Etiqueta: A Lei das Grades

  • Tribunal Constitucional faz justiça

    Tribunal Constitucional faz justiça


    A nossa Lei determina que as penas de prisão têm duas finalidades: reabilitar e punir. E por esta ordem.

    Uma das razões para tal reside no facto de, em Portugal, país europeu e democrático, não existir pena de morte nem prisão perpétua.

    Logo, um recluso, por mais hediondo que tenha sido o crime que cometeu, acabará por ser libertado.

    Posto isto, caberá ao Estado usar a prisão para reabilitar, educar e reintegrar.

    Na maioria dos casos até seria mais correcto escrever “integrar” porque são milhares os nossos presos que nunca estiveram verdadeiramente integrados na sociedade.

    Uma das maneiras de os responsáveis saberem se o esforço de educação e reabilitação está a ser bem-sucedido é através da análise ao sucesso das saídas jurisdicionais (vulgo precárias).

    A Lei estipula que um recluso, ao ter cumprido um quarto da sua pena, poderá beneficiar dessas saídas.

    a long hallway with a bunch of lockers in it

    Exemplifico:

    Se um preso estiver condenado a doze anos de cadeia, ao fim de três anos poderá ir a casa, por dois dias, e regressar à prisão.

    Os técnicos do Instituto de Reinserção Social deverão, depois, ir saber, junto de vizinhos e autoridades locais, do comportamento daquele durante esses dias.

    Caso tudo tivesse acontecido normalmente o recluso poderia sair, de novo, a cada três meses sendo que a duração dessas saídas poderia ir aumentando até sete dias.

    Ao meio da pena, seis anos, poderia ser libertado.

    Mas, em liberdade condicional por igual período. Isto é, se cometesse o mais pequeno delito, regressaria à cadeia e, antes de cumprir a nova pena, teria de cumprir, integralmente, os seis anos que lhe tinham sido “perdoados”.

    Um extraordinário método de combate à reincidência.

    Os Serviços Prisionais, e os Tribunais de Execução de Penas, todavia, NUNCA cumpriram esta Lei.

    Em Portugal não há um único recluso que tenha beneficiado de uma saída jurisdicional ao quarto da pena e só alguns muito, mas muito, especiais conseguem uma liberdade condicional ao meio.

    Só agora, que o Tribunal Constitucional proferiu (depois de recurso de um recluso do Estabelecimento Prisional de Évora) uma terceira decisão favorável à hipótese de recurso, para Tribunal Superior, das decisões dos Tribunais de Execução de Penas em relação às concessões de “saídas jurisdicionais” é que os cidadãos poderão perceber a enorme imoralidade, para não dizer ilegalidade, que se vivia, diariamente, nas nossas cadeias.

    trees and green grass under white clouds and blue sky during daytime

    Com esta medida põe-se cobro à possibilidade de uma decisão, meramente administrativa, decidir sobre um direito fundamental como é o da Liberdade.

    As saídas jurisdicionais que, nunca é demais repetir, são importantíssimas para a reabilitação e reintegração dos reclusos, têm sido decididas com base no parecer de um Conselho Técnico (composto pelo director da cadeia, chefe de guardas, e técnicos dos Serviços de Educação e Instituto de Reinserção Social) e depois da opinião do Ministério Público, pelos juízes dos Tribunais de Execução de Penas, sem que qualquer dos dois Magistrados tenham tido anterior contacto com o recluso, que obviamente não conhecem, sem este ser ouvido, sem a possibilidade de estar representado por advogado e sem direito a recurso para Tribunal Superior.

    Acresce que, inúmeras vezes, alguns dos elementos do Conselho Técnico, especialmente os elementos do IRS, também apresentam relatórios sem nunca terem contactado os reclusos sobre os quais opinam.

    Uma autêntica distorção do “espírito da Lei” até porque o Tribunal não fundamenta, minimamente, os motivos porque concede, ou indefere, as saídas, limitando-se o juiz a colocar, no impresso da decisão, uma cruz antes de uma das quatro ou cinco frases que dele constam (“perigo de fuga”, “não interiorizou o desvalor da conta”, “perigo de alarme social”, etc.).

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    Com esta decisão do Tribunal Constitucional, que só peca por ser muitíssimo tardia, não só os juízes terão de justificar as decisões tomadas como estas passarão a ser, em caso de recurso, analisadas por Tribunal Superior.

    Vai sendo tempo de Portugal deixar de ser, como todas as Entidades Europeias reconhecem, o segundo País mais seguro da Europa, o que tem maior número de presos “per capita” e aquele onde as penas, efectivamente cumpridas, são as mais elevadas da Europa.

    Fossem as nossas leis devidamente cumpridas, dentro dos Estabelecimentos Prisionais, e as nossas prisões teriam pouco mais de metade dos actuais reclusos.

    Claro que isso traria outros gravíssimos problemas ao Sistema.

    Um bom tema para uma próxima Crónica.

    Vítor Ilharco

    (Secretário-Geral da APAR)


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  • Ministério (para o) Público

    Ministério (para o) Público


    As investigações criminais em Portugal, feitas sob a supervisão do Ministério Público, têm sido arrasadas, nos últimos anos, por dois motivos fundamentais:

    1. Perante a suspeita de um crime, os investigadores partem do pressuposto que a primeira opinião que têm é a correcta e, a partir daí, tentam que os indícios que possam encontrar se encaixem na sua teoria descurando uma busca mais racional e lógica da verdade dos factos e chegando a omitir alguns indícios que possam conduzir a “outra” versão;
    2. Para conseguirem um apoio à sua narrativa, vão passando informações a alguma comunicação social que, com grandes parangonas, a defendem e apoiam. São inúmeros os casos em que jornalistas têm acesso às buscas em escritórios e residências, operação que deveria ser secreta, chegando ao ponto de haver alguns que conseguem a proeza de aparecerem nos locais antes mesmo dos agentes e magistrados. 

    Os arguidos e os seus advogados, nestes casos, são notificados pela primeira vez já depois de terem lido nos jornais, ouvido na rádio e vendo nas televisões toda a história criada pelo Ministério (para o) Público.

    As acusações seguem o mesmo caminho, chegando à comunicação social antes de os arguidos e seus advogados a conhecerem.

    Muitas delas delirantes e facilmente desmontáveis em Tribunal.

    Mas, e os custos desta distorção da Lei?

    Os arguidos entram nos Tribunais já com o rótulo de culpados, com a obrigação de provarem a sua inocência, numa distorção absoluta do espírito da Lei que defende exactamente o oposto.

    Muitos chegam a aparecer, no dia do Julgamento, algemados, entre guardas prisionais, por estarem em prisão preventiva.

