Categoria: Entrevistas

  • ‘O Presidente da República tem de ser alguém com a convicção de que o país precisa de um caminho diferente”

    ‘O Presidente da República tem de ser alguém com a convicção de que o país precisa de um caminho diferente”



    Mariana Leitão, 42 anos, fez carreira como gestora e assume ter um interesse particular por tecnologia, mas é hoje a líder do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal (IL) e na última convenção do partido subiu a vice-presidente. É também a candidata da IL à presidência da República, nas eleições do próximo ano.

    Licenciada em Relações Internacionais, tem pós-graduações em ‘International Management’ e em ‘Data Science & Business Analytics’. Uma das suas paixões é o ‘bridge‘ e é mesmo jogadora federada desta modalidade. Representou Portugal nos campeonatos da Europa de ‘bridge‘ de 2018 e 2022 e no campeonato do Mundo de 2022.

    Nesta entrevista ao PÁGINA UM — realizada em Dezembro, antes da IX Convenção da IL que reelegeu Rui Rocha para a liderança do partido e antes de se saber que seria a candidata da IL na corrida a Belém —, Mariana Leitão falou sobre a sua vida na política e reconheceu que está satisfeita com a profissão: “gosto daquilo que faço”. Destacou que, sobretudo, quer “sentir que está a fazer a diferença na vida das pessoas”.

    Mariana Leitão, deputada da Iniciativa Liberal. / Foto: D.R.

    Para a deputada, “enquanto líder parlamentar, é um desafio muito grande estar à frente de uma bancada que tem uma visão tão diferente [dos restantes partidos]”. “Defender essa visão para o país é algo que me orgulha bastante e é algo que eu quero deixar; é quase uma marca que eu quero deixar na minha vida”, afirmou. Do que não gosta na vida como deputada? “Da carga burocrática que também existe na política”. Essa não é a sua “zona de conforto”.

    Na entrevista, abordou os temas de bandeira da IL, como a necessidade de haver políticas que potenciem o crescimento económico do país e a reforma do Estado. Aqui, defendeu que o “Estado deve ser forte naquilo que é essencial”, mas deve ser “mais leve, menos burocrático”, ficar de fora “das áreas onde não tem de estar”. Também abordou o tema do choque que vai ocorrer entre a revolução digital em curso, com o advento da Inteligência Artificial, e a forma como funciona o Estado e entidades públicas em Portugal.

    Sobre a corrida a Belém, a actual candidata à Presidência da República, elencou, na entrevista, os traços do perfil de um bom candidato. “É fundamental que haja um candidato que represente as nossas ideias liberais e esta visão liberal do país. O momento de uma campanha presidencial deve servir também para conseguirmos levar as nossas ideias às pessoas e mostrar que há um país diferente que podemos ter se as nossas ideias conseguirem singrar”, afirmou. Salientou, na altura que, “dos candidatos que se vai falando, não nos parece que nenhum represente este espaço e estas ideias, de liberalismo”.

    Foto: D.R.

    E sobre o perfil de um Presidente da República? Para Mariana Leitão, “é alguém que é um garante da estabilidade, que tem a noção do seu papel e que não cria situações desnecessárias, mas tem de ser alguém que, do nosso ponto de vista, e daquilo que é o ideal de um Presidente da República para um liberal […] tenha esta convicção de que, efectivamente, o país precisa de um caminho diferente”, um “caminho em que tem de ser potenciando o crescimento económico e garantir políticas que promovam o crescimento económico”. Sempre que houver um desvio desse caminho, o Presidente da República deve alertar para esse desvio.

    Na entrevista, a agora vice-presidente da IL frisou que o partido deveria ter “ou um candidato próprio ou alguém que se possa apoiar que represente essas ideias, que as defenda e que as consiga comunicar de forma eficaz”. “[Deve] ser alguém com a consciência da urgência do crescimento económico, de um Estado focado naquilo que é essencial e saindo da frente daquilo que é acessório”. Além disso, deve defender “a desburocratização, a simplificação”. São temas que “o candidato a Presidente da República liberal tem de defender e de ter esta crença de que, desta forma, conseguimos sair desta estagnação em que nos encontramos”.

  • ”É preciso, à esquerda, saber estar em minoria e remar contra a corrente’

    ”É preciso, à esquerda, saber estar em minoria e remar contra a corrente’



    A ascensão de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos vem reforçar a tendência que se passa na Europa de normalização de uma nova extrema-direita. Para Fernando Rosas, historiador e fundador do Bloco de Esquerda, “o momento é muito preocupante em termos internacionais” e “estamos a viver um período muito semelhante ao de 1939”, que antecedeu a Segunda Guerra Mundial. Mas não vai ser um fascismo igual ao que se assistiu naquela época.

