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  • Covid-19: União Europeia (finalmente) investiga compra de vacinas e discursos oficiais mudam de tom

    Covid-19: União Europeia (finalmente) investiga compra de vacinas e discursos oficiais mudam de tom

    Em apenas uma semana, a Europa acordou para a necessidade de saber, afinal, o que se passou com a compra de vacinas contra a covid-19. A Procuradoria Europeia anunciou que tem em curso uma investigação à compra das vacinas. O anúncio surgiu numa semana polémica na Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19, no Parlamento Europeu. Hoje, a presidente desta Comissão surpreendeu muitos eurodeputados com declarações no Twitter a defender a investigação à compra das vacinas e a questionar o secretismo em torno dos contratos com a Pfizer.


    Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, está debaixo de fogo devido a suspeitas relativamente aos contratos secretos de compra de vacinas contra a Covid-19 à farmacêutica norte-americana Pfizer.

    Há mais de um ano que eurodeputados, instituições europeias e membros da sociedade civil pedem o acesso aos contratos secretos negociados por Ursula von der Leyen com o presidente executivo da Pfizer, Albert Bourla.

    Ursula von der Leyen entregou o prémio de liderança do Atlantic Council a Albert Bourla, CEO da Pfizer, em Novembro de 2021.

    Os últimos dias representaram um ponto de viragem que pode trazer dissabores a von der Leyen mas maior transparência ao processo de compra das vacinas. A Procuradoria Europeia anunciou ontem estar a investigar a compra de vacinas pela União Europeia.

    E, hoje, Kathleen van Brempt, presidente da Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, surpreendeu com declarações no Twitter, questionando, pela primeira vez, os contratos feitos com a Pfizer e o volume de vacinas compradas, bem como o montante pago pela União Europeia.

    Estes desenvolvimentos dos últimos dois dias surgem após uma semana explosiva no que toca ao tema das vacinas contra a covid-19, e sobretudo em relação aos contornos das compras lideradas pela Comissão Europeia, que já atingiram os 4,6 mil milhões de doses por 71 mil milhões de euros, mais de um terço do produto interno bruto português em 2021.

    Primeiro, foi uma responsável da gigante farmacêutica norte-americana Pfizer que admitiu, perante deputados do Parlamento Europeu, que a sua vacina não foi testada para se saber se impedia a transmissão do SARS-COV-2.

    As ondas de choque que as declarações desta responsável da Pfizer geraram foram gigantescas e a revolta, tanto de vacinados como de não vacinados, inundou as redes sociais.

    Entretanto, vários media tradicionais, incluindo a Reuters e a Associated Press, apressaram-se a garantir que a Pfizer nunca tinha prometido que a sua vacina impedia a infecção e o contágio, apesar de existirem ensaios clínicos pagos pela Pfizer que garantem que a vacina prevenia a transmissão do vírus.

    Em Portugal, o pneumologista Filipe Froes, um dos mais destacados consultores da Direcção-Geral da Saúde e também da Pfizer (entre outras farmacêuticas), sempre defendeu que a vacina contra a covid-19 reduzia a transmissibilidade em caso de infecção. Em Janeiro deste ano, em declarações à TSF, Froes garantiu que “quem tem o esquema vacinal completo e com dose de reforço, tem um risco de infeção e de transmissão praticamente nulo. Não se pode dizer que seja zero, mas o risco é praticamente nulo.”

    Recorde-se que, com base na garantia de que as vacinas impediam a infecção e o contágio, foi imposto o chamado “certificado digital” ou “passaporte sanitário”, criando-se a maior operação de segregação da população da História moderna. Além disso, foi por uma suposta maior transmissibilidade dos não-vacinados que responsáveis políticos contribuíram para espalhar a estigmatização sobre quem voluntariamente optava por não se vacinar. Em 29 de Julho do ano passado, o presidente norte-americano Joe Biden falava de uma “pandemia de não-vacinados“. E Ursula von der Leyen veio apelar, em 23 de Novembro passado, para que os cidadãos se vacinassem ou recebessem um reforço por se estar perante uma “pandemia de não-vacinados“.

    Após a audição da responsável da Pfizer nesta semana, eurodeputados sugeriram, numa conferência de imprensa, que fosse constituída uma comissão de inquérito sobre a covid-19, acusando a Comissão Especial sobre o tema, que decorre no Parlamento Europeu, de ser uma espécie de farsa. Os eurodeputados denunciariam ainda que continuam a ser secretos os dados sobre a negociação da compra de vacinas por parte da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen.

    Janine Small, presidente da divisão de mercados internacionais desenvolvidos, da Pfizer, na audição na Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, no dia 10 de Outubro.

    Por coincidência, seguiu-se um outro anúncio de relevo: a Procuradoria Europeia anunciou ontem que está a investigar a compra de vacinas contra a Covid-19 pela União Europeia. Esta entidade independente da União Europeia anunciou, numa “rara confirmação”, segundo as suas palavras, que a investigação “surge na sequência da existência de um interesse público elevado”. O comunicado da Procuradoria Europeia adianta que “não serão tornados públicos mais detalhes nesta fase”.

    Foi no seguimento deste comunicado da Procuradoria Europeia, que a presidente da Comissão Especial sobre a pandemia da covid-19 no Parlamento Europeu, a belga Kathleen van Brempt, publicou uma declaração no Twitter, o que surpreendeu muitos dos seus colegas eurodeputados. Brempt escreveu a propósito do anúncio da Procuradoria Europeia que “a Comissão COVI vai acompanhar este caso com grande atenção”.

    “Vários aspectos do terceiro contrato com a Pfizer, merecem ser escrutinados, as mensagens de texto entre a presidente da Comissão Europeia [e o CEO da Pfizer, Albert Bourla] e o facto de não haver nenhum documento sobre as negociações preliminares [entre os dois]”, escreveu ainda.

    E defendeu ainda que “precisamos saber a razão de o maior contrato ser o menos transparente; Precisamos compreender a razão para a União Europeia ser obrigada a comprar 1,8 mil milhões de vacinas da Pfizer/BioNTech, independentemente das necessidades, independente de haver novos e melhores players a entrar no mercado”.

    Conferência de imprensa de 11 de Outubro de eurodeputados que contestam a falta de transparência dos contratos de compra de vacinas contra a covid-19.

    No seu tweet, Kathleen van Brempt lembrou que, “muitos dos contratos feitos pela União Europeia reservam o ‘direito’ a comprar mas no contrato com a Pfizer temos a ‘obrigação’ de comprar”. “Porque nos desviámos do procedimento normal para um contrato que cobre muitas vezes as nossas necessidades, durante um período em que todos deveriam estar já vacinados (2022 e 2023)”, questionou.

    Cristian Terhes, o eurodeputado que desde há cerca de um ano tem lutado, junto com outros eurodeputados, por maior transparência sobre os contratos de compra de vacinas, comentou entretanto as declarações de van Brempt. “O que é dito pela presidente da Comissão COVI representa uma mudança de paradigma da Comissão (Especial sobre covid), porque, até agora, a Comissão comportou-se como se o seu objetivo fosse pedir desculpas a Ursula von der Leyen pela forma fraudulenta como assinou contratos com as empresas de vacinas”, salientou o eurodeputado romeno. “Agora, a presidente admite que existe um problema com a falta de transparência dos contratos, bem como com a forma e finalidade de compra das vacinas”, frisou na sua conta na rede social Facebook.

    O eurodeputado não tem sido, aliás, brando com a presidente da Comissão Europeia e, desta vez, pediu a sua demissão imediata. “Quando, há um ano atrás, comecei a falar com os meus colegas sobre a não transparência dos contratos e outros abusos cometidos por Ursula von der Leyen, muitos me disseram que não poderíamos fazer muito, porque era só conversa, porque estávamos a lidar com o melhor da União Europeia e assim por diante, desculpas atrás de desculpas para não fazer nada”, relembrou.

    Sede da Procuradoria Europeia no Luxemburgo.

    O eurodeputado prosseguiu indicando que “hoje, todos reconhecem que existe um problema com a não-publicação integral dos contratos”, e destacou uma grande mundança: “de segunda-feira, 10.10.2022, até hoje, 15.10.2022, tudo o que foi afirmado sobre estas vacinas mudou drasticamente”.

    Isto porque, recordou Cristian Tehres, “a Pfizer admitiu oficialmente, quando questionada pelo colega Rob Ross, que não testou realmente a vacina para ver se ela impede a transmissão do vírus”, acrescentando que, “mais tarde, isto foi também reconhecido por um representante da Comissão Europeia numa pergunta que lhe fiz”.

    O eurodeputado garantiu que vai continuar a pressão: “obviamente, não vamos parar até descobrirmos a verdade, toda a verdade! Até lá, Ursula von der Leyen deve demitir-se e colocar-se à disposição dos organismos europeus de investigação criminal”. E terminou o seu post com os hashtags #UrsulaMustResign #UrsulaMustGo.

    O romeno Cristian Terhes e o croata Mislav Kolakusic são os eurodeputados responsáveis pela criação da Comissão Conjunta COVID com a Comissão de Controlo Orçamental.

    Este eurodeputado está a preparar, juntamente com o eurodeputado croata Mislav Kolakusic, a Comissão Conjunta COVID com a Comissão de Controlo Orçamental (CONT), na qual será analisado o relatório do Tribunal de Contas da UE sobre como as vacinas foram compradas.

    Segundo este relatório, até Novembro de 2021 a Comissão Europeia comprou, em nome dos Estados, 4,6 mil milhões de doses de vacina por 71 mil milhões de euros. Tehers comentou que “a quantidade é enorme, assim como o valor comprado”. Com efeito, sendo a população da União Europeia de 447 milhões de habitantes, a Comissão Europeia comprou vacinas suficientes para nove doses por pessoa, incluindo crianças.

  • Covid-19: novo estudo defende não ser aconselhável vacinar recuperados

    Covid-19: novo estudo defende não ser aconselhável vacinar recuperados

    Uma análise a cerca de 900 artigos científicos, feita por uma equipa de investigadores italianos, mostra que a imunidade natural é mais prolongada e eficaz do que a imunidade concedida pelas vacinas. Os autores desaconselham mesmo a vacinação de quem “apanhou” covid-19, porque o risco de ter efeitos adversos pode ser 60% superior em comparação a quem se vacinou sem nunca ter tido contacto com o vírus. Se a estratégia de não vacinar recuperados fosse aplicada, mais de metade dos portugueses não necessitaria de fazer “reforços”.


    Numa base de risco-benefício, as pessoas recuperadas da covid-19 não deviam vacinar-se. Esta é a principal conclusão de 12 investigadores e médicos italianos feita após a análise a cerca de 900 estudos publicados em revistas científicas sobre a infecção pelo SARS-CoV e a eficácia das vacinas, e que está em fase de peer review (avaliação pelos pares).