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    Nada que preocupe os cidadãos que se regem pela velha máxima “se está preso algo fez porque não há fumo sem fogo”.

    Infelizmente, há.  

    Isto porque, para além da péssima qualidade de algumas investigações, os Tribunais de Instrução tendem a acreditar nelas e também são pródigos nas acusações mal fundamentadas, ou suportadas em indícios frágeis, que muitas vezes acabam por se mostrar insuficientes em julgamento, levando a absolvições.

    Muitos dirão que acaba por se fazer Justiça já que, constatando-se que os arguidos são inocentes, os tribunais os absolvem.

    Conclusão precipitada e errada já que esquecem as parangonas nos jornais, e as reportagens nas televisões, com os rostos dos acusados em grande plano, motivos mais do que suficientes para destruírem a credibilidade, o carácter e a honra dos implicados que, ainda que posteriormente sejam inocentados, serão sempre observados de soslaio já que, para os portugueses, nunca deixarão de ser culpados, “mas com a sorte de terem sido beneficiados pela brandura dos juízes”.

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    Assustador é saber que, segundo um estudo que a Direcção-Geral da Política de Justiça tornou público (foi publicado na revista “Visão” de 12 de Novembro de 2015 nas páginas 64 a 72), depois de ter analisado os Processos-Crime findos em Julgamento de 1ª Instância, entre 2007 e 2013, se concluiu que, nesses sete anos, foram acusados pelo Ministério Público, e muitos deles enviados para as cadeias em prisão preventiva, e depois absolvidos – segundo as estatísticas, “154.569, cidadãos, universo superior ao da terceira cidade mais populosa do País, Braga, com 138.000 habitantes.”

    Escreve-se naquele estudo: “As percentagens de absolvição por “carência de prova”, em processos-crime findos em julgamento de 1ª instância, em Portugal, oscilam entre 40,4% e 48% do total de arguidos não condenados, estes, na sua maioria, por desistência de queixas em crime semipúblicos ou particulares.”

    E acrescenta que houve casos em que o arguido chegou ao Tribunal “depois de dez juízes diferentes terem validado a sua prisão preventiva, até a tese da acusação desmoronar em Julgamento, como um castelo de cartas.”

    Em média, em todos os dias desses sete anos, incluindo sábados, domingos e feriados, houve 65 cidadãos que foram acusados, e muitos deles presos, para serem, passados anos, absolvidos.

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    Como escreve o autor do texto da “Visão”, o jornalista J. Plácido Júnior estas acusações: “chegam a representar 48% do total de arguidos não condenados, quando o máximo admitido por peritos europeus é de 12%.”

    Para cúmulo, a 4 de Agosto de 2018, o Jornal “Expresso” apresentou um estudo, sobre presos preventivos, que prova que, em Portugal, em dez anos, houve 562 detidos preventivamente e que foram absolvidos em Tribunal.

    Ou seja, que houve um cidadão, por semana, durante dez anos, a ficar preso (porque os juízes consideraram não só que havia indícios fortes para o considerar culpado como, também, que nenhuma outra medida de coacção seria suficiente para que pudesse aguardar o julgamento em liberdade) e, depois, ser absolvido por não se conseguir qualquer prova da sua culpabilidade.

    Além do mais, o estudo garante que este número não inclui os cidadãos que estiveram presos preventivamente e, depois, nem sequer foram acusados.

    Provado que está, e por um Departamento do próprio Ministério da Justiça, que houve 154.569 cidadãos acusados, muitos deles presos, por erros grosseiros, ou mesmo com bases em ilegalidades, quantos dos magistrados que solicitaram e decretaram as prisões preventivas, ou redigiram as acusações, foram punidos?

    Não sei porquê, mas acho que o número deve andar próximo do… zero.

    E esta impunidade dói quase tanto como a injustiça de ver alguém com a vida destruída sem qualquer motivo para além da incompetência ou perseguição de quem o acusou de modo leviano.

    Temos um Ministério que trabalha na criação de histórias para o Público.

    Histórias que provocam ondas de indignação numa população inculta, invejosa, desejosa de criticar quem tem algum poder ou vida mais desafogada que a sua.

    Falta-nos um Ministério Público rigoroso, isento, conhecedor da Lei.

    Mas… como estão acima desta, e com o Poder de castigar quem se lhes opõe, ficarão impunes.

    Temidos, mas não respeitados. Nada que os incomode, segundo parece.

    Vítor Ilharco é secetário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


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  • Doentes mentais são para esconder

    Doentes mentais são para esconder


    A APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso e a OVAR – Obra Vicentina de Auxílio aos Reclusos denunciaram, durante anos seguidos, a presença de centenas de reclusos inimputáveis espalhados pelas 49 cadeias portuguesas.

    Uma vergonha num país europeu que se quer moderno e democrático.

    Sobre este gravíssimo problema Mafalda Pissara escreveu, a 10 de Maio de 2017, no Jornal Universitário do Porto (JUP) um texto com o título “A Inimputabilidade no Direito Penal Português” onde esclarecia:

    “Para que se compreenda a inimputabilidade, importa primeiro falar na culpa. Para haver um crime, a ação que lhe corresponde tem de ser, entre outros, culposa, isto é: há um juízo de censura que se dirige ao concreto agente que cometeu o crime. Portanto, atendendo aos seus conhecimentos e às circunstâncias concretas do crime, pode ser censurável ou não.

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    Ora, o inimputável é aquele que é incapaz de culpa; ele pratica condutas que não são admitidas pelo Direito – são ilícitas -, mas sem culpa. O regime da inimputabilidade está previsto nos artigos 19.º e 20.º do Código Penal (CP).

    No artigo 19.º estabelece-se a inimputabilidade em razão da idade – “os menores de 16 anos são inimputáveis”.

    O artigo 20.º do CP, por sua vez, consagra a inimputabilidade em razão de anomalia psíquica: essa anomalia tem de impedir o agente de distinguir aquilo que é permitido do que não é permitido (o lícito do ilícito); ou, conseguindo distinguir, é-lhe impossível controlar-se e agir de acordo com o que é permitido.”

    O que acontece, todavia, é que um inimputável é julgado em Tribunal, muitas vezes condenado a uma pena de prisão, e não internado num hospital ou clínica psiquiátrica.

    Man in Black Pants Sitting on Bed

    Pior, quando acabava de cumprir os anos a que fora condenado era analisado por médicos que determinavam se continuava a ser perigoso para a Sociedade sendo que, nesse caso, era determinado que continuasse preso por períodos de mais dois anos após o que se seguia nova perícia e novo prolongamento da pena.

    Maneira encapotada de condenar um cidadão (para mais doente) a prisão perpétua que, como se sabe, foi abolida no nosso país onde ninguém pode ser condenado a mais de 25 anos de cárcere.

