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  • A instrumentalização da empatia para justificar a insanidade

    A instrumentalização da empatia para justificar a insanidade

    A empatia é, sem dúvida alguma, um valor humano extremamente nobre e valioso. É ela que nos faz “calçar” os sapatos do outro, sentir compaixão pelo sofrimento alheio e, em última instância, ter vontade de ajudar aqueles que precisam. E, verdade seja dita: ninguém passa pela vida incólume e sem necessitar, em diversos momentos, do conforto de uma mão estendida. Razão ainda maior para que todos sejamos empáticos com outros problemas que não os nossos, e tenhamos bondade para querer para atenuar o sofrimento colectivo – dentro daquilo que esteja ao nosso alcance, evidentemente.

    Porém, tal como tudo, por muito louvável que possa ser um sentimento ou um valor, jamais deverá ser levado a um extremo que resulte na perda de bom senso e até na loucura.

    women forming heart gestures during daytime

    Este é precisamente o motivo pelo qual, por muita empatia que possamos ter por um sem-abrigo, não nos vamos endividar para lhe proporcionar uma casa. Nem sequer dar-lhe toda a comida que temos na despensa – ou, fazer sacrifícios que nos prejudiquem e coloquem a nossa família numa situação vulnerável, apenas para que nada falta ao sem-abrigo.

    De igual modo, ninguém no seu perfeito juízo irá ceder a sua casa a alguém que durma na rua para substituir um sem-abrigo por outro. Nem tão pouco, manter-se em sua casa mas lotá-la com todas as pessoas necessitadas com que se vai cruzando pelas ruas – certamente que a esmagadora maioria não o faz, nem tal coisa lhe passaria pela cabeça.

    E porquê? Porque não é sensato! Tentar colmatar sofrimento com mais sofrimento não é ser empático; é ser simplesmente louco. Ou seja: levada ao seu cúmulo, a “empatia” far-nos-ia cometer as maiores loucuras para salvar o mundo inteiro! Mas nós não somos super-homens nem super-mulheres – somos apenas seres humanos.

    person in black jacket raising right hand

    A maior parte das pessoas nem sequer emprestará dinheiro a um amigo em dificuldades, ou irá emprestar torcendo muito o nariz! E estão erradas? Não! Porque na realidade, todos nós, no fundo, temos perfeita consciência – por muito virtuosos e ‘bonzinhos’ que nos queiramos achar – que aquilo que podemos dar a outrém tem limites; e é insano extravasar esses limites, encetando determinados esforços e sacrifícios por alguém quando tem de ser o próprio a fazê-los.

    E todos sabemos que, embora a ajuda e a cooperação sejam sempre necessárias na vida, nunca se podem substituir aos esforços que cada um tem envidar por si próprio.

    Deste modo, se é verdade que um bom coração saberá quando estender a mão, uma boa cabeça saberá quando não o fazer. E um coração sem cabeça não faz um corpo.

    É este o problema fundamental a que assistimos hoje no mundo Ocidental; a doença que o está a destruir: a instrumentalização da empatia e do nosso lado mais generoso para nos levar ao suicídio. Esta tem sido a dialéctica dominante – ainda mais perversa e diabólica, porque nos manobra e manipula dizendo-nos que só assim seremos “boas pessoas” – na praça pública; imposta pela imprensa, governo, União Europeia, e demais organizações supranacionais. Vimo-lo com a covid-19, mas está a acontecer, às claras, com muitas outras ‘crises’.

    people walking on train station during daytime

    Os interesses concertados querem que o Ocidente se mate (não tão metaforicamente quanto isso), para ser comido de cebolada pelos “coitadinhos”. E como? Através da aceitação desta imigração massiva e descontrolada, de ajudas financeiras astronómicas para países que sofrem ou que estão em guerra, ou outras psicopatias que os nossos ‘overlords’ em Bruxelas nos queiram impôr do alto da sua torre de marfim. Tudo isto, enquanto os europeus definham, dia após dia, e caminham alegremente para o precipício, incautos e de olhos vendados. E com a deterioração da qualidade de vida e da segurança a ocorrer a uma velocidade estonteante.

    Felizmente, parece haver cada vez mais gente a acordar – veremos se a tempo de evitar o suicídio do Ocidente!

    Maria Afonso Peixoto


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  • Em defesa do livro ‘Identidade e Família’

    Em defesa do livro ‘Identidade e Família’

    Depois do famigerado logotipo, a polémica desta semana foi o lançamento do livro Identidade e Família, promovido pelo Movimento Acção Ética e apresentado esta segunda-feira pelo ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. Todo este alvoroço serviu, entre outras coisas, para evidenciar as incoerências, contradições e acrobacias argumentativas de muitos críticos para quem, pelos vistos, só as opções de vida alinhadas com a agenda LGBT merecem ser promovidas e celebradas.

    Tendo lido o livro, creio que poderá ser sumarizado, em poucas palavras, como um comovente tributo à família. Em particular, sim, à dita família tradicional ou natural. Quem alega não saber o que isso é, deverá ter as suas dúvidas dissipadas se tentar formar uma família biológica sem o recurso à ciência moderna. Muito provavelmente, não vai conseguir. Contudo, ao que parece, nos mui interessantes tempos que correm, os esclarecidos são aqueles que negam a biologia, e os “chalupas” são aqueles que aceitam os seus pressupostos.

    A este respeito, as críticas à ideologia de género plasmadas no livro foram usadas para afirmar que esta obra se baseia no ódio e no preconceito. Não é o caso; pelo contrário. É, sim, uma obra assente no amor, que celebra e defende uma instituição que é a célula-base da sociedade, e que, por isso, se reveste da maior importância. Como seria de esperar, porém, serviu de fermento para o azedume e a hostilidade arraigadas contra aquilo que jornais de referência como o Expresso apelidam de direita ultraconservadora.

    O elogio e a promoção dos laços familiares tradicionais constituem hoje um discurso extremista, reacionário, fascista; enfim, perigoso ao ponto de representar um retrocesso civilizacional até à Idade da Pedra. Por outro lado, os mesmos epítetos não foram aplicados à meia dúzia de activistas – assim os denomina a imprensa mainstream – que protestaram à porta da livraria Buchholz durante a apresentação do livro, de bandeiras LGBT em punho e entoando as palavras de ordem “Morte aos Fascistas”. Estes terríveis fascistas a quem se desejava a morte, seriam, claro, todos aqueles que subscrevem o conteúdo do livro – tanto os que se encontravam dentro da livraria, e os outros.

