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  • Notícias do Expresso sobre sondagens das Presidenciais com notas medíocres

    Notícias do Expresso sobre sondagens das Presidenciais com notas medíocres

    Relatório de avaliação do conjunto de notícias sobre a Sondagem Presidencial – Expresso (30 de Janeiro de 2025)


    1. Introdução

    Este relatório apresenta uma avaliação conjunta das três notícias publicadas pelo jornal Expresso no dia 30 de Janeiro de 2025, relativas à sondagem presidencial conduzida pelo ICS/ISCTE para o Expresso e a SIC. As peças analisadas são:

    1. Sondagem presidenciais: Gouveia e Melo destacado, Ventura pode ir à segunda volta.
    2. Mendes é considerado mais ‘à direita’ do que almirante.
    3. PS só tem lugar para um: Vitorino e Seguro seguem empatados, Centeno faria melhor.

    Estas três notícias fazem parte de uma única análise noticiosa sobre a sondagem, abordando diferentes aspectos do estudo. Assim, a avaliação conjunta permite identificar tendências, padrões e eventuais discrepâncias qualitativas entre os artigos.

    A avaliação foi conduzida com base na metodologia Rigor Jornalístico sobre Sondagens (RJS), previamente definida em articulação com o jornal PÁGINA UM e ajustada para dar maior peso à precisão dos dados (35%) e à transparência na apresentação da informação (30%). A análise de conteúdo e a quantificação dos critérios foram da exclusiva responsabilidade do ChatGPT. A avaliação foi realizada com exigência rigorosa, considerando os princípios do jornalismo transparente e informativo numa sociedade democrática.


    2. Metodologia de Avaliação

    A avaliação segue a estrutura RJS (Rigor Jornalístico sobre Sondagens) e abrange seis critérios essenciais, aplicados a cada uma das três notícias.

    A nota final de cada notícia resulta da aplicação destas ponderações às notas atribuídas a cada critério.


    2.1. Processo de Avaliação da Inteligência Artificial

    A avaliação das notícias foi realizada utilizando técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (PLN) e avaliação contextual.

    O Processamento de Linguagem Natural (PLN) refere-se a um conjunto de técnicas que permitem a um modelo de inteligência artificial compreender, interpretar e analisar textos escritos de forma semelhante a um leitor humano. O PLN envolve análise sintáctica, semântica e pragmática, permitindo identificar factos, opiniões, dados estatísticos e omissões. No contexto desta avaliação, o modelo extrai e processa automaticamente as informações presentes na notícia, identificando padrões e verificando a completude dos dados.

    A avaliação contextual complementa o PLN ao interpretar o significado e a relevância das informações no contexto específico da cobertura noticiosa. Esta abordagem analisa a estrutura argumentativa do texto, a escolha de palavras e a ênfase dada a determinados aspectos da notícia, permitindo detectar enviesamentos subtis ou omissões estratégicas. O modelo compara o conteúdo da peça com boas práticas jornalísticas e identifica se a apresentação dos dados pode influenciar indevidamente a percepção pública sobre os resultados da sondagem.


    2.2. Etapas do Processo de Avaliação

    A avaliação das notícias seguiu três níveis estruturados:

    1. Segmentação e Extração de Informação
      • Identificação das percentagens apresentadas e verificação da sua completude.
      • Análise da manchete e do lead para detectar formulações enviesadas.
      • Verificação da presença e clareza da ficha técnica da sondagem.
    2. Comparação com os Padrões de Rigor Informativo
      • Análise de omissões relevantes e apresentação de dados.
      • Identificação de linguagem potencialmente influenciadora da percepção do leitor.
      • Comparação entre as três notícias para detectar diferenças qualitativas.
    3. Atribuição de Pontuações
      • Aplicação da escala de 0 a 20 pontos a cada critério, ponderando os resultados de acordo com a sua relevância.

    3. Avaliação das Notícias

    3. Avaliação das Notícias

    A seguir apresenta-se o quadro consolidado com as avaliações de cada critério para cada notícia:

    A análise dos resultados evidencia que todas as notícias analisadas falham em critérios fundamentais de rigor jornalístico, com nenhuma das três peças a alcançar uma avaliação satisfatória nos domínios da precisão e da transparência.

    A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a pior avaliação global (7,85/20), com resultados particularmente críticos nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A peça não apresenta a totalidade dos votos, omite valores essenciais como brancos e nulos e utiliza uma manchete que pode induzir uma percepção enganadora sobre a posição de Gouveia e Melo. A falta de contextualização dos números e a ausência de qualquer explicação sobre a margem de erro agravam ainda mais a falta de rigor informativo.

    A notícia “Mendes à direita” teve a melhor nota (13,2/20), mas ainda assim insuficiente para ser considerada uma peça jornalística de qualidade. Embora tenha atingido o mínimo aceitável no critério de imparcialidade (15/20), continua a falhar nos critérios essenciais de precisão (12/20) e transparência (10/20), comprometendo a integridade da informação veiculada. O artigo não apresenta a relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto, omitindo dados essenciais para uma análise completa.

    A notícia “PS só tem lugar para um” obteve um resultado intermédio (11,6/20), demonstrando fragilidades tanto na precisão (10/20) quanto na transparência (8/20). A peça explora a divisão no PS, mas sem fornecer uma visão completa do impacto eleitoral desse factor. A ausência de um quadro comparativo e a omissão de cenários de segunda volta tornam a análise incompleta e pouco rigorosa.

    O critério de qualidade da análise e contextualização apresentou notas insuficientes em todas as peças (abaixo de 15/20), o que reforça a fragilidade interpretativa das notícias. Nenhuma das análises explorou de forma rigorosa os impactos dos cenários eleitorais alternativos, nem relacionou as tendências de intenção de voto com a evolução histórica do eleitorado.

    A linguagem e clareza obtiveram 18/20, demonstrando que a apresentação dos textos é acessível. Contudo, uma escrita clara não significa rigor informativo. O problema reside na seleção e estruturação das informações, que distorcem a percepção eleitoral ao omitir elementos fundamentais.

    O rigor metodológico e credibilidade recebeu 16/20, um valor relativamente elevado, mas ainda assim insuficiente para um padrão de excelência. A apresentação da ficha técnica da sondagem poderia ser mais clara e acessível, incluindo detalhes sobre a distribuição da amostra e ponderação dos resultados.


    4. Justificação das Avaliações

    A seguir apresenta-se a justificação detalhada para cada critério de avaliação aplicado a cada uma das três notícias.


    4.1 Precisão dos Dados Apresentados (35%)

    “Sondagem presidenciais” – 5/20

    A notícia apresenta dados incompletos e omite elementos fundamentais para a interpretação da sondagem. A ausência da distribuição total dos votos impede que o leitor compreenda a real dimensão dos indecisos, dos brancos e nulos e dos candidatos com menos expressão. Além disso, a manchete usa o termo “destacado” para descrever Gouveia e Melo, o que pode levar a uma percepção exagerada da sua vantagem eleitoral, quando, na realidade, tem apenas 25% dos votos num cenário altamente fragmentado. A falta de qualquer análise sobre a margem de erro e variações possíveis dos resultados torna a peça extremamente deficiente em precisão.

    “Mendes à direita” – 12/20

    Embora esta peça não apresente uma análise directa das intenções de voto, os dados que fornece sobre a percepção ideológica dos candidatos são apresentados de forma relativamente correcta. No entanto, falta-lhe uma relação entre essa percepção e a intenção de voto, o que compromete a interpretação dos números. O leitor não consegue inferir se a percepção de um candidato como “mais à direita” ou “mais ao centro” afecta a sua elegibilidade e competitividade eleitoral. A ausência de comparação com outras sondagens também limita a precisão dos dados ao não oferecer um quadro evolutivo das tendências eleitorais.

    “PS só tem lugar para um” – 10/20

    A notícia fornece percentagens sobre a disputa interna do PS, mas não contextualiza como essas percentagens se integram no panorama geral da corrida presidencial. O texto refere que Centeno teria melhor desempenho do que Vitorino e Seguro, mas não explica a base comparativa desse cenário, nem especifica como a amostra foi segmentada. Além disso, não são apresentados dados sobre a margem de erro, o que impede que o leitor compreenda se a diferença entre os candidatos socialistas é estatisticamente significativa ou apenas uma variação normal dentro da margem de erro.


    4.2 Transparência e Acesso à Informação Completa (30%)

    “Sondagem presidenciais” – 4/20

    A notícia omite a distribuição completa dos votos, dificultando a compreensão do peso real de cada candidato. Não há qualquer menção aos votos brancos, nulos e aos inquiridos que se declararam indecisos, o que impede uma leitura correcta da sondagem. Além disso, a ficha técnica da sondagem não é apresentada de forma clara e acessível ao leitor, e a ausência de referências detalhadas à metodologia usada no estudo compromete ainda mais a transparência da peça.

    “Mendes à direita” – 10/20

    A transparência desta peça é ligeiramente melhor, mas ainda deficitária. A notícia expõe algumas informações úteis sobre a percepção ideológica dos candidatos, mas não fornece um quadro claro sobre a distribuição total das respostas. Além disso, não há qualquer referência à margem de erro, à metodologia da recolha de dados ou à amostra utilizada para essa avaliação da percepção ideológica, o que prejudica a sua credibilidade.

    “PS só tem lugar para um” – 8/20

    A transparência desta notícia é insuficiente, embora um pouco superior à da peça sobre Gouveia e Melo. A peça fornece alguns números relevantes, mas não detalha a amostra utilizada para avaliar o impacto de cada candidato socialista nas eleições. A ausência de dados sobre o número total de inquiridos e a margem de erro torna a leitura dos números parcial e incompleta.


    4.3 Imparcialidade e Isenção (15%)

    “Sondagem presidenciais” – 10/20

    Embora a notícia não contenha ataques directos a qualquer candidato, a forma como apresenta os dados reforça uma percepção enviesada da corrida presidencial. A manchete e o lead enfatizam a “liderança” de Gouveia e Melo de maneira desproporcionada, sem destacar que 25% das intenções de voto num cenário de grande dispersão não significa uma vantagem decisiva. A falta de referências a outros candidatos menos expressivos também contribui para um enquadramento desequilibrado da informação.

    “Mendes à direita” – 15/20

    A notícia apresenta um enquadramento mais neutro, relatando apenas a percepção ideológica dos candidatos sem sugerir favoritismos. No entanto, a peça não faz qualquer esforço para contextualizar o impacto da percepção ideológica nas intenções de voto, o que pode limitar a compreensão do leitor sobre a relevância desses dados no cenário eleitoral.

    “PS só tem lugar para um” – 12/20

    A peça acentua a divisão interna do PS e pode sugerir uma crise no partido, ainda que não contenha ataques directos aos candidatos mencionados. A forma como apresenta Centeno como uma alternativa eleitoralmente mais viável pode influenciar a percepção do leitor, principalmente porque não são fornecidos dados suficientes para fundamentar essa conclusão.


    4.4 Qualidade da Análise e Contextualização (10%)

    “Sondagem presidenciais” – 12/20

    A análise centra-se exclusivamente na possibilidade de Ventura chegar à segunda volta, mas não explora outras hipóteses ou cenários alternativos, como o impacto de um crescimento de outro candidato de direita. A ausência de um enquadramento histórico ou de comparações com sondagens anteriores reduz a profundidade da análise.

    “Mendes à direita” – 14/20

    A peça apresenta um contexto interessante sobre a percepção ideológica dos candidatos, permitindo uma leitura mais aprofundada sobre o espectro político da eleição. No entanto, a análise não estabelece qualquer ligação entre essa percepção e as intenções de voto, o que a torna menos útil para o entendimento do impacto eleitoral dessa dinâmica.

