Etiqueta: Pedro Almeida Vieira

  • Do processo de silenciamento em curso

    Do processo de silenciamento em curso


    Não sou adepto de teorias da conspiração.

    Acredito sim na relação causa-efeito, nas consequências da acção-reacção,

    Ora, perante isto, digo sem qualquer dúvida: o PÁGINA UM está sob ataque.

    Não estou surpreendido, mas apreensivo, porque sinto que se está perante um processo de silenciamento em curso – que esse processo em plena democracia venha a ter sucesso, significará que vivemos (já) afinal em ditadura.

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    Suspeito fortemente da razão desses ataques. Para não dizer que sei.

    Mesmo com meios ridiculamente baixos em comparação com os media mainstream, o PÁGINA UM tem causado dissabores ao status quo e provocado estremeções numa certa podridão que se vive na sociedade portuguesa – e que, infelizmente, não é fenómeno único na Europa, em especial desde 2020.

    Com independência, objectividade e rigor, o PÁGINA UM tem denunciado uma “narrativa mal-contada” durante a pandemia, com sonegação e manipulação de informação, a par de uma promiscuidade institucional no sector dos media – que extravasa a outras sectores fora da Saúde –, englobando a imprensa e órgãos reguladores, como a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ).

    Temos também colocado processos de intimação a diversas entidades com funções públicas por recusa de acesso a documentos administrativos. São já 13 casos, a que se adiciona uma providência cautelar. Juntam-se cerca de duas dezenas de queixas na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. Não é nada normal este procedimento. Os jornalistas são, na verdade, com poucas excepções muito respeitadores do poder. Aceitam um não. Muitos. Ou nem sequer fazem as perguntas que merecem um não do poder.

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    Por isso, nunca se poderiam esperar, a não ser através do PÁGINA UM, processos de intimação no Tribunal Administrativo contra entidades como o Conselho Superior da Magistratura, o Ministério da Saúde, o Infarmed, a Ordem dos Médicos, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o Instituto Superior Técnico, etc..

    Mostrámos também, nas últimas semanas, que o PÁGINA UM é capaz, mesmo com parcos meios financeiros, de fazer concorrência à grande imprensa mainstream, tendo feito “cachas” nos casos da ministra da Coesão Territorial e do ministro da Saúde. Faríamos mais, não duvidem, com mais meios financeiros; talvez com a introdução de publicidade ou de conteúdos pagos, mas queremos manter a filosofia da nossa criação. A nossa fragilidade é, na verdade, a nossa força. O PÁGINA UM quer mostrar que mesmo frágil se pode vencer.

    Porém, não somos ingénuos. O PÁGINA UM tem imensas fragilidades, sendo que a principal é estar dependente, para a divulgação das suas notícias e obtenção de apoio dos leitores, das redes sociais como meio de difusão.

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    E, de repente, nas últimas semanas, tenho recebido uma sequência inaudita de estranhas sanções provenientes das redes sociais, com destaque para o Facebook, afectando também directa e indirectamente o PÁGINA UM.

    Em 4 de Setembro passado levei um aviso do Facebook, porque escrevi sobre os efeitos adversos das vacinas contra a covid-19, citando um artigo científico publicado na revista Vaccine intitulado “Serious adverse events of special interest following mRNA COVID-19 vaccination in randomized trials in adults”.

    No dia 30 de Setembro, novo castigo do Facebook, desta vez com uma sanção de 24 horas de silenciamento, e ainda avisos de “desinformação” e castigos a quem tivesse partilhado o post do PÁGINA UM. Causa: divulgação de uma notícia baseada em mais um artigo científico na revista Journal of Insuline Resistance intitulado “Curing the pandemic of misinformation on covid-19 mRNA vacines through real evidence-based medicine”.

    A censura do Facebook foi feita num post em que se escrevera o seguinte: “Para ler agora no jornal PÁGINA UM, esperando que a divulgação desta rigorosa notícia de um órgão de comunicação social reconhecido pela ERC e escrito por dois jornalistas com carteira profissional há mais de 25 anos não seja alvo de qualquer tipo de censura ou shadow banning… Testemos também a Democracia em pleno século XXI.”

    Síntese das “castigos” aplicados pelo Facebook.

    E agora, nova sanção, esta madrugada, com a indicação de que a minha “publicação repete informações falsas sobre a covid-19 que desrespeitam os nossos Padrões da Comunidade”. E qual a causa? Um simples post com uma “memória” em que recordava que há um ano a Comissão de Trabalhadores da RTP tinha proposto uma segregação dos funcionários que não se tivessem vacinado, impedindo-os de usar espaços comuns. Apenas escrevi: “Foi há um ano. Alguém sabe se estes senhores jornalistas pediram já desculpa?” Nada mais.

    Foi servido um castigo de três dias.

    Próximo castigo será de sete dias, e depois de 30 dias, e provavelmente o silenciamento absoluto, tachado de “desinformação” ou de “perigo para a saúde pública” ou de “risco para o bem comum”.

    Neste momento, o Facebook faz a mais execrável e cobarde Censura, porque nas ventas de um Estado dito democrático, que nada faz para defender a liberdade de expressão e de imprensa, cometendo tudo isto através de torpes difamações e sem resposta (ainda) possível.

    O Facebook, tal como outras redes sociais, transformaram-se em monstros sem rosto (não há forma sequer de a contactar ou obter uma resposta) que minam a democracia – mas a culpa nem sequer é dele, mas das autoridades.

    Mas o Facebook é mais do que isso. É uma empresa que agora aprecia agradar aos Estados até para evitar mais multas por sucessivos atropelos legais na União Europeia e no Reino Unido.

    Não custa assim a acreditar que esta sequência de castigos – que não devem parar – seja uma manobra concertada para silenciar o PÁGINA UM. Não há coincidências. Se não for com a envolvência directa da empresa, pelo menos por via de um algoritmo que, de repente, se tornou absurdamente sensível na aceitação de denúncias dos haters, culminando em censura e castigos por dá-cá-esta-palha, mesmo quando se citam estudos científicos ou se recorda episódios absurdos de segregação do passado.

    E tudo isto se faz perante um silêncio cúmplice da imprensa mainstream. Acredito até que assistam com alguma satisfação. Compreendo-os: não os tenho também “poupado”, exactamente por, em muitas e variadas situações, não estar essa imprensa a honrar a nobre função do jornalismo. Se eles não denunciam tanta coisa que deveriam denunciar, porque motivo denunciariam um processo de silenciamentos em curso de alguém que os incomoda?

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    O PÁGINA UM vai tomar, com os meios possíveis, providências judiciais nem que seja para confirmar que vivemos numa República das Bananas, onde uma empresa pode censurar e difamar cidadãos e jornalistas, e restringir até a liberdade de expressão, sob princípios que nada têm de científico nem de bem comum.

