O primeiro-ministro Luís Montenegro é detentor desde Agosto de 2023 de uma marca registada de vinhos que se insere num projecto pessoal que deverá passar também pela empresa familiar Spinumviva, actualmente no ‘olho do furacão’ por eventuais conflitos de interesses com as alterações da Lei dos Solos. A Spinumviva, com sede na residência do primeiro-ministro em Espinho, tem a viticultura como segundo CAE (Classificação das Atividades Económicas) secundário, descrito antes mesmo da compra e venda de bens imobiliários (terceiro CAE secundário).
Embora no vasto objecto social da Spinumviva se destaque as actividades de consultadoria e mesmo a mediação de seguros e a possibilidade de gestão de bens imóveis (terrenos e edifícios), há uma outra actividade relevante que tem passado de forma discreta: “exploração de recursos naturais e exploração e produção agrícola, predominantemente vitivinícola”.
Ora, Luís Montenegro é, desde Agosto de 2023, detentor da marca Murus, registada no Instituto Português de Propriedade Industrial, sob a classe 33 da Classificação de Nice, que inclui bebidas alcoólicas, excepto cervejas. No entanto, no registo consultado pelo PÁGINA UM é indicado expressamente que a Murus é uma marca de vinhos.
A Murus – que aparentemente nunca teve uso comercial até agora – foi inicialmente registada em 2008 por Virgínia Montenegro Esteves, antiga funcionária da ARS do Norte e mãe do primeiro-ministro. Houve uma renovação de uso exclusivo da marca em Abril de 2018, o que, em princípio, daria para um período de mais 10 anos. Porém, em 18 de Agosto de 2018, seria feita uma transmissão entre mãe e filho, assim ficando Luís Montenegro como proprietário exclusivo da Murus. O actual primeiro-ministro deu como endereço a sua residência em Espinho, também sede da Spinumviva.
A possibilidade de esta marca de Luís Montenegro vir a ser usada futuramente pela Spinumviva é significativa, uma vez que essa autorização pode ser concedida sem grandes formalismos, mesmo se o primeiro-ministro não é, em termos formais, sócio da empresa que criou e do qual foi sócio maioritário e gerente até finais de Junho de 2022, passando as quotas para os filhos e mulher. No entanto, como está casado em comunhão de adquiridos, a sua ligação à Spinumviva mantém-se por essa via.
Registo da Murus em nome de Luís Montenegro.
O PÁGINA UM não conseguiu ainda obter qualquer esclarecimento de Luís Montenegro sobre os seus projectos vitivinícolas actuais e futuros, sabendo-se, de acordo com uma notícia do Correio da Manhã de Agosto do ano passado, ter declarado ser proprietário de 54 prédios urbanos e rústicos. Neste último grupo estão 46 terrenos em Bragança e três em Resende, que aliás poderão vir a ser valorizados pela alteração da Lei dos Solos, que permite que os prédios rústicos sejam transformados, de forma arbitrária, em áreas urbanizáveis.
O PÁGINA UM ainda não conseguiu consultar os registos do primeiro-ministro na Plataforma Electrónica da Entidade para a Transparência, de modo a saber se aí constam as áreas em concreto e se têm actividade agrícola. No entanto, a entidade que agora acolhe as declarações de rendimentos dos políticos exigiu que o PÁGINA UM fundamentasse as razões do pedido, apesar de se ter anexado cópia da carteira profissional.
Em resposta, o PÁGINA UM forneceu a seguinte justificação, ainda sem resposta: “Se a política fosse transparente por vontade própria, este pedido seria desnecessário. Mas como a transparência política é um conceito mais mitológico do que real, peço acesso à informação porque sou jornalista e a teimosia profissional é uma das minhas virtudes.”
Empresa familiar de Luís Montentegro tem uma descomunal margem operacional para uma consultora.
Saliente-se que o PÁGINA UM revelou em primeira-mão – não sendo citado pela SIC que plagiou a notícia – que a Spinumviva registou uma facturação de 67 mil euros em 2021, de 415 mil euros em 2022, ano em que Luís Montenegro deixou formalmente a empresa familiar, e 235 mil euros em 2023, desconhecendo-se aindas contas do ano passado.
