número de contratos públicos acima dos 100.000 euros
1 – [1] Infraestruturas de Portugal – 74
2 – [2] Município de Lisboa – 45
3 – [3] Estado-Maior da Armada – 24
4 – [4] Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) – 18
5 – [5] Estado-Maior-General das Forças Armadas – 17
6 – [6] Estado-Maior da Força Aérea – 16
7 – [7] Instituto da Segurança Social – 15
8 – [7] Administração Regional de Saúde do Norte – 14
8 – [9] Santa Casa da Misericórdia de Lisboa – 14
8 – [9] Lisboa Ocidental – Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) – 14
11 – [11] Instituto do Emprego e da Formação Profissional – 13
11 – [11] Instituto Nacional de Emergência Médica – 13
11 – [15] Metropolitano de Lisboa – 13
11 – [15] Banco de Portugal – 13
15 – [11] Administração Regional de Saúde do Centro – 12
15 – [11] Município de Loures – 12
17 – [15] Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – 11
17 – [15] CP – Comboios de Portugal – 11
17 – [15] Polícia de Segurança Pública – 11
17 – [20] Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH) – 11
N.D. Este ranking do PÁGINA UM é elaborado a partir dos dados do Portal Base, seleccionando-se exclusivamente os contratos públicos por ajuste directo (regime geral) a partir do preço contratual de 100.000 euros, tendo como referência a data de publicação (e não a data da celebração do contrato). O número entre parêntesis rectos refere-se à classificação do mês anterior. Saliente-se que a identificação das entidades é confirmada com o número de identificação de pessoa colectiva (NIPC), uma vez que as denominações das entidades públicas (adjudicantes) e das empresas privadas (adjudicatárias, que raramente são entidades públicas) usadas no Portal Base nem sempre são escritas da mesma forma, o que pode suscitar alguma confusão. Somente no ranking dos 25 maiores contratos se verificará se houve alteração no preço contratual.
Quase não se dão por elas, por serem apenas três em cada 1.000 mortes contabilizadas em Portugal. Poucas centenas em cada ano. Em todo o país eram menos de um óbito por dia; mas agora, de repente, já é um pouco mais de um por dia, e analisando em detalhe verifica-se que nos últimos dois anos o incremento da mortalidade nos adolescentes e jovens adultos, com idades entre os 15 e os 24 anos, aumentou 22% face ao período pré-pandemia. O forte aumento coincidiu com o início do programa de vacinação contra o SARS-CoV-2, a partir do quatro trimestre de 2021. Mas esse é tema tabu. O PÁGINA UM até já tinha, há cerca de um ano, detectado uma tendência preocupante. Daí para cá, só piorou.
Há um problema persistente e já indisfarçável, excepto se o “sangue jovem” for já indiferente para os lados da Avenida João Crisóstomo, sede do Ministério da Saúde: a mortalidade total na faixa etária dos 15 aos 24 anos está anormalmente elevada desde o início de 2022. A situação nem sequer se pode já considerar surpreendente, porque em Setembro do ano passado o PÁGINA UM já detectara uma preocupante tendência crescente na mortalidade dos adolescentes e jovens adultos desde Outubro de 2021.
Mas desde Setembro, esta situação só piorou. E piorou duplamente, porque há um manto de silêncio político e mediático sobre estas mortes há largos meses, enquanto os media mainstream apenas se entretêm quando há show off, como a trágica (e desumana) morte de um idoso de 93 anos que, quando nasceu em 1930 tinha então uma probabilidade de viver só até aos 50 anos, ou seja, menos 43 anos do que aqueles que acabou vivendo. Os jovens que estão a perder a vida em circunstâncias não apuradas (porque aparentemente não interessa saber as causas) nem sequer terão a chance de contribuir para que, dentro de décadas, não se continue a deixar morrer nenhum idoso sozinho numa maca de hospital…
Em Setembro do ano passado, numa análise do PÁGINA UM aos dados do Sistema de Informação do Certificados de Óbito (SICO) já se constatara que em todo o mês de Agosto de 2022 tinham sido contabilizados 45 óbitos, um máximo desde 2014 – ano em que se começou a recolher estes dados com detalhe etário e mensal – para os jovens daquele intervalo de idades. Mais do que um recorde fortuito, enquadrava-se numa tendência crescente.
Considerando a evolução da média da mortalidade anual – ou seja, o somatório dos óbitos dos 12 meses anteriores –, o mês de Agosto do ano passado mostrava estar num pico (com 360 óbitos), que contrastava com 304 óbitos no mesmo período de 2021. E o PÁGINA UM já anunciava não haver sinais de abrandamento.
E o pior cenário confirmou-se. Uma nova análise do PÁGINA UM aos dados do SICO mostram que, para a faixa etária dos 15 aos 24 anos, o crescimento da mortalidade anual – calculada em função dos 365 dias anteriores – só inverteu ligeiramente na segunda semana de Novembro do ano passado, depois de se estabelecer um novo máximo nos 377 óbitos. Isto significa que morriam então 103 jovens deste grupo etário em cada 100 dias, quando antes da pandemia, e mesmo antes do início da vacinação contra a covid-19, o rácio era de 87 mortes por cada 100 dias. Significa que, extrapolando para 365 dias, havia um acréscimo inexplicável e inesperado de quase 60 mortes por ano de adolescentes e jovens adultos.
Evolução da mortalidade acumulada nos últimos 365 dias para o grupo etário dos 15 aos 24 anos em cada dia desde Janeiro de 2015. Nota: para suavizar pequenas variações diárias procedeu-se ainda, para cada dia, ao cálculo da média móvel a 30 dias. Fonte: SICO / DGS. Análise: PÁGINA UM.
No início de Janeiro deste ano ainda se chegou a observar uma ligeira retracção dos níveis de mortalidade deste grupo juvenil, mas este nunca ficou abaixo dos 360 óbitos (nos últimos 365 dias). E a partir daí encetou-se nova subida que atingiu os 375 óbitos (nos últimos 365 dias) em 21 de Julho. Anteontem, dia 23 de Agosto, este nível de mortalidade situava-se nos 371 óbitos – ou seja, desde 24 de Agosto de 2022 foi esse o número total de mortes em Portugal de jovens entre os 15 e os 24 anos.
Comparando com períodos homólogos durante a pandemia, entre 24 de Agosto de 2021 e 23 de Agosto tinham morrido 360 jovens desta faixa etária – menos 11 óbitos. No período homólogo de 2020 a 2021 apenas 295 – menos 76 óbitos. No período homólogo de 2019 a 2020 registaram-se 338 – menos 33 óbitos. Este último valor, mais elevado do que o contabilizado no ano seguinte, não terá sido devido à covid-19, uma vez que no primeiro ano da pandemia apenas se registou um óbito por esta doença nesta faixa etária.
Nos períodos de Agosto a Agosto dos anos anteriores à pandemia, as diferenças face ao período homólogo de 2022-2023 nos níveis de mortalidade na faixa etária dos 15 e os 24 anos situaram-se entre menos 36 e menos 74 óbitos.
Em Setembro do ano passado, tendo feito uma análise similar, detectando já sinais evidentes de agravamento da mortalidade entre adolescentes e jovens entre os 15 e 24 anos, a situação só piorou.
Para confirmar que este acréscimo de mortalidade nesta faixa etária não é conjuntural, e aparenta ser já estrutural – e é pelo menos coincidente com o início do período de vacinação contra a covid-19 nos jovens –, diga-se que nenhum outro grupo etário apresenta similar cenário.
De acordo com outra análise do PÁGINA UM, para o período de 1 de Janeiro a 23 de Agosto (ou 22 de Agosto nos anos bissextos) desde 2014, é certo que o grupo dos maiores de 85 anos tem sido o mais “fustigado”, mas estamos perante uma faixa etária que está já fora da esperança média de vida, ou seja, com taxas de mortalidade bastante elevadas (acima dos 15% ao ano).
Mesmo assim, comparando, para este período do ano, a mortalidade no quadriénio 2020-2023, observa-se que os mais idosos registaram um acréscimo de mortalidade de 16% face ao quadriénio 2016-2019, com o pior ano a ser o de 2022. Porém, no ano em curso, apesar da mortalidade ainda estar bem acima de qualquer ano pré-pandemia, o número de óbitos está abaixo do registado em 2022 e 2021. Além disso, convém salientar que este grupo etário tem estado a aumentar nas últimas décadas, sendo daí que também se justifica um aumento do número absoluto de óbitos.