    Até porque, ao longo deste seu ano de existência, o PÁGINA UM soube e quis sempre noticiar com responsabilidade e rigor. E também independência, que é algo que sempre incomodou o poder.

    E faço aqui uma promessa: apenas desistirei quando constatar que vivemos já em ditadura. Aí, confesso-vos, se tal desgraça suceder, emigro merecidamente, porque lutei até ao limite para não viver numa ditadura. E deixo neste rectângulo aqueles que nada fizeram para manter viva a democracia.


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  • Diário de bordo em tempos covídicos

    Diário de bordo em tempos covídicos

    Título

    Volta aos Açores em quinze dias

    Autor

    JOSÉ PEDRO CASTANHEIRA

    Editora (Edição)

    Tinta da China (Agosto de 2022)

    Cotação

    15/20

    Recensão

    José Pedro Castanheira foi – é, porque nunca se deixa de ser – um dos mais respeitados jornalistas portugueses, daqueles sérios e a sério, com vasta experiência na investigação jornalística ao longo de quase cinco décadas de actividade, de entre os quais 30 anos no Expresso.

    Além do seu trabalho na imprensa, José Pedro Castanheira é autor de diversas obras de índole biográfica e política, destacando-se a biografia de Jorge Sampaio e o relato da atribulada vida de Annie Silva Pais (filha de um façanhudo director da PIDE), em co-autoria com Valdemar Cruz, que acaba de ser transposto para o pequeno ecrã (Cuba Libre), na RTP.

    Chegado à reforma, Castanheira decidiu em 2020, aos 68 anos, concretizar um seu antigo sonho, de 40 anos: ligar por mar as ilhas açorianas. E mais: ser o “cronista”. Foi processo atribulado, o que até é bom para um relato.

    De facto, em literatura de viagem, por princípio, jamais interesse algum haverá para o leitor se nada de estranho ou mirabolante se passar, sobretudo se o cenário for o mar e um pequeno veleiro o meio de locomoção. E também se o “cronista” não for bom.

    Ora, no caso de Volta aos Açores em quinze dias: diário de bordo de uma viagem para (não) esquecer, garantido estava que o “cronista” seria bom, e isso se confirma ao longo das suas páginas. João Pedro Castanheira, sempre na terceira pessoa (mesmo quando se refere a si), mostra a mestria de um bom contador de história, aqui e ali pontuado com pequenas doses de humor. Em todo o caso, falta ali umas pitadas de sal para que o estilo à laia de cronista dos tempos dos Descobridores ficasse mais refinado, o que se pode justificar pelo pouco tempo de preparação da obra: a viagem decorreu em Maio deste ano, e o livro saiu do prelo no início de Agosto.

    Bom, na verdade, neste caso, a analogia com o sal não é bem conseguida, pois a refinação lhe retira qualidade, ao invés de o aprimorar. Fiquemo-nos então por dizer que a escrita neste curto livro, em formato de bolso, não é “flor de sal” da literatura de viagens marítimas, mas não envergonha, muito pelo contrário. Porém, confessa-se que se pode ficar com uma sensação de algum “inconseguimento”.

    De facto, lido este “diário de bordo”, conclui-se que o mar compartilha, nesta travessia pelo arquipélago dos Açores, o protagonismo tanto com a equipagem do veleiro Avanti (e suas aventuras e desventuras) como com o SARS-CoV-2.

    A pandemia está omnipresente no livro. Não apenas porque a viagem, inicialmente prevista para 2020, se inicia com dois anos de atraso, devido aos lockdowns da pandemia, mas sobretudo por um terço do livro ser quase inteiramente dedicado às contingências do confinamento obrigatório de José Pedro Castanheira no Horta Garden por força de um teste positivo à covid-19 ao 12º dia de viagem.

    E assim, as últimas 60 páginas ingloriamente transformam-se, segundo o próprio autor, em relato do “simplório quotidiano de um jornalista reformado que se arvorou em marinheiro e que, não se tendo precavido suficientemente (apesar de três vezes vacinado), foi obrigado pela ministra Marta Temido e pelo seu diligente SNS24 a um período de isolamento profilático” de cinco dias no dito Horta Garden.

    Esta parte do “diário de um covídico”, nas humoradas mas conformadas palavras de José Pedro Castanheira, tem, pelo menos, uma utilidade histórica não despicienda: tal como olhamos hoje com admiração e espanto para antigas crónicas compiladas no século XVIII na História Trágico-Marítima de Bernardo Gomes de Brito – e sabendo as condições de navegação em épocas ancestrais –, no futuro, certamente, os nossos descendentes olhar-nos-ão com pasmo e espavento às experiências destes navegadores do século XXI. 

    Portanto, três vezes vacinado e depois ainda há um confinamento? Give me a break! Enfim, se os portugueses de antanho andasse com tais frescuras, nem ao forte de São Lourenço da Cabeça Seca, vulgo Bugio, chegariam com os madeiros ondulantes de então, quanto mais aos quatro cantos do Mundo.

    Nota final para o excelente prefácio de Onésimo Teotónio Pereira, distinto açoriano e professor catedrático no Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da Brown University, no estado norte-americano de Rhode Island.

  • TRANSPARÊNCIA: um teste à Democracia

    TRANSPARÊNCIA: um teste à Democracia


    O PÁGINA UM tem mostrado, ao longo da sua existência, que pretende fazer mais do que jornalismo independente. Também quer fazer jornalismo activo, não no sentido de activista, mas de não aguardar apenas pelas notícias nem procurar somente investigar para produzir notícias.

    O PÁGINA UM está atento aos sinais de falência institucional, de que são exemplos as posturas obscurantistas e autoritárias da Administração Pública, as acções persecutórias e promotoras de um falso unanimismo das instituições científicas e a decrepitude moral e ética da comunicação social.

    Por isso, e não por acaso, nos últimos meses o PÁGINA UM tem intentado processos no Tribunal Administrativo de Lisboa face à sistemática recusa de acesso a documentos. O objectivo não é apenas ter acesso a esses documentos, mas servem, de igual modo, como teste à Democracia, aos juízes, que são o seu último pilar.

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    Como amanhã o PÁGINA UM revelará, sobre uma sentença recente (de sexta-feira passada) quase desfavorável na sua totalidade às nossas (justas) pretensões, há motivos para grande preocupação em relação ao rigor e isenção das instituições judiciais, se não no seu todo, pelo menos numa parte.

    Por esse motivo, o PÁGINA UM começou a publicitar todas as peças processuais relevantes da totalidade das intimações já apresentadas no Tribunal Administrativo.

