicação social, pela proteção dos direitos dos jornalistas e pela independência editorial do impacto dos interesses comerciais e políticos instalados, deve reforçar os esforços para aumentar a transparência na propriedade dos meios de comunicação social”.

    Segundo as mesmas organizações, o EMFA deve prever “regras para reger todas as relações financeiras entre o Estado e os meios de comunicação social [para além da publicidade] e “garantir a independência dos reguladores nacionais, bem como a independência do Conselho Europeu dos Serviços aos Meios de Comunicação Social”. Defenderam ainda que a iniciativa deve “proteger totalmente os jornalistas de todas as formas de vigilância [além de spyware]”.

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    O comissário do Mercado Interno, Thierry Breton, afirmou numa conferência de imprensa – citado pelo Politico – que não houve “absolutamente nenhuma tentativa da Comissão de ter poder” sobre os media.

    Por outro lado, as novas regras visam endereçar a questão dos conteúdos noticiosos divulgados nas redes sociais, incluindo notícias que são eliminadas por irem contra as normas impostas por cada plataforma, como o Facebook e o Twitter.

    Tendo como base a “Lei dos Serviços Digitais”, o EMFA inclui salvaguardas contra a remoção injustificada de conteúdos noticiosos.

    “Nos casos que não envolvam riscos sistémicos, como a desinformação, as grandes plataformas online que pretendam remover certos conteúdos legais de media considerados contrários às políticas da plataforma terão de informar os órgãos de comunicação social sobre as razões” antes de as retirar.

    Além disso, “quaisquer reclamações apresentadas por órgãos de comunicação social terão de ser processadas com prioridade por essas plataformas”.

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    Para a Repórteres sem Fronteiras (RSF), a iniciativa é bem-vinda mas precisa de uns “retoques”.

    “A referência explícita no EMFA à “Journalism Trust Initiative (JTI)” como um standard de auto-regulação que permite que os media se identifiquem como tal em plataformas online, beneficiando de proteção específica face às operações de moderação das plataformas, é um passo importante”, apontou a RSR num comunicado.

    Mas ressalvou que os critérios para definir as entidades que são classificadas como “media” não são satisfatórios atualmente. “Se a auto-declaração como um órgão de comunicação social for suficiente para gozar de proteção, então este mecanismo corre o risco de dificultar os esforços que as plataformas devem empreender para combater a desinformação”, avisou.

    Certo é que, notícias verdadeiras têm sido classificadas como “desinformação” devido a erros cometidos por verificadores de factos, os quais operam em parceria com as plataformas de redes sociais, enquanto notícias falsas ou com graves erros escapam a qualquer tipo de escrutínio.

  • Contratos da Pfizer: um nó (cada vez mais) górdio para a Comissão Europeia

    Contratos da Pfizer: um nó (cada vez mais) górdio para a Comissão Europeia

    Depois da Provedora de Justiça Europeia e do Tribunal de Contas Europeu, foi a vez da Procuradoria Europeia se pôr em campo para investigar a compra das vacinas contra a covid-19 pela Comissão Europeia. Mensagens e telefonemas feitos por telemóvel com o presidente-executivo da Pfizer colocaram Ursula von der Leyen no centro da polémica, que recusa divulgar as SMS trocadas com Albert Bourla. Não é a primeira vez que a alemã se vê no centro de uma polémica envolvendo um contrato milionário. Quando era ministra da Defesa da Alemanha também surgiram suspeitas, mas von der Leyen seria ilibada de responsabilidades em Junho de 2020.


    Here I go again! Aqui vou eu outra vez!. Deve ter sido isto, ou coisa parecida, que a presidente da Comissão Europeia pensou quando, na semana passada, a Procuradoria Europeia anunciou que está a investigar os contratos secretos celebrados com a farmacêutica Pfizer.

    A investigação em curso anunciada por aquela instituição europeia não nomeia as pessoas cujas ações serão escrutinadas. Contudo, o nome de Ursula von Der Leyen não deve escapar; tem sido ela a aparecer no centro da polémica, por dúvidas sobre se esteve directamente envolvida nas negociações de um contrato multimilionário com a Pfizer. Ao todo, sabe-se, a Comissão Europeia comprou 4,6 mil milhões de doses de vacinas contras a covid-19, gastando já 71 mil milhões de euros.

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    O cerco em torno da Comissão Europeia começa agora a apertar para apurar como foram negociados os contratos, e porque são os países-membro da Europa obrigados a comprar vacinas que cobrem várias vezes as necessidades.

    Mas a polémica em torno da compra das vacinas à Pfizer já vem de longe, com vários desenvolvimentos de relevo.