    Intitulado “SARS-CoV-2 – O papel da imunidade natural: uma revisão narrativa” (SARS-CoV-2 – the role of natural immunity: a narrative review), este artigo científico de 29 páginas – que tem como primeira autora Sara Diani, da Universidade Europeia Jean Monnet de Pádua – debruça-se sobretudo em analisar a evolução da imunidade vacinal e da imunidade natural, bem como dos riscos das reinfecções e das vacinas contra a covid-19.

    white and black labeled bottle

    Em concreto, esta revisão narrativa analisou a literatura científica sobre a duração da imunidade natural; a imunidade celular; a reatividade cruzada; a duração da proteção imunológica pós-vacinação; a probabilidade de reinfecção e suas manifestações clínicas nos pacientes recuperados; as comparações entre vacinados e não vacinados nas possíveis reinfecções; o papel da imunidade híbrida; a eficácia da imunidade natural e induzida por vacina contra a variante Omicron; e incidência comparativa de efeitos adversos após a vacinação em indivíduos recuperados versus indivíduos virgens de COVID-19.

    É porventura a análise mais completa até agora feita no âmbito da pandemia.

    Uma das principais conclusões deste estudo – que a ser aplicada acarretaria um forte revés económico para as farmacêuticas, porque as vendas reduzir-se-iam – é de que a protecção natural, adquirida após a infecção por covid-19, é mais duradoura do que a imunidade vacinal, e que, mesmo sendo a vacina eficaz – menos, no caso da variante Ómicron –, quem possuir imunidade natural não beneficia em vacinar-se por causa dos riscos dos efeitos adversos das vacinas.

    O destaque para a protecção natural face ao SARS-CoV-2 – que, aliás, é fenómeno habitual em outras doenças infecciosas – advém não apenas da imunidade induzida pelas células B (humoral) mas também pelas células T (celular). “A análise da literatura sobre a imunidade natural pós-COVID-19 destacou uma série de achados que indicam uma boa proteção imunológica na grande maioria dos indivíduos”, dizem os autores, acrescentando que, nos recuperados, a imunidade após a infecção é “tipicamente de natureza humoral mediada por células e parece proteger contra a reinfecção e doença clinicamente grave”.

    O artigo menciona diversos estudos onde “foram encontrados anticorpos protectores e células B de memória” após mais de 12 meses da recuperação, e que o nível de imunidade ainda era bastante forte. “Especificamente, um estudo sueco, com um seguimento após infecção natural de até 20 meses, mostrou uma taxa de proteção de 95% à infecção e 87% à hospitalização naqueles que não tomaram vacinas” após uma primeira infecção, apontam os investigadores italianos.

    A constatação da menor gravidade nas reinfecções advém de uma avaliação empírica nos hospitais. “Em geral, a severidade dos sintomas de reinfecção é significativamente mais baixo do que a infecção primária, com um mais baixo grau de hospitalização (0,06%) e uma mortalidade extremamente baixa”, salientam os autores.

    Isto advém exactamente da “longevidade” da imunidade natural. “Mais de um ano após a infecção primária, as pessoas não vacinadas ainda têm proteção em torno de 70% (69% num grande estudo coorte de profissionais de saúde do Reino Unido)”, salientam. Tal deve-se em grande medida à carga viral nas reinfecções ser “cerca de 10 vezes menor do que a de uma infecção primária”.

    Embora os autores sustentem que “uma vacinação subsequente pode aumentar ainda mais essa proteção” – e tem sido essa a justificação das autoridades de Saúde mundiais para vacinar recuperados –, adiantam que numa análise risco-benefício esta pode não ser a melhor solução.

    Com efeito, os investigadores confirmam, através da análise a outros estudos, que “a proteção contra a infecção conferida pelo ciclo de vacinação é muito boa após os primeiros 14 dias, mas tende a diminuir rapidamente nos meses seguintes, quase desaparecendo cerca de cinco meses após a segunda dose”.

    Mas sustentam que “alguns dados da literatura destacam que numa fase posterior, esta protecção induzida pela vacina contra o contágio e/ou doença grave torna-se menos evidente do que a demonstrada nos indivíduos não vacinados”, mostrando ainda que “alguns investigadores relataram que, após uma infectação com SARS-CoV-2, é improvável que os indivíduos beneficiem da vacinação contra a covid-19”.

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    Dizem mesmo que, “devido à resposta imune prolongada documentada após a covid-19, a administração adicional de doses de vacina, especialmente a partir da segunda dose, não leva a uma melhora significativa na imunidade”.

    Ainda por cima, os recuperados após uma primeira infecção, têm uma maior susceptibilidade a sofrer efeitos adversos decorrentes da vacinação.

    Os investigadores italianos, que não têm ligações a qualquer farmacêutica, defendem mesmo que a vacinação de recuperados de uma infecção pelo vírus SARS-CoV-2 “não deve ser indicada”, tendo em conta “que os eventos adversos locais e sistémicos pós-vacina são 40% e 60% mais altos, respectivamente, em indivíduos com histórico anterior de infecção por SARS-CoV-2″, em comparação com os que ainda não tinham sido expostos ao vírus de forma natural.

    E concluem: “a relação risco-benefício nesses casos [pessoas recuperadas de uma infecção por SARS-CoV-2] parece não indicar a necessidade de administração da vacina”, sustentando igualmente a realização de mais estudos sobre imunidade híbrida (natural e vacinal), uma vez que, até agora, “os resultados dos estudos são às vezes contraditórios”.

  • Covid-19: artigo científico de especialista em medicina baseada na evidência pede suspensão da administração de vacinas por razões de segurança

    Covid-19: artigo científico de especialista em medicina baseada na evidência pede suspensão da administração de vacinas por razões de segurança

    Aseem Malhotra, cardiologista britânico e professor de Medicina Baseada na Evidência, que promoveu a toma das vacinas contra a covid-19, mudou de opinião devido aos seus efeitos adversos, sobretudo nos mais jovens e jovens adultos, e à baixa eficácia observada na prevenção da infecção e transmissão do SARS-COV-2. Num artigo na prestigiada revista científica Journal of Insuline Resistance, o especialista apresenta provas e apela para a suspensão das novas vacinas até haver evidências científicas sólidas sobre a sua segurança e eficácia real.


    Foi um dos primeiros cientistas a associar, em Abril de 2020, os riscos da obesidade e as formas mais graves de covid-19, promoveu as vacinas contra o SARS-CoV-2, mas a sua experiência como médico e os resultados de estudos e evidências científicas levaram um reputado cardiologista britânico a publicar um artigo fracturante e que assume vir quebrar os dogmas e a desinformação que têm sido promovidos em torno das vacinas mRNA contra a covid-19.

    No seu artigo, Aseem Malhotra, professor de Medicina baseada na evidência, e afiliado à Public Health Collaboration, diz que perante os registos dos efeitos adversos e a reduzida eficácia das vacinas na prevenção da infecção e transmissão, sem haver acesso a dados brutos dos ensaios clínicos das vacinas mRNA e na ausência de estudos independentes, a sua administração à população deve ser suspensa.

    Aseem Malhotra

    O cardiologista e activista de saúde pública publicou esta semana um artigo científico no prestigiado Journal of Insuline Resistance onde aponta que a população não tem sido bem informada sobre a real eficácia das vacinas nem sobre os efeitos adversos registados, o que constitui uma grave violação dos deveres médicos e dos direitos dos cidadãos.

    E salienta ainda que as informações veiculadas pelas farmacêuticas, nomeadamente a Pfizer, sobre a capacidade das vacinas de travarem a infecção e a transmissão do vírus SARS-CoV-2 não são confirmadas pela evidência científica. Também os danos na saúde provocados pelas vacinas mRNA estão, segundo Aseem Malhotra, a ser subreportados, enquanto o excesso de mortalidade desde o início da administração das novas vacinas e a afluência aos hospitais por problemas, incluindo do foro cardíaco, deveriam recomendar maior cautela na administração das vacinas.

    Primeira página da primeira parte do artigo científico de Aseem Malhotra no Journal of Insuline Resistance

    O cardiologista defende ainda que sejam efetuados estudos independentes sobre os efeitos adversos das novas vacinas, apontando simultaneamente falhas graves nos ensaios clínicos conduzidos pelos fabricantes.

    Neste artigo, que se encontra dividido em duas partes, Aseem Malhotra rompe ainda com o discurso do “consenso e pensamento único” em torno das vacinas contra a covid-19, e nesse aspecto é taxativo: a eficácia e segurança das vacinas mRNA prometidas pelas farmacêuticas não é demonstrada com base nas evidências científicas observadas em diversos estudos e dados estatísticos.

    O título do estudo não podia, aliás, ser mais directo: “Curando a desinformação na pandemia sobre as vacinas mRNA contra a covid-19 através de uma real medicina baseada na evidência“.

    “Trabalhei durante nove meses neste artigo e hoje finalmente está publicado depois de um processo rigoroso e longo de revisão por pares”, comentou entretanto o cardiologista na sua conta na rede social Twitter, que assume ter tomado duas doses da vacina da Pfizer, mas que foi mudando de opinião face aos dados recolhidos e às conversas com especialistas das universidades de Oxford, Stanford e Harvard, e ainda com dois whistleblowers (denunciantes) da farmacêutica norte-americana. “É talvez o trabalho mais importante da minha vida e da minha carreira até agora”, sublinhou.

    O artigo agora publicado, não é apenas opinativo; identifica em concreto diversas falhas que contribuíram para a desinformação em torno das vacinas mRNA contra a covid-19, possibilitando a manipulação da população que nunca esteve realmente informada sobre a eficácia e segurança destes fármacos. E também os riscos já conhecidos.

    Por exemplo, citando estudos já concluídos, Aseem Malhotra diz que o risco de eventos adversos sérios é de 1 para 800 vacinas tomadas, valores que excedem os ensaios randomizados da responsabilidade das farmacêuticas. Outro exemplo de alerta público é o incremento em 20% das chamadas de ambulâncias para socorrer suspeitas de ataque cardíaco ao longo de 2021 em comparação com 2019, antes da pandemia. E o cardiologista cita também o estudo envolvendo israelitas entre os 16 e os 39 anos de idade que contabilizou um aumento de 25% em determinados problemas cardíacos e coronários após a primeira e segunda doses da vacina contra a covid-19.

    Vídeo de ontem na conta do Twitter de Aseem Malhotra do artigo científico que pubicou, em que assume que foi vacinado com duas doses da Pfizer.

    De entre as falhas identificadas no artigo do cardiologista, sobressaem as detectadas nos ensaios clínicos conduzidos pelas farmacêuticas, mas também as verificadas na actuação dos reguladores como as agências dos medicamentos.

    Aseem Malhotra critica também a parcialidade observada nas notícias e opiniões promovidas pelos media e nas redes sociais em geral, por sustentarem a ideia de uma “narrativa única” a favor da vacinação contra a covid-19 em todos os grupos etários, sem que tenham mencionado as falhas graves detectadas nas “promessas” dos fabricantes e nos ensaios clínicos efetuados.

    A influência do financiamento e da indústria farmacêutica nos media e nas redes sociais, e não só, também é visto pelo especialistas como um dos factores que contribuiu para a imposição de uma narrativa de pensamento único e alegado “consenso” (inexistente) em torno da eficácia e segurança das vacinas mRNA.

    person in white gloves holding white plastic bottle

    Na primeira parte do artigo é sublinhado que “em resposta ao coronavírus 2 da síndrome respiratória aguda grave (SARS-CoV-2), vários novos agentes farmacêuticos foram administrados a milhares de milhões de pessoas em todo o Mundo, incluindo jovens saudáveis ​​com pouco risco de adoecerem com o vírus”. Aponta ainda que “uma margem de manobra considerável foi concedida em termos de testes pré-clínicos e clínicos desses agentes, apesar de um mecanismo de acção totalmente novo e em relação às características de biodistribuição”.