    Estão, para já, disponíveis, na secção TRANSPARÊNCIA, três processos: Infarmed (reacções adversas às vacinas contra a covid-19 e ao remdesivir); Instituto Superior Técnico (relatórios da pandemia) e Banco de Portugal (processos de contra-ordenação contra instituições financeiras). Nas próximas semanas contamos ter já incluídos os 12 processos actualmente em curso. A informação será actualizada com regularidade.

    A Transparência deve começar por expor o trabalho dos tribunais, porque as suas falhas minam-nos a confiança na Justiça.


    Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Sem esses apoios não seria possível esta dinâmica. diversos processos de intimação junto do Tribunal Administrativo.

  • O Fascibook e o Publifacho

    O Fascibook e o Publifacho


    O PÁGINA UM acabou esta tarde por ver censurado pelo Facebook a divulgação naquela rede social de uma notícia que publicou ontem intitulado “Covid-19: artigo científico de especialista em medicina baseada na evidência pede suspensão da administração de vacinas por razões de segurança”.

    A notícia do PÁGINA UM foi escrita por mim e por Elisabete Tavares. Somos jornalistas há mais de 25 anos. Trabalhámos em importantes órgãos de comunicação social.

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    Baseámos a notícias em factos verídicos. Foi publicado esta semana um artigo científico numa revista internacional conceituada (Journal of Insuline Resistance), por um conhecido e prestigiado cardiologista (Aseem Malhotra), que até é presença regular na comunicação social britânica chegou mesmo a ser defensor das vacinas.

    A notícia do PÁGINA UM tem o devido enquadramento; do ponto de vista de rigor mostra-se imaculada.

    Em momentos normais, ou melhor, antes deste estranho Novo Normal surgidos pela pandemia, a notícia do PÁGINA UM seria aceite com naturalidade, apenas como um contributo informativo para o debate sobre ciência, ademais sobre um aspecto fundamental da Saúde Pública.

    Censura do Facebook ao Página Um sobre a divulgação de uma notícia publicada num órgão de comunicação social e escrita por dois jornalistas com mais de 25 anos de profissão. O Facebook aplicou um castigo de “silenciamento” ao director do PÁGINA UM de 24 horas.

    O Facebook, tal como muitas outras tecnológicas, não pode continuar impunemente a agir como até agora, limitando a liberdade de expressão e sobretudo a liberdade de imprensa. Nunca teve mandato para tal, e está claramente a abusar de premissas (uma alegada protecção do bem comum) para criar um mundo sem contestação e ordenado segundo os seus princípios, nem sempre assim tão bondosos.

    Esta atitude fascista do Facebook – que, aliás, e bem, já está a ser contestada nos Estados Unidos –, de imposição de pensamento único, de eliminação do acesso à sua rede social, de censura sem critérios conhecidos através de uma entidade obscura chamada algoritmo ou inteligência artificial, escondida atrás de uma inacessível cortina, que impede quaisquer reclamações, não pode ser tolerável num mundo democrático.

    E não venham com a questão estafada das fake news, que sempre existiram e que deixam de ter relevância numa sociedade com uma imprensa forte, independente e credível.

    Sob a capa da luta contra a desinformação – que é uma externalidade dos sistemas democráticos –, a empresa de Mark Zuckerberg está a matar a democracia. E todos aqueles que defendem os métodos do Facebook contribuem para eliminar a desinformação juntamente com as verdades inconvenientes, sempre minoritárias, sempre incómodas, sempre fracturantes.

    Querer curar enxaquecas cortando cabeças é má opção. Pior ainda, cortar cabeças se alguém apenas questiona se há enxaqueca ou, ou tenta lançar um debate sobre a causa primordial da enxaqueca.

    Com essa postura de tirano, o Facebook e outros gigantes tecnológicos, criaram pequenos tiranete, que são hoje os directores de muitos órgãos de comunicação social.

    Ainda hoje, nem de propósito, o advogado Rui Amores – que tem sido o patrono do PÁGINA UM nos processos de intimação junto do Tribunal Administrativo de Lisboa – vai apresentar a minha contestação à providência cautelar do Pública contra a deliberação da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que obrigou aquele diário a publicar um direito de resposta a um artigo execrável de Dezembro do ano passado.

    Notícia do PÁGINA UM que revelou dados convenientemente anonimizados das crianças internadas com covid-19. Para o Público foi uma revelação de dados clínicos por uma “página de negacionistas anti-vacinas” que atentava contra a “necessidade de se criar consenso social em favor da vacinação”.

     Na providência cautelar o Público confessou que quando se referiu a uma “página negacionista anti-vacinas” naquela sua notícia conhecia quem era o jornalista (eu) e qual era o jornal (PÁGINA). Atente-se ao que escreveu o advogado Francisco Teixeira da Mota: “A omissão do nome da página do Facebook ou do jornal que a alimenta foi uma decisão deliberada da Direcção Editorial do jornal PÚBLICO e da editora da secção da Sociedade que, com sentido de responsabilidade, não quiseram dar publicidade à publicação que, manifestamente, tinha tomado posições claramente atentatórias contra a necessidade de se criar consenso social em favor da vacinação, algo que o jornal assumiu e defendeu desde a primeira hora”.

    Ou seja, temos um jornal doutrinador, que manipula abjectamente para conspurcar quem tem opinião diversa, que lança labéus contra aqueles que, na sua óptima, tentam contrariar um “consenso social”, que não passa de um forçado unanimismo assente no ostracismo de quem augura apenas debate e clarificação.

    Acham eles, acha o Público, que, nesta senda, tudo vale para que, “com sentido de responsabilidade”, “eliminem” as posições contrárias, o debate, a revelação de erros, a descoberta de verdades inconvenientes. Portam-se que nem fachos, apesar de baterem no peito a gritar democracia e a clamar pela liberdade de imprensa. Na verdade, gritar e clamar só os torna hipócritas. Ou seja, fachos hipócritas.

  • As formigas de Boliqueime são térmitas a corroer a nossa democracia

    As formigas de Boliqueime são térmitas a corroer a nossa democracia


    Em três décadas, entre 1991 e 2020, Portugal passou a ter mais cerca de 348 mil habitantes, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, mas aumentou o número de muito idosos (acima dos 80 anos) em quase 413 mil. Em 1991, por cada 1.000 portugueses, havia apenas 27 pessoas com mais de 80 anos; no início do século passou para 36; agora, o número é quase o dobro, tendo subido para 67 em cada mil.

    Aquilo que poderia ser um motivo de alegria social e prova de um sucesso civilizacional – viver mais, aumentar o número de gerações em vida, permitir ser usual crianças crescerem até bem adultos com os avós vivos e até conviverem muitos anos com bisavós –, acabou, porém, em Portugal por se estar a transformar em filmes de horrores, em cenas deploráveis, em quadros que mostram a triste natureza humana.