Ora, mas tal não se verifica no grupo etário dos 15 aos 24 anos, que até revela uma ligeira diminuição populacional em termos absolutos face à gradual diminuição da natalidade nas duas últimas décadas. Nestes casos, um aumento no número de óbitos em determinado período significa automaticamente uma subida da taxa de mortalidade.
Assim, no período de 1 de Janeiro a 23 de Agosto, se se comparar o quadriénio 2020-2023 com o quadriénio 2016-2019, constata-se um agravamento de 15,3% da mortalidade neste grupo de jovens. Contudo, a situação ainda se agrava mais se se comparar o biénio 2022-2023 (média de 243 óbitos) com o período de 2014-2021 (média de 202 óbitos), revelando-se um aumento da taxa de mortalidade de 20,3%. E se se considerar apenas o quinquénio anterior à pandemia (2015-2019), a taxa de mortalidade aumenta 22%.
A dimensão deste flagelo nos jovens entre os 15 e os 24 anos – que passa despercebido num país que se habitua a ter mais de 300 óbitos, na sua esmagadora maioria de pessoas bastante idosas – não encontra paralelo nas faixas etárias antecedentes e subsequentes.
A análise do PÁGINA UM aos dados do SICO desde 2014 para o período entre 1 de Janeiro e 23 de Agosto (ou 22 de Agosto, nos anos bissextos) mostra que, confrontando o quadriénio 2020-2023 (que engloba os anos da pandemia) com o quadriénio anterior (2016-2019), a taxa de mortalidade infantil até apresentou uma melhoria substancial (-23,3%), confirmando aliás a boa evolução deste indicador já salientada em notícia de Maio passado. Isto mesmo se 2022 e 2023 apresentam números mais elevados do que 2021, que foi ano atípico (no bom sentido).
Ministério da Saúde anda desde Agosto de 2022 a dizer que estuda as causas do excesso de mortalidade, mas Manuel Pizarro até já culpou as alterações climáticas.
No grupo dos 1 aos 4 anos, a redução é de 2,5%, embora os valores de 2022 e 2023 sejam mais elevados do que os dois primeiros anos da pandemia (2020 e 2021). Em todo o caso, este é, por norma, um grupo etário de baixíssima taxa de mortalidade, pelo que se pode concluir que a última década tem sido marcada pela estabilidade. O mesmo se pode dizer para o grupo dos 5 aos 14 anos, em que a variação entre os dois quadriénios é praticamente nula.
Como a variação entre quadriénios no grupo etário dos 25 aos 34 anos também se mostra baixa (apenas 2,4%), sendo que os números de óbitos em 2022 e até de 2023 são superados por outros anos do período 2014-2019, mais se destaca assim, pela negativa, a situação da mortalidade dos adolescentes e jovens adultos dos 15 aos 24 anos.
E ainda mais se se juntar, na comparação, o grupo etário dos 35 aos 44 anos, que claramente foi um grupo pouco ou nada afectado pela pandemia, quer pela covid-19, quer pela desregulação do Serviço Nacional de Saúde, quer mesmo por hipotéticos efeitos adversos das vacinas contra o SARS-CoV-2. Com efeito, sendo certo que nos anos anteriores à pandemia, entre 1 de Janeiro e 23 de Agosto, se contabilizam, neste grupo etário, mais de um milhar de óbitos, a partir de 2021 os valores passam a estar abaixo dessa fasquia. Os números deste ano (864 óbitos) são mesmo os mais baixos desde 2014.
Número de óbitos por grupo etário e ano desde 2014 no período de 1 de Janeiro a 23 de Agosto (ou 22 de Agosto, em anos bissextos). Fonte: SICO /DGS. Análise: PÁGINA UM.
Nos grupos imediatamente subsequentes, apesar de o quadriénio 2020-2023 apresentar valores acima do quadriénio anterior à pandemia (2016-2019), os dois últimos anos mostram uma tendência de regresso à normalidade. Nos diversos grupos etários entre os 55 e os 84 anos verifica-se mesmo uma contínua descida ano após ano, desde 2021, o pico da pandemia. Os valores de mortalidade do grupo etário dos 75 aos 84 anos desde o início do ano em curso (20.534 óbitos) até já se situa abaixo da generalidade dos anos entre 2014 e 2022.
Este cenário geral, contudo, só agrava, por isso, a situação dos adolescentes e jovens dos 15 aos 24 anos. Mesmo se, no total, representam apenas 0,3% do total dos óbitos. Mas a morte dos jovens não são apenas mortes: são vidas que deixaram de ser vividas. E isso custa mais…
Entretanto, recordemo-nos que em Agosto de 2022, o Ministério da Saúde anunciou um estudo para analisar e detectar as causas para o excesso de mortalidade. Ainda não deu “sinais de vida”, apesar de o ministro Manuel Pizarro se ter antecipadao e culpado jáas alterações climáticas. Enquanto isto, o PÁGINA UM ainda aguarda os resultados de um recurso junto do Tribunal Central Administrativo Sul, através do seu FUNDO JURÍDICO, para aceder aos dados discriminados do SICO que, em poucos dias de análise, permitiria apurar as principais doenças ou afecções responsáveis por esses excessos.
número de contratos públicos acima dos 100.000 euros
1 – [1] Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra– 199
2 – [2] Hospital de Braga – 173
3 – [3] Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte – 172
4 – [4] Instituto Português de Oncologia do Porto – 87
5 – [5] Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro – 71
6 – [6] Centro Hospitalar Universitário do Algarve – 68
7 – [10] Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia – Espinho – 66
8 – [7] Centro Hospitalar Universitário de São João – 65
8 – [9] Hospital de Loures – 65
10 – [8] Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca – 58
11 – [11] Instituto Português de Oncologia de Lisboa – 53
12 – [12] Hospital Garcia de Orta – 51
13 – [13] Centro Hospitalar Universitário de Santo António – 38
14 – Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga – 32
15 – [16] Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano – 27
16 – [15] Hospital de Santo Espírito da Ilha Terceira – 26
16 – [17] Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental – 26
18 – [18] Centro Hospitalar do Médio Tejo – 24
18 – [18] Centro Hospitalar Tondela-Viseu – 24
18 – [20] Centro Hospitalar Barreiro Montijo – 24
N.D. Este ranking do PÁGINA UM é elaborado a partir dos dados do Portal Base, seleccionando-se exclusivamente os contratos públicos por ajuste directo (regime geral) a partir do preço contratual de 100.000 euros, tendo como referência a data de publicação (e não a data da celebração do contrato). O número entre parêntesis rectos refere-se à classificação do mês anterior. Saliente-se que a identificação das entidades é confirmada com o número de identificação de pessoa colectiva (NIPC), uma vez que as denominações das entidades públicas (adjudicantes) e das empresas privadas (adjudicatárias, que raramente são entidades públicas) usadas no Portal Base nem sempre são escritas da mesma forma, o que pode suscitar alguma confusão.
No acto da inscrição para a Jornada Mundial da Juventude, houve 354 mil peregrinos que pagaram ao Patriarcado de Lisboa verbas que incluíam um kit de transporte, e quem preparou os seus próprios percursos pagou os bilhetes do seu bolso. Mas ninguém explica agora se o Patriarcado pagou algum serviço ou se antes encaixou as verbas nos seus cofres; e nem se sabe se os operadores suportaram algum custo adicional. Só se sabe, sim, que um simples despacho do ministro Duarte Cordeiro mandou o orçamento do Fundo Ambiental às malvas e determinou que se concedesse um subsídio à empresa intermunicipal TML de até 3,3 milhões de euros. Mas esta empresa pública, que sobrevive de subsídios à exploração e já apresenta indicadores que podem levar à sua dissolução em breve, também ainda não deu sinal de si sobre esta matéria. Nem ao próprio Ministério do Ambiente. O apoio estatal concedido é superior ao custo do polémico altar-palco.
No âmbito da Jornada Mundial da Juventude, o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, autorizou a transferência de 3,3 milhões de euros do Fundo Ambiental para a empresa pública TML – Transportes Metropolitanos de Lisboa, mas ninguém diz, em concreto, para que serviu nem qual a justificação.
A TML é uma empresa pública, criada em 2021 no seio das 18 autarquias Área Metropolitana de Lisboa (AML), com atribuições no planeamento e gestão de bilhética, como o Cartão Viva, funções antes atribuídas à OTLIS. Apesar de no ano passado, primeiro em pleno funcionamento, ter alcançado a venda de 15,6 milhões de euros, mostra, desde já, uma situação completamente deficitária, não tendo registado prejuízos colossais apenas porque sobretudo a AML lhe injectou 20 milhões de euros de subsídios de exploração.
