Categoria: Entrevistas

  • ‘A grande emergência nacional é o aumento geral e significativo dos salários’

    ‘A grande emergência nacional é o aumento geral e significativo dos salários’

    O Partido Comunista Português (PCP) foi o primeiro partido a ser inscrito junto do Tribunal Constitucional, no pós 25 de Abril de 1974. Paulo Raimundo, 47 anos, assumiu o cargo de secretário-geral do PCP em Novembro de 2022, sucedendo a Jerónimo de Sousa naquela função. Como é habitual, nas eleições legislativas, o PCP integra a coligação CDU, junto com o Partido Ecologista Os Verdes. Depois de o partido ter ficado com apenas seis deputados na Assembleia da República nas últimas eleições – com o PEV a deixar de estar no hemiciclo –, o PCP pretende ver reforçada a sua representação parlamentar. Mas também já pensa nas eleições europeias, e Paulo Raimundo defende que será com mais eurodeputados comunistas que a Europa pode enfrentar a ascensão da direita e de partidos populistas. Esta rubrica do PÁGINA UM teve como objectivo conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal. A entrevista com Paulo Raimundo é a última publicada no âmbito desta iniciativa, em que apenas cinco partidos estiveram ausentes: Livre, Bloco de Esquerda, PS, PSD e PPM.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE PAULO RAIMUNDO, SECRETÁRIO-GERAL DO PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Têm afirmado que pretendem eleger mais deputados nestas eleições e voltar a ter uma posição mais forte no Parlamento. Nesta altura, até tendo em conta também as sondagens, que sabemos que nem sempre acertam, o que nos pode dizer dos vossos objectivos?

    Em relação às sondagens, nós temos afirmado – e é uma convicção profunda que tenho e, aliás, comprovada em todos os actos eleitorais – que elas condicionam muito e acertam pouco. Tem sido sempre assim e foi assim também há bem pouco tempo, na Madeira e nos Açores. Também diziam que nós íamos desaparecer e foi tudo ao contrário. A CDU cresceu, de forma mais expressiva na Madeira, e de forma menos expressiva nos Açores. Mas ficámos a 85 votos de eleger um deputado – que tanta falta fazia ao povo açoriano.

    Mas, voltando à sua pergunta, aquilo que achamos que o nosso povo, os trabalhadores e o país precisam é que a CDU se reforce – que tenha mais votos e mais deputados. E estamos muito convencidos de que é possível; não para nós ficarmos todos contentes no Domingo à noite, a agitar as nossas bandeiras – porque não é esse o objectivo – mas porque achamos que mais votos e mais deputados da CDU determinará o caminho futuro a partir do dia 11 de Março.

    Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP. (Foto: D.R./PCP)

    E porque considera importante que haja mais deputados do PCP na Assembleia da República [AR]?

    Eu vou responder-lhe de forma sucinta, com exemplos concretos. Uma boa parte das nossas propostas – que são isso mesmo, propostas, e não um conjunto de promessas vãs e ocas – , nem são grande novidade. Nós levámo-las, neste mandato, à Assembleia da República; nomeadamente medidas sobre os salários, as pensões, o reforço do Serviço Nacional de Saúde, medidas concretas para pôr a banca a pagar o aumento das taxas de juro, o travão para as rendas e os direitos dos trabalhadores por turnos.

    Nós propusemos um conjunto de medidas, e vamos voltar a propô-las; e elas só não foram aprovadas porque nós não tínhamos a força necessária para as fazer aprovar e para impor a sua concretização. E se nós tivéssemos tido a força necessária para isso, a vida das pessoas hoje estaria diferente – e a ideia que temos é que estaria melhor.

    E a razão de fundo é que nós precisamos de mais votos e mais deputados, porque é isso que vamos decidir no dia 10 de Março: é número de deputados que cada força elege, e é a partir dessa correlação de forças que se determinará cada uma das propostas e cada uma das soluções. E nós nunca faltaremos às soluções positivas, nem para convergir e para propor – como fizemos nestes últimos anos. Mas precisamos de mais força para que elas se concretizem. Esse é que é o grande objectivo. E não é indiferente nós termos mais ou menos deputados, porque isso condicionará as respostas que são necessárias, desde as pensões, ao SNS [Serviço Nacional de Saúde] à habitação e a uma coisa que nós estamos a dar uma grande e justa centralidade, que é os direitos dos pais e das crianças. E essa é uma grande vantagem daqueles que confiam na CDU.

    Depois, na situação que enfrentamos, é de salientar que não há força mais consequente ou com mais experiência acumulada e mais provas dadas de combate à direita do que a CDU, e em particular o PCP. E mesmo para aqueles que estão a apelar ao voto para combater a direita, convenhamos que essa garantia é dada pela CDU e pelo PCP de uma forma incomparável em relação aos outros partidos.

    (Foto: D.R./PCP)

    Falou em algumas medidas e, de facto, o PCP e a CDU têm apresentado propostas muito concretas, nomeadamente, como referiu, o travão das rendas. Há muitas famílias em Portugal a passar muitas dificuldades pelo aumento das taxas de juro e do custo de vida. Quer recordar aqui duas ou três propostas que sejam cruciais, no ponto de vista da CDU, para melhorar a vida dos portugueses?

    Aquilo que nós temos colocado como a grande emergência nacional, e a primeira medida que é preciso responder, é o aumento geral e significativo dos salários – esta é a grande questão central para dar resposta. E tem de ser um aumento geral e significativo, agora, e não só para 2028 ou 2030 – é agora que faz falta, para fazer duas coisas. Desde logo, para responder aos problemas que mencionou: o aumento do custo de vida e a pressão brutal da grande maioria. E, depois, para responder a uma questão elementar, que é a justiça – e em particular a justiça na distribuição da riqueza que é criada todos os dias. Não podemos viver sabendo que há 3 milhões de trabalhadores no nosso país que ganham até 1.000 euros de salário bruto; com o que isso implica na vida de cada um. E esta é a primeira grande medida.

    Mas, depois, também é preciso responder a outros problemas concretos – alguns que terão possibilidades de resposta a médio e longo prazo, mas onde são precisas medidas concretas agora. Um deles é a habitação, e nós propomos uma lei-travão ao aumento das rendas. Iniciámos este ano com 7% de aumento das rendas, um aumento que soma a tudo o que tudo o que aumentou também, como a electricidade, o gás, e o custo de vida que aumentou de forma brutal.

    E a alimentação também.

    E a alimentação tem um peso determinante, em particular naqueles que têm menos rendimentos, e que gastam cerca de 40% do seu rendimento em alimentação. Veja-se o impacto que tem na vida das pessoas de cada vez que a Sonae – e todas as outras distribuidoras – encaixam mais uns milhões de lucros. Este é um outro problema.

    Mas, como nós dizemos, os lucros da banca deviam suportar o aumento das taxas de juro. Porque com a situação que nós temos hoje, eu até fico pasmado como é que ninguém para além de nós vem ‘a jogo’.  A banca, hoje, encaixa por dia 6,5 milhões de euros, só em comissões e taxas; não é em lucros de operação financeira. Ora, nós propomos que esses 6,5 milhões de euros em taxas e comissões sejam um elemento para suster o aumento das taxas de juro que sejam creditados nas prestações de cada um – no crédito à habitação, mas também em quem tem o seu pequeno negócio. Porque os pequenos e médios empresários também estão muito aflitos.

    Depois, há uma outra medida – esta de médio a longo prazo – para aumentar a oferta de habitação, que é um investimento público musculado, de forma a que cheguemos ao fim dos próximos quatro anos com mais 50 mil habitações disponibilizadas. A habitação pública – que não resolve tudo, mas responde a algumas necessidades que existem… E certamente que assim conseguiremos baixar a especulação.

    É esta conjugação de duas medidas com consequências imediatas e um projecto de futuro a médio e longo prazo que vai alterar o paradigma deste sector, que é o mais desregulado e mais liberalizado da nossa economia, que é a habitação, e que está nas mãos da banca e dos fundos imobiliários.

    (Foto: D.R./PCP)

    De facto, tem-se assistido a uma grande ‘financeirização’ desse sector, apesar de ser fundamental haver habitação para a população Mas hoje, é um sector que os investidores olham como um mero jogo, como se fossem acções na bolsa.

    Sim; é exactamente assim como está a descrever. É um negócio. Transformámos um direito constitucionalmente consagrado, que é o direito à habitação – ‘transformámos’, salvo seja – num negócio de milhões. E a grande questão com que estamos confrontados neste caminho, e que é preciso interromper, é que hoje é assim com a habitação, amanhã é a saúde, e depois é tudo. E a nossa grande prioridade é interromper esse caminho.

    E está disponível para apoiar algum governo do PS? Até porque muitas das medidas que está a mencionar provavelmente vão encontrar resistência, sobretudo à direita.

    Como se costuma dizer, essa é a questão de um milhão de dólares, porque essa pergunta tem de ser devolvida com outra: vamos convergir para quê? Qual é a política? Quais são as respostas, as soluções, e as medidas concretas? E a experiência que nós temos, em particular nestes últimos dois anos, é que a maioria absoluta do Partido Socialista não deu resposta a nenhuma destas questões de que falámos: nem nos salários, não na saúde, nem na habitação e nas outras.

    Portanto, para nós, há uma coisa que é evidente: o PS, por sua iniciativa, nunca dará as respostas que são necessárias. Daí a nossa ideia de que a única possibilidade de trazer o PS para as soluções, não é dando força ao PS – é dando mais força à CDU, com mais votos e mais deputados. E, como aconteceu naquele tempo, ainda que limitado, em que travámos o percurso desastroso do PSD e do CDS,  e recuperámos uma parte muito roubada ao nosso povo – não recuperámos tudo, é verdade, mas fomos mais além nas creches, nos manuais escolares gratuitos, no passe de transportes – uma medida de grande dimensão –, no aumento extraordinário das reformas, no fim do PEC [pagamento especial por conta] para os pequenos e médios empresários. Tudo isto onde fomos mais além não foi por vontade própria do PS – que não só não tinha vontade, como resistiu. A única forma de isto ter sido garantido – e voltamos sempre à primeira questão – foi a correlação de forças, o número de votos e de deputados que a CDU teve, e a força que obrigou o PS.

    Portanto, é como lhe digo: nós não descartamos nenhuma possibilidade de convergência, mas não passamos cheques em branco, por um lado, e não falamos nisso no abstrato, falamos no concreto.  Se é para aumentar salários, não falharemos; se é para reforçar o número de profissionais e respeitar os profissionais do SNS, não falharemos; se é para pôr a banca a cobrir o aumento das taxas de juro, não falharemos. E por aí fora. É no concreto.

    (Foto: D.R./PCP)

    Temos as eleições europeias à porta e também tem-se assistido a grandes recuos na Europa em termos do nível de democracia, e a uma ascensão de medidas mais de direita, com grandes multinacionais com grandes lucros. Olhando para estas eleições europeias, quais são as pretensões do PCP?

    Nós enfrentamos de facto grandes perigos. Por que razão cresce esta ou aquela força, ou esta ou aquela tendência mais extremista e perigosa? Cresce porque as políticas não dão resposta à vida das pessoas. E esse é um problema que é nacional, mas é um problema também à escala das nações e da União Europeia. Porque aquilo a que temos assistido é, como disse, é a uma brutal e constante concentração da riqueza às mãos de uns poucos, das grandes multinacionais; e à perda constante de soberania dos países.

    Temos o caso da TAP, por exemplo. Até acho extraordinário o que aconteceu. Veja o ponto a que chegámos: a UE permitiu que o Estado português pegasse em dinheiro, que é de quem trabalha no nosso país, para salvar TAP – como aconteceu com todas as empresas de aviação do mundo –, mas com uma condição. O Estado português só podia pôr dinheiro público na sua empresa pública se, no fim do processo, fosse no sentido da sua privatização. Ora, isto é o fim da picada. É o fim da soberania total, e não há nenhuma possibilidade de nós nos desenvolvermos assim.

    Há uma coisa que nós sabemos: há grandes perigos, de facto, mas também há grandes potencialidades. E, tal como em todos os momentos da História – seja no nosso país, ou em todos os países deste mundo fora e da União Europeia – em última instância, o povo terá a força suficiente para alterar este rumo. Porque este rumo não serve os povos; pode servir as multinacionais, o Banco Central Europeu, e os grandes negócios, mas este caminho que está em curso não serve os povos. E os povos, mais cedo ou mais tarde, vão ter de travar isso. E eu estou convencido que é possível, também no quadro da batalha para o Parlamento Europeu, dar um sinal nesse sentido – e era um sinal de grande importância, que nós precisávamos todos; cada um dos povos nos seus países, a União Europeia no seu conjunto, e naturalmente, também nós aqui no nosso país.

    Transcrição de Maria Afonso Peixoto.


    Veja AQUI a página na Internet com informação do PCP e programa da coligação CDU.


  • ‘Sempre que o PSD e o CDS se juntaram nas legislativas, nunca perderam eleições’

    ‘Sempre que o PSD e o CDS se juntaram nas legislativas, nunca perderam eleições’

    Depois de uma surpreendente ausência de assento parlamentar decorrente das eleições legislativas de 2022, o CDS-PP tem garantia de regresso à Assembleia da República, ou mesmo até ao Governo, onde já esteve diversas vezes em democracia, a última nos Governos de Passos Coelho. Integrado na ‘nova’ Aliança Democrática, o líder dos centristas, Nuno Melo, está optimista numa vitória e lança críticas aos radicalismos de uma possível ‘geringonça 2.0’ e do populismo do Chega, que diz nada ter de direita. Nuno Melo é o único líder dos três partidos da Aliança Democrática que aceitou ser entrevistado para a HORA POLÍTICA, depois das recusas de Gonçalo da Câmara Pereira (PPM) e Luís Montenegro (PSD). Esta rubrica do PÁGINA UM teve como objectivo conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal. Amanhã esta rubrica será fechada com a entrevista (já) concedida por Paulo Raimundo, secretário-geral do Partido Comunista Português.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE NUNO MELO, PRESIDENTE DO CDS-PP, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Como é que tem sido o feedback da população relativamente às propostas da coligação de que faz parte o CDS-PP, a Aliança Democrática [AD]? Está optimista?

    Sim, estou realmente muito optimista. Hoje, além da razão para optimismo que resulta da própria candidatura em si mesma desta AD que junta três partidos – sendo que sempre que o PSD e o CDS se juntaram nas legislativas, nunca perderam eleições – também temos uma reacção na rua que nos permite medir o acolhimento junto das pessoas. E, de facto, esse acolhimento tem sido muito impressionante; quer dizer, basicamente não notamos rejeição, notamos muito apoio e entusiasmo, e tem sido assim invariavelmente de Norte a Sul. Por isso, eu estou muito confiante em relação ao resultado – que também resulta da necessidade de uma alternativa a estes oito anos. Ou seja, basicamente aquilo que vai estar em causa já não é tanto uma disputa entre partidos ou coligações, mas uma opção entre aqueles que não se resignam e que acham que é possível conseguir muito melhor, e os outros, que acham que está tudo bem. Pedro Nuno Santos vai a debates perguntar “afinal, o que é que não funciona?”. É um bocadinho isso que está em causa, e eu acredito que a grande maioria das pessoas vai querer mudar. E a alternativa ao PS é, realmente, a AD.

    Aliás, o lema que tem usado para chamar os portugueses a votar nesta coligação é precisamente que esta é a coligação que pode mudar Portugal. Vê, de facto, a AD como a verdadeira alternativa?

    Sim. Nós temos um facto que é inquestionável: durante oito anos, o Partido Socialista [PS] governou com várias maiorias, primeiro a geringonça, depois com outra maioria e com um apoio no Parlamento, embora não escrito, e por fim, com a maioria absoluta. Teve os meios e os instrumentos e teve péssimos resultados em todas as áreas sectoriais. Portanto, aqui chegados, a alternativa a este PS está necessariamente naquilo que são os partidos do arco da governabilidade – que têm credibilidade, são previsíveis e estáveis. São partidos que têm grande experiência; e que já estão no país inteiro, em coligação, a gerir com muita competência os destinos das pessoas. Recordo que são mais de 40 autarquias que o PSD e o CDS gerem em conjunto, e estão juntos também no governo regional dos Açores e da Madeira. E tudo isto, a meu ver, faz desta coligação – com respeito por todos os outros adversários – a mudança lógica, e essa alternativa útil que pode ser transformadora. Depois, temos os extremismos, que hoje são corporizados, quer à nossa esquerda, quer no espaço do populismo radical. Porque à esquerda, o próprio Pedro Nuno Santos, que traduz o pior do Governo do doutor António Costa – ele próprio remodelado -, verbaliza a opção de uma geringonça 2.0 que levará ao Governo o Bloco de Esquerda e o PCP; ou seja, aqueles dois partidos que durante a geringonça, apoiavam o PS no Parlamento com o Pedro Nuno Santos, estarão no Governo, numa versão muitíssimo mais radicalizada, levando os extremismos para dentro da governação. Por outro lado, há, uma outra expressão que é populista, radical, que manipula emoções e que não é de direita, e que promete tudo a todos.

    Fala do Chega.

    Sim, basicamente; mas enfim, o Chega de direita realmente não tem nada. E é profundamente radical. Mas um partido que propõe mais taxas, mais impostos, mais Estado e que quer a TAP nacionalizada a viver com os impostos contribuintes, que quer transformar o PRR em subsídios, que quer o Estado a ser fiador de empréstimos de privados, que quer as polícias a fazerem greve, ou que possam ter dentro dos quarteis secções partidárias… Obviamente que isto de direita, não tem nada – é um populismo muito radical, e com um programa que, curiosamente, em larga medida, está seguramente muito mais próximo Bloco de Esquerda e do PS do que da AD.

    Esse radicalismo à esquerda que refere também se reflectiu em relatórios que indicam que Portugal foi um dos países que recuou no seu nível de democracia, e temos também alguns problemas na própria União Europeia [EU], com alguma legislação comunitária que até vem condicionar um pouco a liberdade de imprensa. Nesse sentido, a AD promete ser mais moderada, com um programa e propostas que respondem às necessidades dos portugueses?

    Portugal recuou nos níveis de democracia e caiu nos rankings da pobreza. Note que, neste momento, Portugal tem perto de 4 milhões de pessoas que vivem no limiar da pobreza sem prestações sociais. Um em cada três jovens é forçado a sair do país, convivem com uma taxa de desemprego em Portugal superior a 20%, e com salários genericamente muito baixos. Mas, em cima disso, Portugal é um país que, em oito anos, foi ultrapassado por vários outros países de Leste, desde a Polónia à Hungria, e agora recentemente também pela Roménia – países que eram mais pobres na altura da adesão à UE, e que aderiram muito mais tarde, mas que tiveram outras opções do ponto de vista daquilo que são as apostas na sociedade e na economia, e que fizeram com que conseguissem muito melhores resultados. Portanto, diria que também essa expressão acaba por trazer um certo descrédito às instituições democráticas. E estes anos foram terríveis, com estas substituições sucessivas de governantes – todas elas à volta de incidentes que, do ponto de vista institucional, preocuparam também o Presidente da República muitas vezes – e, de resto, o Primeiro-Ministro acaba a demitir-se. Tudo isto são sinais de uma degradação muito acentuada, e crescente, que fez com que este Governo caísse por si, apesar dessa maioria absoluta. E isso também é muito impressionante.

    Tem mencionado algumas propostas da AD, mas quer destacar algumas que podem de facto ter um efeito positivo para colmatar algumas das crises que nós vivemos, nomeadamente na habitação, nos baixos salários, nos impostos e no próprio Serviço Nacional de Saúde [SNS]?

    Sim; sumariamente, e começando pela Saúde, porque é realmente fundamental retirar-se a ideologia do Serviço Nacional de Saúde. O Ministro Manuel Pizarro é o Ministro da Saúde, não é o Ministro do SNS. Mas aquilo que o Governo conseguiu nestes oito anos, por causa da ideologia, foi transformar hospitais bem geridos em hospitais cheios de problemas, desde Braga a Loures; por causa do preconceito ideológico de uma ministra que fazia questão de dizer que ouvia a Internacional quando se sentia tensa. E este Governo é um governo que extingue parcerias-público privadas de Braga e de Loures, e transformaram hospitais premiados e bem geridos em hospitais cheios de problemas. Hoje, sabemos que há 1.700.000 pessoas sem médico de família – muitas mais do que antes, quando, em 2016, o doutor António Costa dizia que todos os teriam. Temos urgências fechadas, muitas vezes há dificuldade em conseguir consultas e cirurgias de que dependem a vida dos doentes. Portanto, há muita coisa que tem de ser feita; inclusive ao nível da gestão e, por isso, muitas destas parcerias fazem realmente sentido. Porque se o Governo diz – e em alguns casos é verdade – que investiu muito mais no sector da saúde, mas os resultados são muito piores, isso significa que há uma perda da eficácia naquilo que é gestão a diferentes níveis. E os hospitais têm de ser eficazes na gestão, que vive de recursos que são escassos. Depois, temos de acabar com um preconceito à esquerda, porque o Ministro não é ministro do SNS; ganhando complementariedade entre os sectores público, social e privado. Porque onde o Estado não consiga, o sector social e o sector privado conseguem ajudar. E isto, claro, tendo o doente como escopo, que beneficiará dessa interacção. Há muita coisa a fazer, do ponto de vista da garantia de que se as pessoas não podem ter um tratamento a tempo e horas, o tratamento será feito noutro local que não no SNS, através de vouchers, mas dando resposta aos seus problemas. Também há questões que têm a ver com a dignificação salarial de profissionais de saúde – e refiro-me a médicos, enfermeiros e técnicos de saúde. Também há muitas coisas a fazer, por exemplo, na escola pública, que se degradou muito em oito anos: os professores perderam muita autoridade, os alunos caíram nos rankins – que mostram que, apesar da covid, Portugal teve um pior desempenho dos alunos comparando com outros alunos da União Europeia. E, também no que tem que ver com a Educação, nós propomo-nos a devolver, faseadamente, tempo que foi retido aos professores, e a garantir que não há – como hoje acontece – uma escola para ricos e outra para pobres, numa fractura que põe em causa o próprio elevador social, e onde os alunos de famílias mais desfavorecidas não conseguem aceder a boas ofertas de ensino privado. Também temos respostas para a habitação, por exemplo, entre outras coisas, garantindo que muito daquilo que é o património degradado do Estado pode ser entregue para o mercado através de parcerias com privados, que ajudarão à recuperação desse património e serão ressarcidos do seu investimento. Obviamente, terão lucros, porque nós valorizamos a iniciativa privada, mas o Estado ficará com esse património recuperado. Nós queremos que os jovens fiquem cá, não queremos que saiam, e por isso, logo no primeiro emprego, nós propomos  o IRS jovem, que garante uma taxa de IRC de 15% para os jovens até aos 35 anos. E, por outro lado, também no que tem que ver com a juventude, queremos isentar, na compra da primeira habitação, os jovens em cinco anos de IMT e de imposto de selo. Temos também medidas que são fundamentais para alavancar tudo isto, para que seja possível devolver rendimentos às famílias e às empresas: a AD irá reduzir as taxas de IRS em todos os escalões e retomar uma reforma do IRC – que já tinha estado pactuada com o PS e depois foi rasgada pelo doutor António Costa – que permitirá uma redução faseada mas progressiva dessa taxa de IRC. E isto significa que, tendo mais rendimentos, as famílias poderão ter maiores possibilidades de investimento e de consumo, e as empresas terão maior liquidez para criar postos de trabalho, para se renovarem, para se modernizarem, e para aumentarem salários. Ou seja, é uma questão do modelo económico e do modelo social, que está aqui muito em causa nesta disputa entre o Partido Socialista e a Aliança Democrática.

    Resumindo, o que propõe é, de facto, retirar aquela questão ideológica de muitas das medidas e políticas que têm existido em Portugal?

    Sim; se há uma marca registada deste Partido Socialista, eu diria que assenta na “entrega” de ideologia para tentar resolver problemas, mas por essa via, apenas os agravou – foi assim na saúde, com o fim de parcerias-público privadas, foi assim na educação, com o fim dos contratos de associação, foi assim na habitação, com o programa Mais Habitação, que, como bem sabe, no limite, defendeu e prevê arrendamentos compulsivos; coisa que eu já tinha visto nos espaços socialistas, mas muito pouco nas democracias ocidentais civilizadas. Portanto, há realmente essa diferença e essa fronteira entre a AD – que privilegia o mercado com coesão social, a liberdade e a livre iniciativa, e que acredita no dinamismo da sociedade – e a esquerda, particularmente o PS, que acreditam numa estatização da sociedade e da economia, numa perspectiva que é paternalista, e que diz às pessoas o que podem e não podem fazer, ou onde podem e não podem investir. E, enfim, em relação a esta última estratégia, depois de oito anos… Na verdade, se pensarmos que o PS, nos últimos 27, governou 20, e teve sempre todos os meios; nós achamos que isto não resulta, mas é uma opção legítima para quem queira. Quem não se resigna, e acha que Portugal pode ser muito melhor, tem uma outra estratégia, que é a AD – uma possibilidade que eu acredito que sairá vencedora e, no final, mostrará a todos em Portugal um futuro muito melhor.

    Para terminar: antevê que esta coligação pode continuar, nomeadamente para as europeias e para futuras eleições?

    Sim. Esta é uma coligação que foi feita para as eleições legislativas, com incidência de Governo, bem como para as eleições europeias, e vai até às eleições autárquicas; muito embora nas eleições autárquicas, naturalmente, com respeito também por aquilo que são as prorrogativas próprias das estruturas locais. E, portanto, aí, sem que seja numa base impositiva, mas com total abertura para que a coligação funcione sempre que seja desejável.

    Transcrição de Maria Afonso Peixoto.


    Veja AQUI a página na Internet com informação do CDS-PP.

    Veja AQUI o programa da coligação Aliança Democrática.


  • ‘Julian Assange tem sido um canário na mina de carvão’

    ‘Julian Assange tem sido um canário na mina de carvão’

    Num momento em que a Justiça britânica está a decidir se extradita para os Estados Unidos o jornalista Julian Assange, o fundador da Wikileaks, o PÁGINA UM entrevistou a sua mulher Stella Assange. A advogada e activista dos direitos humanos não tem dúvidas de que o pico da era de liberdade de imprensa e de liberdade de expressão no mundo ocidental já passou e avisa que o mundo ocidental tem vindo a cair numa espiral de censura, cada vez mais sofisticada. Julian Assange, actualmente com 52 anos, foi detido há quase cinco anos, encontrando-se numa prisão de alta segurança em Londres e num estado muito debilitado, física e psicologicamente. O pedido de extradição dos Estados Unidos serve para julgar Assange por ter publicado em 2010 no Wikileaks informação confidencial que denunciava crimes de guerra. Um dos desejos de Stella, confessou ao PÁGINA UM, depois da desejada libertação de Julian Assange – que recentemente recebeu o apoio do chanceler alemão Olaf Scholz – será uma visita conjunta a Portugal.