    Vimos diversas críticas e reacções indignadas em relação ao livro. Alguns, querem convencer-nos de que a família é uma instituição ultrapassada, démodé, como se se tratasse de uma tendência sazonal que agora devemos descartar. Pretender que uma aspiração tão natural e visceral como a formação de família é algo datado é tão absurdo como dizer que necessidades básicas como comer e dormir também já estão gastas.

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    Muitos, dizem que a família natural não existe, e que qualquer conjunto de espécimes humanas e não-humanas pode configurar uma família, e que afirmar o contrário é retrógrado e bafiento. Eis o que já cheira a bafio: esta tentativa incessante de desfigurar a família e aniquilar os valores tradicionais. Uma intenção que não é de agora, mas que tem ganhado terreno através de uma profusão de ideias que levam ao extremo aquilo que o liberalismo tem de pior, resultando num individualismo e hedonismo doentios em que o homem e o seu desejo são a medida de todas as coisas.

    Há quem considere disparatado o desígnio da obra, e troce de alegações de que há uma guerra aberta contra a família. Ironicamente, a urticária generalizada que o livro causou comprova, precisamente, a sua pertinência e necessidade. Afinal, por que carga de água este livro seria tão polémico, se não existisse uma aversão e desejo de repressão dos valores tradicionais e à dita família natural?

    Os militantes woke asseguram-nos sempre, aliás, que não há razões para temer a defesa dos direitos da comunidade LGBT porque estes em nada prejudicam os demais membros da sociedade. Aplicando o mesmo raciocínio, porque se sentem tão incomodados com a mesma liberdade de todos os não-membros da comunidade LGBT para fazer apologia do seu modus vivendi? Parece que, afinal, só acham válido celebrar as suas próprias escolhas e estilos de vida – as pessoas conservadoras e tradicionais não têm direito a exibir orgulho pelas suas opções. Ensinar ideologia de género nas escolas não é doutrinar, dizem-nos, numa espécie de gaslighting. Mas é quem o diz, que agora entrou num pranto pela disseminação de ideias diferentes das suas, vistas como perigosas e prejudiciais.

    Embora uma certa “direita” – ou, talvez, que se identifica como direita –, tentando pôr água na fervura, tenha logo vindo acautelar que o livro não tem como co-autores apenas pessoas de uma ala mais conservadora ou religiosa, este tipo de argumentos é ceder à ‘cultura de cancelamento’ vigente. O fundamental é admitir que, sim, o livro apresenta opiniões bastante zelosas dos laços familiares tradicionais, e que essas posições são mais do que legítimas e não devem ser censuradas ou conspurcadas do debate público.

    Foi também divertido ver alguns críticos da obra a lembrar que hoje há muitas famílias monoparentais, fragmentadas, refeitas, e todos os obstáculos financeiros ou sociais que as famílias enfrentam. Mais uma vez, esta observação só reafirma a importância de se proteger e fomentar uma cultura mais amiga das famílias e propícia à criação de vínculos familiares fortes. O cenário actual em que se revela cada vez mais difícil manter uma família coesa é resultado, precisamente, da perda de valores que este livro tenta denunciar.  

    Por fim, são dignos de louvor todos os nomes que contribuíram para o livro, e que tiveram a coragem de se expor nestes tempos sombrios em que contrariar as convenções politicamente correctas torna o herege alvo de apedrejamento público. Ficou comprovadíssimo que estas iniciativas são necessárias e urgentes, como pão para a boca.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • 10 de Março: uma oportunidade para despolarizar

    10 de Março: uma oportunidade para despolarizar

    O resultado das eleições de 10 de Março não deixou ninguém indiferente. O grande vencedor das eleições foi o Chega, que, para além de ter passado de 12 para 50 mandatos, contribuiu para uma surpreendente redução da abstenção. Pessoas que nunca tinham sequer votado, ou que não votavam há muito, sentiram-se mobilizadas pelo partido de André Ventura. Nestes casos, contam-se muitos jovens, que, saturados com a situação do país, depositaram no Chega a sua fé numa mudança.

    Agora, o futuro afigura-se imprevisível, mas se há efeito que devia brotar destes resultados eleitorais, é este: o travar de um discurso que insiste numa visão maniqueísta e simplista, onde os eleitores do Chega são perigosos fascistas, reacionários, ou estúpidos. No contexto actual, a ideia de que quase 1.200.000 portugueses votaram no Chega porque são antidemocráticos é demasiado curta, preguiçosa, e ignora a heterogeneidade deste universo de votantes.

    Por vezes, vemos também uma postura elitista e sobranceira que pretende diminuir os eleitores do Chega, e a sua inteligência, apelidando-os de ignorantes e boçais. Os arautos da inclusão terão, afinal, algum preconceito para com as camadas menos letradas da população?

    Muitos consideram ingénuo acreditar que o Chega será a mudança que diz ser para o país, e de facto, até agora, temos poucos motivos para crer que o partido de André Ventura terá qualidades superiores aos partidos que nos têm governado. Contudo, aplicando-se o mesmo raciocínio, não deveria chamar-se com o mesmo fervor de incautos aos milhões de portugueses que continuam a votar no Partido Socialista [PS], depois de anos a fio de fraca governação?

    É até muito mais lógico confiar o voto a quem ainda não tem “cadastro”, do que a um partido, ou a um “bloco central” que, de forma reiterada, já deu provas de que não o merece. E, embora tenha perdido muitos dos votos obtidos em 2022 – cerca de meio milhão -, o PS nem sequer foi fortemente penalizado nestas eleições. A sua desvantagem em relação à Aliança Democrática foi tão exígua que, se o PSD não tivesse concorrido em coligação com o CDS-PP, provavelmente Pedro Nuno Santos seria dado como vencedor – pelo menos, pondo de parte o assinalável crescimento da direita. Ora, como é que os eleitores socialistas podem merecer a complacência daqueles que condenam quem dá um voto de confiança a quem nunca governou?

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    Quase duas semanas depois das eleições, há alguns efeitos visíveis. Há quem se mostre agora mais disposto a tentar compreender o ponto de vista de quem pensa, e vota, num sentido diferente, e a dialogar e a criar pontes. Outros, infelizmente, parecem agarrar-se com o mesmo – ou ainda mais – afinco a uma visão dicotómica do mundo, em que de um lado estão os bons, e do outro os maus.