    O objectivo desta primeira parte do artigo científico consistia sobretudo em “obter uma melhor compreensão dos verdadeiros benefícios e danos potenciais das vacinas contra a doença de coronavírus (covid) de ácido ribonucleico mensageiro (mRNA)”, salienta o cardiologista.

    O método seguido baseou-se “numa revisão narrativa das evidências de ensaios randomizados e dados do mundo real dos produtos covid mRNA, com ênfase especial na vacina BionTech/Pfizer”.

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    “Autoridades e sectores da profissão médica apoiaram políticas antiéticas, coercitivas e mal informadas, como mandatos de vacinas e passaportes de vacinas, minando os princípios da prática médica baseada em evidências científicas e consentimento informado”, refere Aseem Malhotra na segunda parte do artigo científico. “Essas acções lamentáveis ​​​​são um sintoma da ‘confusão da informação médica’: a ponta de um iceberg de mortalidade, onde os medicamentos prescritos são estimados como a terceira causa mais comum de morte em todo o mundo, depois de doenças cardíacas e cancro”, acrescenta ainda.

    Nesta fase, Aseem Malhotra pretendeu “identificar as principais causas dessas falhas de saúde pública”, através de “uma revisão narrativa dos factores de condução actuais e históricos que sustentam a pandemia de desinformação médica”.

    As conclusões dessa análise são claras: “as causas subjacentes a esse fracasso incluem a captura regulatória – os guardiões que deveriam proteger o público são, de facto, financiados pelas corporações que ganham com a venda desses medicamentos”; “uma falha nas mensagens de saúde pública também resultou em desperdício de recursos e numa oportunidade perdida de ajudar as pessoas a levar uma vida mais saudável com mudanças de estilo de vida relativamente simples – e de baixo custo”.

    Aseem Malhotra tem alertado para os riscos de problemas cardíacos causados pela vacina contra a covid-19 em atletas, considerando que, nestes casos, é maior do que a infecção.

    Aseem Malhotra acrescenta que “há um forte argumento científico, ético e moral a ser feito de que a atual administração da vacina contra a covid-19 deve parar até que todos os dados brutos sejam submetidos a um escrutínio totalmente independente”. E lança um aviso para o futuro: “as profissões médicas e de saúde pública devem reconhecer essas falhas e evitar o ‘dólar contaminado do complexo médico-industrial’”, acrescentando que, perante aquilo que está em causa, “levará muito tempo e esforço para reconstruir a confiança nessas instituições, mas a saúde – tanto da Humanidade quanto da profissão médica – depende disso”.

    A falta de confiança percepcionada pela população nota-se já, refere o especialista, daí a recente baixa taxa de vacinação para outras doenças como a tripla contra o sarampo, a papeira e a rubéola no Reino Unido. Este facto é visto como muito preocupante, já que estas são vacinas com vasta comprovação da sua eficácia e segurança.

    Aseem Malhotra, que é presença assídua nos media britânicos, vinha já alertando, desde o início do ano, para os riscos de vacinação de jovens, especialmente quando começaram a surgir suspeitas de problemas cardíacos afectando futebolistas, como em Janeiro passado com o guarda-rede do Suderland, Lee Burge. No entanto, o cardiologista é também uma figura controversa no universo médico do Reino Unido, devido em parte à popularidade das suas dietas livre de açúcares e à contestação sobre o uso de estatinas para o controlo do colesterol.

  • Instituto Superior Técnico diz agora que afinal fez “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”

    Instituto Superior Técnico diz agora que afinal fez “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”

    Divulgado há menos de dois meses, um alarmista relatório do Instituto Superior Técnico, que “responsabilizava” as festividades e festivais de música de Junho de terem causado centenas de mortes, afinal parece que não foi bem um relatório. No Tribunal Administrativo de Lisboa, uma das mais credenciadas instituições universitárias públicas do país, que tem um protocolo com a Ordem dos Médicos, diz agora que só fez um “esboço embrionário”, e que não há relatório algum. A Lusa, porém, garantiu ao PÁGINA UM que “o relatório existe, naturalmente”. Moral da história: cerca de uma dezena de órgãos de comunicação social divulgaram, como verídico, um estudo científico alarmista, afinal nunca validado, e que, aparentemente, nem sequer existiu, apesar de a Lusa ter feito citações na sua notícia original. Eis um caso paradigmático do estado da Ciência e do rigor informativo do Portugal de hoje.


    Foi apresentado taxativamente como um relatório do Instituto Superior Técnico (IST). Em 28 de Julho passado, a agência noticiosa Lusa – detida maioritariamente pelo Estado – divulgou um take, replicado por cerca de uma dezena de órgãos de comunicação social, revelando que o IST estimava que a realização em Junho das festividades dos santos populares e festivais como o Rock in Rio tinha sido a causa da ocorrência de cerca de 340 mil casos de covid-19.

    E mais: citando frases do relatório – assim apresentado sempre nas notícias divulgadas pela imprensa –, salientava-se que com medidas sem impacto económico, designadamente o uso de máscara e a testagem gratuita, ter-se-ia registado igualmente uma sexta vaga, devido à variante Ómicron, mas “os seus efeitos seriam cumulativamente menores e a descida seria mais cedo e mais rápida”.

    Lusa noticiou as conclusões de um estudo do Instituto Superior Técnico sobre o impacte das festividades em Junho na transmissão e mortes por covid-19. Instituição universitária, que faz Ciência, quer convencer agora o Tribunal que aquilo que fez foi apenas “um esboço embrionário”.

    O estudo na base do relatório – que a direcção editorial da agência noticiosa garantiu em 2 de Agosto passado ao PÁGINA UM que “existe, naturalmente, caso contrário a Lusa não teria feito notícia” – ainda terá permitido que os peritos apontassem “a morte de 790 pessoas com covid-19 devido ao levantamento das restrições e às festividades, dos quais 330 associados às festas populares de Junho.”

    Mas, afinal, a história estava mal contada. Muito mal contada. Por todos os envolvidos.

    Em resposta ao Tribunal Administrativo de Lisboa – no seguimento de uma intimação feita pelo PÁGINA UM no início deste mês por recusa de acesso aos diversos relatórios e dados em bruto produzidos por esta instituição universitária pública desde 2021 –, o gabinete jurídico do IST afiança que “o grupo de investigadores (…) [encabeçado pelo próprio presidente, o catedrático Rogério Colaço] apenas realizou um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”.

    Henrique Oliveira, Rogério Colaço, Miguel Guimarães e Filipe Froes, na sede do Ordem dos Médicos, em Julho do ano passado, aquando da apresentação do plano de acompanhamento da pandemia. O Instituto Superior Técnico recusa divulgar os estudos e os dados. O Tribunal Administrativo decidirá se obriga ou não uma instituição pública a ceder dados científicos para validação pública.

    Repita-se: “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”.

    Destaque-se de novo: “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”.

    Com essa manobra, o IST está a procurar convencer o Tribunal Administrativo de Lisboa a não o obrigar a disponibilizar qualquer relatório nem dados em bruto, uma vez que a lei determina que “as notas pessoais, esboços, apontamentos, comunicações eletrónicas pessoais e outros registos de natureza semelhante, qualquer que seja o seu suporte” não são classificados como documentos administrativos.

    Trecho das alegações do IST junto do Tribunal Administrativo de Lisboa a garantir que realizou “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”. A Lusa garante que viu um relatório, e até o cita.

    Ou seja, o IST pretende ver reconhecido pelo Tribunal Administrativo de Lisboa que o relatório que a Lusa garante existir, afinal não existe porque não passa afinal de um esboço – ou menos do que isso: “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório”.

    No entanto, antes das insistências do PÁGINA UM em finais de Junho junto do investigador Henrique Oliveira – e mais tarde junto do próprio presidente do IST, Rogério Colaço –, nunca aquela instituição universitária renegou as notícias da Lusa e dos outros órgãos de comunicação social.

    Pelo contrário, na troca de e-mails com Henrique Oliveira, este investigador do IST mostrava que conhecia o impacte mediático da divulgação do take da Lusa.

    Num dos e-mails ao PÁGINA UM, este investigador, que assume ser “o único do grupo de trabalho [de cinco elementos] mandatado a falar sobre esses assuntos de análise”, escreveu o seguinte: “ontem [dia 28 de Julho] recusei diversos convites, antes do seu e-mail, nomeadamente de três televisões nacionais, para falar sobre o assunto porque… entrei de férias e as férias são, digamos, pouco científicas”.

    Resposta da directora-adjunta da Lusa ao PÁGINA UM garantindo que o relatório do IST “existe, naturalmente”, caso contrário não teria sido feita notícia. Mas para o Tribunal Administrativo de Lisboa, o IST diz agora que nunca houve relatório mas apenas um “esboço embrionário, consubstanciado num mero ensaio para um eventual relatório”. Aparentemente, o “esboço embrionário” não evoluiu, ao fim de dois meses, não tendo havido gestação e o “nascimento” de um qualquer relatório científico.

    Henrique Oliveira salientou também ao PÁGINA UM que todos os outros membros do grupo de trabalho do IST – Pedro Amaral, José Rui Figueira e Ana Serro, além de Rogério Colaço – estavam de férias. Ou seja, a notícia da Lusa foi convenientemente divulgada na véspera de todos os cinco investigadores do IST meterem férias.

    Saliente-se que as conclusões alarmistas do alegado relatório do IST – afinal um “esboço embrionário” transmitido ao público como se fosse pura Ciência saída de uma universidade pública portuguesa – não encontram respaldo nas evidências observadas durante o mês de Junho, como o PÁGINA UM revelou.

    Com efeito, enquanto decorreram as festas de Santo António, São João, Rock in Rio e outros festivais ao de Junho, os casos positivos de covid-19 foram sempre descendo em Portugal, contrariando mesmo as previsões anteriores de um relatório do IST, conforme comprovara o jornal digital Blind Spot dias antes do take da Lusa.

    Por exemplo, no dia 1 de Junho a média móvel de sete dias estava nos 24.602 casos positivos para todo o país, no dia 8 tinha descido para 20.575 casos, no dia 15 já estava nos 15.368 casos positivos, no dia 22 baixou para os 12.939 casos positivos e no final do mês estava mesmo abaixo dos 10 mil casos.

    Um relatório anterior do IST alertava que haveria um aumento das infecções com as festividades, mas tal não sucedeu. O suposto relatório de finais de Julho pretendia convencer o público que afinal as previsões estavam quase certas. Mas, na hora de mostrar a base científica dessas conclusões, o IST está a recusar essa validação externa. As festas populares em Lisboa este ano tiveram grande fluxo, sem máscaras, mas os casos regrediram face a Maio

    Durante o mês de Junho, os casos positivos de covid-19 aceleraram sempre, mas na direcção oposta à subida: ou seja, reduziram-se, o que contrariou os defensores do uso de máscaras e de restrições aos ajuntamentos como formas eficazes de controlo da pandemia. Em Julho sucedeu o mesmo. De acordo com os dados do Worldometer para Portugal, no final de Julho contabilizavam-se 3.258 casos positivos em cada dia (média móvel de sete dias). Em Agosto, os casos mantiveram-se sempre estáveis em redor dos 2.500 casos positivos. Actualmente, rondam os 2.200 casos por dia.