    O PÁGINA UM divulga já na íntegra o vídeo da entrevista a Stella Assange conduzida pela jornalista Elisabete Tavares, em inglês, estando também na plataforma Spotify. Ainda hoje, o PÁGINA UM publicará a entrevista editada em português, em formato de texto.


    Veja aqui o vídeo completo da entrevista a STELLA ASSANGE conduzida pela jornalista Elisabete Tavares.


    Se preferir, pode ouvir aqui a entrevista integral a STELLA ASSANGE no Spotify.


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  • Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Luís Montenegro, presidente do Partido Social Democrata

    Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Luís Montenegro, presidente do Partido Social Democrata

    Como sucedeu com todos os outros 23 líderes partidários, o PSD foi convidado a participar na rubrica HORA POLÍTICA, uma iniciativa única na imprensa em Portugal, que visa contribuir para uma democracia com maior pluralismo e diversidade, concedendo espaço para uma entrevista em pé de igualdade.

    Apesar das inúmeras insistências, Luís Montenegro, presidente do PSD, não mostrou disponibilidade para ser entrevistado pelo PÁGINA UM. É apenas a quinta HORA POLÍTICA sem a presença de um líder partidário (seguindo a opção de Rui Tavares, Mariana Mortágua, Gonçalo da Câmara Pereira e Pedro Nuno Santos) depois de 17 entrevistas concedidas ao PÁGINA UM por líderes partidários.

    Curiosamente, as assessorias de comunicação do PSD e do PS tentaram sempre saber se o outro partido iria conceder a entrevistas, acabando assim por nenhum dos dois se mostrar disponível, o que tem um significado em termos de democraticidade.

    O PÁGINA UM dedica assim uma ‘hora de silêncio’ ao PSD, e aproveita para divulgar as 17 entrevistas que já publicámos anteriormente. Todas as entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A NÃO-ENTREVISTA DE LUÍS MONTENEGRO, PRESIDENTE DO PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA, (QUE NÃO FOI) CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Luís Montenegro, presidente do Partido Social Democrata, optou por não conceder entrevista ao único órgão de comunicação social com uma iniciativa em que não discriminava nenhum partido independentemente de deter ou não representação parlamentar.

    Este espaço, que seria do Partido Social Democrata, fica assim dedicado a divulgar novamente as 17 entrevistas já publicadas pelo PÁGINA UM aos 10 líderes políticos do partidos inscritos no Tribunal Constitucional por ordem crescente de antiguidade. Esta postura do PÁGINA UM será repetida caso se verifiquem ‘faltas’ idênticas. Saliente-se que foram convidados todos os líderes (e apenas os líderes) dos 24 partidos, independentemente de estarem representados na Assembleia da República ou de participarem nas próximas eleições, sendo a sua divulgação feita por ordem crescente de antiguidade, terminando no dia 6 de Março com a entrevista ao Partido Comunista Português, o mais antigo do país.

    Líderes dos partidos com entrevistas já publicadas, cuja sequência de publicação remete para a sua antiguidade, em função da data da inscrição no Tribunal Constitucional.

    OSSANDA LIBER, presidente da Nova Direita


    ANA CARVALHO e DUARTE COSTA, co-líderes do Volt Portugal


    MÁRCIA HENRIQUES, presidente do Reagir Incluir Reciclar (RIR)


    ANDRÉ VENTURA, presidente do Chega


    JORGE NUNO SÁ, presidente do Aliança (concorre com o Partido da Terra na coligação Alternativa 21)


    RUI ROCHA, presidente da Iniciativa Liberal


    RUI LIMA, presidente do PURP


    JOAQUIM ROCHA AFONSO, presidente do Nós, Cidadãos


    BRUNO FIALHO, presidente da Alternativa Democrática Nacional (ADN)


    ÉLVIO SOUSA, secretário-geral do Juntos pelo Povo


    GIL GARCIA, líder do Movimento Alternativa Socialista (MAS)


    INÊS SOUSA REAL, porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza (PAN)


    JOSÉ MANUEL COELHO, vice-presidente do Partido Trabalhista Português (PTP)


    PEDRO SOARES PIMENTA, presidente do Partido da Terra


    JOSÉ PINTO-COELHO, presidente do Ergue-te


    MARIANA SILVA, porta-voz do Partido Ecologista Os Verdes


    CIDÁLIA GUERREIRO, secretária-geral do PCTP/MRPP


    Pode consultar AQUI a programa da Nova Direita.

    Pode consultar AQUI o programa do Volt Portugal.

    Pode consultar AQUI o programa do RIR – Reagir Incluir Reciclar.

    Pode consultar AQUI o programa do Chega.

    Pode consultar AQUI o programa da coligação Alternativa 21 integrada pelo partido Aliança.

    Pode consultar AQUI o programa da Iniciativa Liberal.

    Pode consultar AQUI a página do PURP.

    Pode consultar AQUI o programa do Nós, Cidadãos.

    Pode consultar AQUI o programa do ADN – Alternativa Democrática Nacional.

    Pode consultar AQUI o programa do Juntos Pelo Povo.

    Pode consultar AQUI a página do MAS.

    Pode consultar AQUI o programa do PAN.

    O PTP não tem programa disponível online.

    Pode consultar AQUI a página do MPT-Partido da Terra.

    Pode consultar AQUI o programa do Ergue-te.

    Pode consultar AQUI o programa do Partido Ecologista Os Verdes.

    Pode consultar AQUI a página com informação do PCTP/MRPP


  • Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Pedro Nuno Santos, secretário-geral do Partido Socialista

    Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Pedro Nuno Santos, secretário-geral do Partido Socialista

    Como sucedeu com todos os outros 23 líderes partidários, o PS foi convidado a participar na rubrica HORA POLÍTICA, uma iniciativa única na imprensa em Portugal, que visa contribuir para uma democracia com maior pluralismo e diversidade, concedendo espaço para uma entrevista em pé de igualdade.

    Apesar das inúmeras insistências, Pedro Nuno Santos, secretário-geral do PS, não mostrou disponibilidade para ser entrevistado pelo PÁGINA UM. O gabinete de comunicação de Pedro Nuno Santos procurou saber sempre se Luís Montenegro, líder do PSD, também aceitaria ou não conceder entrevista ao PÁGINA UM. A entrevista ao presidente do PSD não foi ainda realizada, estando o seu espaço de entrevista previsto para esta segunda-feira. Poderá ser assim a quinta HORA POLÍTICA sem a presença de unm líder partidário (seguindo a opção de Rui Tavares, Mariana Mortágua e Gonçalo da Câmara Pereira) ou a 18ª HORA POLÍTICA com entrevista concedida por líderes partidários.

    O PÁGINA UM dedica assim uma ‘hora de silêncio’ ao PS, e aproveita para divulgar as 17 entrevistas que já publicámos anteriormente. Todas as entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A NÃO-ENTREVISTA DE PEDRO NUNO SANTOS, SECRETÁRIO-GERAL DO PARTIDO SOCIALISTA, (QUE NÃO FOI) CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Pedro Nuno Santos, secretário-geral do Partido Socialista, optou por não conceder entrevista ao único órgão de comunicação social com uma iniciativa em que não discriminava nenhum partido independentemente de deter ou não representação parlamentar.

    Este espaço, que seria do Partido Socialista, fica assim dedicado a divulgar novamente as 17 entrevistas já publicadas pelo PÁGINA UM aos 10 líderes políticos do partidos inscritos no Tribunal Constitucional por ordem crescente de antiguidade. Esta postura do PÁGINA UM será repetida caso se verifiquem ‘faltas’ idênticas. Saliente-se que foram convidados todos os líderes (e apenas os líderes) dos 24 partidos, independentemente de estarem representados na Assembleia da República ou de participarem nas próximas eleições, sendo a sua divulgação feita por ordem crescente de antiguidade, terminando no dia 6 de Março com a entrevista ao Partido Comunista Português, o mais antigo do país.

    Líderes dos partidos com entrevistas já publicadas, cuja sequência de publicação remete para a sua antiguidade, em função da data da inscrição no Tribunal Constitucional.

    OSSANDA LIBER, presidente da Nova Direita


    ANA CARVALHO e DUARTE COSTA, co-líderes do Volt Portugal


    MÁRCIA HENRIQUES, presidente do Reagir Incluir Reciclar (RIR)


    ANDRÉ VENTURA, presidente do Chega


    JORGE NUNO SÁ, presidente do Aliança (concorre com o Partido da Terra na coligação Alternativa 21)


    RUI ROCHA, presidente da Iniciativa Liberal


    RUI LIMA, presidente do PURP


    JOAQUIM ROCHA AFONSO, presidente do Nós, Cidadãos


    BRUNO FIALHO, presidente da Alternativa Democrática Nacional (ADN)


    ÉLVIO SOUSA, secretário-geral do Juntos pelo Povo


    GIL GARCIA, líder do Movimento Alternativa Socialista (MAS)


    INÊS SOUSA REAL, porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza (PAN)


    JOSÉ MANUEL COELHO, vice-presidente do Partido Trabalhista Português (PTP)


    PEDRO SOARES PIMENTA, presidente do Partido da Terra


    JOSÉ PINTO-COELHO, presidente do Ergue-te


    MARIANA SILVA, porta-voz do Partido Ecologista Os Verdes


    CIDÁLIA GUERREIRO, secretária-geral do PCTP/MRPP


    Pode consultar AQUI a programa da Nova Direita.

    Pode consultar AQUI o programa do Volt Portugal.

    Pode consultar AQUI o programa do RIR – Reagir Incluir Reciclar.

    Pode consultar AQUI o programa do Chega.

    Pode consultar AQUI o programa da coligação Alternativa 21 integrada pelo partido Aliança.

    Pode consultar AQUI o programa da Iniciativa Liberal.

    Pode consultar AQUI a página do PURP.

    Pode consultar AQUI o programa do Nós, Cidadãos.

    Pode consultar AQUI o programa do ADN – Alternativa Democrática Nacional.

    Pode consultar AQUI o programa do Juntos Pelo Povo.

    Pode consultar AQUI a página do MAS.

    Pode consultar AQUI o programa do PAN.

    O PTP não tem programa disponível online.

    Pode consultar AQUI a página do MPT-Partido da Terra.

    Pode consultar AQUI o programa do Ergue-te.

    Pode consultar AQUI o programa do Partido Ecologista Os Verdes.

    Pode consultar AQUI a página com informação do PCTP/MRPP


  • Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Gonçalo da Câmara Pereira, presidente do Partido Popular Monárquico

    Oiça e leia a ‘não-entrevista’ de Gonçalo da Câmara Pereira, presidente do Partido Popular Monárquico

    O Partido Popular Monárquico, fundado em 1975, integra a coligação Alternativa Democrática (AD) com o PSD e o CDS-PP nas actuais eleições legislativas. Como sucedeu com todos os outros 23 líderes partidários, o PPM foi convidado a participar na rubrica HORA POLÍTICA, uma iniciativa única na imprensa em Portugal, que visa contribuir para uma democracia com maior pluralismo e diversidade, concedendo espaço para uma entrevista em pé de igualdade. Apesar das inúmeras insistências, Gonçalo da Câmara Pereira, presidente do PPM, não mostrou disponibilidade, por estar em silêncio durante a campanha para as eleições legislativas. O PPM é, por isso, a terceira ausência (após o Livre, de Rui Tavares, e o Bloco de Esquerda, de Mariana Mortágua) no meio de 17 entrevistas (já publicadas), que incluíram partidos sem e com assento parlamentar (Iniciativa Liberal, Chega e PAN). O PÁGINA UM dedica assim uma ‘hora de silêncio’ ao PPM, e aproveita para divulgar as 10 entrevistas que já publicámos anteriormente. Todas as entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A NÃO-ENTREVISTA DE GONÇALO DA CÂMARA PEREIRA, PRESIDENTE DO PARTIDO POPULAR MONÁRQUICO, (QUE NÃO FOI) CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Gonçalo da Câmara Pereira, presidente do Partido Popular Monárquico (PPM) encontra em silêncio durante a campanha eleitoral e optou por não conceder entrevista ao único órgão de comunicação social com uma iniciativa em que não discriminava nenhum partido independentemente de deter ou não representação parlamentar.

    Este espaço, que seria do Partido Popular Monárquico, fica assim dedicado a divulgar novamente as 17 entrevistas já publicadas pelo PÁGINA UM aos 10 líderes políticos do partidos inscritos no Tribunal Constitucional por ordem crescente de antiguidade. Esta postura do PÁGINA UM será repetida caso se verifiquem ‘faltas’ idênticas. Saliente-se que foram convidados todos os líderes (e apenas os líderes) dos 24 partidos, independentemente de estarem representados na Assembleia da República ou de participarem nas próximas eleições, sendo a sua divulgação feita por ordem crescente de antiguidade, terminando no dia 6 de Março com a entrevista ao Partido Comunista Português, o mais antigo do país.

    Líderes dos partidos com entrevistas já publicadas, cuja sequência de publicação remete para a sua antiguidade, em função da data da inscrição no Tribunal Constitucional.

    OSSANDA LIBER, presidente da Nova Direita


    ANA CARVALHO e DUARTE COSTA, co-líderes do Volt Portugal


    MÁRCIA HENRIQUES, presidente do Reagir Incluir Reciclar (RIR)


    ANDRÉ VENTURA, presidente do Chega


    JORGE NUNO SÁ, presidente do Aliança (concorre com o Partido da Terra na coligação Alternativa 21)


    RUI ROCHA, presidente da Iniciativa Liberal


    RUI LIMA, presidente do PURP


    JOAQUIM ROCHA AFONSO, presidente do Nós, Cidadãos


    BRUNO FIALHO, presidente da Alternativa Democrática Nacional (ADN)


    ÉLVIO SOUSA, secretário-geral do Juntos pelo Povo


    GIL GARCIA, líder do Movimento Alternativa Socialista (MAS)


    INÊS SOUSA REAL, porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza (PAN)


    JOSÉ MANUEL COELHO, vice-presidente do Partido Trabalhista Português (PTP)


    PEDRO SOARES PIMENTA, presidente do Partido da Terra


    JOSÉ PINTO-COELHO, presidente do Ergue-te


    MARIANA SILVA, porta-voz do Partido Ecologista Os Verdes


    CIDÁLIA GUERREIRO, secretária-geral do PCTP/MRPP


    Pode consultar AQUI a programa da Nova Direita.

    Pode consultar AQUI o programa do Volt Portugal.

    Pode consultar AQUI o programa do RIR – Reagir Incluir Reciclar.

    Pode consultar AQUI o programa do Chega.

    Pode consultar AQUI o programa da coligação Alternativa 21 integrada pelo partido Aliança.

    Pode consultar AQUI o programa da Iniciativa Liberal.

    Pode consultar AQUI a página do PURP.

    Pode consultar AQUI o programa do Nós, Cidadãos.

    Pode consultar AQUI o programa do ADN – Alternativa Democrática Nacional.

    Pode consultar AQUI o programa do Juntos Pelo Povo.

    Pode consultar AQUI a página do MAS.

    Pode consultar AQUI o programa do PAN.

    O PTP não tem programa disponível online.

    Pode consultar AQUI a página do MPT-Partido da Terra.

    Pode consultar AQUI o programa do Ergue-te.

    Pode consultar AQUI o programa do Partido Ecologista Os Verdes.

    Pode consultar AQUI a página com informação do PCTP/MRPP


  • ‘Somos contra os subsídios. As pessoas têm de trabalhar para um ordenado digno’

    ‘Somos contra os subsídios. As pessoas têm de trabalhar para um ordenado digno’

    O Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses – mais conhecido por PCTP/MRPP – nasceu em 1970 e foi inscrito oficialmente junto do Tribunal Constitucional em 1975. No seu arranque, contou com a adesão de muitos estudantes que viriam a ser figuras de relevo na sociedade portuguesa, como Saldanha Sanches, Maria José Morgado e Durão Barroso. Teve também na sua liderança, durante muitos anos, o professor universitário e advogado António Garcia Pereira, que se demitiu do partido em 2015 em rota de colisão com o fundador Arnaldo Matos. Agora, Cidália Guerreiro, 69 anos, professora aposentada, é a líder, como secretária-geral, do PCTP/MRPP. E mantém a atitude crítica, defendendo que celebrar o 25 de Abril mostra ser uma mera formalidade, porque a população é hoje tão explorada como antes da Revolução dos Cravos. Acredita também que o Mundo caminha para uma Terceira Guerra Mundial e que Portugal já não tem soberania, fazendo parte do imperialismo globalizado. Esta é a 17ª entrevista da HORA POLÍTICA, a rubrica do PÁGINA UM que deseja concretizar o objectivo de conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE CIDÁLIA GUERREIRO, SECRETÁRIA-GERAL DO PCTP/MRPP, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    O PCTP/MRPP é um partido que anda de mãos dadas com aquilo que é a História de Portugal, até antes da democracia.

    Sim; o partido foi fundado antes do 25 de Abril – que parece ser aquele marco que instaura a democracia. Nasceu a 18 de Setembro de 1970, e naturalmente que antes também já tinha algumas raízes. Foi um partido que nasceu para combater a ditadura fascista, mas também porque considerava que não havia um verdadeiro Partido Comunista; e que o Partido Comunista da altura era um partido revisionista – e por isso aquela célebre frase que sempre tínhamos: ”morte ao fascismo e ao social-fascismo”.

    E era uma luta muito de estudantes, não era?

    Sim; o partido começou exactamente com um movimento estudantil, nomeadamente uma organização que se chamava, creio, ”Vamos ao Trabalho”, na Faculdade de Direito.

    Cidália Guerreiro na sede do PCTP/MRPP, em Lisboa. (Foto: PÁGINA UM)

    Nessa altura, já estava integrada no movimento?

    Ainda não; eu integrei-me no partido já em 1974, quando vim para Lisboa. Nessa altura, o movimento era muito dinâmico e praticamente toda a juventude militava ou, pelo menos, aderia às ideias do partido. Nessa altura, o partido também encetou uma grande luta relativamente à Guerra colonial e teve uma intervenção muito grande.

    E tiveram também, nessa altura, várias figuras mediáticas ligadas ao partido, como António Garcia Pereira e Durão Barroso.

    Pois; isso aconteceu. Como disse, uma grande parte da juventude aderiu ao partido e às suas ideias. Depois, naturalmente, com todo o desenvolvimento, foram-se distanciando, tomaram outros caminhos, fizeram outras escolhas e estão numa outra “barricada” [risos].

    Estamos prestes a comemorar, e tem havido uma grande campanha mediática em torno disso, os 50 anos de democracia. O que significa para si e para o PCTP-MRPP estes 50 anos desde o 25 Abril?

    Teríamos, se calhar, de voltar um pouco atrás; que é perceber o que foi o 25 de Abril. Por um lado, o que foi inicialmente, que nós não consideramos uma revolução; consideramos que houve uma movimentação a partir das Forças Armadas, e que não pretendia ser muito mais do que isso? Na verdade, na chamada Madrugada de Abril, a população que foi convidada para ficar em casa, acabou por ter outra decisão e ir para a rua. E foi esse movimento de massas que veio alterar o que estava inicialmente previsto, que seria apenas uma mudança de um sector da burguesia para outro. Foi um golpe de Estado levado a cabo pelos militares, que tinha a ver com a situação da Guerra colonial.

    E revê-se na forma como estão a ser programadas as comemorações e como tem sido, aliás, celebrado o 25 de Abril em Portugal nos últimos anos?

    Não. Até porque, neste momento, o que nós temos de democracia, e que estaria subjacente à própria movimentação das massas e que foi feito com uma grande espontaneidade e alegria; e o “garrote” que tínhamos que não só a nível de falta de liberdade, mas da própria exploração intensa das pessoas – isso não se concretizou. Portanto, não sei bem o que vamos celebrar neste 25 de Abril. É uma celebração oficial, uma formalidade. Era bom que se reflectisse sobre o que se pretendia com o 25 de Abril, nomeadamente na parte da população, e aquilo que hoje temos. Porque a população que na altura tinha grandes dificuldades, e estava sujeita a uma grande exploração, hoje não tem grandes diferenças na sua vida e no seu dia-a-dia; ela debate-se novamente com problemas económicos, de Saúde, habitação. Quase que voltámos ao princípio, numa outra versão.

    Para além do nível de democracia que nos últimos anos, sobretudo a partir de 2020, com muitas medidas, catastróficas, que se vêem pelo excesso de mortalidade também. Mas houve um recuo enorme no nível democrático em países ocidentais, incluindo em Portugal.

    Se nós tivéssemos – que nunca tivemos – qualquer ilusão relativamente ao que era a democracia burguesa, tudo ficou muito claro aquando das prisões, em Maio de 1975, em que 430 militantes do nosso partido foram presos e ficaram encarcerados em Caxias a mando do COPCON.

    Portanto, logo a partir daí, entende que ficou comprometido o processo do avanço democrático?

    É a democracia burguesa [risos]. A ideia de democracia burguesa não é bem de igualdade para todos; diz-se isso, mas não é. Aliás, o nosso partido neste momento sofre uma perseguição muito grande a nível de exigências da legalidade. Estamos constantemente confrontados, por exemplo, com multas excessivas, porque se encontra uma ou outra irregularidade; que não justificam essas multas.

    O partido deixou de ter subvenção, ou seja, deixou de ter acesso a um apoio que se dá aos partidos para as suas tarefas e operações. E no que respeita às multas, tem exactamente os mesmos valores para os partidos grandes, que têm enormes subvenções.

    Tem, mas com algumas diferenças. Nós estamos sujeitos, por exemplo, a contabilidades organizadas e temos de ser nós a fazê-las. A verdade é que os grandes partidos em Portugal transformaram-se em empresas. E a partir do momento em que os partidos não são partidos, com uma intervenção política na sociedade através das suas ideologias, mas passam a ser, quase à maneira americana, empresas que têm capitais, negócios, operações financeiras e tudo isso, a desigualdade surge; é inevitável. Nós não temos uma subvenção, mas também não concordamos com subvenções. Evidentemente, quando estamos no sistema, não o deitamos fora; utilizamo-lo. Mas, se os partidos querem igualdade, efectivamente deveriam concorrer às eleições em pé de igualdade. Ora, se nós temos um orçamento de 3.000 euros para estas eleições – e nem sabemos se o vamos ter… Estas eleições são muito mais caras do que as anteriores; os orçamentos previstos perfazem os dois milhões de euros, e são dinheiros públicos.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Não concorda com isso?

    Não; não deveria haver subvenções, absolutamente nada. Os partidos deviam ter os seus próprios meios; porque só assim é que se poderia pensar – e mesmo assim, não seria completamente claro – que os partidos não estão ao serviço de ninguém.

    E como é que o partido sobrevive em termos financeiros?

    Sobrevive só com as quotas, donativos e fundos dos seus militantes, simpatizantes e outros apoiantes; mais nada.

    E não é suficiente?

    Claro que não; e por isso, não temos possibilidade de fazer uma propaganda que dê visibilidade ao partido. Muitas vezes, as pessoas interrogam-se porque é que não aparecemos mais – não aparecemos porque esta também é uma forma da dita democracia nos silenciar.

    E a imprensa, que também tem estado em crise, mas não entende dá sempre mais atenção aos partidos que já têm mais meios financeiros para fazer campanha?

    Isso é evidente; mesmo nos próprios espaços que são dados, os grandes partidos têm uma campanha completamente diferente; basta ver o que está a acontecer neste momento, com todos os debates. Ainda lhes dá bastante tempo para expressarem as suas propostas; embora elas até nem sejam muito diferentes umas das outras, se formos a ver. Já os chamados pequenos partidos, têm um debate único. E, aliás, importa lembrar que esse debate até foi imposto pelo nosso partido em 2011. Mas são debates em que, quase em 10 minutos, somos bombardeados com perguntas que temos de responder num tempo recorde – é quase impossível.

    E entende que essa situação deveria mudar, em termos daquilo que é o acompanhamento da imprensa?

    Naturalmente; se falamos em igualdade, então deveria haver igualdade de todas as maneiras, tanto a nível da imprensa como dos meios, e em todos os aspectos. Só assim é que se via o que cada um pode oferecer. E mais: por exemplo, em relação aos próprios negócios – porque, depois, isto é um investimento para os grandes partidos… Já não me lembro quanto é que o PS vai investir, mas acho que são 3 ou 4 milhões. Mas é um investimento para poderem estar em sectores-chaves que lhes permitem fazer grandes negociatas, tal como vemos, depois, o que acontece a nível da corrupção. Isto é um pé para entrar noutro nível.

    E o que é hoje o PCTP-MRPP? Ainda é o mesmo partido de há 50 anos ou mudou alguma coisa?

    Na aparência, mudaram algumas coisas, mas em termos de programa, mantém-se o mesmo. Mesmo em relação às eleições, estamos numa posição um bocadinho difícil, porque nós achamos que as eleições não vão resolver nenhum dos problemas da população.

    Porquê? Porque é que têm essa visão?

    Aqueles que nós defendemos, que é a população trabalhadora, não vai deixar de ser explorada porque o sistema não vai mudar. Nada vai mudar com as eleições nem com algumas reformas que neste momento estão a ser propostas. E é aí que nós também criticamos alguns partidos que se dizem de esquerda porque criam a ilusão de que as eleições vão melhorar e que uma ou outra reforma vai melhorar as coisas; não vai. E chegará uma altura em que não vai mesmo melhorar, e nem vai ser possível até introduzir reformas. O sistema tem de ser alterado, efectivamente, e só vai ser alterado quando a população estiver consciente de que isso tem de ser feito. E nós estamos cá exactamente para denunciar o carácter das eleições, e por isso, não deixámos de estar presentes nelas. Daí que eu estivesse a dizer que é difícil, porque dizemos que não acreditamos que as eleições resolvam, mas estamos cá, e as pessoas perguntam porque é que estamos. Estamos, exactamente para dizer que há outro caminho; porque também não podemos chegar à situação de dizer que votámos, e não conseguimos. Não; há outro caminho. Então, vamos votar, mas com consciência de que isso não vai resolver, e quando tivermos essa consciência, veremos então como é que resolvemos.