    Para estes últimos, não deveria ser difícil perceber os motivos que levaram ao crescimento do Chega, que são mais que muitos, e até legítimos, por muito que lhes seja confortável enterrar a cabeça na sua ideologia e recusarem-se a ver óbvio. É evidente que os eleitores do Chega não são criaturas temíveis e medonhas, que devemos enxotar a todo o custo. Muitos, talvez a maior parte, são pessoas normais, insatisfeitas (e quem pode estar satisfeito?), que viram neste partido uma possibilidade de inversão de rumo. Se viram bem, é discutível. Mas, então, que se discuta, e se debata, com mais abertura e respeito mútuos, e menos chavões e epítetos ocos.

    Também é pertinente reflectir sobre a vitória do Chega dada pelos emigrantes, e que nada tem de paradoxal, incoerente ou hipócrita, sabendo nós que estes portugueses foram obrigados a emigrar, precisamente, devido às políticas do centrão. É, pois, natural que tenham batido com o pé, votando no partido que se diz antissistema. Além disso, a forma lamentável como o Partido Socialista tem (des)tratado os emigrantes teria de ter consequências. O contrário é que seria de estranhar.

    Finalmente, se queremos combater esta cultura de trincheiras, é preciso reprovar a atitude antidemocrática e deplorável de um outro vencedor destas eleições: o Livre. Rui Tavares, arrolando os argumentos mais mirabolantes, tentou fazer tábula rasa do voto de mais de um milhão de portugueses, conspurcando o partido de André Ventura como se este não contasse para nada. Mostrou a essência do seu partido: um lobo em pele de cordeiro, porventura o mais perigoso à esquerda, de tão cínico e dissimulado.

    Sempre debitando palavras vãs e evocando a defesa da democracia, esta esquerda dita “moderada”, “fresca” e “cosmopolita”, revelou-se o seu oposto. Engendrando uma bizarra e sinistra teoria ao melhor estilo democrático, numa espécie de “vamos a eleições até que a esquerda consiga maioria para governar”, Rui Tavares comprovou que de democrático, tem pouco, e de divisivo, tem muito.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • Campanha eleitoral ou circo?

    Campanha eleitoral ou circo?

    Seja qual for o resultado das eleições legislativas de 10 de Março, o fim deste período pré-eleitoral só poderá fazer-nos respirar de alívio. Depois do sufrágio, dificilmente poderemos cair num cenário mais deprimente do que aquele que temos vivido por estes dias.

    Tem sido penoso ver como a desonestidade assaltou o ‘combate’ político e tomou a democracia como refém, sem pejo nem vergonha. Este jogo do “vale tudo” em que a política portuguesa se tornou só nos pode entristecer e fazer questionar sobre como chegámos a este ponto. Não há margem para dúvidas: batemos mesmo no fundo. 

    Desde logo, assistimos a um desfile de “debates” – já bastante criticados – entre os partidos com assento parlamentar, que de pouco servem, para além de ocas acusações mútuas e ‘soundbites’ com fartura. Depois, vimos, nos principais órgãos de comunicação, jornalistas e comentadores cativos a avaliar a ‘performance’ dos candidatos, dizendo de sua justiça sobre quem ganhou ou quem perdeu. Quem ganhou, será sempre discutível, mas quem perdeu, é claro: todos nós, eleitores.

    Há quem argumente que mais vale ter debates de 25 minutos do que não ter qualquer debate, e mostram-se optimistas com o elevado número de espectadores, referindo que poderá indiciar um maior interesse e envolvimento dos cidadãos com a política. Discordo. Já nas últimas legislativas tivemos este modelo de “debates”, bastante bem-sucedido a nível de audiências, mas que nem por isso se reflectiu numa redução significativa da abstenção.

    Muitos assistem a estes ‘duelos’ como se fosse uma espécie de concurso ou reality show. Tornou-se um espéctaculo e mero entretenimento, parecendo apenas interessar ver quem “arrasa” o adversário – e não necessariamente quem apresenta melhores argumentos ou ou mostra maior credibilidade nas propostas.

    Para nós, espectadores, e não eleitores, só faltavam entregarem-nos pipocas para o deleite ser completo; não interessa já a política na sua essência pura e dura, mas sim a dopamina gerada por ver quem atiça mais o oponente, atira as maiores ‘larachas’ ou levanta mais a voz ou interrompe com mais frequência. Posto isto, tenho dúvidas de que a generalidade das pessoas fique mais esclarecida depois de um debate deste tipo.

    Também é condenável que alguns candidatos tenham conseguido mais tempo de antena do que outros. Queimaram os já escassos minutos de que dispunham com acusações e gritaria, e assim, foi-lhes concedido pelos jornalistas tempo extra. O mínimo que se exige, neste modelo já de si absurdo, é que, pelo menos, as regras sejam iguais para todos. O candidato perdeu tempo com miudezas? Paciência; se ficar alguma coisa por dizer, a responsabilidade é sua.

    No final de tudo isto, o balanço só pode ser negro. Decerto que a maioria dos portugueses sabe de cor que Rui Tavares tem os filhos numa escola privada, que a Mariana Mortágua tem uma avó que entrou em “sobressalto” com a Lei Cristas, e que Luís Montenegro, na ‘visão’ de Inês Sousa Real, é um ‘machista’ porque a interrompeu (os candidatos masculinos que interromperam os seus oponentes serão machistas também por isso?), mas quantos terão assimilado, pelo menos, uma mão cheia de medidas, para cada partido?

    E se os líderes dos partidos com representação parlamentar merecem avaliações, seria também pertinente atribuir também notas aos jornalistas moderadores – alguns, puseram questões de pouco interesse público, e contribuem sobremaneira para que os debates, já mauzinhos, fossem ainda piores.

    No meio disto, fomos ainda brindados com as presenças de líderes partidários nos programas da manhã e da tarde das televisões, mostrando uma empatia e simpatia que tresanda a artificial, numa tentativa de assacar mais uns votos ao eleitorado mais velho. Uma tristeza.

    Igualmente tristes são os argumentos esgrimidos, da esquerda à direita, tanto nos debates como nos pós-debates, que quase se resumem, em muitos casos, a slogans vazios e chavões, ou ainda a uma disputa sobre quem é o mais extremista.