    Em Abril de 2021, a presidente da Comissão Europeia afirmou, numa entrevista ao New York Times, que trocou mensagens de texto (SMS) e telefonemas com o presidente-executivo da Pfizer, Albert Bourla, durante um mês, numa altura em que estava a ser negociado um grande contrato com a farmacêutica.

    O contrato efetuado naquela altura tornou a União Europeia o maior cliente da Pfizer até então. Em causa estava a compra de 1,8 mil milhões de doses da nova vacina desenvolvida pela Pfizer em conjunto com a alemã BioNTech.

    O jornalista Alexander Fanta, do jornal digital alemão Netzpolitik.org, pediu o acesso às SMS ao abrigo da lei de acesso a informação. Mas a Comissão Europeia indicou que já não tinha as mensagens.

    Emily O’Reilly, provedora da Justiça Europeia

    Contudo, em Janeiro deste ano, a provedora de Justiça da União Europeia (UE), Emily O’Reilly, acusou a Comissão Europeia de má administração por falhar em entregar as mensagens de texto trocadas entre Ursula Von der Leyen e o CEO da Pfizer. E exigiu à Comissão que procurasse melhor as SMS. Em todo o caso, o inquérito foi encerrado em Julho passado, sem a Comissão ter entregado as mensagens, não apagando assim as suspeitas, pelo contrário.

    Num duro comunicado, a Provedora de Justiça Europeia considerou que o inquérito “sobre a forma como a Comissão (Europeia) tratou um pedido de mensagens de texto entre a sua presidente e o CEO de uma empresa farmacêutica é um alerta para todas as instituições da União Europeia no sentido de garantir a responsabilização numa era de mensagens instantâneas”.

    Salientou que “um ano após o pedido inicial de um jornalista, a Comissão (Europeia) ainda não esclareceu se existem mensagens relatadas que dizem respeito a grandes acordos de aquisição de vacinas e se o público tem direito a vê-las”.

    O’Reilly foi bastante assertiva sobre a actuação da Comissão Europeia, censurando o mau exemplo que foi dado ao longo do processo. “A resposta da Comissão às minhas perguntas não esclareceu a questão básica de saber se as mensagens de texto existem, nem clarificou como a Comissão responderia a um pedido específico de outras mensagens de texto”, disse a provedora, citada no mesmo comunicado.

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    E aproveitou para dar mais raspanetes: “O tratamento deste pedido de acesso a documentos deixa a lamentável impressão de uma instituição da União Europeia que não está disponível em assuntos de interesse público significativo”.

    Outro desenvolvimento importante no caso da compra das vacinas à Pfizer ocorreu no mês passado. O Tribunal de Contas Europeu publicou um relatório onde afirmou que a Comissão Europeia também recusou divulgar detalhes do papel de Ursula von der Leyen nas negociações com a Pfizer.

    O Tribunal de Contas descobriu que o contrato gigantesco com a Pfizer, assinado em Maio de 2021, foi feito à revelia dos procedimentos habituais. Para os restantes contratos de compras de vacinas com as outras farmacêuticas, o procedimento foi seguido.

    Segundo informação oficial, é a Comissão que, “a par de uma equipa de negociação conjunta, conduz as negociações com os fornecedores de vacinas”, acrescentando que “os membros da equipa de negociação conjunta — em representação de sete Estados-Membros — são nomeados por um Comité Diretor”. É este Comité que “discute e analisa todos os aspetos dos contratos ao abrigo do acordo prévio de aquisição (APA) antes da assinatura”. E todos os Estados-Membros da União Europeia “estão representados neste comité, que se reúne semanalmente”. 

    Tony Murphy, presidente do Tribunal de Contas Europeu

    Estranhamente, no caso do grande contrato feito com a Pfizer, foi a própria Ursula von der Leyen que levou a cabo as negociações iniciais, em Março de 2021. No mês seguinte, ela levou os resultados das negociações ao Conselho Director. Uma reunião planeada para 2022, que iria reunir assessores científicos para debater a estratégia de vacinas da União Europeia, nunca aconteceu, segundo o relatório do Tribunal de Contas.

    Também contrariando os procedimentos habituais, a Comissão Europeia recusou fornecer documentos e informações sobre as negociações com a Pfizer, como actas de reuniões e condições negociadas. Um auditor que ajudou a liderar a investigação admitiu ao jornal Politico que a recusa da Comissão em divulgar informações era altamente incomum. “Isso quase nunca acontece. Não é uma situação que normalmente enfrentamos no tribunal”, disse o auditor, que pediu anonimato.

    Há mais de um ano que eurodeputados, instituições europeias e membros da sociedade civil pedem o acesso aos contratos secretos negociados com a Pfizer.