    A acção do PÁGINA UM no Tribunal Administrativo de Lisboa, com o apoio dos leitores através do FUNDO JURÍDICO, surgiu depois de esgotados todos os prazos e tentativas para o presidente do IST, Rogério Colaço, disponibilizar voluntariamente todos os relatórios e dados brutos sobre as análises em redor da pandemia. A verificação externa independente é, aliás, uma prática comum de validação em debates científicos, algo que o catedrático que agora lidera esta instituição pública parece querer ignorar, independentemente da Lei do Acesso aos Documentos Administrativos.

    Mas o presidente do IST sempre recusou disponibilizar essa informação. Aliás, a única vez que Rogério Colaço se dirigiu ao PÁGINA UM foi numa lacónica mensagem enviada através do seu Galaxy: “O pedido formal ao presidente do IST está respondido e a resposta é negativa.”

    Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico, nunca negou a existência e paternidade do relatório divulgado pela Lusa no final de Julho. No Tribunal Administrativo de Lisboa alega agora que a instituição universitário pode promover, sob a forma de Ciência, um “esboço embrionário, consubstanciado num mero ensaio para um eventual relatório”, não permitindo sequer uma validação externa independente.

    Saliente-se, por fim, que o PÁGINA UM questionou no início de Agosto os responsáveis editoriais do Público, Observador, Visão, TSF, Correio da Manhã, jornal i, Sábado e CNN Portugal para saber se, tendo todos replicado o take da Lusa, houvera antes da divulgação junto dos leitores uma confirmação da veracidade dos factos, se houvera confronto de outras fontes e se alguém das respectivas redacções tivera acesso ao famigerado relatório do IST.

    Só dois responderam ao PÁGINA UM: Sábado e jornal i. E confirmaram que não tinham tido acesso ao relatório. Todos os outros nem sequer responderam ao PÁGINA UM, considerando assim o assunto irrelevante.

    Em suma, cerca de uma dezena de órgãos de comunicação de âmbito nacional divulgaram uma notícia sobre um “relatório” que afinal a própria instituição científica diz ser agora ser “um esboço embrionário, que consubstancia um mero ensaio para um eventual relatório” – e, por esse motivo, não o quer divulgar. Nem divulgar os supostos dados científicos que estiveram na base de uma notícia alarmista não confirmável.

    O processo de intimação do PÁGINA UM continua a correr no Tribunal Administrativo de Lisboa, até porque foi solicitado ao IST mais informação do que a referente ao suposto “esboço embrionário”.

  • Excesso absurdo de mortalidade dos 5 aos 24 anos e nos maiores de 85

    Excesso absurdo de mortalidade dos 5 aos 24 anos e nos maiores de 85

    O PÁGINA UM fez um breve balanço da mortalidade do Verão de 2022: foi péssimo. O Verão de 2020 foi quase igual; o do ano passado pouco melhor. Nesta época do ano, a culpa pouco se pode dar à covid-19, mas as autoridades de Saúde não parecem preocupadas em saber os motivos da hecatombe. No triénio de 2020-2022, morreram no Verão mais de 10 mil pessoas face ao triénio anterior. Crianças com mais de 5 anos, adolescentes e jovens adultos com menos de 25 anos são os mais afectados. E, claro, os maiores de 85 anos.


    Apesar das doenças letais (incluindo covid-19) terem causado, como habitualmente, uma maior mortalidade nos meses de Inverno, os últimos três Verões (2020, 2021 e 2022) foram muito mais mortíferos. Explicações oficiais só para o ano, na melhor das hipóteses, a considerar as previsões do Ministério da Saúde.

    O recente Verão, que terminou às primeiras horas de ontem, confirmou aquilo que já se perspectivava: foi mesmo o mais funesto desde, pelo menos, 1980, aproximando-se dos 30 mil óbitos – valores que apenas se costumavam encontrar nos meses de Inverno.

    Antes da pandemia, a mortalidade total no Verão raramente ultrapassava os 25 mil óbitos.

    silhouette of person standing near cross

    De acordo com os dados disponíveis do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO), analisados pelo PÁGINA UM, o Verão de 2022 terminou assim com 29.620 mortes (valores ainda provisórios), um recorde (garantido) desde 2009, ano em que se começaram a apresentar valores diários. Contudo, considerando os valores mensais a partir de 1980, este terá também sido, muito provavelmente, o período estival mais mortífero nas últimas quatro décadas.

    A situação do Verão deste ano é particularmente preocupante, porque surge na sequência de um contínuo e atípico excesso de mortalidade na Primavera, da ordem dos 4.500 óbitos, um incremento de quase 17% face ao último quinquénio.

    Desde Março não houve um só mês sem a mortalidade estar bem acima da média do último quinquénio. Setembro deste ano deverá apresentar valores próximos dos 9.000 óbitos, número também elevado para esta época do ano. O nono mês costuma ser o menos mortífero.

    A evolução da mortalidade em Portugal, numa altura em que a covid-19 está claramente na fase endémica, vem confirmar o descontrolo absoluto da Saúde Pública desde a chegada do SARS-CoV-2. A “culpa” já nem pode ser atirada ao coronavírus.

    E isso nota-se sobretudo nos períodos de menor actividade viral, no período estival. Embora o Verão de 2021 tenha registado valores pouco acima do “normal” (27.005 óbitos) – mas beneficiando muito por via do morticínio do Inverno anterior, que “eliminou” os mais vulneráveis –, o de 2020 também foi bastante letal (29.079 óbitos).

    Mortalidade total no período estival (21 de Junho a 22 de Setembro) entre 2009 e 2022. Fonte: SICO

    Dessa forma, os Verões de triénio 2020-2022 foram 13,8% mais mortíferos do que o triénio imediatamente anterior (2017-2019): o somatório mostra uma diferença superior a 10 mil mortes (85.704 vs. 75.286).

    Porém, e talvez seja esse o aspecto mais preocupante, o acréscimo de mortalidade não atingiu por igual todas as faixas etárias.

    Na verdade, até houve grupos etários que apresentaram uma forte redução, como foi o caso dos menores de 5 anos: no triénio de 2017-2019 tinham morrido 247 crianças desta faixa, enquanto no triénio de 2020-2022 se contabilizaram 184 mortes, ou seja, uma descida de 25,5%. A taxa de mortalidade infantil (menores de 1 ano) reduziu 27,6%.

    Houve mais dois grupos etários com reduções, mas mais limitadas: adultos dos 35 aos 44 anos (-3,5%) e dos 45 aos 54 anos (-1,2%). Nos 25 aos 34 anos, o Verão do triénio da pandemia foi praticamente semelhante ao anterior (460 vs. 458).

    Óbitos por grupo etário entre 2017 e 2022 no período estival entre 2017 e 2022, e comparação entre os triénios 2017-2019 e 2020-2022. Fonte: SICO. Análise: PÁGINA UM.

    No extremo oposto observam-se aumentos completamente atípicos nos Verões da pandemia. Em termos absolutos, o aumento maior verificou-se nos maiores de 85 anos, com um acréscimo de 6.682 óbitos nos três últimos períodos estivais.

    O crescimento relativo foi de 22,5%, mesmo assim inferior ao que se contabilizou para os grupos das crianças dos 5 aos 14 anos (+23,8%) e dos adolescentes e jovens adultos dos 15 aos 24 anos (29,3%). Em termos absolutos, os aumentos foram de 15 óbitos no primeiro grupo (63, no triénio de 2017-2019, contra 78, no triénio) e de 70 no segundo grupo (239 contra 309).

  • Covid-19: menos internados, mas risco de morte nos hospitais aumentou muito entre os 25 e os 64 anos

    Covid-19: menos internados, mas risco de morte nos hospitais aumentou muito entre os 25 e os 64 anos

    A vacina contra a covid-19 prometia milagres, incluindo a redução drástica de mortes mesmo com doença grave. A variante Ómicron, entretanto, surgiu como um game changer, com uma menor agressividade e letalidade. Porém, se efectivamente no primeiro semestre de 2022 se observou menos hospitalizações, porém aumentou o risco de morte dos internados com quadros graves de covid-19. Este paradoxo ainda se evidencia mais no período de Março a Junho, e nos adultos entre os 25 e os 64 anos. Qual o motivo? A Direcção-Geral da Saúde, como habitualmente, remete-se ao (seu comprometedor) silêncio.


    A probabilidade de morte de internados no grupo etário dos 25 aos 64 anos por covid-19 apresentou uma evolução paradoxalmente desfavorável no primeiro semestre de 2022 face aos períodos anteriores da pandemia, a despeito do programa de vacinação contra a covid-19 e da menor letalidade da variante Ómicron, de acordo com uma análise detalhada à base de dados da Morbilidade e Mortalidade Hospitalar.

    Nos adultos entre os 25 e os 44 anos, segundo os cálculos do PÁGINA UM, o risco de morte durante uma hospitalização causada pelo SARS-COV-2 no período de Março a Junho de 2022 chega a ser o triplo face ao período homólogo de 2020 e 2021, e duplica naqueles com idades compreendidas entre os 45 e 64 anos. Comparando o primeiro semestre deste ano com o do ano anterior, o aumento é menor, mas mesmo assim bastante significativo entre os 25 e os 64 anos.

    Apesar da Ómicron ser claramente uma variante de menor agressividade e letalidade do que as anteriores – e, portanto, o risco da infecção se agravar até necessitar de hospitalização ser agora bastante menor, conforme o PÁGINA UM já comprovou –, há um aparente paradoxo, ainda não explicado pelas autoridades de Saúde: as hospitalizações diminuíram, é certo; a taxa de letalidade também, mas para quem evolui agora para um caso grave (que resulte num internamento) viu as suas chances de sobrevivência diminuírem se tiver entre 25 e 64 anos. Ou seja, a taxa de mortalidade em meio hospitalar da covid-19 aumentou.

    Com efeito, na faixa etária dos 25 aos 44 anos, no primeiro semestre deste ano foram apenas internadas 420 pessoas contra os 1.484 em 2021 – o que mostra uma redução da agressividade do vírus, tanto mais que o número de infecções (casos positivos) foi muito superior. Ora, mesmo se o número de óbitos para este grupo foi menor entre Janeiro e Junho deste ano (24) do que no período homólogo passado (42), a taxa de mortalidade hospitalar acabou por ser superior: 5,7% em 2022 e 2,8% em 2021. Comparando os dois semestres, duplicou.

    Evolução mensal da taxa de mortalidade hospitalar total (%) global (todas as idades). A vermelho apresenta-se a linha de tendência. Fonte: ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    De igual modo, no grupo etário dos 45 aos 64 anos, a taxa de mortalidade hospitalar no primeiro semestre de 2022 foi bastante superior à do ano passado, mesmo se o número de internados também desceu significativamente. Nos primeiros seis meses de 2022 contabilizaram-se nos hospitais do SNS um total de 1.167 doentes por covid-19, uma redução de 82% face ao ano anterior, mas a diminuição nos óbitos foi menor, apenas de 67% (190 vs. 578). Significa assim que a taxa de mortalidade hospitalar por covid-19 subiu de 8.9% no primeiro semestre de 2021 para 11,4% no primeiro semestre do presente ano. Noutra perspectiva, no ano passado, em cada 1.000 internados, morreram 89; este ano, 114.