    Pedro Costa, presidente da junta de freguesia de Ourique e filho de António Costa, ainda esta semana, acusou Luís Montenegro de um ter discurso de extrema-direita. E porquê? Porque o líder social-democrata disse – espantem-se – , que embora os imigrantes sejam necessários e bem-vindos, Portugal deve continuar a ser português. Acaso diria Pedro Costa o mesmo do presidente de Angola, se João Lourenço defendesse que Angola deve continuar a ser angolana? E de Xi Jinping, se dissesse o mesmo da China? É grave que se desça tão baixo, e que se passe, de forma tão flagrante, um atestado de estupidez a todos nós.

    Já os nossos ‘entertainers’ de serviço, como Ricardo Araújo Pereira, ocupam-se com as declarações de Gonçalo da Câmara Pereira. O líder do Partido Popular Monárquico serviu de arma de arremesso da ‘esquerda’ para disparar contra à direita, que usou e abusou deste fait divers. Um líder partidário que não tomará sequer parte do Governo, não deveria encimar a nossa lista de preocupações. Mas muitos mordem o ‘isco’ e despendem tempo a cogitar sobre o presidente do PPM, em vez de dedicar atenção àquilo que fará, de facto, diferença nas suas vidas.

    Nesta cacofonia nos media tradicionais salva-se, e surpreendentemente, a internet. Com todos os seus defeitos, é graças às plataformas digitais que podemos ter acesso a entrevistas mais demoradas, vídeos mais elucidativos, e aos próprios programas dos partidos políticos.

    A este respeito, o PÁGINA UM, aliás, destaca-se por ter sido o único jornal a conceder espaço e voz iguais a todos. Ao contrário de todos os outros órgãos de comunicação social, não contribuímos para um simulacro de democracia que, qual jogo viciado, ao dar palco aos mesmos de sempre, faz com que nada mude. A imprensa tem, por isso, muitas culpas no cartório, quando à deterioração da democracia. Ainda assim, depois, cinicamente mostram-se apreensivos com a ascenção de forças extremistas e antidemocráticas.

    Se tivéssemos apenas os media convencionais para nos esclarecer neste período eleitoral, estávamos desgraçados.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • Quem semeia ventos, talvez colha tempestades

    Quem semeia ventos, talvez colha tempestades

    O ainda ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, parecia ser uma das maçãs menos ‘podres’ deste Governo e deste Partido Socialista. Conciliador e diplomático, sempre aparentou, pelo menos, respeitar as classes profissionais sob sua tutela; contrastando, por exemplo, com as figuras do ministro da Educação, João Costa, e da ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, que, se não ‘desprezam’ os ‘seus’ professores e os ‘seus’ agricultores, então disfarçam muito bem.

    Infelizmente, José Luís Carneiro manchou essa imagem, e é agora protagonista de uma guerra (aberta) entre as forças de segurança e o Governo. Depois das supostas baixas médicas ‘fraudulentas’ apresentadas por alguns polícias, que levaram ao cancelamento do jogo Sporting-Famalicão no sábado, o ministro da Administração Interna tornou-se mais papista que o Papa.

    Para além de lhes dar um valente ‘raspanete’, acusou as forças de segurança de “insubordinação” e anunciou a abertura de um inquérito pela Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI). Contudo, antes de o ministro se pronunciar publicamente no domingo, já o Governo havia qualificado a situação como uma “insubordinação gravíssima”.

    Esta resposta do Governo – uma óbvia demonstração de força e autoridade – foi aplaudida; sobretudo, depois de o presidente do Sindicato Nacional da Polícia (SINAPOL), Armando Ferreira, ter dito, na SIC Notícias, que as legislativas de 10 de Março poderiam estar em risco se as forças de segurança repetissem o feito. Vozes preocupadas se levantaram, com alguns a verem neste alerta uma ameaça de “golpe de estado” e uma insurreição.

    Toda esta tensão começou (e escalou bastante) em Novembro passado, sobretudo depois de o Governo ter aprovado um suplemento de missão às carreiras da Polícia Judiciária, discriminando a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana. Agora, embora se valide o descontentamento das polícias, diz-se que os seus protestos têm de manter-se dentro da legalidade. Ou, por outras palavras: ‘podem espernear à vontade, desde que não incomodem’. Ou seja, desde que as manifestações de descontentamento sejam inócuas e não sirvam para nada – tal como, de resto, têm sido quase todas, nesta encenação de democracia.  

    Temos o direito a descer à Avenida da Liberdade ao sábado à tarde, de cartaz em punho; tudo o resto é ‘extravasar’ os limites da legalidade.

    Sobre a possibilidade de um ‘boicote’ às eleições legislativas, António Costa, que nos lembra um daqueles companheiros tóxicos e manipuladores que nos acusa daquilo que faz, logo disse acreditar que “jamais as forças de segurança perpetrariam um ato tão grave de traição à nossa democracia”.

    Porventura, o mesmo não está garantido para o caso do nosso (ainda) primeiro-ministro. Depois destes últimos oito anos de governação, António Costa só poderá ficar para a História como um líder que deixou o país de joelhos e escorraçou a democracia.

    A revolta e a contestação que se inflamam e alastram a várias classes profissionais são prova de que os protestos das forças de segurança não são a ameaça à democracia que nos deveria preocupar. Se há alguém que tem faltado ao país, e que por isso poderia ser acusado de ‘insubordinação’, é este Governo socialista. Pois se é verdade que as forças de segurança devem estar ao serviço da Nação, não é menos verdade que o chefe de Governo foi eleito para servir e defender o povo. E, nesta tarefa, falhou reiteradamente.

    Concorde-se ou não com os protestos da polícia, há um crédito a ser-lhes dado: fizeram tremer o poder, ao contrário de outras formas de luta inúteis, que muitas vezes prejudicam mais os cidadãos do que os governantes. As polícias atingiram o poder onde dói, pondo seriamente em causa a autoridade do Governo. Mostraram, assim, que o seu poder é frágil e pode ruir como um castelo de cartas, num ápice e pela acção de apenas uma dúzia de pessoas.

    E esta é a razão para a resposta tão ‘musculada’ do Ministério da Administração Interna, com ameaças de processos disciplinares e até mesmo criminais.

    Entretanto, alguns agentes da Unidade Especial de Polícia que também apresentaram baixa médica no fim-de-semana (porém, sem o mesmo desfecho do jogo Sporting-Famalicão) já começaram a sofrer represálias, e correm agora o risco de não terem os seus contratos renovados.