    A recente denúncia – por parte das duas Associações acima indicadas – do caso de um recluso, considerado inimputável, que estava preso há 37 anos, talvez porque tenha tido acompanhamento na comunicação social, fez tocar as campainhas de alarme e aconteceu o habitual: foi publicada, rapidamente, uma Lei a tentar corrigir a situação.

    Só que, analisada friamente, acabou por agravá-la.

    Determina essa Lei que nenhum recluso pode continuar preso após ter cumprido a sua pena, na íntegra.

    O que parecia ser uma descoberta digna de La Palisse resultou, neste caso concreto, no agravar de uma situação já de si dificílima.

    O recluso inimputável é colocado em liberdade. E depois?

    Low Section of Man Against Sky

    Quem protege a Sociedade de um cidadão perigoso?

    E quem o protege da Sociedade que se sente no direito de se defender?

    E quem protege a Família com um problema destes em casa?

    A APAR defendeu, sempre, que quando um cidadão chega a tribunal, para ser julgado, caso haja suspeitas sobre a sua saúde mental, os juízes devem requerer uma perícia médica.

    Se as suspeitas se confirmarem, e o cidadão for considerado inimputável, independentemente do crime que tenha cometido, deve sair da alçada da Justiça e passar para os cuidados do Ministério da Saúde.

    Pelo simples facto de ser um doente e não um criminoso na verdadeira acepção da palavra.

    Deve ser internado num quarto de hospital psiquiátrico, tratado e guardado por enfermeiros e médicos e não numa cela de uma qualquer prisão ao cuidado de guardas prisionais, sem capacidade para com ele lidar e para segurança de todos.

    Para além do mais, se a sua doença não for curável, o que infelizmente acontece com frequência, poderá e deverá ficar internado até ao fim da sua vida e sem se infringir qualquer lei.

    Photo of a Victim of Domestic Abuse

    É doloroso reconhecer isto, mas é a realidade.

    Para além do mais há a situação dos juízes que, certamente, não ficarão confortáveis ao condenar à prisão alguém que ali está por ser doente.

    Todos sabemos que a única razão para esta prática é que a falta de hospitais psiquiátricos, e a necessidade de isolar estes doentes, obriga ao recurso desumano de os “internar” numa cadeia.

    Poucos saberão, todavia, que ali são duplamente punidos porque a comunidade reclusa deles se defende, muitas vezes com violência, quando são fisicamente perigosos, ou deles abusa quando são apáticos, desligados do mundo, inofensivos.

    Esta lei é uma tentativa de lavar as mãos de décadas de inércia e incompetência de vários Governos.

    Como muitas outras, agravou o problema, repete-se.

    Não sei como o resolver, confesso, a não ser com a criação de mais clínicas e hospitais psiquiátricos.

    Vivendo em Portugal sei que isso é extremamente difícil.

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    As prioridades, no nosso País, são estranhas.

    Aqui governa-se com prazos de quatro anos, no máximo, porque o que conta são os resultados das eleições e os inimputáveis não votam.

    Embora, por vezes, e atendendo aos resultados, eu fique com muitas dúvidas.

    Vítor Ilharco é secetário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


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  • O Ministro Bizarro

    O Ministro Bizarro


    Em 1995 foi estabelecido o Programa para a Saúde nas Prisões (Health in Prisons Programme, HIPP) da Organização Mundial de Saúde (OMS), com o intuito de “promover cuidados de saúde e políticas de promoção da saúde, junto da população reclusa, com base nas recomendações internacionais, nomeadamente nas Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, conhecidas como Regras Nelson Mandela”.

    O Relatório deste Organismo, há dias tornado público, com base em números facultados pelos Estados e relativos a 2020, é arrasador no que respeita a Portugal.

    Ali se menciona que, no nosso país, apenas existem 33 médicos para um total de 49 estabelecimentos prisionais. Um rácio de 2,9 médicos para cada 1.000 reclusos, enquanto na população em geral esse rácio atinge os 5,3.

    Relativamente aos psiquiatras, os dados da OMS sinalizaram 19 especialistas nas prisões portuguesas, o que se traduz num rácio de 1,7 por cada 1.000 presos, bem superior aos 0,1 registados para a população em geral, número demonstrativo do tipo de cidadãos que estão detidos.

    Quanto ao número de dentistas, este não vai além dos 12 no sistema prisional, sendo o rácio de 1,1 igual entre a população em geral e a prisional, mas não indicam o número de horas de consultas e tratamentos por estes profissionais.

    O que o Relatório não diz, provavelmente por falta de dados, é que os mais de 12.000 reclusos, espalhados pelas 49 prisões, só podem contar com menos de trinta psicólogos.

    Esquece o número de doentes mentais e inimputáveis nas nossas cadeias (algo que nos deveria envergonhar já que, obviamente, o lugar destes cidadãos deveria ser o hospital) que é da ordem das muitas centenas. Garantem que ultrapassa os 10% da população em reclusão.

    Omite os números da tuberculose e doenças infectocontagiosas, que são muitíssimo superiores aos da população em liberdade.

    Também não refere a existência de males praticamente irradicados na sociedade, como a sarna e outros.

    Não refere que muitas das doenças têm base, ou são agravadas, pela falta de higiene nos espaços prisionais e pela péssima alimentação dada aos reclusos (o Estado não distribui produtos de limpeza ou desinfectantes e paga, às empresas fornecedoras, 0,80 € por cada refeição). 

    Muitos destes problemas devem-se ao facto das clínicas nas cadeias não dependerem do Serviço Nacional de Saúde e serem exploradas (e nunca o termo foi tão correcto) por empresas que concorrem a concursos que têm, como único intuito, saber qual faz o preço mais baixo.

    Só assim se compreende que, há não muitos anos, a empresa vencedora pertencesse a um recluso na cadeia de Coimbra que, a partir daí, a geria.

    Também não aborda a constante falta de medicação para muitas doenças graves. Ao contrário do que acontece com os ansiolíticos e a metadona.

    Isto porque, há alguns anos, foi alterada a regra da aquisição dos medicamentos, que deixou de ser feita pelo Hospital Prisional de Caxias, que funcionava como “central de compras” e os distribuía por todos os Estabelecimentos Prisionais, com óbvias vantagens nos preços dos mesmos, para passarem a ser adquiridos por cada uma das prisões.

    Apesar de tudo, ao tomarmos conhecimento do conteúdo do estudo, acreditámos na possibilidade dos nossos governantes se sentirem mal ao constatarem os números ali indicados e que nos colocam, também nesse campo, na cauda da Europa.

    Foi com expectativa que aguardámos a reacção do Ministro da Saúde.

    Questionado pelos jornalistas, este disse que “o Governo está a trabalhar para melhorar o sistema”.