    “PS só tem lugar para um” – 13/20

    A análise sobre a disputa interna do PS é relevante, mas falta-lhe uma exploração mais profunda das consequências desse cenário no contexto eleitoral mais amplo. O artigo não avalia cenários de segunda volta ou a redistribuição de votos caso o PS apresente um candidato diferente.


    4.5 Linguagem e Clareza (5%)

    Todas as três notícias obtiveram 18/20 neste critério, indicando que a linguagem utilizada é clara, directa e acessível ao público. No entanto, uma escrita clara não significa rigor informativo. A escolha de termos nas manchetes, sobretudo na peça sobre Gouveia e Melo, tem impacto na percepção pública e pode distorcer a interpretação dos leitores sobre a corrida eleitoral.


    4.6 Rigor Metodológico e Credibilidade (5%)

    As três notícias receberam 16/20 neste critério. Embora a ficha técnica da sondagem seja referida, falta uma explicitação detalhada sobre a metodologia utilizada, incluindo a ponderação dos votos e a forma como foram tratados os indecisos. A inclusão desses elementos teria aumentado a credibilidade da informação apresentada.



    5. Conclusão detalhada

    A avaliação detalhada das três notícias do Expresso sobre a sondagem presidencial de 30 de Janeiro de 2025 revela falhas estruturais graves na apresentação e interpretação dos dados eleitorais, comprometendo a sua transparência e o rigor informativo esperado num jornalismo de qualidade. Nenhuma das peças analisadas atingiu um nível aceitável nos critérios essenciais de precisão dos dados e transparência na exposição das intenções de voto, e todas apresentaram deficiências na imparcialidade e na contextualização das informações.

    A principal crítica global é a omissão da distribuição total dos votos, um elemento fundamental para uma análise rigorosa da sondagem. Sem essa informação, os leitores não conseguem interpretar correctamente a posição relativa de cada candidato, nem compreender o impacto real dos indecisos, dos votos brancos e nulos e das oscilações entre os diferentes cenários eleitorais. Esta ausência de dados configura uma grave falha jornalística, pois limita o acesso do público a uma leitura completa e isenta dos resultados da sondagem.

    As notas finais atribuídas a cada notícia demonstram que todas apresentam problemas sérios na forma como estruturam a informação e comunicam os resultados eleitorais:

    Com base nestes resultados, destaca-se que:

    • A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a avaliação mais baixa (7,85/20), com falhas graves nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A omissão de informações essenciais sobre a distribuição total dos votos e a construção de uma narrativa que enfatiza a “liderança” de Gouveia e Melo sem o devido enquadramento quantitativo configuram erros inaceitáveis para uma cobertura informativa deste tipo.
    • A notícia “Mendes à direita” teve a melhor avaliação (13,2/20), mas não atinge um patamar aceitável de rigor jornalístico. Embora seja menos enviesada na sua estrutura, a falta de uma relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto compromete a sua utilidade informativa. A ausência de contextualização histórica e de cenários alternativos impede que a peça seja considerada um exemplo de jornalismo rigoroso.
    • A notícia “PS só tem lugar para um” ficou com uma nota intermédia (11,6/20), sendo penalizada por falhas na transparência (8/20) e na precisão dos dados (10/20). A peça apresenta números relativos à disputa interna do PS, mas não explica o impacto dessa divisão no contexto eleitoral geral, nem fornece elementos que permitam uma interpretação objectiva dos dados.

    Em termos de linguagem e clareza, todas as notícias obtiveram avaliações elevadas (18/20), o que demonstra que os textos são acessíveis ao público. No entanto, uma escrita clara não é sinónimo de rigor informativo, e a forma como a informação é estruturada e selecionada pode influenciar percepções eleitorais de maneira subtil, mas relevante.

    O rigor metodológico e credibilidade das peças foi insuficiente (16/20 em todas as notícias), pois a ficha técnica da sondagem não foi devidamente destacada nem explicada em profundidade. A ausência de informações sobre a ponderação dos dados e sobre a forma como foram tratados os indecisos limita a credibilidade das notícias.


    5.1 Considerações Finais

    A avaliação global da cobertura do Expresso sobre a sondagem presidencial indica uma abordagem deficiente no que diz respeito à transparência e ao rigor da apresentação dos dados eleitorais. As três peças analisadas falham em apresentar um panorama completo e objectivo da corrida presidencial, deixando lacunas significativas que podem afectar a percepção dos leitores sobre a realidade eleitoral.

    A falta de um quadro comparativo completo das intenções de voto compromete a análise global da sondagem, e a escolha de manchetes e leads sem a devida sustentação quantitativa introduz um viés na percepção pública, ainda que de forma implícita.

    Se estas deficiências fossem corrigidas, as notícias poderiam atingir notas entre 16 e 18 em 20, garantindo um padrão informativo adequado ao jornalismo de qualidade e ao dever de transparência perante os leitores.

    A presente avaliação sublinha a importância do rigor na apresentação de sondagens eleitorais, um elemento central para garantir que os cidadãos tenham acesso a informação completa, fiável e imparcial.

  • Administração Biden fez mais do dobro dos repatriamentos de Trump

    Administração Biden fez mais do dobro dos repatriamentos de Trump

    A Administração Biden, cujo mandato decorreu entre 2021 e 2024, mais do que duplicou o número de repatriamentos de estrangeiros face aos anos do primeiro mandato de Donald Trump (2017-2020), embora usando um expediente especial – uma lei sanitária de 1944, o Título 42 – que fez baixar artificialmente as deportações formais. Estes dados foram recolhidos e analisados pelo PÁGINA UM nos relatórios do Serviço de Imigração e Alfândega (Immigration and Customs Enforcement) e de uma unidade de estatística do Departamento de Segurança Interna (DHS) dos Estados Unidos, com informação detalhada desde 1996 até finais de 2024.

    Apesar de a recém-formada Administração Trump ter elegido o controlo intensivo da imigração ilegal como uma das suas bandeiras – provocando já celeuma com deportações para o Brasil e a Colômbia –, certo é que, nos últimos quatro anos, os Estados Unidos até impediram um maior número de permanências face aos anos anteriores.

    Criança numa caravana de migrantes a caminho dos Estados Unidos. Foto: AFP

    Considerando todas as tipologias de repatriamento – retornos administrativos e forçados, deportações coercivas e expulsões sob regimes específicos, como o Título 42 –, foram contabilizados 777.590 processos ao longo de 2024. De entre estes, os retornos administrativos – aplicados quando um estrangeiro é intercetado na fronteira ou detetada a sua ilegalidade em inspeções regulares e sai voluntariamente do território norte-americano sem ser sujeito a um processo formal de deportação – totalizaram 92.310 casos, ou seja, 12% do total. No caso dos retornos forçados (‘enforcement returns’) – que não envolvem processo judicial completo, sendo uma forma simplificada de repatriamento –, no ano passado contabilizaram-se 355.290 casos, ou seja, 46% do total.

    Já as deportações coercivas, também denominadas formalmente como remoções (‘removals’) – que implicam um processo legal mais rigoroso, com a expulsão e outras penalidades, baseando-se em violações das leis de imigração –, atingiram os 329.990 casos, representando 42% do total.

    O total de repatriamentos a partir dos Estados Unidos no último ano civil do mandato de Joe Biden supera qualquer dos quatro anos do primeiro mandato de Donald Trump. Mas a contabilidade ainda se torna mais tenebrosa, e altera a perceção, se se contabilizar o período em que se aplicou o regime especial do Título 42, durante a pandemia. Aí, chega-se à conclusão de que, no mandato de Joe Biden, entre 2021 e 2024, foram repatriadas 4.779.640 pessoas – contra 2.001.220 pessoas no primeiro mandato de Trump (2017-2020) –, o que torna este o terceiro presidente que mais repatriou desde o mandato de Eisenhower (1953-1960).

    Expulsões sumárias durante a pandemia, ao abrigo do Título 42, fundada numa lei sanitária de 1944, permitiu ‘mascarar’ ondas de deportações da Administração Trump..Foto: AP.

    Com efeito, tendo a Administração Biden repatriado, por ano, uma média de quase 1,2 milhões de pessoas, só foi superado por Bill Clinton (1,5 milhões por ano) e George W. Bush (1,3 milhões por ano). Na lista dos últimos 13 presidentes, Donald Trump surge, porventura surpreendentemente, apenas na nona posição em termos de repatriamentos totais – e é aquele que menos repatriou nos últimos 50 anos.

    A aplicação do Título 42 foi inicialmente usada pela Administração Trump, em Março de 2020, ‘ressuscitando’ uma lei sanitária de 1944, que permitia assim ao Governo adotar restrições à entrada de pessoas ou bens no país para prevenir a disseminação de doenças transmissíveis. Transposta para desburocratizar expulsões de forma sumária, Trump usou-a bastante para controlo da imigração a partir do México, alegando que a sobrelotação em centros de detenção promoveria surtos incontroláveis. Sem acesso ao sistema tradicional de imigração, incluindo o direito de solicitar asilo – e contrariando assim o direito internacional –, no final do primeiro mandato de Trump, entre março e setembro de 2020, foram expulsas quase 207 mil pessoas, cerca de 34% dos 608 mil repatriamentos daquele ano.

    Este número anual (608.380) foi o mais elevado do primeiro mandato de Trump. Antes da pandemia, sem Título 42, os repatriamentos da primeira Administração Trump tinham atingido 387 mil em 2017, um pouco mais de 487 mil no ano seguinte e cerca de 518 mil em 2019.

    Número médio de repatriamentos por ano de cada Administração norte-americana desde 1953. Barras a azul referem-se a presidente democratas; barras a vermelho a republicanos. Fonte: DHS.

    Se parece evidente que Trump usou, em 2020, a ‘desculpa’ da pandemia para expulsar mais imigrantes sem burocracias nem pingo de humanidade, então a Administração Biden abusou nos anos seguintes. De facto, se, no primeiro ano da pandemia, Trump usou o Título 42 para expulsar uma média mensal de quase 61 mil (em 10 meses), a Administração Biden tomou-lhe o ‘gosto’. Ao longo do primeiro ano de mandato, Joe Biden tinha, na sua conta, 1.071.080 repatriamentos apenas pelo Título 42, sem incluir as restantes ‘modalidades tradicionais’.

    Por esse motivo, só contabilisticamente, as deportações (‘removals’) nos Estados Unidos desceram de 234.340, em 2020 (era Trump), para apenas 85.100, em 2021 (primeiro ano da era Biden). Assim, juntando um pouco mais de 128 mil de retornos administrativos e quase 50 mil de retornos forçados, a Administração Biden acabou, no primeiro ano de mandato, por ‘mandar embora’ um total de 1.334.200 pessoas, um crescimento de 119% face ao ano anterior, ainda sob governo federal do seu opositor republicano.

    No ano seguinte, em 2022, o democrata repetiu a dose: os repatriamentos surgiram à boleia do famigerado Título 42, com base em supostos motivos de saúde pública. Nessa ‘modalidade’, foram expulsos, sem apelo nem agravo, mais de 1,1 milhões de pessoas, uma média próxima das 100 mil por mês. Além destes, foram ainda repatriados mais 154 mil por retornos administrativos, quase 81 mil por retornos forçados e cerca de 123 mil deportações coercivas. No total, em 2022, a Administração Biden repatriou quase 1,47 milhões de pessoas, de longe o número mais elevado desde 2010.