Altar-palco foi palco de polémica e baixou de 4,2 milhões para 2,9 milhões de euros. Apoio do Fundo Ambiental para transportes, que foram pagos pelos peregrinos, foi superior.
O montante máximo a atribuir (3,3 milhões de euros) pelo Ministério do Ambiente decorre de um despacho de Duarte Cordeiro, publicado no final de Julho, que decidiu usar as verbas do Fundo Ambiental para, “mediante protocolo de colaboração técnica e financeira a celebrar” com a TML “para apoiar a aquisição de títulos de transporte público para os peregrinos que participam na Jornada Mundial da Juventude 2023”.
A atribuição da verba do Fundo Ambiental – um milionário fundo com receitas previstas este ano de 1,2 mil milhões, metade dos quais dos leilões das licenças de emissões de dióxido de carbono (CELE) – foi feito à margem do orçamento de 2023 aprovado pelo próprio Duarte Cordeiro em Março deste ano, que determinava que o destino das verbas só poderia ser revisto “caso a execução orçamental da receita apresente variações significativas face às receitas previstas ou perante eventuais alterações significativas à execução orçamental de compromissos assumidos.”
Porém, Duarte Cordeiro invocou uma cláusula de excepção do diploma que criou o Fundo Ambiental em 2016 que permite apoios pontuais por decisão do “membro do Governo responsável pela área do ambiente e da ação climática” quando se considerar que beneficia “a intervenções urgentes ou de especial relevância”. E o ministro do Ambiente assim fez, por considerar que se justificava “o apoio à disponibilização de títulos de transporte intermodais específicos para os peregrinos da JMJ, como forma de induzir e facilitar a opção de deslocações em transporte público, em detrimento de outras formas de mobilidade mais poluentes e penalizadoras do ambiente.”
Duarte Cordeiro gere o Fundo Ambiental com um orçamento anual de 1,2 mil milhões de euros. Por simples despacho, pôde contrariar o orçamento do multimilionário fundo e atribuir 3,3 milhões de euros para apoiar uma empresa deficitária, sem justificação fundamentada.
Porém, a justificação para esta operação de financiamento à TML não encaixa na realidade, porque os peregrinos que se inscreveram na Jornada Mundial da Juventude tiveram de pagar o transporte, que estava incluído explicitamente como contrapartida. Recorde-se que nos Pacotes Peregrinos, a Fundação JMJ Lisboa 2023 – criada pelo Patriarcado de Lisboa para a organização do evento que contou com a presença do Papa Francisco – estabeleceu diferentes valores de inscrições, desde os 95 até aos 255 euros, todos incluindo kits de transporte.
Pressupondo que uma parte das avultadas receitas do Patriarcado de Lisboa pelas cerca de 354 mil inscrições de peregrinos se destinaria, em princípio, para também custear passes de transportes, o PÁGINA UM questionou por duas vezes a Fundação JMJ para saber se houve algum pagamento de serviços, ou algum desconto pelos passes durante a Jornada Mundial da Juventude, quer à TML quer a outro qualquer operador, como a Carris e Metropolitano de Lisboa. Porém, do Patriarcado de Lisboa só veio silêncio – e, por agora, só Deus saberá a resposta…
Ou também a administração da TML – mas esta também não respondeu aos pedidos de informação do PÁGINA UM sobre o protocolo de colaboração técnica e financeiro previsto, nem deu explicações para o recebimento do apoio do Fundo Ambiental sabendo-se que, em princípio, os peregrinos pagaram o transporte no acto da sua inscrição.
Houve 354 mil peregrinos que pagaram inscrição, que incluía kit de transporte. Os restantes tiveram que pagar bilhete nos transportes. TML não explica se recebeu dinheiro do Patriarcado de Lisboa ou se teve suportar algum custo que não teve retorno financeiro positivo.
Apenas o Ministério do Ambiente, através do gabinete de imprensa de Duarte Cordeiro reagiu, embora ao estilo de Pôncio Pilatos, dizendo que aguardam que a “TML comunique o número de títulos usados para poder contabilizar o montante do Fundo Ambiental que será efetivamente necessário mobilizar, nos termos referido no despacho”, acrescentando, porém, que “o valor que a TML receberá será repartido pelos operadores da área metropolitana de Lisboa que aderiram, consoante o número de validações”, incluindo “a Carris e o Metropolitano de Lisboa”.
Na nota enviada pelo Ministério do Ambiente ao PÁGINA UM não surge qualquer referência sobre a noticiada comparticipação de 40% por parte do Governo aos passes dos peregrinos, através de um suposto acordo com a Fundação JMJ.
Em suma, cerca de um mês após o despacho governamental, ignora-se se o dinheiro recebido dos peregrinos pela Fundação JMJ acabaram no bolso da Patriarcado de Lisboa, e se os 3,3 milhões de euros não são mais um dos contínuo subsídios à exploração de uma empresa pública, nascida há apenas dois anos, que já está deficitária.
A TML gere, entre outros títulos, o passe Navegante dos transportes públicos da Área Metropolitana de Lisboa. No ano passado, as receitas de prestação de serviços só cobriram 44% dos custos. Resultado: sobrevive de subsídios de exploração para pagar sobretudo contratos externos e salários de 72 funcionários.
De facto, mostra-se surpreendente constatar, através do relatório e contas de 2022, que a TML, para obter no ano passado vendas de 15,6 milhões de euros, teve de contratar serviços externos no valor de quase 31,4 milhões de euros – sendo 27,7 milhões em subcontratos –, além de arcar gastos com pessoal da ordem dos 3 milhões de euros. Em média, o salário bruto dos 72 empregados aproxima-se dos 3.000 euros mensais. E os três administradores custaram ao erário público, em dois anos (2021 e 2022) quase 456 mil euros.
No recente relatório e contas, a administração da TML até já alerta para o incumprimento de indicadores estabelecidos por um diploma de 2012 relativo à actividade empresarial de municípios. Essa legislação obriga que as empresas municipais sejam extintas se, por exemplo, as vendas e prestações de serviços realizados durante os últimos três anos não cubram, pelo menos, 50% dos gastos totais dos respetivos exercícios, ou se o resultado líquido for negativo durante três anos. A continuar esta situação financeira, se os municípios retirarem parte dos subsídios à exploração, os prejuízos contabilísticos disparam.
14 – [13] CTT – Correios de Portugal (Mercadorias) – 10
15 – [14] Gertal (Restauração) – 9
15 – [14] Ronsegur (Vigilância) – 9
17 – [16] Generali (Seguros) – 8
17 – [16] Iberlim (Limpezas) – 8
17 – [16] Iberdrola (Energia) – 8
17 – [16] Euromex (Limpezas) – 8
N.D. Este ranking do PÁGINA UM é elaborado a partir dos dados do Portal Base, seleccionando-se exclusivamente os contratos públicos por ajuste directo (regime geral) a partir do preço contratual de 100.000 euros, tendo como referência a data de publicação (e não a data da celebração do contrato). O número entre parêntesis rectos refere-se à classificação do mês anterior. Saliente-se que a identificação das entidades é confirmada com o número de identificação de pessoa colectiva (NIPC), uma vez que as denominações das entidades públicas (adjudicantes) e das empresas privadas (adjudicatárias, que raramente são entidades públicas) usadas no Portal Base nem sempre são escritas da mesma forma, o que pode suscitar alguma confusão. Somente no ranking dos 25 maiores contratos se verificará se houve alteração no preço contratual.
É um jogo do rato e do gato. O grupo Global Media, liderado por Marco Galinha, que detém o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias, corrigiu os dados económicos que omitira no Portal da Transparência dos Media, mas continua a esconder dívidas de 10 milhões de euros ao Estado. Mas os novos indicadores mostram que a situação financeira é mesmo extremamente frágil. A “confissão” (parcial) da Global Media junta-se à da Trust in News, que acabou por assumir, depois de uma investigação do PÁGINA UM, que deve mesmo 11,4 milhões de euros ao Fisco. Nada que apoquente o dono da Visão e de outros 16 títulos da imprensa nacional: o empresário Luís Delgado (que só empatou 10 mil euros na Trust in News) está, neste momento, na Ucrânia a convite de Marcelo Rebelo de Sousa. Uma liberalidade presidencial justificada, certamente, pelos bons serviços.