    Mais:

    Que “o sistema de saúde nas prisões portuguesas funciona manifestamente bem. É verdade que não tem todos os médicos que deveria ter, mas tem uma dotação profissional muito adequada”.

    Revelou, ainda, que foi “esta quarta-feira assinado um despacho pelo Ministério da Saúde, o Ministério da Justiça e o Ministério do Ensino Superior para que crie um grupo de trabalho para muito rapidamente produzir um relatório sobre medidas operacionais para melhorar a saúde nas prisões”.

    O habitual.

    Um Grupo de Trabalho que vai escrever um relatório com conclusões que todos conhecem há anos.

    Desnecessário, até para o Ministro que o encomenda, já que este considera que “o sistema de saúde nas prisões portuguesas funciona manifestamente bem”.

    Enfim, medidas tomadas, com a única intenção de empurrar os problemas com a barriga, por um Ministro bizarro. Tão Bizarro que até escreve, repetidamente, o seu apelido com uma gralha.

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


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  • Provedoria de Justiça: um ornamento luxuoso 

    Provedoria de Justiça: um ornamento luxuoso 


    Numa recente entrevista à agência Lusa, a Senhora Provedora de Justiça deu algumas novidades que apanharam de surpresa todos quantos trabalham no Sistema Prisional.

    Desde logo a informação de que, desde 2014, “o sistema prisional tem sido acompanhado “de muito perto”, através do Mecanismo Nacional de Prevenção” (MNP).

    Segundo a Dra. Maria Lúcia Amaral, o MNP é uma entidade independente confiada ao Provedor de Justiça, “que realiza visitas sem aviso prévio a locais de detenção com o objetivo de prevenir situações de tortura, maus-tratos ou outros abusos, inspecionando as condições em que se encontram quaisquer pessoas privadas de liberdade”.

    Confesso que só depois de ter lido que a Senhora Provedora se referia ao sistema prisional português é que despertei para o texto.

    Com toda a sinceridade estava em crer que a Provedoria tinha aberto uma Delegação, num qualquer outro país, e que a Senhora Provedora estava a fazer o balanço dessa iniciativa.

    Na realidade, tanto quanto é conhecido, a Provedoria de Justiça, em Portugal, e no que respeita às cadeias, não passa de um ornamento que enfeita o edifício da Justiça para dar um ar de modernidade e defesa dos Direitos Humanos.

    Sem qualquer outra função que não seja essa.

    Recebe a Provedoria de Justiça algumas queixas do interior das cadeias, graças à possibilidade que os reclusos têm de lhes ligar directamente a partir das cabines?

    Maria Lúcia Amaral, provadora da Justiça.

    Sim!

    Cada vez menos, obviamente, dada a total inutilidade dessas queixas que têm, como resposta, na imensa maioria das vezes, uma fotocópia com a informação de que a Provedoria está impedida de os apoiar.

    E é verdade.

    A única possibilidade que teria (e que não é despicienda) seria a de usar o seu poder de influência para tentar resolver alguns dos casos mais graves.

    O que não faz “para não se imiscuir nas tarefas doutros organismos”.

    Sendo assim…

    Há sempre excepções, e seria uma tremenda injustiça não elogiar o trabalho do Dr. João Portugal, que é, na Provedoria de Justiça, um verdadeiro lutador pelos Direitos dos reclusos e seus familiares.

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    A Provedoria, no entanto, enquanto organismo, pouco ou nada faz para garantir esses Direitos.

    Conhecem a realidade das cadeias, mas o que fazem para combater a miséria que ali se vive e as ilegalidades que ali se cometem diariamente?

    Não sabem que os presos têm uma alimentação miserável (o Estado paga 0,80 euros por cada refeição)?

    Não sabem da falta de apoio médico?

    Da impossibilidade de os reclusos estudarem ou trabalharem?

    Da qualidade das instalações, com dois e três presos em celas “individuais” onde a água escorre pelas paredes, sem vidros nas janelas, com fios eléctricos descarnados, com pulgas e percevejos, com a necessidade de meterem uma garrafa de água na sanita, à noite, para as ratazanas não saírem por aí?

    Do tratamento desumano dado às visitas?

    Da ilegalidade de, durante as greves dos guardas prisionais, os reclusos não poderem receber ou enviar correspondência, estudar, trabalhar, terem algumas consultas médicas, irem a algumas sessões em tribunais ou aos funerais dos entes queridos, etc., etc.?

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    E o que fazem quanto a tudo isto?

    Por alguma razão as Associações de apoio aos reclusos, com a APAR à cabeça, passaram a ser os verdadeiros interlocutores dos reclusos, e famílias, junto do Estado e Tribunais.

    Uma centena de chamadas por dia, a que se juntam cartas e emails, com pedidos de todo o género, chegam à Associação diariamente.

    Muitas vezes se deu conhecimento desses problemas à Provedoria pedindo apoio na tentativa da sua resolução.

    Há mais de um ano que se desistiu de qualquer diálogo.

    Aos pedidos de apoio recebiam as mesmas circulares enviadas aos reclusos com a informação da impossibilidade de agirem.

    O papel da Provedoria é, fundamentalmente, fazer passar, de preferência para o estrangeiro, a ideia de que somos um país moderno, preocupado com os Direitos Humanos e com Entidades preparadas para garantir o cumprimento das Leis.

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    Daí que se tenha atribuído, em tempo mais do que recorde, uma indemnização milionária à família de um ucraniano que morreu no aeroporto, antes mesmo de se saber em que condições aconteceu essa morte e sem que tenha havido julgamento, quanto mais condenados.

    Mas que fizemos um figurão no estrangeiro, pagando quase um milhão de euros, lá isso…

    Entretanto, e para não ser exaustivo, há reclusos a serem agredidos e torturados diariamente nas nossas cadeias, abuso no incumprimento das leis impedindo visitas com os horários e as condições estipuladas pela Lei, trabalho a ser pago a dois euros por dia, todo o tipo de dificuldades para se poder estudar e exploração de agiotagem nos preços dos produtos das cantinas.

    As visitas deste “Ornamento Luxuoso”, pomposamente baptizado de Provedoria de Justiça, às cadeias resultaram em quê?

    Segundo a Senhora Provedora, o “acompanhamento do sistema prisional português adquiriu uma outra densidade e uma outra dimensão por causa desta nova realidade que é a existência de um mecanismo nacional de prevenção que tem por mandato imperativo o acompanhar de muito perto, de muito perto, tudo o que acontece em lugares onde haja pessoas privadas de liberdade e o exemplo por excelência é o estabelecimento prisional“.

    Estará a falar de quê?

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A Universidade do Crime 

    A Universidade do Crime 


    Uma das ideias mais repetidas, quando se debate o Sistema Prisional, é que as cadeias funcionam como a “Universidade do Crime”.