    Distribuição dos repatriamentos entre 2010 e 2024 por tipologia. Fonte: Office of Homeland Security Statisticas / DHS.

    Por via da maior facilidade de expulsar imigrantes através do Título 42, a Administração Biden teve um efeito talvez esperado: quem era sumariamente ‘atirado’ fora da fronteira tentava de novo. O relatório de 2022do Office of Homeland Statistics salienta que as expulsões ao abrigo do Título 42 contribuíram para “encontros” repetidos das autoridades com os mesmos indivíduos. “Em 2022, 26% dos encontros de aplicação da lei pela CBP [Agência de Proteção de Fronteiras e Alfândega] envolveram pessoas anteriormente encontradas nos 12 meses anteriores, em comparação com 45% dos encontros entre março e setembro de 2020, 35% em 2021 e uma média de 15% entre 2014 e 2019.”

    Somente em Maio de 2023 o Título 42 foi descontinuado, e o sistema de imigração norte-americano retornou às regras tradicionais, que exigem processos legais mais estruturados para avaliar os pedidos de asilo, impondo penalidades severas para reentradas não autorizadas. Nesse ano, ainda foram expulsos sumariamente, por essa via, um total de 579 mil pessoas, registando-se uma descida do total dos repatriamentos para valores próximos de 1,2 milhões de pessoas. Neste ano, já se observou uma subida das deportações ‘clássicas’, com recurso a meios judiciais, que se cifraram em 117.540 pessoas, enquanto os retornos forçados aumentaram para quase 289 mil e os retornos administrativos se quedaram nos 154 mil.

    Observando as expulsões de território norte-americano ao abrigo da aplicação do Título 42, os valores impressionam em quatro anos: 2.960.910 casos, representando 64% do total dos repatriamentos. Neste período, em cada 100 expulsos por esta via, 97 foram durante o mandato de Biden. Por causa disso, as deportações tiveram apenas um peso de 13% no total dos repatriamentos, quando, no quinquénio anterior à pandemia, representavam 71% do total dos repatriamentos.

    black and silver bicycle in front of the man in black shirt
    Joe Biden usou e abusou de uma lei sanitária de 1944 para expulsar de forma imediata, sem apelo nem agravo, mais de 2,7 milhões de pessoas de imigrantes ilegais entre 2021 e 2023. Fonte: DR.

    Por esse motivo, mostra-se enganador analisar somente a evolução dos números de deportações considerando o período, uma vez que a descida entre 2021 e 2023 é fictícia. Sem pandemia, muitos casos de expulsão sumária seguiriam a via judicial. Também é certo que a expulsão sumária promoveu, indirectamente, uma ‘inflação’ de casos, já que quem fosse mandado sair ao abrigo do Título 42 não incorria nas penalizações (por regra, pena de prisão de dois anos) caso fosse novamente apanhado ilegalmente – e daí os novos ‘reencontros’ com as autoridades fronteiriças.

    Seja como for, o padrão do imigrante ilegal nos Estados Unidos não se modificou substancialmente nos últimos anos, embora se tenha intensificado em função do crescimento generalizado dos repatriamentos entre os períodos da primeira Administração Trump (2017-2020) e da Administração Biden (2021-2024). Com efeito, somando todas as modalidades de repatriamento, México (a grande distância), Guatemala e Honduras mantêm-se no topo, representando em conjunto 69% das ‘saídas’, mas com crescimentos acentuados.

    O vizinho do sudoeste dos Estados Unidos, onde maiores tensões fronteiriças existem, registou 1.061.890 repatriamentos no quadriénio 2017-2020 e subiu para 2.363.640 no mandato de Biden. Já a Guatemala teve um crescimento de 167%, passando de 187.220 repatriamentos no primeiro mandato de Trump para 500.260 no mandato de Biden. Quanto às Honduras, a subida relativa foi de 228% entre as administrações republicana e democrata, passando de 134.630 repatriamentos para 442.040.

    Top 20 dos países de origem dos imigrantes repatriados na Administração Trump (2017-2020) e na Administração Biden (2021-2024).

    Um dos sinais do recrudescimento dos repatriamentos na Administração Biden mostra-se pelo número de países com mais de 100 mil casos em quatro anos. No período do primeiro mandato de Trump, além da tríade habitual (México, Guatemala e Honduras), só as Filipinas ultrapassaram aquela fasquia, havendo apenas mais três países (El Salvador, Canadá e China) com repatriamentos acima de 50 mil. Já durante o mandato democrata, que agora terminou, contabilizam-se sete países acima de 100 mil repatriamentos em quatro anos: a tríade México, Guatemala e Honduras, e ainda El Salvador (que passou para a quarta posição), Filipinas, Índia e Canadá. Com mais de 50 mil deportações entre 2021 e 2024 contam-se também o Equador, China, Colômbia e Venezuela.

    De destacar que esta evolução mostra, de igual modo, que a pressão sobre as fronteiras norte-americanas está a recrudescer a partir da América Latina, sendo particularmente relevantes os crescimentos relativos dos repatriamentos do Equador, Colômbia, Venezuela, Haiti e mesmo Brasil.

    Apesar destes factos mostrarem que o partido democrata no poder foi mais ‘repressivo’ sobre estrangeiros ilegais, Donald Trump tem sido visto como um impiedoso adversário da imigração desde que tomou posse para o seu segundo mandato não consecutivo na Casa Branca. O 47.º presidente norte-americano prometeu a deportação de “milhões e milhões” de imigrantes.

    E, na última semana, já estalaram várias polémicas em torno do tema das deportações. O caso do avião com 88 brasileiros deportados gerou uma onda de indignação internacional, que os media tradicionais se encarregaram de reforçar, aproveitando para culpar Trump. Os cidadãos brasileiros estavam algemados e relataram ter sido alvo de maus-tratos durante o voo, onde seguiam 16 agentes de segurança dos Estados Unidos, além da tripulação composta por oito membros. O avião, com destino a Belo Horizonte, no sudeste do Estado de Minas Gerais, aterrou em Manaus devido a problemas técnicos, segundo informações do Ministério da Justiça brasileiro, citadas pela agência de notícias Reuters.

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    Zona fronteiriça. Foto: Greg Bulla.

    O Ministério das Relações Exteriores brasileiro anunciou na rede X que pedirá explicações aos Estados Unidos sobre o que classificou como o “tratamento degradante” a que foram sujeitos os brasileiros deportados. Saliente-se, contudo, que este foi já o segundo voo de imigrantes brasileiros ilegais indocumentados que chegou ao Brasil este ano, sendo que um ocorreu durante os últimos dias do mandato de Joe Biden.

    Outra polémica surgiu com a Colômbia, que é o terceiro maior parceiro comercial dos Estados Unidos na América Latina. O presidente colombiano, Gustavo Petro, começou por anunciar que o país iria recusar a aterragem de aviões militares norte-americanos com imigrantes deportados. Mas a ameaça de Trump de impor tarifas a produtos colombianos e outras sanções, nomeadamente a suspensão de vistos, surtiu efeito. Petro voltou atrás com a sua decisão, e a Casa Branca colocou a guerra comercial e as sanções em standby.

    O plano de ‘castigo’ dos Estados Unidos previa a imposição de tarifas de 25% sobre todos os produtos colombianos e ainda a proibição de viajar e a revogação de vistos atribuídos aos funcionários do governo colombiano. Também incluía sanções financeiras e bancárias, entre outras ameaças.

    Nos media, o tom geral tem sido de crítica à postura de Trump, sobretudo pelo recurso à táctica de ‘chantagem’ para pressionar o presidente colombiano. Numa outra polémica, foi noticiado também que a ‘polícia de imigração’ (ICE) recebeu autoridade sem precedentes para agilizar deportações, numa altura em que há relatos de ‘raides’ em diferentes locais nos Estados Unidos e as tropas norte-americanas estão a ser colocadas na fronteira com o México.

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    Foto: TheDigitalArtist

    Em todo o caso, convém referir que, quando tomou posse em 2017, Trump manifestou a sua intenção de criar um muro contínuo na longa fronteira de 3.142 quilómetros com o México para controlar a imigração. Queria mesmo obrigar aquele país a pagar pela obra, fazendo ameaças de sanções, cobranças de dívidas e cortes de acordos comerciais. Também prometeu ainda expulsar todos os imigrantes ilegais e previa aumentar os custos de taxas de entrada no país e de vistos temporários.

    Na campanha que então venceu contra Hillary Clinton, Trump queria obrigar as empresas a empregar primeiro cidadãos norte-americanos, sem exceção, e ainda pretendia vedar a entrada a sírios, iraquianos e outros cidadãos de países de maioria muçulmana.

    A realidade foi menos ‘brutal’, a tal ponto que a Administração Biden até acabou por repatriar muitos mais estrangeiros do que ele no seu primeiro mandato.

  • Bloco de Esquerda de cofres recheados quando despediu mães lactantes

    Bloco de Esquerda de cofres recheados quando despediu mães lactantes

    Apesar da diminuição da subvenção pública pela perda de deputados nas eleições de 2022 ter sido a principal justificação alegada pelo Bloco de Esquerda para uma redução de pessoal – que implicou o despedimento de duas mulheres lactantes –, o partido agora liderado por Mariana Mortágua tem tido uma generosa folga financeira, mesmo se o período entre 2019 e 2022 tenha mostrado algumas fragilidades, mas longe de serem dramáticas.

    Com efeito, de acordo com a análise do PÁGINA UM às demonstrações financeiras depositadas na Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, o Bloco de Esquerda, bem antes das eleições legislativas de 2022 – que levaram à queda de 19 para apenas cinco deputados –, já andava com as contas no ‘vermelho’ por um longo período. Desde 2019, para ser mais preciso, registou um longo período de prejuízos, pouco normal na história deste partido de esquerda.

    No final de 2012, culminando com a saída de Francisco Louçã da coordenação bloquista, o partido apresentava uma situação financeira já bastante desafogada, com um capital próprio de quase 2,3 milhões de euros. Não são montantes exorbitantes – comparando com PS, PSD e mesmo PCP –, mas aquilo que mais impressionava era o excelente controlo da dívida e a elevada liquidez. Nesse ano, o passivo  era apenas de 71 mil euros, todo de curto prazo, e havia 680 mil euros em contas bancárias.

    Nos anos seguintes, apesar de variações entre exercícios melhores e menos bons, o Bloco de Esquerda atingiu em 2018 a melhor situação financeira de sempre, com fundos patrimoniais de 2,96 milhões de euros, um passivo perfeitamente controlável (171 mil euros), sem dívidas de longo prazo. Com uma subvenção pública nacional e regional de quase 1,7 milhões de euros, o Bloco de Esquerda terminou esse ano com mais de 1,5 milhões de euros em contas bancárias. Em todo o caso, embora 2018 tivesse sido ainda de lucro, verificou-se uma redução significativa: no ano anterior tinha sido de 445 mil euros, baixando para 130 mil. Uma das razões terá sido o aumento de gastos com pessoal – que subiram, entre 2017 e 2018, de 365 mil para 672 mil euros – e de fornecimentos e serviços externos, que pularam de 616 mil euros para 1,06 milhões de euros.

    A partir de 2019, as contas começam a mostrar alguns sinais de degradação. Embora o Bloco de Esquerda tenha mantido, nas legislativas desse ano, os 19 deputados que alcançara em 2015, os custos com as campanhas eleitorais, que incluiu também as europeias, atiraram as contas para o ‘vermelho’. Deste modo, em 2019, o Bloco de Esquerda teve um prejuízo de quase 378 mil euros. Em todo o caso, a liquidez manteve-se elevada: quase 1,1 milhões de euros em depósitos bancários.