    A reacção do primeiro-ministro e do ministro da Administração Interna não só expôs a sua prepotência, como evidenciou uma falha de julgamento e de entendimento da História. Indiferentes à revolta que se avoluma, optaram por ter mão firme, quando deviam ter-se redimido. Em vez disso, atiraram mais achas para a fogueira, esquecendo-se que quem semeia ventos, colhe tempestades.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • Ironia do destino: os acríticos aprenderam a criticar os media

    Ironia do destino: os acríticos aprenderam a criticar os media

    Muitos jornalistas e activistas ‘antifascistas’ parecem ter sido subitamente assaltados por um aguçado espírito crítico em relação à imprensa mainstream. E quem é o responsável por este milagroso despertar do torpor em que estavam mergulhados? O Chega.

    Por estes dias, temos assistido a uma indignação galopante contra alguns canais de media, acusados de indirectamente ‘levar ao colo’ o partido de André Ventura já que lhe dedicaram uma desmesurada atenção e espaço. Mesmo que, confesso, não seja eu uma telespectadora suficientemente assídua para confirmar a justeza deste argumento, até dou de barato que haja razão. De qualquer modo, esse aspecto não me parece ser relevante para uma discussão séria.

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    O ponto a salientar é outro, e bastante simples: aqueles que não disseram uma palavra sobre a vergonhosa cobertura mediática feita em torno da pandemia, agora já põem em causa os critérios daquilo que se revela ou não como uma notícia. De repente, parece que os críticos perceberam como o gatekeeping, a selecção das matérias tratadas pelos media, pode ser duvidosa e obscura.

    Por isso, é legítimo perguntar: em que mundo têm vivido estas pessoas para não se terem apercebido de que 70% ou 80% – estou a especular nos números, mas entendam a ordem de grandeza – daquilo que sai nos media serve para encher chouriços e esvaziar cabeças?

    Acordaram agora para a realidade do ‘soundbite’ e do fútil? E o que se segue para estes novos combatentes do populismo noticioso: vão aderir às tais “teorias da conspiração” propaladas pelos supostos “chalupas” de que, afinal, sempre é verdade que os media estão comprados, que é tudo propaganda? Há quem lhe chame ironia do destino.

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    A hipocrisia destes novos ‘questionadores’ é gritante. Recordemos, por exemplo, o período da pandemia. Muitos revoltados com a miserável e nada isenta cobertura jornalística, lançaram ataques ferozes sobre a imprensa – alguns até físicos, como aconteceu nos Estados Unidos e no Reino Unido, com protestos junto das instalações de canais como a CNN e a BBC. Os próprios media, nacionais e internacionais, claro, retribuíam os ‘mimos’, acusando estes grupos de atentarem contra a democracia e de serem de “extrema-direita” ou anti-sistema.

    Em Portugal, o conhecido cantor de hip-hop ‘Estraca’ lançou, em Dezembro de 2021, “Jornalixo”, que denunciava a podridão e corrupção dos órgãos de comunicação social. Tornou-se ‘viral’ nas redes sociais, mas o rapper foi ridicularizado por muitos daqueles que agora vociferam contra os media.

    Há ainda um exemplo paradigmático e particularmente revelador da duplicidade de critérios de quem hoje culpa a comunicação social pelo crescimento (mediático) do Chega. Donald Trump, inegavelmente detestado por muitos jornalistas, foi sempre alvo de um escrutínio feroz e desigual em comparação com os candidatos do Partido Democrata. O tratamento que recebia era, sem qualquer dúvida, tendencioso e negativo.

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    Nesse contexto, o ex-presidente norte-americano chegou a dizer que “os media são o inimigo do povo”. Esta entrada a pé juntos fez os supostos defensores da democracia rasgar as vestes. Os ‘antipopulistas’, contudo, pouco se importavam que se deitasse para o lixo a isenção e o rigor jornalísticos quando o protagonista das notícias era Trump. Valia tudo, até mentir ou distorcer os factos para denegrir a sua imagem. Na altura, essa cobertura mediática afagava o seu viés ideológico.

    Agora, dá-se um plot twist. Os acríticos foram picados pelo bichinho do espírito crítico e já aprenderam a desconfiar dos media. Estamos perto de ver essas pessoas, que aplaudem a comunicação social quando se ‘porta bem’ – e promove os actores políticos que lhes agradam – e a condenam quando, aos seus olhos, se ‘porta mal’, dizerem que os media são o inimigo do povo. Só agora, porque o Chega continua a subir nas sondagens. Santa hipocrisia. Santa paciência.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • As Forças ‘Machistas’ Portuguesas

    As Forças ‘Machistas’ Portuguesas

    Neste nosso cantinho da Europa Ocidental, com a profusão das democracias liberais e as garantias dos “direitos humanos”, habituámo-nos a uma ideia de paz permanente e cooperação. Essa será uma das razões que explica o progressivo desinvestimento nas Forças Armadas, sendo que também contribuirá certamente a crescente rejeição de quaisquer sentimentos ‘nacionalistas’ ou patrióticos.

    Muitos românticos acreditam até que não precisamos de Forças Armadas, que os conflitos bélicos são uma expressão de masculinidade tóxica, e o simples desejo de vivermos todos em paz e harmonia é suficiente para este cenário se concretizar. Idealistas, têm dificuldade em entender que, infelizmente, o conflito, por vezes beligerante, é um fact of life. Em suma: sem prejuízo de tudo ter de ser feito para evitar a tragédia da guerra, tudo deve ser feito também para, no caso de nos bater à porta, sermos capazes de nos defender.

    Sucede que a soberania nacional soçobrou, de várias formas. Portugal quase se tornou num país ‘satélite’ da União Europeia. Neste lugar tão pacato como irrelevante à escala internacional, as Forças Armadas foram sendo preteridas, deixadas para segundo plano. Mas sinais de alarme e gritos de socorro têm-se vindo a amontoar, embora sem efeito, caindo nos ouvidos moucos dos últimos Governos. O mais recente tomou a forma de uma carta de nove páginas enviada, esta quarta-feira ao Presidente da República, por oficiais-generais do Grupo de Reflexão Estratégia Independente (GREI), a denunciar a “insustentável situação dos militares das Forças Armadas”. Recorde-se que no último dia de 2022 o número de militares do Exército, Força Aérea e Marinha registou um mínimo histórico, com apenas 21.080 efectivos – um pouco abaixo do número de oficiais da Guarda Nacional Republicana.

