Etiqueta: Albatroz

  • Uma bíblia para a regulação emocional

    Uma bíblia para a regulação emocional

    Título

    Permissão para sentir

    Autor

    MARC BRACKETT 

    Editora

    Albatroz (Junho de 2024)

    Cotação

    18/20

    Recensão

    O autor deste livro, Marc Brackett, é um verdadeiro especialista em emoções, tendo publicado já 125 artigos académicos sobre a ‘matéria’. Mas só se tornou um ‘mestre’ da inteligência emocional depois de ter conseguido ultrapassar os seus próprios traumas, que incluíram crescer numa família disfuncional e ter sofrido de bullying na escola e abusos sexuais em criança. Em virtude destas experiências, a sua vida parecia um inferno porque vivia refém do seu tumulto interno, que o acometia de raiva e frustração e o atirava para uma espiral de descontrolo.

    O ponto de viragem deu-se quando o seu tio lhe colocou uma simples, mas poderosa questão: “o que estás a sentir?”. Foi a partir daí que, de certa forma, Marc sentiu que tinha permissão para entrar, finalmente, em contacto com o furacão de emoções que tinha dentro de si. E marcou o início de uma longa jornada de aprendizagem sobre o que é isto de sentir, e como se pode navegar os sentimentos da forma mais saudável possível.

    Veio então a tornar-se investigador e formador na área, e é fundador e director do Centro para a Inteligência Emocional e Yale, além de professor no Centro de Estudos Infantis da mesma universidade.
    Criou também o método “RULER”: a abordagem baseada em evidências científicas que ensina aos leitores neste Permissão para sentir. Na sigla que lhe dá nome, o primeiro “R” é para reconhecer, “U” é para compreender [‘understand’, em inglês], “L” é para classificar [‘label’], “E” é para expressar, e o último “R” para regular.

    O objectivo deste método? Dar competências para uma boa compreensão e gestão das emoções.

    Neste âmbito, desenvolveu o Mood meter, que serve para nos ajudar a identificar e a ‘medir’ as nossas emoções, através de um quadro com inúmeros estados de espíritos, divididos em quatro cores que correspondem a quatro grandes tipos de emoções. Num quadro com dois eixos, os estados emocionais estão organizados com base em dois grandes parâmetros: o grau de energia (que pode ser alto ou baixo) e o de prazer (também alto ou baixo).

    O autor ensina também variadas estratégias de regulação emocional – como o “monólogo interior” ou o “reenquadramento cognitivo”.

    As recomendações contidas neste livro são de um carácter muito prático e acessível, que qualquer pessoa pode aplicar independentemente do seu conhecimento sobre a “arte” da inteligência emocional.

    A título de exemplo, um dos insights mais curiosos partilhados por Marc Brackett é que, ao contrário do que se possa pensar, não são só as emoções “negativas” que precisam de ser reguladas, mas também as “positivas”.

    Sobretudo num mundo em que tudo parece desenrolar-se a uma velocidade estonteante, em que os distúrbios do foro mental como a depressão e a ansiedade atingem proporções epidémicas – até mesmo entre a população juvenil –, este livro é da maior utilidade.

    Marc Brackett consegue cumprir eficazmente a missão a que se propõe: ajudar os leitores a tornarem-se, eles próprios, autênticos “cientistas das emoções”, conferindo-lhes instrumentos  para reconhecer e lidar com aquilo que sentem de um modo construtivo. Com esse propósito, além dos múltiplos recursos que ‘oferece’ nesta obra, providencia também uma extensíssima bibliografia.