    A situação financeira do partido não melhorou, pelo contrário no triénio da pandemia (2020-2022), período em que o Bloco de Esquerda praticamente não fez oposição ao Governo socialista, acabando com uma ‘derrocada’ na representação parlamentar nas eleições de 2022, recuando para cinco deputados. Com inéditos custos de pessoal em 2020 da ordem dos 850 mil euros, o Bloco de Esquerda teve então o segundo ano consecutivo de prejuízos (-143 mil euros). E não parou por aí. Os gastos com pessoal reduziram-se em 2021 e 2022 (584 mil e 630 mil euros, respectivamente), mas a redução da subvenção pública neste último ano agravou as contas. Em 2021 o prejuízo foi de 58 mil euros e em 2022 foi de quase 303 mil euros.

    Embora os prejuízos acumulados nesse quadriénio (2019-2022), rondando 882 mil euros, tenham ‘limpado’ parte dos fundos patrimoniais, o Bloco de Esquerda estava, até em comparação com os restantes partidos políticos, em situação de desafogo financeiro quando procedeu aos despedimentos das suas funcionárias lactantes.

    Com efeito, o ano de 2022 terminou com fundos patrimoniais de 2,2 milhões de euros, um passivo de apenas 103 mil euros e com as contas bancárias a contabilizarem 792 mil euros. Ou seja, o Bloco de Esquerda não estava numa situação aflitiva que justificasse um despedimento de mulheres em situação delicada, sobretudo se se considerar ser essa uma das ‘bandeiras’ do partido. Em todo o caso, na análise das contas de 2023, as últimas apresentadas, nota-se que o ‘sacrifício das lactantes’ contribuiu para o bem económico do partido: as contas regressaram ao ‘verde’ (+ 35 mil euros).

    Nota-se, aliás, que Mariana Mortágua impôs uma austeridade draconiana, tendo apenas gastos de pessoal de 456 mil euros, menos 44% do que no ano anterior. Porém, o dinheiro em contas bancária teve uma ligeira redução, para os 717 mil euros, mas com o passivo total a recuar para apenas 79 mil euros.

    Se se excluir o Livre – por ter fundos patrimoniais ainda muito reduzidos (172 mil euros em 2023, não tendo praticamente passivo) – e o Chega – que em 2023 ainda tinha fundos patrimoniais de apenas 217 mil euros –, o Bloco de Esquerda é o partido que apresenta melhor situação económica relativa, com um rácio de autonomia financeira de 96%, bem à frente do PSD (86%) e do PCP e PAN, ambos com 85%. O PS apresenta um rácio de apenas 8%, mesmo assim uma melhoria face ao ano anterior, quando estava em falência técnica. Pior ainda só o CDS, que em 2023 estava com capitais próprios negativos de 302 mil euros, e encontra-se em falência técnica desde 2016, pelo que não tem qualquer autonomia financeira.

  • Em 2022 e 2023, enquanto liderava INEM do Norte, empresas de Gandra d’Almeida facturaram 520 mil euros

    Em 2022 e 2023, enquanto liderava INEM do Norte, empresas de Gandra d’Almeida facturaram 520 mil euros


    As duas empresas do demissionário director executivo do Serviço Nacional de Saúde, Gandra d’Almeida, nas quais foi gerente até meados do ano passado, receberam mais de meio milhão de euros apenas em 2022 e 2023, quando este era em simultâneo director da Delegação Regional do Norte do INEM. Os salários como gerente na Raiz Binária e na Tarefas Métricas, ambas tendo a prestação de serviços de saúde no seu objecto social principal, totalizaram uma verba duas vezes superior ao que auferia no INEM.

    De acordo com uma análise às contas destas duas empresas nos dois exercícios completos em que Gandra d’Almeida liderava o INEM do Norte, a Raiz Binária – criada em 2014, com a então namorada, hoje sua mulher, com sede numa vivenda em Gulpilhares (Vila Nova de Gaia) – facturou 195.633 euros em 2022 e 198.533 euros no ano seguinte. Neste período, como gerente único – e acumulando com o salário de dirigente de direcção intermédia no INEM (cerca de 3.500 euros, incluindo despesas de representação) –, Gandra d’Almeida ‘sacou’ 126.612 euros nos dois anos.

    Gandra d’Almeida foi director da delegação do Norte do INEM entre Novembro de 2021 e Maio de 2024,tendo acumulado a gerência de duas empresas privadas no sector da saúde com um salário médio superior a 6.800 euros.

    Saliente-se, contudo, que nenhum desta facturação provém de contratos inseridos no Portal Base, que inclui todos os contratos públicos. Porém, por vezes existem incompreensíveis atrasos na introdução de registos de contratos. Com efeito, por agora, no Portal Base todos os 13 contratos públicos da Raiz Binária com centros hospitalares foram celebrados entre Julho de 2016 e Junho de 2020, sendo que o último vigorou até meio de 2021, ou seja, antes da entrada em funções de Gandra d’Almeida no INEM do Norte.

    Quanto à Tarefas Métricas, trata-se de uma empresa unipessoal, ou seja apenas detida por Gandra d’Almeida, criada em Junho de 2019, com similares objectos sociais da Raiz Binária: a prestação de serviços como categoria principal, seguindo-se uma actividade imobiliária. A Tarefas Métricas teve, em 2022 e 2023, uma facturação menor do que a da sua ‘irmã’ Raiz Binária: 60.413 euros e 66.214 euros, respectivamente. Mas, mesmo assim, Gandra d’Almeida recebeu, como gerente desta novel empresa, um total de 64.858 euros nesses dois anos.

    Tudo somado, apenas nos dois últimos anos ‘empresariais’ – as contas de 2024 não estão concluídas –, e enquanto liderava o INEM do Norte, Gandra d’Almeida recebeu a título de gerente da Raiz Binária e Tarefas Métricas, sem contabilizar outros recebimentos, um total de 191.470 euros, significando, assim, um salário médio mensal bruto (14 meses por ano) de 6.838 euros.

    Além deste montante ser quase o dobro do montante que Gandra d’Almeida auferia então no INEM do Porto, a gerência de empresas privadas, ainda mais no sector da saúde, mostra-se profundamente incompatível. De acordo com a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, não pode existir acumulação com actividades privadas que sejam concorrentes, similares ou conflituantes com as funções públicas, especialmente quando envolvem conteúdo idêntico ou o mesmo público-alvo de forma permanente ou habitual.

    A acumulação, segundo o diploma de 2014, somente é permitida se as actividades privadas não forem legalmente incompatíveis com as funções públicas, não coincidirem, mesmo que parcialmente, com o horário de trabalho, não comprometerem a isenção e a imparcialidade exigidas e não prejudicarem o interesse público ou os direitos dos cidadãos. Caso sejam praticados actos contrários ou conflituantes com os interesses do serviço público no âmbito das atividades privadas autorizadas, a autorização para acumulação será revogada, configurando ainda uma infracção disciplinar grave.

    Gandra d’Almeida só renunciou à gerência das duas empresas em Maio do ano passado, semanas antes de ser nomeado para o cargo de director executivo do SNS. Além disso, também cedeu as quotas à sua família, à mulher e três filhos menores de 12 anos. No caso da Tarefas Métricas, apesar da gerente ser a sua mulher, uma parte da quota (70%) é da Raiz Binárias e as restantes quotas foram distribuídas pelos três filhos menores de 12 anos, um dos quais terá cerca de três anos, pelo número de identificação fiscal.

    Destaque-se que ambas as empresas têm, como actividade secundária, o sector imobiliário e, no caso da Raiz Binária ainda o alojamento local e o comércio. Contudo, não é conhecida outra actividade efectivamente exercida nas duas empresas e a componente imobiliária servirá, ao que o PÁGINA UM apurou, para encaixar despesas gerais da família de Gandra d’Almeida, uma vez que a sede das duas empresas coincide com a vivenda onde o médico vive com a sua mulher e dois filhos menores.

    Aliás, a empresa Raiz Binária, apesar de um capital social de apenas 100 euros, possui um activo tangível da ordem dos 600 mil euros. Ou seja, ao que tudo indica, o ex-director executivo terá transferido o seu património para a empresa, tanto mais que surge no passivo um endividamento bancário de longo prazo de 316 mil euros, além de outros passivos correntes de 175 mil euros.

    O PÁGINA UM pediu esclarecimentos a Gandra d’Almeida, através do contacto disponível das empresas agora geridas pela mulher com sede na habitação comum, mas ainda não obteve qualquer reacção.


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  • Gouveia e Melo vai poder usar farda durante a (eventual) campanha para as presidenciais

    Gouveia e Melo vai poder usar farda durante a (eventual) campanha para as presidenciais

    Uma fotografia de Gouveia e Melo, envergando o uniforme branco naval, está a ser utilizada pela Universidade Nova de Lisboa para promover um curso de quatro dias, ao preço de 3.000 euros, onde o almirante na reserva será um dos formadores, ao lado de Paulo Portas e Alexandra Reis. O Estado-Maior da Armada afirma que a Lei das Ordens Honoríficas Portuguesas permite que Gouveia e Melo possa, quando assim o desejar, estar de farda, mesmo tendo passado à reserva. Está, assim, aberta a possibilidade de o antigo líder da Marinha poder usar, livremente, uniformes militares em marketing eleitoral ou mesmo durante a campanha eleitoral, caso venha a candidatar-se.


    Caso se candidate à Presidência da República, na sua campanha eleitoral, Gouveia e Melo pode surgir, se assim entender, fardado e com as insígnias militares. Essa é a posição do próprio Estado-Maior da Armada, agora sob a liderança do Almirante Nobre de Sousa, após ter sido confrontado com publicidade a um curso de formação da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa onde surge o agora almirante na reserva, e putativo candidato a Belém, fardado e ostentando as suas medalhas.

    A publicidade ao curso, que surge nas redes sociais da Nova SBE Executive Education, mas não se insere em qualquer grau de ensino. Trata-se de um curso de quatro dias, denominado ‘Leadership & Crisis Management’, com um custo de inscrição de 3.000 euros, em que Gouveia e Melo será um dos formadores.

    No denominado ‘corpo docente’, estão também, entre outros, Paulo Portas e Alexandra Reis – a ex-presidente da NAV que causou a a demissão de Pedro Nuno Santos de ministro do Equipamento no início de 2023 –, bem como António Cunha Vaz, um dos mais conhecidos e influentes donos de agências de comunicação e imagem. No anúncio, com uma fotografia em destaque do ex-Chefe do Estado-Maior da Armada, envergando o uniforme branco naval com a insígnia do posto de Almirante, surge a mensagem: “Junte-se a Henrique Gouveia e Melo na formação executiva de Leadership & Crisis Management e aprenda a transformar as crises em oportunidades”.

    Para justificar a legitimidade de Gouveia e Melo andar fardado e medalhado onde quer que esteja, e quando quiser, o Estado-Maior da Armada relembra a Lei das Ordens Honoríficas Portuguesas, que especifica que “os militares agraciados com qualquer grau das ordens Militares da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito e de Avis, têm direito ao uso do uniforme militar, seja qual for o seu quadro ou situação e mesmo depois de deixarem a efetividade de serviço”.