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    O caso da idosa num lar de Boliqueime, pejada de formigas, onde supostamente a provedora até mandava tirar rótulos de iogurtes fora do prazo, não é caso único. Nunca foi. E piorou a olhos vistos nos últimos dois anos com a pandemia, onde um manto de segredo paira em redor das chamadas Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas (ERPI). Não se sabe ao certo quantas pessoas morreram por ou com covid-19 desde Março de 2020, nem qual foi a letalidade de outras doenças.

    O PÁGINA UM tem tentado conhecer esses números desde Janeiro deste ano. Portugal é um dos poucos países europeus que nunca divulgou qualquer relatório. Mas, apesar de um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA), em Abril passado, o Ministério da Saúde “luta” no Tribunal Administrativo de Lisboa para não ceder essa informação.  

    A situação deplorável dos lares deve-se, em grande medida, à demissão do Estado – e dos sucessivos Governos – em olhar para a Terceira Idade com uma visão humanista. Para o Estado – e para os sucessivos Governos –, os idosos não são pessoas a quem a sociedade – toda e não apenas os familiares directos – paga um tributo e presta uma justa homenagem pelos seus contributos durante a “vida activa”. São empecilhos, sugadores de recursos económicos.

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    Na bitola de um ministro das Finanças, um pensionista – e ainda mais aquele que não tem recursos financeiros próprios para seguir para um lar privado, pagando-o integralmente – é sempre um encargo, uma despesa a ser rapidamente transformada em zero só e quando morrer.

    E, por isso, o Estado – e os sucessivos Governos – fazem de conta que se preocupam com os idosos. Numa população crescente de velhos, o Estado prefere manter um status quo assente num caduco e anacrónico pseudo-voluntarismo – como são as IPSS –, em vez de criar um sistema profissional e exigente, com regras e regulação apertada. Deixa à iniciativa das IPSS – ou de empresas privadas, quando em zonas “lucrativas” –, a implementação de oferta em vez de ser o Estado a satisfazer as necessidades da procura, muito diferenciada em função da região.

    Por isso, quando se olha para os relatórios da Carta Social – da responsabilidade do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – só se pode antever uma desgraça social. Fora e dentro dos lares. Com efeito, se considerarmos toda a oferta disponível dos chamados lares de idosos (ERPI), de acordo com a mais recente Carta Social de Dezembro de 2021, verifica-se que a capacidade evoluiu de um pouco menos de 60 mil camas no ano 2000 para pouco mais de 100 mil em 2020, ou seja, mais 40 mil camas. Ora, nesse período, só considerando a população com mais 85 anos, tivemos um aumento de mais de 174 mil.

    Evolução da população portuguesa com mais de 80 anos. Fonte: INE. Análise: PÁGINA UM.

    Se no ano 2000 existiam 265 idosos com mais de 85 anos por cada 100 camas em ERPI; em 2020 esse rácio passou para 333 idosos por cada 100 camas. Estão a ver no que isto dá, certo? Numa espécie de jogo da cadeira… cada vez há mais jogadores e menos cadeiras.

    Tudo isto inclina o jogo para os aventureiros e pessoas menos escrupulosas – independentemente de muitas estarem travestidas de IPSS ou de Santas Casas da Misericórdia –, que se aproveitam da fragilidade do Estado – e dos sucessivos Governos – que não querem publicamente que se olhe por debaixo do tapete e se observe os horrores que se foram chutando (nem sequer é varrer, porque nem sequer se é meigo).

    Assim, tendo em conta que a única preocupação do Estado – e dos sucessivos Governos – é não se ver publicamente, em demasia, as lástimas sociais, permite-se assim, alegremente, que muitos lares se transformem em depósitos de velhos, antecâmaras da morte, purgatórios perpétuos, onde se fecham os olhos aos excessos de ocupação, se negoceiam vagas ao melhor preço (ou à melhor herança para a IPSS), à qualidade da comida, à frequência de cuidados médicos e de enfermagem, aos mínimos das equipas operacionais, etc., etc., etc..

    Chega-se, inclusive, a fechar os olhos aos lares ilegais (englobando aqueles em fase de licenciamento, mas a funcionarem já), cujos endereços o próprio Estado conhece, porque perante tantas carências (face à demissão do Estado), julga-se que tudo é melhor do que nada.

    Fiscalizações, então – esqueçam. Nunca em tempo algum uma vistoria a um lar encontraria sequer um ácaro microscópico debaixo do travesseiro de uma idosa acamada. Por uma simples razão: por regra, os serviços da Segurança Social avisam com um mês de antecedência os lares que vão fiscalizar. Está certo: convém não chocar os inspectores com imagens, enfim, “desagradáveis”. Não queremos funcionários do Estado traumatizados. Nem com formigas. Mesmo se estas revelam, afinal, uma Democracia a ser roída por térmitas.

  • Qual é, afinal, o preço da Transparência?

    Qual é, afinal, o preço da Transparência?


    Desde o seu nascimento, o PÁGINA UM mostrou ao que vinha: queria rigor informativo, e, para tal, necessitava de informação. Queria informação.

    Um dos pilares da Democracia é a Imprensa livre e interventiva – aquela que observa e sindica os poderes sem concepções, sem receios e sem outra estratégia que não seja conhecer a Verdade.

    Tem sido essa a visão do PÁGINA UM.

    E, por esse motivo, foi com naturalidade, que o PÁGINA UM foi solicitando o acesso a documentos administrativos de diversas entidades, ainda no ano passado.

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    Perante a recusa sistemática por parte das diversas entidades, recorreu à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos. Recebeu, com uma excepção, pareceres favoráveis. Nenhuma entidade visada quis saber disso. Os pareceres da CADA não são vinculativos.

    Por isso, desde Abril, o PÁGINA UM tem intentado, com o apoio dos seus leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO, diversos processos de intimação junto do Tribunal Administrativo.

    Uma dúzia, 12, até agora.

    Não tenho memória de um outro qualquer órgão de comunicação social ter intentado tantos processos de intimação desta natureza, até porque poucas vezes há “coragem” ou “interesse” em confrontar entidades como Ministérios, institutos públicos ou direcções-gerais, o Banco de Portugal, universidades ou, last but not the least, até o Conselho Superior da Magistratura.

    Infelizmente, mais haverá, por certo, se houver condições financeiras e logísticas, embora o PÁGINA UM tenha a noção dos seus limites.

    O Obscurantismo está enraizado na Administração Pública e nas entidades com funções públicas.

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    Com efeito, aquilo que mais me tem surpreendido, na generalidade dos processos no Tribunal Administrativo de Lisboa em curso, é o profundo zelo e a compenetrada abnegação com que as entidades públicas visadas procuram recusar o acesso a documentos públicos. Usam todos os argumentos jurídicos, desde as mais picuinhas até às mais descaradas mentiras, chegam a “jogar sujo” (como já fez a Ordem dos Médicos “encenando” uma queixa-crime). Tudo lhes vale.