    Apenas na faixa etária dos maiores de 65 anos, se observou uma redução global em todos os indicadores quando comparados o primeiro semestre de 2021 e 2022: o número de internados desceu de 17.240 para 9.599; o número total de óbitos reduziu-se de 5.836 para 2.531; e, em consequência destes valores, a taxa de mortalidade hospitalar diminuiu de 33.9% para 26,4%.

    Evolução mensal da taxa de mortalidade hospitalar (%) no grupo etários dos 25 aos 44 anos. A vermelho apresenta-se a linha de tendência. Fonte: ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Saliente-se que a mortalidade hospitalar nos menores de 25 anos foi sempre irrelevante do ponto de vista da Saúde Pública: desde Março de 2020 até Junho deste ano (28 meses) foram internadas 1.917 pessoas (69 por mês) e morreram sete, das quais cinco com idades entre os 15 e os 24 anos. A taxa de mortalidade hospitalar foi assim inferior a 0,4%.

    Se este exercício for feito por períodos homólogos nos três anos de pandemia – sendo possível comparar os meses entre Março e Junho de 2020, 2021 e 2022 –, excluindo assim o período de descontrolo do Serviço Nacional de Saúde em Janeiro e Fevereiro de 2021 –, constata-se de uma forma ainda mais marcante este paradoxal fenómeno. Ainda mais sabendo-se que, virtualmente, toda a população com mais de 25 anos está vacinada, sendo que uma parte significativa recebeu ainda reforço.

    Evolução mensal da taxa de mortalidade hospitalar (%) no grupo etários dos 45 aos 64 anos. A vermelho apresenta-se a linha de tendência. Fonte: ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    De facto, se no período de Março e Junho de 2020 e 2021, a taxa de mortalidade hospitalar se manteve muito semelhante tanto no grupo dos 24 aos 44 anos (1,44% vs. 1,51%) e no dos 45 aos 64 anos (5,59% vs. 6,11%), em 2022 agravou-se. E muito. Para o primeiro grupo subiu para 5,23% e para o segundo grupo para 11,70%.

    Observando a evolução mês a mês desde o início da pandemia, a tendência crescente no período mais recente mostra-se evidente em ambos os grupos, embora com uma maior variabilidade (também por os valores absolutos de internados e óbitos serem menores) entre os 25 e os 44 anos. Para este grupo, nunca até Dezembro de 2021 houvera um mês com taxa de mortalidade hospitalar acima dos 5%, mas em 2022 já se registaram três meses acima dessa fasquia: Fevereiro (8,9%), Março (6,5%) e Junho (8,8%).

    Evolução mensal da taxa de mortalidade hospitalar (%) nos maiores de 65 anos. A vermelho apresenta-se a linha de tendência. Fonte: ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    No grupo dos 45 aos 64 anos, a taxa de mortalidade hospitalar – que sempre apresentou uma grande variabilidade, embora até Dezembro do ano passado apenas por uma vez ultrapassara os 10% –, tem estado agora em níveis sempre acima dos 10%. No primeiro semestre de 2022, este rácio situou-se entre os 10,3% em Janeiro e os 12,6% em Fevereiro, havendo já três meses acima de 12%.

    Para os mais idosos, acima dos 65 anos, a evolução foi diferente, mas também paradoxal, sobretudo por se estar perante um grupo etário com reforços vacinais. Entre Março e Junho de 2020, quase um terço (31,6%) dos casos graves de covid-19 que levavam ao internamento acabaram em desfecho fatal. Nesta altura, não havia ainda vacina. Esse rácio diminuiu para cerca de um em cada cinco internados (20,96%) em 2021 – já com a vacinação aplicada e “beneficiando” da morte dos mais vulneráveis nos fatídicos meses de Janeiro e Fevereiro. Este ano de 2022, com vacina e Ómicron, subiu estranhamente para 24,80% (ou seja, uma morte em cada quatro internamentos).

    people in white shirt holding clear drinking glasses

    A evolução mensal da mortalidade hospitalar no grupo dos mais idosos mostra, aliás, que os casos graves (que chegam, por isso, ao internamento) mantiveram um padrão relativamente estável. Se exceptuarmos o início da pandemia (Março e Abril de 2020) e Janeiro de 2021 – com taxa de mortalidade que atingiu os 40,6% – e um breve período de 2021 (meses de Abril e Maio com taxas abaixo de 20%), este rácio quase sempre esteve compreendido entre os 24% e os 32%. Ou seja, neste grupo vulnerável – e que contribui para a grande maioria dos óbitos por covid-19 –, apesar do menor risco de internamento, o risco de morte em caso de hospitalização continuou em níveis elevados.

    Nessa medida, aparentemente, os avanços médicos no tratamento desta doença, a menor agressividade da variante Ómicron e as vacinas não trouxeram impactes positivos substanciais em termos de probabilidade de sobrevivência em estados grave da doença.

    Relembre-se que esta taxa de mortalidade hospitalar da covid-19 – calculada em função do número de óbitos por cada 100 doentes (graves) que são hospitalizados – não deve ser confundida com a taxa de letalidade, que corresponde ao número de óbitos em função dos casos positivos (infecções). Nem tão-pouco ao risco de internamento, que constitui a probabilidade de um caso de infecção chegar a necessitar de internamento.

    Taxa de mortalidade hospitalar (%) nos grupos etários dos 25-44, 45-64, maiores de 65 anos e para a população portuguesa nos períodos de Março a Junho de 2020, 2021 e 2022, e ainda para o período de Março de 2020 a Junho de 2022. Fonte: ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Na verdade, tanto a taxa de letalidade como o risco de internamento baixaram em 2022 com o surgimento da Ómicron, como, aliás, o PÁGINA UM já demonstrou. Porém, fica por explicar um paradoxo: com uma menor pressão hospitalar (mesmo em termos absolutos), com um vírus agora menos agressivo (e letal) e ainda com as vacinas – apresentadas como um medicamento que prometia diminuir o surgimento de doença grave e de morte (no decurso de doença grave sujeita a hospitalização, pressupõe-se) –, quais então as razões para se estar com taxas de mortalidade hospitalar superiores às registadas em 2020 e 2021?

    O PÁGINA UM gostaria de, pelo menos, saber a opinião da Direcção-Geral da Saúde. E escreveu mesmo um longo e-mail no passado dia 9 à directora-geral Graça Freitas, incluindo gráficos e alguns dos cálculos que agora se apresentam, pedindo-se explicações. Não obteve resposta. Como habitualmente.

  • Vacinação em jovens adultos: por cada hospitalização evitada, há entre 18 e 98 casos de reacções adversas graves

    Vacinação em jovens adultos: por cada hospitalização evitada, há entre 18 e 98 casos de reacções adversas graves

    Estudo coloca em causa imposição da vacinação em universidades norte-americanas, concluindo que os prejuízos potenciais no grupo etário dos 18 aos 29 anos são superiores aos benefícios. Este “sacrifício” nem sequer traz vantagens para as comunidades mais vulneráveis face ao rápido decaimento da eficácia das vacinas na protecção contra a infecção, asseguram os autores, que pertencem a conceituadas universidades da América do Norte e Reino Unido.


    Se a vacina contra a covid-19 se chamasse emenda, e soneto fosse o SARS-Cov-2, então poder-se-ia aplicar o rifão português para sintetizar as conclusões de uma análise de 11 investigadores norte-americanos e britânicos divulgado esta semana: será pior a emenda do que o soneto se se insistir na vacinação de jovens adultos.

    O estudo – com 50 páginas e 125 referências bibliográficas –, ainda se encontra em avaliação pelos pares (peer review), sendo da autoria de 11 investigadores de diversas universidades, entre as quais a de Oxford, Harvard e Edimburgo. Alguns destes cientistas publicaram em Maio passado um artigo científico na prestigiada revista BMJ Global Health onde arrasaram a gestão política e mediática da pandemia, invocando sobretudo questões éticas.

    three men and one woman laughing during daytime

    Nesse artigo era salientado que a adopção dos certificados digitais, como passes sanitários para o acesso a determinados locais, tinha “colidido com os direitos humanos e promovido a polarização social afectando a saúde e o bem-estar”, acabando por ser usado com um fito “inerentemente punitivo, discriminatório e coercitivo.” Defendiam então uma reavaliação “à luz das consequências negativas.”

    Agora, no artigo intitulado “Covid-19 vaccine boosters for young adults: A risk-benefit assessment and five ethical arguments against mandates at universities”, os investigadores mostram-se mais taxativos, chegando a quantificar o risco dos efeitos adversos de um reforço vacinal nos jovens dos 18 aos 29 anos em confronto com o risco de hospitalização sem vacinação.

    Na análise risco-benefício, os autores estimam que, nos Estados Unidos, para se evitar uma hospitalização naquele grupo etário será necessário vacinar entre 22 mil e 30 mil adultos, uma vez que as complicações em caso de infecção de não-vacinados é sempre rara. Este risco da não-vacinação entra em confronto com o que se conhece sobre efeitos adversos das vacinas.

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    Ora, de acordo com os dados do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) – a agência norte-americana de Saúde –, referidos pelos autores, esse número de vacinados, para prevenir apenas uma hospitalização, resulta em 18 a 98 casos de reacções adversas graves, incluindo 1,7 a 3,0 casos de miocardite, e ainda entre 1,37 e 3,23 casos sérios de reactogenicidade capaz de interferir com tarefas diárias.

    Por esse motivo, e porque os investigadores consideram que já existe, naquele grupo etário, uma elevada prevalência de imunidade adquirida por infecção, dizem que, nessas circunstâncias, o perfil de risco-benefício se torna ainda menos favorável. E, nessa medida, criticam a política de imposição da vacina em muitas instituições de ensino superior norte-americanas. Recorde-se que, em Maio passado, pelo menos mil universidades e campus universitários dos Estados Unidos exigiram a vacinação contra a covid-19, e mais de três centenas requereram agora a dose de reforço para aceitar matrículas. 

    Os investigadores relembram ainda que “a vacinação em massa foi promovida como a forma de terminar a pandemia”, mas tal nunca sucedeu, porque a eficácia na protecção contra a infecção decai muito rapidamente.

    Neste contexto, estes investigadores consideram que vacinar jovens adultos com uma dose de reforço, se mostra antiético. Primeiro, porque ainda “não existe nenhuma análise formal de risco-benefício para este grupo etário”; segundo, porque “a imposição da vacina pode resultar num malefício acumulado superior aos benefícios para os mais jovens”; terceiro, porque a redução de infecções nos jovens por via vacinal não acarreta significativos benefícios para a sociedade; quarto, porque a obrigatoriedade da vacina “viola o princípio da reciprocidade”; e por fim, a obrigatoriedade de vacinação tem consequências sociais profundas.

    Em Portugal, a vacinação nunca foi obrigatória, mas a pressão política e mediática para os jovens adultos se vacinarem foi enorme ao longo do ano passado, tanto mais que o acesso a determinados locais esteve condicionado à apresentação de certificado digital.