    Ou seja, ideia de que a missão de reabilitar um recluso – o que permitiria que, ao terminar a sua pena, pudesse reintegrasse a sociedade mais consciente das suas responsabilidades enquanto cidadão – não só falha como acaba por, graças ao contacto com outros delinquentes, permitir que ganhe novos conhecimentos no que ao crime diz respeito.

    Infelizmente, há algo de verdadeiro nesta acusação.

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    As cadeias têm, em Portugal, um único “objectivo”: fazer com que os presos cumpram as suas penas sem causarem problemas.

    Daí o privilegiarem a inércia, permitindo que os reclusos passem anos encerrados nas suas celas, sem qualquer horário para se levantarem ou deitarem, com acesso a televisão e playstations nas celas, com distribuição de doses elevadas de ansiolíticos, sem obrigatoriedade ou, sequer, aconselhamento ao trabalho ou estudo, mas, bem pelo contrário, com a criação de todo o tipo de obstáculos sempre que algum se propõe a desempenhar qualquer tarefa.

    Ser activo, na cadeia, obriga a que guardas e funcionários trabalhem, algo que todos fazem por evitar.

    A ida ao ginásio ou biblioteca é, sempre, uma dificuldade.

    O trabalho é considerado uma benesse, embora seja “pago” por valores vergonhosos (dois euros por dia).

    Um recluso conseguir estudar é praticamente uma miragem, dadas as regras criadas para o impediram: proibição de acesso a computadores, ausências de salas apropriadas, falta de material e professores qualificados, celas e camaratas sobrelotadas sem o mínimo de condições para a concentração necessária.

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    Depois há, ainda, as constantes greves de guardas (num ano estiveram mais de 300 dias em luta), que impedem aulas normais.

    Resta, pois, a conversa entre todos, a troca de experiências, a informação detalhada sobre o mundo do crime, os seus riscos, o modo de os evitar, os contactos dos especialistas nas diversas “áreas”, o esclarecimento sobre materiais a usar nas diversas “actividades”.

    Quem quiser ocupar o seu tempo, nas cadeias, para se aperfeiçoar no crime, é óbvio que o consegue.

    Nesse ponto têm razão os que as consideram “universidades”.

    Esquecem o principal, todavia. É que ninguém começa os seus estudos nas Faculdades.

    De quais pré-primárias, escolas e liceus vêm, então, estes “alunos”?

    A resposta torna-se mais simples, se tivermos em conta que mais de 50% dos jovens presos nas nossas cadeias são filhos de ex-reclusos.

    Muitos deles visitaram ambos os progenitores nas cadeias.

    Os seus “estudos” iniciaram-se na rua em zonas de absoluta exclusão social.

    São crianças que ficaram fechadas na rua quando os pais saíam, de madrugada, para trabalhos desgastantes e mal pagos, que os faziam chegar a casa revoltados, cansados e sem dinheiro.

    Os cadernos, o lanche preparado pelos pais, os livros de estudo que as crianças normais usam no dia-a-dia são, nestes bairros, trocados pelas artimanhas para se conseguir roubar um pão que engane a fome.

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    É fácil estas crianças serem arregimentadas para, por exemplo, entregarem drogas a consumidores, a mando de traficantes adultos que sabem o risco, o de serem presos, que correriam se a trouxessem consigo.

    Recebem, aquelas, uma miséria que lhes dá para enganar a fome, mas, também, o “diploma de passagem”, com sucesso, pela “pré-primária do crime”.

    A “escola primária” são os pequenos furtos que proporcionam algum dinheiro que lhes permitirá comprar droga que dividem em duas partes: uma para consumir e outra para vender.

    Vão “melhorando” as suas condições financeiras ao mesmo tempo que caem nos radares das diversas polícias.

    No “liceu”, as disciplinas aumentam em número e dificuldade.

    Os assaltos exigem riscos elevados, mas podem proporcionar, também, lucros avultados.

    man in black long sleeve shirt raising his right hand

    Os alunos chegaram, até aqui, com uma ideia de impunidade, porque não conheceram qualquer cadeia, apesar dos inúmeros pequenos delitos cometidos.

    Arriscar é, também, uma prova de virilidade perante os companheiros.

    Há, até, grupos que não aceitam, entre os seus, quem nunca tenha passado pela prisão, não podendo, por isso, ser considerado um verdadeiro gangster.

    Daí que os crimes se tornem cada vez mais graves e os jovens cada vez mais violentos e destemidos.

    Até que entram na cadeia.

    Tudo perante o desdém da sociedade em relação a este fenómeno perigosíssimo, conhecido e estudado.

    Haveria, apesar de tudo, a hipótese de conseguir reverter esta situação se a Lei de Execução de Penas fosse minimamente tida em conta.

    É bem clara a sua redacção: as cadeias servem para reabilitar e punir. Por esta ordem.

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    O Ministério da Justiça deu, à Direcção-Geral responsável, o nome de Reinserção e Serviços Prisionais.

    Colocando a palavra Reinserção antes de Serviços Prisionais.

    O mínimo que se exigiria era que houvesse o cuidado de começarem a trabalhar a reabilitação dos detidos no dia da sua entrada nas cadeias.

    E o que acontece?

    Há 30 psicólogos para 12.000 reclusos em 49 cadeias.

    O dia-a-dia das prisões está descrito no início do texto.

    A nossa percentagem de presos reincidentes é das mais elevadas da Europa.

    Sim, as nossas prisões são Universidades do Crime. E há quem se gabe de tal. 

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Prender inimputáveis 

    Prender inimputáveis 


    Em primeiro lugar, há que tentar compreender quem, à face da Lei, deve ser considerado inimputável.

    Para haver um crime, a acção que lhe corresponde tem de ser culposa.

    Isto é, deve haver um juízo de censura que se dirige ao autor do crime.

    man in black long sleeve shirt raising his right hand

    Logo, atendendo aos seus conhecimentos e às circunstâncias concretas do crime, este pode ser censurável ou não.

    Ora, o inimputável é aquele que é incapaz de culpa. Ele pratica condutas que não são admitidas pelo Direito – são ilícitas – mas sem culpa.

    O regime da inimputabilidade está previsto nos artigos 19.º e 20.º do Código Penal.

    No artigo 19.º estabelece-se a inimputabilidade em razão da idade: “os menores de 16 anos são inimputáveis” e inclui, para estes, um regime em risco (assistencial) e um outro com medidas tutelares educativas, sem caráter sancionatório, mas antes corretivo.

    O artigo 20.º, por sua vez, consagra a inimputabilidade em razão de anomalia psíquica.