    E o que está em causa, afinal? Documentos públicos.

    Mas são também documentos que permitem analisar, avaliar e qualificar as acções de pessoas que conjunturalmente gerem a res publica, daquelas próprias que “lutam” para que uma imprensa livre não lhes ponha a vista em cima.

    Não estamos a falar de documentos com dados da vida privada de ninguém.

    São documentos sobre os quais não está em causa qualquer devassa. São “apenas” dados de inquestionável interesse público.

    Perante tantos obstáculos, e para também existir uma melhor percepão do esforço (que se espera não ser inglório) do PÁGINA UM , decidiu-se criar uma nova secção no jornal: TRANSPARÊNCIA.

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    Na secção TRANSPARÊNCIA – e porque os processos administrativos mesmo em curso não estão sujeitos a qualquer segredo –, o PÁGINA UM passará a disponibilizar uma cronologia e os documentos mais relevantes, designadamente os requerimentos iniciais, os argumentos da outra parte e os despachos e sentenças do Tribunal.

    Este será um processo lento – mais ou menos em função dos apoios que o PÁGINA UM venha a ter –, mas prometemos colocar informação de todos os processos, mesmo daqueles (ou sobretudo daqueles) em que não seja dada razão ao PÁGINA UM.

    Começamos hoje esta tarefa de TRANSPARÊNCIA com o processo de intimação contra o Infarmed por recusa em permitir o acesso à base de dados do Portal RAM, que detém informações sobre as reacções adversas das vacinas contra a covid-19 e do antiviral remdesivir.

    Mais de nove meses após termos pedido essa informação, o Infarmed luta para não ceder informação de interesse público.

    Qual é, afinal, o preço da Transparência?


    Nota: O PÁGINA UM decidiu “descontinuar” o P1 TV, uma vez que nos confrontámos com a impossibilidade de encontrar uma solução financeira que garantisse os princípios basilares do jornal, entre os quais a sua independência. O esforço financeiro que o P1 TV acarretou e acarretaria para o futuro do jornal – com a produção de documentários, reportagens, depoimentos, etc. – seria incomportável. O P1 Tv foi assim um embrião que não “vingou”, mas que ficará sempre como uma referência. Muito provavelmente, regressaremos com um novo modelo, apenas sonoro (podcasts), mais ágil mas também mais compatível com os nossos recursos. Gostaria pessoalmente de deixar os meus agradecimentos ao Nuno André e ao Júlio Barreiros pelo trabalho entretanto desenvolvido, com destaque para o documentário “O Pão Nosso“.

  • Público, o assumido e vergonhoso jornal doutrinador de massas

    Público, o assumido e vergonhoso jornal doutrinador de massas


    Em 23 de Dezembro do ano passado, o jornal Público, que tem como director o senhor Manuel Carlos Carvalho (como surge inscrito na Comissão da Carteira Profissional de Jornalista), decidiu publicar um artigo intitulado “Dados clínicos de crianças internadas em cuidados intensivos com covid expostos nas redes sociais”, que fazia eco de ataques soezes de certos sectores da comunidade médica – leia-se, Ordem dos Médicos e seus apaniguados – ao PÁGINA UM, que nascera dois dias antes.

    Em causa estava um artigo da minha autoria que revelava dados oficiais anonimizados de internamentos de crianças, provando assim que, mesmo podendo ocorrer hospitalizações por covid-19 em idade pediátrica, estas sempre foram extremamente raras e atingindo aquelas que já possuíam graves comorbilidades.

    Manuel Carlos Carvalho, director do Público

    Ora, como se sabe, houve pedidos meus de direito de resposta para diversos órgãos de comunicação social – todos inicialmente recusados, mas que viriam, com grande atraso, a ser alvo de decisões favoráveis por parte da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC).

    Assim, no passado 24 de Agosto, após um longo processo, a ERC viria a deliberar a procedência ao meu recurso por “denegação ilícita do direito de resposta por parte do Público”, exigindo que o jornal do senhor Manuel Carlos Carvalho publicasse o direito de resposta.

    Com legitimidade para tal, o Público tomou a decisão de contestar a obrigatoriedade de publicação do direito de resposta através de uma providência cautelar com efeitos suspensivos.

    Mas, se esta estratégia do Público se mostra legítima – sobre a moralidade, não me pronuncio por agora –, também possibilitou confirmar com que linhas se cose o jornal do senhor Manuel Carlos Carvalho.

    Num dos pontos do articulado do Público pelo seu advogado, Francisco Teixeira da Mota – prezado jurista da liberdade de imprensa, que curiosamente até já prefaciou um livro da minha autoria, pese embora repetidamente escreva “Paulo Almeida Vieira” no processo –, consta a seguinte pérola onde se “justifica” os motivos para se ter chamado “página de negacionistas anti-vacinas no Facebook” ao PÁGINA UM sem o identificar justa e correctamente como um normal órgão de comunicação social (que o Público sabia que era):

    person in white gloves with blue textile on lap

    A omissão do nome da página do Facebook ou do jornal que a alimenta foi uma decisão deliberada da Direcção Editorial do jornal PÚBLICO e da editora da secção da Sociedade que, com sentido de responsabilidade, não quiseram dar publicidade à publicação que, manifestamente, tinha tomado posições claramente atentatórias contra a necessidade de se criar consenso social em favor da vacinação, algo que o jornal assumiu e defendeu desde a primeira hora”.

    Eis aqui a confissão da mais abjecta postura doutrinária de um jornal. A confissão expressa da Direcção Editorial do jornal Público de ter tido a clara intenção de prejudicar a credibilidade do PÁGINA UM, de um jornal que nascera dias antes, e de permeio desacreditar um jornalista com décadas de experiência, que colaborara com órgãos de comunicação social como o Expresso e a Grande Reportagem – e que, hélas, até publicara artigos de opinião no Público.

    Eis também aqui a abjecta confissão da Direcção Editorial do jornal Público de se ter demitido da sua função informativa e de promoção de debate, assumindo o papel de “colaboracionistas” na criação de um “consenso social em favor da vacinação” universal, incluindo de jovens e de crianças. A confissão de terem, despudoradamente, negado os princípios da imprensa isenta e rigorosa.

    Notícia do PÁGINA UM que revelou dados anonimizados de crianças internadas com covid-19

    E isto quando, na verdade – e soube-se mais tarde, através de uma notícia de Março deste ano do PÁGINA UM – nem consenso havia então na própria Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 (CTVC), o órgão consultivo da DGS.