    Na semana passada, as suspeitas em torno dos contratos com esta farmacêutica alemã – que tem ultrapassado a Moderna, a Janssen e a AstraZeneca no chorudo negócio das vacinas contra a covid-19 – aumentaram com a entrada em cena da Procuradoria Europeia. Na sequência deste anúncio, a presidente da Comissão Especial sobre a pandemia de covid-19 no Parlamento Europeu, Kathleen van Brempt, surpreendeu os seus colegas com declarações no Twitter, questionando, pela primeira vez, os contratos feitos com a Pfizer e o volume de vacinas compradas, bem como o montante pago pela União Europeia.

    Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia

    Apesar disso, a farmacêutica norte-americana nega qualquer irregularidade nas negociações. No passado dia 10, a presidente da International Development Markets da Pfizer, Janine Small, afirmou que o contrato para a venda de 1,8 mil milhões de doses não foi acordado através de SMS. “Posso dizer categoricamente que não foi o caso”, afirmou este alto quadro da farmacêutica norte-americana numa inquirição no Parlamento Europeu da Comissão Especial sobre a pandemia de covid-19, citada pela Reuters. Recorde-se que Janine Small admitiu também, nesse dia, que não tinham sido testados, nos ensaios clínicos antes da aprovação das vacinas, qualquer alegado efeito de redução da transmissibilidade nos vacinados, algo que esteve na base da introdução do certificado digital.

    Certo é que, mais do que a Comissão Europeia, a própria presidente da instituição tem sido o rosto das políticas drásticas que a União Europeia adoptou na gestão da pandemia, incluindo a maior operação de segregação registada desde a Segunda Guerra Mundial. Com efeito, o certificado digital serviu como “arma” para pressionar os europeus a tomarem várias doses de vacinas contra a covid-19.

    Ursula von der Leyen foi uma das muitas responsáveis da Comissão Europeia, sendo acompanhada pelos líderes dos diferentes países europeus, a falar em “pandemia de não-vacinados”, instigando as pessoas a vacinarem-se. Como se foi confirmando ao longo de 2021, e sobretudo depois do surgimento da variante Ómicron, a transmissão da infecção ocorre tanto entre vacinados como não-vacinados. Mesmo assim, a Comissão Europeia prolongou a validade do certificado digital até Junho de 2023, embora actualmente o seu uso esteja virtualmente suspenso.

    Albert Bourla, presidente-executivo da Pfizer

    Não é a primeira vez que Ursula von de Leyen surge numa polémica de contratos milionários opacos envolvendo mensagens e chamadas por telemóvel. A actual presidente da Comissão Europeia foi investigada quando era ministra da Defesa da Alemanha, entre 2013 e 2019. Ursula von der Leyen acabou por ser ilibada no chamado “Caso do Consultor”, em Junho de 2020, mas também aqui houve telefones à mistura.

    Os partidos então no Governo na Alemanha acabaram por absolver a agora presidente da Comissão Europeia no escândalo sobre a contratação milionária de consultores externos, sem a devida fiscalização e escrutínio. A absolvição surgiu num relatório que resultou de uma Comissão Especial parlamentar que investigou o caso. Em todo o caso, Ursula von der Leyen admitiu, naquela Comissão, que “erros foram cometidos” na contratação de consultores, segundo o Politico.

    As principais críticas não se dirigiram à contratação de consultadoria externa, mas ao método. Durante a investigação, Ursula von der Leyen foi criticada porque os dados de dois telemóveis oficiais, que utilizou durante o tempo em que foi ministra da Defesa, foram apagados. Esses dados poderiam ser prova na investigação.

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    Sobre o assunto, von der Leyen disse, numa entrevista ao Spiegel que terá entregado os dois telemóveis e acrescentou que não foi responsável por qualquer acto de eliminação de dados. “Terá de perguntar o que lhes aconteceu. Os equipamentos pertencem ao Ministério e tinham de ser devolvidos”, afirmou.

    Mas a procissão para esclarecer as dúvidas em torno dos contratos assinados com a Pfizer ainda estará agora no adro, somando-se ainda a gestão política da Comissão von der Leyen na guerra da Ucrânia e o método para suprir a crise energética e a subida vertiginosa da inflação no espaço comunitário. Do sucesso desta estratégia depende o seu futuro político, até porque tem colocado “todas as fichas” na derrota da Rússia.

    No seu recente discurso anual, no dia 14 de setembro, Ursula von der Leyen frisou que a Europa tem estado do lado da Ucrânia desde o primeiro dia “com armas”, “com fundos” e com “as sanções mais duras [aplicadas à Rússia] que o Mundo já viu”. Disse que a Europa ficará do lado da Ucrânia “o tempo que for preciso”, sinalizando um Inverno duro para os europeus.