    Nesta entrevista ao PÁGINA UM, o professor catedrático emérito da Universidade Nova de Lisboa manifestou preocupação com o que considera ser uma nova era de um regime fascista, com uma nova extrema-direita reconfigurada, e aliada de partidos tradicionais de direita. Além disso, Fernando Rosas sublinhou o apoio que oligarcas financeiros e tecnológicos dão a este novo regime que surge como sendo aparentemente benévolo, para resolver os problemas das populações, mas que irá acabar por se impor como autoritário e levar a um aumento das desigualdades económicas e sociais.

    Fernando Rosas, na sua residência, em Lisboa, onde recebeu o PÁGINA UM para esta entrevista. / Foto: PÁGINA UM

    O aviso é também deixado por Fernando Rosas no seu mais recente livro ‘Direitas velhas, direitas novas’, no qual analisa a evolução da extrema-direita na Europa ocidental no pós-Segunda Guerra Mundial.

    Para o fundador do Bloco de Esquerda, a Europa está a normalizar a extrema-direita, com a actual presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a contribuir para essa realidade, através de alianças e políticas que beneficiam grandes grupos económicos e interesses oligárquicos, designadamente a indústria de armamento.

    Para o historiador, nesta ascensão da nova extrema-direita reconfigurada, o anti-semitismo nazi foi substituído pelo anti-islamismo, a homofobia, a xenofobia e a repressão sexual.

    Mas esta nova “extrema-direita não cai do céu aos trambolhões, não é um fenómeno que [surgiu] de repente”, porque “tem origem na crise sistémica do capitalismo neoliberal”, numa “crise económica, uma crise social e uma crise política”. Isto porque “as instituições desacreditaram-se, porque abandonaram as pessoas e as pessoas respondem com medo e respondem com raiva”. É destas emoções primárias que a nova extrema-direita se alimenta para crescer, defendeu Rosas.

    Foto: PÁGINA UM

    “[Em] alguns desses partidos será uma direita que se reconfigura, cavalgando esse descontentamento e cavalgando totalmente sem escrúpulos. Explorando os instintos primitivos das pessoas, o racismo, a homofobia, a concorrência desbragada, o messianismo, a aceitação de verdadeiros palhaços, bobos da corte que se apresentam como líderes de opinião”, afirmou.

    Alertou que “a mentira, a manipulação e esse cavalgar tem uma grande novidade em relação ao que se passou nos anos 20 e nos anos 30 do século passado, que são os meios que têm, a manipulação algorítmica, através das redes sociais, das vontades”, numa “verdadeira operação de contra-revolução cultural” e de “manipulação das vontades, dos sentimentos”. Porque “os eleitorados não são maioritariamente fascistas ou neofascistas; os eleitorados estão zangados, e há uma parte da extrema-direita que se reconfigurou para cavalgar esse descontentamento”.

    Defendeu que com décadas de capitalismo neoliberal, o que temos hoje “são os resquícios de solidariedade social, trabalho coletivo, de espírito de comunidade” porque o lucro se tornou o objectivo central e tudo foi mercantilizado. “A mercantilização é o passar por cima do outro, é o espírito das ‘startups‘, o trepar por cima do outro e fazer o que for preciso para vencer”, disse.

    Para Fernando Rosas, a esquerda precisa de “saber estar em minoria e lutar contra a corrente” para combater o novo fascismo e a guerra que se avizinha. “Remar contra a corrente é a história da esquerda”, disse. Lembrou que “a luta económica, a luta política contra a exploração do capital é indissociável de outras lutas que não são propriamente económicas, mas são lutas e ideológicas, são lutas do espírito, são lutas culturais”.

    Mas defendeu que também a sociedade civil se precisa de movimentar. “E eu tenho confiança que a cidadania tem força suficiente, se souber caminhar nesse sentido, mas eu diria que o mundo que aí vem é complicado”, avisou.

    Pelo meio, deixou fortes críticas à comunicação social, que acusa de contribuir para a ascensão da nova extrema-direita, porque “querem ganhar com a especulação, com as audiências, com o espectáculo” e reproduz o ambiente de normalização de partidos, como o Chega, que “transporta a subversão da democracia”.

    Fernando Rosas defendeu que acções como a recente manifestação contra a acção policial na Rua do Benformoso, em Lisboa, são a base para a criação de uma plataforma que una movimentos para combater o que classifica de novo fascismo. / Foto: D.R.