A empresa familiar Montenegro registava no final de 2023 um lucro acumulado de 345 mil euros, não tendo sido revelada a lista de clientes para apurar se houve consultadoria na área imobiliária.
Em apenas dois anos de plena actividade, a Spinumviva – a empresa de consultadoria fundada por Luís Montenegro no início de 2021, agora pertencente à mulher e filhos – facturou 650 mil euros e apresentou lucros de cerca de 345 mil euros. Tudo através de prestação de serviços de consultadoria realizada, ao que tudo indica, maioritariamente pelo actual primeiro-ministro, que não respondeu a um conjunto de questões colocada pelo PÁGINA UM. E foram bem pagas: só em 2022, a novel empresa da família Montenegro, com duas pessoas em funções (uma a tempo inteiro e outras a tempo parcial), facturou 415 mil euros, o que dá uma média de 162 euros por hora de trabalho.
Na análise detalhada do PÁGINA UM às demonstrações financeiras da Spinumviva, da qual o primeiro-ministro renunciou à gerência e às quotas em 2022 a favor da mulher e dos dois filhos, existem sinais de inexistência de qualquer património imobiliário ou terrenos com potencial de valorização – os activos fixos tangíveis cifravam-se apenas em 20.550 euros.
Empresa familiar de Luís Montentegro tem uma descomunal margem operacional para uma consultora.
Apesar de o objecto social integrar a compra, venda e arredamento de bens imobiliários, estas actividades surgem com o terceiro e quarto CAE (Classificação das Atividades Económicas), sendo que o CAE principal da Spinumviva é “outras actividades de consultoria para os negócios e a gestão”. Como primeiro CAE secundário aparecem “Outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares não especificadas” e a seguir ainda se indica a “viticultura” como segundo CAE secundário.
Um dos aspectos mais relevantes da empresa da família Montenegro – que no ano da sua criação, em 2021, apenas facturou 67.850 euros – tem sido a sua elevadíssima margem operacional, ou seja, a percentagem dos resultados operacionais face à facturação. Com efeito, apesar do que o nome possa sugerir – Spinumviva evoca, numa raiz latina, uma conjugação da ideia de espinho (e, por associação, a cidade de Luís Montenegro) com vida –, a ainda breve trajetória da empresa tem sido tudo menos espinhosa, revelando-se um verdadeiro mar de rosas.
Se em empresas de consultadoria, esse rácio se situa entre os 15% e os 35%, podendo chegar aos 40% em empresas altamente especializadas, a Spinumviva começou em 2021 por ter logo uma margem operacional de 35,3%, disparou no ano seguinte para 75,3% – com Luís Montenegro a ser ainda gerente e sócio até Junho – e em 2023 ficou pelos 46,2%. Esse desempenho permitiu à empresa, em apenas três anos, acumular lucros de 345 mil euros, descontados salários e despesas. Como não têm sido distribuídos dividendos, Luís Montenegro – que está casado em comunhão de bens como a sua mulher Carla, gerente e detentora de 70% do capital social –, não está obrigado a declarar esses valores.
As demonstrações financeiras da Spinumviva em três anos – as contas de 2024 somente serão apresentadas nos próximos meses, até Julho – não mostram quem são e foram os seus clientes, sendo certo que não surge qualquer contrato público no Portal Base. Mas esta é uma empresa que ‘vive’ dos eventuais pergaminhos e contactos de Luís Montenegro, uma vez que nem sequer tem um site, e tudo indica que a prestação de serviços, pelo menos na primeira fase, tenha sido suportada pelo actual primeiro-ministro. Com efeito, no ano de maior facturação, a empresa tinha apenas um trabalhador a tempo inteiro e outro a tempo parcial, enquanto em 2023, já sem Luís Montenegro como sócio, apresentava três pessoas a tempo inteiro e uma pessoa a tempo parcial, embora como salários baixos para uma consultora (menos de 1.200 euros por mês).