  • Amar sem amarras

    Amar sem amarras

    Título

    Relacionamentos amorosos

    Autor

    MARIA GORJÃO HENRIQUES

    Editora

    Albatroz (Outubro de 2024)

    Cotação

    13/20

    Recensão

    Viver relacionamentos mais autênticos. Esta é a principal proposta deste livro de Maria Gorjão Henriques, terapeuta, professora e facilitadora de ‘consciência sistémica‘. Assim, a autora propõe ao leitor que tome consciência de que pode não estar a ser autêntico nos seus relacionamentos por trazer consigo as histórias e traumas familiares. Em simultâneo, propõe que o leitor se liberte dessas amarras que o impedem de ser ele próprio nos relacionamentos.

    O livro sugere um caminho de auto-descoberta e de abertura de consciência. Saliente-se que se trata de uma obra que se segue a uma outra da autora: ‘O despertar da consciência com as constelações familiares’ (Albatroz, 2023). 

    A autora estruturou o livro em 10 capítulos, incluindo um sobre ‘Uma visão sistémica sobre a importância sistémica da família de origem’ e outro sobre ‘Os arquétipos masculino e feminino’ e termina com o capítulo sobre ‘O relacionamento amoroso enquanto caminho para a nossa evolução espiritual’. Também incluiu no livro algumas propostas de exercícios, bem como páginas com frases como: “o que pensas crias, o que sentes atrais”.

    No fundo, a proposta do livro é que o leitor faça todo um percurso de se descobrir a si próprio, quem é o que o move nos relacionamentos, se são crenças familiares e comportamentos aprendidos e traumas vividos ou se vive os relacionamentos de forma autêntica, estando presente na sua essência.

    No livro também são abordadas temáticas sobre as dinâmicas pragmáticas que podem existir em relacionamentos amorosos e de como se pode ter relacionamentos harmoniosos, sublinhando-se, por exemplo, a importância de haver um equilíbrio entre o dar e o receber. 

    A autora pretende, sobretudo, transmitir boas práticas com base na permissa de que “não existem relacionamentos perfeitos, mas podem existir bons relacionamentos”. Sempre num contexto de uma existência espiritual, em que existe uma conexão do leitor consigo mesmo e que está ‘presente’ na vida, incluindo nos relacionamentos, não espelhando no outro os traumas e ‘heranças’ familiares, mas consciente e desperto. 

  • O fim da submissão

    O fim da submissão

    Título

    Pare de (tentar) agradar aos outros

    Autor

    HAILEY MAGEE (tradução: Elisabete Nunes)

    Editora

    Albatroz (Outubro de 2024)

    Cotação

    17/20

    Recensão

    O título original deste livro, na sua versão em inglês, é Pare de agradar aos outros − Encontre o seu poder. Na adaptação à versão portuguesa, perdeu-se algo pelo caminho, mas também se ganhou algo. No fundo, perdeu-se a parte de ‘encontrar o nosso poder’ e ganhou-se na ideia de que, efectivamente, por muito que se tente, nunca conseguimos saber se agradamos aos outros ou não. Isto porque os outros podem estar, também, a tentar agradar-nos a nós! Uma espécie de círculo vicioso no qual uns tentam agradar aos outros e vice-versa, criando uma bola de neve infindável que desliza e acelera montanha abaixo, imparável. Algum dia, a bola terá de chegar ao vale e, aí, ou encontra um campo aberto para abrandar e estabilizar (derretendo, depois, lentamente até desaparecer por completo) ou rebenta com estrondo contra algum obstáculo que encontre na descida. Seja como for, o final dessa montanha, pode ser já na nossa morte. Por isso, seria melhor que deixássemos de alimentar a bola enquanto é tempo. No fundo, é o que nos propõe a autora deste livro: deixar de alimentar a bola de neve do ‘agradar aos outros’. 

    Agradar (ou tentar agradar) é algo que se faz como mecanismo de defesa e protecção. Pensa-se que, assim, seremos apreciados, pertenceremos a um ‘grupo’ e, numa eventual crise, não morremos à fome. Pensa-se que, assim, agradando, não se é atacado. Seremos (bem) vistos. Pensa-se, assim, que está garantida a ‘sobrevivência’. Contudo, é um mecanismo que arrisca conduzir ao burnout, ao desequilíbrio financeiro, emocional e mental. Não é possível agradar a todos, a toda a hora, e ‘sobreviver’ intacto. Há perdas a registar. 