    Sobre os Estados Unidos, apontou que o fenómeno do “super-identitarismo” fez com que a “luta deixou de ser entre oprimidos e opressores e passou a ser entre brancos e pretos, mulheres e homens, heterossexuais e transexuais ou homossexuais”, levando à divisão da “frente que tem que haver num objectivo comum: a emancipação política e social”.

    Na Europa, incluindo em Portugal, defendeu que deve haver uma plataforma que junte a esquerda, com acções em conjunto que fomentem uma plataforma comum para combater “este novo anti-fascismo”. Mas alertou que esta plataforma “que é preciso construir não pode ter ilusões acerca do capitalismo neoliberal” porque combater a extrema-direita actual “é resolver o problema da habitação, dos salários, do desemprego”. É isso que vai tirar a base e o eleitorado dos novos partidos de extrema-direita, defendeu.

  • Rui Zink

    Rui Zink

    Na vigésima quarta sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com o professor universitário e escritor Rui Zink.



    Uma das figuras mais emblemáticas e provocadoras da literatura portuguesa contemporânea, Rui Zink nasceu em Lisboa em 1961, sendo um escritor que transita entre a seriedade da análise crítica e o humor irreverente que desconstrói convenções, tanto na escrita como na forma de estar na vida.

    Formado em Estudos Portugueses pela Universidade Nova de Lisboa, Rui Zink seguiu carreira académica como professor universitário, leccionando na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

    Como escritor, estreou-se em 1987 com ‘Hotel Lusitano’, mas foi com ‘Apocalipse Nau’ (1996), ‘O suplente’ (2000), ‘O Anibaleitor’ (2006) e ‘A Instalação do medo’ (2012) que consolidou a sua posição enquanto autor de relevância cultural e social, reforçada ainda mais com ‘A dádiva divina’, em 2004. A sua escrita é ágil, irónica e profundamente crítica, explorando temas que vão desde os abusos de poder e os medos contemporâneos até à banalidade do quotidiano. É um mestre em provocar o leitor, ora arrancando gargalhadas inesperadas, ora colocando-o perante inquietações existenciais.

    Para além da prosa, Rui Zink aventurou-se no teatro, na banda desenhada e na literatura infantil, mostrando uma versatilidade que reflecte a sua curiosidade e criatividade insaciáveis. O humor e a inteligência, por vezes ácidas, que perpassam a sua obra fazem dele uma espécie de cronista dos absurdos e das contradições do mundo moderno.

    Rui Zink fotografado no PÁGINA UM.

    Nesta conversa com Pedro Almeida Vieira, Rui Zink fala na forma como a Literatura ‘venceu’ uma carreira desportiva, revisita o seu percurso ‘transgressor’, desde a sua juventude, e como tem vindo a ‘amadurecer’.

    Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Rui Zink sugere o romance ‘Frei Luís de Sousa’, de Alberto Freitas da Câmara, publicado em 1935 – livro que não leu, mas que recomenda por via do protagonista – e ainda ‘A voz dos deus’, de João Aguiar, publicado em 1984.

    Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Rui Zink.
  • Ernesto Rodrigues

    Ernesto Rodrigues

    Na vigésima terceira sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com o professor universitário e escritor Ernesto Rodrigues.



    Transmontano, nascido em Torre de Dona Chama em 1956, Ernesto Rodrigues é uma figura de destaque da literatura e da academia portuguesa, com vasta obra ensaística, experiência em edição literária e docência na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo sido também director do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias entre 2015 e 2019.

    Além do ensaio, com ênfase sobretudo no mundo das letras e do jornalismo do século XIX, ao longo da sua vida acumula uma experiência no jornalismo literário, a partir dos anos 1970, mas tem sido muito através da Literatura que se tem destacado. Como ficcionista, começou com ‘Várias bulhas e algumas vítimas’ (1980), seguindo-se mais dois romances na década de 1980: ‘A flor e a morte’ (1983) e ‘A serpente de bronze’ (1989). A partir de 1994 publicou mais seis romances, dos quais se destacam ‘O romance do gramático’ (2011), ‘A Casa de Bragança’ (2013), ‘Uma bondade perfeita’ (2016, que ganhou o Prémio PEN Clube) e o mais recente Liliputine (2023). Tem também publicado poesia e dramaturgia.

    Além de integrar várias antologias de poesia, é também um dos poucos tradutores literários de húngaro, fruto da sua passagem como leitor de Português em Budapeste.

    Ernesto Rodrigues fotografado no PÁGINA UM.