    De acordo com os mais recentes dados da Direcção-Geral da Saúde (DGS), virtualmente toda a população com mais de 25 anos fez a vacinação completa, enquanto na faixa dos 18 aos 24 anos se atingiu os 98%. No entanto, o reforço (geralmente, a terceira dose) teve menor adesão: 67% receberam-na no grupo dos 25 aos 49 anos, descendo para apenas 54% entre os 18 e os 24 anos.

  • Evolução da pandemia: SARS-CoV-2 está agora muito mais transmissível, mas muitíssimo menos letal

    Evolução da pandemia: SARS-CoV-2 está agora muito mais transmissível, mas muitíssimo menos letal

    O PÁGINA UM pegou nos dados possíveis, aqueles poucos que o obscurantismo do Ministério da Saúde deixa escapar a contragosto, e revela como evoluiu a pandemia em Portugal, desde Março de 2020 até Junho de 2022. E mostra como não faz sentido andar a contar ondas (seis, dizem), e que é mais importante olhar para a forma como evoluíram as taxas de internamento e o risco de morte. E identifica ainda o momento exacto em que tudo mudou, para melhor: Novembro de 2021. Foi por causa das vacinas? Foi por causa da Ómicron? Não decida. Deixe a Ciência ter a palavra, embora seja conveniente que essa seja diferente daquela que maioritariamente se viu, desde 2020, a lançar “certezas” e conjecturar previsões à moda dos búzios e de relatórios-fantasma.


    A Direcção-Geral da Saúde (DGS) não responde nem comenta. O Ministério da Saúde luta, afincadamente, no Tribunal Administrativo de Lisboa para não ceder documentos e bases de dados, nomeadamente as do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE) e do Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO). As autoridades de Saúde e de Estatística manipulam dados, de sorte que o cruzamento da pouca informação disponível se mostra complexa ou mesmo impossível.

    Veja-se, por exemplo, o intencional desfasamento dos grupos etários em diversas bases de dados, para assim impedir o cálculos de indicadores epidemiológicos por entidades e pessoas independentes.

    person holding white plastic pump bottle

    E neste cenário, last but not the least, ainda tivemos a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) a expurgar, durante meses, a base de dados da Morbilidade e Mortalidade Hospitalar (BDMMH), por estar, a dita base de dados, a comprometer uma certa “narrativa oficial” sobre o desempenho oficial do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

    Entretanto, “regressou” a dita base de dados, há uns poucos dias, depois de muita pressão e denúncia do PÁGINA UM. Mas com dados estranhos, como a estranha diminuição abrupta dos internamentos e mortes hospitalares sobretudo nos últimos meses.

    Porém, acreditando que estamos perante dados oficiais credíveis – até prova em contrário ou admissão de “martelanço” –, a ressuscitada BDMMH permite, em cruzamento com alguns dados básicos da DGS relativos à covid-19, estabelecer uma evolução da pandemia em Portugal, desde Março de 2020 até finais de Junho deste ano, em diversos indicadores relevantes: incidência, risco de internamento, risco de morte (taxa de letalidade) e também de mortalidade hospitalar.

    Nesta análise deixaremos a mortalidade hospitalar associada à covid-19 para outra oportunidade.

    Uma questão relevante em Epidemiologia, sobretudo quando se trata de doenças causadas por vírus, é a assumpção de que um agente ou uma doença não são imutáveis. No caso do SARS-CoV-2, e pese embora todo o alarmismo que o rodeou – em que esteve sempre omnipresente o receio de sempre surgir uma variante pior do que a anterior, mesmo se a História mostrava o contrário noutras situações –, seria, na verdade, mais do que expectável que a sua transmissibilidade e letalidade do vírus evoluísse nestes dois domínios.

    E, nessa medida, a covid-19 de 2020 fosse diferente da covid-19 de 2021, e esta fosse diferente da covid-19 de 2022, até estabilizar numa fase endémica.

    Será que foi?

    Vejamos.

    Observando em detalhe a evolução mensal dos casos positivos – e sem prejuízo das sempre criticáveis políticas de testagem, que se tornaram um negócio –, mostra-se evidente que, do ponto de vista da incidência, e numa perspectiva holística, nunca se poderá falar de seis ondas – o número que a generalidade dos “especialistas”, políticos e imprensa contaram desde Março de 2020. Na verdade, nem cinco tivemos, nem quatro; quando muito, houve duas ou, no máximo, três.

    Evolução da incidência por mês (casos positivos) de covid-19 desde Março de 2020 até Junho de 2022. Fonte: DGS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Por exemplo, a dita “primeira onda” que começou em Março de 2020 e se estendeu até Maio daquele ano contou apenas um total de cerca de 33 mil casos, ou seja, pouco mais de 10 mil por mês. Ora, essa média mensal na, incorrectamente chamada, primeira onda é praticamente similar à média diária em Abril de 2022, o mês do primeiro semestre deste ano com menor incidência cumulativa.

    Se considerarmos os casos positivos de Janeiro de 2022 (cerca de 1,3 milhões), praticamente todos da variante Ómicron, verificamos também que foram em maior número do que os casos contabilizados em todos os longos meses em que dominaram as outras variantes.

    Nessa perspectiva, nem os surtos do Inverno de 2020-2021 – que se destacam dos períodos imediatamente anteriores e posteriores – se mostra comparável à verdadeira onda registada no primeiro semestre de 2022, onde cerca de 37% da população portuguesa foi “infectada”, o que dá uma média mensal de 6%. Só em Janeiro passado, chegou a mais de 12%.

    Nos 22 meses anteriores (desde Março de 2020 até Dezembro de 2021) tinha sido “infectada” cerca de 14% da população, dando assim uma média mensal de 0,6%. Mesmo as “infecções” registadas em Janeiro de 2021, que se destacou de todos os outros meses anteriores a 2022, somente “atingiram” 3% da população.  

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    Deste modo, mostra-se difícil defender agora a existência de mais do que duas ondas de “casos positivos” (Inverno de 2020-2021 e primeiro semestre de 2022), e quando muito três, se se admitir que no primeiro semestre de 2022 se conseguem identificar duas.

    A evolução da pandemia veio, na verdade, demonstrar que olhar para “ondas de casos” – ou “pandemia de testes”, como se chegou a chamar, com propriedade – foi um absurdo, uma vez que nunca houve nem uma correlação entre casos e internamentos nem entre casos e óbitos (entre internamentos e óbitos, já lá iremos…)

    De facto, observando a evolução do número de internamentos por mês atribuídos à covid-19, de acordo com a BDMMH, a mediana rondou os 1.800 – ou seja, em metade dos 28 primeiros meses da pandemia (Março de 2020 a Junho de 2022) nunca se ultrapassou aquele número. Por outro lado, a média mensal ficou um pouco aquém dos 2.500 internamentos.

    Se considerarmos a fasquia dos 3.000 internados, somente no período de Novembro de 2020 até Fevereiro de 2021 se registou um fluxo muito mais significativo de internamentos: acima dos 6.000 nos dois últimos meses de 2020 e acima dos 10.000 nos dois primeiros meses de 2021.

    Evolução do número de internamentos por mês por covid-19 desde Março de 2020 até Junho de 2022. Fonte: BDMMH / ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Nessa medida, a definirem-se “ondas de internamentos” (que significam, além de um indicador da agressividade do vírus, picos de pressão hospitalar), então apenas houve uma em Portugal: iniciada em Outubro de 2020 (2.312 hospitalizações) e que findou em Março do ano seguinte (2.760), tendo causado hospitalizações acima dos 6.000 internamentos em Novembro e Dezembro e atingido o auge em Janeiro e Fevereiro de 2021 (com mais de 10.000 internamentos em cada mês).

    A essa onda única sucedeu uma relativa estabilidade nos internamentos, quase indiferente aos casos positivos. No último ano com dados, entre Julho de 2021 e Junho de 2022, contabilizam-se seis meses com internamentos entre os 1.700 e os 2.000, havendo apenas dois meses (Janeiro e Fevereiro) excedendo aquela fasquia.

    Convém, contudo, salientar que Janeiro e Fevereiro deste ano tiveram uma incidência de infecções por SARS-CoV-2 cinco vezes superior ao período invernal homólogo do ano anterior (1,97 milhões de casos positivos vs. 384 mil)

    No caso da evolução da mortalidade, embora ainda seja necessário a DGS esclarecer muitos aspectos – por exemplo, a elevada fracção de óbitos registados fora das unidades hospitalares (8.549 mortes, no total) e o contributo de comorbilidades relevantes para a causa de morte –, a covid-19 foi efectivamente uma causa de morte muito relevante em determinados períodos, se comparada, por exemplo, com as doenças respiratórias “associadas” à gripe.

    Evolução do número de óbitos por mês atribuídos à covid-19 desde Março de 2020 até Junho de 2022 nos hospitais do SNS e fora dos hospitais. Fonte: DGS e BDMMH / ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM. Nota: A DGS indica os óbitos totais e a ACSS os óbitos apenas ocorridos nos hospitais do SNS; pela subtracção obtém-se os óbitos fora dos hospitais. Em dois meses (Abril e Maio de 2021), o valor indicado pela ACSS (hospitais) foi ligeiramente superior ao indicado pela DGS (total), daí o valor negativo para os óbitos fora dos hospitais.

    No início da pandemia (Abril de 2020), a mortalidade atribuída à covid-19 pode ser considerada bastante relevante por ser superior à expectável face à pneumonia, mas foi no período de Outubro de 2020 a Março de 2021 que a situação assumiu um cenário mais grave.

    Neste último período, a mortalidade associada ao SARS-CoV-2 foi, sem dúvida, anormalmente elevada, em especial nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2021, mesmo tendo em conta a estação do ano (Inverno). Em todo o caso, dever-se-ia encontrar uma explicação plausível para se contabilizarem, naqueles dois meses, respetivamente 2.557 e 1.066 óbitos fora de unidades hospitalares do SNS.

    Após Março de 2021, a mortalidade atribuída à covid-19 não deve ser considerada anormal do ponto de vista da Saúde Pública, se atendermos que esta doença veio “substituir”, em grande medida, uma parte das doenças respiratórias – sendo disso prova a redução abrupta e persistente dos internamentos e óbitos associados a pneumonias e outras doenças similares.

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    Comparando o primeiro semestre dos três anos de pandemia (2020-2022) com o primeiro semestre dos três anos imediatamente antes (2017-2019), as mortes por doenças do aparelho respiratório diminuíram 24% (14.445 vs. 22.567 óbitos, ou seja, menos 8.131 mortes).

    Os óbitos atribuídos à covid-19 no período invernal de 2021-2022 – um total de 3.554 mortes entre Novembro de 2021 e Março de 2022 – já não parecem assumir valores anormais, considerando o quase desaparecimento da época gripal (e das mortes a si associadas). A mortalidade nos meses seguintes pode classificar-se como elevada em função da época do ano, mas, como já referido, deveria ficar esclarecida se a elevada fracção de óbitos atribuídos à covid-19 que ocorreram fora dos hospitais do SNS não “inflacionou” os efeitos do SARS-CoV-2.

    Em todo o caso, a evolução dos números da mortalidade atribuída à covid-19 (em meio hospitalar e fora dos hospitais) apresenta tendência para estabilizar, em termos absolutos, desde Dezembro do ano passado.