    A autora, uma life coach, propõe ao leitor um plano dividido em quatro partes para se sair do círculo vicioso e tóxico de ‘ter’ de agradar aos outros. Na primeira parte, o leitor é desafiado a ‘descobrir-se’. Na segunda, a ‘defender-se’. Na terceira, a ‘cuidar-se’. Na quarta, e última, a ‘enriquecer-se’. 

    Pelo meio, há que largar a ‘culpa’ por não se ‘agradar’ aos outros e por dizer ‘não’. E também deixar ir a ‘vergonha’ e ‘raiva’ e convidar a ‘empatia’ por nós a entrar na nossa vida. 

    Este livro fornece, nas suas 355 páginas, muitos recursos para se atingir o objectivo pretendido e deixar de querer ‘agradar’. O que fazer com os recursos e com o livro, isso cabe apenas ao leitor decidir. Tem-se toda uma vida para o fazer, até se chegar ao vale, no fundo da montanha. 

  • Iscas com batatas cozidas (e laranja com açúcar no fim)

    Iscas com batatas cozidas (e laranja com açúcar no fim)

    Título

    Conhece-te a ti próprio

    Autora

    NICOLE LePERA (tradução: Maria do Carmo Figueira)

    Editora

    Albatroz (Junho de 2024)

    Cotação

    14/20

    Recensão

    Olhando para a capa, compraria este livro só pela promessa de ter meditações guiadas. Depois, vejo no topo da capa que o livro vem recomendado por alguém que se chama Inês Gaya. Torço o nariz. Soa-me a uma daquelas pessoas ‘namasté’, que amam todos, mas fazem compras na Shein e mudam o nome porque traz boas vibrações. (E, se calhar, não é nada disto e estou a projectar, só que não compro na Shein nem mudei de nome… ainda). Desconfio desse tipo de gente como das pessoas que “adoram animais”, menos ao sábado de manhã no talho. Há que haver coerência.

    Depois, pergunto-me: será que todos se deveriam conhecer a si próprios? Será seguro? Há pessoas que começam com um livro para se conhecerem melhor a si próprias e a seguir divorciam-se e acabam a frequentar as feiras de roupa vintage, a pensar que isso é ‘cool’, sobretudo com o cheiro a mofo e os preços proibitivos das calças à Bee Gees (e eu gosto de Bee Gees).

    Para piorar, na capa diz que a autora é ‘bestseller’ e tem mais de oito milhões de seguidores. Há muita gente de que me consigo lembrar que tem muitos seguidores, mas isso não é bom.

    Na contracapa, anuncia que o livro é interactivo e oferece um roteiro prático para a autocura. E diz que a autora é uma psicóloga holística. Apesar dos clichés, resolvi dar uma hipótese ao livro, até porque tinha esta recensão para escrever.

    Ao melhor estilo ‘New Age’, resolvi abrir o livro numa página ao calhas e ver o que me saía na rifa. Fui cair na página 212: “Conheça a sua dependência emocional”. Caramba. “As nossas narrativas, os nossos comportamentos, e as nossas respostas autónomas são desencadeadas por ciclos de activação do sistema nervoso”.

    Decido tentar outra, a ver se me sai uma menos difícil. Abro na página 158: “Conheça o seu ego”. Afinal, prefiro a outra anterior.

    Este livro é para trabalhar. Vai dar trabalho. As meditações era só como aquela laranja com açúcar que a mãe prometia se comesse as iscas todas, com as batatas cozidas e tudo. Era engolir, fechando as narinas, para não sentir o sabor. 

    Acabo a tentar uma terceira página e caio na 153: “Ferida da criança interior”. Continuo a preferir a da dependência emocional (apesar de estar tudo ligado, como no Universo).