    Sobre este seu percurso, e de tudo um pouco, desde a sua infância, nesta conversa com Pedro Almeida Vieira, Ernesto Rodrigues revisita os seus passos na Literatura, abordando desde a sua infância até temas como o estudo dos folhetins nos jornais – seu tema de doutoramento –, a sua paixão pela Hungria e a sua incansável procura pelo saber. E falam de muitas mais histórias e estórias.

    Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Ernesto Rodrigues recomenda os romances ‘O bobo’, de Alexandre Herculano – publicado originalmente em 1843 n’O Panorama e em 1878, já postumamente – e ‘O prato de arroz doce’, de Teixeira de Vasconcelos, publicado em livro em 1875.

    Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Ernesto Rodrigues.
  • ‘O futuro da agricultura está na cidade’

    ‘O futuro da agricultura está na cidade’



    Os novos agricultores vêm dos grandes centros urbanos. Por isso, Jaime Ferreira, presidente da Agrobio – Associação Portuguesa de Agricultura Biológica, não duvida que “o futuro da agricultura está na cidade”. “É da cidade que vão sair as pessoas que vão para os campos. Os futuros agricultores vêm da cidade”, disse o engenheiro florestal em entrevista ao PÁGINA UM. Mas há uma dificuldade que os novos agricultores enfrentam: não encontram terrenos e, sobretudo, a preços razoáveis.

    Por isso, nesta entrevista, o presidente da Agrobio também falou sobre a nova lei dos solos, deixando fortes críticas à medida, avisando que “está aberta a porta para usarmos solos que deviam estar guardados para uma função nobre como é a produção dos alimentos”. “Vai aumentar ainda mais os preços da terra e afastar pessoas da agricultura”. “Vai aumentar ainda mais a especulação (imobiliária)”, afirmou, frisando que se trata de “um problema sério de alienação de solos agrícolas”.

    Jaime Ferreira, presidente da Agrobio. / Foto: D.R.

    decreto-lei do Governo que alterou o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial foi publicado em Diário da República no dia 30 de Dezembro visando facilitar a reconversão de solos rústicos em urbanos para a construção de habitação. Segundo o Executivo, o objectivo é baixar os preços da habitação, pelo aumento da oferta, através de arrendamento acessível e habitação a custos controlados. A revogação do diploma foi esta sexta-feira debatida no Parlamento, mas um acordo do Governo com o PS permitiu manter as alterações ao RJIGT. O diploma, com alterações propostas, prosseguiu para discussão em sede de especialidade.

    Jaime Ferreira alertou que a nova lei tem outras implicações, nomeadamente ambientais e prevenção de catástrofes. Isto porque, por um lado, pode levar a que sejam feita construção de habitação em zonas próximas de rios e zonas de cheia e, por outro, porque promove a densificação, sendo que é mais difícil proteger casas que estejam espalhadas no território, em caso de catástrofes naturais, como nos incêndios. Em termos ambientais, também tem implicações em matéria de saneamento, gastos de energia e transportes, apontou.

    Defendeu que a solução para o problema da crise de habitação não deve vir à custa da agricultura. “Um estudo apontou que existem em Portugal três fogos para cada pessoa”, afirmou, indicando que há casas a mais no país, pertencendo muitas delas ao Estado, designadamente autarquias, mas também a entidades como a Santa Casa da Misericórdia, por exemplo.

    Fundada em 1985 para divulgar e promover a agricultura biológica em Portugal, a Agrobio conta hoje com 9.200 associados e assume-se como associação de agricultores, consumidores e apoiantes da causa ambiental. Opera 12 mercados semanais de venda ao consumidor, 10 dos quais na área metropolitana de Lisboa. Também presta apoio aos agricultores, promove cursos de formação e iniciativas pedagógicas em torno de agricultura biológica. Mas, para Jaime Ferreira, o objectivo original da Agrobio ainda não está cumprido, “em particular na área da informação”, havendo ainda “muitos mitos” em torno da agricultura biológica.

    Apesar disso, Portugal está acima da média europeia de área de cultivo dedicada a agricultura biológica. A meta que Portugal fixou, para 2027, junto da União Europeia (UE), era de 19%. Na UE, foi fixada a média de 25% até 2030. “Portugal está acima da média. Desde 2020 para hoje, 2025, já temos 865 mil hectares em agricultura biológica. Corresponde a cerca de 27% da superfície agrícola útil em Portugal. Já passámos os 25%”, disse Jaime Ferreira.

    E há espaço para crescer. A UE disponibilizou 15 mil milhões de euros em fundos para o sector da agricultura, incluindo a conversão de áreas de cultivo convencional para produção biológica. Mas, a nível europeu, apenas 4% dos produtos agrícolas que chegam à mesa dos consumidores são de origem biológica.