  • Fact-checkers inflamam ânimos em tentativa de minimização do #pfizergate

    Fact-checkers inflamam ânimos em tentativa de minimização do #pfizergate

    Os certificados digitais ainda estão tecnicamente activos, e durante mais de um ano constituíram uma segregação nunca vista depois da II Guerra Mundial. Na base dessa imposição, esteve sempre a ideia de que os vacinados protegiam os outros de serem por eles infectados, mesmo se os surtos da Ómicron confirmaram o que há muito se sabia: a imunidade de grupo era uma quimera. Um alto quadro da Pfizer veio agora alegar que não foi estudado inicialmente se a vacina evitava a transmissão, mas a posição desta farmacêutica norte-americana sempre foi dúbia, nunca negando a base com que os governantes impuseram o certificado digital. A celeuma aumentou nos últimos dias quando fact-checkers como os da Associated Press e da Reuters vieram tentar ilibar a Pfizer.


    Afinal, a Pfizer mentiu ou não sobre a sua vacina?

    Grandes empresas de media, como a Reuters e a Associated Press (AP), tentaram, nos últimos dias, pôr água na fervura na polémica sobre a real eficácia da vacina da Pfizer contra a covid-19 em impedir a transmissão do vírus. Mas o resultado não foi o esperado, pois conseguiram inflamar ainda mais a revolta, visível em comentários e artigos dentro e fora das redes sociais.

    Numa análise feita pelo PÁGINA UM, nos últimos dois anos, tanto a Pfizer, como governantes, políticos, jornalistas e “especialistas” induziram a população a acreditar que a vacina contra a covid-19 impedia a transmissão. Foi com base nessa ideia, que foi amplamente espalhada, que foi criada a maior operação de discriminação e segregação da história moderna, governos violaram a Lei e houve graves atropelos aos direitos humanos e civis em diversas regiões do globo, incluindo na Europa.

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    Dose da vacina da Pfizer/BioNTech.

    Se foi por acaso ou não, o que é certo é que se alguém quiser processar a Pfizer por ter “mentido” sobre a sua vacina proteger contra a transmissão do SARS-CoV-2, não vai encontrar apoio na declaração de aprovação preliminar da vacina.

    Ou seja, tecnicamente, aquando da autorização de emergência concedida à vacina, em dezembro de 2020, pelo regulador norte-americano, a Food and Drug Administration (FDA), foi referido explicitamente que não havia provas de que a vacina conseguia impedir a transmissão do vírus. Mas isso significa que a Pfizer não mentiu?

    Tecnicamente, olhando apenas para essa comunicação do regulador norte-americano, não mentiu. Mas a verdade é que, poucos dias depois, o presidente-executivo da Pfizer, Albert Bourla, foi muito claro ao afirmar em entrevista à estação de televisão norte-americana CNBC que a vacina deve ser tomada para “proteger os outros”, sugerindo que os vacinados não iriam contagiar outras pessoas. E ainda afirmou: “confie na Ciência”.

    Janine Small substituiu o presidente-executivo da Pfizer, Albert Bourla, na audição na Comissão Especial sobre a pandemia de covid-19 no Parlamento Europeu.

    Ora, não foi apenas Bourla a semear a ideia de que a vacina impedia o contágio. Governantes, autoridades de saúde, “especialistas”, médicos, jornalistas, figuras públicas, todos afirmaram que a vacina parava o vírus e que os não vacinados é que iriam transmitir o vírus a outros.

    Mas comecemos pelo início. Vários órgãos de comunicação social, incluindo agências noticiosas como a Reuters e a Associated Press (AP), apressaram-se, nos últimos dias, a classificar como erróneo (misleading, em inglês) afirmar que a Pfizer mentiu sobre a sua vacina proteger contra a transmissão do vírus SARS-CoV-2.

    As empresas de media referiam-se à polémica que estalou na semana passada, depois de uma responsável da farmacêutica, Janine Small, ter respondido a um eurodeputado, numa audição no Parlamento Europeu, que a Pfizer não testou a sua vacina para ver se impedia a transmissão antes de submeter o pedido de autorização para uso de emergência do fármaco junto do regulador americano.

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    As ondas de choque geradas pela afirmação propagaram-se rapidamente como tsunamis, incluindo nas redes sociais. A rapidez com que as empresas de media ou “verificadores de factos” – que se articulam com as empresas que operam redes sociais – vieram tentar pôr água na fervura, não parece estar a funcionar. A Reuters noticiou mesmo que a vacina da Pfizer realmente “diminuía a transmissão nas primeiras variantes” do SARS-CoV-2.

    Mas a tentativa de empresas como a Reuters e a AP em diminuírem a importância da afirmação de Janine Small, acabou por enfurecer ainda mais os que já estavam zangados e provocou uma onda maior de revolta, visível na inundação das redes sociais nos muitos posts e vídeos. Entre os comentários, há acusações de que empresas de media estão a querer branquear o tema e ajudar a Pfizer.