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    Essa anomalia tem de impedir o agente de distinguir aquilo que é permitido do que não é permitido (o lícito do ilícito). Ou, conseguindo distinguir, ser-lhe impossível controlar-se e agir de acordo com o que é permitido.

    Em termos de consequências da classificação como imputável ou como inimputável, há que ver a diferença entre penas e medidas de segurança. No Direito Penal, não pode haver uma pena sem que haja culpa; ora, ao inimputável, por ser incapaz de culpa, não pode ser atribuída uma pena.

    Portanto, o ordenamento jurídico-penal, deve limitar-se a aplicar-lhe medidas de segurança.

    Estas não têm como objetivo a punição do autor do delito mas, atendendo à sua especial perigosidade, a proteção da sociedade.

    Assim, o inimputável não pratica crimes, mas tão só ilícitos e devem ser-lhe aplicadas medidas de segurança, e não penas, dado que essas são dirigidas a quem é passível de atuar com culpa (imputável).

    No entanto, qual é a realidade em Portugal?

    O número de camas, nos hospitais psiquiátricos, tem vindo a diminuir, mas o número de doentes mentais não.

    Pelo contrário.

    Portugal tem uma das mais elevadas prevalências de doenças mentais da Europa.

    A par desta constatação surge uma outra que demonstra que há um défice de cuidados acentuado e que perto de 65% das pessoas com perturbações mentais moderadas e 33,6% com perturbações graves não recebem cuidados de saúde mental adequados.

    Resultado provocado por estas duas situações: quem acompanha e trata destes doentes são as suas famílias, ou profissionais em infraestruturas que não estão vocacionadas para o seu tratamento.

    Quando os doentes mentais se tornam perigosos, com agressões a familiares ou amigos, ao ponto de estes terem de ser observados em hospitais, há a obrigação da intervenção das autoridades.

    Os problemas agravam-se, então, sobremaneira.

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    Os relatórios das agressões têm de ser enviados aos Tribunais o que leva, em muitas ocasiões, a que os Juízes decretem o internamente compulsivo desses doentes em hospitais psiquiátricos.

    Dada a falta de vagas nestes, contudo, a opção tem sido, muitas vezes, o “internamento” em prisões.

    Daí que, nas nossas cadeias, haja presos que nunca foram condenados por qualquer delito.

    Os números da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, de 2021, indicavam 183 inimputáveis, com medidas de segurança aplicadas, internados em clínicas psiquiátricas prisionais e 195 em clínicas e hospitais psiquiátricos não prisionais.

    Estar preso por ser doente é algo que ultrapassa tudo o que é admissível e nos deveria envergonhar, a todos, enquanto cidadãos.

    À “APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso” foram relatados vários casos de familiares revoltados com o modo como os seus são tratados pelo Estado.

    Um pai foi agredido pelo filho que lhe fez um golpe, no pescoço, com um “x-ato”.

    Identificado no hospital viu o seu caso levado a Tribunal.

    O Juiz decretou que o jovem fosse internado no “Pavilhão Forense” do Hospital Júlio de Matos. Não havendo vagas foi conduzido ao Estabelecimento Prisional de Lisboa onde ficou mais de três anos.

    O pai diz-se arrependido de ter denunciado o filho.

    E não se pense que estes casos são raros.

    São dezenas de cidadãos nestas circunstâncias em diversas cadeias portuguesas.

    O Estado, incapacitado de os tratar condignamente em hospitais apropriados, opta por escondê-los atrás dos muros das cadeias com gravíssimo prejuízo para eles (que são, diariamente, alvo de todo o tipo de abusos) e dos restantes reclusos, guardas prisionais e funcionários, que podem ser alvo de ataques violentos de quem não se consegue controlar.

    Problemas que, repito, deveriam envergonhar todos aqueles que aceitam estas situações degradantes como se tal não fosse a demonstração mais evidente de vivermos num Estado falhado que despreza aqueles pelos quais devíamos zelar com mais cuidado e de modo prioritário.

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    E já nem quero perguntar se não estaremos perante uma ilegalidade e uma inconstitucionalidade.

    Temos, agora, como Director-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, um investigador e psicólogo forense, o Prof. Doutor Rui Abrunhosa Gonçalves, com vários trabalhos publicados sobre este tema e conhecido crítico da situação que relatamos.

    Tenhamos, então, esperança numa mais que premente alteração ao actual sistema.

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A saúde nas prisões 

    A saúde nas prisões 


    Quando se criticam os maus cuidados de saúde nas cadeias portuguesas, a resposta mais usual é a de que, de um modo geral, não é grande a diferença entre os cuidados prestados aos utentes reclusos e aos cidadãos em liberdade.

    Ainda que tal fosse verdadeiro – mas não é – o problema é que, estando o cidadão em reclusão ao cuidado do Estado, e sem possibilidade de recorrer a cuidados diferentes daqueles que o Sistema Prisional lhe confere, este terá de lhe garantir um tratamento eficaz e digno.

    O que, habitualmente, não acontece.

    man in black long sleeve shirt raising his right hand

    O facto dos reclusos não poderem beneficiar, na íntegra, do Serviço Nacional da Saúde, o que, há que reconhecer, é de difícil aceitação, ajuda a perceber a origem de muitos problemas.

    Um enfermeiro especialista, que já prestou serviço em vários Estabelecimentos Prisionais, considerou que o recurso a “outsourcing para necessidades permanentes” é um “flagelo”.

    Deu como exemplo uma proposta de trabalho, que recebeu por parte de uma empresa de trabalho temporário, a “CV Healthcare Solutions”, denunciando que “as empresas pagam menos de 5 euros à hora aos enfermeiros”, o que “desmotiva e desqualifica o serviço”, contribuindo para a “situação dramática existente nos estabelecimentos prisionais ao nível dos cuidados de saúde”.

    Nada de estranhar se tivermos em conta a falta de cuidado na análise às propostas das empresas concorrentes à “exploração” das enfermarias das quarenta e nove cadeias portuguesas.

    black and gray stethoscope

    Como prova o facto de a que ganhou o concurso, não há muitos anos, ser propriedade de um recluso, no Estabelecimento Prisional de Coimbra, que a geria a partir da cadeia.    

    Em Julho de 2017, o então director-geral dos Serviços Prisionais, Dr. Celso Manata, dizia à Rádio Renascença que as prisões tinham “menos de metade dos enfermeiros de que precisavam”.

    E acrescentava: “A nível operatório temos unidades completamente fechadas. Os médicos que estão aqui, e os enfermeiros, têm sido heróis, porque praticamente têm feito omeletes sem ovos”.

    Nada disse, como é habitual, sobre o resultado que tais falhas tiveram no que concerne aos reclusos doentes.

    Talvez esperando que o cidadão normal pense que ficou tudo bem graças a heroicidade dos profissionais de saúde.