Sendo uma empresa familiar numa área de consultadoria altamente especializada – pela margem operacional –, nada indica que esse know how venha da mulher e dos dois filhos, que são agora os sócios-gerentes. Carla Montenegro tem formação académica como Educadora de Infância e em Ciências das Educação, o filho Diogo faz 20 anos este mês e o filho mais velho, Hugo, conta 23 anos, e terá terminado há poucos meses a licenciatura em Administração de Empresas na Universidade Católica do Porto, depois de desistir de Direito. O PÁGINA UM não conseguiu apurar mais informações porque não foram respondidas diversas questões pela Spinumviva.
Ontem, na edição do Correio da Manhã, Luís Montenegro afiançou que apenas executou serviços de consultoria “no âmbito da protecção de dados pessoais”, acrescentando que, “por ironia do destino”, a Medialivre, dona daquele jornal, fora “um dos clientes”. Mas ao PÁGINA UM, tanto o gabinete do primeiro-ministro como a gerência da Spinumviva não revelaram quais foram os outros clientes.
Extracto da certidão permanente da Spinumviva consultada pelo PÁGINA UM.
Aliás, mesmo existindo a garantia dada por Luís Montenegro ao Correio da Manhã de não haver necessidade de alteração do objecto social no sentido de eliminar os negócios imobiliários e extinguir o potencial conflito de interesses, na verdade a empresa pode executá-los quer estejam ou não previsto no objecto social. Isto porque o Código das Sociedade Comerciais pemite a realização de actos complementares ou conexos com o seu objecto social, ainda que este não mencione explicitamente essa actividade. Nessa medida, a consultadoria imobiliária pode ser vista como conexa à actividade principal, envolvendo aconselhamento sobre investimentos, avaliação de activos ou planeamento estratégico no sector.
O PÁGINA UM perguntou a Luís Montenegro e à Spinumviva se revelariam todos os clientes e tipo de consultadorias que passassem a realizar, mas, como já referido, não obteve qualquer reacção.
O Chega usufruiu de um ‘regime especial’ concedido pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social: apesar de não ter sequer jornalistas na sua Folha Nacional – o órgão de comunicação social em versão digital e impressa semanalmente –, o regulador permite ilegitimamente que ostente, na sua ficha técnica, um director (Nuno Valente), um director-adjunto (Patrícia Carvalho) e um subdirector (Ricardo Dias Pinto), além de um editor (Bernardo Pessanha). Ou seja, só ‘generais’ sem qualquer ‘soldado’. Assim, não surpreende que, apesar de actualizado diariamente, 97 das últimas 100 notícias, publicadas desde o dia 8 de Fevereiro, sejam ‘takes’ da Agência Lusa e apenas três são de ‘produção própria’, embora sem assinatura.
A Lei da Imprensa, um diploma de 1999 com a sua mais recente alteração de 2015, estabelece explicitamente, na secção da “organização das empresas jornalísticas”, que “nas publicações com mais de cinco jornalistas o director [que tem sempre de existir] pode ser coadjuvado por um ou mais directores-adjuntos ou subdirectores, que o substituem nas suas ausências ou impedimentos”. Ora, a Folha Nacional nem um, quanto mais seis jornalistas para possuir essa estrutura.
André Ventura, líder do Chega.
Aliás, nem o seu director, Nuno Valente – um assessor videógrafo do Grupo Parlamentar do Chega –, não tem carteira profissional ou de equiparado, algo que não é obrigatório no seu caso, uma vez que a Folha Nacional é classificada, no âmbito da Lei da Impresa, um periódico doutrinário, como são os casos do Povo Livre (PSD), Ação Socialista (PS), Esquerda.net (Bloco de Esquerda) e Avante (PCP).
Porém, ao contrário da Folha Nacional, nenhum dos outros órgãos de comunicação social considerados doutrinários por razões ideológicas – que se distinguem dos periódicos informativos por poderem ter um cunho ideológico assumido – têm mais do que o director no topo da sua estrutura, mesmo quando contam com jornalistas acreditados.