    Tirando o tom ‘namasté’ da capa e o texto cliché da contracapa, é um livro para partir pedra interior. Ou desentupir canos mentais e emocionais. O faça você mesmo, mas sem tutorial no Youtube. Sem bonecos para pintar, nem cartas de deusas e de arquétipos para responder às nossas perguntas e nos guiarem.

    Fazer tudo o que propõe este livro, levaria anos e anos. Décadas. Uma vida. Melhor orar e pedir a Jesus para ajudar a libertar os fardos, curar a criança interior a acabar com as dependências emocionais. O pior é se Jesus envia este livro para a nossa mesa de cabeceira. (Caramba…)

  • Não pensar: a via para a iluminação

    Não pensar: a via para a iluminação

    Título

    O caminho do Zen

    Autor

    ALAN WATTS (tradução: Alexandra Guimarães)

    Editora (Edição)

    Albatroz (Setembro de 2023)

    Cotação

    17/20

    Recensão

    Alan Watts foi um filósofo britânico, reconhecido por ter sido um dos primeiros a interpretar a sabedoria do Oriente, incluindo o budismo zen e o taoísmo, contribuindo para a sua divulgação no mundo ocidental. Nascido em 1915 em Chislehurst, Inglaterra, faz 50 anos, a 16 de novembro, que morreu em 1973 nos Estados Unidos.

    Em 1951 mudou-se para São Francisco, onde começou a ensinar estudos budistas, e em 1956 começou o seu popular programa de rádio, “Way Beyond the West”. No início dos anos 1960, já a viver em São Francisco, as suas palestras, na rádio, eram transmitidas a nível nacional e o movimento da contracultura adoptou-o como porta-voz espiritual. 

    A sua abordagem única à filosofia e espiritualidade fez dele um dos pensadores mais populares e amados do seu tempo, sendo este O caminho do Zen um dos seus principais contributos. Esta obra, agora publicada pela Albatroz (original de 1957), é uma leitura muito útil para quem está interessado em aprender sobre a filosofia do Zen e, porventura, a iniciar-se nesse caminho. 

    Tendo em conta que o livro foi publicado na década de 1950, poderá parecer, em alguns momentos, desactualizado. Não tanto pelo tema, ancestral, mas eventualmente pelo interesse que um leitor submerso numa vida pautada pelos valores da produtividade, o trabalho como condição humana, ou pelo flagelo do imediatismo e pragmatismo da contemporaneidade, lhe possa consignar. Nada disto tem lugar no Tao – uma das grandes influências da prática Zen, ainda que pouco ou nada se possa afirmar sobre esta filosofia, pois

    “Aqueles que sabem não falam;
    Aqueles que falam não sabem”
    (pág. 13).

    Pese embora a sua manifesta cautela, Alan Watts explora a tradição filosófica e religiosa chinesa que se concentra no entendimento e na harmonia com o Tao, ou o Caminho, com o objectivo de resgatar a sua influência na prática do Zen – uma escola de pensamento e prática budista que se desenvolveu a partir do Mahayana.

    O autor inicia este ensaio histórico-filosófico descrevendo e explicando o Taoísmo e o Budismo Mahayana. Sempre com a ressalva de que

    “O Tao é algo turvo e indistinto,
    Tão indistinto! Tão turvo! (…)

    A qualidade das fontes a que o autor recorre e o seu trabalho exaustivo sobre a filosofia e espiritualidade orientais tornam esta obra especialmente valiosa. Está bem evidente, ao longo de todo o livro, que Alan Watts tem, como principal objectivo e até mesmo como missão, o desejo de que o leitor sinta curiosidade em pesquisar e pôr em prática alguns dos preceitos do Zen.