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    Não querendo pôr em causa a qualidade técnica e o empenho pessoal dos mesmos (que, bem ao contrário, faço questão de realçar) a verdade é que não podemos esperar “ad aeternum” que essa entrega seja suficiente para resolver, por si, problemas de extrema gravidade.

    Até para defesa dos próprios médicos e enfermeiros que aceitam correr riscos por falta de alternativa. 

    Contrariamente ao que seria de supor os próprios responsáveis pelo Sistema Prisional são críticos desta solução.

    O Dr. Celso Manata confessou, publicamente, que “do ponto de vista económico, as empresas médicas, nas cadeias, são uma má resposta porque como o médico está sempre a rodar, não conhece a pessoa, pede os exames todos e prescreve toda a medicação que lhe é pedida”.

    Outra medida nunca devidamente explicada foi a decisão de substituição da Central de Compras de Medicamentos (que tinha sede no Hospital Prisional de Caxias) pela possibilidade de os diversos Estabelecimentos Prisionais comprarem muita da medicação destinada aos seus reclusos.

    photo of abandoned house

    Não só os medicamentos ficaram mais caros – por ser diferente adquiri-los através de uma central de compras ou por quarenta e nove Estabelecimentos, alguns deles com umas dezenas de reclusos – como a ruptura de stocks se tornou, em muitos deles, mais frequente. Para não dizer constante.

    À APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso chegam diversas queixas, de muitos reclusos, contra a falta de alguns medicamentos e, mais estranho, contra o facto de terem de ser os seus familiares a comprar alguma da medicação que necessitam.

    Incluindo a receitada pelos médicos dos Estabelecimentos Prisionais.

    Algo que pensávamos proibido mas que é, de qualquer modo, incompreensível e condenável a todos os títulos.

    Seria importante saber se os Ministérios da Justiça e da Saúde têm conhecimento desta situação e se concordam com a mesma.

    A entrega de medicamentos fora de prazo, ou sem data de validade visível, ou com rótulos e documentação em língua estrangeira, tudo ilegalidades de extrema gravidade, é comum em todos as prisões e foi profusamente documentada por um Delegado da “APAR”, farmacêutico, que dessas situações deu conta a todas às entidades sem resultado algum.

    A dispensa de medicamentos, feita por enfermeiros e guardas, sem luvas, retirando-os do “blister” e entregando-os na mão do preso, é a rotina diária que tem, como consequência, a alteração da composição qualitativa e quantitativa provocada pelo contacto directo com a luz, humidade, calor e conspurcação das mãos.

    Resultado de tudo isto – e de muito mais com que poderia encher dezenas de páginas – são os trágicos números de mortes nas cadeias portuguesas: 50 por 10.000 reclusos.

    O dobro da média europeia, segundo as “Estatísticas Penais Anuais do Conselho da Europa” que comparam a situação prisional nos 47 países membros e podem ser consultadas em relatórios anuais.

    Nos últimos cinco anos morreram, nas nossas cadeias, 303 reclusos.

    Inexplicavelmente, só seis dessas mortes foram investigadas pela Polícia Judiciária, embora a Lei obrigue a que sejam todas.

    Nada de grave.

    Falamos de presos que, todos sabemos, são cidadãos de segunda e não dão votos.

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • Os presos são para esconder! 

    Os presos são para esconder! 


    As prisões portuguesas são um mundo vazio onde a vida fica suspensa, até que o recluso possa regressar à Liberdade.  

    Um tempo sem sentido, onde apenas se pensa em punir e se esquece, quase totalmente, a necessidade de dar meios e ferramentas a cada um dos condenados, que acabam por sair ainda mais marginalizados do que estavam antes de entrarem na Prisão.  

    Fomentar a inércia, por todos os meios possíveis, é a prática diária. 

    man in black long sleeve shirt raising his right hand

    Distribuem-se ansiolíticos à saciedade, de modo a ter os reclusos adormecidos e nada reivindicativos, facilitam a preguiça, permitindo playstations, consolas de jogos, leitores de CDs e rádios, para os conseguir ter nas celas, já que dar-lhes trabalho, permitir que estudem ou façam exercício físico, obriga a que funcionários e guardas também trabalhem… 

    A palavra reabilitação, que devia ser (e é, no espírito da Lei) o foco principal de todo o Sistema Prisional, é colocada em último lugar das preocupações de muitos responsáveis (?) e praticamente desprezada pela imensa maioria da classe política nacional.  

    Dizer-se que o objectivo que se pretende alcançar durante o cumprimento de penas, é “reintegrar” os cidadãos em reclusão é quase uma blasfémia. 

    white metal gate

    Os números mostram que entram e saem, por ano, cerca de 5.000 cidadãos necessitados de inserção social, e não de “reinserção”, dado que, na sua grande maioria, nunca estiveram realmente inseridos, pois viveram quase toda a vida à margem de uma sociedade que os ignora, fora das regras sociais estabelecidas, fora do mercado de trabalho ou sem capacidades (escolaridade, formação profissional ou mesmo formação cívica) para poderem sobreviver em Liberdade sem praticar crimes.  

    Não há ninguém que não conheça essa realidade, por muito que se faça (e faz) para a esconder.  

    A exclusão social é a prova mais evidente de décadas de má governação no nosso país.  

    E, pior, não se consegue vislumbrar uma qualquer medida que leve à inversão destas políticas vergonhosas.  

    Obviamente que o crime tem de ser combatido e o crime grave não pode merecer qualquer contemplação. 

    black barbwire in close up photography during daytime

    Mas o tempo de punição só ganhará algum sentido se for aproveitado na tentativa de construção de um novo projecto de vida, que não obrigue à prática de crime para sobreviver.  

    A verdade é que não existem condições de apoio a este tipo de cidadãos, mais vulneráveis e a necessitar de um apoio solidário e efectivo.  

    E para além de nada acontecer, durante a prisão, o encarceramento leva a que aconteçam tragédias inaceitáveis numa sociedade que se diz Democrática e Livre.  

    Um Mundo onde a exclusão física e psicológica – que leva a que a maioria dos reclusos se sinta rejeitado e fora da Comunidade – será uma bola de neve que só terminará quando TODOS nos sentirmos co-responsáveis pelos outros e, em especial, pelos que têm maiores dificuldades em sobreviver sem apoio da comunidade e do Estado, enquanto primeiro responsável por esta coesão social.  

    O Poder Político tem afirmado, quando quer usar o assunto para se promover e ganhar votos, que conhece a realidade.  

    Mas a verdade é que os presos, e as prisões, são temas que todos – a começar no Presidente da República, Governo, Deputados, Comunicação Social e até os Cidadãos comuns – evitam tratar.  