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    Contudo, nos quatros meses em que se mostra possível comparar três anos sucessivos (Março a Junho), verifica-se que 2022 (já com vacinação plena, incluindo reforços, em quase toda a população “vacinável”) foi aquele com maior número de óbitos por covid-19 (3.063), contrastando com os 750 óbitos em 2021 (contudo, após o morticínio de Janeiro e Fevereiro) e com os 1.579 óbitos de 2020 (no início da pandemia).

    Esta análise da evolução dos casos positivos, das hospitalizações e dos óbitos serve, na verdade, sobretudo como base para a criação de indicadores epidemiológicos que, de forma simples, ajudam a demonstrar que a covid-19 não é hoje, em 2022, a mesma de “antanho”. E também permite aferir, à falta de transparência do Ministério da Saúde em disponibilizar dados discriminados do SINAVE e do SICO, os momentos-chaves da mudança.

    Em suma, identificar os períodos em que a covid-19 deixou de ser um problema de Saúde Pública.

    Um dos indicadores mais interessantes que deveriam ser disponibilizados pela DGS – e nunca o foram – é o do risco de internamento, para o qual basta uma análise fina aos dados do SINAVE, de modo a saber, em cada período, a probabilidade de um infectado ser hospitalizado.

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    Perante o lamentável obscurantismo da DGS – e a demora do Tribunal Administrativo em responder à intimação apresentada pelo PÁGINA UM –, pode-se, em todo o caso, “caçar com gato”, e estimar um valor próximo através do cálculo da razão entre internamentos e casos positivos (infelizmente, apenas para a população em geral, uma vez que os grupos etários para os casos são diferentes dos que se referem aos internamentos).

    Referia-se que existe um enviesamento neste indicador calculado desta forma – fazendo com que não constitua um risco efectivo de internamento –, porque existe um deferimento entre a infecção e o internamento (e a eventual morte). Deste modo, os infectados de um período podem ser os internados do período seguinte. Ora, apenas com o SINAVE se poderá apurar esse indicador com rigor.

    Colocadas estas premissas, mesmo assim o indicador que se calcular constitui uma aproximação bastante interessante da realidade, permitindo identificar cinco períodos distintos ao longo da pandemia.

    Na primeira fase da pandemia, até Agosto de 2020, o risco de internamento dos “infectados” (medido pelo número de casos positivos) foi relativamente elevado, sobretudo em Abril e Maio, quando se atingiu um risco de 14,2% e 18,6%, respectivamente. Neste último mês atingiu-se o valor mais elevado de risco de internamento ao longo de toda a pandemia, embora se deva considerar que, neste período, se optava pela hospitalização, por prudência, mesmo em casos não demasiado graves.

    Evolução do risco de internamento (internados por casos positivos, em percentagem) por mês por covid-19 desde Março de 2020 até Junho de 2022. Fonte: DGS e BDMMH / ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Depois deste período, o risco de internamento situou-se entre os 3% e os 6% no período de Setembro de 2020 a Janeiro de 2021, aumentando depois, num terceiro período, para 13,2% em Fevereiro de 2021 e para 15,9% no mês seguinte.

    Um quarto período começou em Abril – ainda de transição, com o indicador a baixar para 6,1% –, estendendo-se até Outubro de 2021, com o risco de internamento a variar entre os 2% e os 5%. Tendo em consideração que, neste período de Maio até Outubro de 2021, a taxa de vacinação abrangia já praticamente toda a população mais vulnerável (acima dos 65 anos), parece evidente advir daí uma redução no risco de internamento: foi de 2,8%, que confronta com os 5,6% do período homólogo do ano anterior (ainda sem vacina). Porém, dir-se-á sempre que essa redução do risco entre estes períodos homólogos (com e sem vacina) é de 50%.

    De facto, somente a partir de Novembro de 2021, e especialmente a partir do mês seguinte, o risco de internamento diminuiu fortemente. Em Dezembro do ano passado situou-se apenas nos 0,7% – ou seja, em cada 1.000 infectados, somente sete necessitaram de internamento –, estando assim pela primeira vez abaixo de 1%. Ao longo de 2022, este rácio esteve sempre inferior a 0,6%.

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    Pergunta-se: foi por causa da vacina ou foi a menor agressividade da variante Ómicron? – eis a questão dos milhões de euros que a pandemia ainda faz rodar em negócios.

    Certo é que, se for a vacina, os seus benefícios custaram muito tempo a chegar; se não tiver sido a Ómicron a constituir o game changer, então foi uma coincidência extraordinária as vacinas se terem tornado eficazes (em evitar o risco de internamento) no exacto mês em que aquela nova variante surgiu e se tornou rapidamente dominante (e muito mais transmissível).

    Em todo o caso, a evolução da pandemia, mesmo antes do surgimento da Ómicron, evidencia que as vacinas contra a covid-19 tiveram um efeito benéfico, embora temporário, na redução significativa da letalidade.

    Com efeito, e com similares premissas às que se apresentaram para o risco de internamento – e face à impossibilidade, por causa da política de obscurantismo da DGS, de analisar a evolução por faixa etária –, pode-se estimar também a taxa de letalidade global (para toda a população), através do cálculo do rácio óbitos por infectados em cada mês.

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    Esse indicador permite confirmar, atendível a estratégia de testagem, que a taxa de letalidade – ou o risco de morte em caso de infecção – foi bastante elevada (acima de 1%) até Março de 2021, com alguns períodos com valores preocupantes: Março a Maio de 2020 e Dezembro de 2020 a Março de 2021.

    A partir de Abril de 2021, a taxa de letalidade ficou sempre abaixo de 1%, o que apenas sucedera no primeiro ano da pandemia num curto período (Setembro e Outubro de 2020).

    Contudo, a partir de Abril de 2021 – com o processo de vacinação em “velocidade de cruzeiro” –, assistiu-se, aparentemente, a uma progressiva redução do efeito protector das vacinas. Isto porque a taxa de letalidade aumentou sensivelmente a partir dos meses de Junho e Julho daquele ano (0,23% e 0,30%, respectivamente) a atingir os 0,86% em Outubro.

    E eis que a seguir, repentinamente, baixou de novo, quedando-se nos 0,49% em Novembro, e depois ainda se reduziu nos meses seguintes. Ao longo de 2022, a taxa de letalidade da covid-19 variou entre os 0,08% em Janeiro e os 0,22% em Junho.

    Evolução mensal da taxa de letalidade (óbitos por casos positivos, em percentagem) por covid-19 desde Março de 2020 até Junho de 2022. Fonte: DGS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    Não havendo informação que permita, de forma expedita, calcular a taxa de letalidade por grupos etários, pode-se sempre dizer que para os mais idosos esse indicador será agora, certamente, inferior a 2%, quando nas primeiras fases da pandemia se situava nos 15%. Nos mais jovens continua irrelevante, porque sempre foi.

    Também para o risco de morte, a mesma pergunta: qual a causa desta favorável evolução? As vacinas – que começaram a ser administradas no final de Dezembro de 2020 e tiveram já vários reforços – ou a variante Ómicron, que surgiu exactamente na altura que a taxa de letalidade parecia ir disparar com a chegada do Inverno?

    Em tempos normais, a Ciência debateria essa questão de forma aberta, com base em hipóteses e com todos os dados (leia-se, informação oficial) em cima da mesa, sem truques, sem omissões sem necessidade de intervenção do Tribunal Administrativo para se aceder a informação oficial, sem tramoias de burocratas que “expurgam” bases de dados para satisfazer amigos governantes.

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    Mas, infelizmente, uma coisa esta pandemia nos demonstrou: a Ciência tornou-se maleável e submissa ao poder político, e, nessa medida, jamais desejará agora discutir abertamente alguns temas, que se tornaram tabu, porque comprometedores da sua independência e idoneidade.

    Quando se diz Ciência, estamos a falar dos cientistas que, por acção ou omissão, mandaram os seus princípios às malvas.

  • Metade dos óbitos atribuídos ao SARS-CoV-2 estão agora fora dos hospitais. Mortes são por ou com covid-19?

    Metade dos óbitos atribuídos ao SARS-CoV-2 estão agora fora dos hospitais. Mortes são por ou com covid-19?

    Apesar da elevada imunidade vacinal – por ser um dos países do Mundo com maior taxa de vacinação –, e também natural – por mais de metade da população ter tido contacto com o vírus –, Portugal apresentou nos últimos meses um número de óbitos muito mais elevado do que nos períodos homólogos de 2020 e 2021. Mas também ressalta uma percentagem absurda de óbitos atribuídas à covid-19 que se registaram fora das unidades hospitalares do SNS. A Direcção-Geral da Saúde não explica por que razão metade das vítimas da covid-19 dos últimos meses (que seriam, assume-se, casos graves desta doença) não mereceu tratamento hospitalar, morrendo aparentemente sem assistência médica adequada.


    Entre Março e Junho deste ano, metade dos óbitos atribuídos à covid-19 registados pela Direcção-Geral da Saúde ocorreu fora dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), de acordo com uma análise do PÁGINA UM, que cruzou dados oficiais da Direcção-Geral da Saúde (DGS) com a base de dados da Morbilidade e Mortalidade no Portal da Transparência, entretanto “ressuscitado” (ver N.D., em baixo).

    Esta situação recoloca assim mais dúvidas sobre se os certificados de óbito para os casos fora das unidades hospitalares fazem directa referência ao SARS-CoV-2 como causa de morte, ou se optam por outras causas mais relevantes e a contabilização para as estatísticas da covid-19 se devem apenas ao facto de as pessoas falecidas estarem com teste positivo ao coronavírus.

    person in white jacket wearing blue goggles

    Embora a percentagem de óbitos por covid-19 fora das unidades do SNS – por exemplo, em lares ou em residências – tenha sido sempre relevante desde o início da pandemia, e nunca explicado pela DGS, a informação retirada da mais recente versão da base de dados da Morbilidade e Mortalidade Hospitalar, gerida pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), mostra uma subida ainda mais inexplicável nos últimos meses.

    Esta situação pode indiciar um de dois problemas; ou ambos: os óbitos atribuídos à covid-19 estão exagerados, por incluírem mortes fora das unidades hospitalares sem mais qualquer diagnóstico para além de um teste positivo ao coronavírus; ou há doentes-covid em situação grave a morrerem fora dos hospitais sem tratamento devido.

    Óbitos atribuídos à covid-19 em Portugal por mês, com certificado nos hospitais e fora dos hospitais. Fonte: DGS e ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    De facto, uma elevada fracção de mortes atribuídas à covid-19 fora dos hospitais não é aspecto despiciendo, uma vez que a esmagadora maioria dos casos graves desta doença, que resultam em morte apresenta previamente um quadro clínico de insuficiência respiratória ou outros sintomas que recomendariam um internamento hospitalar.

    Por outro lado, recorde-se que esta doença foi considerada de elevadíssima infecciosidade.

    Portanto, coloca-se aqui saber se estas mortes se deveram mesmo à acção directa e letal do SARS-CoV-2 – e, portanto, uma elevada percentagem de doentes graves não teve apoio médico especializado que pudesse evitar a sua morte – ou se as mortes em causa ocorreram devido a outras comorbilidades relevantes e os óbitos acabaram por ser atribuídos à covid-19 apenas porque a vítima estava positiva naquela altura.

