Etiqueta: Habitação

  • Será que os ministros podem contribuir (com as suas casas) para o Programa Mais Habitação?

    Será que os ministros podem contribuir (com as suas casas) para o Programa Mais Habitação?

    Aviso: todos os ministros são proprietários imobiliários, embora alguns detenham apenas um mais ou menos “modesto” apartamento. Outros andam a pagar empréstimos bancários. Mas há um punhado de governantes que, além do próprio António Costa, possuem um património susceptível de vir a ser “cobiçado” pela ministra da Habitação, caso avance a peregrina ideia do arrendamento coercivo.

    Confira em baixo uma síntese da “busca” do PÁGINA UM ao património imobiliário dos principais governantes em funções, de acordo com as últimas declarações entregues no Tribunal Constitucional, e que escondem mais do que revelam, tantas são as rasuras justapostas para os jornalistas não verem e o público não saber.


    Marina Gonçalves, ministra da Habitação

    A responsável pelo pacote legislativo é apenas proprietária de uma fracção autónoma em Cristelo, no concelho de Caminha, de onde é natural, que pelo valor patrimonial (96.144,61 euros), deverá ser uma moradia.

    Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência

    A ministra da Presidência apenas detém um apartamento para habitação com três divisões e 67 metros quadrados. Frugal, portanto.

    Marina Gonçalves, ministra da Habitação, António Costa, primeiro-ministro, e Fernando Medina, ministro das Finanças, na apresentação do pacote legislativo para a habitação na passada quinta-feira.

    João Gomes Cravinho, ministro dos Negócios Estrangeiros

    Proprietário de duas fracções urbanas em Lisboa – uma na freguesia de Santa Maria Maior e outra em Arroios –, o ministro João Gomes Cravinho, não declarou rendimentos prediais. Assumindo que vive num dos dois apartamentos, o segundo pode vir a ser “cassado” pela colega Marina Gonçalves para avolumar a oferta no mercado de arrendamento.

    Helena Carreiras, ministra da Defesa Nacional

    Sem indicação sequer da freguesia, a ministra da Defesa Nacional é proprietária de um único prédio urbano na cidade de Lisboa, com o valor patrimonial de 128.138 euros, o que indicia ser um apartamento.

    Mariana Vieira da Silva é o membro do Governo com propriedade mais “exígua”.

    José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna

    O ministro da Administração Interna consegue que o Tribunal Constitucional lhe conceda direito a completo segredo sobre a sua propriedade predial. Apenas se sabe que tem um prédio urbano, mas não se sabe onde nem o seu valor patrimonial.

    Catarina Sarmento e Castro, ministra da Justiça

    Embora grande parte da informação da última declaração não seja transparente – ou seja, está rasurada –, a ministra da Justiça apresenta uma panóplia patrimonial, distribuída por Lisboa, Peniche e sobretudo Marinha Grande. Neste concelho do distrito de Leiria, Catarina Sarmento e Castro possui uma moradia T4 e mais uma garagem autónoma, enquanto em Peniche tem um T1 e outro apartamento da mesma dimensão em Carnide, na cidade de Lisboa. Além destes imóveis, tem um terço da herança indivisa de um T4 e de um T2 na Marinha Grande, além de um escritório de dimensões desconhecidas e três garagens autónomas. Como não apresenta rendimentos prediais, algumas destas propriedades são candidatas a integrarem a bolsa de arrendamento coercivo da ministra da Habitação.

    Se a peregrina ideia do arrendamento coercivo (sob a aura de inconstitucionalidade) avançar, e então se houver justiça, alguns das propriedades da ministra da Justiça serão as primeiras a entrarem no mercado…

    Fernando Medina, ministro das Finanças

    O antigo presidente da autarquia alfacinha detém um apartamento T4 nas Avenidas Novas, em Lisboa, mantendo uma dívida bancária de 351.855 euros. De resto, tem espalhados pelo Norte do país uma mão-cheia patrimonial que as rasuras do Tribunal Constitucional não permitem conhecer em detalhe: ½ de um prédio urbano em Vila real, ¼ de um prédio (não se sabe se rústico ou urbano) em Ribeira de Pena, mais ½ de três prédios rústicos em Celorico de Basto, e mais ½ de um prédio urbano em Muxões (Celorico de Basto), além de 1/6 de uma herança indivisa herdada do pai que o Tribunal Constitucional não considera merecedor de ser discriminada.