É mais uma prova da falta de vigilância e fiscalização preventiva da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC): nas últimas duas semanas, a Global Media é o segundo grupo de media, depois da Trust in News – dona da Visão e de mais 16 títulos –, a corrigir dados económicos no Portal da Transparência dos Media. Porém, o grupo liderado por Marco Galinha – que detém o Jornal de Notícias, Diário de Notícias e outros órgãos de comunicação social, incluindo a rádio TSF – continua a querer esconder a existência de uma colossal dívida de 10 milhões de euros ao Estado, perante o cúmplice silêncio de Fernando Medina, ministro das Finanças, que se mantém em silêncio sem explicar a base legal para esta situação.
Pela consulta ao Portal da Transparência dos Media, feita hoje pelo PÁGINA UM, mostra-se evidente que houve acrescentos relevantes. A Global Media assume agora, perante a ERC, que 21,15% do seu passivo é detido pela empresa Páginas Civilizadas – uma das suas sócias. Em termos absolutos, esse passivo representa um montante de 11,6 milhões de euros de dívidas da empresa aos seus sócios. Como a parte dos empréstimos dos sócios no passivo total atingia, no final de 2022, um montante de 14,7 milhões, significa que 3,1 milhões de euros é relativo a sócios não identificados. Como o Portal da Transparência apenas exige que sejam identificados os detentores do passivo acima de 10%, a Global Media está isenta de fazer essa declaração.
Marco Galinha, líder da Global Media, continua sem assumir dívida ao Estado, bem patente no balanço, mas novos dados indicados ao regulador mostram uma muito débil situação económica e financeira.
Mas como o grupo de Marco Galinha não corrigiu ainda as declarações de 2021 – que, claramente não correspondem à verdade, se confrontados com as demonstrações financeiras desse ano – continua-se sem saber quais dos sócios teve direito a uma devolução de empréstimo da ordem dos 7 milhões de euros. Recorde-se que, como revelou o PÁGINA UM no dia 4 do presente mês, a Global Media aumentou no ano passado a dívida ao Estado em mais de 7,1 milhões de euros face a 2021, desviando esse dinheiro, que se deveria destinar aos cofres públicos, para reembolsar empréstimos aos seus sócios, entre os quais se encontra o empresário Marco Galinha.
De acordo com a análise à evolução financeira deste grupo de media – que estará, entretanto, a tentar vender as participações de 45,7% da Agência Lusa, detida maioritariamente (50,4% pelo Estado) –, a dívida estatal aumentou de 2.905.183 euros em 2021 para 10.038.481 euros no ano passado. Em anos anteriores, entre 2017 e 2021, o montante das dívidas ao Estado situava-se entre os 2,9 milhões e os 3,6 milhões de euros.
Ora, e é exactamente o montante de 10.038.481 euros de dívidas ao Estado inscrito do passivo de balanço de 2022 – que deverão ser inteiramente fiscais – que continuam sem ser reconhecidas pela Global Media, mantendo-se ausente no Portal da Transparência dos Media. Como o passivo total do grupo atingia, no final do ano passado, os 54.529.482 euros, as dívidas ao Estado atingirão 18,29% do total, ou seja, claramente acima dos 10%. Por isso, se forem apenas dívidas à Autoridade Tributária e Aduaneira – ou se o montante especificamente a esta entidade for superior a 5,5 milhões de euros –, a Global Media continua a omitir um facto relevante.
Declarações da Global Media no Portal da Transparência dos Media relativas ao ano de 2022 no início deste mês (à esquerda), antes das revelações do PÁGINA UM, e hoje (à direita).
Além do empréstimo à Páginas Civilizadas, a Global Media inscreveu agora também no Portal da Transparência uma dívida à Naveprinter que atingiria no ano passado os 7,1 milhões de euros, correspondentes a 12,99% do passivo. Esta empresa é a gráfica que imprime o Jornal de Notícias, Diário de Notícias, O Jogo, Vida Económica, Correio do Minho e outros títulos de âmbito regional – e, na verdade, é detida pela própria Global Media. Esta nova informação reforça ainda mais a ideia de elevada debilidade financeira do grupo de Marco Galinha, porque em contas consolidadas o activo reduz-se ainda mais.
De facto, os activos da Global Media estão a ser “suportados” por uma dúvida ao Estado de 10 milhões de euros, por empréstimos de sócios de 14,7 milhões e por uma dívida a uma gráfica do grupo de 7,1 milhões de euros. Ora, isso representa um pouco mais de metade dos 60,5 milhões de euros de activo do grupo, dos quais 30 milhões são goodwill – que não é, propriamente, em empresas de media, um activo contabilizado a preço justo.
Tanto sobre este caso da Global Media como sobre a situação similar da Trust in News – que, após as revelações do PÁGINA UM, acabou por assumir as dívidas fiscais no Portal da Transparência no valor de 11,4 milhões de euros –, a ERC disse ontem ao PÁGINA UM que, “anualmente, procede à verificação da informação comunicada em cumprimento do regime jurídico da transparência”, mas que “por motivos operativos, esta verificação é iniciada findos os prazos legais para a transmissão dos fluxos financeiros anuais, a 30 de junho, e numa base de amostragem.”
Luís Delgado assumiu que a sua empresa de 10 mil euros de capital social tem uma dívida ao Fisco de 11,4 milhões de euros. Semanas depois recebeu um convite de Marcelo Rebelo de Sousa para acompanhar a restrita comitiva presidencial à Ucrânia como empresário dos media de sucesso.
O regulador acrescenta ainda “que a inserção da informação correta e fidedigna é da responsabilidade de cada regulado e a ausência ou incorreção na comunicação são passíveis de responsabilidade contraordenacional”, pelo que “todos os casos desconformes detetados pela ERC são naturalmente objeto de averiguação, respeitando os procedimentos legais”. Ou seja, embora não revele taxativamente, deverá já estar a decorrer processos de contra-ordenação por falsas declarações dos grupos de Marco Galinha e de Luís Delgado.
Nada, porém, que previsivelmente modifique o status quo de impunidade dos media mainstream em Portugal. Por exemplo, Luís Delgado – o empresário que com um capital social de 10 mil euros consegue serenamente atingir 11,4 milhões de euros de dívida fiscal – até integra a restrita comitiva presidencial à Ucrânia, a convite pessoal de Marcelo Rebelo de Sousa. Uma liberalidade presidencial certamente com justificação.
número de contratos públicos acima dos 100.000 euros
1 – [1] Medtronic Portugal – 61
2 – [2] Laboratório Pfizer – 45
2 – [2] Sanofi – 45
4 – [4] Johnson & Johnson – 39
5 – [5] Novartis Farma – 36
6 – [6] Roche – 35
7 – [7] Gilead Sciences – 34
8 – [8] Roche Sistemas de Diagnósticos – 28
9 – [9] Abbott Laboratórios – 27
10 – [10] Takeda – 25
11 – [11] Werfen Portugal – 24
12 – [12] Abbott Medical – 23
12 – [12] Biogen Portugal – 23
12 – [12] Siemens Healthcare – 23
15 – [15] Janssen-Cilag – 21
16 – [16] Cepheid Iberia – 20
17 – [17] Abbvie – 19
18 – [18] Octapharma – 18
18 – [18] Alexion Pharma – 18
20 – [20] Vertex Pharmaceuticals – 17
N.D. Este ranking do PÁGINA UM é elaborado a partir dos dados do Portal Base, seleccionando-se exclusivamente os contratos públicos por ajuste directo (regime geral) a partir do preço contratual de 100.000 euros, tendo como referência a data de publicação (e não a data da celebração do contrato). O número entre parêntesis rectos refere-se à classificação do mês anterior. Saliente-se que a identificação das entidades é confirmada com o número de identificação de pessoa colectiva (NIPC), uma vez que as denominações das entidades públicas (adjudicantes) e das empresas privadas (adjudicatárias, que raramente são entidades públicas) usadas no Portal Base nem sempre são escritas da mesma forma, o que pode suscitar alguma confusão. Somente no ranking dos 25 maiores contratos se verificará se houve alteração no preço contratual.
Não se sabe quantas garrafas foram ou serão necessárias abrir, e quanto vinho será entornado, mas certo é que a Comunidade Intermunicipal do Douro não teve problemas em despachar a compra de 316 mil euros a uma empresa unipessoal da região para o fornecimento de dezenas de milhar de copos para promover a região. Um dos dois contratos define o número preciso de copos de duas qualidades, de dois estilos: 66 mil. Os copos de melhor qualidade custam por unidade, no mercado, mais de sete euros. Mas estes são apenas dois dos 42 contratos já assinados pelos autarcas do Douro para promover os vinhos desta região, que envolvem mais de 2,6 milhões de euros. Mas é pouco provável que haja escândalo na imprensa mainstream por causa disto: CMTV, SIC e TVI estão entre os beneficiários destes contratos públicos.