    E é um partido que mantém o seu cariz de uma esquerda mais radical e que tem sido também crítico da actuação do PCP e do Bloco de Esquerda, por exemplo, naqueles anos em que apoiaram o Governo de António Costa.

    E que não resolveram absolutamente nada. Portanto, isso vem provar aquilo que acabei exactamente de dizer. Não foi porque se fizeram algumas reformas que as coisas se alteraram; pelo menos, os problemas de fundo da população subsistem. O que é que se criou? A ilusão de que se poderia alterar. E, aliás, hoje estamos a pagar bem caro essa ilusão. Os portugueses todos [risos]. E os portugueses também terão que se interrogar todos porque é que estamos em eleições. Porque já fomos para eleições em 2022 com um Governo que não completou a legislatura.

    Uma imagem de Karl Marx na sede do partido.
    (Foto: PÁGINA UM)

    E em que o PCTP/MRPP esteve presente.

    Sim, nós denunciámos a situação, dissemos que as eleições estavam a ocorrer e que o próprio Parlamento se tinha implodido a ele próprio porque era necessário alterar a correlação de forças devido a algumas alterações que estavam a surgir. Nomeadamente a gestão dos milhões do PRR, que estava para vir. E portanto, essa implosão não foi natural – aconteceu porque era necessária. E depois tivemos uma maioria absoluta; e não se percebe porque é que o Governo caiu. Aparentemente, não seria por motivos políticos, propriamente, mas sim pela Justiça; o que não deixa de ser política, porque o que está em causa é a forma como um Governo de maioria absoluta geriu os nossos dinheiros, o dinheiro do povo.

    Sim, porque muitas vezes há governantes que dizem que o Governo nos deu isto ou aquilo, mas o Governo não dá nada, na verdade, porque o dinheiro é dos contribuintes.

    Toda a razão; as pessoas falam dessa forma, dizem que o Governo tem de ajudar e ter pena de nós… Não dão nada, porque o Governo o que faz é gerir o dinheiro do país. E como é que vai gerir? Aqui é que nós vemos, porque não gere a favor da população, mas sim a favor daqueles que efectivamente mandam no Governo – a favor dos grandes monopólios dos capitalistas e desses interesses. E isto, agravado pelo facto de Portugal não ter qualquer autonomia nem independência, e nem o próprio orçamento pode fazer porque ele tem sempre de ser aprovado pela União Europeia. E nós também denunciámos isso nas últimas eleições. Porque quando falamos eleições, se quisermos ser sérios, temos que ver em que contexto e em que cenário é que as eleições acontecem. Primeiro ponto: não há qualquer autonomia a partir do momento em que estamos inseridos na UE e na NATO; temos de fazer aquilo a que essa situação nos obriga – se a UE achar que o nosso orçamento está errado, não o aprova. Se achar que vamos ter de ter uma economia de guerra, é essa economia que vamos ter. Portanto, todas as promessas que neste momento até estão a ser feitas – e sei que ainda estamos em altura de saldos porque o mês de Fevereiro ainda não terminou –,  tudo isto é tão exagerado que deixa de ser credível. Ninguém acredita que estas promessas são para se fazer; estas promessas são para chegar ao poder. E chegados ao poder, depois, o que vai acontecer? O que já aconteceu: de dois em dois anos temos um novo Governo, e se calhar agora até vamos ter num intervalo mais curto.

    E estão a ser negociadas alterações ao nível do Regulamento Sanitário Internacional, bem como o novo Tratado Pandémico, e há países que estão de pé atrás relativamente ao que está a ser desenhado, que é um grande reforço do poder da Organização Mundial de Saúde. Como sabemos, é uma organização importante, mas também está vulnerável a interesses privados. Também vos preocupa que haja este tipo de evolução, não só a nível comunitário, de estas organizações internacionais se poderem imiscuir nas decisões do país?

    Preocupa-nos, mas não nos surpreende. Nós sempre fomos dizendo – é evidente que não somos suficientemente ouvidos – que o capitalismo atingiu o seu estado supremo, que é o imperialismo, e que está globalizado e ‘mundializado’. E como agora se chegou ao ponto em que as crises capitalistas não estão a ser resolvidas por uma via pacífica, vai extrapolar para a guerra, que é exactamente aquilo em que, neste momento, estamos. Quando há uma potência imperialista hegemónica como os Estados Unidos, que está a perder poder e a vê-lo fugir para uma outra potência em crescimento, que neste caso é a China, vai recorrer a todas as estratégias para conseguir sobreviver. E é exactamente nesse nível que nós estamos. Já estamos numa guerra inter-imperialista, que se vai desenvolver rapidamente – e nós queremos chamar a atenção para isso. Neste momento, temos a guerra na Ucrânia e no Médio Oriente, e naturalmente, a nível de desenvolvimento económico, vai ter consequências.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Mas os Estados Unidos parecem estar com vontade de se envolver em mais conflitos…

    São obrigados a fazer isso, mas estão a perder as guerras todas. A Europa já perdeu a guerra, naturalmente, também na Ucrânia. E aquilo que nós vemos e isso também nos preocupa, porque são sinais, quando temos o Chanceler alemão a dizer que vamos ter de nos armar e que todos os países europeus vão ter de produzir armamento. E que vamos ter de criar um escudo nuclear com a França e com a Grã-Bretanha. Ora, se neste momento a palavra de ordem é armamento, qual é o cenário que se nos vai colocar? Quando temos agricultores na Alemanha a fazerem as suas manifestações porque lhes foi retirado o subsídio do gasóleo, e quando a própria Alemanha diz que não vai repor porque agora a economia é outra, significa que estamos a entrar num caminho do alargamento de uma terceira Guerra Mundial – que vai ser bastante violenta e pode levar-nos num grau de destruição e de sofrimento muito grandes. E nós temos a obrigação de o denunciar, porque é uma guerra que não é nossa, não é connosco.

    Mas as guerras dão muitos lucros, ao nível da indústria de armamento. E nos anos de pandemia houve uma enorme transferência de riqueza, como em geral acontece em grandes crises, mas neste caso para as grandes multinacionais; não só farmacêuticas, mas tecnológicas, e as empresas cotadas em Portugal, como as maiores empresas de energia e dos supermercados. Portanto estamos numa altura em que há muita riqueza para essas entidades.

    Sim, disse tudo com a sua pergunta [risos]. A Ucrânia também serviu para gastar as armas que já não interessam – portanto, os Estados Unidos têm ganhado bastante dinheiro nisto tudo – e para experimentar um novo armamento. No fundo, isto é uma preparação.

    Entende que é uma preparação?

    É. Uma preparação para aquilo que se vai instalar. Até já temos um alinhamento de vários blocos para esta terceira guerra; e neste momento, é muito difícil evitá-la.

    Portanto, já está a deixar aqui esse aviso, porque é aquilo que consegue perceber que vai acontecer…

    Sim, e Portugal não devia envolver-se nesta guerra, não tem nada a ver com ela, nem vai ganhar nada com ela. E nós tivemos sempre uma palavra de ordem já antes de 1974, mas logo a seguir ao 25 de Abril fizemos bastantes manifestações relativamente à presença da NATO em Portugal; e a palavra de ordem era “NATO fora de Portugal”, e continuamos a tê-la. Portanto, as ideias fundamentais do partido mantêm-se.

    A propósito dessas palavras de ordem, e como há pouco referiu, acha que Portugal ainda manda alguma coisa? Ainda há decisões que possa sequer tomar?

    Portugal não manda absolutamente nada, Portugal obedece.

    António Garcia Pereira liderou o PCTP/MRPP e foi candidato em diversos actos eleitorais, incluindo à presidência da República. Demitiu-se do partido em 2015, após fortes críticas internas. (Foto: D.R.)

    Embora haja países na União Europeia, e tivemos o caso do Brexit, que têm criticado a forma como a Comissão Europeia e a União Europeia se têm comportado.

    Sim, mas nós não mudámos absolutamente nada; sempre fomos contra a integração de Portugal na União Europeia, e também em relação à Comunidade Económica Europeia [CEE]. Nós dissemos foi que não foi Portugal que entrou na CEE, foi a CEE que entrou em Portugal. Portanto, essas coisas que precisam às vezes de tempo para se perceber, neste momento estamos a perceber quais são as consequências da nossa perda de soberania quando entrámos na UE, e quando perdemos a nossa moeda. Quando passámos a ter o euro, parece que ficou tudo muito satisfeito, ou criou-se a ideia de que estávamos a receber muito dinheiro dos países ricos sem termos que fazer nada; que é uma posição perfeitamente oportunista. Alguns receberão dinheiro, mas enfim. A verdade é que Portugal não tem autonomia absolutamente nenhuma, só tem que obedecer – faz parte de um imperialismo. As pessoas dizem que não são imperialistas, e que até somos um país pobre; mas não é assim. Portugal faz parte do imperialismo, e dentro do imperialismo globalizado, tem uma função; a função que lhe for dada, é essa que ele vai fazer.

    A discussão que está a colocar na mesa não tem sido falada, apesar da gravidade do que se passa a nível da política internacional; o que se tem visto nas campanhas, como referiu, são muitas promessas dos partidos. Os portugueses vão ter o PCTP/MRPP no boletim de voto? Apresentaram listas para estas eleições?

    Sim; embora dentro do partido se tenha discutido muito se este ainda é o momento de concorrermos a eleições, dado o desgaste, a destruição e a desilusão com aquilo que nós chamamos a democracia burguesa.

    (Foto: PÁGINA UM)

    E estão em todos os círculos?

    Não, estamos só em alguns circos. É do conhecimento geral que o partido está a passar por algumas dificuldades internas, e está a tentar reorganizar-se e reforçar-se.

    E em que círculos concorrem?

    De qualquer das formas, no conjunto dos círculos abrangemos, pelo menos, mais de metade da população votante – estamos em Lisboa, Setúbal, Porto, Braga, Aveiro, Beja, Portalegre, Castelo Branco e Europa.

    E que propostas é que têm no vosso programa para os temas que entende serem mais importantes para os portugueses?

    Antes disso, eu ainda gostava de dizer, relativamente à demissão deste Governo, que de facto é inexplicável e cria alguma perplexidade na população sobre como é que um Governo de maioria absoluta cai. Será que cai porque tem de cair, porque é a forma que a burguesia tem de ultrapassar e de se desresponsabilizar da situação que foi criada por este próprio Governo durante dois anos, e que já não tinha grande saída? Quando o Governo caiu, sabemos que tínhamos todos um descontentamento enorme em vários sectores.

    Então, entende que é uma manobra concertada?

    Sim, entendemos que é uma manobra; tal como foi a queda do Governo anterior, esta também foi. Aliás, Portugal está a cair: caiu o Governo da República, o governo das regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Isto não pode ser por acaso. Portugal está ingovernável?

    E há dúvidas sobre se vai ser possível formar um Governo depois das eleições.

    Pois, provavelmente, sim; até porque essas dúvidas estão a colocar-se também nos Açores. Houve um partido que ganhou as eleições, e não sabemos se vai haver um governo. Portanto, o mesmo pode acontecer aqui.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Mas no caso do seu partido, acredita que pode crescer em votos, e que pode atrair com as vossas propostas, mais militantes? Quais são as vossas metas para estas eleições?

    Pode crescer, mas neste momento o nosso partido tem de se reorganizar para os movimentos que vão surgir inevitavelmente no meio da crise que está a acontecer. O partido tem de estar preparado; a revolução não se faz de dentro do partido, faz-se de fora do partido – e sempre dissemos isso. Mas, em relação à Saúde, por exemplo, um aspecto que se estava a falar; o Serviço Nacional de Saúde [SNS] está destruído. Fala-se que tem de ser reconstruído, mas na nossa óptica, neste momento já vai ser muito difícil que ele seja reconstruído porque ele está destruído.

    E também muitos portugueses, aqueles que podem, têm sido empurrados para o privado, não é?

    Mas o SNS foi destruído paulatinamente, sem que se desse conta. Porque o SNS começou a subsidiar os serviços privados de saúde, que se transformaram num negócio. E a partir daqui, se o investimento, que é social, no público, passa por esse público para ir para o privado, o serviço público fica destruído. Falando de forma simples: nós não temos nenhum serviço público, por exemplo, onde se possa ir fazer análises, raio-X, ressonâncias ou TACs; são todos privados.

    As pessoas são encaminhadas para os serviços privados?

    O problema é que as pessoas não dão por isso. Como vão fazer as suas análises aos laboratórios, e muitas vezes não pagam, acham que está tudo bem. Mas esquecem-se de uma coisa: não pagam, mas esses serviços são pagos. E por isso é que estamos a ver todo esse tipo de laboratórios e de meios complementares a crescerem enormemente.

    Além do muito dinheiro que foi gasto e saiu até um relatório do Tribunal de Contas relativamente aos gastos com a pandemia, que foram exorbitantes.

    Exactamente. E eu não faço ideia porque agora não tenho esses dados, de quanto é que, de facto, transita do serviço público para o privado. Mas a verdade é que o serviço público vai encolhendo, à medida que o privado vai alargando.

    Entende então que essa situação devia mudar.

    Acho que ela está catastrófica, é o caos. E é por isso que o Governo também caiu e não tinha interesse em continuar, porque ia continuar para fazer o quê? Não tinha já solução.

    Mas acha que há interesse em mudar?

    Não haverá interesse, mas há interesse em deixar ficar durante algum tempo, até que as coisas estejam completamente arrumadas. Quando dermos conta, já não temos SNS; às tantas, já não vamos ter tempo para o recuperar, pelo menos de uma forma fácil.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Então considera que esta destruição foi propositada?

    Naturalmente; tem a ver com os interesses. Se a Saúde se transformou num negócio, e a própria pandemia veio demonstrá-lo… Porque se a humanidade está em perigo, os laboratórios não estiveram ao serviço da humanidade e desse perigo; estiveram ao serviço dos grandes lucros que tiveram.

    Tiveram e, aliás, nós no PÁGINA UM noticiámos alguns casos desses.

    Qualquer pessoa se questiona se, então, estamos mesmo a trabalhar para o bem da humanidade, e se estamos preocupados com isso – porque não é isso que a realidade nos diz.

    Mas não é o se passa também um pouco no ensino? Tivemos também os professores em protesto. E é sabido que, por exemplo, muitos políticos têm os seus filhos em colégios privados.

    Sim, no ensino é a mesma coisa. Embora eu pense que o nível de destruição no ensino não avançou tão depressa como na Saúde. A Saúde está completamente destruída. Mas são negócios, de facto, que estão em causa. E a verdade é que nunca, a não ser antes do 25 de Abril, nós tivemos hospitais fechados. Para uma mulher grávida, deve ser uma espera angustiante saber onde é que o filho vai nascer, e se a maternidade mais perto estará aberta ou fechada. É dramático quando nós pensamos que os hospitais fecham ao fim-de-semana. Não podem fechar.

    Ou seja, não há segurança para uma mulher que esteja grávida, não sabe o que vai acontecer?

    Ou tem meios – e cá está, a igualdade não existe – ou arranjam meios, porque de facto não querem correr o risco de terem um parto com consequências trágicas. Portanto, até às vezes se empenham para conseguir resolver esse problema. Mas o que é insuportável é pensar que temos serviços de saúde que são necessários 24 horas – porque nós não sabemos quando é que adoecemos – fechados.

    Entende que há um retrocesso?

    Sim, disso não há dúvidas nenhumas. Hospitais fechados era antes do 25 de Abril, que não havia hospitais. Então se vamos comemorar o 25 de Abril, vamos comemorar o quê? Voltamos àquela questão inicial; é apenas uma propaganda, hoje vive-se de propaganda. E os meios de comunicação social, ganharam de facto um estatuto de quarto poder, e criam-se as ideias que se criam.

    Entende que os media, em larga medida, o que fazem é propaganda?

    Uma grande parte, sim. Os media têm chefes, patrões, e donos; portanto, as propagandas também avançam a partir daí.

    Mas também estão em crise agora, não é?

    E criam ideias. Dominam, e depois tudo é discutido na base das ideias criadas.

    Mas é interessante porque muitas vezes é passada a mensagem de que a propaganda é só de regimes ditatoriais, mas não se entende que haja propaganda em governos de países ocidentais.

    O que é mais perigoso, porque nos outros países nós já sabemos que há [risos]. Portanto, aí já estamos alertados. Mas neste pensamos que não, que tudo é natural e tudo é – como se dizia antigamente – a bem da nação. Mas não é; é a mal da nação.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Como é que tem acompanhado estes protestos que têm havido em várias áreas, desde os jornalistas, aos agricultores e às forças de segurança?

    Eu continuo a dizer: é a crise do capitalismo. São as contradições que efectivamente se agudizam, e que não apresentam soluções. Mesmo com os agricultores não é outra coisa. Nós vamos ter um problema entre a agricultura, que está a ser destruída completamente, e tem que ser concentrada – aquilo que a que assistimos nos últimos tempos foi à concentração da agricultura com monopólios, por um lado, e o nascimento de um operariado agrícola. Por incrível que possa parecer; às vezes diz-se que o conceito de operário está a desaparecer, mas não está, pode é alterar-se. Nos campos, o que nós temos com esta agricultura intensiva, nomeadamente do Olival e do amendoal no Alentejo, é o que está a criar isto. Foi a venda de uma grande parte de propriedades mais pequenas para grupos económicos estrangeiros; temos a ideia de que são só espanhóis, mas não são – são angolanos e americanos. E estão a criar um conjunto de pessoas que são operários: alguns, nacionais, e outros, imigrantes, a viver em condições péssimas, como todos sabemos. Em condições degradantes e de exploração. E quando a própria comunidade, na luta pela pseudo energia verde, diz que tem de se cortar até 50% dos pesticidas, está a esquecer-se do que é usado, de facto, nestas culturas intensivas; que é uma brutalidade desse tipo de fertilizantes e que contagia até os outros terrenos que estejam ao lado e que ainda resistam a ser integrados nessas grandes propriedades. Depois, temos uma indústria de distribuição e agroalimentar que vai também sofrer algumas destas consequências. As outras propriedades no norte do país serão um pouco diferentes, mas a tendência, naturalmente, é de centralização e concentração.

    Mesmo nos Estados Unidos tem havido um movimento de determinadas figuras mediáticas a serem compradoras de grandes lotes de terra.

    Sim; e eles têm comprado muito em Portugal, nomeadamente terrenos no Alentejo.

    Agora já não se fala tanto no ambiente, mas sim na questão das alterações climáticas. O que é certo é que ao nível comunitário, se prolongou por mais uma década, por exemplo, o uso do glifosato, que era da Monsanto, e foi comprado pela Bayer, e que é perigosíssimo. Portanto, em relação a algumas coisas, não bate aqui a bota com a perdigota.

    Podem dizer que nós repetimos a cassete, mas para nós, a questão de fundo continua a ser o sistema capitalista e o modo de produção capitalista, que está esgotado e tem de ser substituído. É normal; tem a ver com a história. Os modos de produção vão-se sobrepondo; o modo de produção capitalista está esgotado, e tem que dar origem a um novo modo de produção. Há essencialmente duas riquezas, como nós dizemos: a natureza e o trabalho. Sendo que o trabalho é a forma como o homem utiliza instrumentos para retirar a riqueza da natureza. Está tudo aí. E aquilo que se chama a economia verde, muitas vezes, mais não é do que outro negócio.

    Como a questão de se substituir um carro a combustível por um eléctrico…

    Ora aí está; que parece que não vai ser uma coisa melhor, e não está a ser fácil. É, na mesma, a sociedade de consumo e a utilização da natureza até às últimas consequências. Agora vamos ter uma luta para recorrer a novas matérias que serão necessárias para novas tecnologias; mas nada é feito em termos de planeamento ou de respeito pela natureza. E todos estes desastres climáticos que estamos a ter, têm a ver com a falta de respeito que houve pela natureza e com o esgotar dos recursos.

    (Foto: D.R./PCTP-MRPP)

    Mas os avisos já existiam e muitas das pessoas que estão na política hoje, na Europa e em Portugal, já estavam na política nos em que começaram os avisos. Portanto, não é de agora.

    Claro que não; foi desde sempre. O Friedrich Engels também já falava nisso há muito tempo, com A dialética da Natureza.

    Também se viu, nos últimos anos, um enorme recuo ao nível dos direitos humanos, em vários países, com medidas repressivas que, entretanto, se percebeu que muitas foram erradas. Têm vindo a ser aprovadas, a nível comunitário, novas regulamentações sobre os direitos digitais e a imprensa, mas que vêm condicionar a liberdade de imprensa e de expressão. Como é que vê esses sinais?

    Eu acho que nós temos a realidade impor-se. O que é que se passa na Palestina?

    Ou seja, os direitos humanos é só de vez em quando?

    É, quando convém, e de formas diferentes. Nós estamos agora a vivenciar a hipocrisia que existe relativamente aos direitos humanos. Porque está a haver um genocídio; não temos dúvidas nenhumas. E até tivemos o nosso Presidente da República – um dos primeiros Presidentes da República – a apoiar Israel. Ele podia ter estado calado nessa altura; esperava, pelo menos. Mas não! Cá está: Portugal é o bom aluno, e tem de se pronunciar em primeiro lugar. Portanto, quanto à forma como se vê os direitos humanos, eu penso que basta olhar para o que está a acontecer. Em que os países que podiam, e deviam, ter uma palavra a dizer, não o fazem. Porque acham que Israel tem que se defender; e em nome desse princípio que impõem, pode matar milhares e milhares de civis e não há problema nenhum.

    Portanto, choca-a esta forma como o Governo, o Presidente da República, e até a própria União Europeia se tem posicionado nesse tema?

    Sim; todos foram a Israel: o Presidente da República, o Parlamento, todos. E tiveram necessidade de o fazer – essa é a questão. E o Presidente da República ficou numa situação muito difícil com as posições que tomou – essas e outras. E já não sabemos se este Novembro de 2023 estava a ser tão constrangedor para uma série de poderes em Portugal; e que juraram inclusivamente esta demissão. Portanto, tivemos quase três poderes metidos no meio de uma demissão, que não vai alterar absolutamente nada.

    (Foto: PÁGINA UM)

    E o próprio Presidente da República esteve envolvido num escândalo.

    Exactamente. Isto é a tal corrupção – continuo a dizer – inerente ao sistema e ao facto de termos recebido tantos milhões. Criaram-se tantas comissões para fiscalizar, fiscalizavam-se uns aos outros.

    E para os portugueses, em que é que se traduzem esses milhões?

    Em nada. Nós temos uma crise de habitação dramática, com consequências incalculáveis. Não há casas, pura e simplesmente. A habitação é um direito, que está na Constituição, e aquilo que nós vemos é que não há, nem foi construído, nem planeado. E isso é grave.

    E as que existem, os portugueses não conseguem pagar.

    Não têm acesso a elas. Nós estamos de facto num sistema que se baseia na lei da oferta, no negócio e na mercadoria; mas nós temos uma oferta que está inquinada. Para já, houve políticas que não planearam habitação social, nem tiveram isso em conta. E agora querem resolver o problema com arrendamentos que nem se sabe como se vão fazer, e nem sequer se há condições ou um número de habitações para isso. E este ano, houve um dos maiores aumentos ao nível das rendas. Neste momento, não é possível aos portugueses arrendarem uma casa em Lisboa, porque também têm uma concorrência com estrangeiros que vêm viver e trabalhar para Lisboa e que têm facilidade em pagar rendas acima dos 1.000 euros.

    Portanto, a vossa visão é que o Estado deveria chegar-se à frente?

    Sem dúvida, e a questão que se coloca é porque é que não o fez. Porque já fez dois anos que recebeu milhões do PRR, em que o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana [IHRU] era uma das instituições que deveria ter resolvido o problema, e não fez nada. E já vamos no terceiro ano, porque isto vai terminar em 2026. Portanto, faltam dois anos. O que é que aconteceu ao dinheiro?

    Acha que é uma questão ideológica de não se querer do Estado, e querer que sejam os privados a resolver?

    Pode ser. Mas é sobretudo uma questão de negócios.

    Voltamos ao mesmo?

    Sim. Porque, no fundo, como é que está a ser executado o PRR? Quem são as empresas que beneficiam? E beneficiando, como é que o estão a aplicar? De facto, há três sectores que chegaram a um estado de destruição quase total com as políticas deste Governo de maioria: a habitação, a saúde e o ensino.

    E na saúde temos um excesso de mortalidade assustador. Portugal é dos países da Europa com o maior nível de excesso de mortalidade, e o Ministério da Saúde não quer investigar.

    Não quer investigar, mas sabe.

    Sim, tem as suas bases de dados anonimizadas, que podem perfeitamente ser disponibilizadas, e nós no PÁGINA UM temos uma acção em tribunal para que essas bases de dados sejam disponibilizadas.

    Exactamente, e devem ser. Nós continuamos a dizer o mesmo que no princípio: o Serviço Nacional de Saúde está destruído.

    Uma foto de Arnaldo Matos, fundador do partido, em destaque no hall de entrada da sede do PCT/MRPP.
    (Foto: PÁGINA UM)

    Portanto, os portugueses também não estão a ter acesso a cuidados de saúde.

    Não, não estão. E quando os obtêm, já é em situações que às vezes são reversíveis. Há pessoas que estão à espera de operações e de outras intervenções; não é só as horas que se espera na urgência; não há acompanhamento.

    E como dizia antes de começarmos esta entrevista, nem para se nascer, nem para morrer em Portugal, as coisas estão bem.

    Sim; é dramático. E vai chegar a uma altura em que é insustentável. E aí, as coisas rompem.

    Quando fala, sentimos que pode não haver já solução. Em todo o caso, vê que há uma possibilidade para Portugal de travar um bocadinho esses movimentos, também em termos de uma Terceira Guerra Mundial, mas não só?

    Não vai travar absolutamente nada; porque estão em causa forças maiores que querem sobreviver, e que só podem sobreviver por aí.

    E há alguma coisa que os portugueses podem fazer no sentido de dar a volta a isto e tentar resolver algumas questões?

    Têm que se consciencializar de como é que vão resolver as questões, e de retirar algumas lições do que vai acontecendo. Porque os portugueses vão perceber. Vão perceber que lutam por isto, que tentam alterar e que já votaram não sei quantas vezes, só nos últimos tempos, e que isto está podre. Ninguém vai acreditar que todas estas propostas e ofertas que estão a ser feitas são para ser concretizadas; elas são feitas para se chegar ao poder e ver quem é que consegue enganar melhor. Uma vez lá instalados, vai acontecer a mesma coisa. Até porque nenhum dos partidos que estão a concorrer, desses que fazem as grandes propostas e que acham que de facto vão chegar ao poder, pode dizer com certeza que o programa que estão a apresentar vai ser o programa que vão concretizar. Porque eles não sabem sequer se vão governar sozinhos, nem com quem se vão aliar.