    Recorde-se que num primeiro parecer sobre a vacinação de adolescentes, homologado por Graça Freitas em 28 de Julho do ano passado, de entre 12 votos da CTVC registaram-se três contra e duas abstenções. Menos de duas semanas mais tarde, em 8 de Agosto registaram-se quatro votos contra e “uma pessoa não votou”. Estes pareceres foram escondidos durante meses pela DGS, e apenas foram revelados após pressão do PÁGINA UM na Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos.

    Bem sei: a Direcção Editorial do Público não se preocupava com as minudências de investigar e questionar; andava sim, “com sentido de responsabilidade” (sic), só preocupada em doutrinar o povo para o tal “consenso social em favor da vacinação” – e daí também, muito responsável e nojentamente tratava de denegrir um colega de profissão que desejava informar os leitores.

    O Público, o doutrinário jornal do “consenso social” não poderia assim informar os seus leitores de que o consenso sempre foi uma quimera, mesmo na classe médica. E que a DGS escondeu dados e especulou.

    Enfim, fica-se, com esta reles confissão da Direcção Editorial do Público, a saber que, para certos jornalistas, quando alguém não está a favor da criação de “consenso social”, seja ele qual for no futuro, não só se pode – como até se deve – tudo fazer para descredibilizar o “opositor”, classificando-o como alguém que toma “posições claramente atentatórias contra a necessidade de se criar consenso social”.

    man covering his face with both hands

    O tempo, esse julgador, mostrará como gente sem carácter para se manter como jornalista – como seja os membros da Direcção do Público e a sua editora da Sociedade, que se julgam “exemplares cidadãos” – deverá ficar recordado na História.

    Espero, sinceramente, que os sinais que mostram ter sido um erro colossal vacinar contra a covid-19 crianças, adolescentes e jovens adultos saudáveis não se confirmem como uma triste herança de tempos distópicos. Porque se se confirmarem, gente como eles não se mostrará apenas como uma mera cáfila de doutrinadores; será também vista como uma corja criminosa.


    Nota: Com esta providência cautelar, acompanhada da recusa de publicar o direito de resposta, a Direcção Editorial do Público também consegue outro propósito: como sou parte contra-interessada terei de constituir advogado e pagar uma taxa de justiça de 306 euros. Por isso, nestas lutas, o PÁGINA UM – que não tem, como o Público, uma “mãe” (leia-se, Sonae) que lhe suporta prejuízos consecutivos bem superiores a 2 milhões de euros por ano –, apenas conta com os seus leitores, através do FUNDO JURÍDICO, para uma luta que se sabe nunca será fácil. Nem para o PÁGINA UM, nem para aqueles que o querem dobrar.

  • Até as derrotas me dão esperança

    Até as derrotas me dão esperança


    Esta madrugada, eram cinco horas e eu ainda estava a escrever, mas não era nenhuma notícia. Deveria ser, mas não era.

    Estava a escrever “argumentos jurídicos”, para “auxiliar” o advogado do PÁGINA UM, Rui Amores, a contra-alegar no Tribunal Administrativo em dois dos processos de intimação que interpusemos para acesso a documentos administrativos.

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    São já 12, como será do conhecimento público, todos devido à falta de transparência de entidades públicas. Talvez sejam mais em breve, incluindo contra a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), cujo Secretariado veio, na semana passado, recusar-me o acesso a informações, em alguns casos relacionados com notícias que escrevi, alegando que, além de “constitu[ír]em documentos nominativos, sujeitos à proteção de dados pessoais”, eu não tenho “um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante”.

    Já estamos na fase em que jornalistas da CCPJ defendem e promovem a tese de que os jornalistas, pela sua condição, não têm interesse em matérias que investigam. E que, basicamente, não devem chatear.

    Não nos surpreendamos: o próprio Conselho Superior da Magistratura (CSM) já defende essa linha (não por acaso, é vê-la agora em estreita colaboração com a CCPJ). E mesmo tendo o CSM perdido um processo de intimação em primeira instância no Tribunal Administrativo de Lisboa, recorreu, pelo que o acesso continua ainda impossível.

    Mas vejam então como dediquei esta noite “jurídica”, que só há pouco terminou com a escrita deste Editorial.

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    O primeiro processo, no qual estive a “alegar”, é recente – começou no mês passado. Tem como ré a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) – que, aliás, tem estado a criar regulamentos internos ad hominem (voltarei ao tema!) – e deve-se à recusa no acesso aos pedidos de confidencialidade de empresas de media para que fiquem secretos determinados fluxos financeiros. A transparência é a regra, mas há uns “amigos” que podem ser excluídos dessa obrigação. A ERC quer decidir… secretamente.

    O segundo processo é mais antigo (iniciou-se em finais de Maio), e refere-se à recusa das Ordens dos Médicos e dos Farmacêuticos em ceder documentos operacionais e contabilísticos da campanha Todos Por Quem Cuida, que envolveu 1,4 milhões de euros, e o apoio financeiro da indústria farmacêutica. Embora considerado urgente, esta intimação já caminha para o quarto mês, tendo já 46 registos (movimentos) processuais. Tem sido interessante ver como as duas Ordens, mais as respectivas sociedades de advogados, lutam abnegadamente para não cederem os documentos requeridos para se avaliar como ganharam e como gastaram o dinheiro dos donativos.

    Pormenor dos movimentos processuais da intimação sobre o acesso aos documentos da campanha Todos por Quem Cuida

    Enfim, nos últimos tempos, uma parte dos meus dias de trabalho no PÁGINA UM não se mostra visível, sob a forma de notícias; são estas “burocracias”, as pequenas “batalhas” em prol da transparência, do acesso a documentos, apresentando requerimentos, reiterando pedidos de informação, compondo queixas. É desgastante, mas necessário. Os leitores não vêem este trabalho de formiga – e, por vezes, sinto que o menor fluxo de notícias, patente nas últimas semanas, pode influenciar a avaliação que se faz ao PÁGINA UM.

    Mas sempre assumi que o PÁGINA UM, além de um projecto de jornalismo independente, seria um projecto de cidadania. O leitmotiv do PÁGINA UM é a Democracia, a defesa dos princípios democráticos, assumindo que a Imprensa é um dos instrumentos.

    Nesta linha, os processos em Tribunal Administrativo – perante o inculcado e bem enraizado obscurantismo da Administração Pública – estão a servir também de teste à Democracia; servem para perceber se ainda existe uma entidade externa ao Poder, e às decisões arbitrárias deste em recusar o acesso à informação por parte dos cidadãos, que defenda a Democracia.

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    Sinto, por isso, cada um dos processos de intimação no Tribunal Administrativo como um teste à vitalidade da Democracia portuguesa.