    A Agrobio inaugurou, no dia 13 de novembro de 2024, o Mercado biológico Agrobio do Fanqueiro, em Loures), junto à Escola Básica do Fanqueiro. Os mercados da Agrobio têm uma frequência semanal e visam aproximar os produtores dos consumidores. / Foto: Agrobio.

    Apesar de Portugal estar acima da meta média fixada pela UE em área de agricultura biológica, “70% são pastagens, forragens e culturas arvenses”, o que “quer dizer que estão ligadas à produção animal”. Só que os animais produzidos de modo biológico estão a chegar ao consumidor como sendo de origem convencional. “Há um problema da valorização”, pelo que a Agrobio defende a criação de incentivos para que o produto chegue ao consumidor com certificação “bio”.

    Por outro lado, destacou que a agricultura em Portugal tem um problema: “está desligada dos interesses dos consumidores”, que procuram mais legumes, vegetais, leguminosas e frutos secos. Além disso, há que pensar na soberania e na segurança alimentar a nível nacional, numa altura em que a própria UE está deficitária, dependendo de importações para satisfazer as necessidades internas. Nessa matéria, a nível comunitário, “do ponto de vista de produção alimentar, nós regredimos”, avisou.

  • ‘Os portugueses que tiveram reacções adversas às vacinas covid-19 estão ao abandono’

    ‘Os portugueses que tiveram reacções adversas às vacinas covid-19 estão ao abandono’

    Mais de 2.100 pessoas assinaram a ‘Petição Por um Programa do Estado Português de Indemnização das Vítimas de Reações Adversas a Vacinas contra a Covid-19’. A autora da iniciativa é a médica cardiologista Teresa Gomes Mota. Em entrevista ao PÁGINA UM, a antiga vogal do conselho de administração da Fundação Portuguesa de Cardiologia alerta que o país está num estado de negação por não reconhecer sequer que existem portugueses que sofreram reacções adversas às vacinas contra a covid-19. Também sublinhou que, nas actuais condições, seria de recomendar que, na hora de vacinarem contra a covid-19, todas as pessoas tivessem acesso aos riscos que incorrem. A cardiologista também deixou fortes críticas à falta de transparência em torno do processo de vacinação contra a covid-19, com o Infarmed a divulgar alguns dados mas sob ordem judicial.



    Tem sido uma das vozes em defesa dos direitos das pessoas que sofreram reacções adversas às vacinas contra a covid-19. Teresa Gomes Mota, cardiologista, é agora a autora da ‘Petição Por um Programa do Estado Português de Indemnização das Vítimas de Reações Adversas a Vacinas contra a Covid-19‘.

    Para a experiente médica, os portugueses que tiveram reacções adversas às vacinas contra a covid-19 foram deixados ao abandono. Portugal é dos poucos países na Europa sem um programa de indemnização àquelas vítimas.

    Teresa Gomes Mota, cardiologista, na sede do PÁGINA UM, em Lisboa. / Foto: PÁGINA UM

    Nesta entrevista ao PÁGINA UM, Teresa Gomes Mota destaca que, para já, seria positivo que o país e as autoridades reconhecessem que existem vítimas das vacinas contra a covid. Para a cardiologista, o país está num estado de negação, nem sequer reconhecendo que aquelas vítimas existem.

    Por outro lado, também defende que maior transparência em todo o processo de farmacovigilância e criticou o Infarmed, por apenas ter divulgado alguns dados depois de o PÁGINA UM ter avançado com acções na Justiça para aceder a dados do regulador do sector farmacêutico.

    Defendeu também a importância de ser dada informação clara aos que decidem tomar as vacinas contra a covid-19, para que possam, verdadeiramente, fazer uma escolha


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  • Tiago Salazar

    Tiago Salazar

    Na vigésima segunda sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com o jornalista e escritor Tiago Salazar.



    Contador de histórias por natureza, e por excelência, Tiago Salazar encontrou no jornalismo e na literatura as suas formas de expressão privilegiadas, embora também percorra as estradas alfacinhas mostrando as estórias e vivências de Lisboa, que já lhe serviam de mote para livros.

    Formado em Relações Internacionais, estudou Guionismo e Dramaturgia em Londres, mas durante anos o jornalismo ‘conquistou-o’, colaborando com o Diário de Notícias, a revista Grande Reportagem, e, mais tarde, a Time Out Lisboa.

    Viajante incansável, muitas das suas ‘aventuras’ acabaram em livro, como são os casos de ‘Viagens sentimentais’ (2007), ‘A casa do Mundo’ (2008), ‘As rotas do sonho’ (2010), ‘Endereço desconhecido’ (2011), partindo de um programa de televisão, e ‘Crónica da selva’ (2014).