    (Foto: D.R.)

    Mas os dois grandes partidos já indicaram, pelo menos a AD e o PS, que há aquela linha vermelha em relação ao Chega. Como é que vê as sondagens que apontam para um crescimento do Chega?

    Oh, as sondagens nunca são assim tão seguras quanto isso; depende dos grupos que são sondados e depende, inclusivamente, daquilo que o sondado quer dizer.

    Portanto, podem ser enviesadas?

    Podem. Há também problemas a nível da comunicação, porque a comunicação não sabe o que o povo sente.

    Foi a comunicação social e alguns partidos que fizeram o Chega. E, portanto, até lhes dá jeito. Porque podem tentar dizer que se não ganharem eles, vai ser o Chega e vai ser uma desgraça. Mas foram exactamente eles que fizeram o Chega dessa forma. A comunicação social e os comentadores, porque vivem numa bolha, acham que aquilo que eles dizem é o que a população pensa. E pensam também que a maior parte das pessoas são influenciadas por aquilo que eles dizem; mas a vida das pessoas é diferente daquilo que os comentadores pensam.

    As pessoas têm uma vida difícil, chegam ao fim do mês e não têm dinheiro para pagar as despesas. E sabem que não têm direito à saúde, que esse bem não está garantido, que têm problemas com a habitação e com a educação; isso elas sabem. E quando muitas vezes contestam, no sentido imediato, e dizem que algo está mal, podem não saber ainda o que querem, mas sabem que não querem isto. Ora, se há um partido populista que diz que algo está mal, é normal que algumas pessoas concordem.  E, portanto, o Chega, que não tem um programa, propriamente…  Porque apontam para o que está mal, mas qual é a proposta do Chega? Eles têm de dizer claramente como é que resolvem estes problemas, e qual o modelo de saúde que querem. Porque nós não temos problemas nenhuns que nos acusem de querer o desenvolvimento do Estado social – não é isso que nós queremos, mas entre o que queremos, e o que temos, queremos isso. E não temos problemas nenhuns em que haja meia dúzia de comentadores que defendam, por oposição, a liberalização e a iniciativa privada; nem ficamos sequer incomodados que tentem fazer crer que as nossas ideias são uma coisa do passado.

    Também há a questão da imigração, e partidos que defendem um maior controlo, mas temos também uma grande emigração dos jovens. Quer deixar uma mensagem aos jovens, sobretudo os que têm estado a sair do país?

    Pois estão, e vão continuar a sair; estou convencida de que a emigração aumentar. E a imigração também vai aumentar porque também nos faz falta. No fim de contas, voltamos a ter as tais contradições: nós temos desemprego, temos jovens qualificados a sair, e em igual proporção, temos imigrantes a entrar. É quando estas contradições são insanáveis, que as coisas têm que rebentar. Porque os portugueses não podem ir trabalhar para fora, para depois haver necessidade de uma mão-de-obra barata – e é o que está a acontecer. Os imigrantes vêm trabalhar, sujeitos a ordenados baixíssimos e a uma exploração intensíssima. Mas eles geram lucro suficiente para o pagamento que se lhes dá, e para os subsídios que são dados, em alguns casos, em Portugal. Nós somos contra esta história dos subsídios; não tem que haver subsídios. As pessoas têm de trabalhar por um ordenado digno, que lhes permita viver. E como os governos não querem fazer isso, temos de recrutar mão-de-obra barata, explorada, e colocar gente em situações indignas.

    Um dos murais que trouxeram fama ao PCTP/MRPP (mural sem data, nem local). (Foto: D.R.)

    Pensa que é um sinal também da decadência daquilo que existe em alguns países ocidentais?

     É, e vai ter consequências. Porque é muito bonito estarmos a dizer que ainda bem que os imigrantes cá estão, porque são eles que estão a sustentar a Segurança Social… Isso é um facto. Mas será bom para o desenvolvimento do país? Se calhar, não é. Não pode ser visto como algo bom, quando enviamos para fora os nossos.

    Portanto, é algo que também tem que se repensar?

    É uma contradição que, de facto, tem de ser resolvida. Mas ainda bem que os imigrantes estão cá, e nós não queremos que eles estejam nas condições em que estão; porque depois são problemas sociais atrás de problemas sociais. E se, inclusivamente, houve acordos para que alguns contratos fossem feitos em termos de imigração, esses acordos têm de ser respeitados. E não são; como nós vimos. E é preciso, de vez em quando, sair esses alertas para nós abrirmos os olhos e verificarmos que as coisas não estão a correr bem.

    Portanto, há muito para fazer?

    Há muito para fazer, porque há muito mal feito [risos].

    Transcrição de Maria Afonso Peixoto.


    Veja AQUI a página na Internet com informação do PCTP/MRPP.


  • ‘Não podemos continuar a apostar em agricultura intensiva. Temos é de continuar a apostar na produção nacional’

    ‘Não podemos continuar a apostar em agricultura intensiva. Temos é de continuar a apostar na produção nacional’

    Voltar a ter deputados eleitos na Assembleia da República é o principal objectivo do Partido Ecologista Os Verdes, que foi fundado em 1982. Mariana Silva, 41 anos, é uma porta-voz do PEV e membro do Conselho Nacional e da Comissão Executiva do partido que concorre a eleições na coligação CDU-Coligação Democrática Unitária, com o Partido Comunista Português. A professora, natural de Guimarães, e antiga deputada do PEV, defende que faz falta uma voz ecologista no Parlamento português. Diz ainda que Portugal deve parar de querer ser o ‘bom aluno’ e aplicar cegamente as políticas ambientais e agrícolas que são impostas pela União Europeia, devendo, antes, defender mais os agricultores e as populações. Esta é a 16ª entrevista da HORA POLÍTICA, a rubrica do PÁGINA UM que deseja concretizar o objectivo de conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE MARIANA SILVA, PORTA-VOZ DO PARTIDO ECOLOGISTA OS VERDES, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Qual é a situação actual do seu partido, nomeadamente naquilo que são os objetivos agora para estas eleições legislativas?

    Nós não temos líder politico; temos é o Conselho Nacional e a Comissão Executiva. Eu pertenço aos dois, mas sou candidata pelo círculo de Lisboa. E os Verdes fizeram em Dezembro 41 anos. Por isso, temos já uma longa história na defesa da Ecologia, do Ambiente, e da biodiversidade em Portugal. E ficámos fora do Parlamento nas últimas eleições, e este será o nosso grande objectivo destas eleições: voltar à Assembleia da República [AR] e poder, continuar este trabalho num outro patamar; porque este trabalho continua nos colectivos regionais, e em todo o país junto das populações – como é nosso apanágio e como sempre trabalhámos, e só sabemos trabalhar dessa forma.

    Até porque têm muitos candidatos eleitos em termos de autarquias, e vários órgãos autárquicos.

    Sim, exactamente; vereadores e também eleitos em assembleias de freguesia. E por isso esse trabalho continuou, mas todos reconhecemos que é importante ter um grupo parlamentar e estarmos representados na AR. E aquilo que nós identificamos enquanto partido, e que as pessoas nos dizem quando nos procuram para ajudar a solucionar os seus problemas e resolver os problemas locais ou até nacionais, é que nós fazemos falta. Faz falta uma voz ecologista no Parlamento e, nestes dois últimos anos, essa falta sentiu-se. E por isso era necessário retomarmos o nosso trabalho e voltarmos ao Parlamento para podermos dar continuidade a muitos dos projectos que temos em cima da mesa. Como sabemos, as alterações climáticas são uma questão de que falamos há anos, mesmo quando tínhamos os velhos do Restelo a dizer que estávamos a fantasiar um problema.

    Mariana Silva, na sede do PEV. (Foto: PÁGINA UM)

    Hoje, felizmente, já não se diz isso, nem se pensa, mas continua a ser difícil a concretização de medidas que possam mitigar e controlar as alterações climáticas. E nós precisamos também de dar continuidade a estes projectos que tínhamos em cima da mesa e que temos ao longo dos anos vindo a trazer; para que, com a ajuda de reflexão de movimentos, associações, debate, e de conversa que também nos permite ter um contacto real com as questões, e poder dar-lhes as soluções que são necessárias. E depois, podia falar também dos problemas que afectam hoje a maioria dos portugueses: a habitação, o Serviço Nacional de Saúde [SNS], a escola pública – em todas estas áreas, os Verdes têm trabalho e será neste âmbito que nós concorremos também nestas eleições legislativas de 2024.

    Quando se ouve falar em Ecologia, e em defesa do meio ambiente, normalmente pensa-se apenas em florestas e a biodiversidade de animais, mas Ambiente é tudo. Neste âmbito, algumas das propostas que têm também abrangem, como referiu agora, temas que têm estado no centro de preocupações dos portugueses, como a crise na habitação. Que propostas é que têm para este problema?

    Relativamente à crise da habitação, nós temos como propostas interromper a especulação imobiliária, controlar as rendas e aumentar o parque habitacional do Estado, para podermos de alguma forma dar resposta a este problema que enfrentamos hoje em todo o país e que traz graves problemas à economia familiar e aos portugueses. Há pessoas que até têm dois empregos para poder fazer face a este custo de vida e ao aumento das rendas. Os créditos à habitação também subiram muito e isso trouxe graves problemas para as famílias portuguesas, e por isso é preciso pôr aqui um limite e trazer de novo uma acalmia na economia de cada um de nós para podermos realmente viver e não sobreviver. Esta também é uma das nossas lutas: nós não não temos que sobreviver, não é o que nos espera de futuro; mas sim viver e usufruir. E por isso, podemos trabalhar para termos as condições dignas e os nossos direitos garantidos, mas precisamos que as leis também estejam aplicadas a continuarmos neste caminho de vivermos de forma saudável. E há pouco dizia que o ambiente é tudo, e é mesmo. Nós dizemos que só temos este planeta, e temos que o deixar, senão em melhores condições, pelo menos em bom estado para as gerações que vêm a seguir. E eu acho que esse é o grande momento de viragem que estamos a sentir agora – e que acho que veio um bocadinho com a covid-19 – que é percebermos que tudo está interligado.

    Se nós tivermos uma natureza que não está protegida, e uma fauna que não está protegida, e que não haja um desenvolvimento para a sua protecção e conservação, isso, de alguma forma, vai afectar também a saúde dos seres humanos. Isto está interligado; e por isso também precisamos de uma natureza, de uma floresta reforçada autóctone para que a fauna e a flora possam desenvolver-se de forma adequada para depois não afectar os seres humanos. Mas, por outro lado, temos os seres humanos a destruir tudo isto. E por isso, precisamos realmente de passar a mensagem às pessoas de que o Ambiente não é os passarinhos e as árvores – o Ambiente e a Ecologia são muito mais; é nós sabermos estar junto da natureza, usufruir dela, mas também protegê-la, porque só temos este planeta e por isso temos de o proteger.

    E se pensarmos na água, nesse bem essencial à vida, conseguimos ter uma ligação ainda mais próxima com aquilo que são os problemas ambientais e a defesa do Ambiente. A água é um bem finito e por isso precisamos também de o proteger, e em algumas partes do nosso país, as pessoas já sentem no seu dia-a-dia a falta de água e os transtornos que traz. E por isso, há anos que lutamos: não queremos a privatização da água, a água tem de ser pública. Os rios, ribeiras, as nossas linhas de água – tem que haver um maior investimento na sua despoluição. E temos também de ter uma agricultura que não tenha tanta necessidade de água, e por isso há um longo caminho ainda a percorrer para que possamos proteger a natureza e a nós próprios.

    Eu que nasci em Abril de 1974, desde pequena que oiço falar em Ecologia e em desertificação. No entanto, passados 50 anos, parece que está tudo igual ou até pior. E apesar de hoje haver um maior foco e na questão da protecção do Ambiente, o que é certo é que há muito por fazer naquilo que são esses desafios, e eventualmente perigoso, por exemplo, se não acautelarmos a questão da gestão da água, não é?

    Exactamente. Mas aquilo que verificamos é que existem os planos, a reflexão e os estudos, mas depois são guardados na gaveta e não são postos em prática; e isto é uma opção política. Nós percebemos – e temo-lo dito também nesta campanha e já dizíamos nas outras – que é preciso reforçar os deputados da CDU na AR, para que possamos fazer esta pressão sobre a aplicação destas leis: a Lei de Bases do Clima, Regulamento do Arvoredo Urbano, e de Gestão da Água Pública.

    Há um conjunto de medidas e de investimentos que deveriam estar a ser aplicados e feitos, e não estão. E por isso, dependemos muito da pressão que possa ser feita sobre o futuro Governo, para que possa realmente aplicar estas medidas. Nós não precisamos das ”COPs” [conferências do clima] para nos dizer o que temos de fazer no futuro; nós sabemos o que temos que fazer. Esta questão da poupança da água é muito direccionada para o indivíduo; mas as grandes produções, como do abacate, que não são autóctones, e todos os hectares de amendoeiras e de Olival, e esta agricultura intensivo, prejudicam naquilo que deveria ser uma boa gestão da água em regiões onde ela já não é tão abundante. Por isso, precisávamos de outras opções políticas e de outras gestão daquilo que é a nossa agricultura e os nossos projectos agrícolas para o país.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Ou seja, também um planeamento mais vasto?

    Há um planeamento mais vasto, só que não depois, não é aplicado; porque há outros interesses e é contra estes interesses que nós lutamos. Por exemplo, a monocultura do eucalipto, que nós conseguimos, de alguma forma, travar, com o acordo conjunto com o Partido Socialista [PS]; houve alguma evolução e também não podemos dizer que não, e sermos catastróficos e achar que isto está tudo mal. Houve uma evolução, e é um caminho que tem de seguir, mas não deixa de ser interessante que este Governo de maioria PS caia por dois projectos ambientais – a exploração de lítio e o hidrogénio. Não deixa de ser interessante que estejamos agora em eleições antecipadas por causa do Ambiente, apesar daquilo que se vai dizendo à nossa volta de que as pessoas não estão interessadas no Ambiente e querem é pôr comida na mesa; e que é verdade.

    Estamos numa altura em que o nosso salário não chega ao fim do mês, os bolsos rapidamente se esvaziam e as famílias precisam de fazer face às contas que têm de pagar ao fim do mês. Mas é preciso também olhar para as questões ambientais porque também vão ajudar na economia do país; não podemos continuar a apostar em agricultura intensiva que nos vai prejudicar depois nos solos, e que daqui a uns anos já não podemos produzir nada ali.

    Temos é de continuar a apostar na produção nacional, em produtos autóctones que nos permitam também desenvolver a economia do país, e ao mesmo tempo, respeitar o Ambiente, utilizando algumas práticas agrícolas que sabemos serem mais respeitadoras e que conseguem equilibrar tudo isto. Porque não vamos ser radicais e dizer que não vamos produzir nada porque precisamos de produzir, mas também não devemos produzir de forma desadequada, que nos vai trazer problemas de future.

    É este equilíbrio que temos de procurar para o nosso país, e que as políticas ambientais sejam mesmo concretizadas. E também há uma falta de técnicos e de funcionários nas estruturas responsáveis, como a Agência Portuguesa do Ambiente [APA], a Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária [DGAV] e o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas [ICNF] – todos eles precisam de ser reforçados porque cortaram-se ”gorduras” em 2015, que agora fazem falta. E era o que dizíamos naquela altura: não eram gorduras, eram trabalhadores que faziam falta estas estruturas, para poderem fiscalizar nos locais e no território, todos estes projectos tão necessários, que podem depois ter implicações ambientais.

    Falando com diversos líderes partidários e peritos em diversas áreas, a fiscalização em Portugal parece ser um grande problema. Mas essa fraca fiscalização não favorece determinados negócios e negociatas que podem não ser tão bons para a população? E eu prefiro dizer população em vez de Ambiente, porque não distingo entre Ambiente e população.

    Exactamente; e é correcto, porque a população está implicada em processos que em nada a vão beneficiar, apesar de lhe venderem essa ideia de que vai ser benéfico. Nós não somos contra a exploração de minerais – excepto do urânio – porque sabemos que têm de existir, mas têm que respeitar as regras e ser transparentes. E por isso não ficámos surpreendidos quando estas questões vieram para cima da mesa e fizeram cair o Governo. Nós sempre questionamos a transparência destes processos, sobretudo do lítio; em que não havia transparência nem envolvimento da população, e era necessário explicar muito daquilo que estava a ser planeado para aquele território. E um território como Boticas, classificado como terreno agrícola de qualidade mundial. E quando olhamos para a agricultura de montanha, que é um importante sumidouro de dióxido de carbono [atividades em que as quantidades de carbono absorvido são maiores do que as emissões] e traz um contributo muito grande para as metas de descarbonização a que Portugal se propõe para 2030, não percebemos quais, afinal os interesses.

    Tudo isto foi questionado ao ministro do Ambiente na altura, e sobretudo, as questões de falta de transparência e de envolvimento da população; porque a população é o garante da tradição cultural e de tradições que, se as perdermos, nunca mais vamos conseguir retomar.

    Além disso, são populações já muito castigadas pelas opções políticas ao longo destes anos – já não têm um centro de saúde, autocarros, nem mobilidade e a escola pública, de onde os mais jovens foram obrigados a sair por não ter acesso a estes serviços. E agora, ainda querem destruir a única coisa boa que eles têm, que é a paisagem, a montanha ou a agricultura e a produção de gado. Há todos estes interesses que se sobrepõem ao interesse das populações. Nós fomos sempre contra isso, e continuaremos a ser.

    Sede do PEV. (Foto: PÁGINA UM)

    Alguns reguladores e organismos funcionam um bocadinho como um travão para que se tomem mais decisões em termos de Ambiente, e falou na APA, por exemplo, e no ICNF. Mas não deveria haver também uma menor influência política nesses organismos?

    Vejamos: quando o PS pediu aos portugueses a maioria absoluta e termina desta forma… A primeira coisa que fez foi o Simplex Ambiental, que prejudica imenso o Ambiente e a protecção e a conservação da natureza, porque põe em causa tudo o que seria o estudo do impacto ambiental de diferentes projectos e dá simplesmente os espaços aos promotores desses projectos; e isto não pode acontecer. Quando falamos, por exemplo, na exploração de minerais como o lítio, estamos a falar de subsolo, e de quem é o subsolo? É de todos nós. Se entregamos a investigação do subsolo e das riquezas que lá se encontram a uma empresa privada, nunca vamos saber aquilo que temos no nosso subsolo, nem conhecemos a nossa riqueza porque estamos dependentes daquilo que a empresa privada nos vai dizer que lá existe.

    Como os Verdes já disseram, precisamos, primeiro, de saber o que temos de riquezas, e no nosso subsolo, e que mais-valias traz para a economia do país esta riqueza. E depois, perceber se até pode ser o próprio Estado a explorer, ou se pode ser concessionado. E aquilo por que nós nos ontinuaremos a bater é que estas estruturas do Ministério do Ambiente têm de estar reforçadas e ter a liberdade de poderem trabalhar para proteger aquilo que é da sua responsabilidade: as florestas, as minas, os animais, a fauna. Por isso, precisamos que eles não digam que não podem ir ao terreno porque não têm combustível ou não têm carros, porque todo o seu material está obsoleto.

    A investigação para perceber se a água está poluída ou não, não pode ficar com os privados porque já vimos no que dá – como naquele famoso caso em que a água afinal estava poluída e as pessoas estavam a consumi-la. Precisamos de laboratórios onde se possam fazer essas investigações, porque o Estado tem de ter acesso a esta informação, e tem de ser o dono da informação e perceber até onde é que pode ou não pode ir, e proteger aquilo que é o bem de todos. Porque quando dizemos que vamos explorar o lítio em Montalegre ou em Boticas, ou que vamos colocar as eólicas offshore no nosso mar, e vai prejudicar aquela população, prejudica também o país.

    Nós não podemos achar que a seca no Algarve, só afecta quem vive no Algarve; afecta todo o país – economicamente e até para depois para as políticas que se aplicam. Por isso, é preciso olhar para tudo isto como um todo. A transição energética e a descarbonização têm de ser feitas, mas não é à custa da natureza, outra vez.

    Há vozes que dizem que a questão das alterações climáticas tem estado a ser um pouco usada como desculpa para algumas políticas que têm sido prejudiciais. Atribui-se às alterações climáticas a culpa de algumas coisas que têm estado a acontecer, mas será que algumas não são fruto de medidas erradas que foram tomadas ao longo de décadas?

    Sim; mas as alterações climáticas também são fruto daquilo que foi o comportamento do ser humano em todo o mundo. Mas se outrora não se ligava e não se tinha esta preocupação tão presente, agora é Ambiente e tudo se justifica; basta pintar de verde a medida e a coisa já pode passar. E isso também nos preocupa, por isso é que temos de estar sempre atentos a este problema. Porque quando os Verdes propõem, por exemplo, que se acabe com o sobre-embalamento dos produtos, que não faz sentido; porque quando chegamos a casa, temos um saco de lixo maior do que o espaço que ocupamos nos nossos armários com os bens alimentares. E nós sabemos que as empresas têm essa capacidade de fazer esta evolução para um material mais indicado ou até para material nenhum, porque há alimentos com várias embalagens sem que haja necessidade disso. Por isso, há que resolver este problema de estarmos sempre a criar e a trazer mais produtos para o nosso dia-a-dia.

    Quando se propõe que quando vamos buscar uma refeição possamos levar a nossa própria embalagem, é também enfrentar as empresas que produzem embalagens descartáveis, e que não podemos reutilizar. Portanto, há um duplo problema de querermos ter no nosso dia-a-dia todas estas facilidades de poder comprar um produto e trazê-lo para casa sem ter de andar com tudo atrás de nós, mas ao mesmo tempo, estarmos a criar resíduos e a criar um outro problema de onde é que vamos pôr esses resíduos e como os vamos tratar. E Portugal não cumpre as metas, por isso temos este problema muito presente na nossa sociedade.

    Aquilo que nós defendemos é que não é necessário continuarmos a criar produtos, e podemos viver o nosso dia-a-dia mudando alguns comportamentos; mas só os podemos mudar se não nos impingirem estas embalagens e estes produtos. Mas não deixa de ser engraçado que tudo seja atribuído ao indivíduo: as pessoas é que têm de fechar a torneira enquanto lavam os dentes, têm de tomar duches rápidos, levar o saco para o supermercado… Parece que nós é que temos a culpa, quando as grandes empresas é que também nos sobrecarregam com a ilusão da necessidade daqueles produtos. E precisávamos mesmo de fazer um caminho de sensibilização; e a educação ambiental nas nossas escolas, que está um bocadinho esquecida, precisava de ser retomada, para sensibilizarmos os mais jovens, futuros adultos, para as questões ambientais. Mas, precisávamos também que as empresas correspondessem e não tivessem apenas medidas que são, muitas vezes.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Como é que se pode pedir aos cidadãos que adoptem novos comportamentos, se depois vemos politicos autorizarem o abate de árvores protegidas, ou mesmo eventos internacionais sobre o Ambiente, para onde vão todos aqueles políticos e bilionários nos seus jactos privados? E em cima disso, ainda falam constantemente em mais impostos para o cidadão. Isto não são mensagens difíceis para a população de integrar e para que altere o seu estilo de vida?

    Exactamente, mas isso também o Partido Ecologista os Verdes tem dito: os países ricos podem poluir porque podem pagar; isto não é correcto, porque um país mais pobre que não possa pagar, não pode poluir. Não faz sentido nenhum. E no caso do indivíduo, também não faz sentido que seja o responsabilizado e taxado com mais impostos para que mude o seu comportamento ou tenha uma consciência ambiental mais desenvolvida. A questão é mesmo a de não se sobrecarregar as pessoas com esta ideia de que têm comprar porque se não o fizerem já não têm correspondência na sociedade; como é a questão da roupa, porque amanhã já há qualquer coisa nova.  

    Nós nascemos em 1982, quando estes problemas não estavam tão presentes, mas a Constituição da República Portuguesa era muito avançada e no seu artigo 66 já falava do direito ao ambiente sadio. E a necessidade de se lutar e defender o Ambiente já existia nessa altura, sobretudo com as indústrias, a poluição das linhas de água, e outras questões que já se iam colocando e que as pessoas já iam reflectindo. E agora, nós mantemo-nos neste caminho de ser possível fazer-se de forma diferente, com opções políticas diferentes, mas com outros desafios. Eu poderia falar também da mobilidade, que é tão importante para nós, nomeadamente a questão do carro eléctrico: nós somos contra o carro eléctrico. Tem de haver uma solução ao combustível fóssil, mas não queremos substituir 500 carros a combustível fóssil por 500 carros elétricos – assim, vamos manter os problemas, e se calhar até agravá-los.

    É o tal incentivo ao consumo de que falava, e que não pode ser a resposta.

    Exactamente; porque traz outros problemas; como a exploração do mineral, a questão de para onde vão as baterias, a reciclagem deste material que ainda não está desenvolvido, e continuamos com o problema do estacionamento, e com as estradas cheias de carros. Vamos continuar a perpetuar problemas que queremos contrariar; e todos os planos de mitigação das alterações climáticas referem que o desenvolvimento para o futuro é o transporte público, e que a solução para o futuro é o transporte público colectivo.

    Portugal, que é um país pequeno, não apostou na ferrovia, nem nos transportes públicos, mas sim nas estradas, que temos muitas, e incentivou a compra e o uso de carro.  As populações no interior não são bem servidas por transportes públicos, mas o país está a discutir o carro eléctrico, o TGV e o novo aeroporto. Como é que esta situação?

    A questão é que fomos alternando entre PS e PSD ao longo destes anos, e as opções políticas foram estas: o desinvestimento na ferrovia, no transporte público, e naquilo que era o desenvolvimento das populações de forma a terem acesso ao direito à mobilidade. Porque o direito à mobilidade, depois, dá-nos o direito à Educação, à Cultura, à Justiça, à Saúde; se eu não tiver esse direito garantido, não consigo garantir todos os outros.

    Aquilo que acontece em Portugal, muitas vezes, e que quem vive nas áreas metropolitanas se esquece, é que fora destas áreas não existe transporte público. Mas, mesmo nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, não são servidas todas as áreas. Há muitas dificuldades nos concelhos mais distantes do centro, que não têm horários nocturnos de autocarro e ao fim-de-semana, e por isso ficam isolados, apesar de estarem no distrito de Lisboa. Parece uma ideia que não se concretiza; porque em Lisboa há tudo, desde barco, a comboio e eléctrico, mas só há numa área muito restrita.