    Ana Catarina Mendes, ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares

    Proprietária de uma fracção – presume-se que apartamento – na freguesia lisboeta da Misericórdia, Ana Catarina Mendes detém ainda 50% de umas outras fracções na capital, ambas na freguesia de Campo de Ourique. Divorciada do ex-ministro Paulo Pedroso, a sua declaração não indica quem é detentor da outra metade destas duas fracções. Certo apenas que na declaração de 2019, Ana Catarina Mendes reportou um rendimento predial de 18.000 euros, mas na declaração de Março de 2022 – já separada de Pedroso – não indica qualquer rendimento deste tipo.

    Com duas casas de férias, António Costa Silva “livra-se” do arrendamento coercivo gizado pela sua colega da Habitação.

    António Costa Silva, ministro da Economia e do Mar

    Sendo porventura o ministro com maior património financeiro – e com o maior rendimento anual antes de entrar em funções governamentais (384.936 euros), António Costa Silva indica a propriedade de uma fracção em local desconhecido (apenas existe a referência ao artigo matricial 1344 e ao registo número 2099), além de um prédio urbano em Sobral da Lagoa, no concelho de Óbidos. Terá concluído a compra em Novembro de 2022 de uma fracção (não discriminada) na Quarteira, no concelho de Loulé.

    Pedro Adão e Silva, ministro da Cultura

    Proprietário de um apartamento na zona das Amoreiras, sob a qual tem um empréstimo de 465.656 euros, o ministro da Cultura apresenta-se como titular de uma fracção autónoma em Vila Nova de Milfontes (com valor patrimonial de 85.219 euros), a que acresce outra em Alvor (com valor patrimonial de 49.765 euros) e 1/24 de uma outra fracção na Praia do Alvor (com valor patrimonial de 77.495 euros).

    Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente, à esquerda de António Costa, tem um apartamento em Lisboa, e outro em Sintra, que já aluga.

    Elvira Fortunato, ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior

    Proprietária de uma fracção na Charneca da Caparica, provavelmente uma moradia, a atender ao valor patrimonial (160.339,55 euros), a ministra da Ciência detém ainda um prédio urbano em Vila Real de Santo António (com valor patrimonial de 7.875 euros) e 1/2 de uma outra parcela na mesma localidade.

    João Costa, ministro da Educação

    O ministro da Educação indica apenas uma moradia na Quinta do Anjo, sem mais qualquer indicação.

    Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

    Proprietária de um apartamento de 148 metros quadrados em Moscavide e de um T4 na Portela com 136 metros quadrados, a ministra do Trabalho é forte “candidata” a incorporar um destes prédios urbanos no pacote do arrendamento coercivo da Habitação, porque não apresenta rendimentos prediais. Tem ainda uma moradia na Silveira, no concelho de Torres Vedras, com 132 metros quadrados, integrado num terreno 750 metros quadrados, além de dois prédios urbanos, aparentemente em más condições, em Vila Nova de Foz Coa.

    Manuel Pizarro, ministro da Saúde

    Proprietário de um apartamento na freguesia portuense de Ramalde, bem como de duas outras fracções na mesma zona, uma das quais será o escritório onde funcionava a sua empresa de consultoria.

    Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente e Acção Climática

    Com ½ de um T3 em Lisboa, em freguesia desconhecida, o ministro do Ambiente indica a propriedade de uma fracção autónoma para habitação em Sintra, sem outra qualquer indicação. Apresentou um rendimento predial anual de 2.800 euros.

    João Galamba, ministro das Infraestruturas

    Proprietário de um apartamento em Arroios (com valor patrimonial de 87.077 euros), o novo ministro das Infraestruturas detém ainda um prédio urbano em Cascais com um valor patrimonial de 135.030 euros. Deve ser um bom senhorio, porque os rendimentos prediais declarados num ano foram apenas de 333 euros.