    Mas tem sido no romance que Tiago Salazar se tem destacado, designadamente com ‘O baú contador de histórias’ (2014) e ‘A escada de Istambul’ (2016), a que se juntam, mais recentes, dois romances do género histórico: ‘O Magriço’ (2020) e ‘O pirata das Flores’ (2021).

    Tiago Salazar fotografado no PÁGINA UM.

    Nesta conversa com Pedro Almeida Vieira para a Biblioteca do PÁGINA UM, Tiago Salazar conversa sobre a sua paixão pelas viagens, pelo jornalismo e também pelas personagens que encontra ou (re)cria nos seus romances. E a conversa também para as dificuldades da escrita em Portugal, até por via de Tiago Salazar estar agora a escrever com o apoio de uma bolsa literária. Mas também fala da vida e da anarquia…

    Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Tiago Salazar recomenda os romances ‘O Grande Cagliostro’, de Carlos Malheiro Dias, publicado em 1905, ‘Hora de Sertório’, de João Aguiar, publicado em 1994, e ‘A casa do pó’, de Fernando Campos, publicado em 1986.

    Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Tiago Salazar.

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  • Mónica Bello

    Mónica Bello

    Na vigésima segunda sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com a jornalista e escritora Mónica Bello.



    Iniciou-se no jornalismo em 1988, n’O Independente, onde editou o Caderno 3, tendo regressado, anos mais tarde, para assumir o cargo de directora-adjunta, e, em mais de três décadas, Mónica Bello desempenhou mais cargos de edição executiva: na revista Volta ao Mundo, no jornal Diário Económico e no site de informação Dinheiro Vivo.

    Integrou ainda a equipa fundadora do jornal i, como subdirectora, e foi ainda directora-adjunta da revista Grande Reportagem e do jornal Diário de Notícias.

    As suas vivências jornalísticas levaram-na também ao mundo dos livros. Em 2006, publicou ‘A costa dos tesouros’, sobre navios afundados e património cultural subaquático na costa portuguesa. E em 2020, publicou também ‘A vida extraordinária do português que conquistou a Patagónia’, sobre um português aventureiro no extremo meridional do continente sul-americano. De permeio, em 2012, escreveu, em co-autoria, dois livros de receitas para crianças, Este mês estreou-se, finalmente, no romance, com ‘A jóia que o rei não quis’, que ficciona uma história verdadeira envolvendo um punhal do século XIX, que pertence agora à Fidelidade, a mais antiga seguradora portuguesa em actividade.

    Mónica Bello fotografada no PÁGINA UM.

    Nesta conversa com Pedro Almeida Vieira – um reencontro depois de se terem cruzado na revista Grande Reportagem no final dos anos 90 –, Mónica Bello fala do seu percurso jornalísticas e duas suas aventuras nestas lides que a levaram a conhecer alguns dos temas que transpôs para os livros, bem como da ‘feitura’ do seu primeiro romance.

    Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Mónica Bello recomenda os romances ‘Uma fazenda em África’, de João Pedro Marques, publicado em 2012, ‘O cemitério dos eternos prazeres’, de Domingos Amaral, publicado em 2024, e ‘Equador’, de Miguel Sousa Tavares, publicado em 2003.

    Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Mónica Bello.

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  • Teolinda Gersão

    Teolinda Gersão

    Na vigésima sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com a escritora Teolinda Gersão.



    Reconhecida e consagrada como uma das grandes vozes da literatura contemporânea portuguesa, Teolinda Gersão tem construído uma obra marcada pela sensibilidade e pela capacidade de explorar os meandros mais profundos da experiência humana. A Literatura, em si, é mais do que um veículo de expressão pessoal; é uma ferramenta para dar forma às múltiplas dimensões da vida, onde memória, história e identidade convergem.

    Embora oficialmente a sua estreia seja apontada ao ano de 1981 com “O Silêncio”, romance logo amplamente elogiado pela crítica, Teolinda Gersão teve uma juvenil incursão, aos 14 anos, com um livro de contos, ‘Liliana’, em 1954, cujo exemplar está patente na Biblioteca do PÁGINA UM, e que, embora não reconhecida na sua bibliografia, surge como um ponto de partida para esta longa, mas admirável conversa com Pedro Almeida Vieira.

    Teolinda Gersão fotografada no PÁGINA UM.