    Antes disso, porém, é necessário que nós, leitores ocidentais, ultrapassemos um dos grandes obstáculos à nossa própria compreensão, nomeadamente o pensamento dualista e a linguagem eminentemente classificatória. É neste contexto que o autor contrasta o pensamento oriental com o ocidental, salientando que o taoísmo está relacionado com a espontaneidade e o desapego, tão difícil ao conhecimento convencional do Ocidente. 

    Watts aborda, então, a importância do paradoxo e da não dualidade no Zen, realçando que, muitas vezes, as respostas para as questões mais profundas não podem ser explicadas verbalmente, podendo ser compreendidas somente pela experiência directa.  Isto significa que o caminho do Zen não pode ser descoberto pela aquisição de conhecimento ou pelo pensamento, na medida em que é algo que está além da existência material, por isso, indizível – um dos paradoxos do Zen. 

    Assim, ter como objectivo o “despertar” ou ser iluminado é, paradoxalmente, deixar de tentar alcançar o Caminho – tão-somente por se ter pensado nisso de forma convencional. Para saber o que é o Zen e, sobretudo, o que não é, a única alternativa é a sua prática, a sua experienciação.

    É na parte final do livro que Alan Watts dá exemplos de práticas do Zen e de como a sua vivência e experiência directa – fundamental neste caminho – podem conduzir a uma certa ‘ideia’ de iluminação, independentemente das crenças religiosas. O autor enfatiza, ainda, a importância da meditação como uma prática central no Zen – uma forma de acalmar a mente e alcançar uma compreensão mais profunda da realidade.

    Algumas das artes descritas pelo autor, e por intermédio das quais se pode experimentar o Zen, são o haiku, a caligrafia, a jardinagem, a cerimónia do chá, a pintura e o tiro com arco. Fica o convite.

  • Uma introdução à cultura milenar

    Uma introdução à cultura milenar

    Título

    Namasté: o caminho indiano para a felicidade

    Autores

    HÉCTOR GARCIA E FRANCESC MIRALLES (tradução: André Marcelo)

    Editora (Edição)

    Albatroz (Abril de 2023)

    Cotação

    14/20

    Recensão

    Nascido em 1981, em Espanha, Héctor García vive no Japão desde 2004. Antes de se radicar no oriente, trabalhou como engenheiro de software no CERN (Centro Europeu de Pesquisa Nuclear), na Suíça. Ficou conhecido desde a publicação do livro A geek in Japan. Mas foi com o livro Ikigai, escrito com o conterrâneo Francesc Miralles, que se viria a tornar um fenómeno mundial. 

    Francesc Miralles é também um autor premiado de livros de desenvolvimento pessoal. Nascido em Barcelona em 1968, já trabalhou como editor, tradutor e ghost writer. Estudou jornalismo, literatura inglesa e alemão, e é músico. Foi, também, depois de uma longa viagem à Índia que escreveu o seu primeiro romance.

    Depois de Ikigai e outras derivações do método pelos autores desenvolvido, surge este Namasté: o caminho indiano para a felicidade, editado, em Portugal, pela Albatroz.

    Se os leitores estavam à espera de um manual – com receitas para encontrar o nirvana, o zen, ou algo semelhante, dependendo da crença religiosa de cada um –, é disso que se trata: uma introdução a diversas religiões e práticas espirituais, sobretudo as que estão ligadas ao hinduísmo, não fosse este um caminho indiano.

    O livro está divido em três partes. Na primeira, “A cultura da felicidade”, os autores começam por descrever a saudação e o significado de “Namasté”. Se dúvidas havia, quando alguém une as palmas das mãos, à altura do centro do peito, com os dedos a apontar para cima e os polegares próximos do peito, inclinando o tronco para a frente e pronunciando a palavra “Namasté”, está a dizer: “a minha alma saúda a tua”, ou “o que há de sagrado em mim reconhece o que há de sagrado em ti”.