    Uma vitória – e tivemos duas embora ainda sem efeitos práticos, porque o Conselho Superior da Magistratura e a Ordem dos Médicos (um outro processos, sobre pareceres técnicos) recorreram – é sempre uma esperança.

    Mas mesmo quando também há uma derrota, paradoxalmente, nasce uma esperança – mas por outros motivos.

    Por exemplo, esta madrugada, no meio da consulta da plataforma dos meus processos, constatei que tive uma derrota. Foi ontem concluída a sentença da intimação para o Ministério da Saúde abrir o seu arquivo – para conhecer a gestão durante os anos da pandemia.

    Ora, tendo eu pedido acesso integral do arquivo do Ministério da Saúde desde 2020, identificando as entidades a quem se dirigiam e recebiam ofícios e relatórios, a juíza entendeu, mesmo assim, que “atendendo à forma como o pedido foi formulado, a Entidade Requerida [Ministério da Saúde] não consegue satisfazer a pretensão, por não ser possível identificar, em concreto, a que documentos e informações o Requerente [eu] pretende o acesso, nem mesmo para perceber se estão em causa dados pessoais ou nominativos.”

    white head bust

    E acrescenta, dando na ferradura, que “importa salientar que não se trata de negar o acesso aos arquivos e registos administrativos, que conforme acima se expôs, constitui um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, todavia, impõe-se aos requerentes dessa informação que concretizem o que pretendem, caso contrário, a entidade administrativa não consegue satisfazer o pedido.”

    Esta decisão é surpreendente, porque a Lei do Acesso aos Documentos Administrativos diz taxativamente que “se o pedido não for suficientemente preciso, a entidade requerida deve, no prazo de cinco dias a partir da data da sua receção, indicar ao requerente a deficiência e convidá-lo a supri-la em prazo fixado para o efeito, devendo procurar assisti-lo na sua formulação, ao fornecer designadamente informações sobre a utilização dos seus arquivos e registos.” Algo que o Ministério da Saúde nunca fez nem propôs. Aliás, o Ministério classificou logo o pedido do PÁGINA UM de “manifestamente abusivo“.

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    Mas, mesmo assim, a juíza achou que como não consegui identificar em concreto os documentos – talvez o número dos ofícios ou o título de relatórios, que só poderia saber se fosse adivinho –, mesmo se identifiquei as entidades envolvidas e o intervalo de datas, “não se impõe à Entidade Requerida que entregue ao Requerente a informação e documentos requeridos.”

    E, pronto, improcedente, e pague-se as custas… Ou recorra-se para o tribunal superior, com mais custas, que é aquilo que se fará enquanto houver dinheiro do FUNDO JURÍDICO. E esperança…

    E, então, perguntam os leitores: onde está afinal a esperança nesta derrota?

    Está em poder contribuir para muitos acordarem do torpor (quase) colectivo que deixou a nossa Democracia apodrecer.


    Embora com meios incomensuravelmente menores do que as entidades públicas, o PÁGINA UM não vergará facilmente na sua luta em prol da transparência e do acesso à informação. No caso dos processos judiciais, que podem envolver custos acrescidos em caso de derrota, os apoios podem ser concedidos ao FUNDO JURÍDICO. Para o apoio ao trabalho jornalístico, podem apoiar através de várias modalidades.

  • Portugal vai ter um GRITE – Gabinete de Registo das Incompetências e Trapaças do Estado

    Portugal vai ter um GRITE – Gabinete de Registo das Incompetências e Trapaças do Estado


    O Ministério do Ambiente e da Acção Climática e o seu titular, Duarte Cordeiro, estão tão imbuídos da missão de facilitadores e fazedores do Bem que, enfim, até na fase de consulta pública do denominado Simplex Ambiental – ou, mais pomposamente, do diploma que visa a “simplificação de licenças e procedimentos para empresas na área ambiental” – dão dicas para quem quiser comentar ou tecer recomendações, até amanhã.

    Escrevem eles – ou, enfim, o Governo – que se deve incluir “uma reflexão sobre impactos em termos de custos de contexto (i.e., aumento ou diminuição de encargos associados ao cumprimento das obrigações legais que decorram desta iniciativa legislativa)”, e que se considere “o custo de oportunidade associado ao tempo em que os procedimentos administrativos ficam parados (ou seja, a duração média dos processos de licenciamento) (…), bem como ao facto de, na prática, não ser possível, muitas vezes, beneficiar efetivamente da figura do deferimento tácito.”

    Duarte Cordeiro, ministro socialista do Ambiente e Acção Climática

    O diabo costuma estar nos pormenores; mas, neste caso, aparenta estar em toda a proposta, e em todo o seu esplendor. Todo o diploma cheira mal em cada um dos seus poros.

    Sejamos claros: com este diploma – que também elimina a obrigatoriedade de muitos projectos de apresentarem avaliação prévia do impacte ambiental (em grande parte sob o “chapéu” da urgência de medidas de descarbonização, bondade que parece justificar tropelias e atropelamentos) –, o Governo não deseja desburocratizar.

    Não o move, na verdade, encurtar prazos para o avanço daqueles projectos com impacte ambiental que, com a devida e ponderada “regulação” da Administração Pública, mereceriam sempre uma aprovação. Se assim fosse, bastaria ao Governo eliminar algumas redundâncias burocráticas, e apostar sobretudo num reforço dos meios humanos e técnicos, retocando a logística administrativa. Aumentava-se a eficiência da máquina administrativa, e eis que tínhamos prazos encurtados e tramitações simplificadas.

    Ah, mas isso não! O Estado não quer instruir nem treinar os “jogadores” que lhe batem à porta, fazendo com que acertem as suas bolas numa baliza estreita. O bondoso Estado – ou melhor, o Governo que circunstancialmente detém o poder de gerir o território do país – está disposto a arranjar uma baliza gigantesca, onde tudo caberá: os projectos normais, que seriam aprovados mesmo com avaliação de impacte ambiental, e, enfim, os outros projectos “anormais” que, com as actuais regras do jogo, jamais seriam aprovados.

    giant petrel

    Portanto, assim se conseguirá, com o álibi de acelerar prazos – como se o ontem já fosse tarde para os amanhãs gloriosos – autorizar todas as tropelias.

    Porém, aquilo que verdadeiramente me assusta neste diploma é a figura do “deferimento tácito”. Causa-me calafrios. Apetece logo puxar da pistola (leia-se, caneta) e disparar sem perguntas nem remorsos.

    Sou jornalista desde os anos 90, e ademais comecei no jornalismo ambiental e de urbanismo, pelo que bem sei o significado de um “deferimento tácito”: caminho aberto para esquemas menos claros.