    Nos vídeos partilhados encontram-se excertos de entrevistas do presidente executivo da Pfizer, Albert Bourla, onde este afirma que os dados apontavam que a vacina é eficaz a travar a transmissão do vírus e que a vacina deve ser tomada porque “protege os outros”, indicando que quem se vacina não passa o vírus a outras pessoas.

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    Afinal, quem tem razão: empresas como a Reuters e a AP e restantes “verificadores de factos” ou as pessoas que em todo mundo se sentem traídas pela Pfizer e por governantes e autoridades de saúde e especialistas?

    Certo é que muitas pessoas que se vacinaram, fizeram-no com a convicção de que estavam a proteger-se, mas também contribuíam para evitar transmitir o vírus às restantes pessoas. Era um acto de cidadania, de responsabilidade social. Um dever cívico. E quem assim não agisse seria malvisto do ponto de vista social. Outras pessoas vacinaram-se porque foram forçadas, de modo a poderem trabalhar livremente, ir à universidade, a entrar em espectáculos ou restaurantes, a viajar. Em diversos países, quem não estava vacinado nem sequer podia entrar em transportes públicos.

    Na Europa e outras regiões do globo foi-se instalando um “apartheid”, que retirou (e ainda retira) direitos a quem não tomava as doses da vacina. Em países como a Austrália, Canadá e Nova Zelândia a violação de direitos humanos e civis foi (ainda é) extremamente severa, só ultrapassados pela gestão da pandemia na China – uma ditadura.

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    Na Europa, foi criado o polémico “passaporte covid” ou “certificado digital” (nome adotado em Portugal), inicialmente apenas para controlo em aeroportos, mas que começou a ser abusivamente usado como um “cartão de acesso” dos cidadãos no próprio país.

    O certificado digital, aprovado em 14 de Junho de 2021 pela Comissão Europeia, foi a maior operação de segregação e discriminação da história moderna. Na sua base, estava a “crença” de que as vacinas impediam a transmissão do SARS-CoV-2. E assim se criaram mitos, como aquele de que existia “uma pandemia de não vacinados”, o que era falso, dado que os vacinados também propagavam o vírus.

    Voltando à pergunta, afinal a Pfizer mentiu ou não? Comecemos pelo anúncio da FDA sobre a concessão de autorização para uso de emergência da vacina da Pfizer/BioNTech. Foi a 11 de Dezembro de 2020 e no comunicado podia ler-se: “Nesta altura, não há dados disponíveis para determinar sobre quanto tempo a vacina vai oferecer protecção, nem existem provas de que a vacina previne a transmissão do SARS-CoV-2 de pessoa para pessoa”. Se quisermos ser incorrectos e dar informação parcial, então pegamos apenas neste comunicado e assim os “verificadores de factos” estão certos: a Pfizer não mentiu.

    Notícia de 11 de Março de 2021 da Reuters, referindo que a vacina da Pfizer prevenia a transmissão por assintomáticos.

    Mas, a verdade está nos detalhes. Se se quiser ser correto e fornecer a informação de modo imparcial e completa, então há que pegar também em declarações do CEO da Pfizer, de autoridades, de governantes, de “especialistas”, de jornalistas que incutiram na população a ideia de que a vacina da Pfizer parava a transmissão do vírus.

    Porque, na realidade, as pessoas não leem habitualmente comunicados da Pfizer ou da FDA. As pessoas leem e ouvem as declarações de “figuras da autoridade” na televisão, nas rádios, na Internet e na imprensa.

    Começando então pela própria Reuters, e pelo dia 11 de Março de 2021. Nesse dia, a agência publicou uma notícia que foi massificada para todos os media. O título da notícia é o seguinte: “Pfizer/BioNTech dizem que dados sugerem que a vacina é 94% eficaz a prevenir infeção em assintomáticos”. No primeiro parágrafo da notícia pode ler-se: “A Pfizer Inc e a BioNTech SE disseram na quinta-feira que dados reais de Israel sugerem que a sua vacina contra o covid-19 é 94% eficaz na prevenção de infeções em assintomáticos, o que significa que pode reduzir significativamente a transmissão (do SARS-CoV-2)”.

    Ou seja, a mesma Reuters que agora diz que a Pfizer não disse que a sua vacina impedia a transmissão do vírus publicou uma notícia pouco depois da aprovação preliminar do fármaco pela FDA a dizer que … a Pfizer sugere que a sua vacina impede a transmissão.

    Esta notícia é relevante mas não é a única prova de que foi disseminada a ideia pela população de que a vacina da Pfizer contra a covid-19 impedia a infecção e a transmissão do vírus a outras pessoas. O próprio presidente-executivo da farmacêutica, Albert Bourla, afirmou em diversas entrevistas, nos últimos dois anos, que a vacina servia para proteger “os outros”, ou seja, que os vacinados não iriam passar o vírus a outras pessoas.