    E o gabinete de comunicação e relações-públicas da Marinha acrescenta mesmo que “Esta disposição aplica-se ao caso concreto do Sr. Almirante Gouveia e Melo que, ao longo da sua carreira, foi agraciado com diferentes graus da Ordem de Avis.“ Contudo, na verdade, deve acrescentar-se um pormenor relevante não mencionado na informação enviada pelo Estado-Maior da Armada ao PÁGINA UM: esse militar só poderá estar uniformizado se ostentar, em simultâneo, “as respectivas insígnias“.

    Saliente-se que, além da Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo, recebida no final de Dezembro das mãos do Presidente da República, Gouveia e Melo já tinha sido condecorado outras duas vezes com a Ordem de Avis: primeiro, em Junho de 2004, com o grau de comendador, quando era capitão-de-fragata; e depois, em Maio de 2021, com o Grande-Colar, enquanto dirigia a task force da vacinação contra a covid-19 e era ainda adjunto do Planeamento do Estado-Maior-General das Forças Armadas.

    A interpretação do Estado-Maior da Armada sobre a legalidade do uso de uniforme por Gouveia e Melo, mesmo que esteja agora na reserva, recentra a ‘celeuma’ causada pela sua entrevista à RTP, em Setembro passado, onde também surgiu fardado a fazer abordagens que poderiam ser consideradas políticas.

    Apesar de a lei estar do seu lado, para poder ostentar a postura e disciplina militar, o PÁGINA UM quis saber se Gouveia e Melo autorizou a Universidade Nova de Lisboa a usar a sua imagem fardada para atrair pessoas para um curso de 3.000 euros. Porém, a mensagem enviada para o seu e-mail da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa não obteve resposta.


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  • Sem sequer subir ao palco, Tony Carreira ‘saca’ lucro milionário com Passagem de Ano em Lisboa

    Sem sequer subir ao palco, Tony Carreira ‘saca’ lucro milionário com Passagem de Ano em Lisboa

    Em finais de Junho, Carlos Moedas subiu a um palco do Terreiro do Paço para, de voz estridente, anunciar a entrega da medalha de mérito cultural a Tony Carreira. Pouco meses depois, sem chinfrim, de forma discreta, a empresa do cançonetista, a Regi-Concerto, teve uma oferta de ‘mão-beijada’ concedida pela Câmara Municipal de Lisboa: a co-organização das festas de Ano Novo no valor de 265 mil euros, incluindo IVA. Com um cartaz que não custará mais de 80 mil, constituído pelo ‘veterano’ José Cid e pelo seu próprio filho Mickael, e como a EGEAC assume ainda despesas, Tony Carreira terá um lucro, sem subir ao palco lisboeta, próximo dos 150 mil euros. Algo apenas possível quando se tem ‘mérito’… para sacar ajustes directos num mercado onde o ‘amiguismo’ prevalece.


    Não foi só uma Medalha de Mérito Cultura da Cidade que este ano Tony Carreira recebeu das mãos de Carlos Moedas; também recebeu de ‘mão-beijada’ o direito de co-organizar as festividades da Passagem de Ano no Terreiro do Paço, possibilitando-lhe meter no cartaz o filho Mickael, em queda de popularidade. E se a medalha pode pesar no coração do cançonetista; o ‘cheque’ pelo espectáculo na oficialmente chamada Praça do Comércio, com vista para o Tejo, vai pesar-lhe bem na carteira.

    Sem se conhecer, mais uma vez, os critérios de selecção de artistas e produtoras para a organização de espectáculos, a Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC) escolheu este ano a produtora de Tony Carreira, a Regi-Concerto, para co-produzir as celebrações do Novo Ano na principal praça de Lisboa, que terá como ‘ponto alto’ as actuações de José Cid – e convidados não definidos – e de Mickael Carreira, para além do habitual fogo-de-artifício. O contrato foi assinado no passado dia 20, assinado por António Manuel Mateus Antunes – o nome real de Tony Carreira, como gerente da Regi-Concerto –, apesar da EGEAC ter anunciado o cartaz na semana anterior.

    Carlos Moedas entregou medalha de mérito cultural a Tony Carreira em Junho passado, Meio ano depois, a autarquia entregou, por ajuste directo, um contrato que lhedará um lucro de quase 150 mil euros. Foto: CML.

    O valor do contrato por ajuste directo, justificado para defender direitos de autor, uma alegação bastante questionável, atinge os 265.680 euros, incluindo IVA, mas os custos para a empresa municipal deverão alcançar os 300 mil. Com efeito, através do contrato, a EGEAC assume também responsabilidades bastante onerosas, como a obtenção de licenças, a promoção e publicidade, a disponibilização de camarins e equipamentos auxiliares, a contratação de serviços de segurança, a limpeza e logística, e a garantia de fornecimento eléctrico adequado.

    Por sua vez, a Regi-Concerto, a empresa de Tony Carreira obriga-se apenas a assegurar a representação dos artistas, incluindo contratação e gestão de despesas relacionadas, bem como a montagem e operação de equipamentos técnicos (som, iluminação e vídeo).

    O montante a pagar pela empresa municipal da autarquia liderada por Carlos Moedas será o mais elevado de sempre conseguido pela empresa de Tony Carreira em contratos públicos. Considerando valores sem IVA – que, neste caso, atinge os 216 mil euros –, a Regi-Concerto tinha, até agora, como contrato mais chorudo, um ajuste directo para as festas populares do Monte da Caparica em 2022. Por “serviços musicais e audiovisuais” não especificados no contrato, a União das Freguesas de Caparica e Trafaria pagou à Regi-Concerto um total de 74.260 euros. O segundo contrato público de montante mais elevado da Regi-Concerto referia-se, por sua vez, à contratação do próprio Tony Carreira para abrilhantar a Passagem do Ano de 2023 para 2024 em Coimbra. Há um ano, autarquia coimbrã despendeu 62.500 euros para ter o artista.

    E é, exactamente, por esse motivo que o valor agora pago pela EGEAC assume um montante exorbitante, até porque Tony Carreira – que é um dos artistas mais bem pagos em contratos públicos – decidiu rumar para outras paragens. Por valores desconhecidos, vai actuar no Hotel Tivoli de Vilamoura para um selecto público que se dispôs a pagar um mínimo de 490 euros por cadeira (e mesa).

    De facto, considerando os preços praticados tanto por José Cid como por Mickael Carreira, os cofres da Câmara Municipal de Lisboa foram generosos para a Regi-Concerto. No caso de José Cid – que se mantém, aos 82 anos, ainda bastante activo –, o seu ‘cachet’, quando actua sozinho, variou este ano entre os 12.500 e os 50.750 euros. O seu mais recente concerto foi para as comemorações do 20º aniversário da elevação a cidade de Anadia – a sede do concelho onde se radicou ainda na adolescência –, e cobrou apenas 15 mil euros. Mas há um ano, pela actuação na Passagem de Ano no Campo de Viriato, a autarquia de Viseu pagou à sua empresa (José Cid, Lda.) 30 mil euros. Aliás, esse foi o valor que a própria EGEAC lhe pagou em 2019 para actuar na Passagem de Ano, poucos meses depois de ter recebido o Grammy Latino de Excelência Musical.

    Quanto a Mickael Carreira, que tem tido uma carreira sobretudo à sombra do pai, o seu valor medido em termos de ‘cachet’ e procura é mais baixo ainda do que o do veterano José Cid. De facto, em actuações a solo, apenas se encontram três contratos públicos com a sua presença este ano: em Arronches, na Chamusca e no Marco de Canavezes, por valores entre os 18.500 e os 21.330 euros. Em 2023 registam-se apenas dois (Pampilhosa da Serra e Lamego), por valores próximos.

    Deste modo, atendendo as ‘cachets’ habituais de José Cid e Mickael Carreira, e mesmo tendo em conta os valores mais elevados praticados em festas de Passagem de Ano, jamais seria de esperar valores acima de 70 mil euros para o conjunto, a que se podem juntar mais entre 10 mil e 20 mil euros de fogo-de-artifício. Ou seja, o lucro imediato por uma noite para a Regi-Concerto deverá estar próximo dos 150 mil euros, um excelente negócio para Tony Carreira, por obra e graça do contínuo esbanjamento de dinheiros públicos sem se conhecerem critérios de escolha dos artistas e das produtoras nem de custos.


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  • Presidenciais: Maçons aceleram movimento de apoio a Gouveia e Melo

    Presidenciais: Maçons aceleram movimento de apoio a Gouveia e Melo

    Já tem nome a associação dinamizada por dois destacados maçons para ajudar Gouveia e Melo a chegar à Presidência da República. Chama-se Movimento de Apoio Almirante à Presidência, e o acrónimo MAAP faz lembrar o mítico MASP, uma peça fundamental de Mário Soares que o levou a Belém em 1986. Os dois principais dinamizadores desta ‘entourage’ do recém-exonerado Chefe do Estado-Maior da Armada são os maçons Paulo Noguês e José Manuel Anes, e já deram uma pequena e simbólica ajuda: na última edição da revista ‘Segurança e Defesa’, cujos conteúdos são por si decididos, Gouveia e Melo foi capa com direito a entrevista de 14 páginas sobre a sua vida, obra e pensamento. O MAAP, que desejava ser transversal na sociedade, será constituído formalmente dentro de duas semanas.


    O anúncio foi ontem feito na rede social profissional LinkedIn, mas já vem sendo preparado discretamente nos últimos meses: membros da Maçonaria estão a constituir uma plataforma formal de apoio ao Almirante Gouveia e Melo para preparar as condições logísticas, operacionais e financeiras da sua candidatura à Presidência da República em Janeiro do próximo ano.

    Em mensagem de ‘angariação’ de novos integrantes deste movimento, Paulo Noguês – um conhecido maçom, co-fundador da polémica loja maçónica Mozart (onde também esteve Luís Montenegro), da qual se viria a desvincular depois de escândalos de tráfico de influências – não apenas declarou o seu apoio pessoal à candidatura de Gouveia e Melo como anunciou que “juntamente com um grupo de amigas e amigos, onde pontifica o Prof. Doutor José Manuel Anes, decidimos constituir uma Associação com esse objetivo: MAAP – Movimento de Apoio Almirante à Presidência”. O acrónimo escolhido faz lembrar o MASP, o movimento de apoio a Mário Soares em 1985.

    Gouveia e Melo recebeu, na semana passada, a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo das mãos do actual Presidente da Repúlica. Foto: © Miguel Figueiredo Lopes / Presidência da República

    A referência deste movimento, que se diz “cívico”, dinamizado por Paulo Noguês, à figura de José Manuel Anes confere também um forte cunho associado à Maçonaria. Aos 80 anos, este criminalista e professor universitário continua a ser uma das referências mais relevantes da Maçonaria, tendo sido grão-mestre da Grande Loja Regular de Portugal no início do presente século.

    Tanto Paulo Noguês como José Manuel Anes – que colaboram na Diário de Bordo, uma editora, foram dando sinais deste apoio a Gouveia e Melo nos últimos meses, e não por acaso o agora ex-Chefe do Estado-Maior da Armada foi capa da revista quinquimestral (cinco em cinco meses) ‘Segurança e Defesa’ com uma longa entrevista de 14 páginas intitulada “Marinha olha para o mar como uma oportunidade e não um problema”, onde se abordam também aspectos da sua vida e pensamento político.

    Contactado pelo PÁGINA UM, Paulo Noguês admite que o MAAP será constituído formalmente, em notário, dentro de duas semanas, mas que não será constituído apenas por maçons, mas também por pessoas de outros quadrantes, incluindo homens e mulheres ligadas até à Igreja e Opus Dei, embora não sejam adiantados, por agora, outros nomes. “Serão conhecidos ao longo do tempo, alguns dos quais na data da constituição; será um movimento transversal da sociedade”, diz Paulo Noguês, para conceder apoio logístico e financeiro, “abrangendo todo o território nacional e a emigração”.