Por exemplo, o Avante – o quase centenário jornal do PCP – tem apenas um director, Manuel Rodrigues, que tem o chamado cartão equiparado a jornalista (TE310), – não tem director-adjunto, mesmo se conta, na sua redacção, com quatro jornalistas acreditados: Gustavo Carneiro (apresentado como chefe de redacção), João Chaqueira (apresentado como “chefe adjunto”) e dois redactores, Domingos Mealha e Hugo Janeiro.
Jornal ostenta um director, um director-adjunto e um subdirector, mas não tem jornalistas. Lei da Imprensa não permite, mas ERC fecha os olhos.
Já a Esquerda.net – a publicação online do Bloco de Esquerda – menciona apenas na sua ficha técnica o nome do director, Luís Branco, também jornalista acreditado. Apesar da generalidade das notícias não estarem assinadas, com excepção daquelas da autoria do próprio director, tudo está dentro da legalidade: com menos de seis jornalistas, não há mais nenhum cargo de direcção.
No caso da Ação Socialista, nada também a apontar. Há apenas um director – Porfírio Silva, ex-deputado socialista, sem título passado pela CCPJ, que no seu caso não é necessário – e mais duas pessoas na redacção: André Salgado e Mary Rodrigues, esta última jornalista acreditada.
Quanto ao Povo Livre, semanário do PSD, não surge uma ficha técnica específica no site, mas a edição imprensa ostenta apenas o nome da sua directora, a ex-deputada Emília Santos. Ou seja, sem mais qualquer cargo de direcção.
Contactada para esclarecer a legalidade da situação da Folha Nacional, a ERC – que costuma até fiscalizar a desconformidade dos logotipos, ameaçando com multas –, alega que “nas publicação periódicas de natureza não jornalística não são exigíveis para os cargos de directores-adjuntos e subdirectores o cumprimento dos requisitos”, ou seja, a existência de uma redacção com mais de cinco jornalistas.
Patrícia Carvalho é deputada do Chega e assume-se como directora-adjunta da Folha Nacional. A Lei da Imprensa não petmite.
Contudo, na verdade – e apesar do regulador dos media, liderado agora por Helena Sousa, ser useiro e vezeiro em interpretações jurídicas rocambolescas –, a Lei da Imprensa é muito clara, ao explicitar que “nas publicações [independentemente de serem informativas ou doutrinárias] com mais de cinco jornalistas o director pode ser coadjuvado por um ou mais directores-adjuntos ou subdirectores, que o substituem nas suas ausências ou impedimentos”. E apenas remete para uma outra norma (artigo 19º) para dispensar a audição do conselho de redacção se os dirigentes de um periódico doutrinário mudarem ou indicarem o director e eventuais adjuntos. Convém dizer que a Folha Nacional não tem conselho de redacção, exactamente porque é uma publicação periódica com menos de seis jornalistas.
Além disso, uma empresa ou entidade com uma publicação doutrinária é sempre jornalística se for periódica, como estipula claramente a Lei da Imprensa. Só não será jornalística se se tratar de uma publicação não periódica, classificando-se, nesse caso, a empresa como editorial. A única coisa que distingue as publicações doutrinárias (como a Folha Nacional e as dos outros partidos) das publicações informativas é o conteúdo e abordagem. No grupo das publicações doutrinárias, o objectivo predominante passa pela divulgação de uma ideologia ou credo religioso. Ou seja, podem fazer artigos jornalísticos – como fazem, claramente, o Avante e o Esquerda.net – ou divulgar as notícias da Lusa, como insistentemente faz a Folha Nacional.
O PÁGINA UM consultou dois advogados que destacaram ser “absurda” a interpretação da ERC, que “baralha conceitos” da própria Lei da Imprensa. Isto porque “embora doutrinária a Folha Nacional é uma publicação periódica, logo jornalística, e assim, não tendo mais de cinco jornalistas, não pode ter directores adjuntos”, salienta um dos causídicos. “A classificação das empresas enquanto jornalísticas ou não é conferida pela periodicidade, e não por ‘achismos’”, acrescenta.