    No dia 14 de dezembro de 2020, poucos dias após a aprovação preliminar da vacina, Bourla afirmou numa entrevista à CNBC: “Repito, mais uma vez, que esta escolha de não se vacinar não vai afectar apenas a sua saúde e a sua vida; vai afectar as vidas de outros e provavelmente as vidas das pessoas que mais ama, que são as pessoas que normalmente está mais em contacto”. E adiantou: “por isso, confie na ciência”.

    A 25 de fevereiro de 2021, Bourla disse à NBC: “Tenho quase a certeza – mas os dados terão de confirmar – que vamos ter também um alto grau de proteção contra a transmissão”. E remeteu para os estudos que estavam a realizar, incluindo o que foi feito em Israel e noticiado, nomeadamente pela Reuters.

    As declarações de Bourla no sentido que quem se vacinasse iria proteger “os outros” (sugerindo que não iria ser passado o vírus a outros) sucederam-se nos últimos dois anos. Ainda em maio deste ano, o CEO da Pfizer sentou-se para uma entrevista a Klaus Schwab, fundador e presidente do Fórum Económico Mundial, em Davos.

    Questionado sobre o que diria às pessoas que não se quiserem vacinar porque existem já alguns fármacos para alegadamente ajudar a diminuir os sintomas de covid-19, Bourla foi claro. “O objetivo não é que fique doente e se trate. O objetivo é prevenir que não adoeça e isso vai maximizar as hipóteses de ficar bem e vai maximizar as hipóteses de as pessoas que você ama não ficarem infectadas.” E prosseguiu: “você não se vacina apenas por você, vacina-se para proteger a sociedade e sobretudo para proteger aqueles que mais ama”.

    Em 8 de Março de 2021, Graça Freitas falava da importância da vacinação para não permitir a transmissão do SARS-CoV-2 entre pessoas.

    Não foi apenas o CEO da Pfizer a induzir a população em erro. Em Portugal há muitos exemplos. No dia 8 de Março de 2021, a directora-geral da Saúde, Graça Freitas protagonizou um vídeo para promover a vacinação contra a covid. O vídeo foi amplamente divulgado, incluindo na Internet e redes sociais. Graça Freitas afirmava que a vacina tinha duas vantagens: uma para “o próprio”, porque a vacina “protege contra a doença e complicações”; e a segunda vantagem era “para todos, para a comunidade”, uma vez que “esta protecção que uns dão aos outros chama-se imunidade de grupo”.

    E a directora-geral da Saúde explicava o seu raciocínio: “Quanto mais pessoas estiverem vacinadas, menos pessoas o vírus tem para infectar, menos velocidade tem de propagação”. Mais uma vez, a ideia que ficou é que quem se vacinasse não seria infectado com o vírus e também ficariam protegidos os outros, que não apanhariam a doença de vacinados.

    O neurologista e investidor Michael Burry insurgiu-se contra a Associated Press por “proteger” a Pfizer.

    Em Portugal, jornalistas, médicos e “especialistas” espalharam a ideia de que as vacinas impediam a transmissão, incluindo o conhecido Filipe Froes, consultor da Direcção-Geral da Saúde e da Pfizer, bem como de outras farmacêuticas.

    Mas, lamentavelmente, o rol de personalidades que induziram em erro a população inclui: o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden; Bill Gates; Anthony Fauci (epidemiologista-chefe nos Estados Unidos), Rochelle Walensky, diretora do regulador norte-americano da saúde, a Centers for Disease Control and Prevention (CDC), entre muitos outros.

    Em todo mundo instalou-se um clima de segregação e perseguição de pessoas que optaram por não se vacinar. Foi divulgada informação falsa sobre os não vacinados.

    Compreende-se a revolta que existe hoje na população. Talvez a melhor análise da situação foi feita por Michael Burry, investidor e médico, famoso pela fortuna que conseguiu por prever a crise financeira de 2008, retratada no filme “The Big Short“.

    Comentando um tweet da AP, que afirmava que a Pfizer não mentiu sobre a sua vacina, Burry escreveu: “A AP a dar cobertura, como de costume”. “Mas o problema não é a Pfizer. Todos os cientistas sabiam desde o início que a vacina não impedia a transmissão. Era de senso comum. E ainda assim o Governo mentiu, os vossos médicos mentiram, a vossa escola mentiu. E colocaram-vos sob o seu controlo”. E incitava por fim: “Da próxima vez, lutem”.