    Em Novembro passado, Gouveia e Melo foi capa da revista quinquimensal ‘Segurança e Defesa’, editada pela empresa de Paulo Noguês e que tem José Manuel Anes como coordenador.

    Além do PPM – o ‘mal-amado’ parceiro da Aliança Democrática que elegeu Luís Montenegro para a liderança do Governo -, não há ainda qualquer associação formal de partidos políticos com representação parlamentar ao recém exonerado Chefe do Estado-Maior da Armada, apesar do ‘namoro’ de figuras do CDS-PP, que até lhe concederam currículo académico na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

    No caso do MAAP, Paulo Noguês assume que, apesar de existirem contactos com Gouveia e Melo – como, aliás, ficou patente na recente entrevista na ‘Segurança e Defesa’ – “não há uma legitimação prévia, nem tinha de haver” por parte do putativo candidato a Belém para a constituição desta associação.

    Recorde-se que, no início de Dezembro passado, o semanário Tal & Qual revelava que Gouveia e Melo estaria a tentar aprofundar ligações à Maçonaria, aludindo aos seus contactos com a loja ‘Camelot’, integrante da Grande Loja Regular de Portugal, onde professam Paulo Noguês e José Manuel Anes em lugares de destaque. No mesmo dia, através de um comunicado da Marinha, Gouveia e Melo afirmou que “tais afirmações”, sobre a sua alegada integração numa loja maçónica, eram “absolutamente falsas”, lamentando a “reiterada ausência de [aplicação do] contraditório” por parte do Tal & Qual.

    Sobre se o apoio de pessoas ligadas à Maçonaria possa agora causar incómodo a Gouveia e Melo, Paulo Noguês nega essa possibilidade: “não implicámos nem vamos implicar o Almirante, até porque poderão existir muitos mais movimentos de apoio”.

    O PÁGINA UM tentou, através da Marinha e por outras vias, obter um comentário de Gouveia e Melo sobre a criação do MAAP, comprometendo-se a acrescentar a sua reacção se entretanto ocorrer.


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  • ‘Foge, cão, que te fazem barão’: Condecorações custam cinco milhões de euros desde 2021

    ‘Foge, cão, que te fazem barão’: Condecorações custam cinco milhões de euros desde 2021

    No século XIX, perante os exageros do reconhecimento desmesurado, surgiu o dichote: “Foge cão, que te fazem barão; para onde, se me fazem visconde”. Hoje, na Terceira República, já não há o perigo de se ‘apanharem’ títulos nobiliárquicos, mas há sempre uma grande chance de se levar uma alfinetada no peito ou um penduricalho no pescoço para a conveniente condecoração. O PÁGINA UM foi, por isso, pesquisar os contratos públicos para tentar perceber quanto se gastou, e quem gasta, na aquisição de medalhas e insígnias com que nos convencemos que somos os ‘melhores da Cantareira’. Além da tradição das condecorações sobretudo nas forças armadas e de segurança, bem como as concedidas pela Presidência da República, as autarquias também gastam que se fartam, e até o Fisco não se esquece da sua ‘medalhinha’. De entre as 104 entidades que, desde 2021, enaltecem feitos através deste ‘modus operandi’, a Marinha foi a mais gastadora: 675 mil euros.


    Portugal, país multisecular, pode não cometido feitos recentes dignos de louvor universal, mas a nível interno não nos podemos queixar da falta de brilho, pelo menos das insígnias e condecorações oferecidas amiúde. De facto, somos uma Nação que há muito deixou de conquistar mundos, mas que ainda exibe, com espantosa solenidade, a arte de premiar-se a si própria. Se não temos demasiadas invenções a propor ao mundo, nem pensamentos revolucionários nem epopeias para celebrar, nem guerras para combater ou pazes para estabelecer, inventam-se então glórias administrativas e até fiscais que colocam qualquer um na iminência de se tornar uma eminência no pódio da auto-celebração. Claro que, com custos, porque as medalhas e outros insígnias similares, mesmo que fossem de latão – e algumas são de ouro –, não caem do céu nem se fazem como a água-benta. Custam bom dinheiro e movimentam, além de muitas vaidades, um negócio apetecível.

    Num levantamento do PÁGINA UM aos contratos para a aquisição de medalhas e insígnias – que, em alguns poucos casos, incluem adereços ou outros ‘apetrechos’ similares (como taças) –, foram detectados 280 contratos no Portal Base, envolvendo mais de uma centena de entidades, para adquirir ‘lembranças’ para os ilustres agraciados, num período de apenas quatro anos. Estes contratos, celebrados entre Janeiro 2021 e final deste ano de 2024, somam um valor total de 4,05 milhões de euros, que se aproxima dos cinco milhões de euros, caso se inclua o IVA. E quase grande parte através de contratos de mão-beijada: 182 foram por ajuste directo ou similar (65%), 56 após consulta prévia (31%) e apenas 42 por concurso público (24%).

    Presidência da República é uma das ‘máquinas’ de condecorações do país. Foto: PR.

    Entre os organismos mais entusiastas nas medalhas estão os militares, as forças de segurança e a Presidência da República. No primeiro caso, em apenas quatro anos, os diversos ramos das Forças Armadas, incluindo o Estado-Maior-General, despenderam 1.227.199 euros (com IVA incluído) em medalhas e condecoração, estando a Marinha no topo. Desde 2021, o Estado-Maior da Armada gastou mais de 675 mil euros, dos quais 380 mil euros durante a liderança de Gouveia e Melo, que nas últimas semanas andou a distribuir comendas e medalhas, incluindo a Isaltino Morais, presidente da autarquia de Oeiras, que de imediato o apoiou na quase certa candidatura às Presidenciais de 2026.

    Por sua vez, o Exército gastou, em quatro anos, um total de 362.325 euros em condecorações, ficando-se as Força Aérea nos 237.204 euros. A cúpula – isto é, o Estado-Maior-General das Forças Armadas – teve um encargo, neste período, de 37.232 euros.

    No caso das forças de segurança, a militarizada – a Guarda Nacional República (GNR) – também adora medalhar-se: despachou, desde 2021, um total de 237.204 euros para sobretudo condecorar os seus elementos, que rondam os 23 mil. A Polícia de Segurança Pública (PSP) foi mais comedida, embora tenha um efectivo menor (um pouco menos de 21 mil agentes), e apenas gastou em medalhas 59.812 euros nos últimos quatro anos.

    A Presidência da República, através da sua Secretaria-Geral, é uma cliente habitual das empresas de medalhística. Ou melhor dizendo, de uma só: a Casa das Condecorações Helder Cunha, com quem, nos últimos quatro anos, celebrou 14 ajustes directos, sempre em valores baixos para, de forma muito conveniente mas pouco transparente, não ser obrigada a abrir concurso público. Certo é que, tudo a somar, só nestas insígnias para comendadores e outras insígnias de ordens honoríficas se gastaram 202.902 euros.

    Descontando a Ordem dos Contabilistas Certificados – que surge em destaque na lista (com gastos de 150.650 euros) por ser considerada uma entidade pública, mas o financiamento é sobretudo ‘privado’ –, são as autarquias que ocupam os restantes lugares no top 10 dos maiores apreciadores (e ‘consumidores’) de medalhas. Destacam-se Braga (148.415 euros), Cascais (126.014 euros), Loulé (113.332 euros) e Lagos (102.633 euros). O município de Castelo Branco (100.364 euros) fecha o lote de 12 entidades públicas que pagaram, desde 2021, mais de 100 mil euros para agraciamentos.

    Foto: Academia Militar.

    Em todo o caso, na lista compilada pelo PÁGINA UM encontram-se 67 Câmaras Municipais, além de duas juntas de freguesia (Santa Maria Maior, em Lisboa, e União de Charneca da Caparica e Sobreda, em Almada), que gastaram mais de 2,2 milhões de euros em medalhas. Além dos municípios já referidos, detectam-se mais 22 com gastos em medalhas acima dos 25 mil euros: Oeiras (86 360 euros), Guimarães (84 304 euros), Vila Nova de Famalicão (81 478 euros), Mortágua (74 703 euros), Faro (72 200 euros), Peso da Régua (60 202 euros), Almada (59 279 euros), Seixal (58 972 euros), Vila Nova de Gaia (55 350 euros), Barcelos (55 229 euros), Fafe (49 735 euros), Tavira (49 174 euros), Palmela (48 824 euros), Póvoa de Varzim (48 559 euros), Guarda (41 620 euros), Sintra (39 975 euros), Funchal (37 757 euros), Vila do Conde (35 117 euros), Oleiros (30 553 euros), Trofa (29 690 euros), São João da Pesqueira (28 876 euros), Ansião (25 483 euros).

    Também o Governo e a Administração Pública directa têm aberto os cordões à bolsa para conceder ‘graças’. Por exemplo, em Abril deste ano, a Presidência do Conselho de Ministros gastou 23.616 euros para adquirir medalhas comemorativas da participação nas ações militares da Revolução dos Cravos. Em Junho de 2021, o Ministério da Defesa fez um contrato, após consulta prévia, no valor de 22.075 euros para, durante três anos, serem fornecidas “medalhas de condecoração”. Também se encontraram três contratos da Assembleia da República, um por ano, para as medalhas do Prémio Direitos Humanos. Não são baratas: pelas seis medalhas, em ouro, atribuídas em três anos, o Parlamento gastou 47.847 euros. Em média, cada uma ficou em quase oito mil euros. Mas a Assembleia da República não foi a única entidade pública a conceder medalhas em ouro: no final de 2023, por exemplo a autarquia de Castelo Branco adquiriu 10, tendo cada uma custado, com IVA, cerca de 4.250 euros.

    Merecem também destaque os três contratos da Autoridade Tributária e Aduaneira, todos deste ano. O primeiro serviu para comprar “1.000 medalhas com símbolo” do Fisco, no valor total de 9.840 euros, o que se pode considerar um preço unitário comedido. Já os dois outros contratos, de Julho passado, serviram para comprar “medalhas comemorativas de 40 anos de serviço público”, sem um número determinado no contrato (e o caderno de encargos não consta no Portal Base), bem como as caixas. Cada um destes contratos rondou os 23 mil euros.

    Em muitos casos, condecorações servem para que os condecorados não esqueçam quem os condecorou. Foto: Marinha.

    De entre as outras entidades com montantes apreciáveis de gastos em medalhas destacam-se ainda a Fundação INATEL (79.450 euros), a Direcção-Geral da Educação (77.378 euros), a empresa municipal lisboeta EGEAC (70.528 euros), o Instituto do Emprego e da Formação Profissional (41.279 euros), o Banco de Portugal (28.855 euros) e a Imprensa Nacional – Casa da Moeda (28.608 euros), bem como diversas universidades, ordens profissionais e até hospitais. Convém, contudo, salientar que os valores apurados pelo PÁGINA UM podem pecar por defeito, uma vez que na pesquisa no Portal Base podem constar contratos não detectados pelo facto de a sua descrição não mencionar palavras como medalhas, condecorações ou insígnias. Além disso, em compras mais pequenas, muitas as entidades públicas podem não ter registado os contratos se o procedimento adoptado tiver sido o ajuste directo simplificado.

    Em todo o caso, assim se prova que, mesmo já sem caravelas nem fulgores inventivos, Portugal continua a navegar com mestria nos mares do auto-elogio, não sendo já sequer necessário erguer castelos ou cravar padrões em terras distantes. A glória das insígnias reluzentes surge agora sob a forma de medalhas e fita para pendurar entregues a torto e a direito. Os elogios ficam com quem recebe; a factura é paga pelos contribuintes.