    Nestes últimos anos, com o passe social intermodal – que era uma luta antiga nossa e que se dizia ser uma utopia, mas foi possível – a 20 e 40 euros, as pessoas podem-se deslocar dentro do distrito de forma livre sem  terem de ser tão dependentes do veículo individual. E precisamos de alargar esta medida para todo o país. Quando esta medida foi implementada nas áreas metropolitanas, foi possível perceber que problemas é que se enfrentaram, e agora, os outros concelhos podem aplicá-la, já com esta informação e experiência de outras áreas.

    Mas o isolamento é muito real no nosso país; há localidades que só têm transporte durante o período escolar, e há outras que não têm de todo. E esta foi uma luta e uma questão que levámos muitas vezes à AR e para a qual precisamos de olhar. Mas quando falamos, por exemplo, de ferrovia, fala-se tanto de alta velocidade e do plano nacional ferroviário, mas quem estiver atento sabe que o plano ferroviário de 2020 não está cumprido sequer, e ficou muito aquém das expectativas e daquilo que estava projectado.

    Quando nós pensamos que a Linha do Oeste ainda não está electrificada, nem do Algarve ou do Douro, nós temos é de olhar primeiro para esta condição da ferrovia em todo o território; para depois, pensarmos em algo mais desenvolvido, como uma alta velocidade ou uma linha nova de Lisboa-Porto, que é necessária, ou até para fora da Europa. Mas há ainda muito a fazer nas localidades e no desenvolvimento da ferrovia a nível nacional; só que, depois, as grandes parangonas é que soam aos ouvidos e acha-se que a alta velocidade é que vai solucionar tudo, quando ainda estamos muito atrás e ainda precisamos de investir nas linhas que as pessoas usam no seu dia-a-dia.

    Campanha nas eleições autárquicas de 2017. (Foto: D.R.)

    E que, depois, poderia ter também um impacto no crescimento económico e em fixar a população em determinadas zonas do país.

    Sim; a ferrovia sempre teve esse papel de fixar as pessoas em determinadas regiões, e poderá voltar a ter. E até poderia ter também um reflexo na habitação, porque as pessoas podem ir morar para outros lugares. Este investimento tarda, e já deveria estar feito porque já está planeado – lá está, os tais planos que não saem da gaveta –, o investimento também estava já planeado e já se sabia quanto é que se pretendia gastar. Mas depois, há outras opções políticas erradas destes partidos que têm estado no Governo, o PS e o PSD, e que não pretendem resolver, de todo, o problema do direito à mobilidade, que nos dá a garantia de um melhor ambiente; porque esta questão do passe social intermodal veio tirar milhares de carros das nossas estradas.

    Por isso, podemos considerá-la uma das maiores medidas de defesa do Ambiente dos últimos anos, senão a maior de sempre. É preciso olhar para estas medidas e, como dizíamos no início da nossa conversa, o ambiente é muito mais do que as árvores e os passarinhos. Nós precisamos de dar condições de vida às pessoas e de garantir estes direitos para que elas possam estar mais conscientes e sensibilizadas para estas causas e para aquilo que é necessário para deixarmos um futuro melhor.

    Um dos alertas que o vosso partido tem feito ao longo do tempo tem a ver com o combate à promiscuidade entre politicos e grandes grupos económicos, também com os grandes lucros que a banca tem tido, com um grande empurrão do Banco Central Europeu. Mas têm alertado também para a corrupção, que acaba por afectar até as decisões que têm impacto ambiental. Isto continua a ser algo que pretendem denunciar e combater?

    Sim; combater a corrupção e garantir a transparência é para nós um dos pontos essenciais e nós vamos manter-nos firmes nesta intenção. Porque como eu já referi, a questão do apoio aos grandes grupos económicos, da exploração de lítio sem sabermos que vantagens vai trazer para o país, a questão do hidrogénio, sem conhecermos realmente todo o envolvimento e todas as consequências que existem para as populações, e a questão das eólicas de offshore, que ninguém sabe e que não se fala…

    A CDU promoveu uma discussão em Matosinhos com a população para explicar o que estaria em causa e propor que as pessoas reflectissem também sobre isso – porque tudo isto são projectos que podem ser criados nesta figura da transição e da descarbonização, e que são legitimados pela necessidade de se cumprir metas e supostamente para nos trazer qualidade de vida; mas depois, quando procuramos perceber o que trazem, de facto, estes projectos, vemos que é a destruição da agricultura familiar, da pesca tradicional, e da economia local.

    Aliás, temos agora agricultores nas ruas pela Europa fora.

    Exactamente. Por isso, estes projectos, que até podem ser necessários no futuro, é preciso que não se passem barreiras, e não se começar a casa pelo telhado.

    E de haver transparência.

    Sim, porque nós precisamos de saber o que aquela empresa que vai explorar, e que benefícios vai haver para o país; porque para já, só conhecemos as consequências graves; não conhecemos os benefícios.

    Pois, e não só os benefícios para políticos ou escritórios de advogados.

    Sim, e económicos, para a economia das populações; lembremo-nos da venda das barragens, que não trouxeram qualquer benefício para as populações. Por isso, precisamos realmente de olhar para estes projectos, não só na questão ambiental e nas consequências que poderão ter no Ambiente e nas populações, mas também para a Economia; e deixar de haver esta ligação dos governos com estes grandes interesses, que não faz sentido e que precisamos de interromper. Os projectos têm de contribuir para o desenvolvimento do país e de respeitar as populações e aquilo que se pretende para o nosso desenvolvimento, que tem de continuar, mas de uma forma equilibrada.

    Falou sobre aquilo que é conhecido pelo greenwashing, que consiste em medidas que, no fundo, levam a grandes lucros para grandes grupos, advogados, consultoras e politicos. E nós temos um jornalista premiado, embaixador do European Climate Pact, o Boštjan Videmšek, colaborador também do nosso jornal, que alertou numa entrevista para um aproveitamento económico, político e financeiro à boleia daquilo que supostamente é a defesa do Ambiente e o combate às alterações climáticas. Concorda com este alerta de Boštjan Videmšek?

    Sim; concordo que há uma justa redistribuição da riqueza, que vai apenas para meia dúzia. E depois, todos os outros produzem para este grupo muito pequeno. E é preciso contrariar este processo; até porque, se nós pensarmos nas preocupações ambientais que pretendemos, não podemos acreditar que vai existir justiça ambiental sem justiça social. Elas têm de andar sempre juntas. Por isso, precisamos de olhar para todos estes projetos que poderão ter também o seu lugar, mas que terão de ser faseados. Nós podemos pensar nos painéis solares, primeiro que tudo, nos nossos telhados, e nos telhados dos parques industriais, ou em alguns espaços públicos, como nas nossas escolas, ou nos condomínios dos prédios. Isto não vai solucionar o problema, mas vai ajudar.

    Mas, em vez disto, pensamos logo é em grandes parques com painéis solares, ou em solos que são férteis para a agricultura; e não faz sentido que se comece por aí. Estamos agora a pensar nas dessalinização como uma solução, mas será que é importante investirmos esse dinheiro agora? Ou será que deixássemos de ter alguma agricultura intensiva que temos, e se não permitíssemos mais projectos como os enormes campos de golfe, não conseguíamos fazer esta poupança na gestão da água? Ou com o imenso desperdício de água nas redes públicas, que precisam desse investimento também, e que está identificado. Porque não se investe primeiro neste caminho, e depois sim, vemos se é preciso dessalinização ou parques eólicos? Tudo isto deve ser pensado num momento mais à frente, em que já tenhamos esgotado este processo com vista a colmatar as nossas necessidades, só depois, podemos pensar em reforçá-las.

    No caso da agricultura, muitas vezes é tida como poluente, gastadora de água e não sustentável, mas podemos pensar na agricultura familiar – que não é suficiente, porque não nos vai dar de comer a todos – como algo que nos permite regular e ajudar a que se preserve os solos, a água, o ambiente e o ar, e que nos ajude também nesta transição.

    O estatuto da agricultura familiar, que defendemos há anos, e a agricultura biológica, que precisa também de ser financiada e subsidiada, porque os jovens agricultores estão a apostar em projectos muito interessantes em várias partes do país; mas depois, embarram em coisas como venderem a maçã a um preço, para depois a distribuidora vender a um preço muito mais alto. Isto é uma injustiça muito grande para quem dedica a sua vida e o seu dia-a-dia, sobretudo na agricultura, que são 365 dias por ano, quer seja na produção alimentar ou de animais. Há uma entrega muito grande, tanto de investimento como de trabalho, que não podem ser desvalorizados desta forma; nem pode dar lucro apenas às grandes distribuidoras, mas a quem produz.

    E as grandes distribuidoras, donas dos grandes hipermercados em Portugal, têm batido lucros recorde nos últimos anos.

    Sim, e se nos lembrarmos da altura da covid-19, fecharam-se os mercados locais, mas mantiveram-se abertos os hipermercados grandes. E nós lutamos contra isso também; os Verdes também exigiram na AR que os mercados locais fossem reabertos porque eram tão seguros como os hipermercados.

    Portanto, os lobbies também funcionaram.

    Exactamente. E é nisto que temos de continuar, e temos que ter força para voltar à AR para poder fazer esta pressão e defender aqueles que cuidam realmente da natureza e do ambiente.

    Marcha no 25 de Abril de 2019. (Foto:D.R.)

    Vários jornalistas e investigadores têm alertado para os lobbies das grandes multinacionais nas medidas para a agricultura e para o facto de, na Europa, hoje ainda serem autorizados determinados pesticidas e herbicidas que se sabe serem prejudiciais à saúde, como o glifosato. Além disso, na Comissão Europeia, há também uma vontade de se diminuir as restrições ao nível dos organismos geneticamente modificados na agricultura. Como é que vê esta tendência preocupante na Europa?

    É uma preocupação para nós e é uma luta que trazemos também ao longo do tempo; porque somos contra os organismos geneticamente modificados e lutamos para que sejam regulamentados, bem como com o uso dos pesticidas. Até porque a agricultura intensiva é que tem uma necessidade, em grande escala, destes produtos; a agricultura familiar precisa menos, e por isso defendemos a produção e o consumo locais, para que tudo seja mais próximo e se reduza o desperdício alimentar; para além de ajudarmos assim a economia local. Tudo está interligado, novamente. E sobre esta questão dos pesticidas e dos organismos geneticamente modificados, hoje estamos com uma grande dificuldade nas nossas linhas de água por causa das espécies invasoras, devido à poluição das águas e ao uso excessivo destes pesticidas. Tudo isto é preocupante para nós, e fizemos várias propostas de investimento na despoluição das linhas de água e na concretização do desaparecimento destas espécies invasoras. Mas precisamos, sobretudo, de sensibilização.

    Dos políticos, dos agricultores?

    Dos políticos, também. Mas nós precisamos que os nossos agricultores tenham o Ministério da Agricultura e as suas direcções regionais mais próximos deles.

    Mas não estão cada vez mais próximas de Bruxelas?

    Exactamente. Tal como nós precisamos que a mobilidade esteja em todo o território, nós precisamos que o Ministério do Ambiente e as direcções regionais façam também esse trabalho de proximidade com os agricultores. Porque quando falamos da transição digital chegar à agricultura, não estamos a ver o agricultor com o seu computador no meio do seu terreno, a fazer a sua candidatura aos subsídios. É óbvio que faz, mas depois, naquilo que diz respeito à protecção no trabalho, quer seja no uso de máquinas ou dos tratores e toda aquela maquinaria, quer seja na sensibilização do uso destes produtos, ou num acompanhamento científico e técnico para se perceber de que forma é que se pode proteger as culturas de forma mais natural; e é óbvio que, com as alterações da temperatura –  20 graus em Janeiro não é normal e vai afectar muito as culturas –, naturalmente as pessoas procuram uma solução para não perderem todo o seu trabalho. Mas haveria outras soluções, se o Ministério da Agricultura também não estivesse despojado desta ajuda que deveria dar aos agricultores. Deveria ajudá-los a combater muitos destes problemas, e isso não se vê e nem se sente no terreno.

    Há diversos jornalistas e investigadores preocupados com um reforço dos lobbies em determinadas indústrias, nomeadamente fabricantes de herbicidas e pesticidas, mas com a indústria farmacêutica também no centro, porque acabam por ser multinacionais que produzem esses produtos. E tanto Portugal como os restantes países da União Europeia estão cada vez mais sujeitos a políticas decididas a montante, muito influenciadas por determinados lobbies. E falo não só na questão do ambiente, mas também na saúde humana, porque há também alertas para a enorme influência da Organização Mundial de Saúde. Teme também que estes lobbies possam estar a determinar políticas que não são no melhor interesse da agricultura europeia, portuguesa, e da defesa do ambiente e da nossa saúde?

    Sim; nós acompanhamos essa preocupação. E como já dissemos noutras alturas, Portugal não pode ser sempre o bom aluno, e dizer que sim a tudo sem questionar estas medidas de Bruxelas, que são decididas lá, e depois não têm em atenção a agricultura, o desenvolvimento, e todas as necessidades específicas de Portugal. E nós tentamos também combater e chamar a atenção para isso.

    Precisamos, por exemplo, que Portugal tenha subsídios para a pesca superiores a outros países europeus que não têm mar. E precisamos de não depender tanto da Europa para o desenvolvimento e para a produção nacional. Não temos que fechar leitarias porque o leite é mais barato num outro país ou porque vem de lá para cá; e isso é-nos imposto.

    Precisamos que Portugal tenha mais voz no Parlamento Europeu e possa defender os seus agricultores e a sua população; para que possamos ter produtos mais saudáveis e cumprir com muito daquilo que são as políticas já escritas, como o desperdício alimentar. Porque é que vem tudo de fora, em camiões, quando não há essa necessidade? Nós podemos produzir muita coisa no nosso país, sem ter de fazer essas viagens que aumentam a pegada ecológica, e que podem ser uma mais-valia para a economia nacional.

    Mas a opção tem sido a de não contrariar o que é decidido no Parlamento Europeu, para ser bom aluno. E nós não concordamos com isso, seja a nível dos organismos geneticamente modificados, ou através da imposição de não se poder tabular a energia, porque Bruxelas não deixa. Não podemos continuar neste caminho de obedecer cegamente sem ter em consideração as necessidades do país.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Sente que não é defendido o pluralismo e a diversidade de opiniões na comunicação social no sentido de os portugueses conhecerem as propostas do vosso partido e de outros, para estas questões do ambiente?

    Sim, era essencial que estas questões fossem discutidas. É importante pensarmos que temos de reduzir o IRS e o IVA dos bens essenciais e de olhar para a economia de uma outra forma; tudo isto é importante. E, também, aumentar salários e pensões, dar condições dignas de vida às pessoas, contratar profissionais e respeitá-los no Serviço Nacional de Saúde, defender a escola pública, e ter respeito pela carreira dos professores, que depende de um investimento. Mas é também importante trazermos outras questões para cima da mesa, como o Ambiente e tudo aquilo que o envolve, porque vai ter ligação nisto tudo. E o que tendencialmente se faz, infelizmente, é que continuarmos a achar que a Economia, a Saúde, e a Educação não têm nada a ver com o Ambiente. E que a agricultura não tem nada a ver com o Ambiente. E não é verdade, porque o ambiente toca todas estas áreas; e as medidas ambientais e os projectos que possam ter influência no nosso Ambiente e na nossa natureza precisam de ser pensados englobando tudo isto e trazendo todas estas questões das alterações climáticas. Porque para termos cidades resilientes às alterações climáticas, vamos precisar de as transformar. E isso também vai envolver a Economia, o investimento e as opções políticas. E é aqui que falhamos. De vez em quando fala-se das questões ambientais, mas desgarradas de tudo o resto; quando não é possível desgarrá-las nem é possível concretizá-las se elas não forem pensadas como um todo.

    Tem havido também algumas correntes controversas que dizem que a defesa do ambiente e o combate às alterações climáticas podem não ser compatíveis com uma sociedade democrática. Como é que vê estas correntes que defendem que talvez seja melhor uma ditadura para pôr toda a gente a fazer o que os políticos querem?

    Pois, eu nem sei que diga sobre isso [risos]. Porque a democracia é que nos leva a comportamentos aceitáveis e a mudanças que venham contribuir para o bem de todos, e não só de alguns. Portanto, a Ecologia é compatível com a democracia, e só pode acontecer em democracia; até porque, como sabemos, não era uma preocupação antes de termos a democracia, há 50 anos. Foi depois da revolução que passou a ser uma preocupação, e rapidamente. A questão é que, por exemplo, nós não encaramos, tendencialmente, o acesso à mobilidade como uma questão de saúde pública, e de prevenirmos problemas de saúde que depois nos vão poupar dinheiro no SNS e vão dar qualidade de vida às pessoas. Quando nós pensamos na poluição atmosférica, ou da água, do ruído, ou na poluição luminosa – que é uma questão que é raro falarmos e que a maior parte não quer sequer pensar nisso –, diminuindo todos os níveis de poluição, nós vamos melhorar a qualidade de vida das pessoas. E vamos prevenir na farmácia, no centro saúde e no hospital; vamos poupar noutras áreas. E na agricultura é igual: se comermos bem e estivermos sensibilizados para comer aquilo que está próximo, e para a produção e o consumo locais, vamos ter mais qualidade de vida e mais saúde. E por isso é que agora também se fala numa única saúde, e isso envolve desde os animais aos vegetais e ao ser humano, protegendo também o ambiente.

    Mas de preferência, com poucos químicos…

    Exactamente; com poucos ou nenhuns, de preferência, e tendo essa possibilidade. Mas se nós investirmos na mobilidade, vamos poupar noutras áreas.

    E olhar de uma forma integrada.

    Sim; e se nós apostarmos e investirmos na educação ambiental das nossas crianças, vamos ter adultos que não vão precisar de taxas nem tachinhas para cumprir, nem que a polícia ande em cima deles, ou que haja uma lei a condená-los à cadeia, porque não fecharam a torneira quando estavam a lavar os dentes. Vamos precisar de adultos mais responsáveis; e, por isso, apostar na educação ambiental e na sensibilização nas nossas escolas trará outros comportamentos e outras exigências, enquanto cidadãos, mais conscientes daquilo que queremos e do bem comum – que nos tornará num país democrático e livre, para que possamos enfrentar o futuro e deixar aos nossos filhos um planeta sustentável, que dure ainda muitos anos. Porque, como sabemos, falamos em mitigação e não em combater as alterações climáticas; porque elas já estão aí e precisamos é de mitigá-las e de nos adaptarmos – de alguma forma, protegermo-nos a nós e ao Ambiente para que isto não evolua de uma forma avassaladora, que traga problemas graves para o futuro.

    Transcrição de Maria Afonso Peixoto


    Veja AQUI o programa do Partido Ecologista Os Verdes.


  • ‘Temos de despir a Educação de qualquer tipo de carga ideológica’

    ‘Temos de despir a Educação de qualquer tipo de carga ideológica’

    Presidente do Ergue-te desde 2005, José Pinto-Coelho diz ter “muito orgulho em ser de extrema-direita”. Assume-se como salazarista e demarca-se da xenofobia e do racismo. O seu partido nasceu a partir da quase extinção de um outro – o Partido Renovador Democrático, fundado em 1985 e que chegou a ser presidido pelo antigo Presidente da República Ramalho Eanes. Em 2000, o partido assumiu a identidade nacionalista e mudou de nome, para Partido Nacional Renovador (PNR), mas ficou ‘manchado’ pelas ligações a figuras do neonazismo, como Mário Machado. Nestas legislativas, o Ergue-te concorre a todos os círculos eleitorais e enfrenta a ascensão do Chega, que, segundo Pinto-Coelho, além de não ser de extrema-direita, tem beneficiado de promoção por parte dos media. Esta é a 15ª entrevista da HORA POLÍTICA, a rubrica do PÁGINA UM que deseja concretizar o objectivo de conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE JOSÉ PINTO-COELHO, LÍDER DO ERGUE-TE, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Estão a concorrer a estas eleições legislativas em todos os círculos, correcto? Quais são os vossos objectivos para estas eleições e porque quiseram concorrer em todos os círculos?

    Antes de responder à sua questão, queria fazer esta introdução porque efectivamente, os partidos políticos sem representação parlamentar não têm voz, nem mediatismo; têm apenas umas míseras migalhas. Eu, por exemplo, no dia 20 de Fevereiro vou estar no debate na RTP1 e 3, em directo, com os partidos sem representação parlamentar; mas vão lá estar 10 partidos e o debate dura cerca de duas horas. Aquilo não é bem um debate, é muito entrevista colectiva e é a única coisa que nós vamos ter. E é impossível, nas escassas intervenções de cada partido – que ao todo, somam cerca de sete ou oito minutos, no máximo – passar qualquer mensagem. Portanto, há uma desigualdade brutal entre os partidos com representação e sem representação parlamentar. Dir-nos-ão que os outros tiveram mais votos que nós e, portanto, merecem mais – mas as coisas não são assim. Quando estamos em eleições, tem de ser um ponto de partida igual para todos; porque senão, é um círculo vicioso, porque aqueles que têm votos, têm voz, e como têm voz, têm votos.

    José Pinto-Coelho, presidente do Ergue-te. (Foto: PÁGINA UM)

    Aliás, há um partido que fez uma queixa à Comissão Nacional de Eleições [CNE], precisamente por essa falta de pluralismo.

    Claro. Mas repare: fizeram uma queixa porque são ainda ingénuos e são novos; porque se estivessem aqui há 20 anos a batalhar contra isto, sabiam que uma queixa dessas não dá em rigorosamente nada. Todo este sistema está profundamente blindado, e é profundamente injusto. Nós, ao princípio, tínhamos ainda algumas ilusões de umas queixas na CNE. Mas não vale a pena, é perda de tempo e é criar ilusões absolutamente inúteis. Mas, em relação à sua questão, nós concorremos no país todo, em todos os 22 círculos; somos um dos partidos sem representação parlamentar, e um dos três que concorrem em todos os círculos.

    Aliás, José Pinto Coelho é um cabeça-de-lista por Lisboa e também João Pais do Amaral, vice-presidente, é o cabeça-de-lista por Leiria.

    Exactamente. E o nosso objectivo é participar nas eleições para ir a votos, sabendo à partida que há uma grande desigualdade e que infelizmente em Portugal – e não só, mas o que nos interessa é o nosso caso –, existe uma lógica que é, a meu ver, profundamente absurda: a do voto útil ou estratégico. As pessoas, sistematicamente, não votam naquilo que mais gostam ou em que acreditam, para votar em esquemas estratégicos para correr com outros; é a lógica do mal menor. E esse voto estratégico acaba por penalizar gravemente e ser uma injustiça perante o voto ideológico ou por convicção. E nós temos sido sempre vítimas disso e sabemo-lo, porque eu conheço muitas pessoas, que me dizem mesmo “eu prefiro as vossas ideias, mas vocês não têm hipótese“. Ou acontecia com o CDS ou com o Chega…  

    Desde 2005 que eu sou presidente do partido, e temos ido a votos e temos vindo a crescer, apesar de tudo. E entre os partidos sem representação parlamentar, chegámos a ser um “grande“ entre os pequenos. Nós em 2015 chegámos a ter 27.000 e tal votos; não é uma coisa assim tão ridícula como isso. E nós sentíamos um crescimento, estávamos a crescer claramente; isso era perceptível, e palpável. Mas depois, entrou em cena algo que nos prejudicou gravemente e que levou o nosso eleitorado, porque as pessoas vão atrás de ilusões e de quem tem voz, e o nosso eleitorado fugiu-nos. E, usando uma linguagem de luta de boxe, eu costumo dizer que em 2019, em que perdemos 10.000 votos, fomos às cordas, e em 2022, fomos ao chão, porque passámos para 5.000 votos.

    Está a falar da subida e da concorrência do Chega?

    Sim; directa e claramente desse partido; e já podemos, mais à frente, esmiuçar um pouco mais essa questão. Mas sim, fomos ao chão, com 5.000 votos; daqueles que são resistentes e que realmente votam por ideologia pura e não embarcam em ilusões ou utopias ou no voto estratégico. E claro que isso teve reflexos no ânimo, na debandada, e na perda de crença por parte de muita gente…

    E na parte financeira, certamente.

    Sim, e também há uma grande injustiça na parte financeira, porque os partidos com representação parlamentar são subvencionados pelos nossos impostos, e os partidos sem representação parlamentar, não são. Ou seja, uns ganham dinheiro por cada voto, e outros não ganham; portanto, há um tratamento desigual. Isso não me parece justo. É evidente que os partidos todos deviam receber dinheiro do erário público.

    (Foto: D.R./Ergue-te)

    Portanto, não partem em pé de igualdade.

    Pois. É evidente que se nós tivermos agora 5.000 votos, deveríamos receber por cada um desses votos; porque essas pessoas não são menos do que os 2 milhões que teve o Partido Socialista [OS], e que recebe função disso. Todos os partidos deveriam receber; e nós até defendemos que os partidos recebem demasiado dinheiro da subvenção, que é uma injustiça, porque é são 135 avos do Indexante de Apoios Sociais [IAS]. Estamos a falar de cerca de 3,50 euros por cada voto que os partidos recebem; são barbaridades do erário público. Eu compreendo que os partidos possam receber uma subvenção, porque são um mecanismo fundamental para que o sistema político exista. O Estado também tem de alimentar a sua própria máquina. Mas nós defendemos que essa subvenção devia ser muito inferior, cerca de 400 avos; ou seja, mais ou menos 1 euro e pouco por voto – mas devia ser para todos. O Ergue-te sempre foi um partido que viveu exclusivamente das cotizações dos militantes; e é muito pouco. Mas uma coisa é termos tido habitualmente um orçamento anual de cerca de 7.000 euros, e agora levou uma pancada muito grande. Nós apresentamos para estas eleições um orçamento de 1.500 euros, que se resume praticamente a tempos de antena. Não temos dinheiro para campanha nenhuma, nunca tivemos; publicámos um ou outro outdoor. É absolutamente impensável.

    Então, fazem uma campanha mais presencial, ou nas redes sociais?

    Redes sociais; é basicamente por aí. E, portanto, agradecemos muito iniciativas como esta do Página Um, que nos dá voz. Infelizmente, sabemos que o alcance não é o mesmo que terá uma televisão em horário nobre, mas é com isso que contamos. Em termos de objetivos: antes de mais, concorrer é uma questão de orgulho, independentemente de termos mais ou menos votos; e há sempre a esperança de que haja um crescimento. Nas últimas eleições, nós concorremos como Ergue-te, e eu acredito – até porque já ouvi algumas vozes nesse sentido – que muita gente nem sabia que era o PNR. E foi um risco calculado, mas há um preço a pagar, e eu acredito que tenhamos sido vítimas disso. Nestes dois anos, já houve um maior conhecimento, e não tenho a menor dúvida de que vamos ter novos votos

    Ou seja, o nome já é mais conhecido?