  • Covid-19: União Europeia (finalmente) investiga compra de vacinas e discursos oficiais mudam de tom

    Covid-19: União Europeia (finalmente) investiga compra de vacinas e discursos oficiais mudam de tom

    Em apenas uma semana, a Europa acordou para a necessidade de saber, afinal, o que se passou com a compra de vacinas contra a covid-19. A Procuradoria Europeia anunciou que tem em curso uma investigação à compra das vacinas. O anúncio surgiu numa semana polémica na Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19, no Parlamento Europeu. Hoje, a presidente desta Comissão surpreendeu muitos eurodeputados com declarações no Twitter a defender a investigação à compra das vacinas e a questionar o secretismo em torno dos contratos com a Pfizer.


    Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, está debaixo de fogo devido a suspeitas relativamente aos contratos secretos de compra de vacinas contra a Covid-19 à farmacêutica norte-americana Pfizer.

    Há mais de um ano que eurodeputados, instituições europeias e membros da sociedade civil pedem o acesso aos contratos secretos negociados por Ursula von der Leyen com o presidente executivo da Pfizer, Albert Bourla.

    Ursula von der Leyen entregou o prémio de liderança do Atlantic Council a Albert Bourla, CEO da Pfizer, em Novembro de 2021.

    Os últimos dias representaram um ponto de viragem que pode trazer dissabores a von der Leyen mas maior transparência ao processo de compra das vacinas. A Procuradoria Europeia anunciou ontem estar a investigar a compra de vacinas pela União Europeia.

    E, hoje, Kathleen van Brempt, presidente da Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, surpreendeu com declarações no Twitter, questionando, pela primeira vez, os contratos feitos com a Pfizer e o volume de vacinas compradas, bem como o montante pago pela União Europeia.

    Estes desenvolvimentos dos últimos dois dias surgem após uma semana explosiva no que toca ao tema das vacinas contra a covid-19, e sobretudo em relação aos contornos das compras lideradas pela Comissão Europeia, que já atingiram os 4,6 mil milhões de doses por 71 mil milhões de euros, mais de um terço do produto interno bruto português em 2021.

    Primeiro, foi uma responsável da gigante farmacêutica norte-americana Pfizer que admitiu, perante deputados do Parlamento Europeu, que a sua vacina não foi testada para se saber se impedia a transmissão do SARS-COV-2.

    As ondas de choque que as declarações desta responsável da Pfizer geraram foram gigantescas e a revolta, tanto de vacinados como de não vacinados, inundou as redes sociais.

    Entretanto, vários media tradicionais, incluindo a Reuters e a Associated Press, apressaram-se a garantir que a Pfizer nunca tinha prometido que a sua vacina impedia a infecção e o contágio, apesar de existirem ensaios clínicos pagos pela Pfizer que garantem que a vacina prevenia a transmissão do vírus.

    Em Portugal, o pneumologista Filipe Froes, um dos mais destacados consultores da Direcção-Geral da Saúde e também da Pfizer (entre outras farmacêuticas), sempre defendeu que a vacina contra a covid-19 reduzia a transmissibilidade em caso de infecção. Em Janeiro deste ano, em declarações à TSF, Froes garantiu que “quem tem o esquema vacinal completo e com dose de reforço, tem um risco de infeção e de transmissão praticamente nulo. Não se pode dizer que seja zero, mas o risco é praticamente nulo.”

    Recorde-se que, com base na garantia de que as vacinas impediam a infecção e o contágio, foi imposto o chamado “certificado digital” ou “passaporte sanitário”, criando-se a maior operação de segregação da população da História moderna. Além disso, foi por uma suposta maior transmissibilidade dos não-vacinados que responsáveis políticos contribuíram para espalhar a estigmatização sobre quem voluntariamente optava por não se vacinar. Em 29 de Julho do ano passado, o presidente norte-americano Joe Biden falava de uma “pandemia de não-vacinados“. E Ursula von der Leyen veio apelar, em 23 de Novembro passado, para que os cidadãos se vacinassem ou recebessem um reforço por se estar perante uma “pandemia de não-vacinados“.

    Após a audição da responsável da Pfizer nesta semana, eurodeputados sugeriram, numa conferência de imprensa, que fosse constituída uma comissão de inquérito sobre a covid-19, acusando a Comissão Especial sobre o tema, que decorre no Parlamento Europeu, de ser uma espécie de farsa. Os eurodeputados denunciariam ainda que continuam a ser secretos os dados sobre a negociação da compra de vacinas por parte da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen.

    Janine Small, presidente da divisão de mercados internacionais desenvolvidos, da Pfizer, na audição na Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, no dia 10 de Outubro.

    Por coincidência, seguiu-se um outro anúncio de relevo: a Procuradoria Europeia anunciou ontem que está a investigar a compra de vacinas contra a Covid-19 pela União Europeia. Esta entidade independente da União Europeia anunciou, numa “rara confirmação”, segundo as suas palavras, que a investigação “surge na sequência da existência de um interesse público elevado”. O comunicado da Procuradoria Europeia adianta que “não serão tornados públicos mais detalhes nesta fase”.