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  • 29 meses após um arrogante ‘não’, presidente do IST vai ter de mostrar 51 ‘esboços embrionários que consubstanciam meros ensaios para eventuais relatórios’ sobre a pandemia

    29 meses após um arrogante ‘não’, presidente do IST vai ter de mostrar 51 ‘esboços embrionários que consubstanciam meros ensaios para eventuais relatórios’ sobre a pandemia

    Num país onde há cientistas que, por ocuparem uma cátedra, ‘falam de cátedra’ sem humildade científica, um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul veio dar este mês uma lição ao presidente do Instituto Superior Técnico (IST). Após Rogério Colaço ter recusado divulgar, de forma arrogante, relatórios sobre a situação epidemiológica da covid-19 no Verão de 2022, uma luta judicial do PÁGINA UM ao longo de quase 30 meses teve finalmente um desfecho: o IST vai ter o mesmo de revelar o conteúdo integral de 52 relatórios, elaborados em parceria com a Ordem dos Médicos, que ‘ajudaram’ a prolongar o estado de pânico durante a segunda metade da pandemia. O PÁGINA UM já conseguira em primeira instância que o IST cedesse o último relatório (nº 52) que, com base em estimativas enviesadas e especulações de escasso rigor e transparência, atribuíra centenas de mortes às festas populares e aos festivais de música no Verão de 2022. Com episódios caricatos e pouco edificantes para a academia, o IST chegou a dizer que não elaborara qualquer relatório mas sim “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório’. Agora, tem de mostrar mais 51, mesmo se mantiver a espúria tese dos “esboço embrionário”.


    Senhor Pedro Vieira,

    O sr André Pires [do gabinete de comunicação] respondeu exatamente de acordo com as instruções dadas por mim. O pedido formal ao presidente do IST está respondido e a resposta é negativa.

    Rogerio Colaço

    Presidente do IST

    Foi desta forma, seca e arrogante, enviado pelo Galaxy pessoal às 12 horas e 19 minutos do dia 30 de Julho de 2022, que o catedrático Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico (IST), recusou ceder ao PÁGINA UM a cópia de um relatório de investigadores desta (suposta) prestigiada instituição universitária pública de Portugal sobre a situação epidemiológica da pandemia. Em pleno Verão do terceiro ano da pandemia causada pelo SARS-CoV-2, estando um curso um alívio significativo das medidas restritivas, incluindo a ‘retoma’ de festividades, mas havendo muitos ‘especialistas’ a desejarem manter níveis de pânico elevado, o IST fizera divulgar, através da agência Lusa, um relatório ‘bombástico’ que concluíra que as festas populares e festivais de música em Lisboa tinham estado “na origem de 340 mil casos de covid-19” que teriam causado “a morte de 790 pessoas”.

    Henrique Oliveira, Rogério Colaço, Miguel Guimarães e Filipe Froes na sede do Ordem dos Médicos, em Julho de 2021, aquando da apresentação do plano de acompanhamento da pandemia. O Instituto Superior Técnico recusou divulgar os relatórios em 2022. Vai ter de ceder por ordem do tribunal.

    Mas quando o PÁGINA UM pediu a um dos autores desse estudo, Henrique Oliveira, que mostrasse o relatório escrito e o ficheiro de dados que o suportava, as portas fecharam-se. Este relatório inseria-se num parceria entre o IST e a Ordem dos Médicos que se terá iniciado em Julho de 2021, com pompa e circunstância: Rogério Colaço e Henrique Oliveira, por parte da instituição universitária, e Miguel Guimarães e Filipe Froes, por parte da associação profissional de clínicos, tinham até promovido uma conferência de imprensa, apresentando um novo indicador de avaliação do estado da pandemia, supostamente melhor do que as da Direcção-Geral da Saúde, por ser “uma ferramenta que resulta de um trabalho colaborativo”, desenvolvida através da “agregação de competências”. Nesse momento, Filipe Froes orgulhava-se por ter participado numa “equipa coordenada pelo Dr. Miguel Guimarães”, então bastonário da Ordem dos Médicos, cuja associação com o IST “abrir[a] as portas do futuro para parcerias e sinergias (…) em que todos somos vencedores”.

    Porém, na hora da verdade, “as portas do futuro”, e do suposto conhecimento científico – que deve ser confrontado – fecharam-se. E começaram a surgir as mais estapafúrdias desculpas numa triste novela pouco edificante para uma universidade pública.

    Quando o PÁGINA UM apresentou uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa para obrigar o IST a fazer aquilo que deveria ter sido feito de forma natural, a instituição liderada por Rogério Colaço ‘inovou’ pelo absurdo: considerou, em finais de Setembro de 2022, que aquilo que fora divulgado seria “um esboço embrionário, que consubstancia[va] um mero ensaio para um eventual relatório”. A intenção era clara: querer convencer o tribunal a não se aplicar a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos. Pouco mais tarde, ainda em sede de processo de intimação, o IST diria que nunca negara “ter elaborado um ensaio, apenas afirm[ara] que não se tratava do produto final do estudo, mas uma mera abordagem embrionária, por isso que era um esboço”. E acrescentava que o seu “esboço” que associou mortes às festividades de Junho “pode não conter informações exactas e precisas.”

    A Lusa noticiou, em 28 de Julho de 2022, as conclusões de um estudo do Instituto Superior Técnico sobre o suposto impacte das festividades em Junho desse ano na transmissão e mortes por covid-19. A instituição universitária, que faz Ciência, quis convencer o Tribunal Administrativo de que aquilo que fez não foi um estudo, mas apenas “um esboço embrionário”. Ou uma “mera abordagem embrionária”.

    Em resposta, neste jogo do gato e do rato, a juíza de primeira instância exigiu, em Novembro desse ano, que o IST lhe enviasse o documento em envelope lacrado que considerava “um esboço embrionário” para apurar se era um “esboço” ou uma desculpa esfarrapada. Mesmo perante esta suprema humilhação – uma instituição universitária a ver-se forçada a mostrar se andava a mentir ao tribunal –, o IST continuou perseverou: em vez de enviar o original, remeteu uma cópia com “anotações manuscritas a lápis”, em mais uma vã tentativa de ver o relatório considerado um “esboço”. Somente com uma nova entrega revelou então que se estava perante 52 relatórios, com o último a ser aquele que se referia às festividades.  

    Finalmente, em Janeiro de 2023, o Tribunal Administrativo de Lisboa tomou uma decisão, mas para grande surpresa, apesar de ter concedido o direito de o PÁGINA UM ter acesso ao Relatório 52, a sentença não se pronunciou sobre os outros 51 relatórios nem sobre os ficheiros de dados. O IST acabou por enviar o Relatório 52, que seria ‘esmiuçado’ pelo PÁGINA UM em Fevereiro do ano passado. Esta semana, aproveitando as evoluções tecnológicas, o PÁGINA UM usou o ChatGPT para uma análise ao Relatório 52 com base em critérios de “rigor académico, transparência, clareza e impacte científico”, elaborada “de forma isenta e detalhada”.

    Numa análise de três páginas, o ChatGPT atribuiu uma avaliação de 12 (em 20) à equipa de investigadores do IST, coordenada pelo catedrático Rogério Colaço, e salienta que “o Relatório Rápido nº 52 […] é um documento tecnicamente competente, mas apresenta falhas significativas que comprometem a sua utilidade como ferramenta de apoio à decisão”, acrescentando que “a falta de transparência nos dados e metodologias, combinada com mensagens contraditórias, reduz a sua credibilidade e impacto académico”. E sugere recomendações como seja “detalhar as metodologias utilizadas, especialmente para estimativas contrafactuais; publicar os dados brutos e aumentar a transparência das fontes; incluir variáveis adicionais e explorar contextos sociais e económicos mais amplos; [e] garantir maior consistência na comunicação para evitar mensagens ambíguas”.

    Rogério Colaço, cidadão português nascido em Soure em Junho de 1968, conjunturalmente presidente do Instituto Superior Técnico, vai ter de entregar 51 relatórios elaborados por uma instituição universitária pública, ao cidadão Pedro Almeida Vieira, nascido em Coimbra em Novembro de 1969, conjunturalmente director do jornal PÁGINA UM.

    Tanto o PÁGINA UM como o IST – que ainda tentou ‘sacar’ do tribunal a cópia que enviara em envelope selada – recorreram da sentença, por razões diferentes. Apesar de ter entregado o último relatório, o IST argumentou junto do Tribunal Central Administrativo do Sul que a sentença estava errada, enquanto o PÁGINA UM alegava que a juíza Telma Nogueira erradamente não se pronunciara sobre os outros 51 relatórios – que também deveriam ser disponibilizados – nem sobre os ficheiros com os dados.

    E é sobre este recurso que o Tribunal Central Administrativo do Sul veio agora pronunciar-se, mais de dois anos e cinco meses depois do pedido inicial do PÁGINA UM, através de um histórico acórdão.

    Apesar de o IST, em sede de contra-alegação, ter chegado a defender que ficara “apenas provada [na primeira sentença] a existência do relatório intitulado Relatório Rápido n.º 52, não se provando a existência de outros elementos”, e que “cabia ao recorrido [PÁGINA UM] fazer prova da existência dos restantes relatórios, assim como, dos alegados ficheiros informáticos com dados numéricos”, os desembargadores Marcelo Mendonça, Ilda Côco e Ana Lameira consideraram o óbvio. “Não é difícil perceber que, tendo sido elaborado pelo Recorrido público [IST] o relatório n.º 52 sobre a avaliação epidemiológica da covid-19, a ordem numérica, cronológica e lógica das coisas impele-nos a concluir que terão de existir 51 relatórios antecedentes vindos da safra do Recorrido público”, salientam.

    Os desembargadores consideraram também que “um relatório sobre a avaliação epidemiológica da covid-19 que surge depois de um trabalho prévio de análise, estudo ou tratamento de dados coligidos segundo uma determinada metodologia, a partir de um sítio da internet de acesso público (da Direcção Geral da Saúde), em que se utilizou um determinado programa de análise matemática, nada tem de esboço ou de rudimentar, pois que, atentas tais características, o conteúdo ou a informação escrita que daí emerja já não pode ser encarada como um mero rascunho”.

    O Relatório Rápido nº 52 do IST assegurava que que houvera um aumento das infecções com as festividades populares no Verão de 2022, mas tal não sucedeu. O relatório divulgado pela Lusa em finais de Julho pretendia convencer o público que afinal as previsões estavam quase certas. Mas, na hora de mostrar a base científica dessas conclusões, o IST recusou essa validação externa. As festas populares em Lisboa no Verão de 2022 tiveram grande fluxo, sem máscaras, mas os casos positivos de SARs-CoV-2 regrediram face a Maio.

    E acrescentam ainda os desembargadores que mesmo que esses documentos contenham “ainda estimativas, cujas respectivas conclusões e resultados extraídos ainda carecem de análise e confirmação”, são sempre documentos administrativo, pois “se de um relatório se trata, algum conteúdo útil há de abordar e relatar, ainda que preliminarmente, não se admitindo que essa eventual provisoriedade seja motivo para negar o acesso ao conteúdo ou informação escrita já existente”. E concluem ainda que, mesmo se se estivesse perante direitos de propriedade intelectual ou segredo relativo à propriedade intelectual, “o princípio vigente é o da acessibilidade”.