    Já começa a ser; há pessoas que não se tinham apercebido e que já se apercebem. De facto, foi um risco calculado, mas mudámos o nome numa altura que nos era adversa. Podem ser erros, mas nós pensamos nas coisas a prazo e não no imediato; não somos nada imediatistas. Somos corredores de maratona. E para nós, qual seria um bom resultado? Única e exclusivamente este: ser eleito. Estamos aqui para ser eleitos e, tendo voz, quero mostrar aos portugueses qual é verdadeiramente o único partido antissistema – que não é faz de conta, nem oposição controlada. É bater de frente contra este sistema e contra este regime.

    O regime de que fala é o do arco da governação?

    É o regime que nasceu no dia 25 de Abril, e que nós não sufragamos. Ao contrário de todos os outros partidos políticos, nós não gostamos deste regime. Foi um regime que, do nosso ponto de vista, inaugurou a página mais negra da história de Portugal; pior ainda do que o tempo da ocupação espanhola. Porque essa era uma ocupação externa, e agora estamos a ser ocupados, na nossa opinião, pelos traidores internos; que é pior.

    O Ergue-te é um partido muito apontado como sendo de extrema-direita e defensor do salazarismo. Como é que um partido de extrema-direita, que elogia admira Salazar, convive com a democracia?

    Só para concluir a questão anterior: um bom resultado é ser eleito, mas qualquer coisa que denote um crescimento claro, não sendo um bom resultado, será animador. Agora, sobre esta questão: é sempre um bocado complicado falar quando se utiliza rótulos. Eu nunca tive medo de dizer nada daquilo que penso, e não ando aqui com jogos.

    Mas não se revê nestes termos?

    É isso que vou explicar. Pessoalmente, eu sempre afirmei de extrema-direita; não tenho nenhum problema, tenho muito orgulho em ser de extrema-direita. Mas quando se fala em rótulos políticos é sempre complicado, porque cada um tem a sua ideia e não há uma base clara ou científica sobre isso.

    João Pais do Amara, vice-presidente do Ergue-te e cabeça-de-lista por Leiria. (Foto: D.R./Ergue-te)

    Mas quer dizer que há várias extremas-direitas?

    Não; se assumirmos que sou eleito, onde é que me vou sentar no Parlamento? Na extrema-direita, porque não há ninguém mais à direita do que eu. Portanto, isso não é nada de pejorativo, é assim. Há a extrema-esquerda, como o Bloco de Esquerda, e há o extremo-centro, como o PSD. Os rótulos que eu prefiro é: nacionalista, e soberanista. Isto é que nos identifica. Agora, se querem chamar extrema-direita… Eu considero-me naturalmente de extrema-direita.

    Têm sido apontadas semelhanças, por exemplo, com a francesa Frente Nacional.

    Neste momento, já não, porque a Frente Nacional desvirtuou-se totalmente com Marine Le Pen, que consideramos que está a trair o seu pai. Mas deixe-me só recuar um pouco: disse que somos um partido que defende o salazarismo, e isso não é verdade. Eu sou salazarista, mas o partido não defende isso, porque o partido é do século XXI e para o século XXI; para o futuro. Não somos saudosistas. Mas, é evidente que todos temos direito às nossas referências. Ainda agora vão celebrar os 50 anos do 25 de Abril e podíamos também dizer que são passadistas, porque já lá vão 50 anos. Mas, o partido não tem o salazarismo como referência – que isso fique claríssimo. Eu pessoalmente tenho a mais profunda admiração por Salazar e pelo Estado novo, mas isso pertence ao século XX. Hoje em dia, seria absolutamente impossível de replicar, porque a sociedade mudou. Voltando à Frente Nacional. Eu já fui a França discursar, por duas vezes, em iniciativas da Frente Nacional, no tempo do pai, Jean-Marie Le Pen. Nomeadamente em 2007, quando ele se candidatou a eleições presidenciais e convidou alguns partidos congéneres europeus. E eu tive a honra e o privilégio de ter estado lá num pavilhão imenso, em Lille, completamente repleto e durante uns minutos, a discursar em francês a apoiar a candidatura de Jean-Marie Le Pen. Hoje, o partido desvirtuou-se bastante; a filha claramente traiu os caminhos do pai – tanto é que, a neta de Jean-Marie Le Pen, Marion Maréchal Le Pen, sobrinha de Marine, que é mais na linha do pai, saiu do partido e agora está com o Zemmour. Porque é mais na linha do daquilo que era a antiga Frente Nacional. Portanto, hoje não temos qualquer ligação com esse partido.

    Considera que também outros partidos, conotados com a extrema-direita, têm estado a desvirtuar-se?

    Sim. Mas lá está, o problema dos rótulos: a comunicação social e a narrativa politicamente correcta gosta de ter rótulos para fazer uma encenação, e dizer que há uma extrema-direita – sobre a extrema-esquerda por acaso nunca falam – e chamar extrema-direita a tudo o que seja um bocadinho de fora daquilo que é o grande centrão. E isso é profundamente incorreto. E quanto mais chamam extrema-direita ao Chega – que não é –, mais votos lhe estão a dar. E é um erro crasso porque estamos a chamar uma coisa que na verdade não são, e isso atrai votos.

    Entende que a imprensa está a promover o Chega?

    Sempre esteve; desde antes da sua existência. É quotidiano: o André Ventura está sempre nas notícias, porque ele é extremamente hábil e muito esperto, e sempre arranjou casos e historietas e ruído para aparecer na comunicação social. O Chega foi completamente promovido pela comunicação social e continua a ser.

    Não sendo esse o objectivo desta entrevista, pergunto-lhe se guarda alguma tristeza ou rancor relativamente a André Ventura, devido a algum tipo de aproximação no passado?

    Antes da entrevista, eu desabafei consigo e vou dizer isto aqui publicamente. Eu lamento que nas escassíssimas entrevistas que tenho tido desde 2019, se fale sempre do Chega. E mesmo que eu não fale, e não quero falar, sou interpelado nesse sentido. E assim, estou a fazer propaganda a outros. Eu gostava que perguntassem a André Ventura se, ao princípio, para ganhar votos, ele não copiou de cálculo o programa do PNR; porque foi “decalcadinho“, mas com uma diferença: nós acreditamos naquilo que defendemos, e ele não acredita. Eu não tenho propriamente um rancor.

    José Pinto-Coelho num vídeo de campanha do Ergue-te.

    Acredita que André Ventura não é de extrema-direita?

    Não é; ele é de extremo-oportunismo. Sei que estas palavras parecem duras, mas acredite que não tenho rancor porque eu luto contra os sentimentos primários de rancor. Não quero, até porque o rancor só faz mal a quem o sente.  Mas também não ando aqui a dourar a pílula relação a isso. Ele é um homem que é um social-democrata, que pertence ao sistema, e que esteve e apoio o PSD durante 17 anos, e que depois foi alavancado pelas aparições na CMTV e como colunista no Correio da Manhã. E depois – não sei porquê nem me interessa –, foi posto num lugar-chave para lançar o Chega, que já tinha outdoors antes de ser partido. Portanto, há muito dinheiro que entrou ali, e teve imensa visibilidade. E realmente foi lançar os chamados soundbites – eu prefiro dizer chavões, porque sou português – com os quais as pessoas concordam. E nós andamos há 20 anos a dizer as mesmas coisas, e aparece um homem, sem passado, que começa com uns chavões e as pessoas aplaudem-lhe a coragem. É absurdo.

    Então, não acredita que o Chega conseguindo mais votos, como as sondagens apontam, terá capacidade de fazer diferença, nem que a sua intenção seja a de fazer a diferença?

    Não vai fazer diferença por uma razão: é um partido do sistema. Veja como ele vai buscar ao sistema toda a escória, o refugo dos partidos, e as segundas e terceiras linhas do PSD, do CDS, e da Aliança. Ele está a ir buscá-los a todos; ou seja, pessoas que não tinham já emprego nesses partidos, vão ter um emprego no Chega. E isso é um partido antissistema? Por amor de Deus, não é nada; é um partido completamente do sistema. E n aquele partido não há uma coluna vertebral, não há pilares fundamentais e ideológicos – são tudo e o seu contrário, se for preciso. Isto não se trata de rancor contra uma pessoa, mas de um sentimento real de injustiça. Eu não acredito que o Chega vai ter 20% dos votos.

    Não acredita nas sondagens?

    Não acredito. Mas ainda assim, vai subir consideravelmente, até ao ponto em que as pessoas começarem a ver assim que o Chega afinal é mais do mesmo. Mas aquilo que me chateia é que as pessoas que pensam como nós, não votem em nós, e estejam a desperdiçar votos noutro partido. Portanto, aqui não é rancor, mas é mágoa e um sentimento de traição e de abandono, de que as pessoas deviam apoiar um partido no qual acreditam. Mas votam num partido só porque vai correr com o PS; eu acho isso tão redutor e tão pouco exigente. Porque vão correr com o PS agora, mas daqui a uns anos o PS está lá outra vez. Isto é ouvir o disco e toca o mesmo. Portanto, o grau de exigência das pessoas é extremamente baixo. E isso chateia-me porque se houvesse coragem para mudar e para mudar mesmo…. Uma mudança a sério, de paradigma e de mentalidades, exige sacrifícios. As pessoas, porque veem uma passadeira à frente e cavalgam essa passadeira, votam num partido para correr com o OS. Assim, sem esforço, vão muito comodamente lá pôr o voto, e esquecem aquelas pessoas que têm lutado contra tudo e contra todos, sem meios, e que gastam a sua vida toda a lutar. E viram-lhes as costas, quando o Ergue-te é que seria um partido de real oposição ao sistema e que não tem ilusões para mudar as coisas. Para mudar o paradigma actual, é um processo que vai levar muito tempo e vai exigir muito sacrifício, mas com um objectivo: tornar Portugal novamente português.

    Então podemos excluir algum tipo de disponibilidade para entrar em coligações, seja nestas eleições, seja no futuro?

    Eu acho que coligações é uma coisa que não faz sentido. Se há um partido, é porque esse partido defende algumas coisas, e se há outro partido, é porque o outro partido defende outras coisas. Mas se há partidos muito semelhantes, às tantas, mais vale fundirem-se. Porque quando há uma coligação tem de haver cedências e nós por acaso já fomos desafiados nestas eleições em concreto. Tivemos dois contactos para fazer uma coligação, com o Nós, Cidadãos e com o Partido Popular Monárquico, antes de estar na AD. Eu disse logo que era nem um nem outro; nem pensar. Coligações obrigam a cedências importantíssimas. Além disso, se nós estamos sempre combater o sistema, e todos estes partidos do sistema, sejam eles com ou sem representação parlamentar…  Isso no fundo era trair a nossa própria identidade. Portanto, nunca faremos coligações. E voltando aqui às contradições do outro senhor: uma pessoa que dizia há anos que nunca faria coligações com os partidos do sistema, porque dizia-se anti-sistema, está desejoso de entrar num governo qualquer com o PSD; e as pessoas não conseguem ver isso! As pessoas não conseguem, e isso sinceramente entristece-me. As pessoas quando estão deslumbradas com alguma coisa, só veem o que querem. Mas nós temos que fazer o nosso caminho. E quem começa a abrir a pestana e volta para nós, é muitíssimo bem-vindo porque eu acredito no arrependimento, e sei que neste momento há pessoas já estão arrependidas, e que já voltaram atrás. Dói-me, mas são bem recebidas, porque as pessoas podem-se enganar e é assim a vida. Nós vamos continuar o nosso caminho.

    Para além do timing de mudança de nome que referiu, no vosso passado houve algumas situações que podem ter afastado portugueses que, apesar de terem uma ideologia nacionalista, não se reviam, por exemplo, nas aproximações que tiveram a figuras mais ligadas ao neonazismo, à xenofobia ou ao racismo. Considera que isso é uma mancha no vosso percurso ou é algo que faz parte também do partido?

    Bem, vamos lá ver. É evidente que nós temos um percurso e isto leva-nos muito para trás. Sempre houve em Portugal várias tendências dentro do nacionalismo; e que, tendo algumas coisas em comum, depois têm grandes divergências do ponto de vista até estético e de um modo de ser e de estar. E o nosso partido, quando aparece, e estamos a falar do ano 2000, falar de Salazar é um crime de lesa-pátria. As pessoas têm que ter essa noção; foi há 23 anos. As pessoas tinham medo de falar de qualquer coisa. Nós até, para criar o partido, estamos a tentar desde 1997. Havia uma coisa que era a Aliança Nacional, que queria transformar-se em partido. Arranjar nomes para legalizar o partido era uma missão quase impossível, porque as pessoas tinham medo de dar o seu nome. Às vezes, eram tardes inteiras a contactar pessoas e a contar-lhes os objetivos e contar a história da nossa vida, para depois no fim nos dizerem que iam pensar.

    Na altura conseguiram 5.000 assinaturas?

    Não conseguimos, só 2.000, e nunca mais saíamos dali. E, por isso, apanhámos uma janela de oportunidade. Foi uma coisa genial: o partido do Ramalho Eanes, o Partido Renovador Democrático [PRD], ia-se extinguir. O Tribunal Constitucional ia extingui-lo, porque não apresentava contas, estava cheio de dívidas, e as pessoas tinham debandado. E nós falámos com o então presidente Vargas Loureiro, que morreu passado pouco tempo, porque estava já muito doente, e fizemos uma Convenção com os escassos militantes que restavam ainda do PRD. E ficámos com o partido; ele também estava desejoso de passar aquele peso que tinha em cima. Ficámos com o partido e mudámos o nome. E a partir de 2000, começamos com um projecto nacionalista, que era extremamente difícil, mas reunia pessoas sobretudo do passado, muitos velhos salazaristas, etc. E havia. E em paralelo, na juventude, havia uma dinâmica de crescimento. E como toda a Juventude, com todos os excessos, e uma imagem que não é nossa… Mas foi um passo que era inultrapassável e era inevitável: ou nós desaparecíamos, e não tínhamos força nenhuma nem visibilidade, ou havia de facto alguma junção. Eu acho que muito injustamente, sinceramente, as pessoas preocupam-se com uma imagem de radicalismo, mas não se preocupam com o radicalismo dos partidos do sistema de levarem bancos à falência, da corrupção toda, dos pedófilos, dos processos abafados. Isso não preocupa as pessoas que continuam a votar nesses partidos. Mas, quando um partido de facto não tem grande força, todo e qualquer pretexto serve para que não se vote nele. Mas o facto é que nós vínhamos a crescer.

    (Foto: PÁGINA UM)

    Mas o Ergue-te estava ligado, por exemplo, a Mário Machado.

    Não é assim, é ao contrário. Ele teve uma breve passagem, já lá vão tantos anos.

    Mas hoje, o Ergue-te identifica-se com ideologia neonazi, xenófoba, racista?

    Não, nem hoje nem nunca.

    Há pouco falou em excessos e há excessos na juventude, mas a xenofobia e o neonazismo, eu não considero um excesso, já é algo extremo…

    Não é no nosso partido, o nosso partido é aquilo que sempre foi: a sua direcção, eu em concreto, e as coisas que nós dizemos.

    Portanto, hoje não têm ligação, nem subscrevem qualquer tipo de ideologia neonazi?

    Nem hoje nem nunca, nunca subscrevemos, nunca isso aconteceu. Dentro de cada partido, pode haver pessoas que tenham estilos próprios, mas o partido nunca foi isso. Mas se as pessoas querem dar essa conotação, problema delas. Eu não renego o passado, nem me envergonho de nada. Nem acho que seja nenhuma mancha. Simplesmente o partido teve o percurso que teve, e sempre defendeu abertamente as causas que eu divulgo. E aquilo que eu dizia há 20 anos, há 15, ou há 10, digo hoje; sem problemas nenhuns. Nós somos um partido nacionalista. Xenófobo ou racista são chavões, que dá para tudo. Eu não sei o que é ser xenófobo ou racista, sinceramente; porque chamam racista a quem não quer que haja uma invasão de imigrantes. Isso hoje é ser racista… Portanto, eu desprezo esse tipo de rótulos. Estou-me nas tintas para esse tipo de rótulos, não me importo absolutamente nada. Nós somos o que somos.

    Olhando agora para a frente, que propostas têm? Têm defendido ideias como a industrialização da economia, a promoção da agricultura e as pescas, regular os mercados de energia e o financeiro, e regular os produtos de primeira necessidade. Mas sobre as questões mais actuais, como a habitação e a Saúde, o que propõem?

    Começou por falar numa área que não é propriamente aquela que mais nos identifica. Nós temos posições sobre todas as matérias, desde o Ambiente até a imigração. Mas há matérias que são bandeiras principais, porque nos distinguem de todos os demais. E na economia também, porque nós repudiamos de igual forma o socialismo e o liberalismo; para nós, são dois cancros, duas mazelas e dois atentados à soberania de uma nação. Repudiamos veementemente o socialismo, por criar um Estado paternalista igualitário que não premeia o mérito e que trata de igual forma o empreendedor e o parasita, e repudiamos igualmente o liberalismo, que sobrepõe a economia e o mercado à política e às nações.

    Então o que é que defendem nesse aspecto?

    Nós defendemos, como dizemos no início do nosso programa, a identidade, o património histórico e cultural e a soberania da nação, para que a nação seja coesa e que tenha futuro. Contudo, temos de definir perspectivas político-sociais que sejam realistas no contexto em que vivemos, nós não somos tontinhos e desajustados do tempo, nem anacrónicos. Portanto, uma coisa é aquilo que idealizamos, e outra coisa é aquilo que é possível. Eu, pessoalmente, gosto do proteccionismo de mercado. Dou-lhe dois exemplos muito concretos e muito bem-sucedidos: a Espanha de Franco, ou o Brasil do regime militar; em que se tinha capacidade e meios para promover a produção nacional e alavancar a economia. Foram dois grandes sucessos para ambos os países. Mas eu sei que hoje não é possível replicar esse modelo – no contexto actual, o com a União Europeia, nada disso é possível. Mas também é verdade que se uma pessoa está amarrada, pode tentar com alguns movimentos folgar um bocadinho os laços. Portanto, aquilo que nós defendemos é proteger na medida do possível tudo o que é produção nacional, e – na medida do possível, mas sendo corajosos nisso e batendo o pé onde pudermos –,  relançar os sectores vitais para uma maior autonomia e soberania, como os sectores alimentar, energético, pesca, agricultura, indústria.  Nós demos cabo disso tudo; a nossa integração europeia não só foi uma irresponsabilidade mal feita, porque podia ter sido muito melhor acautelada… A entrada no euro, no meu ponto de vista, foi também um erro crasso. Porque os portugueses continuaram a ganhar salários na lógica do escudo, mas a consumir na lógica do euro, e a perder uma qualidade de vida absolutamente extraordinária e tudo isto está irrecuperável. Nós somos um país com um mercado, por exemplo, habitacional, com preços a nível de outras cidades europeias, mas ganhamos muitíssimo menos. E estamos numa concorrência desleal porque vêm cá estrangeiros, compram casas, e estão a comprimir e a fazer uma pressão brutal no mercado habitacional.

    Mas também incentivados por algumas políticas.

    Sim. E por isso é que eu digo que este é um tegime traidor porque nos desprotege e está a prejudicar o seu próprio povo. E isso volta-me à questão do proteccionismo de mercado: nós defendemos o proteccionismo onde ele é possível, e há sectores onde é possível. E o que este regime faz, com estes sucessivos governos… E repare que eu não aponto só o dedo ao PS, porque isso é a tal ilusão muito pouco exigente. Não me interessa combater o OS; eu quero combatê-los a todos, porque são, no fundo, todos culpados. É verdade que o PS esteve lá muito mais anos, mas os outros também fizeram a mesma porcaria; os vistos Gold e essas coisas todas que nos estão a prejudicar gravemente. Nós defendemos o maior proteccionismo possível em cada momento, que não tem nada de mau, pelo contrário: é muito bom, é proteger aquilo que é nosso. Dir-me-á que há muitos limites em função da União Europeia. Pois há, mas nós temos que começar a alargar um pouco isso e criar as condições para que, num futuro o mais breve possível mas sempre distante, possamos pensar numa espécie de Brexit. Porque as pessoas diziam que a Inglaterra se ia perder, e não se perdeu nada. A Inglaterra continua o seu caminho; é verdade que tem outra capacidade porque não estava no euro. Mas por isso é que eu defendo que temos de começar a olhar para nós e criar as condições para que um dia possamos não depender. Porque por este caminho, o que é que nós somos? Somos um povo escravo. Vamos ser um país cada vez mais periférico, que não tem peso nenhum, e vamos ser um povo de serviços – de má qualidade, ainda por cima.

    José Pinto-Coelho na RTP, no debate entre os líderes dos partidos sem assento parlamentar.
    (Foto: Captura de imagem do programa na RTP1)

    Portanto, defende a saída de Portugal, a prazo, da União Europeia?

    Sim, nós somos contra a União Europeia e contra esta união federalista e castradora. Mas nós não somos irresponsáveis como o MRPP, e demagogos, a dizer que vamos sair já, e vamos sair como? E depois no dia seguinte, quem é que paga os ordenados da função pública? Isso é impossível. Temos que perceber que isso é impossível. Porém, também não alinhamos com aqueles que estão muito confortáveis na União Europeia. Do nosso ponto de vista, a UE é um corpo estranho, e tem de ser combatido porque é uma construção artificial. A EU de hoje não tem nada a ver com a inicial CEE. Ou seja, está a ser mudada nas nossas costas, nos bastidores, por políticas obscuras e interesses inconfessáveis que só prejudicam as nações. E, com isso, prejudica que as empresas nacionais e as famílias nacionais. Eu detesto a UE, mas nós não podemos sair agora. Temos é de criar condições para um dia fazê-lo. Mais uma vez, as nossas políticas e as nossas propostas são a prazo; é uma mudança de paradigma e mudança de mentalidades. A curto e a médio prazo, aquilo que podemos fazer é mudar algumas coisas. E é por isso que é urgente que entremos na Assembleia da República, para que a partir daí possamos crescer desmesuradamente – que eu acredito nisso – e começar a mudar o rumo de algumas coisas em Portugal.

    E defende um protecionismo em que áreas, por exemplo? Indústrias, produtos? Em tudo. A mim faz-me imensa aflição que, por exemplo, a eletricidade seja dos chineses, ou que a ANA seja dos franceses; isso não faz sentido. As coisas, ou são viáveis ou não são viáveis. Se são, porque é que não estão na mão dos portugueses, e estão na dos chineses? Isso é um crime de traição à pátria: passar sectores absolutamente vitais da nossa economia e soberania para mãos estrangeiras. Nunca poderia ter acontecido. E não era obrigatório, ninguém nos obrigou a vender. Outro exemplo: os nossos impostos estão a pagar milhões de euros por ano de arrendamento aos proprietários do Campus de Justiça, que também são franceses. Isso faz algum sentido? É nesta perspetiva que temos de ter medidas proteccionistas, e garantir a maior independência e autonomia possível. E isso aplica-se transversalmente em todos os sectores: desde a propriedade às grandes empresas, às energias, e à produção agrícola. Tudo. Onde podemos ter em português, não devemos abdicar, e devemos recuperar isso. Por isso é que também – e agora vou mudar um pouco de tema –, o acordo ortográfico, por exemplo, também é uma traição, porque estamos a desvirtuar aquilo que é a nossa língua escrita e a abdicar voluntariamente de uma parcela importante de identidade nacional. Portanto, isto aplica-se quer à cultura quer à economia e à população.

    Então também não gostou do novo símbolo da República Portuguesa?

    Isso é absolutamente absurdo. E os preços… Aquilo custou quase 80.000 euros.  Desbaratam o nosso dinheiro. E esse símbolo é absolutamente deplorável, porque não é um símbolo nada; é um grafismo que não pode simbolizar uma pátria. Até porque as pessoas são muitas vezes induzidas em erro e acham que a bandeira portuguesa é tricolor, mas não é. A bandeira é bicolor, com o verde e o encarnado. Só que depois tem um escudo, com a esfera armilar, e tem ali um certo amarelo; mas leva as pessoas a pensarem que é tricolor, e este grafismo novo induz ainda mais a isso. Nós não somos os Camarões; os Camarões sim, têm essas cores. Mas nós temos esta bandeira, é a bandeira nacional e eu prezo-a, por um lado, porque foi sobre ela que lutámos no Ultramar, mas desprezo-a em simultâneo, por ser a bandeira da República. Eu não sou republicano, sou monárquico; e ainda por cima é uma bandeira maçónica, porque aquilo veio muito da carbonária da Maçonaria, sobretudo o verde. Mas enfim, isso são outros 500….

    João Pais do Amaral num vídeo de campanha do Ergue-te.

    E qual é a vossa postura em relação ao tema da imigração e o fluxo migratório que vemos para Portugal e outros países europeus?

    Já em 2000, há 23 anos, nos insurgimos contra as leis permissivas de imigração. Nós sempre nos batemos pela nossa identidade e pela promoção do crescimento demográfico de portugueses; porque nós estamos a passar um terrível Inverno demográfico, nascem cada vez menos portugueses, e é preciso investir é no nascimento de portugueses e não na importação de imigrantes para colmatar essa falha. E nós sempre nos insurgimos contra aquilo a que chamamos a invasão imigrante, ou seja, uma imigração descontrolada e excessiva. E sobretudo se ela vem de pessoas que culturalmente não partilhem da nossa matriz, porque isso é pôr em perigo, obviamente, a nossa identidade, matriz cultural e os nossos costumes. Em 2007, com aquele famoso cartaz do Marquês, que pusemos, corremos um grande risco. Houve partidos que apresentaram queixa na Procuradoria-Geral da República para nos extinguir e ilegalizar. Isso é verídico. Mas nós, com coragem, dissemos que basta de imigração, e nacionalismo é a solução, e com uma nota de humor também, que faz parte, a dizer para fazerem boa viagem. Portanto, nós sempre fomos contra esta imigração invasora, e contra os acordos Schengen. Um país sem fronteiras é a mesma coisa que uma casa sem portas; ninguém na sua casa tem a porta escancarada nem retira a porta. Entra apenas quem nós queremos. Portanto, isto não faz absolutamente sentido nenhum. E esta onda de invasões migrantes tem sido cada vez mais maior e mais volumosa.