Foi tudo para copos. E nem sequer estamos a falar no custo do vinho. A Comunidade Intermunicipal do Douro (CIMDOURO) – uma associação de 19 municípios criada em 2009, e abrangida pelo direito público – já gastou quase 316 mil euros na aquisição de copos para eventos da Cidade Europeia do Vinho. O mais recente contrato, colocado hoje no Portal Base, foi assinado em Julho, havendo um outro em Abril.
O Douro foi escolhido no ano passado pela Rede Europeia das Cidades do Vinho (RECEVIN) – derrotando as candidaturas, também lusitanas, do Algarve e Vale do Lima –, e as iniciativas começaram há sete meses, prevendo-se o culminar das festividades em 13 de Janeiro do próximo ano.
Do primeiro contrato dos copos não existem muitas referências, apenas constando que incide sobre “aquisição de bens/serviço para a “MERCHANDISING – COPOS DE VINHO – DOURO CIDADE EUROPEIA DO VINHO 2023” (sic). O valor do contrato, entregue à empresa unipessoal Amadeu Araújo por consulta prévia – embora o Portal Base não identifique as outras empresas convidadas – foi de 85.755,60 euros, IVA incluído, estando omitida a quantidade ou qualidade dos copos.
Porém, no caso do segundo contrato existem já referências muito concretas. De acordo com esse contrato assinado em Julho, e hoje publicado no Portal Base, a associação municipal decidiu contratar também a empresa unipessoal Amadeu Araújo para fornecer no prazo de 100 dias, um total de 36 mil copos de acrílicos em tritan – cujo preço de mercado, em pequena quantidade, ronda os 5 euros – e mais 30 mil copos do tipo Riedel Degustazione Red Wine, que, também em pequenas quantidades pode atingir um preço unitário acima dos 7 euros. Há garrafas de vinho do Douro, de qualidade já bastante razoável, que custam isso ou pouco mais.
Este contrato é o mais oneroso de todos os 43 contratos públicos detectados pelo PÁGINA UM já estabelecidos este ano pela CIMDOURO, liderada por Carlos Silva Santiago, presidente social-democrata da autarquia de Sernancelhe, para eventos no âmbito da Cidade Europeia do Vinho, em diversas localidades da região duriense. No total, a conta vai nos 2.146.829 euros sobretudo em acções de promoção e festividades, que incluem pagamentos de concertos a artistas (Pedro Abrunhosa, Ana Bacalhau, Miguel Araújo e António Zambujo) e contratos com estações de televisão. Sem IVA. Com IVA a conta segue acima dos 2,6 milhões de euros.
Carlos Silva Santiago, presidente da autarquia de Sernancelhe e da Comunidade Intermunicipal do Douro, de copo na mão, durante a gala de abertura da Cidade Europeia do Vinho em Fevereiro.
Apesar da decisão de entregar a organização da Cidade Europeia do Vinho para 2022 ter sido decidida em Bruxelas em Junho do ano passado, apenas um dos 42 contratos já assinados pela CIMDOURO foi por concurso público, curiosamente o da aquisição dos 66 mil copos. Porém, foi um concurso público muito sui generis, porque o anúncio foi publicado em 12 de Junho deste ano e somente havia seis dias para apresentação de propostas. Resultado: só houve um concorrente, a Amadeu Araújo Unipessoal.
Esta empresa de Amadeu Araújo tem sede fiscal em Santa Marta de Penaguião, mas o seu proprietário exerce actividade em toda a região duriense, com 19 contratos públicos no valor total de quase 475 mil euros, grande parte dos quais a autarquia e entidades públicas de Peso da Régua, entre as quais a Santa Casa da Misericórdia. Segundo pesquisa do PÁGINA UM, Amadeu Araújo é suplente do Conselho Fiscal dessa Santa Casa, além de ser vogal da Associação Comercial e Industrial dos Concelhos do Peso da Régua, Santa Marta de Penaguião e Mesão Frio (ACIR). Também foi entre 2013 e 2016 vogal da A2000 – uma associação de desenvolvimento local de direito público –, com quem a sua empresa estabeleceu dois contratos.
Além dos 316 mil euros em copos, a CIMDOURO não teve grandes problemas em gastar mais de 183 mil euros (IVAS incluídos) em divulgação do eventos em caixas multibanco, em dois contratos por ajuste directo com a MOL 2. A sociedade Quinta da Pacheca, em Lamego, que possui também um hotel, também não se deu mal: em dois contratos de catering para dois eventos amealhou quase 98 mil euros.
Também os principais órgãos de comunicação social participaram na festa – e na distribuição de dinheiros públicos. Excluindo IVA, a Cofina recebeu 40.000 euros pela transmissão televisiva pela CMTV da gala de abertura da Cidade Europeia do Vinho no passado dia 4 de Fevereiro.
Em contrato assinado em 3 de Maio, a SIC assinou um contrato de 61.483 euros para promoção, sem que seja estipulado de que género, tanto mais que o caderno de encargos não se encontra no Portal Base. O contrato foi assinado após consulta prévia, tendo a TVI como perdedora, mas a televisão da Media Capital não ficou a chuchar no dedo, porque em janeiro assinara um outro contrato similar, embora num valor mais reduzido: 34.224 euros.
Por sua vez, a Porto Canal, através da sociedade Avenida dos Aliados, presidente por Jorge Nuno Pinto da Costa, amealhou verbas para promover a Cidade Europeia do Vinho, encaixando 41.600 euros. O jornal regional Viva Douro recebeu 19.750 euros para os mesmos efeitos.
Apesar de o contrato dos copos ser, até agora, o mais dispendioso, a análise dos contratos feita pelo PÁGINA UM mostram que o evento da gala de abertura, realizada em Lamego, teve também um custo elevado, rondando os 280 mil euros.
Este montante inclui, além dos custos de transmissão televisão e de produção, os cachets de Ana Bacalhau e Pedro Abrunhosa (19.040 euros, no conjunto), Miguel Araújo (12.500 euros), António Zambujo (10.350 euros) e Ópera da Academia e da Cidade (10.000 euros).