    No documento, apontaram a “falta de pessoal” como o maior problema, entendendo ser um reflexo da perda dos direitos dos militares nos últimos Governos, a falta de progressão nas carreiras e as baixas remunerações. E fazem uma observação bastante sibilina: “até parece que o objetivo prosseguido é depauperar as FFAA [Forças Armadas] dos seus recursos humanos, deixá-las esgotarem-se e, assim, exauridas, chegarem à extinção”. Palavras certeiras. De facto, parece mesmo haver dolo e uma intenção clara no sentido de enfraquecer as Forças Armadas. Numa Europa que ‘comanda as operações’ a partir de um núcleo reduzido em Bruxelas, até já discutindo a criação de um exército europeu, e se Portugal já abdicou de grande parte da sua soberania, para que precisa de uma Defesa robusta e pujante?

    O escárnio recorrente e a aversão a demonstrações de força, que encontra o seu apogeu nos discursos de autoflagelação, penitência e culpabilização pelo nosso passado, têm como consequência natural a desvalorização das Forças Armadas. É certo que quase todos os sectores, em Portugal, estão na mó de baixo, e este dificilmente poderia fugir à regra. Mas, apesar disso, há uma evidente e concertada acção que visa a desmoralização dos nossos militares.

    Os exemplos são abundantes. Começo por um que me indignou sobremaneira, sendo eu filha de um militar da Força Aérea: a nomeação de uma “socióloga” como Ministra da Defesa Nacional, Helena Carreiras – a “primeira mulher” a ocupar o cargo. Quisesse alguém humilhar as Forças Armadas, teria dificuldade em fazer uma escolha que melhor manifestasse essa intenção. Sim: a nomeação de Helena Carreiras foi uma flagrante humilhação.

    Esta opinião pode ser impopular num ‘Ocidente’ – é apenas o Ocidente que o faz – que finge acreditar que homens e mulheres são “iguais”, e que partilham exactamente das mesmas apetências, capacidades e inclinações, mas a biologia importa-se pouco com a ideologia de cada um. A ideologia da “igualdade de género”, que pretende uma paridade absoluta, é não só contrária à natureza dos sexos; é incompatível com a criação de uma superpotência militar.

    E, claro, Helena Carreiras distingue-se pela sua preocupação com as “questões de género” nas instituições miliares e a “integração das mulheres”, áreas em que concentrou a sua investigação. Em Novembro passado, chegou a falar na existência de um “machismo estrutural” nas Forças Armadas – um discurso woke e absolutamente patético, que me envergonha e repugna como filha de um militar. A senhora ministra está mais preocupada em impregnar o seu activismo feminista nas entidades que tutela, do que em dignificar os profissionais que põem a sua vida ao dispor pelo país. Um circo pegado.

    E sem 2020 os generais-oficiais do GREI já tinham alertado para o estado de “pré-falência” das Forças Armadas, algumas das medidas entretanto apresentadas pelo Ministério da Defesa para remediar a situação, foram menos do que meros ‘paliativos’.

    A título de exemplo, as medidas apresentadas em Outubro de 2023, são cómicas, e quase trágicas. Com vista a aumentar o número de candidatos, desceu-se a exigência: os militares podem agora ser ‘minions’ de 1,54 metros, e algumas doenças crónicas já não bastam para excluir uma candidatura. Em cima da mesa, esteve também a abertura a estrangeiros, mas a ideia ficou, pelo menos por enquanto, em águas de bacalhau.

    Tudo isto seria desnecessário, se houvesse uma valorização efectiva das Forças Armadas e do seu papel. Respeite-se aqueles que se colocam na linha da frente pela defesa da nação, honrando a sua coragem e abnegação – e não espezinhando a masculinidade, qualificando-a como “tóxica” -, ao invés de lançar acusações de machismo e dissertar sobre a igualdade de género na Defesa, e talvez os portugueses voltem a querer servir o país como militares.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • O ‘Governo’ de Davos e as vidas de oito mil milhões

    O ‘Governo’ de Davos e as vidas de oito mil milhões

    Uma vez mais, a elite mundial encontra-se, esta semana, nos Alpes suíços, em Davos, para discutir o que será feito dos muitos milhões de almas cujas vidas estão à mercê desta pequena agremiação de líderes políticos e magnatas. É a reunião anual do “Fórum Económico Mundial”, criado pelo economista suíço-alemão Klaus Schwab em 1971.

    Embora os olhos do Mundo devessem estar postos nesta cimeira, e o escrutínio sobre aqueles que por lá passam devesse ser implacável – porque são eles que, assemelhando-se a Deuses no Olimpo, tomam as derradeiras decisões que afectam todos nós -, a maior parte das pessoas não sabe nem sonha a dimensão do poder concentrado nestes “escolhidos”. Escolhidos, é uma maneira de dizer, pois constituem literalmente apenas um “punhado” não eleito de pessoas: este ano, o encontro contará com 2.800 convidados. Um número reduzido comparando com os cerca de oito mil milhões de pessoas a habitar o planeta, e sobre os quais os 2.800 participantes exercem um poder desmesurado.

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    Num vídeo de 2016, entretanto removido da sua página oficial (mas ainda disponível no Facebook), o Fórum Económico Mundial fazia oito previsões para o Mundo em 2030, e vaticinava que o cidadão comum “não terá nada e será feliz”, pois tudo será “alugado”. Tradução: abolição da propriedade privada.

    Também se previa o fim dos combustíveis fósseis, e dos Estados Unidos como potência mundial hegemónica, e o consumo de carne apenas como um “regalo ocasional”. Tudo isto faria parte da construção de um “mundo melhor”. Atendendo ao poder desta elite para determinar os destinos do globo, convenhamos que estas não são ‘previsões’, mas planos traçados e já em marcha, conforme, de resto, nos vão informando as ‘notícias’ diárias. Ainda hoje, soubemos que a União Europeia tenciona acabar com os veículos com mais de 15 anos.

    Não são poucas as ideias macabras já lançadas nestas cimeiras. Uma delas, envolvia o desenvolvimento de uma tecnologia que visa o registo da “pegada ecológica individual”. Trata-se de uma plataforma para inventariar tudo aquilo que comemos, consumimos, e os locais e a forma como viajamos. Um mundo onde cada passo que damos fica registado no ‘digital’ – é difícil imaginar uma distopia mais tenebrosa.