    Além de ser abordada uma carreira literária ímpar – que cruza fronteiras culturais e psicológicas, onde se destacam obras como ‘A Casa da Cabeça de Cavalo’, ‘Os Guarda-Chuvas Cintilantes’, A Cidade de Ulisses’ e o mais recente ‘Autobiografia não escrita de Martha Freud –, Teolinda Gersão fala do seu percurso de vida e da forma com a sua trajetória criativa se foi cruzando com o percurso académico, até lhe ter ganhado primazia.

    Nesta conversa, Teolinda Gersão revisita também as influências que moldaram a sua visão literária e pessoal, desde os anos que viveu em Berlim até à sua incursão pela literatura africana, e a visão que foi moldando sobre Portugal e os portugueses. E mostra sobretudo ser uma mulher de paixões, que se desvendam na forma como fala de determinados temas ou assuntos. Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Teolinda Gersão decidiu escolher ‘Adoecer’, de Hélia Correia, publicado em 2010, ‘Fanny Owen’, de Agustina Bessa-Luís, publicado em 1979, e a chamada ‘trilogia da mão’, de Mário Cláudio constituída por ‘Amadeo’. ‘Guilhermina’ e ‘Rosa’, publicados originalmente entre 1984 e 1986.

    Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Teolinda Gersão.

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  • ‘Há uma ideia de que em nome da liberdade de expressão se pode dizer tudo’

    ‘Há uma ideia de que em nome da liberdade de expressão se pode dizer tudo’

    É uma figura pública reconhecida pelos portugueses e acaba de ganhar um importante caso na Justiça. António Garcia Pereira, advogado e antigo candidato à Presidência da República, defendeu em regime ‘pro bono’ Renata Cambra num processo contra dois réus, um deles Mário Machado, que está ligado à extrema-direita e ao neonazismo. O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou a condenação de Machado a uma pena de prisão efectiva de 2 anos e 10 meses, num caso que envolve incitamento à violência e ao ódio contra mulheres de ideologias de esquerda, designadamente contra a ex-dirigente do Movimento Alternativa Socialista. Esta vitória segue-se a outra: Garcia Pereira foi homenageado, em Maio, com o Prémio Nelson Mandela pela sua “coragem em denunciar excessos” de entidades “com capacidade de intimidação”. Nesta entrevista ao PÁGINA UM, no seu escritório, em Lisboa, Garcia Pereira falou sobre os limites à liberdade de expressão mas também sobre a cultura de cancelamento de que tem sido alvo na comunicação social, desde que criticou as medidas ilegais que foram adoptadas pelo governo na pandemia. O Tribunal Constitucional acabou por lhe dar razão, mas a cultura de cancelamento mantém-se. O advogado afastou um regresso à vida política activa mas deixou críticas aos partidos de esquerda. Deixou também um alerta: o Almirante Gouveia e Melo, que não tem afastado ser candidato às eleições presidenciais, tem um perfil autocrático que beneficia dos tempos actuais de ascensão do populismo e do facto de o povo não ter memória.



    António Garcia Pereira luta há muito contra o fascismo e tem sido um rosto em defesa da democracia e dos direitos fundamentais. Agora, o conhecido advogado e antigo professor universitário, acaba de celebrar uma relevante vitória na Justiça: a confirmação pelo Tribunal da Relação de Lisboa da condenação a pena de prisão efectiva de Mário Machado, ligado à extrema-direita e ao neonazismo. Machado e outro réu, Ricardo Pais, foram condenados por terem incitado à violência e ao ódio contra mulheres de esquerda, designadamente Renata Cambra, antiga dirigente do Movimento Alternativa Socialista.

    Apesar de poderem recorrer da sentença, Garcia Pereira está confiante de que Machado vai mesmo cumprir os dois anos e 10 meses de pena de prisão, admitindo que um eventual o recurso para adiar o cumprimento da sentença venha a ser rejeitado.

    Mas, nesta entrevista ao PÁGINA UM, no seu escritório em Lisboa, Garcia Pereira, de 72 anos, alertou que “evidentemente que a luta contra os fascistas e os neonazismo não se faz apenas nos tribunais”. Para o reputado mestre e doutor em Direito, tem existido alguma complacência com situações em que há ataques ao bom nome e dignidade das pessoas, nomeadamente nas redes sociais. E citou a “própria jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem” que tem alimentado abusos do direito à liberdade de expressão.

    António Garcia Pereira. / Foto: D.R.

    Para o advogado, “a liberdade de expressão de pensamento é um valor fundamental, mas a liberdade de expressão de pensamento está aliada a uma coisa que Gabriel García Márquez escreveu na sua carta, considerado o seu testamento: um homem só deve olhar de cima para baixo, para outro homem, para ajudar a levantar-se no chão”.