    Para quem não conhece o termo, o deferimento tácito significa uma aprovação por ultrapassagem do prazo de análise pelo Estado. Ou seja, é um prémio concedido pelo Estado à incompetência involuntária ou intencional da Administração Pública. Ou ainda um prémio ao requerente que, por “artes mágicas”, consegue que, algum funcionário estatal ou membro do Governo, vá colocando outros projectos em análise sempre em cima do seu, de modo que, enfim, hélas, o prazo passa… e voilà, aprovação.

    No diploma em causa, promovido pelo bondoso ministro Duarte Cordeiro, conta-se 25 vezes o termo “deferimento tácito”, e lá estão estabelecidos, em detalhe, os trâmites, céleres e desburocratizados, para a obtenção de um “licenciamento de secretaria”. Portanto, passa o prazo, e o promotor de um determinado projecto tem a garantia de que, fazendo um requerimento electrónico, a Agência para a Modernização Administrativa lhe passará uma “certidão no prazo de três dias úteis”, após os serviços tutelados pelo ministro do Ambiente confirmarem, no prazo de um dia, que houve deferimento tácito. Se os serviços do ministro do Ambiente nada disserem em um dia, segue a certidão à mesma.

    Modelo de requerimento previsto no Simplex Ambiental para o pedido de deferimento tácito.

    Só para mostrar que não se cumpriram prazos de análise, o Estado mostra rapidez e eficiência.

    Tão competente se mostra Duarte Cordeiro em prever os momentos de incompetência da Administração Pública que, vejam lá, até já se preparou um “modelo de certidão de deferimento tácito” (vd. página 128 do Simplex Ambiental).

    Reza assim: “A presente certidão atesta que (colocar a firma ou nome do interessado) obteve uma (colocar a designação legal do tipo de ato requerido e que foi obtido por deferimento tácito) para (identificar a atividade permitida através do ato de deferimento tácito). As autoridades públicas competentes devem, para todos os efeitos legais, assumir que a (colocar a firma ou nome do interessado) obteve todos os atos necessários para a realização da atividade em causa junto das entidades competentes, não podendo, designadamente, aplicar coimas por ausência da licença/autorização/permissão necessária para o desenvolvimento desta atividade.

    Eis como se produzirá um salvo-conduto para todo o tipo de arbitrariedades, sob a capa da bondade da transição energética, para salvar o Planeta do aquecimento global torpedeando todos os princípios de conservação da Natureza que demoraram décadas a consolidarem.

    E vejam lá ainda, pormenor relevante: Duarte Cordeiro é tão amigo do deferimento tácito que até o concede mesmo se o requerente nunca tiver pagado quaisquer taxas enquanto aguardava que a Administração Pública se mantivesse incompetente.

    Perante isto, tenho uma proposta para Duarte Cordeiro: em vez de ser a Agência para a Modernização Administrativa a gerir os deferimentos tácitos, crie o GRITE, acrónimo de Gabinete de Registos das Incompetências e Trapaças do Estado. Pelo menos, fica mais claro aquilo que sairá deste Simplex Ambiental.

  • O regresso de Clara Pinto Correia à crónica semanal… hoje, no PÁGINA UM

    O regresso de Clara Pinto Correia à crónica semanal… hoje, no PÁGINA UM


    O PÁGINA UM começará hoje a publicar crónicas semanais de Clara Pinto Correia. Grande parte da população portuguesa conhece esta mulher nascida em 1960, que se notabilizou não apenas na Ciência – sobretudo na investigação no domínio da Embriologia no Instituto Gulbenkian de Ciências e em universidades norte-americanas (Buffalo e Harvard) – como na Literatura.

    Foi também, durante mais de uma década, presença assídua na comunicação social, passando pelo O Jornal, o Diário de Notícias e a revista Visão, que terminou, de forma abrupta e polémica, em 2003.

    Já passaram quase 20 anos, portanto.

    Duas décadas se passaram, muitas explicações se deram então (e a própria Clara as deu), e uma “coisa” (não aprecio muito este termo, mas enfim…) me parece evidente: Portugal não pode jamais ostracizar em definitivo os melhores de entre si como se todos aqueles que decretam o “édito de expulsão” na concha da ostra (ostracismo deriva daqui), como faziam os gregos, fossem perfeitos, puros, imaculados de pecado e defeitos.

    E sei também que a Clara Pinto Correia, com a sua colaboração no PÁGINA UM – inicialmente semanal; veremos o futuro –, contribuirá, com o seu olhar amadurecido mas simultaneamente jovial, para que (nos) observemos melhor, com outros ângulos, talvez com maior empatia.

    Empatia, antes da simpatia, é aquilo que como director do PÁGINA UM peço a todos os nossos leitores – aqueles que nos seguem e apoiam desde o início deste projecto editorial. E, sobretudo, desfrutem dos escritos da Clara Pinto Correia.

    A Deriva dos Continentes “renasce” hoje no PÁGINA UM. E isso só, só isso mesmo, deve ser motivo para o nosso contentamento. O resto é supérfluo.

    Pedro Almeida Vieira


    Razões de um regresso

    Já nem sei quando é que comecei a fazer crónicas, mas, pelo menos, em 1989 já mandava todas as semanas, de Buffalo para O JORNAL, por uma novidade muito fina que era o fax, uma série de dois anos chamada THE BIG EASY, sobre o quotidiano na América profunda.

    Depois escrevi outra série para a revista de O JORNAL, depois passei anos a escrever ao domingo para o DIÁRIO DE NOTÍCIAS, depois passei outros tantos anos a escrever para a VISÃO… até que, em 2003, enquanto eu estava nos Estados Unidos a concluir um projecto de investigação de prazo apertado, creio que é do conhecimento comum que a populaça me foi cortando os braços, as pernas, a cabeça, numa grande animação de linchamento na praça pública[1], ao mesmo tempo que fazia chorar muito os meus filhinhos que tinham ficado em casa sem mim.

    Agora os matulões vão nos trinta anos e já me encheram de netos, pelo que temos a certeza de que mais ninguém vai chorar por minha causa[2].

    Espera-se, portanto, que vos diga que é bom estar de volta?

    Então, mas e eu é que sei?

    Oiçam lá, como é que é? Já ninguém se lembra de que os caminhos do Senhor são insondáveis?

    Bem, eu lembro-me… mas se calhar é tudo uma questão de defeito. Ou mesmo de feitio. Qu’ importe, como diria o outro…

    Clara Pinto Correia


    [1]Às tantas, nessa altura, telefonou-me um dos meus melhores amigos, sem saber se havia de rir ou de chorar, a contar-me que nas notícias se debatia furiosamente o meu “plágio”, enquanto por baixo, em notas de rodapé muito pequeninas, passava um letreiro a dizer “explodiu o Space Shuttle”. Francamente, pessoal.

    [2]Agora a tendência deles é mais para suspirarem “Oh, Mãe…”