    No seu discurso desta terça-feira, o enviado especial norte-americano para o clima, Jonh Kerry, afirmou que não importa quem saia vencedor das presidenciais de 2024, a “neutralidade carbónica será alcançada”, pois está em curso uma “revolução económica” acima de qualquer político ou cidadão. Uma assumpção de que a plebe, tendo o direito ao voto, não tem, de facto, voto na matéria?

    Annual Meeting 2019

    Reclamar-se a preservação da democracia é incompatível com uma atitude indiferente face a este projecto denominado “Fórum Económico Mundial”; um democrata só pode condenar a sua existência. Com efeito, aquilo que esta cimeira representa é uma obscena e antidemocrática concentração de poderes e uma medonha promiscuidade entre o poder político e o económico. Não importa que se vistam com pele de cordeiro, apregoando bandeiras agradáveis ao ouvido, como a erradicação da fome e a igualdade de género; é indefensável que as elites reunidas na Suíça tenham o bem colectivo em mente. Utilizam eufemismos para desígnios duvidosos, como a “luta contra a desinformação”, que, obviamente, irá desembocar na censura e na supressão da liberdade de expressão.

    Como é tradição, os media noticiam o encontro com a leveza de quem faz um boletim meteorológico. De resto, mantém-se um registo idêntico ao dos artigos sobre a reunião do famoso grupo Bilderberg em Portugal em Maio do ano passado. Conferências aparatosas organizadas pelos mais poderosos do mundo, onde a política e o “Grande Capital” estão de mãos dadas (ou mais que isso), não fazem soar quaisquer alarmes aos “guardiões da democracia”. Nem suscitam ponta de desconfiança. Não. A cobertura noticiosa esgota-se num estilo ‘panfletário’. E depois, claro, ficam muito surpresos e de queixo caído, porque já ninguém compra jornais.

    Dos partidos políticos, também não se ouve, por estes dias, uma palavra de desconfiança para com as figuras que esta semana aterraram em Davos – muitas delas em jactos privados, para depois dissertar sobre as alterações climáticas. Nem da ala direita, tipicamente mais sensível à defesa da soberania nacional, nem da ala esquerda, sempre mais vigilante com os poderes instituídos. 

    World Economic Forum

    Não é nos “senhorios”, nem na classe média ou nos donos de alojamento local, amiúde alvos da ‘esquerda’, que reside o capitalismo malévolo e nocivo, mas nas instituições representadas pelas personalidades que aterram em Davos. Estes, sim, são os verdugos que nos manuseiam como marionetas, fomentando guerras, inflacção e crises económicas que resultam em transferências de riqueza estratosféricas.

    Estas são as elites que cometem o ‘assassinato’, para depois fingirem o papel de agentes policiais. São os causadores de problemas, que, de seguida, se apresentam perante nós como portadores de respostas e soluções. No entanto, não é preciso muito para concluir que, longe de zelar pela ‘plebe’, aquilo que ambicionam é uma interferência crescente e cada vez mais ruinosa nas nossas vidas, sem sequer terem passado pelo ‘crivo’ eleitoral para esse efeito.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • Preparem-se para o ‘lançamento’ do Costa Jr.

    Preparem-se para o ‘lançamento’ do Costa Jr.

    A ‘cadeira do poder’ de António Costa ainda está quente – tanto que ele ainda lá está, como primeiro-ministro em gestão –, e já vemos o seu primogénito, Pedro Tadeu Costa, a ser alavancado pela comunicação social para eventuais ‘voos’ altos na política portuguesa. Findo o Congresso do Partido Socialista (PS), depois de vermos Costa ‘filho’ na SIC Notícias no domingo à noite – como é sabido, o seu tio, Ricardo Costa, é Director de Informação da SIC – a fazer comentário em conjunto com a vice-presidente do Partido Social Democrata (PSD), Inês Palma Ramalho, ontem podíamos vê-lo na CNN, frente a Margarida Bolseiro Lopes, vice-presidente da Comissão Política Nacional do PSD. Há pouco tempo, Pedro Tadeu Costa também já tinha estado na CNN a defender a candidatura de Pedro Nuno Santos à liderança do PS.

    Mas, vejamos: quais os ‘títulos’ que acumula para ser posto a “debater”, nestas estações televisivas, com duas dirigentes do Partido Social Democrata? Pedro Tadeu Costa destaca-se agora, aos 33 anos, por ser presidente da junta de freguesia de Campo de Ourique (venceu as autárquicas de 2021 por apenas 25 votos, depois de uma juíza ter negado recontagem) e também deputado do Grupo Municipal do PS na Assembleia Municipal de Lisboa. Para além de, claro, ser filho do primeiro-ministro demissionário.

    De imediato, surge a dúvida: quão comum é vermos presidentes de juntas de freguesia a fazer comentário político regular? Sobretudo, como se o seu estatuto comparasse com o das duas dirigentes do PSD?

    Dizem alguns que o currículo do jovem (ou deveríamos antes chamá-lo D. Pedro I, da dinastia Costa?) fá-lo meritório do espaço recentemente adquirido nos media, onde opina de forma desprendida, como se o Governo do seu pai não tivesse arrasado o país. Mas se atentarmos às suas qualificações académicas e profissionais, concluímos que o ‘palco’ mediático que tem vindo a ganhar é desproporcional. Inevitavelmente, a sensação que fica é de estar-lhe a ser pavimentado o caminho para quando chegar o dia em que já esteja ‘maduro’, poder candidatar-se a altos cargos políticos, seguindo as pisadas do seu progenitor.

    De facto, olhando para o seu percurso, vemos claras semelhanças entre Costa pai e Costa filho. Ambos se filiaram na Juventude Socialista com apenas 14 anos, e ingressaram na licenciatura de Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, sendo que Pedro Tadeu Costa tem também uma pós-graduação em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação pelo ISCTE. No então, Pedro não tem inscrição na Ordem dos Advogados, presumindo-se que não se inscreveu ou não concluiu o estágio.

    Pedro Tadeu Costa ‘transformou-se’ agora em comentador da CNN Portugal.

    António Costa deu o seu primeiro salto na Política servindo na Assembleia Municipal de Lisboa. Pedro, por seu turno, começou a trabalhar como autarca na Assembleia de Freguesia de São Domingos de Benfica em 2013, passando para a Junta de Freguesia de Campo de Ourique em 2017.