Lista dos contratos assinados pela Comunidade Intermunicipal do Douro no âmbito da Cidade Europeia do Vinho (excluindo IVA)
1 – Aquisição de copos – Merchandising – Cidade Europeia do Vinho (Concurso público) – Amadeu Araújo Unipessoal – 187.140 euros
2 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Outdoors Autoestradas (Consulta prévia) – Dreammedia Portugal – 74.996 euros
3 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aluguer de estrutura móvel para eventos (Consulta prévia) – Multitendas – 74.750 euros
4 – Douro Wine RoadShow – Aquisição de atrelado caixa fechada expansível – Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – Raceland – 74.643 euros
5 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Redes de multibanco (Ajuste Directo Regime Geral) – MOL 2- Multimédia Outdoor Online – 74.550 euros
6 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Redes de multibanco – Fase II (Ajuste directo regime geral) – MOL 2 – Multimédia Outdoor Online – 74.532,45 euros
7 – Merchandising – T-Shirt Oficial – Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – Primine – 74.000 euros
8 – Estrutura, som e audiovisuais da gala de abertura da Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – Fun Addict – 72.500 euros
9 – Gestão e coordenação – Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – Plataforma Coerente – 72.500 euros
10 – Merchandising – Copos de vinho – Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – Amadeu Araújo Unipessoal – 69.720 euros
11 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Serviços de catering comemorativo Cidade Europeia do Vinho – I (Consulta prévia) – Quinta da Pacheca – 65.467 euros
12 – Promoção da Cidade Europeia do Vinho 2023 – Rádios nacionais (Consulta prévia) – Intervoz Publicidade – 65.000 euros
13 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Televisão generalista (Consulta prévia) – SIC-Sociedade Independente de Comunicação – 61.482,78 euros
14 – Produção de conteúdos digitais da Cidade Europeia do Vinho 2023 – Fotografia e Vídeo (Consulta prévia) – I Love Douro – 59.800 euros
15 – Produção do espectáculo da gala de abertura da Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta prévia) – PLW – Artes do Espetáculo e Turismo – 56.500 euros
16 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aquisição de serviços de pirotecnia (Consulta prévia) – Pirotecnia Minhota – 55.000 euros
17 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aluguer de material para eventos – Mesas e cadeiras (Consulta prévia) – Jet Stand – 54.820 euros
18 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aluguer de bancadas para eventos (Consulta prévia) – Hélio Coelho – Organização de Eventos – 47.717 euros
19 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Televisão por cabo (Consulta Prévia) – Avenida dos Aliados – 41.600 euros
20 – Transmissão televisiva da gala de abertura Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 (Consulta Prévia) – Cofina Media – 40.000 euros
21 – Promoção do evento Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 – Desenvolvimento de uma campanha promocional televisiva (Consulta prévia) – TVI – Televisão Independente – 35.224 euros
22 – Execução da Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Peacock Smartbusiness Services – 19.950 euros
23 – Aquisição de serviços de promoção da Cidade Europeia do Vinho 2023 – Jornal regional Viva Douro (Ajuste directo regime geral) – Vivacidade Sociedade de Comunicação Social – 19.750 euros
24 – Concerto de Música – Ana Bacalhau e Pedro Abrunhosa – Gala de abertura Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Sons em Trânsito Espectáculos Culturais – 19.040 euros
25 – Aquisição de serviços para desenvolvimento de branding e APP – Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Twoplay – 19.000 euros
26 – Aquisição de merchandising – Brindes para Passeio Mota Douro – Douro Cidade Europeia do Vinho 2023 (Ajuste directo regime geral) – Álvaro Augusto Ramos Fonseca – Pulibrindes – 18.176,4 euros
27 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aquisição de serviços de aluguer de som e luz (Ajuste directo regime geral) – Braga Eventos – 17.635 euros
28 – Douro Wine RoadShow – Exposição Douro – Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Fundação Museu do Douro – 17.500 euros
29 – Promoção do evento – Pórticos – Cidade Europeia do Vinho 2023 (Ajuste directo regime geral) – Factory Play – 16.355 euros
30 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Serviço de aluguer de barco – Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Tomaz Douro – Empreendimentos Turísticos – 15.305,28 euros
31 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Serviços de catering comemorativo Cidade Europeia do Vinho – II (Ajuste directo regime geral) – Quinta da Pacheca – 14.000 euros
32 – Organização, coordenação e execução – DCEV – Aquisição de serviços de segurança privada (Ajuste directo regime geral) – 3XL Segurança Privada – 13.704 euros
33 – Douro Wine RoadShow – Aluguer de viatura/carrinha curta e média duração – Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Vitoria & Pereira Rent-a-Car – 13.200 euros
34 – Concerto de música – Miguel Araújo – Gala de abertura Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Primeira Linha – 12.500 euros
35 – Douro Wine RoadShow – Cidade Europeia do Vinho 2023 – Alojamento e viagens – National Geographic Food Festival (Ajuste directo regime geral) – Realvitur Viagens e Turismo – 11.616,6 euros
36 – Douro Wine RoadShow – Cidade Europeia do Vinho – Chefs de cozinha – National Geographic Food Festival (Ajuste directo regime geral) – António Luís Gomes Gonçalves – 11.500 euros
37 – Conceção e aquisição de materiais gráficos Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Hermínio Manuel Lopes – 11.265 euros
38 – Concerto de música – António Zambujo – Gala de abertura Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Brain Entertainment – 10.350 euros
39 – Concerto de música – Orquestra – Gala de abertura Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Ópera da Academia e da Cidade – Associação Cultural – 10.000 euros
40 – Douro Wine RoadShow – Cidade Europeia do Vinho 2023 – Transporte de stand e bens alimentares regionais – National Geographic Food Festival (Ajuste directo regime geral) – Totalplan – 9.500 euros
41 – Douro Wine RoadShow – Aquisição de tenda – Cidade Europeia do Vinho (Ajuste directo regime geral) – Factory Play – 9.160 euros
42 – Palco, luz e som para o Encontro de Cantadores de Janeiras no âmbito da Cidade Europeia do Vinho 2023 (Ajuste directo regime geral) – Simbólico Aplauso – 5.540 euros
No mundo da política e da comunicação, LPM e Luís Paixão Martins são sinónimos, mesmo se formalmente este consultor já abandonou a chefia de uma das mais influentes empresas do sector, muito por força da sua ligação ao Partido Socialista. Mas embora a presença de LPM continue perene nos meandros governamentais, sendo exemplo a ligação com a Presidência do Conselho de Ministros, os contratos públicos reforçam sobretudo o portfolio, até porque a sua facturação é quase toda do mundo privado. O seu mais recente trunfo é a definição e implementação da estratégia de comunicação da todo-poderosa Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde, cujo contrato foi publicado no Portal Base na semana passada. Claro que se as chinese walls funcionarem, nenhum dos 17 clientes da LPM na área da Saúde, entre as quais constam sete farmacêuticas, beneficiarão desta ligação com a nova entidade estatal presidida por Fernando Araújo…
A LPM Comunicação – a empresa fundada por Luís Paixão Martins, consultor de marketing político do Partido Socialista, e há vários anos administrada pelo seu filho João – ganhou o concurso para prestação de serviços de assessoria de imprensa da Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS), enquanto mantém, no seu portfólio de clientes privados, sete farmacêuticas e mais uma dezena de empresas e entidades do sector da saúde, entre as quais um hospital privado, uma empresa de homeopatia, três sociedades médicas, uma empresa e uma associação de empresas de diagnóstico médico, uma fundação e duas instituições não governamentais.
O contrato foi assinado em Maio, mas apenas divulgado na semana passada no Portal Base, e surge no decurso de um concurso público, envolvendo mais duas empresas (Creative Minds e KICAB), para assessorar a equipa de Fernando Araújo a instalar uma estrutura. Na prática, a DE-SNS vai centralizar algumas das funções políticas e administrativas que estavam dispersas pelo próprio Governo e por duas entidades públicas: a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS).
Luís Paixão Martins, fundador da LPM e pai do actual administrador único da empresa que vai gerir a comunicação da Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde. (DR)
No entanto, apesar da ideia da criação da DE-SNS ter saído de um Conselho de Ministros do início de Setembro do ano passado, os alicerces têm estado a avançar a conta-gotas, sem ainda sequer estarem aprovados os estatutos. Por exemplo, a partir de ontem, por Resolução do Conselho de Ministros, a DE-SNS passou a ser a entidade que formalmente passa a designar, por despacho, os membros dos órgãos de gestão de hospitais, centros hospitalares, institutos portugueses de oncologia e unidades locais de saúde.
No entanto, essa função até já ocorria na prática nos últimos meses, desde que Fernando Araújo, antigo administrador do Centro Hospitalar de São João, foi escolhido por Manuel Pizarro, ministro da Saúde. Por exemplo, a antiga bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, Ana Paula Martins, foi já indicada pela DE-SNS para o cargo de presidente do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, que abrange o Hospital de Santa Maria. Recorde-se que Ana Paula Martins era então directora dos assuntos governamentais da farmacêutica Gilead e ocupara, durante alguns meses, o cargo de vice-presidente do PSD no final de mandato de Rui Rio.
As funções de grande sensibilidade política e social previstas para a DE-SNS – para além da gestão, supervisão e monitorização das unidades do SNS, definirá diretrizes, normas e orientações, com implicações nos fornecedores, utentes e empresas privadas – parecem não ter sido consideradas na escolha da empresa de por onde passará a estratégia de comunicação e de assessoria de imprensa.
Fernando Araújo, director executivo do Serviço Nacional de Saúde, à esquerda de Manuel Pizarro, ministro da Saúde.
De acordo com o levantamento do PÁGINA UM, a LPM identifica como seus clientes, apenas no sector da Saúde, sete farmacêuticas – AbbVie, Bluepharma, Daiichi-Sankyo, Gedeon Richter, GlaxoSmithKline, Novartis e Viatris –, uma empresa de homeopatia (Boiron), duas entidades na área do diagnóstico – a empresa Hologic e a Associação Portuguesa das Empresas de Diagnósticos Médicos (Apormed) –, uma empresa hospitalar privada (Lusíadas), uma fundação associada a uma farmacêutica (Fundação Bial), duas organizações não-governamentais sem fins lucrativos (Liga Portuguesa contra o Cancro e a União das Associações das Doenças Raras de Portugal) e ainda três sociedades médicas (Sociedade Portuguesa de Senologia, Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia e Sociedade Portuguesa de Cardiologia). Esta última sociedade médica é aquela que mais financiamento obtém do sector farmacêutico desde 2017, enquanto a penúltima se encontra no top 10.