    Na sua opinião, a Europa e Portugal deveriam, e sobretudo Portugal que também é um país de emigrantes e que sempre na sua história se integrou, umas vezes melhor, outras vezes menos bem, com outras culturas. Entende que Portugal e a Europa deveriam fechar os olhos, por exemplo, a imigrantes que vêm de países que estão em guerra, de situações de pobreza extrema e de fome que atravessam o Mediterrâneo? O que é que fariam em relação a essas pessoas?

    Quando começou a primeira grande onda desses ditos refugiados que atravessavam o Mediterrâneo, nós em 2015, quando tivemos a melhor votação, pusemos um outdoor – o único – a dizer ”não aos refugiados”, e pusemos refugiados entre aspas porque eram imigrantes e migrantes económicos. Aproveitaram a situação da guerra na Síria, e os que cá chegavam vinham de vários países, nem sequer eram da Síria. Portanto, aquilo foi um falso acolhimento de refugiados. Ainda hoje, continuam a chegar ao Algarve de vez em quando pessoas vindas de Marrocos e vêm lá com os seus ténis de marca e os seus telemóveis… Isto é uma vergonha. Mas deixe-me só acabar aqui com um mito. Portugal sempre foi um país de emigração, é verdade. E tem tido surtos de emigração consideráveis desde o século XIX, pelo menos, para vários pontos do globo, mas atenção: primeiro, os portugueses que ficam não têm de ser reféns dos que partem. Era o que mais faltava! Aqueles que ficam têm de aceitar como moeda de troca outros, só porque alguns dos nossos querem ir para fora?

    E hoje há outra vez esse movimento, com muita saída de jovens do país.

    Exactamente; eu já vou a esse aspecto. Mas, de uma vez por todas, as pessoas têm que bater o pé e não se deixar comer por parvas com certas coisas. Porque nós também emigrámos… Sim, eu também vivi no Brasil a seguir ao 25 de Abril, era miúdo. Mas os portugueses que ficam não têm que ser reféns daqueles que partem. Depois, quando os portugueses emigram a sério, emigram para trabalhar, e não é de mão estendida à espera de apoios sociais. E quando emigram, respeitam o país que os recebe, integram-se e vão para países de matriz cultural semelhante. Nunca houve imigração maciça de portugueses para o Uganda ou para a Tailândia… Procuram o Brasil, a Venezuela, França, Alemanha, Inglaterra…

    (Foto: PÁGINA UM)

    Onde podem ter oportunidades de emprego e de condições de vida.

    Sim, mas repare, os portugueses nos anos 60 foram viver para bairros de lata nos arredores de Paris, sem electricidade, sem água e com condições de higiene miseráveis. E, portanto, o português não é emigra para usufruir de apoios sociais, e emigra para países semelhantes. Mas nós s não temos que ser reféns disso e não temos que receber uma imigração que custa muito ao país, por muito que que os observatórios falem do lucro; não dão lucro nada. Porque repare, quando falam naquele número astronómico para a segurança social: é evidente que os trabalhos têm que descontar. Mas, para já, n[os não temos que ver as coisas de uma perspectiva economicista, porque há coisas muito mais importantes, como a questão da identidade e da substituição populacional, que há muitos anos vimos alertando. Mas mesmo do ponto de vista da economia, então e o que perdemos em apoios sociais? E o que perdemos na criminalidade que tem vindo a aumentar? E não venham com conversas que o português se tornou mais criminoso; a criminalidade vem sim da imigração descontrolada.

    Mas também há muitas redes, que acabam por aproveitar-se da fragilidade de muitos imigrantes, não é?

    Claro; mas nós não apontamos o dedo ao imigrante em concreto – excepto em alguns casos –, mas sim aos nossos governantes, que são traidores e que permitem isto. E isto é tudo uma hipocrisia: nós estamos a assistir a uma invasão do Indostão, pessoas que vêm do Paquistão, do Nepal, da Índia, e que depois têm trabalho escravo! Como é que essas pessoas que são os campeões de defesa dos direitos humanos e da dignidade – toda a esquerda –, mas depois encomendam comida fornecida por um paquistanês que passa o dia, de sol a sol, a trabalhar para dar ao pedal, para ganhar uma miséria e que vive num buraco qualquer com mais de 50 pessoas? Isto é uma hipocrisia, porque eles estão a fomentar o trabalho escravo, indigno e estão a prejudicar gravemente os portugueses. Mas estes são os que trabalham; porque também há tantos imigrantes fora dos grandes centros urbanos, como no Alentejo, que vivem exclusivamente de apoios sociais pagos com os nossos impostos. Isso é de uma injustiça tremenda. Portanto, o que o Ergue-te sempre defende é reverter os fluxos migratórios. E isso não se faz com medidas avulso nem com cosméticas; e por isso é que eu falo sempre na mudança de paradigma, e isso vai levar tempo; mas é preciso começar. É preciso começar a criar condições para que Portugal, baixando impostos – é a famosa curva de Laffer…

    Portanto, defendem que se reduza a carga fiscal?

    Sim, para animar a economia, porque quando há uma grande pressão sobre os impostos, o próprio Estado não angaria tantas receitas como angariaria se houvesse uma redução de impostos. E o Brasil, com Bolsonaro, recentemente, é um exemplo disso. Trump também fez isso e foi um sucesso económico brutal. Acontece que é preciso mexer em muitas situações.

    (Foto: D.R./Ergue-te)

    Portanto, menos impostos para as empresas, para as famílias?

    Sim. É preciso voltar a criar condições para que os portugueses regressem, porque há muitos portugueses, sobretudo jovens, massa cinzenta, que sai do país; alguns, porque querem, mas isso é uma minoria. A maior parte é porque a sua mãe pátria lhes recusa um ganha-pão digno e não lhes dá valor, porque as pessoas tiram cursos superiores muitas vezes, e depois vão ganhar 800 ou 900 euros.

    E não tem habitação. Mas para fixar de facto esses jovens e para haja salários mais dignos, que medidas é que propõem?

    Várias coisas, e vou ser muito sumário. Em relação à imigração, é fechar as portas, e mandar embora aqueles que estão cá a mais e que vivem em apartamentos aos 50 ou aos 40. Nós não queremos cá imigrantes de raças e culturas que não têm nada a ver connosco; e queremos mudar a lei da nacionalidade, porque a nacionalidade herda-se e não se atribui administrativamente na secretaria. Por outro lado, atrair os jovens baixando impostos. O problema da Habitação é culpa directa de todos estes governos. As pessoas não vão gostar desta medida e vão dizer que perdemos votos, mas não queremos saber,  nós pensamos nos portugueses em primeiro lugar: queremos acabar com o alojamento local nas grandes cidades. Em Lisboa e no Porto não pode haver alojamento local; no resto do país, onde quiserem, tudo bem. Depois, fiscalizar as casas que têm lá a viver 40 e 50 indostânicos, e proibir isso, mandá-los embora para sua casa, e reverter os fluxos migratórios. Depois, recuperar edifícios que estejam devolutos do próprio Estado, impedir a venda de casas a não residentes em Portugal, porque tem havido uma imensa especulação imobiliária e nós estamos a concorrer com o poder de compra de estrangeiros. E há ainda a questão de que a Caixa Geral de Depósitos devia efectivamente baixar os juros à habitação, porque tem margens de lucro astronómicas. E se nós não podemos impor isso aos bancos privados, o Estado tem a obrigação de o fazer – aqui está um aspecto de intervencionismo e de proteccionismo. Se o Estado o fizesse, os outros, por concorrência, eram obrigados a baixar também os juros.

    (Foto: D.R./Ergue-te)

    Portanto, com esse conjunto dessas propostas, já iria haver mais habitação?

    Eu estou convencido que sim.

    Nos últimos anos, o vosso partido foi crítico, da questão da TAP, mas também, por exemplo, das aulas de cidadania, que defendem que deve acabar. Na Educação, que mudanças é que defendem?

    Para nós, a Educação, está muitíssimo capturada pelo marxismo cultural, sem dúvida, e pelo que chamam a ideologia woke. E temos que despir a Educação de qualquer tipo de carga ideológica. Sobre a disciplina de Cidadania, nós, ao contrário de outros que defendem que seja opcional, defendemos que deve ser extinta. Porque não podemos permitir que, mesmo opcionalmente, a pretexto de uma suposta cidadania, despejem lixo na cabeça das nossas crianças.

    Está a falar da questão da identidade de género?

    Sim, da ideologia de género e essas coisas. Para já, não existe género; só existe o sexo masculino e o sexo feminino, ponto Final. Portanto, tudo isso já é uma novilíngua que estão a impor para confundir as mentes, e é preciso ter coragem de o dizer; eu não falo em género, só há dois sexos. O resto, são fantasias e invenções delirantes de esquerdistas. Depois, como é que é possível estarmos a investir 400 milhões nesta ideologia de género, em que uma das parcelas desse investimento é para ir buscar ao Uganda homossexuais que estão a ser perseguidos? Quer dizer, mas nós somos algum caixote do lixo, para vir tudo o que os outros países não querem? Nós não somos a Santa Casa da Misericórdia. Tudo isto um perfeito absurdo.

    Mas também são pessoas que são sujeitas, se calhar, a serem detidas e serem maltratadas nos países de origem.

    Mas isso é um problema deles, os países que resolvam. Nós é que temos de pagar por isso e recebê-los?  Cada um que resolva os seus problemas. Por exemplo, nós somos também contra o Islão, e não queremos cá o Islão; se nós importarmos o Terceiro Mundo, ficamos iguais ao Terceiro Mundo. E a Educação é um sector absolutamente fundamental, porque é aí que estão a formatar as nossas crianças. Há três sectores que são absolutamente fundamentais e que têm sido usados pela sabedoria do marxismo cultural: a escola, a universidade e a comunicação social. Usam-nos para promover tudo o que é porcaria e isso tem que ser revertido, porque estão completamente capturadas para formatar as mentes e para destruir tudo o que sejam valores tradicionais. E só para terminar: chamam-nos conservadores, mas nós não somos conservadores – somos tradicionais, que é muito diferente. Eu não sou conservador, não me sinto como tal e repudio isso até; sou tradicionalista, que é bastante diferente.

    Transcrição de Maria Afonso Peixoto


    Veja AQUI o programa do Ergue-te.


  • ‘Considerar a produção de energia nuclear em Portugal é absurdo’

    ‘Considerar a produção de energia nuclear em Portugal é absurdo’

    Aos 47 anos, Pedro Soares Pimenta comanda o Partido da Terra desde 2020. O psicólogo e empresário, residente em Leiria, lidera o partido fundado em Agosto de 1993 pelo conceituado arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, na altura, com a denominação Movimento Partido da Terra (MPT). Nestas eleições legislativas, o MPT concorre na coligação Alternativa 21, com o partido Aliança. Anteriormente, o Partido da Terra já teve dois deputados na Assembleia da República e dois eurodeputados. Depois de ter sido impedido pelo Tribunal Constitucional de concorrer às eleições europeias, em 2019, o partido prepara-se para se apresentar com candidatos nas europeias, em Junho, a sonhar com uma presença no Parlamento Europeu. Esta é a 14ª entrevista da HORA POLÍTICA, a rubrica do PÁGINA UM que deseja concretizar o objectivo de conceder voz (mais do que inquirir criticamente) aos líderes dos 24 partidos existentes em Portugal. As entrevistas são divulgadas na íntegra em áudio, através de podcast, e publicadas com edição no jornal.


    OUÇA NA ÍNTEGRA A ENTREVISTA DE PEDRO SOARES PIMENTA, LÍDER DO PARTIDO DA TERRA, CONDUZIDA PELA JORNALISTA ELISABETE TAVARES


    Começo por perguntar, já que estamos numa numa altura de campanha eleitoral, o porquê de o Partido da Terra, desta vez, decidir avançar em coligação com o partido Aliança, sob o nome Alternativa 21?

    Agradeço o convite feito pelo jornal pelo PÁGINA UM e congratulo e mando um abraço a todos os portugueses que nos estão a ouvir e que nos vão ler. Nós, por natureza, e quem nos conhece, sabe que vamos sempre sozinhos a todas as eleições e a todos os círculos. No entanto, houve uma convergência de ideias entre os líderes, tanto do Partido da Terra –  no qual eu me incluo –, e os líderes do Partido da Aliança para conseguirmos fazer um projeto realista para o país, sem demagogias, pragmático, mas principalmente um projeto de desenvolvimento. No fundo, estruturado para que consigamos sair deste círculo vicioso, negativo, que os partidos, os governos de esquerda nos têm vindo a habituar. Chegámos a esse entendimento entre os doi partidos e decidimos avançar. O nome do Alternativa 21, é exactamente isso, uma alternativa para o século XXI. Muitos dos portugueses com quem nós falamos, tanto a nível do Continente como nas ilhas, nos arquipélagos dos Açores e da Madeira, dizem: “nós votamos sempre nos mesmos porque não existe outra alternativa”. Existe uma alternativa e essa alternativa é a Alternativa21.

    Pedro Soares Pimenta (Foto: Captura a partir de imagem de debate na RTP)

    Outra coisa que eu tento explicar às pessoas de uma forma muito simples – porque estou na política desde 2015 e sou presidente do partido desde 2020 – , e até costumo brincar: quando Deus criou a Terra e Deus criou Portugal e os portugueses, certamente quando passou por cima de Portugal não definiu que apenas o Partido Social Democrata e o Partido Socialista é que fossem as pessoas com capacidade ou com a sapiência suficiente para poder governar o país. Não, não é isso. Todos os partidos – o Partido da Terra, e eu pessoalmente, somos um bocadinho à parte daquilo que os outros fazem – cada um defende a sua dama. Mas eu digo de uma forma muito frontal: todos os partidos têm pessoas válidas. Todos os partidos têm pessoas com capacidade. Todos os partidos têm pessoas que conseguem levar os seus projetos e conseguem levar Portugal para melhor. A questão é que, sistematicamente, desde o 25 de Abril, só jogam dois partidos: o Partido Socialista e o Partido Social Democrata. Isto também muito por culpa – não querendo desprezar o trabalho da comunicação social e dos jornalistas – da comunicação social que existe em Portugal. Porque, sistematicamente, alimenta, de uma forma quase absurda e ilógica e quase grotesca, os partidos com assento parlamentar. Vê-se até nos debates que existem.

    Nas televisões, por exemplo.

    Não é uma coisa que eu acho completamente absurda. Dão uma hora a dois candidatos e depois dão duas horas a 14 ou 15 ou 16. Isto é desqualificar os outros partidos.

    Parece que há partidos de primeira e de segunda, que há uns que são melhores do que os outros.

    Mas isso há. Isso está visto em Portugal. Falo por mim: do Partido da Terra, eu sei; do Aliança, também, porque houve aqui uma convergência de ideias para conseguir fazer um manifesto eleitoral. Mas há outros partidos que nem me passa pela cabeça o que é que eles defendem ou deixam de defender. E há outros que eu, por iniciativa própria, nem quero saber. A questão é mesmo esta: muitos dos portugueses não têm as condições da liberdade de saber quais são os projetos do Partido da Terra, os projetos do Aliança, os projetos de uma coligação porque não é possível, porque não chega lá.

    A que se deve essa posição dos grandes grupos de comunicação social? Tive a experiência de, ao fazer alguma pesquisa para estas entrevistas da HORA POLÍTICA, encontrar mais informação sobre diversos partidos na imprensa local ou regional, do que propriamente em grandes meios de comunicação social. A que se deve esse tipo de atenção que é dada aos maiores partidos por parte dos grandes grupos de comunicação social?

    Não costumo, por natureza, dizer mal de jornalistas. Não digo, não digo. Conheço alguns. Até porque a culpa nem é propriamente dos jornalistas, mas da máquina que faz funcionar todo este mundo. Muitos jornalistas, quando estão em início de carreira, recebem a recibo verde.

    Há precariedade.

    É precariedade. Têm um trabalho que não é garantido, nunca sabem o dia de amanhã. Se dizem aquilo que não devem, o mais provável é não seja renovado o seu contrato e depois vão para ‘o olho da rua’. Isto acontece de uma forma mais natural do que aquilo que as pessoas alguma vez imaginam. Não estou a falar dos jornalistas, mas do polvo que existe à volta dos próprios meios de comunicação social.  Não sei se já teve oportunidade de ver quais são as propostas do Partido Socialista em relação aos meios de comunicação social.

    Não vi?

    O Partido Socialista, uma das coisas que quer é rever as competências da ERC. Nem sei porque é que RC existe porque não cumpre aquilo para que foi criada. A partir do momento em que existe a tal desqualificação em que existem os partidos de primeira e os partidos de segunda. Não sei para que é que a ERC existe, não faço a mínima ideia. Há outra questão, querem aumentar a participação do Estado na agência Lusa.

    Pedro Soares Pimenta com Jorge Nuno de Sá, líder do partido Aliança (segundo a contar da esquerda), e Nuno Afonso (primeiro a contar da direita), fundador do Chega e que concorre, agora, como independente, pela coligação Alternativa 21, no círculo de Lisboa. (Foto: D.R./Alternativa 21)

    Não concorda com isso, por exemplo?

    A agência Lusa, já tem nomeação política. A direção da agência Lusa já é de nomeação política. Muitas pessoas não sabem o que é agência Lusa. Se você questionar, grande parte dos portugueses não sabe. A agência Lusa é a central que gere comunicações de notícias em Portugal. A agência, Reuters é internacional. E há mais algumas. A Lusa tem uma importância crucial para a neutralidade das notícias para todo o território português. Ora, se existe um governo que quer ainda entrar com mais força na agência Lusa, controlar a agência Lusa. o que é vai acontecer? Vai acontecer que quem lá está vai controlar a informação.

    E todas as notícias que saem da agência Lusa são depois disseminadas em todos os órgãos comunicação social, sem alterar uma vírgula. Portanto, tudo o que sai na agência Lusa é depois replicado, é feito um copy-paste em todo lado.

    É tudo replicado. Vou lhe dar aqui duas situações. Não vou falar nomes para não haver aqui confusões. Nós enviamos comunicados para alguns meios de comunicação social regionais e para o meio de comunicação social que, neste caso, é a Lusa. Como é possível fazermos um comunicado e não sair em rigorosamente meio nenhum?

    Tenho recebido indicações de vários partidos de que isso tem acontecido. Ou seja, que enviam vários comunicados de imprensa para a agência Lusa e para outros meios e que nunca conseguem que haja notícias sobre esses comunicados.

    Dê uma explicação plausível para que isto aconteça. Não me consegue dar, nem eu lha vou pedir para não por a a sua posição em causa.

    Tenho feito muitas críticas, enquanto jornalista, sobre várias situações. É também por isso que estamos, por exemplo, a fazer esta iniciativa, HORA POLÍTICA, porque sentimos que não existe diversidade e o pluralismo que deveria existir na comunicação social.

    E eu aceitei porque quando me disse que iam contactar com todos os partidos, eu disse logo: sim senhor, se assim é, vamos embora e eu estarei totalmente disponível. Mas há um segundo ponto de que quero falar. Houve dois meios de comunicação social – um deles foi por telefone e o outro foi por vídeo para colocar no telejornal das 20h, foi nos Açores… Posso dizer, porque revoltado. É um jornal que é do Estado, que é controlado pelo governo regional dos Açores. Estive cerca de 45 minutos a responder a tudo aquilo que o jornalista me perguntou. Houve uma parte em que eu me enganei. Em vez de dizer “estamos aqui para defender os Açores”, enganei-me e disse “Algarve”. E depois rectifiquei: “peço imensa desculpa, não é Algarve, é Açores”. Enganei-me por uma simples situação: eu tinha estado no Algarve no dia anterior e tinha estado lá está a fazer um discurso. Quando sai no jornal a peça, de 45 minutos, passou para uns 8 segundos. E passou exatamente o quê? A parte em que eu me enganei. Isto não é seriedade, é ser malicioso.

    Pedro Soares Pimenta no XI Congresso do MPT. (Foto: D.R./MPT)

    Tem havido quem defenda que haja injecção de dinheiro dos contribuintes em grandes grupos de comunicação social. Tem havido uma crise. Grupos têm dívidas gigantescas, nomeadamente dívidas ao Estado. É o caso da Trust in News, que é a dona da revista Visão. Tem uma dívida enorme, mais de 11 milhões de euros, ao Estado. Também é uma coisa que é inexplicável. Depreendo que, se calhar, não estará muito de acordo com isso. Qual é a sua posição?

    Não é uma provocação, é uma rasteira. Como eu disse, o problema não são os jornalistas, o problema são os grandes grupos. Realmente, é uma coisa que me surpreende a mim, como é que se deve 11 milhões de euros ao Estado, com a situação e com a qualidade de jornalismo que a Visão, por exemplo, tem tido nos últimos anos, por vezes algo tendenciosa, mas a qualidade está lá. Eu faço outra pergunta: como é que o Estado, como é que o Governo, deixou que a dívida acumulasse até estes níveis?

    Se for outra empresa, se for de outro setor, se calhar já não pode.

    Ora, aí está. Se a Elisabete ou o Pedro Pimenta dever 100 euros às Finanças, ou se tiver uma pequena empresa e falhar com uma obrigação fiscal, que é que vai acontecer, passados dois ou três meses? Cai o Carmo e a Trindade. Como é que estes grupos conseguem? De uma forma muito clara. Porque está tudo dentro do sistema. Quando estiver lá um partido, a coisa é de uma forma, quando estiver outro partido, a coisa é de outra forma. E os dois partidos são sempre os mesmos. Eles sabem para onde é que vão lidar. A RTP é do estado. Não vão cuspir no prato onde comem. É evidente que eles não vão dizer mal, descaradamente, do governo. Quando o fazem, está muito mal do Governo. E é um sinal, é um indício, que aquele governo está a prazo. É estranho, mas é verdade. Vou dizer outro caso. Isto é verdade e é uma daquelas coisas que eu gostava que houvesse jornalismo independente e de investigação a sério… Infelizmente, em Portugal, parece que deixou de existir. Mas, gostava que houvesse jornalismo a sério, de verdade, que fosse investigar todas as localidades, os concelhos e freguesias pelo país fora. Porque vão ficar surpreendidos. Porque há um determinado partido que, quando ganha a Câmara [Municipal], das primeiras coisas que faz é contratar os elementos dos jornais regionais ou locais para assessores nessa determinada Câmara. E, depois, financia esses determinados jornais, como apoio do município.  Isto pode chamar-se muita coisa. Na minha terra, chama-se “meter a manta por cima de quem pode fazer barulho”.

    Sobre a questão da visibilidade de alguns partidos junto dos portugueses, até para que saibam que existem alternativas, existem ainda a questão do financiamento das campanhas eleitorais. O nível de subvenções é também muito diferente entre uns e outros. Mas os pequenos partidos, quando há uma multa, muitas vezes não são poupados. Há multas de milhares de euros por inconformidades.

    Temos uma particularidade. O Partido da Terra já teve contas penhoradas pelo Tribunal, porque não pagou uma determinada multa, para a qual até existia um acordo feito. Foi uma confusão, entrou um presidente, saiu outro. Mas tem toda a razão. Nós vamos avançar com queixa para o Tribunal Europeu. Nós já contactámos outros partidos para nos unirmos. Ninguém quer, não percebo. Mas nós vamos fazer [uma queixa] por várias razões. Uma delas foi: proibiram-nos de ir às eleições europeias, em 2019, e agora permitiram que o Chega fosse às regionais da Madeira. A situação é idêntica. Ou melhor, não é idêntica. A situação do Chega é muito pior do que a situação do Partido da Terra, quando nos impediram de ir às eleições europeias, em 2019. Não nos podemos esquecer que cinco anos antes, nós, no Partido da Terra, tínhamos conseguido dois eurodeputados. Ou seja, impediram-nos de ir em 2019. Não estou a dizer que o partido até conseguisse eleger alguém. Mas haveria de, pelo menos, um eurodeputado que foi eleito, ou pelo partido A ou pelo partido B, que não iria. Porque aí os votos iriam ser divididos.

    (Foto: D.R./MPT)

    Então, porque é que houve essa dualidade de critérios? O que é que se passa?

    Tiveram medo do Chega. Do MPT, não tiveram medo nenhum. ‘Chumbaram’, não fomos. Tinham-nos dados razão antes de entregar os papéis para eleições. Não nos deixaram ir a eleições. E, depois das eleições, voltaram a dar-nos razão no Tribunal Constitucional. O Tribunal do Círculo do Funchal permitiu… Havia uma deliberação do Tribunal Constitucional a dizer que o Chega não tinha os órgãos diretivos para poder ir a eleições, por causa daquela confusão, em que alguém contestou os órgãos sociais do partido etc. E o Tribunal Constitucional disse: o Chega não tem direção. Para todos os efeitos, de grosso modo, é isto:  não há direcção, de facto. O Tribunal do Funchal, aceitou ou foi feita uma reclamação. O Tribunal Constitucional disse que não, que continuavam a bater na mesma tecla, a dizer que não havia possibilidade, que a direcção do Chega não tinha legalidade para decidir, nem quem eram os candidatos, nem quem e como é que iriam a eleições. Portanto, não havia legalidade naquela direcção.

    Mas avançou tudo, portanto, não houve questão.

    O Tribunal do Círculo do Funchal bateu o pé e disse “vai, vai, vai”. E o Tribunal Constitucional, em última instância, disse: “OK, pode ir”. É incrível, isto não é democracia, é um absurdo. É ilógico, é uma anormalidade. As razões que invocaram para o Partido da Terra não poder concorrer às europeias em 2019 eram muito menos gravosas do que a situação do Chega nas regionais da Madeira. E porque há dois pesos e duas medidas. Porque é que o Chega se tornou ‘papão’ e todos têm medo de o deitar abaixo?

    E as sondagens estão a dar um valor próximo dos 20% ao Chega. Como é que vê as sondagens e os resultados que têm sido divulgados? Embora saibamos que as sondagens muitas vezes não mencionam partidos como o Partido da Terra.

    Bom, neste caso, a coligação Alternativa 21.

    Exactamente, estamos aqui a falar do Partido da Terra, mas nestas eleições vai em coligação.

    Há cerca de dois anos, quando foram as legislativas, lembra-se, quando faltava cerca de 5 ou 6 dias para acabar a campanha, quem é que estava em primeiro lugar, destacado?

    Não, já não me recordo.