    Os autores prosseguem apresentando cinco ideias de cinco mestres para o mundo atual. Impressionante pode ser o caminho Sadhu, o estilo de vida do viajante indiano, “baseado na renúncia para atingir a lucidez espiritual”. A renúncia e a sobriedade caminham juntas neste percurso constituído por quatro fases de vida, cuja resposta à questão “De que podemos prescindir?”, parece ser uma das opções mais práticas da existência.

    É num “ashram” que se podem encontrar as condições ideais para aprender a viver em comunidade. O exemplo de Elizabeth Gilbert também é nomeado, com o seu Comer, orar e amar.  

    Na segunda parte do livro, “A filosofia da felicidade”, os autores convidam ao leitor à auto-indagação, em que a primeira pergunta é, naturalmente, “quem sou eu?”. Apesar de ser uma formulação simples, nem sempre é fácil de responder, tão embrenhados que estamos na corrida para ter e ter e ter. É precisamente aquilo que resta, depois de tudo o que se perde num naufrágio, por exemplo, que se poderá eventualmente saber responder àquela grande questão existencial. 

    Para auxiliar à reflexão, os autores vão citando outras obras, destacando-se o livro de Don Miguel Ruiz, Os quatro acordos, aqui denominados de “os quatro desapegos”, o primeiro dos quais é sempre o “ego”.  

    Dharma, karma, samsara e nirvana são outros termos que o leitor poderá reconhecer e relembrar, estando aqui contextualizados e como introdução à terceira e última parte do livro, “A prática da felicidade”. Nesta, os autores sugerem e descrevem algumas técnicas de respiração para diversas situações do quotidiano. A prática do ioga, a medicina Ayurveda são outras sugestões dos autores. 

    Fica, por isso, patente a ideia de que é uma introdução às diversas possibilidades para o caminho espiritual. O importante é que cada pessoa percorra aquele com o qual se identifica, quer em termos de práticas meditativas, mais passivas ou ativas, como o ioga, quer em termos de aprendizagem e mesmo de alimentação. No fundo, as bases para uma vida espiritual, sendo certo que uma alimentação saudável é fundamental para uma vida globalmente saudável, onde se insere, naturalmente (para os autores, claro), a prática da meditação.

    Este é um livro de leitura curta e fácil, porque escrito de forma simples, para principiantes em meditação, ou para as pessoas curiosas pela cultura milenar indiana. 

  • Manual de instruções para amar

    Manual de instruções para amar

    Título

    8 regras do amor

    Autor

    JAY SHETTY

    Editora (Edição)

    Albatroz (Janeiro de 2023)

    Cotação

    17/20

    Recensão

    Jay Shetty é um autor britânico de origem indiana, que ficou muito conhecido pela obra Pensa como um monge, editado em Portugal pela Albatroz, tal como este, 8 Regras do amor.

    Depois de ter vivido vários anos, na Índia, a aprender a prática védica com monges em ashrams, Shetty começou a partilhar as suas ideias e conteúdos no mundo virtual e digital.

    Actualmente, além destes dois bestsellers, Shetty tem um dos podcasts mais ouvidos no Mundo, On purpose, e é um dos life coachs mais conhecidos e seguidos na Internet.

    As 8 regras do amor, sugeridas pelo autor, dividem-se em quatro partes: Tempo a sós, Compatibilidade, Cura e Conexão.

    Jay Shetty agrupa estas etapas e descreve as regras, recorrendo às lições dos livros primordiais da tradição oriental e fazendo uma analogia com as quatro etapas de vida descritas pelos Vedas, como se cada ashram fosse uma “sala do Veda”, “uma escola de aprendizagem, crescimento e apoio” (p. 14):

    1. Brahamacharya ashram – “Preparação para o amor”, que inclui as duas primeiras regras.

    Para aprender o amor a dois, é preciso apreciar o tempo que se está a sós – a Regra 1: “Deixe-se estar sozinho”. Com a Regra 2, “Não ignorar o carma”, o autor diz-nos que: “O carma é um espelho que nos mostra onde as escolhas nos levaram…” (p. 53).