    João Galamba declara uma segunda habitação em Cascais e um rendimento predial anual de 333 euros.

    Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial

    Excluindo o património do marido, a ministra da Coesão Territorial é proprietária de um prédio urbano em regime de propriedade horizontal em Coimbra, sem se conhecer detalhes para além do artigo matricial urbano (nº 4277). Não tem rendimentos prediais.

    Maria do Céu Antunes, ministra da Agricultura e da Alimentação

    A antiga presidente da autarquia de Abrantes, apenas indica a propriedade de um prédio naquela cidade, sem outra referência além do artigo matricial (nº 7771).

  • António Costa tem dois apartamentos elegíveis para arrendamento coercivo

    António Costa tem dois apartamentos elegíveis para arrendamento coercivo

    Uma das medidas mais polémicas – e eventualmente inconstitucional – do plano do Governo para aumentar a oferta de casas é o arrendamento coercivo, ou seja, o Estado obrigará os proprietários com alojamentos desocupados a alugarem. A ministra Marina Gonçalves já veio descansar emigrantes e proprietários com casa de férias, mas ficarão assim eventualmente elegíveis apartamentos que não apresentem rendimento predial e se situem próximo da habitação permanente. O primeiro-ministro António Costa tem dois apartamentos nestas condições, um na Penha de França e outro em Odivelas.


    Dois dos apartamentos do primeiro-ministro António Costa na região de Lisboa não lhe estão a dar qualquer rendimento predial nem podem ser consideradas segunda residência, pelo que eventualmente ficarão abrangidos pela mais polémica medida prevista pelo pacote legislativo do Ministério da Habitação: o arrendamento coercivo.

    De acordo com a consulta feita pelo PÁGINA UM à última declaração de património e rendimentos do primeiro-ministro no Tribunal Constitucional, António Costa declarou a posse de cinco fracções autónomas em Portugal: três em Lisboa – na freguesia de Benfica, onde oficialmente mora, de Santa Clara e de Penha de França –, uma em Odivelas, e uma ainda no Carvoeiro, onde passa férias quando está no Algarve, embora neste caso detenha apenas uma parte indivisa de herança. Além dessas, sabe-se que António Costa detém ainda uma fracção – que ele próprio desconhece as características – na cidade de Margão, em Goa, por herança.

    Estrada do Desvio, junto à Calçada de Carriche, na freguesia de Santa Clara, onde António Costa é senhorio de um apartamento.

    No entanto, nessa declaração – feita em 21 de Novembro passado, que consistiu num esclarecimento exigido pelo Ministério Público sobre uma declaração anterior, datada de 30 de Março de 2022 –, António Costa explicita que os seus rendimentos prediais, num total de 7.300,80 euros por ano, “provêm do arrendamento da fracção sita na freguesia de Santa Clara, devidamente identificada no campo próprio, e ainda da permilagem correspondente às rendas do condomínio sito na freguesia de Benfica”, dizendo que “não há qualquer outro rendimento a declarar”.

    Apesar desta última declaração ter sido rasurada pelos serviços do Tribunal Constitucional – alegadamente por permitir a identificação individualizada de residências, mas em que se expurgou indevidamente a tipologia e área das fracções –, o PÁGINA UM sabe que esse apartamento de António Costa na freguesia de Santa Clara se localiza num segundo andar de um prédio da Estrada do Desvio, junto à Calçada do Carriche. Não se divulga o endereço completo por não ser, por agora, relevante.

    Rua Estácio da Veiga, à esquerda, na freguesia de Penha de França, onde António Costa é proprietário de um apartamento sem rendimento predial.

    Desta forma, assumindo António Costa que as outras duas fracções não têm rendimento predial, nem são casas de férias, significa que o primeiro-ministro pode ser considerado, segundo os critérios do Ministério da Habitação, um proprietário elegível para arrendamento coercivo, caso não prove inequivocamente que aquelas têm uma ocupação frequente ou permanente.