    Certo é que, estranhamente, a mortalidade atribuída à covid-19 pelas autoridades de Saúde tem estado bastante superior em 2022 face aos períodos homólogos de 2020 (quando não existiam vacinas e a população estava naive) e de 2021.

    Entre Março e Junho deste ano, a DGS diz terem morrido 3.063 pessoas por covid-19, enquanto no período homólogo do ano passado foram 720 e em 2020 atingiram os 1.036.

    Ora, mas se se descontar aos óbitos atribuídos à covid-19 pela DGS entre Março e Junho deste ano aqueles que foram observados nos hospitais – pela consulta da base de dados da ACSS –, constata-se que terão morrido 1.531 pessoas fora dos hospitais, ou seja, 50% do total. No ano passado, no período homólogo esse valor tinha rondado os 6,4% (48 óbitos) e em 2020 atingiu os 34,4% (543 óbitos)

    Ao longo da pandemia, o rácio óbitos fora / dentro do SNS foi sempre bastante variável, mas apenas esporadicamente alto em Maio de 2020 e no Inverno de 2020-2021, quando então os hospitais do SNS colapsaram, mas não tão persistente e elevado como em 2022.

    Aliás, em Maio passado, o PÁGINA UM já noticiara que até Dezembro de 2021 uma em cada três vítimas atribuídas à covid-19 tinha falecido fora dos hospitais do SNS, mas esse rácio ainda aumentou mais este ano.

    Evolução mensal da percentagem de óbitos atribuídos à covid-19 e ocorridos fora das unidades do SNS. Fonte: DGS e ACSS. Cálculos e análise: PÁGINA UM.

    A partir de Janeiro, somente em Março se registou uma percentagem de óbitos atribuídos à covid-19 fora do SNS abaixo dos 40%, chegando-se aos 57% em Junho (dos 999 óbitos, 429 ocorreram em hospital público e 570 fora dos hospitais públicos).

    Sobre estas matérias, o PÁGINA UM pediu comentários e esclarecimento à DGS, com conhecimento para o Ministério da Saúde, mas não obteve (ainda) qualquer resposta.


    N.D. O PÁGINA UM apresentou uma intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa contra a Administração Central do Sistema de Saúde por ter eliminado, e depois reposto de forma mutilada, a base de dados da Mortalidade e Morbilidade Hospitalar que constava no Portal da Transparência do SNS. Esta base de dados, que então tinha informação até Janeiro de 2022, servira para o PÁGINA UM publicar um conjunto de trabalhos de investigação sobre o desempenho do SNS durante a pandemia.

    Entretanto, sem sequer informar o PÁGINA UM, a AACS indicou ao Tribunal Administrativo de Lisboa que já repusera a base de dados da Mortalidade e Morbilidade Hospitalar no Portal da Transparência do SNS, indicando que o fizera no passado dia 12 de Agosto.

    Esta data, cuja prova da veracidade não foi apresentada, é em todo o caso posterior à notícia do PÁGINA UM a denunciar as ligações de amizade entre o presidente da ACSS, Vítor Herdeiro, e a ex-ministra da Saúde Marta Temido (12 de Julho), e à notícia sobre a apresentação das bases de dados “mutiladas” (5 de Agosto). Aliás, a ACSS apenas comunicou ao PÁGINA UM, por ofício de dia 4 de Agosto, que disponibilizara três bases de dados (as mutiladas), e nunca mais nada comunicou, e devia.

    O PÁGINA UM lamenta, aliás, a postura e a estratégia da ACSS, não apenas pela tentativa de persistir na mutilação (voltando agora atrás) como estar a convencer o Tribunal Administrativo de Lisboa de que toda a informação requerida foi disponibilizada (foi feito um pedido de inutilidade superveniente da lide). Não é verdade. O PÁGINA UM tinha também pedido à AACS “a consulta presencial e/ ou eventual cópia digital da Base de Dados Central do GDH (Grupos de Diagnósticos Homogéneos), bem como do denominado BI-MH (Bilhete de Identidade para a Morbilidade Hospitalar”, porque servirá para a aferir se os valores divulgados agora no Portal da Transparência são reais ou “martelados”.

    Como o PÁGINA UM revelará a partir de amanhã, pelo menos “estranhos” são.

    Saliente-se que os processos judiciais do PÁGINA UM, que têm constituído uma “frente de combate”em prol da transparência da Administração Pública, são financiados pelos leitores através do seu FUNDO JURÍDICO, que já envolveu 12 processos de intimação e uma providência cautelar.

  • Associação de médicos de Saúde Pública “lança-se nos braços” das farmacêuticas

    Associação de médicos de Saúde Pública “lança-se nos braços” das farmacêuticas

    Com a pandemia, a discreta Associação Nacional de Saúde Pública (ANMSP) foi ganhando projecção. Ricardo Mexia, presidente desde 2016, conseguiu com as suas aparições nos media alcançar um estatuto público que o ajudou a chegar a presidente da Junta de Freguesia do Lumiar. Já o seu substituto, Tato Borges, conseguiu algo que nunca tivera antes do cargo: já acumulou, desde Novembro, quatro apoios financeiros da Pfizer, incluindo uma viagem ao Canadá para um congresso. E a própria ANMSP está a atrair cada vez mais patrocínios do sector farmacêutico. A associação diz que está tudo dentro da lei e garante manter-se independente.


    Desde que assumiu a presidência da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública (ANMSP), Gustavo Tato Borges tem acumulado relações comerciais com a Pfizer, uma das farmacêuticas com maior facturação à conta da pandemia, através das vacinas Comirnaty e do antiviral Paxlovid.

    De acordo com a Plataforma da Transparência e Publicidade, este médico – que trabalha actualmente na Administração Regional de Saúde do Norte – não tinha qualquer registo de recebimento de financiamentos de farmacêuticas entre 2013 e finais do ano passado, mas tornou-se “apelativo” ao assumir a liderança desta associação há exactamente um ano, quando substituiu Ricardo Mexia, entretanto eleito líder presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, em Lisboa.

    Ricardo Mexia, à esquerda, durante o último congresso da ANMSP em Novembro do ano passado, em Amarante.

    Tato Borges, que era então vice de Mexia, começou a capitalizar o interesse da Pfizer, que lhe pagou 1.000 euros por um dia de consultadoria. Este ano, entretanto, a farmacêutica norte-americana consolidou a parceria com o médico, por três ocasiões: primeira, no 15º Encontro Pfizer Vacinas, que se realizou em 7 e 8 de Maio em Tróia, no valor de 553 euros; segunda, por uma palestra no Encontro Pfizer 2022, no valor de 1.000 euros; e a terceira, mais substancial: um cheque de 5.757 para custear a participação num congresso internacional de doenças pneumocócicas entre 19 e 23 de Junho na cidade canadiana de Toronto.

    Mas não tem sido só pessoalmente Tato Borges a beneficiar deste interesse da Pfizer. Também a ANMSO – criada em 1987 e que mantém a sua sede na Ordem dos Médicos, na Avenida Gago Coutinho, em Lisboa – tem começado a ser olhada com maior interesse pela indústria farmacêutica, sobretudo as empresas com interesses comerciais em redor da pandemia.

    Exemplo paradigmático foi o último congresso desta associação, que se realizou em Novembro do ano passado em Amarante: contou com o apoio financeiro da Merck Sharp & Dohme (produtora do antiviral molnupiravir), Pfizer (vacina e antiviral Paxlovid), Gilead (antiviral remdesivir), Johnson & Johnson (vacina, através da subsidiária europeia Janssen) e Roche (esta a única sem interesses relevantes no combate ao SARS-CoV-2).

    Tato Borges começou a facturar da Pfizer logo a seguir a assumir a presidência da ANMSP. Uma “coincidência”, diz a associação.

    Entre este congresso e pagamento de outros eventos – como seja em concreto o pagamento de 7.800 euros para uma acção descrita como “Apoio realização de trabalhos no âmbito da vacinação” (sic) –, a ANMP recebeu no ano passado 17.800 euros. Já contabilizados este ano encontram-se apoios da AbbVie (11.070 euros), da Janssen Cilag (3.000 euros), Merck Sharp & Dohme (10.990 euros), Pfizer (8.000 euros), Gilead (3.690 euros) e Roche (5.000 euros).

    Em oito meses de 2022, a ANMSP já recebeu assim 41.750 euros, um valor que contrasta com montantes muito mais modestos no primeiro ano da pandemia (15.900 euros, em 2020) e sobretudo antes da pandemia: entre 2013 e 2019 somente conseguiu “atrair” da indústria farmacêutica um total de 11.530 euros, uma média de 1.650 euros por ano.

    Contactado por e-mail pelo PÁGINA UM, Tato Borges respondeu através da Direcção da ANMSP, em que esclarece que “os apoios recebidos da indústria farmacêuticas estão enquadrados em normativos legais definidos para promover a transparência”, vincando ser esta associação uma “sociedade científica privada e independente”.

    Agradecimento na página do Facebook da ANMSP aos parceiros que financiaram o seu congresso, entre as quais quatro farmacêuticas com fortes negócios em redor da pandemia.

    Quanto ao facto de os apoios financeiros da Pfizer a Tato Borges terem começado a fluir apenas após o início da liderança da associação, a ANMSP diz tratar-se de uma “coincidência e [que] qualquer leitura para além desta é falaciosa”.

    A ANMSP diz também que os apoios da Pfizer atribuídos a Tato Borges como médico, e não como dirigente associativo, “não condicionam a sua actividade profissional ou associativos, nem têm impacto nas actividades desta associação”.

    Em todo o caso, saliente-se que Tato Borges tem sido particularmente activo na defesa de medidas não-farmacológicas contra a covid-19, como o uso de máscaras na actual fase endémica do vírus, e tem contribuído para a manutenção de uma tensão de permanente alarme, nomeadamente na população estudantil, onde em Portugal a covid-19 jamais foi um problema de Saúde Pública. 

    Recorde-se que, no nosso país, morreram sete pessoas com menos de 25 anos (que representam cerca de 2,5 milhões de habitantes) por covid-19, a última das quais em Janeiro deste ano (uma jovem entre os 15 e os 24 anos).

    E saliente-se ainda que, na sua resposta ao PÁGINA UM, a ANMSP diz ainda que “não pode deixar de lamentar que o Sr. Jornalista [Pedro Almeida Vieira] tenha procurado esclarecimentos no próprio dia em que vai publicar uma determinada matéria, pois isso revela que não pretende esclarecer estes assuntos, mas sim poder afirmar que as entidades foram questionadas e não responderam, sem intenção de apurar a verdade”.


    N.D. Efectivamente, o PÁGINA UM enviou um e-mail às 01:14 de hoje para a ANMSP, e um segundo e-mail para o endereço profissional de Tato Borges pelas 09:42 horas, onde além das questões se referia o seguinte: “Alerto que, independentemente dos seus esclarecimentos, que desde já muito agradeço, e uma vez que estamos perante factos públicos, escreverei sobre esta matéria nesta terça-feira.” A resposta da ANMSP chegou às 10:52 horas, e obviamente foi incluída, por ter sido sempre esse o objectivo inicial.