    Era Rui Rio. As últimas sondagens, 4 ou 5 dias antes, davam Rui Rio e o PSD como estando à frente de António Costa, mas 36 para 28, ou algo assim, desse género, já não me lembro ao certo. Mas Rui Rio estava muito à frente. Resumindo, o Partido Socialista teve uma maioria absoluta. As sondagens valem o que vale. O Chega crescer… É normal que cresça porque a população está descontente. A população está descrente, a população não acredita na palavra de um político. A população vê a política como algo muito negativo. Depois aparece um populista, um demagogo. Por tudo aquilo que o que o doutor André Ventura diz é praticamente impossível de aplicar, até pela Constituição portuguesa. Agora está a ser desmascarado por vários meios, porque as propostas que ele apresenta, até financeiramente não são viáveis para o país. Só que as pessoas se reveem nesses discursos que fazem no Chega. Tem uma equipa, presumo, deve ter uma equipa que trabalha muito bem e diz assim: “os portugueses estão descontentes com as torneiras em plástico; OK, então vamos agora dizer que as torneiras em plástico não prestam e que nós defendemos as torneiras em metal”. E lá vem o Chega defender as torneiras em metal. Uma semana depois: “espera aí que o ‘pessoal’ está descontente porque os carros têm pneus borracha; vamos a público dizer que têm de ser pneus de plástico”.

    Ajusta um bocadinho àquilo que sente que é a vontade da população.

    Depois tem uma máquina brutal nas redes sociais. A máquina mais forte nas redes sociais que eu conhecia, era a do Bloco de Esquerda, que estava muito bem implementada, trabalhava muito bem. Neste momento, o Chega conseguiu ultrapassar o Bloco. É, a nível de máquina nas redes sociai, a divulgar informação..  E quando eu digo máquina, não é dizer que é o Chega que divulga. Não. São personagens, indivíduos que criam páginas que criam perfis para divulgar toda uma imagem, notícias, toda uma informação. E as pessoas começam a ser massivamente bombardeadas com aquilo e vão atrás. Um dos nossos motes é falar da direita de uma forma séria. Temos de falar daquilo que o Chega fala. Todos temos de falar. Nós temos de falar da imigração descontrolada. Temos de falar dos polícias. Nós temos de falar do Sistema Nacional de Saúde, embora o Chega fale pouco disso. O primeiro a falar da imigração ilegal… Isto chegou ao cúmulo da estupidez. O primeiro que falou da imigração ilegal, e daí contestar as políticas que a esquerda criou, foi Pedro Passos Coelho. Foi o primeiro a falar sobre isto. Quando houve a ‘geringonça’, política abriu as portas de Portugal a qualquer um que quisesse entrar, sem averiguar e sem verificar de onde é que vinham, o que é que tinham feito. E Pedro Passos Coelho – que, para mim, foi um grande político, e é um estadista – e ele [chamou a] atenção que isto é negativo. Temos de saber de onde é que eles vêm. Tudo aquilo que André Ventura agora está a dizer de uma forma quase raivosa, Pedro Passos Coelho já disse isto de uma forma mais ponderada e até de uma forma mais realista e concreta. Isto não é novidade nenhuma. É evidente que quando Pedro Passos Coelho disse, ele avisou: “atenção, que isto vai acontecer”.

    Já foi há uns anos.

    Foi, salvo erro, em 2016 ou 2017. Mas ele disse: “atenção, que isto vai acontecer”. Evidentemente, aconteceu. Todos sabíamos que ia acontecer. Ora, André Ventura e o Chega agarram no mote e agora que está a potenciar tudo isto.

    Falando agora da coligação Alternativa 21, no caso do Partido da Terra, tem um histórico em termos de ter candidatos eleitos. Entre 2005 e 2009, teve 2 deputados na Assembleia da República nas listas do PSD, na altura era liderado, salvo erro por Pedro Santana Lopes. Em 2014, como também já referiu, teve dois eurodeputados no Parlamento Europeu. Foi o primeiro partido ecologista a seguir aos Verdes, a consegui-lo.

    Acho que os Verdes entraram em coligação com o PCP.

    Além dos vários candidatos eleitos em termos de eleições autárquicas e também na Madeira. Quais são os objetivos agora, em coligação?

    Infelizmente, são dois partidos que jogam, são dois partidos que movem, são dois partidos que estruturam a informação, que não permitem que pequenos partidos consigam mostrar e desenvolver um trabalho adequado.

    Então, o que é que desejava? O que é que seria o ideal para si?

    Acredito muito no candidato de Leiria, que é um ex-administrador hospitalar que defende há muitos anos, há cerca de duas décadas, a construção de um hospital nas Caldas da Rainha ou Alcobaça. E agora o  Partido Socialista decidiu meter um hospital Central do Oeste, no Bombarral. Isto não cabe na cabeça de ninguém. E, portanto, ele vai defender, evidentemente, o hospital das Caldas da Rainha. Acredito também no Nuno Afonso, que concorre pelo círculo de Lisboa. É uma pessoa que veio do Chega, fundador do Chega, e que viu a demagogia e mentira naquele partido decidiu sair e trilhar o seu caminho, Depois, também acredito no círculo de Santarém por causa do projeto do aeroporto de Santarém. Deveremos ser os únicos que apoiamos incondicionalmente o projeto do aeroporto em Santarém. Acredito que a população do distrito e toda aquela região Ribatejana vai ver quem é que verdadeiramente são os candidatos que vão defender e querem defender toda aquela região e votarão em concordância com isso.

    Fala por causa do aeroporto de Alcochete?

    Completamente absurdo. Nem sei como é que alguém pondera aquilo. Alcochete, Vendas Novas, Montijo… Montijo, nós somos contra desde 2015. Entrei em 2015, fui cabeça de lista por Leiria. Na altura, defendia a abertura da aviação civil em Monte Real. Compreendo que Monte Real complicado, que é uma base NATO e é uma das bases mais operacionais de Portugal. O melhor é a base mais operacional do Continente. A base mais operacional de Portugal é a das Lajes, com os aviões norte-americanos. Mas é a base mais operacional do continente. É uma base NATO. Eu sei que seria difícil embora existam vários aeroportos na Bélgica, na Alemanha, em que é um aeroporto NATO, com aviões militares, e um aeroporto civil. Portanto, seria possível, com vontade política, seria possível. Como nunca ninguém quis muito, realmente nunca ninguém ponderou Monte Real… Porquê? Porque está a 120 km de Lisboa e o governo acha que isso é muito. Noutras capitais não acham, aqui acham. Agora, aparece o projeto de Santarém. A nível a nível do impacto ambiental, a nível de resposta ao país,de obra estruturante para o país e para o futuro do país, é a melhor resposta é a melhor obra possível e imaginária. Cerca de 65 a 75% dos passageiros que param na Portela é para ir para o norte do distrito de Lisboa.

    Pedro Soares Pimenta num vídeo de campanha do MPT nas anteriores legislativas.
    (Foto: Imagem capturada a partir de vídeo do MPT)

    Portanto, já ficavam numa rota, digamos assim, mais mais fácil.

    Repare naquilo que eu acabei de dizer: 65% a 75% dos passageiros que vão pela Portela vão para o norte do distrito de Lisboa. E o que é que os governos que passam por Portugal dizem? Eles vão para o norte? Então vamos construir a sul. Isto devia ser um sketch humorístico.

    Não tem muito racional, é isso?

    Isto não tem racionalidade nenhuma. Andaram a bater com o aeroporto do Montijo… Você sabe porque é que a Força Aérea deixou de operar aviões a jato na base do Montijo? Porque tiveram dois acidentes com aves. Porque aquilo é uma zona de nidificação de aves, numa zona brutal, das principais da Europa. Algumas só nidificam ali, a nível mundial.  Os senhores da Força Aérea decidiram acabar com os voos no Montijo, porque não pode ser, porque caíram dois aviões. Uma vez, mataram duas pessoas, outra vez mataram mais duas.

    E a zona é um património natural e fantástico, termos ambientais.

    Aquela zona tem de ser protegida. Até se poderia fazer hotéis de ecoturismo.

    Turismo de ambiente.

    Há uns anos vi o dinheiro que envolve a actividade de observação de aves. Os que vão correm mundo a fotografar aves e a observar aves. É um negócio de biliões.

    Sim, fotografia e observação de aves.

    Em Portugal não se liga nenhuma a isso. Há um local nos Açores que está no roteiro mundial para avistamento de aves. Agora, de resto, em Portugal, no Continente, zero. O que há são pequenas iniciativas privadas ou de associações. Podia ser um dos maiores a nível internacional. É que nem se coloca a possibilidade sequer de meter aviões a jacto ali. É uma questão de segurança. Da Força Aérea portuguesa saem dois aviões por causa de aves que embatem contra os aviões, depois a um Boeing 737 não acontece nada, só porque um ministro disse que os pássaros eram inteligentes, que fugiam dos aviões.

    E como vê o anúncio também que foi feito logo antes da campanha eleitoral de que Portugal avança finalmente com a construção da linha de TGV? E sobre a questão da ferrovia, temos o caso da CP, onde também só em aumentos de capital já foram colocados muitos milhões de euros por parte dos contribuintes…

    Somos a favor da TGV que ligue um dos portos profundos, um dos mais importantes da Europa, que é Sines, ao resto da Europa, e ligue a capital, Lisboa, a Madrid. Totalmente de acordo. Vou falar da minha posição pessoal porque o Partido da Terra é um partido aberto, aberto às ideias. Não é um partido castrador, cada um tem as suas ideias, cada um defende as suas ideias e nós só temos de respeitar. A minha liberdade acaba quando começa a do outro, e vice-versa. Não somos um partido de proibições, bem pelo contrário.

    (Foto: D.R./MPT)

    Há um debate de ideias.

    Exatamente. E acho que foi assim que foi criado o Partido da Terra, com Gonçalo Ribeiro Telles e aquele grupo que se encontrava em Lisboa, num café em Lisboa, era quase uma tertúlia, por assim dizer, de ideias. E dessas tertúlias saíram, por vezes, projetos interessantes para o país. O TGV, sou totalmente a favor de ligar Sines ao resto da Europa. Para isso, temos um problema que é [converter a] bitola ibérica para a bitola europeia. Tem de ser alterada. É muito dinheiro que vai ser investido nisso. De Lisboa a Madrid: totalmente de acordo. Faz-me confusão, por exemplo, ligar o Porto a Lisboa com duas ou três paragens. Somos a favor que as grandes obras estejam próximas das populações, totalmente de acordo. A minha questão é o dinheiro que se vai gastar só para dizer que se tem um TGV de Porto a Lisboa. Porque, do Porto a Lisboa, com duas ou três paragens, vai-se poupar 15, 20 ou 22 minutos, do que se fosse num Alfa Pendular. Gastar 3, 4, 5 ou 6 mil milhões de euros só para poupar 15 ou 20 minutos, é difícil de ‘engolir’.

    Até porque os portugueses estão com outros problemas. Há a crise na Habitação, na Saúde, mas outras questões também para as quais são necessárias verbas e políticas.

    Na Saúde, é uma questão de prioridades. As prioridades dos governos que têm governado o país têm estado um pouco desfasadas daquilo que os portugueses verdadeiramente necessitam. Sou a favor que se faça uma reestruturação e uma requalificação de todo o parque hospitalar, de norte a sul do país. Mas, para isso, é preciso muito dinheiro. É preciso muito menos do que para fazer o aeroporto de Alcochete. Muito menos.

    Portanto, deveria ser uma prioridade.

    O que é que está em primeiro lugar? É meter um aeroporto em Alcochete ou em Vendas Novas, que vai ser um atentado ambiental no sul do distrito de Lisboa, em que a própria população… É que nunca houve nenhum político que dissesse: “vamos perguntar aos lisboetas se querem ser bombardeados com mais aviões por cima das suas cabeças”. A maior parte dos lisboetas estão completamente saturados da pressão na capital, estão completamente saturados da pressão ambiental, da pressão do turismo sobre a capital. Se se vai construir um aeroporto na parte sul do distrito, na margem sul, em Alcochete ou Vendas Novas, a maior parte do tráfego vai ser pela Ponte Vasco da Gama. Todos nós sabemos que o ponto em que a ponte Vasco da Gama já está. Os lisboetas estão, em grande parte, contra estas iniciativas. E Santarém, se calhar, é a melhor solução até para os lisboetas. E até porque não investimento público nenhum, zero. São 15.000 milhões de euros que se fala para fazer o aeroporto em Alcochete. Temos de rezar para que Nossa Senhora desça à terra e conseguir fazer um milagre de não haver derrapagens na obra pública em Portugal, o que não existe. Não vão ser 15.000 milhões, vão ser 17, 18, 20, 22.000 milhões. Portugal está assim tão bem para gastar entre os 15 e os 20.000 milhões a construir um aeroporto na margem sul, quando existe privados que o fazem sem despesa para o erário público? É ilógico, é uma anormalidade.

    Portanto, para si prioridade, deveria ser esta questão da Saúde.

    O mais importante, que mais preocupa as populações, é a saúde e a segurança.

    E habitação, infelizmente, também.

    Nem vou falar de habitação, porque teria de falar de outro assunto. E uma hora não chega. Porque a habitação, só acontece o que está a acontecer, porque os seus excelentíssimos, senhores da ‘geringonça’, decidiram abrir as portas do Portugal a quem quisesse entrar, sem verificar quem são ou quem deixam de ser. Portugal deve ser dos poucos países da Europa onde a imigração ilegal não deve existir, porque está, de tal forma aberto, que não há necessidade de haver a imigração ilegal. Eles entram, estão à vontade. Não sou nada contra a imigração é nós precisamos de pessoas.

    Cartaz da coligação Alternativa 21. (Foto: D.R./Alternativa 21)

    É a favor que haja um controlo.

    Tenho nada, nada contra. A esquerda, quando ouve alguém dizer isto, diz logo que eu sou isto ou sou aquilo. Não, não, não, nada disso. Venham brasileiros trabalhar, venham indianos trabalhar, venham nórdicos trabalhar, venha quem quiser trabalhar e ter a sua vida. Não tenho problema nenhum. Portugal é um país de emigrantes. Aceitamos e recebemos de braços abertos a imigração que venha para Portugal, para trabalhar, para estudar, para estruturarem, para dar qualidade de vida às suas famílias. Agora, estarmos a receber um indivíduo, por exemplo –  e saiu na comunicação social – , que matou duas pessoas no seu país de origem, e no aeroporto apanha um avião, vem para Portugal como turista e ao fim de meses tinha nacionalidade portuguesa, isto não pode acontecer. Peço imensa desculpa, não pode acontecer. Tem de haver controlo. Somos contra a imigração descontrolada. Era aquilo que dizia Pedro Passos Coelho em 2016.

    Mas a própria União Europeia está a pressionar os países e tem vindo a ter essa política, e alguns países já têm problemas e agora tentam controlar. Mas tem sido algo também que vem de Bruxelas, ou não?

    Daqui a um ano, 2 anos, 3 anos, você, possivelmente, vai dizer que no dia 17 Fevereiro de 2024 falou com o Pedro Soares Pimenta e, se calhar, ele tinha razão. Portugal já teve um dos passaportes mais poderosos, mais seguros do mundo. E, neste momento, o nosso passaporte tem sido olhado com desconfiança. Isto é das coisas que mais me entristece cada vez que saio do país.

    Afeta a reputação do país.

    Completamente, completamente. É estamos a falar agora, em 2024. Quando for em 2025 ou 2027, vamos ver como é que está. Vai estar muito pior. A questão da segurança: dizemos que Portugal é um país seguro. Mas Portugal é um país seguro por aquilo que funcionários da polícia criminal têm feito nos últimos 10, 15, 20, 25 anos. Nós temos de ver, com as políticas que foram criadas pelo Partido Socialista, como é que vai estar daqui a 10 ou 15 anos. Garanto-lhe que não vai ser dos países mais seguros da Europa ou do mundo, como agora se diz. Se somos hoje, é por causa de políticas de há 15, 20, 25 anos para cá.

    Sobretudo, se não se investir nas forças de segurança que, aliás, têm estado com protestos.

    As forças de segurança têm de ser reestruturadas. Porque a forma como está não é possível manter. Falo da PSP e da GNR. Eles revoltaram. Conheço muitos elementos da Polícia de Segurança Pública. Tive uma relação com uma agente da PSP durante 7 ou 8 anos, portanto, conheço a realidade da PSP. Os políticos em Portugal não dão real valor àquilo que eles passam. Porque aquilo que eles passam na rua é de bradar aos céus. Acho que nenhum português tem noção daquilo que a polícia passa quando entra no seu turno de trabalho. Não tem noção daquilo que eles passam, da parte da forma como eles são enxovalhados, como eles são ameaçados, como eles são agredidos. Ninguém tem noção.

    O que recebem não compensa os riscos e depois há também as condições em que trabalham.

    De forma alguma. Mas eu acredito, isto foi um espoletar que lhes fez pensar “estão a gozar connosco, temos de ir para a rua”. Mas há uma situação que para mim e para eles talvez seja mais gravosa, é a falta das condições de segurança que tem de ser dada por um Estado de direito aos órgãos da polícia criminal. Quando um juiz diz que chamar um polícia disto ou daquilo, ou ‘filho disto’, é um acto de revolta, isto é gozar com os polícia.

    E põe em causa a segurança das forças de segurança.

    E cria desmotivação. Deveria definir-se um subsídio de risco para cada agente que esteja em funções operacionais. Vamos dar 350, 400, 500 euros de subsídio de risco para agentes em funções operacionais.  Onde é que vamos buscar o dinheiro? É muito simples, é fazer a requalificação e reestruturação das forças, dos órgãos de polícia criminal. Se perguntar a agentes da PSP e da GNR, não vão contra aquilo que vou dizer. Porque é que existem dois corpos de intervenção? Porque é que não existe um corpo nacional de intervenção? que existem? 2 porque é que? Porque é que existem dois? Porque é que existem o Corpo de Operações Especiais e o Batalhão de Operações Especiais? Porque é que não existe apenas um? Porque é que não existe o Corpo Nacional de Segurança Interna, em vez de haver a direção nacional da PSP e o comando nacional da Guarda Nacional Republicana? Só o dinheiro que se pouparia aqui, dava para pagar este dinheiro a todos os agentes de polícia operacionais, que andam na rua todos os dias a combater a criminalidade em Portugal.

    (Foto: D.R./MPT)

    Ou seja, há medidas que podem ser tomadas e que são importantes para o futuro das forças de segurança e para colmatar alguns dos problemas?

    Tem é de se querer. Tem de se querer. Isto vai doer apenas unicamente a uma faixa da PSP, que são os oficiais. Os oficiais não vão gostar, mas os agentes que andam na rua, garanto-lhe que ficariam muito melhor.

    Hoje, fala-se, mais do que na defesa do ambiente, fala-se mais em alterações climáticas. E temos tido, não só situações de atentados ambientais em Portugal, mas continuamos a ter, além da poluição dos grandes grupos poluidores, temos tido casos de abates árvores de espécies protegidas para determinados projetos. Mas também, até na Europa, tem havido alguns casos de preocupação. Falo, por exemplo, do alargar por mais 10 anos a autorização de uso do glifosato, que um pesticida considerado perigoso. Também há um lobby para a Europa diminuir as restrições para a utilização de organismos geneticamente modificados na agricultura e outras medidas fala-se também da questão da autorização de certos pesticidas. Qual é a sua visão sobre este Tema?

    Orador 2

    Tudo aquilo que disse, tem toda a razão. Realmente, falou uma palavra mágica que são os lobbies. É evidente que os lobbies, infelizmente, na Europa – e Portugal não foge à regra – têm muito poder naquilo que deveriam ser as práticas normais ou reais para combater as alterações climáticas. Por exemplo, a União Europeia está a querer considerar o nuclear como energia verde. Não digo que o nuclear não seja uma energia mais limpa, mas com um pequeno pormenor: Portugal, onde está – e todos se esquecem disso –, é potencialmente sísmico. Temos o caso do Japão, que é muito avançado a nível tecnológico e nas centrais nucleares. É muito avançado e vimos o que aconteceu em Fukushima. Considerar sequer [a produção de energia] nuclear em Portugal é completamente absurdo. Não sabemos o pode acontecer amanhã. Também ninguém pensou que o terramoto no 1755 iria acontecer e aconteceu e mudou a realidade histórica de Portugal perante a Europa. O mais importante é conseguirmo-nos soltar das amarras dos lobbies.

    Devíamos promover, por exemplo, uma política séria de dessalinização da água do mar para combater a escassez de água, principalmente no Algarve, que está com uma carência grave de água. Não há políticas para isso. Devíamos renegociar os acordos com Espanha em relação aos caudais dos rios. Ninguém fala disso. Nós devíamos ter falado com Espanha por causa da central nuclear de Almaraz, que se tiver algum problema, vai contaminar toda a parte de Lisboa com produtos radioativos. Ninguém fala nada sobre isso. Devíamos criar um estatuto legal de preservação dos rios e dos rios livres, que permita identificar barreiras, de norte a sul do país para que as águas não sejam deterioráveis e para que os habitats ribeirinhos e o normal ciclo dos nutrientes, dos sedimentos, para os animais e para a fauna e flora possa viver em concordância e estabelecer para aquilo que devia ser o normal. Uma das políticas, por exemplo, que nós apoiamos é a criação de mais guardas florestais e, possivelmente também os guarda-rios para defender a flora e fauna, tanto nas florestas, como os nossos rios.

    Há uma série de situações em se pode fazer algo e não se faz. Porque parece que há entraves. Por exemplo, na agricultura, ninguém fala de uma agricultura sustentável, ninguém fala do setor das pescas, que é incrível. Ninguém fala da pesca local – e isto também tem a ver com as questões ambientais – que é a pesca mais sustentável. Não. Ainda potenciam é a pesca dos grandes armadores, dos arrastões que destroem o fundo do mar em vez de potenciar e ajudar os pequenos armadores da pesca local.

    Um dos jornalistas que colabora com o jornal PÁGINA UM é o esloveno Bostjan Videmsek, é um jornalista premiado, cobriu muitos conflitos e guerras, mas ele é também um embaixador do Pacto Europeu do Clima e tem escrito sobre a questão da defesa do ambiente. Escreveu um livro – Plano B – com vários casos positivos no ambiente. Ele considera que a pandemia e as alterações climáticas são também vistos como uma enorme oportunidade, não só para reforçar lucros de grandes lobbies e indústrias mas para reforçar poderes de políticos.

    Na covid, não concordo, parece uma teoria da conspiração. O que é interessante, é que foram criados novos lobbies com a situação da covid-19 e lobbies tremendamente poderosos. Ao nível da transição energética e da proteção ambiental, tivemos uma oportunidade muito forte de conseguir implementar políticas correctas ao nível de defesa do ambiente e de defesa ecológica. E não se fez rigorosamente nada. A transição energética tem de ser apoiada. A transição digital, exactamente a mesma coisa. A transição tecnológica também. Mas não nos podemos esquecer de uma coisa. Eu, por vezes, ouço certos e determinados candidatos políticos dizer que devíamos pôr tudo elétrico. Isso é impensável, absurdo. Nem o português comum tem capacidade para comprar um carro elétrico. Tem de haver uma melhoria das tecnologias para o português comum, da classe média, conseguir comprar um carro elétrico por 20 a 23 mil euros. Há uns anos, perguntei a um indivíduo: o que é que vocês vão fazer às baterias, quando acabarem? Respondeu: “ou vamos enterrar ou não vamos fazer nada”. Vão criar poluição. Depois, outra coisa muito importante é ver como funcionam as minas tanto do lítio como dos outros minerais que são necessários para criar uma bateria elétrica.

    (Foto: D.R./MPT)

    Em Portugal, esse é um tema importante.

    É uma poluição extrema e quando dizemos isto cai logo o Carmo e a Trindade. Dizem “não sabes o que estás a dizer”. Eu digo: “vão a África, vejam as minas que estão a céu aberto e vejam se aquilo tem alguma lógica”. Não tem lógica nenhuma.

    E a exploração humana, a escravatura ou a exploração de crianças, também.

    Tal e qual. Houve um estudo que foi feito nos Estados Unidos sobre se passássemos tudo a eléctrico, daqui a um ano, o que é que acontecia. E a resposta foi: o país parava. Não há capacidade na rede elétrica para sustentar todos os veículos elétricos, não há capacidade. E não há capacidade nos Estados Unidos, nem em Espanha, nem em Portugal, nem em França. Não existe capacidade. Portanto, tem de haver o bom senso de tentar minimizar a poluição dos veículos a combustíveis fósseis, alterá-los para energias complementares ou verdes, como o hidrogénio verde. Isto, sim, vai ser o futuro. Acredito que esse vai ser o futuro. E também combustíveis sintéticos. Está a ser investigado pela Porsche, Toyota, como outras grandes marcas. E e acredito que essa é que vai ser a resposta. O elétrico vai funcionar, vai funcionar durante muitos anos, a tecnologia vai crescer, vai ser melhorada e vamos ter uma resposta adequada, se calhar daqui a 10 ou 15 anos vamos ter uma perfeição. Mas daqui até lá haverá certamente outros tipos de combustíveis que poderão alimentar tudo.

    As europeias eleições europeias estão quase aí. Estamos a falar em poucos meses, em Junho, já teremos as eleições. O Partido da Terra está a pensar, planeia concorrer com listas às eleições europeias?

    Se o Tribunal Constitucional não fizer como fez em 2019, que não nos permitiu eleições europeias, isso é garantido. Não há uma eleição, que eu tenho conhecimento, pelo menos, desde que eu estou no partido, em que o Partido da Terra não tenha estado presente.

    Podemos esperar por isso.

    Garantidamente. Mas esta hora… Vou só dizer-se que esta hora devia ser muito mais, porque não falámos dos pescadores não falámos de um tema de que ninguém quer falar, que é a Defesa Nacional. Ninguém quer falar. A esquerda conseguiu fazer uma coisa que já tinham projetado há algum tempo e conseguiram alimentar esse projeto; conseguiram fazer com que as forças de defesa nacionais estejam entregues à desgraça. Não temos meios de navais com capacidade, não temos meios aéreos com capacidade. Devíamos investir num plano estruturado para renovar todas as frotas existentes. Não há. É engraçado. É que eles conseguiram passar a imagem de: “para quê, não precisamos”. Precisamos! A Ucrânia mostrou que precisamos. O mundo prova que precisamos. Eu gostava de viver num mundo cor-de-rosa, como alguns certos e determinados políticos, certos e determinados partidos dizem que vivemos. Também gostava de viver num desses mundos, mas não vivo. Temos de estar preparados e temos de dar condições aos militares. Os militares têm sido completamente desqualificados e isso é triste e vergonhoso.


    Veja AQUI o programa da coligação Alternativa 21.

    Veja AQUI a página do Partido da Terra.