    O apartamento da Penha de França, localiza-se também num segundo andar da Rua Estácio da Veiga, num prédio de três pisos em boas condições. O primeiro-ministro já possui este apartamento pelo menos desde 2015, como noticiou o Observador em Março daquele ano, quando António Costa assumiu o cargo de secretário-geral do Partido Socialista.

    Já o apartamento em Odivelas, na Rua da Paiã, situa-se também no segundo andar, neste caso de um prédio em más condições de conservação. O apartamento foi dado como vendido em 21 de Outubro de 2016 numa notícia do Observador, de há quatro anos, que revelava os intensos negócios imobiliários de António Costa. Mas o PÁGINA UM pode garantir que é esse o apartamento que ainda está declarado pelo primeiro-ministro como pertencendo a si e à mulher Fernanda Tadeu.

    Rua da Paiã, em Odivelas. No edifício verde, ao lado esquerdo, está o apartamento de António Costa.

    Pode, em todo o caso, haver mais uma confusão na declaração de António Costa. Nos esclarecimentos transmitidos pelo primeiro-ministro ao Tribunal Constitucional surge mesmo a informação de que ele desconhecia que uma conta bancária não identificada, por rasurada pelos serviços daquele órgão de fiscalização e controlo dos políticos e da democracia, e que ele repetidamente indicava como sua, afinal, para sua “surpresa”, nem sequer era titular. O primeiro-ministro prometeu vir a rectificar a situação.

  • Pacote legislativo “esquece” perturbação da residência secundária, que já tem quota de 40% no Algarve

    Pacote legislativo “esquece” perturbação da residência secundária, que já tem quota de 40% no Algarve

    São mais de 1,1 milhões os alojamentos em Portugal que são utilizadas exclusivamente para férias ou residência secundária. No Algarve, quase 40% do total deste património imobiliário é deste segmento. O PÁGINA UM analisou os dados sobre habitação disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), onde se destaca que, no caso da região de Lisboa, apenas uma em cada 10 casas é de segunda habitação, e onde há assim menos disponibilidade imediata de alojamentos. Somando as habitações secundárias às casas que se encontram vagas, significa que um terço do parque habitacional em Portugal está, neste momento, indisponível para arrendamento ou venda. Ou seja, um total de 1,8 milhões de casas. Mas o Governo aparentemente ignora o impacte da residência secundária no mercado habitacional e sobre aqueles que apenas querem uma para viver condignamente.


    São casas usadas em exclusivo em curtos períodos, para passar as férias e fins-de-semana, e superam já os 1,1 milhões de alojamentos a nível nacional. No total, as casas usadas como habitação secundária correspondem agora a 18,5% do total do parque habitacional nacional, tendo crescido 180.462 em números absolutos em duas décadas, a um ritmo de mais de nove mil por ano. As regiões Norte e Centro são aquelas onde mais se concentram residências secundárias, agregando 61% do total, mas é o Algarve que apresenta um maior peso relativo: cerca de quatro em cada 10 alojamentos desta região são de residência não-permanente.

    Significa assim que, como estas casas não se encontram disponíveis no mercado, por usufruto contínuo embora intermitente dos seus proprietários, quase um quinto das habitações no país estão indisponíveis para venda ou arrendamento permanente. E o pacote legislativo, apresentado na passada quinta-feira pelo Governo, omite qualquer referência a este segmento, dando enfoque somente aos alojamentos não ocupados ou aos que estão a ser disponibilizados para alojamento local. Ou seja, quem tem casa considerada de segunda residência está livre, aparentemente, de sofrer imposições ou outras medidas coercivas do Governo para a colocar no mercado habitacional.

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    Quatro em cada 10 casas no Algarve não têm ocupação permanente.

    Em Portugal, o número de casas de segunda habitação – como são habitualmente designadas, mesmo quando os seus proprietários têm mais do que dois alojamentos – cresceu 20% nas últimas duas décadas, de acordo com dados censitários do Instituto Nacional de Estatística (INE) analisados pelo PÁGINA UM. Esta taxa foi ligeiramente superior ao crescimento do parque habitacional global, que foi de 19% entre 2001 e 2021.