    Foi no seguimento deste comunicado da Procuradoria Europeia, que a presidente da Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, a belga Kathleen van Brempt, publicou uma declaração no Twitter, o que surpreendeu muitos dos seus colegas eurodeputados. Brempt escreveu a propósito do anúncio da Procuradoria Europeia que “a Comissão COVI vai acompanhar este caso com grande atenção”.

    “Vários aspectos do terceiro contrato com a Pfizer, merecem ser escrutinados, as mensagens de texto entre a presidente da Comissão Europeia [e o CEO da Pfizer, Albert Bourla] e o facto de não haver nenhum documento sobre as negociações preliminares [entre os dois]”, escreveu ainda.

    E defendeu ainda que “precisamos saber a razão de o maior contrato ser o menos transparente; Precisamos compreender a razão para a União Europeia ser obrigada a comprar 1,8 mil milhões de vacinas da Pfizer/BioNTech, independentemente das necessidades, independente de haver novos e melhores players a entrar no mercado”.

    Conferência de imprensa de 11 de Outubro de eurodeputados que contestam a falta de transparência dos contratos de compra de vacinas contra a covid-19.

    No seu tweet, Kathleen van Brempt lembrou que, “muitos dos contratos feitos pela União Europeia reservam o ‘direito’ a comprar mas no contrato com a Pfizer temos a ‘obrigação’ de comprar”. “Porque nos desviámos do procedimento normal para um contrato que cobre muitas vezes as nossas necessidades, durante um período em que todos deveriam estar já vacinados (2022 e 2023)”, questionou.

    Cristian Terhes, o eurodeputado que desde há cerca de um ano tem lutado, junto com outros eurodeputados, por maior transparência sobre os contratos de compra de vacinas, comentou entretanto as declarações de van Brempt. “O que é dito pela presidente da Comissão COVI representa uma mudança de paradigma da Comissão (Especial sobre covid), porque, até agora, a Comissão comportou-se como se o seu objetivo fosse pedir desculpas a Ursula von der Leyen pela forma fraudulenta como assinou contratos com as empresas de vacinas”, salientou o eurodeputado romeno. “Agora, a presidente admite que existe um problema com a falta de transparência dos contratos, bem como com a forma e finalidade de compra das vacinas”, frisou na sua conta na rede social Facebook.

    O eurodeputado não tem sido, aliás, brando com a presidente da Comissão Europeia e, desta vez, pediu a sua demissão imediata. “Quando, há um ano atrás, comecei a falar com os meus colegas sobre a não transparência dos contratos e outros abusos cometidos por Ursula von der Leyen, muitos me disseram que não poderíamos fazer muito, porque era só conversa, porque estávamos a lidar com o melhor da União Europeia e assim por diante, desculpas atrás de desculpas para não fazer nada”, relembrou.

    Sede da Procuradoria Europeia no Luxemburgo.

    O eurodeputado prosseguiu indicando que “hoje, todos reconhecem que existe um problema com a não-publicação integral dos contratos”, e destacou uma grande mundança: “de segunda-feira, 10.10.2022, até hoje, 15.10.2022, tudo o que foi afirmado sobre estas vacinas mudou drasticamente”.

    Isto porque, recordou Cristian Tehres, “a Pfizer admitiu oficialmente, quando questionada pelo colega Rob Ross, que não testou realmente a vacina para ver se ela impede a transmissão do vírus”, acrescentando que, “mais tarde, isto foi também reconhecido por um representante da Comissão Europeia numa pergunta que lhe fiz”.

    O eurodeputado garantiu que vai continuar a pressão: “obviamente, não vamos parar até descobrirmos a verdade, toda a verdade! Até lá, Ursula von der Leyen deve demitir-se e colocar-se à disposição dos organismos europeus de investigação criminal”. E terminou o seu post com os hashtags #UrsulaMustResign #UrsulaMustGo.

    O romeno Cristian Terhes e o croata Mislav Kolakusic são os eurodeputados responsáveis pela criação da Comissão Conjunta COVID com a Comissão de Controlo Orçamental.

    Este eurodeputado está a preparar, juntamente com o eurodeputado croata Mislav Kolakusic, a Comissão Conjunta COVID com a Comissão de Controlo Orçamental (CONT), na qual será analisado o relatório do Tribunal de Contas da UE sobre como as vacinas foram compradas.

    Segundo este relatório, até Novembro de 2021 a Comissão Europeia comprou, em nome dos Estados, 4,6 mil milhões de doses de vacina por 71 mil milhões de euros. Tehers comentou que “a quantidade é enorme, assim como o valor comprado”. Com efeito, sendo a população da União Europeia de 447 milhões de habitantes, a Comissão Europeia comprou vacinas suficientes para nove doses por pessoa, incluindo crianças.