    Quanto menos forem falados melhor, porque ninguém gosta de tocar numa ferida que está a sangrar há muito tempo.  

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    Podemos todos falar dos maus-tratos que alguns infligem a animais – e de imediato se juntam centenas de pessoas para se manifestarem – mas quando os assuntos são sobre presos, e as condições inadmissíveis em que vivem, ninguém lhes quer tocar!  

    E, no entanto, há muitas medidas extremamente simples, que poderiam melhorar, substancialmente, o nosso Sistema Prisional.  

    Um exemplo: Num país onde o crime de condução sem carta leva mais cidadãos à cadeia (7,8%) do que o crime de homicídio, nas suas diversas formas (7,6%), fica claro que não existe intenção, ou motivação, para ir ao fundo das questões e corrigir o que deve ser corrigido.  

    Obrigar esses faltosos (a direita chama-lhes “bandidos”), ajudá-los até, se tal fosse necessário, a tirar a carta de condução, em vez de os meter na prisão, de onde sairão de igual modo indocumentados, seria um bom exemplo e retiraria das prisões milhares de cidadãos.  

    Ter políticas efectivas de Reabilitação, Reinserção e de construção solidária de vidas destruturadas que, de uma forma ou doutra, levam ao aumento de práticas violadoras das leis da República, seria outro caminho para o sucesso.  

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    Por isso a nossa insistência num combate sem tréguas à exclusão social.  

    É fácil dizer que a prisão é a Faculdade do crime.  

    Esquecem, contudo, que ninguém começa a estudar pela Universidade. 

    Quais são, então, as escolas pré-primárias, as primárias e os liceus do crime?  

    Estão à vista de todos: os bairros de lata, o desemprego, a fome, o absentismo escolar e a falta de oportunidades.  

    Analisar o Sistema Prisional sem ter em conta estas realidades é como tentar estudar trigonometria sem saber a tabuada.  

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.

  • A pandemia nas prisões

    A pandemia nas prisões


    Quem nunca esteve na prisão não sabe como é o Estado, Leon Tolstói

    A covid-19 fez, em Março de 2020, soar os alarmes no Ministério da Justiça.

    Ninguém sabia nada sobre a doença e a única preocupação era evitar que ela se propagasse.

    As cadeias tiveram, desde logo, o tratamento habitual quando se desconhece aquilo que se combate: o máximo de restrições.

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    A ignorância leva a seguir “a voz do povo” e, todos sabem, “vale mais prevenir do que remediar”.

    Aproveitando o Estado de Emergência, entretanto decretado, foi determinado que as visitas dos familiares fossem reduzidas ao máximo. De duas visitas semanais, de uma hora cada, passaram a uma única visita, por semana, e de meia hora.

    Deixaram de poder entrar três visitantes por recluso para passar a um único.

    Colocaram barreiras de acrílico entre reclusos e visitantes.

    Mas não distribuíram máscaras, nenhuma cadeia tinha uma gota de gel, não havia desinfectantes para as celas ou sanitários. Nem as famílias os podiam entregar sendo obrigatória a compra dos mesmos nas cantinas das cadeias (onde os preços são os de lojas gourmet).

    Veio a campanha de vacinação “que foi um êxito” com mais de 90% dos reclusos vacinados.

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    Entretanto as crianças, presas com as mães, em Tires, não recebiam qualquer vacina. Sequer as do Plano Nacional de Vacinação.

    Talvez porque não estava na moda…

    O estado de emergência não foi renovado depois de 30 de Abril de 2021, pelo que, a partir de 1 de Maio desse mesmo ano, passou a vigorar a situação de calamidade, com muito menos restrições, que praticamente terminaram, por decisão do Governo, três meses depois, a partir de 1 de Agosto.

    Mas, é sabido, as cadeias são um mundo à parte.

    Rara é a Lei que ali é cumprida.

    man in brown jacket and brown pants holding black smartphone

    Nem mesmo a Lei de Execução de Penas, que devia reger a vida dos reclusos, é respeitada.

    Todos os dias, em todas e cada uma das prisões de Portugal, os reclusos são vítimas do atropelo às Leis por parte de quem a devia cumprir escrupulosamente. Até para, pelo exemplo, ajudar na reabilitação.

    Dificilmente se poderá encontrar uma maior perversidade do que esta do Ministério da Justiça não cumprir a Lei em relação a cidadãos privados da liberdade por também a não terem cumprido.

    Mas é o que acontece. Para vergonha de todos.

    Num momento em que a vida voltou ao normal – com estádios de futebol, espaços destinados a concertos, transportes públicos, repletos de gente sem máscara –, o que se passa no interior das cadeias?

    Em nenhuma prisão portuguesa se cumpre a lei das visitas, continuando as restrições quer no que respeita ao seu número (deviam ser duas semanais, com pelo menos uma delas ao fim de semana devido aos familiares que trabalham ou estudam); tempo de duração, que devia ser uma hora e não meia hora ou quarenta e cinco minutos, com permissão de entrada de três visitantes por recluso, e não um ou dois, com as crianças de um ano de idade a contarem como adultos.

    Para mais, cúmulo da ilegalidade, as visitas íntimas estão proibidas se os visitantes, ou os reclusos, não estiverem vacinados, mesmo que apresentando testes negativos.

    Isto sabendo-se que as vacinas não são obrigatórias.     

    Todas estas medidas podem ajudar na gestão das prisões.

    Quanto mais restrições, menos trabalho para guardas e funcionários.

    Se isso justifica o incumprimento da Lei é questão diferente. Mas com que poucos se preocupam.

    Únicas conclusões possíveis:

    A Tutela considera um êxito o facto de não ter morrido um único recluso, por covid-19, o que é, sem dúvida, um sucesso a registar.

    Ninguém comenta o facto do número de mortes, por diversas outras causas, e o de suicídios nas cadeias portuguesas – muito pelo agravamento das já péssimas condições de vida e pela quebra dos laços familiares – tenham aumentado, neste período, para o dobro do habitual.

    brown and white short coated dog in cage

    O modo como a covid-19 é encarada nas cadeias portugueses permite não só perceber o total desprezo do Poder Político em relação aos reclusos, e seus familiares, como também provar que as prisões são, no nosso país, feudos geridos à vontade dos directores e chefes de guarda sem qualquer supervisão do Ministério da Justiça ou, sequer, da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

    E razão têm os que dizem que os muros das cadeias servem, principalmente, não para evitar que haja fugas, mas para que não se veja o que se passa lá dentro.

    Vítor Ilharco é secretário-geral da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso


    N.D. Os textos de opinião expressam apenas as posições dos seus autores, e podem até estar, em alguns casos, nos antípodas das análises, pensamentos e avaliações do director do PÁGINA UM.