    Se somarmos as segundas casas com as habitações que se encontram vagas (ou mesmo devolutas), correspondem a um total de mais de 1,8 milhões de alojamentos. Quer então dizer que um terço das casas em Portugal não permanentemente ocupadas estão, mesmo assim, fora do mercado de venda e arrendamento.

    Segundo uma análise do PÁGINA UM aos Censos, que abrangem a população e a habitação, em 2021 havia em termos líquidos, mais 180 mil casas como residência secundária do que em 2001, isto quando o património habitacional cresceu, nestas duas décadas, mais de 950 mil alojamentos.

    Número de alojamentos por segmento em Portugal e por regiões em 2021. Fonte: INE / Censos de 2021.

    No Algarve, o número de casas de férias disparou 42% entre 2001 e 2021, com 45 mil novas residências secundárias, mas em termos absolutos foi o Norte que mais aumentou, com 65.254 novos alojamentos neste segmento, embora com um crescimento relativo de 26%.

    Mas foi no Alentejo que o segmento da segunda habitação mais cresceu desde o início do século: comparando 2021 com 2001, registou-se um aumento de 51.898 novos alojamentos, mas apenas de 4.731 para residência habitual, sendo que a residência secundária contabilizou um aumento de 21.484 e os alojamentos vagos de 25.683 alojamentos.

    A região de Lisboa mostra ser aquela que registou uma evolução mais desequilibrada. Em 2001, agregava 27% do parque habitacional do país, mas apenas agregou 22% do crescimento global do país nas últimas duas décadas. Ou seja, o dinamismo na construção foi menor. O número de alojamentos vagos nesta região apenas aumentou em 10.449 alojamentos (que incluiu aqueles que estão devolutos, para venda, arrendamento ou demolição), e observa-se que o mercado imobiliário foi bastante dinâmico na habitação principal (mais 220.601 novos alojamentos), que foi mesmo “roubar” alojamentos secundários.

    Peso relativo dos alojamentos por segmento em Portugal e por região em 2001 e 2021. Fonte: INE. Análise: PÁGINA UM.

    Na verdade, a região de Lisboa foi a única que viu a residência secundária descer entre 2001 e 2021 (menos 16.039), em completo contraciclo com as outras regiões. Em Portugal, o crescimento do mercado da segunda habitação nas últimas duas décadas foi de 180.462 alojamentos.

    Os dados do INE sobre o património imobiliário por segmento mostram, aliás, que é redutor “culpabilizar” os proprietários de prédios devolutos (muitos já sem condições de habitabilidade) pela actual crise de escassez do mercado habitacional. Com efeito, do total de 5.970.677 alojamentos existentes em 2021, apenas sete em cada 10 (69,4%) têm ocupação habitual, sendo que quase duas em cada 10 são já usadas como residência secundária (18,5%) e as restantes estão vagas. Ou seja, há já muitas mais casas de segunda habitação do que casa potencialmente disponíveis para arrendamento ou venda.

    As diferenças regionais são, porém, enormes – e a nível municipal ainda serão maiores, e até deveriam ser analisadas em função do dinamismo demográfico e social de cada comunidade. Em todo o caso, a região de Lisboa é aquela onde, em 2021, afinal mais casas estavam ocupadas de forma habitual em 2021 (79,6% do total), e portanto onde seria mais difícil ir buscar mais alojamentos para o mercado. Para venda ou arrendamento, segundo o INE, nesta região apenas estão disponíveis 4,7% dos alojamentos existentes (cerca de 70 mil), havendo ainda 6% que se encontram vagos mas não disponíveis no mercado. O INE não explicita quantos destes últimos se encontram sem condições de habitabilidade. O mercado de segunda residência na região de Lisboa está em declíneo, por ser uma das regiões mais caras e de maior escassez no mercado habitacional.

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    A região de Lisboa tem carência habitacional a preços acessíveis, mas é a região do país com maior taxa de ocupação permanente de alojamentos.

    No lado oposto, o Algarve é a região mais rendida ao mercado da residência secundária, mas pela primeira vez os Censos mostram que o segmento da residência habitual (permanente) passou a minoritária: apenas 49,4% dos alojamentos estão agora ocupados todo o ano, sendo que a residência secundária representa já 38,6%, encontrando-se vagos 12%, dos quais 8% estão para venda ou arrendamento.