Contudo, apesar disso, nos critérios de avaliação das candidaturas, cujo processo acabou por ser instruído pelos SPMS, não houve qualquer critério de índole ético que pudesse excluir candidatos que tivessem conflitos de interesse por deterem relações comerciais com entidades privadas do sector da saúde ou com alguma que estivesse sob a supervisão directa ou indirecta da DE-SNS.
Lista dos 17 clientes do sector da Saúde detidos pela LPM. Falta a actualização para incluir a Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde.
Pelo contrário. Além do preço (com um peso de 30%), a “experiência na Área da Assessoria de Imprensa no Setor da Saúde” era um dos critérios explícitos de avaliação qualitativa das propostas, com um peso de 35%.
Ou seja, não houve qualquer cláusula que obrigasse a uma exclusividade, para garantir independência e evitar transmissão de informação privilegiada entre a DE-SNS e clientes da empresa de comunicação vencedora.
Deste modo, a LPM até acabou fortemente beneficiada por possuir contas de 17 clientes na área da Saúde, incluindo as sete farmacêuticas e até um hospital privado.
Em todo o caso, este “problema” seria similar se a escolhida fosse a Creative Minds, que no seu site expõe os seus 28 clientes no sector da Saúde, embora sem incluir tantas empresas de grande dimensão. Com efeito, no meio de pequenas e médias empresas, destaca-se apenas, no sector farmacêutico, a portuguesa Medinfar.
Pelo caminho, neste concurso, ficou a Kicab, a empresa pertencente a Rui Neves Moreira, que foi assessor de imprensa no Hospital de São João, tendo sido escolhido por Fernando Araújo para o assessorar nas primeiras fases de instalação da DE-SNS. Esse contrato, com a duração formal de 9.000 euros por apenas 25 dias de trabalho, levantou celeuma no início deste ano, por envolver um custo de 360 euros por dia.
Saliente-se, contudo, que no contrato agora em vigor com a LPM, o valor nem é elevado para os padrões do mercado. O preço do contrato – 22.380 euros (sem IVA), perfazendo cerca de 2.800 euros por mês, durante os oito meses de duração – até ficou ligeiramente abaixo do preço base, que era de 23.600 euros, o que denota o interesse na aquisição deste cliente público. Na verdade, por exemplo, comparando o montante deste contrato com o volume de negócios da LPM em 2021 – as contas relativas ao ano passado ainda não se encontram disponíveis –, estamos perante uma gota de água.
Com efeito, embora conhecida por ser uma empresa de comunicação próxima do poder, o Estado e a Administração Central e Local nem são assim tão bons clientes em termos de facturação. Em 2021, as receitas da LPM totalizaram 5.976.574 euros, e os seis contratos públicos nesse período (Região de Turismo do Algarve, Direcção-Geral do Património Cultural, Fundação para a Ciência e a Tecnologia, Comissão para a Cidadania e Igualdade do Género e Câmara Municipal de Almada, com dois) ascenderam aos 153.770 euros. Ou seja, o sector privado representou 97,4% da facturação da LPM.
Porém, no mundo da comunicação empresarial, ter uma porta de passagem para o poder mostra-se fundamental. E assim, mais importante do que uma verba num contrato público, ostentar na carteira um organismo estatal com o quilate da DE-SNS vale ouro.
Mesmo quando existe em contrato uma “cláusula de direitos sobre a informação”, que estipula que a LPM não pode usar nem ceder a terceiros a informação da DE-SNS sem autorização prévia. E mesmo que as empresas de comunicação jurem, a pés juntos, que usam (ou colocam em práticas) as chinese walls, quase sempre mais míticas do que verídicas.
Faltavam poucos dias para a prescrição do processo disciplinar a Filipe Froes, iniciado em Fevereiro do ano passado, mas para evitar eventuais acusações de “denegação de justiça”, a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde decidiu arquivá-lo esta semana, alegadamente por falta de provas, embora tudo esteja ainda no segredo dos deuses. O pneumologista diz que foi dado “um passo muito significativo na inexistência de qualquer dúvida sobre a fundamentação e isenção científica das minhas intervenções na comunicação social”. E o PÁGINA UM recorda algumas das polémicas acções de marketing do conhecido pneumologista, e lista todos os 324 eventos pagos por 24 farmacêuticas, que lhe permitiram levar para casa 453.635 euros para além do salário em regime de exclusividade como médico no Hospital Pulido Valente.
Era o desfecho esperado. A Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) terá arquivado, no início desta semana, o processo disciplinar contra o pneumologista Filipe Froes, que fora iniciado em 19 de Fevereiro do ano passado. A decisão – de cujos fundamentos nada se conhece – ocorreu a escassos dias da prescrição do processo disciplinar que, durante quase 18 meses esteve em “banho-maria”. Caso não tivesse sido arquivado, o processo iria prescrever hoje, como o PÁGINA UM já revelara em Julho passado.
Apesar das tentativas do PÁGINA UM junto do Tribunal Administrativo de Lisboa para aceder à informação inspectiva que levou à instauração deste processo –, apenas se sabe que em causa estavam as relações comerciais deste conhecido pneumologista, como médico do Serviço Nacional de Saúde, com diversas farmacêuticas, ignorando-se se aquilo que estaria em causa se circunscrevia a incompatibilidades decorrentes do volume de negócios ou se se estaria a investigar faltas injustificadas no hospital para acudir a eventos pagos pelas empresas.
Filipe Froes, pneumologista do Hospital Pulido Valente, consultor da DGS, consultor de farmacêuticas e influencer sanitário.
Ignora-se também se o arquivamento do processo se deveu efectivamente à conclusão, em fase de instrução, de que Froes não cometeu qualquer infracção ou se se constatou a impossibilidade de finalizar o processo disciplinar antes do dia de hoje, por perfazerem 18 meses e advir daí uma prescrição automática. Note-se que se a IGAS tivesse deixado simplesmente o processo prescrever em claro benefício de Filipe Froes (protegido pelo Ministério da Saúde) poderia vir a ser acusado de denegação de justiça, punida pelo Código Penal.
Em todo o caso, com o arquivamento do processo na IGAS, deixam agora de existir quaisquer desculpas ou impedimentos legais para a consulta de todos os documentos, estando o PÁGINA UM a aguardar um recurso do Tribunal Central Administrativo Sul sobre esta matéria. Também já foi solicitado, novamente, no final desta semana, a consulta à IGAS, que ainda não respondeu.
O alegado arquivamento “por não haver indícios de infração disciplinar imputável ao visado” foi já celebrado pelo próprio Filipe Froes. Numa mensagem na rede social Facebook, na passada quarta-feira, o pneumologista diz ter ficado “muito satisfeito porque foi dado um passo muito significativo na inexistência de qualquer dúvida sobre a fundamentação e a isenção científica das minhas intervenções na comunicação social, bem como da intervenção de todas as outras pessoas que defenderam e promoveram a ciência.” Froes acrescentou ainda que “o mais importante, na minha perspetiva, é o reconhecimento do valor da ciência e do conhecimento científico no combate à pandemia e na mitigação das suas consequências tão nefastas, que só em Portugal foi responsável pelo falecimento de cerca de 27 mil pessoas.”
Carlos Carapeto, inspector-geral das Actividades em Saúde: quase dois anos após o início das investigações a Filipe Froes, e de um jogo do rato e do gato a esconder as diligências tomadas desde Setembro de 2021, o processo disciplinar é arquivado em vésperas de prescrição.
Sem prejuízo de nunca terem estado em avaliação, no processo da IGAS, o rigor científico de Flipe Froes, por não ser matéria susceptível de análise por aquela entidade, convém, contudo, recordar que o pneumologista, mesmo sendo um dos membros da equipa nomeada pela Direcção-Geral da Saúde para definir as terapêuticas contra a covid-19, não se imiscuiu de promover explicitamente medicamentos de farmacêuticas com que colaborava.
Exemplo disso ocorreu com a Gilead. Enquanto, como consultor da DGS, Froes conseguiu introduzir nas terapêuticas anti-covid o remdesivir, um polémico fármaco da Gilead comprado pela Comissão Europeia num negócio nebuloso, ocupava também o seu tempo a ser consultor da empresa norte-americana exactamente para este fármaco. Recorde-se que, de acordo com dados da Agência Europeia do Medicamento, o uso de remdesivir está associado a mais de 900 mortes na Europa.