    Em todo o caso, o acórdão considerou que o IST não está obrigado a facultar os ficheiros informáticos usados para a elaboração dos relatórios – e necessários para efeitos de replicação dos resultados, como se mostra necessário em Ciência –, uma vez que os desembargadores consideraram que o PÁGINA UM fez um pedido “vago, genérico e indeterminável, porque desprovido de informação concreta que melhor especifique, por exemplo, a origem, a índole, o hiato temporal, a autoria ou o local específico de arquivo electrónico donde possam ser extraídos tais elementos”.

    Saliente-se que, sem desprimor da decisão do Tribunal Central Administrativo do Sul, o pedido sobre os ficheiros era não apenas exacto como óbvio em ciências exactas: um relatório com resultados de modelos quantitativos avançados tem sempre subjacente um ficheiro de dados numéricos. Ou seja, para cada relatório existirá necessariamente um ficheiro de dados numéricos. Mas o óbvio em ciências exactas não é, aparentemente, o óbvio em ciências jurídicas.

    woman, face mask, covid-19

    Agora, o IST está intimado a facultar, no prazo de 10 dias, que terminará nos primeiros dias de 2025, os 51 relatórios em falta. Se assim desejar pode fazê-los acompanhar, voluntariamente, dos ficheiros numéricos para eventual replicação dos relatórios. Se não incluir esses ficheiros numéricos, então reforçam-se as ‘críticas’ da análise crítica do ChatGPT que sustenta a “falta de transparência” do Relatório nº 52, uma vez que, entre outros aspectos, “Não são apresentados os dados brutos utilizados para calcular os indicadores e fazer previsões, dificultando a replicação dos resultados”.

    Note-se que esta luta judicial do PÁGINA UM implicou, além de desmesurado tempo, o pagamento de taxas de justiça próximo de mil euros, tendo contado com o apoio dos leitores através do FUNDO JURÍDICO. Quando os relatórios do IST forem finalmente entregues, o PÁGINA UM vai divulgá-los na íntegra e pedirá uma análise do seu rigor por parte do Conselho Científico daquela instituição que integra a Universidade de Lisboa.


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  • Covid-19: DGS quer despachar ‘sobras’ de uma vacina sem farmacovigilância adequada nem compensações por danos

    Covid-19: DGS quer despachar ‘sobras’ de uma vacina sem farmacovigilância adequada nem compensações por danos

    Num país que viveu a pandemia da covid-19 à cata de supostos ‘negacionistas anti-vacinas’ – que incluía quem se opunha à inclusão de jovens e adultos saudáveis nos planos de vacinação, ou considerasse que a imunidade natural era suficiente –, não deixa de ser lamentavelmente irónico que, no final de 2024, Portugal seja um dos poucos da Europa Ocidental que recusa falar das reacções adversas, não tendo montado qualquer plano de compensação das vítimas. E pior: num estranho tabu, o Infarmed nem sequer acompanha a evolução dos casos notificados. A desconfiança e o desamparo têm tido consequências: mesmo na população mais vulnerável, assiste-se a uma crescente recusa da vacina contra a covid-19. Este ano, em comparação com 2023, a ‘procura’ de reforço desceu quase 14%. Foram mais 204 mil portugueses que não quiseram saber da vacina contra a covid-19. E a Direcção-Geral da Saúde, em vez de promover uma melhoria da informação e pugnar pelo apoio às pessoas afectadas, decidiu-se por uma estranha solução: as vacinas que sobraram serão agora administradas no grupo etário dos 50 aos 59 anos. A saúde das pessoas pode ser ‘lixada’; as vacinas é que não podem ir parar ao lixo…


    Não existe qualquer motivo epidemiológico ou de Saúde Pública para a decisão da Direcção-Geral da Saúde (DGS) de alargar o plano de reforço da vacinação contra a covid-19 para a faixa etária dos 50 aos 59 anos, hoje iniciado. O motivo para este alargamento é simples: estão em stock centenas de milhares de doses, que arriscam ir para o lixo, porque cada vez há menos pessoas do grupo dos maiores de 60 anos interessadas em apanhar mais uma dose desta vacina. Isto, num cenário em que são reveladas falhas gravíssimas na farmacovigilância pelo Infarmed num país que insiste em não assumir quaisquer indemnizações e apoios médicos às pessoas que foram afectadas por reacções adversas.

    Conforme o PÁGINA UM mostrou na passada semana, através de dados do Centre for Socio-Legal Studies, Portugal integra o lote de 14 países da União Europeia que optou por nunca implementar qualquer plano de indemnização às vítimas das vacinas contra a covid-19, que integra também a Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Espanha, Grécia, Hungria, Irlanda, Lituânia, Malta, Países Baixos, Roménia e Eslováquia.

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    Ao invés, países como a Áustria, República Checa, Dinamarca, Estónia, Finlândia, França, Alemanha, Itália, Letónia, Luxemburgo, Polónia, Eslovénia e Suécia – que integram também a União Europeia – implementaram sistemas, ou aproveitaram os modelos existentes pré-pandemia – para suportar compensações em casos de dados graves resultantes da administração das vacinas contra a covid-19. Recorde-se que a Comissão von der Leyen isentou de responsabilidades as farmacêuticas. Além dos membros da União Europeia, outros países do Velho Continente têm sistemas desta natureza, designadamente Noruega, Islândia, Noruega, Reino Unido e até Rússia.

    O desinteresse dos portugueses mais idosos pela vacina contra a covid-19 – agravada pela ausência de informação fiável sobre as suas vantagens, num cenário de endemismo do SARS-CoV-2, agora com muito menor virulência numa população com imunidade natural – fica patente não apenas na comparação entre o número de doses administradas no Outono deste ano e o de 2023, como sobretudo no número elevado de pessoas que optaram por aceitar apenas a vacina contra a gripe, cujas vantagens são inequívocas sem efeitos adversos relevantes.

    Com efeito, na época de vacinação outonal do ano passado, segundo um relatório da DGS com informação referente a 10 de Dezembro de 2023, tinham sido administradas 1.516.613 doses contra a covid-19 a maiores de 60 anos, menos 240.186 doses do que as administradas contra a gripe. Deste modo, e considerando uma população de cerca de três milhões de indivíduos nesta faixa etária, em média, por cada 100 pessoas, houve 40 que optaram por não querer nenhuma das vacinas, 50 vacinaram-se contra a gripe e a covid-19, enquanto 10 só quiseram a vacina contra a gripe.

    Comparação entre as doses administradas no Outono de 2023 (até 10 de Dezembro) e no Outono de 2024 (até 8 de Dezembro) de vacinas contra a covid-19 e contra a gripe. Fonte: DGS.

    Ora, este ano, com informação recolhida pela DGS até 8 de Dezembro, o ‘abandono’ da vacina contra a covid-19 aumentou significativamente, não ocorrendo o mesmo para a vacina contra a gripe. De facto, os dados oficiais mostram que, para uma população com idade superior a 60 anos que se manteve estável, houve 1.828.767 pessoas que se vacinaram contra a gripe (mais 26.968 do que em 2023), mas apenas 1.312.295 que quiseram tomar a vacina contra a covid-19, ou seja, foram administradas menos 204.318 doses, o que representa uma queda de quase 14% face a 2023.

    Significa assim que neste Outono, em média, por cada 100 pessoas com mais de 60 anos, houve 39 que optaram por não se vacinarem contra nenhuma daquelas duas doenças, 44 que se vacinaram contra a gripe e a covid-19, e ainda 17 que se vacinaram apenas contra a gripe.

    Assim, em termos concretos, praticamente sete pessoas em cada 100 que se vacinaram no ano passado contra a covid-19 no grupo etário dos maiores de 60 anos disseram ‘não’ este ano, razão pela qual ‘sobraram’ mais de 200 mil doses. Recorde-se que o PÁGINA UM ainda aguarda, ao fim de quase dois anos de uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa, uma decisão para acesso aos contratos das vacinas contra a covid-19.

    Sobre os efeitos adversos das administrações dos reforços do Outono de 2024 não existem dados públicos, mas o PÁGINA UM teve acesso à base de dados do Portal RAM, gerida pelo Infarmed, até início de Agosto deste ano. Apesar de a base de dados estar manipulada, com eliminação de variáveis, contrariando um acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, um dos aspectos mais relevantes é a falta de acompanhamento das pessoas afectadas po reacções adversas. Num total de 45.337 registos individuais notificados no Portal RAM entre finais de Dezembro de 2020 e Agosto de 2024, contabilizam-se 19.224 pessoas sobre as quais o Infarmed desconhece a evolução dos sintomas ou estado de saúde. Ou seja, em mais de quatro em cada 10 registos (42,4%), o Infarmed não apurou sequer como evoluíram os sintomas e afecções detectadas.

    Países (a azul) com planos de compensação para os efeitos adversos de vacinas contra a covid-19. Fonte: Centre for Socio-Legal Studies.

    Numa análise detalhada à variável da evolução das reacções adversas – um processo moroso, porque o ficheiro do Infarmed lista o conjunto de afecções e sintomas numa mesma célula com indicações de progresso por vezes distintas –, observa-se que uma grande parte se refere a problemas que, em princípio, são ligeiros e corriqueiros, como dores no local de vacinação (quase quatro mil casos), dores de cabeça, febre ou dores (centenas de casos). Mas, de entre a lista, constam afecções gravíssimas potencialmente mortais ou com causadores de sequelas profundas. E isto altera de forma radical uma avaliação correcta da segurança das vacinas e impede, desse modo, acções judiciais com pedidos de indemnização.

    Numa averiguação preliminar, o PÁGINA UM detectou, no Portal RAM, 45 casos de miocardites ou pericardites após vacinação cuja evolução permanece desconhecida pelo Infarmed. Há ainda 22 casos de choques anafiláticos, uma reação alérgica grave e potencialmente fatal que pode levar à morte sem tratamento imediato, cuja evolução também se ignora. Foram registados 40 casos de tromboembolismo pulmonar, bloqueio de uma artéria dos pulmões por um coágulo, sem acompanhamento adequado, e 13 casos de acidentes vasculares cerebrais (AVC), suspeitos de estarem fortemente associados às vacinas, cuja evolução permanece incógnita.

    Entre as reações adversas encontram-se ainda 18 casos de síndrome de Guillain-Barré, uma doença autoimune rara que afecta os nervos periféricos e pode levar à paralisia, e 27 casos de paralisia de Bell, uma condição que afeta o nervo facial, sendo por vezes temporária, mas cuja evolução também se desconhece. Foram ainda reportados oito casos de enfarte agudo do miocárdio, 17 casos de trombose venosa profunda, 16 casos de trombocitopenia imune, cinco casos de mielite e 13 casos de vasculite, todos com desfecho desconhecido.

    Extracto da base de dados (em Excel) revelados pelo Infarmed (com mutilação de variáveis), após intervenção do Tribunal Administrativo, e analisados pelo PÁGINA UM para detectar registos com evolução desconhecida de sintomas.

    Na análise das notificações, o PÁGINA UM identificou ainda 63 casos de alterações menstruais e 22 casos de herpes zoster, decorrentes da reactivação do vírus da varicela, todos sem acompanhamento da sua evolução.

    Nenhuma destas pessoas, além das 141 mortes reportadas, beneficiaram de qualquer apoio do Estado nem tão-pouco se conhece se foi analisada, do ponto de vista clínico, a associação factual entre a administração da vacina e os efeitos adversos. E isto também por uma razão simples: o Infarmed, liderado por Rui Santos Ivo, recusa divulgar a variável da casualidade – perante a passividade do Governo e partidos da oposição.


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