    O Alentejo e a região Centro são contudo as zonas de Portugal onde a percentagem de alojamentos vagos é ainda significativa, respectivamente 16,5% e 14,4%.

    No Norte, a fatia de casas destinadas a residência secundária face ao total de casas existentes, subiu um ponto percentual, para 16,9%. Também no Centro se observou uma subida, de 0,5 pontos percentuais, com 23,8% das casas a servirem como casas de férias.

    Ao anunciar um polémico pacote legislativo na passada semana, para dinamizar o mercado imobiliário, e permitir o acesso de famílias a casas a preços acessíveis, o Governo omitiu completamente a habitação secundária, que tem sido um dos factores mais desestabilizadores do mercado habitacional. De facto, a procura e compra de casas de segunda residência, em geral por famílias de maiores posses ou mesmo por estrangeiros, não apenas retira alojamentos do mercado habitacional como faz encarecer os preços em determinadas regiões.

    Marina Gonçalves, ministra da Habitação, António Costa, primeiro-ministro, e Fernando Medina, ministro das Finanças, na apresentação do pacote legislativo para a habitação na passada quinta-feira.

    O pacote de medidas “Mais Habitação” vai estar ainda em discussão pública durante aproximadamente um mês, e regressa ao Conselho de Ministros no dia 16 de Março para aprovação da proposta final, a qual será enviada à Assembleia da República.

    Entre as medidas, há algumas polémicas que se teme que possam até agravar a crise no acesso a rendas a preços acessíveis, já que torna mais valiosas as licenças de alojamento local, por exemplo, fazendo com que os proprietários não queiram passar os seus imóveis para o mercado de arrendamento.

    Estas medidas agora anunciadas surgem depois de anos de políticas de incentivo ao investimento no mercado imobiliário português, como os “Vistos Gold” e o alojamento local. Também foi promovida a atracção de residentes estrangeiros e dinamização do sector do turismo.

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    As políticas que foram implementadas ao longo dos últimos anos, a par da manutenção pelo Banco Central Europeu de taxas de juro artificialmente negativas, fez disparar os preços das casas em Portugal para níveis recorde, com grandes fundos de investimento a juntarem ao frenesim no sector.

    A procura externa fez disparar os preços das casas no país. Segundo dados divulgados pelo Confidencial Imobiliário, os preços de venda habitação em Portugal Continental subiram 18,7% no ano passado. Trata-se da “valorização anual mais elevada dos últimos 30 anos”. “É necessário recuar a 1991 para encontrar uma taxa de variação homóloga no final do ano superior à registada neste último mês de Dezembro”, segundo a mesma fonte.

    Segundo dados divulgados pelo INE, no espaço de um ano, os preços das casas em Portugal dispararam 13,5%, entre o final de Setembro de 2021 e o mesmo mês de 2022, com o preço mediano dos alojamentos familiares a fixar-se em 1.492 euros por metro quadrado.

    O forte aumento da procura e dos preços na habitação não foi compensado com políticas de disponibilização de habitação a preços acessíveis, nomeadamente com apoio do Estado ou das autarquias.

    A crise económica e o aumento do desemprego criados pelas medidas drásticas e sem precedentes impostas em Portugal pelo Governo durante a pandemia vieram penalizar ainda mais as famílias.

    Recentemente, com o aumento mais do que esperado da inflação, o Banco Central Europeu decidiu começar a subir as taxas de juro, a um ritmo que apanhou muitas famílias desprevenidas. Em 2022, a taxa de inflação média anual em Portugal fixou-se 7,8%, segundo o INE. Trata-se do valor mais alto desde 1992.

    As taxas Euribor estão actualmente em níveis máximos de 14 anos, nos prazos de 6 e 12 meses, os mais usados nos contratos de crédito à habitação em Portugal, tendo esta sexta-feira ficado fixadas, respetivamente, em 3,212% e 3,572%. Sobem para novos máximos há cinco sessões consecutivas.