Além da promoção das vacinas das diferentes marcas, às quais tem ligações sólidas, Froes também promoveu antivirais, como o Lagevrio (Merck Sharpe & Dohme) e anticorpos monoclonais, como o Evusheld (AstraZeneca). No caso do primeiro medicamento, o pneumologista – que, desde 2013, recebeu oficialmente 119.291 euros da Merck Sharpe & Dohme – considerou em declarações ao jornal Nascer do Sol, em Novembro de 2021, que seria “sem dúvida, (…) um game-changer”, que complementaria, garantindo que “a mais-valia é ser um medicamento que reduz a carga viral e reduz em 50% a gravidade da doença”. E concluía: “ao fim de dois, três dias, a pessoa já não é transmissora, o que diminui a capacidade de circulação do vírus”.
Afinal, este medicamento acabou por ser um fiasco ao nível da eficácia, e foi mesmo retirado do mercado pela própria farmacêutica. Mas sem antes ter arrecadado, a nível mundial, receitas da ordem dos 5,7 mil milhões de dólares só no ano passado, muito graças a influencers como Filipe Froes.
Arquivamento do processo disciplinar em vésperas da prescrição (ao fim de 18 meses) levou Filipe Froes a concluir que “foi dado um passo muito significativo na inexistência de qualquer dúvida sobre a fundamentação e isenção científica das minhas intervenções na comunicação social”.
No caso do medicamento da AstraZeneca – que este ano já entregou 12.425 euros a Froes –, também o pneumologista fez lobby. Chegou mesmo a fazer-se pagar apenas para estar presente no lançamento em Portugal deste fármaco, que teve retirada a sua autorização no mercado norte-americano no início deste ano, conforme revelou em Fevereiro a prestigiada revista científica BMJ.
Mas esta presença de Filipe Froes foi apenas um dos 11 eventos que lhe foram pagos pela AstraZeneca contabilizados só este ano no Portal da Transparência e Publicidade – uma plataforma gerida pelo Infarmed, mas cuja fiscalização é virtualmente inexistente, o que significa que se mostra muito falível para controlar todas as transacções financeiras envolvendo farmacêuticas.
De acordo com um levantamento exaustivo feito pelo PÁGINA UM, Filipe Froes já deu o corpo e seus talentos por 25 vezes este ano ao sector farmacêutico, embora esteja agora quase em dedicação exclusiva à AstraZeneca (11 eventos) e à Merck Sharpe & Dohme (12 eventos). Esta empresa norte-americana mostra, aliás, ser a preferida do pneumologista: desde 2013 já teve relações comerciais – em suma, contratos para prestação de serviços a troco de dinheiro ou géneros – em 83 ocasiões, das quais 46 apenas desde 2021.
A Pfizer, através de duas subsidiárias que operam em Portugal, também é uma das farmacêuticas com mais relações comerciais com Filipe Froes. No total estão contabilizados 69 contratos, embora grande parte tenham ocorrido antes da pandemia. Em todo o caso, 12 foram estabelecidos em 2021.
Também com relevo são as 40 relações comerciais tanto com a Sanofi como com a AstraZeneca, e ainda as 26 com a portuguesa BIAL e as 16 com a americana Gilead. Em todo o caso, Filipe Froes mostra não ser esquisito na hora de colaborar com as farmacêuticas que lhe batem à porta: desde 2013 já trabalhou para (ou com) 24 farmacêuticas e uma empresa de consultadoria na área da Saúde.
Desde 2020, o ano de início da pandemia da covid-19, Filipe Froes contabiliza 160 eventos pagos por farmacêuticas, enquanto mantinha a sua alegada exclusividade como coordenador da Unidade de Cuidados Intensivos Médico-Cirurgicos Respiratórios do Hospital Pulido Valente (e não como director do Serviço de Cuidados Intensivos, como erradamente a imprensa generalista a ele se refere), como consultor da DGS e ainda, durante algum tempo, líder do Gabinete de Crise da Ordem dos Médicos, instituído pelo ex-bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães.
Montantes recebidos por Flipe Froes pela participação em eventos e prestação de serviços (contratos), por farmacêutica, desde 2013 até 18 de Agosto de 2023. Fonte: Portal da Transparência e Publicidade do Infarmed.
Froes foi, aliás, um dos fiéis “peões de ataque” do Miguel Guimarães contra os médicos que tivessem opiniões contrárias à estratégia seguida pelo Governo no combate à pandemia. Chegou mesmo a encabeçar um grupo de médicos, com Carlos Robalo e Luís Varandas, todos ligados à Pfizer, que apresentaram queixa contra Jorge Amil Dias, presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos, por ter recomendado prudência na vacinação generalizada de jovens saudáveis. O processo seria, mais tarde, arquivado, mas Froes conseguiu, mais uma vez, pelo menos indirectamente, difamar publicamente colegas de profissão e promover um negócio chorudo de uma farmacêutica.
Em termos monetários, e desde 2013, a caixa registadora de Froes – que recebe os proveitos tanto a nível individual como da sua empresa Terras & Froes – já encaixou 453.635 euros, o que significa um “salário” oficial de 3.572 euros. Repita-se, contudo, que o Infarmed não faz uma fiscalização eficaz das transacções, como aliás ficou patente no facto de o patrocínio da farmacêutica BIAL a um livro do pneumologista sobre a covid-19 nunca ter sido registado no Portal da Transparência e Publicidade.
Apesar de um aparente afastamento desde 2021, a Pfizer continua a ser a farmacêutica que mais retribuiu Froes por serviços prestados: 136.074 euros. Segue-se a Merck Sharpe & Dohme, com 119.291 euros, que desde 2020 passou a ser, de longe, a farmacêutica preferida para trabalhar pelo pneumologista.
Filipe Froes é um dos médicos com mais relações comerciais com farmacêuticas, mas os dados só começaram a ser registados em 2013. Mas antes dessa data já ele era presença assídua nos meios de comunicação social, promovendo o uso de fármacos.
Com montantes mais baixos, destacam-se ainda mais três farmacêuticas, que entregaram desde 2013 já montantes entre os 30 mil e os 50 mil euros: Bial (48.717 euros), AstraZeneca (39.908 euros) e Sanofi (38.433 euros). Ainda com montantes oficialmente acima de 10 mil euros encontra-se a Gilead (16.471 euros).
Por ser demasiado enfadonho – até por serem 324 colaborações entre Filipe Froes e as farmacêuticas, que vão desde consultadoria até eventos de marketing, passando por viagens a congressos –, o PÁGINA UM opta por não descrever a tipologia de eventos que estão em causa.
Na verdade, será muito mais didáctico – ou pedagógico – para se aquilatar das promiscuidades deste pneumologista, independentemente dos “empenhos” para lhe colocar uma imagem de isenção quando fala de temas de Saúde, olhar um a um todos os 324 eventos até agora contabilizados, tal e qual, na base de dados do Infarmed. Por isso, o PÁGINA UM decidiu apresentá-los todos, por serem públicos e se mostrar relevante do ponto de vista do interesse público.
LISTA DOS 324 EVENTOS COM FILIPE FROES PAGOS DESDE 2013 POR FARMACÊUTICAS (CONSUBSTANCIADOS EM CONTRATO QUE IMPLICARAM PAGAMENTOS MONETÁRIOS OU EM GÉNEROS)
Contrato nº 97 (2017) Merck Sharp & Dohme [Reunião de Investigadores do ensaio clínico “”MK7655A-014″”, que decorreu em Budapeste (Hungria) de 15 a 17 de Novembro de 2016.] – 954,61 €
Contrato nº 133 (2019) AstraZeneca [Reunião lançamento FASENRA – Bio-“”logic”” New Era, Centro de Congressos Convento S. Francisco – Coimbra] – 176,58 €
Contrato nº 134 (2019) AstraZeneca [Reunião lançamento FASENRA – Bio-“”logic”” New Era, Centro de Congressos Convento S. Francisco – Coimbra] – 176,58 €
Contrato nº 322 (2023) Merck Sharp & Dohme [XXX Congresso de Pneumologia do Norte] – 180 €
Contrato nº 323 (2023) Merck Sharp & Dohme [Reunião Vaxneuvance Porto – Prevenção da Doença Pneumocócica] – 133,1 €
Contrato nº 324 (2023) Merck Sharp & Dohme [14º Congresso de Pneumologia Centro Ibérico 2023] – 123,5 €
N.D. A descrição, entre aspas, é aquela que consta no Portal da Transparência e Publicidade. No caso de empresas subsidiárias de farmacêuticas, optou-se por as agregar e atribuir o apoio (e relação comercial) à empresa-mãe.