    Em entrevista recente, o ‘rebento’ de António Costa assumiu a sua preferência por Pedro Nuno Santos, em detrimento do seu próprio pai, para a liderança do partido. Faz sentido: a hipótese de integrar um executivo comandado pelo pai já está descartada, enquanto que, pelo novo secretário-geral, é uma hipótese cada vez mais palpável.  

    Poderia até pensar-se que Pedro Tadeu Costa sofre da típica vergonha dos adolescentes – pese embora estar já a caminho dos 34 anos – em relação aos pais. Mas a “vergonha” é um mal que não toca aos famosos ‘boys’ carreiristas do PS. Pelo contrário: se partilham os apelidos entre si como resultado dos laços familiares, o ‘descaramento’, a ‘arrogância’ e a ‘prepotência’ serão os seus nomes do meio.

    E, se dúvidas houvesse, o Congresso deste fim-de-semana foi o teste do algodão quanto ao sentimento de impunidade e à prepotência que grassa no Partido Socialista. Durante dois penosos dias, assistimos a um deplorável espetáculo onde o lambe-botismo foi prato principal e onde os sabujos de António Costa não se coibiram de mostrar provas do seu respeito e lealdade incondicionais, branqueando o lastro de incompetência e destruição que foi o seu legado. Pelo meio, António Costa ainda fez o número do “mártir”, com a inenarrável tirada “podem ter-me derrubado, mas não me derrotaram”.

    Costa, que parece crer-se uma espécie de Deus-Todo-Poderoso, pode fingir-se vítima da Justiça; mas, na verdade, é o carrasco dos portugueses. E, pelos vistos, não lhe basta: nos bastidores, os cordelinhos já estão a ser puxados para que o seu filho possa almejar, num futuro não muito distante, dar cabo do que reste do país.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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  • Os mais novos que façam

    Os mais novos que façam

    O ‘activista’ Sérgio Tavares publicou esta semana um vídeo no seu canal de Youtube onde inquiria os transeuntes nas ruas do Porto sobre as suas intenções de voto para as próximas legislativas. Ressalvando que a vox populi (ainda mais do que as sondagens) tem enviesamentos que, do ponto de vista de rigor, deixam muito a desejar, ouvir esta ‘amostra’ da ‘voz do povo’ mostra-se esclarecedora sobre a suposta ‘invencibilidade’ do Partido Socialista.

    Houve um excerto, em particular, que se tornou ‘viral’, atingindo centenas de milhares de visualizações e suscitando comoção nas redes sociais: uma senhora dizia que, no dia 10 de Março, tencionava votar para “manter o que está” (o Partido Socialista) porque já é reformada, e que os sucessivos escândalos a que temos assistido em Portugal também são comuns “nos outros países”. Questionada sobre a necessidade de haver um “grito de revolta”, retorquiu que, por ela, deixa-se andar, e acrescentou: “os mais novos que o façam”.

    E é nestas alturas que somos confrontados com o ‘lado negro’ do voto universal, tido como uma enorme conquista do mundo Ocidental.

    Note-se que a posição desta cidadã não poderia ser mais legítima. Com o avançar da idade, se não antes, é natural que se instalem o comodismo e o desejo de segurança. É normal, e expectável, que um reformado queira apenas assegurar a sua subsistência e não deseje alterações profundas ao status quo. Mais vale pouco, mas certo, do que o risco de perder o pouco que se tem.

    Na verdade, o insensato é exigir que os reformados – que, como sabemos, são muitos, neste país envelhecido – tenham ambição e uma visão de futuro para o país, e que se preocupem, por exemplo, com propostas no sentido de estancar a sangria de jovens para o estrangeiro (um dos muitos males com que nos debatemos).

    No final de Novembro, aliás, foi divulgada uma sondagem do Centro de Estudos e Sondagens de Opinião da Universidade Católica que mostra, precisamente, que o PS tem nos maiores de 65 anos mais de um terço dos seus eleitores (35%). Em contrapartida, nos jovens entre os 18 e os 34 anos, colhe a preferência de apenas 6%. É, além disso, o partido mais favorecido pelos que apresentam níveis de escolaridade mais baixos.

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    Percebe-se assim que, se contássemos exclusivamente com os mais jovens, a composição da Assembleia da República seria muito diferente, e a hegemonia do partido agora liderado por Pedro Nuno Santos teria os dias contados. O mesmo aconteceria se privilegiássemos o voto de quem concluiu pelo menos o ensino secundário, ou o superior.

    Talvez por isso, diga-se a propósito, os partidos à esquerda tenham chumbado um projecto de resolução da Iniciativa Liberal para que se ensinasse literacia financeira nas escolas – e o Bloco de Esquerda até tenha dito que a proposta visava “doutrinar” os alunos. Aparentemente, ensinar os mais jovens a gerir o seu dinheiro é doutrinação, mas dizer-lhes que talvez fosse boa ideia mudarem de sexo, já não é.

    Na rubrica de Sérgio Tavares, vemos também portugueses ‘alienados’ da política; uns, por terem perdido a esperança, outros apenas por desinteresse. Mais uma vez, absolutamente legítimo e normal. E embora alguns possam atribuir a culpa aos agentes políticos por este alheamento, a verdade é que uma fatia significativa da população simplesmente não tem aptidão ou interesse em matérias políticas. Não importa quantos direitos políticos se ofereça; será sempre uma minoria a envolver-se e comprometer-se activamente com um desígnio maior para o país.

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    E é por isso que a visão de uma soberania popular plena expressa na possibilidade do voto para todos tem mais de romântico do que real. Como de resto já foi estudado, e como pudemos observar durante a pandemia de covid-19, as “massas” são altamente manipuláveis. Não são elas que fazem revoluções, ou que mudam os destinos de uma nação. Assim, em democracia, vence quem é mais hábil a manobrar o povo, e não necessariamente quem é mais competente ou idóneo.

    Em todo o caso, vale lembrar que hoje o “jogo” está de tal maneira viciado, que as fichas devem ser postas noutros sítios. O combate político deve fazer-se de outras formas. A cruzinha que somos convocados a fazer de quando em vez, e que faremos no dia 10 de Março, já se tornou quase uma mera formalidade. Sobretudo nestas circunstâncias em que o voto dos muitos que encolhem os ombros e dizem “os mais novos que façam”, tem o mesmo peso desses “mais novos” que estão sôfregos por fazer, e mudar, alguma coisa.

    Maria Afonso Peixoto é jornalista


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