    2. Grhastha ashram – “Pôr o amor em prática”, a partir de 3 regras.

    Nesta parte, o autor ajuda a compreender que o amor é um processo contínuo e a dois, e que, antes de se tomar uma série de decisões, é preciso perceber se somos compatíveis. Ou seja, “antes de decidirmos que estamos apaixonados, de declararmos o nosso amor a alguém e de determinarmos o que significa quando essa pessoa nos diz o mesmo, devemos ter em conta a nossa definição de amor” (p. 95) – a Regra 3: “Definir o amor”.

    Regra 4: “A pessoa com quem está é o seu guru” – “Se escolhermos partilhar a vida com alguém com quem possamos crescer, então estaremos sempre a aprender” (p. 123).

    Regra 5: “O propósito vem em primeiro lugar” – Nesta parte, Shetty lembra os condicionalismos a que todos somos sujeitos desde a infância e que, por vezes, nos levam a romantizar “a ideia de fazer sacrifícios e de nos dedicarmos a outra pessoa (…). Mas conheço pessoas que deixaram de lado os seus próprios propósitos e anos depois sentiram-se perdidas ou enganadas” (p. 151). No fundo, a recordar que, na vida a dois, há duas pessoas a serem respeitadas.

    3. Vanaprastha ashram – “Proteger o amor” apresenta 2 regras, com as quais se pode aprender a resolver conflitos – Regra 6: “Sejam vencedores ou perdedores juntos” – e a terminar um relacionamento, se necessário for – Regra 7: “Ninguém morre com o fim de uma relação”.

    Nesta secção, o autor descreve o tipo de discussões que se pode travar com a pessoa com quem escolhemos viver, sendo certo que existem discussões produtivas e outras que servem apenas para aumentar ainda mais os conflitos. Uma espécie de minicurso de gestão de conflitos.

    Entretanto, todos sabemos, mas se calhar é bom lembrar que a vida continua. O dramatismo é uma forma de dar consistência às histórias que precisamos para dar sentido à nossa vida, mas há algumas, cujo ponto final, é difícil de registar.

    4. Sannyasa ashram – “Aperfeiçoar o amor”. Com a Regra 8 – “Ame uma e outra vez” –, estamos preparados para “experienciar o amor em qualquer momento com qualquer pessoa” (pp. 16-17).

    Ao longo deste guia do amor, o leitor encontra, ainda, ‘fichas de trabalho’ com uma série de exercícios individuais e a dois. Com tal, é para se ir lendo, para se ir aprendendo, exercitando, refletindo, também, e, de preferência, com tempo.

    É possível que o grande sucesso que este livro tem alcançado se deva ao facto de o autor sistematizar e congregar uma série de ensinamentos num único livro, numa escrita intimista, dando exemplos da sua própria vida e dos seus clientes – muitas celebridades entre estes, nomeadamente a Jennifer Lopez, Khloé Kardashian e Oprah Winfrey.

    A estratégia de marketing é, realmente, forte. Desde logo pelo título: “Regras”; e parece funcionar, talvez pela ideia de que existe alguém a orientar-nos. Nesta sociedade fragmentada e de mosaico, as pequenas histórias são produtivas, sobretudo quando se baseiam em grandes e clássicas narrativas, como as do livro dos Vedas – esta abordagem resulta na nossa sociedade (quase) sem referências divinas, mas sedenta de orientação.

    Também na contracapa, onde se lê que “ninguém nos ensina a amar”, “mas não tem de ser assim”, uma vez que neste livro encontramos “um guia completo para viver cada etapa do amor”.

    O livro é, com efeito, um manual muito interessante para todos aqueles que querem aprender um pouco mais sobre si próprios e sobre como manter (ou mesmo terminar) e aprofundar uma relação amorosa.