    Para Garcia Pereira, “há uma desvalorização de valores imateriais, como o bom nome e a dignidade das pessoas”, que é fruto “da época do capitalismo” em que há uma depreciação do respeito pela pessoa, “do respeito pelo outro, da solidariedade”.

    O advogado e histórico combatente contra o fascismo, alertou que se está a assistir a uma repetição da História, em que o excesso e abuso da liberdade de expressão poderão levar a um outro extremo, que é a punição, não só de comportamentos abusivos mas também de todos, incluindo aqueles que são verdadeiramente de liberdade de expressão. “E nós já tivemos essa experiência durante o período da covid-19”, em que houve censura de cientistas e de todos os que suscitaram dúvidas sobre muitas das medidas impostas por governos.

    Garcia Pereira chegou a alertar para o facto de algumas medidas do governo serem ilegais, o que lhe valeu ser cancelado pela comunicação social. “A minha voz, como a de muitos outros, foi eliminada na comunicação social”, lamentou. Um ‘cancelamento’ que se mantém até hoje. Garcia Pereira era um convidado assíduo e era regularmente chamado para fazer comentários em diversos canais de TV. Deixou de ser convidado. “Este ponto de vista que eu estou a defender ser imediatamente silenciado e, pior do que isso, ser insultado, é evidentemente uma demonstração da época que vivemos”, disse.

    Mas o Tribunal Constitucional deu-lhe razão, com mais de duas dezenas de acórdãos a confirmar a inconstitucionalidade de medidas impostas indevidamente e de forma desproporcional na pandemia. “Na pandemia, foi usada a velha teoria de que os fins justificam os meios e que quem conhece a História sabe perfeitamente que esse é um dos alicerces da teoria de legitimação do direito e do Estado do III Reich”, afirmou. Lembrou que chegou a haver quem tivesse sido alvo de processos disciplinares por ter posições diferentes das do governo.

    O advogado com os filhos  Tiago, Ricardo, Manuel e Rita, na cerimónia em que recebeu o prémio Nelson Mandela. / Foto: D.R.

    O antigo candidato à Presidência da República afastou um regresso à vida política activa. Mas deixou críticas aos partidos de esquerda, os quais considera serem os responsáveis pelo populismo. “Em meu entender, não há nenhuma força política verdadeiramente de esquerda [em Portugal] e isso é, em larga medida, responsável pelo pântano em que nos encontramos hoje”, com a população a não ver nos partidos diferenças substanciais sobre as grandes questões que afectam o país.

    E deixou um alerta sobre a ascensão da figura de Gouveia e Melo, actual Chefe do Estado-Maior da Armada. “É aí [nas crises] que sempre, historicamente, surgem os salvadores da pátria. As soluções dos dos [falsos] Messias que aparecem, apresentando-se supostamente acima das classes e dos partidos políticos, com um discurso que é sempre igual”, de que vai acabar com “a bandalheira e a corrupção”. Alguém que diz que “isto está muito mal, é preciso uma pessoa com autoridade”.

    Garcia Pereira criticou Gouveia e Melo por estar há um ano a “a fazer uma campanha usando inclusivamente os meios da Marinha e a farda”. E deu o exemplo recente de um podcast em que o Almirante participou, que decorreu “nas instalações da Marinha, no Centro de Inovação da Marinha”, no qual “não só se pronuncia, por exemplo, sobre o caso do NRP Mondego, como se pronuncia sobre uma série de matérias, inclusivamente políticas, o que um militar no activo não pode fazer”.

    Para o advogado, o anúncio de que André Ventura poderá ser candidato nas eleições presidenciais não passa de uma manobra que “destina-se pura e simplesmente a marcar um certo distanciamento do Chega, de que o próprio Almirante Gouveia e Melo necessita”. Isto porque o Chega foi o partido que se manifestou ser favorável a apoiar Gouveia e Melo, o qual aparenta ter uma proximidade evidente ao CDS-PP.

    Garcia Pereira não tem dúvidas de que Gouveia e Melo é uma “solução perigosíssima” para o cargo de Presidente da República, porque “representa aquilo que representaram todos os [falsos] Messias da História”. Sublinhou que, tudo aponta que o Almirante “é uma personalidade ultra-reaccionária, com um timbre da atuação que é violentamente autocrático”.

    Disse que a aparente popularidade de Gouveia e Melo é explicada pelo facto de haver um povo sem memória. “Um povo sem memória é um povo sem futuro e nós não nos devíamos esquecer para onde é que conduziram experiências políticas anteriores a essa [de Gouveia e Melo]”.


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