Regulador dos media ‘baralha’ conceitos da Lei da Imprensa para ‘legalizar’ Folha Nacional.
Outro dos juristas contactados pelo PÁGINA UM também salienta que, embora publicações doutrinárias possam funcionar sem jornalistas, isso “automaticamente impede-as de ter directores-adjuntos”, uma vez que nunca conseguirão cumprir o requisito do número mínimo de jornalistas para haver ‘ajudantes’ do director”.
O PÁGINA UM insistiu junto da ERC para que fosse indicada em concreto a norma jurídica que permitia a Folha Nacional cumular cargos de direcção editorial, em violação da Lei da Imprensa, mas o regulador não respondeu ainda. O PÁGINA UM também decidiu, ao abrigo do seu direito editorial de obter comentários, colocar questões ao director da Folha Nacional, mas não obteve resposta.
Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, será um dos participantes esta tarde no Flu Summit Portugal, um evento anual da Sanofi de promoção das suas vacinas contra a gripe. O evento realiza-se na sede da Impresa, e conta com médicos, representantes de sociedade médicas, deputados e até Luís Marques Mendes, candidato às Presidenciais que fará um ‘wrap-up’ antes do encerramento. Como anfitrião na abertura estará o CEO da Impresa, Francisco Pedro Balsemão, e a ‘mestre de cerimónias’ é a jornalista Marta Atalaya.
Mesmo não sendo o nome mais sonante desta conferência, a presença de Rui Santos Ivo tem um forte simbolismo: o presidente do Infarmed vai estar presente, e nem é a primeira vez, num evento comercial envolvendo uma farmacêutica e uma empresa de media que não será registado na Plataforma da Transparência e Publicidade do regulador que lidera. E porquê? Porque o presidente do Infarmed tem sistematicamente permitido, à margem da lei, que se oculte um negócio de promiscuidades de milhões de euros que marca, cada vez mais, a influência editorial da chamada Big Pharma nos órgãos de comunicação social portugueses.
Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, participa até em eventos que não cumprem, ‘nas suas barbas’, as regras de transparência impostas pela Lei do Medicamento.
Tal como muitas outas conferência do género na área da saúde, o Flu Summit é sobretudo um encontro de influências, onde, neste caso em particular, a Sanofi reforça a sua posição junto de médicos, decisores políticos e media, funcionando como uma montra estratégica para a empresa francesa consolidar o seu protagonismo na definição das políticas de vacinação em Portugal. Não é por acaso que, na parte final, haverá um ‘networking cocktail’. A ligação a um órgão de comunicação acaba por ser um elo para validar convites ao poder.
Conferências desta natureza são legais, mas têm regras específicas de transparência. São consideradas acções de marketing que obrigariam as farmacêuticas, de acordo com a lei, a divulgar os montantes envolvidos, e sobretudo os pagamentos que são feitos a médicos e aos órgãos de comunicação social. Contudo, apesar de se terem intensificado as relações comerciais nos últimos anos entre grupos de media e farmacêuticas, o Infarmed, através do seu presidente Rui Santos Ivo, tem permitido de forma impune e descarada o incumprimento generalizado da Lei do Medicamento que obriga as empresas farmacêuticas a revelar apoios concedidos a médicos e entidades de qualquer natureza.
O Flu Summit é apenas mais uma das centenas de eventos patrocinados por farmacêuticas que nos últimos anos têm feito entrar valores avultados nos depauperados cofres da Impresa, sem que se saiba ao certo quanto. Serã alguns milhões, certamente, não tanto por cada evento ser milionário mas sim por serem centenas os eventos realizados por ano com a ‘ajuda’ – leia-se, prestação de serviços – de órgãos de comunicação social.
De acordo com o regime jurídico dos medicamentos de uso humano, um decreto-lei de 2006, “o patrocínio, por qualquer entidade abrangida pelo presente decreto-lei, de congressos, simpósios ou quaisquer ações ou eventos de cariz científico ou de divulgação, direta ou indireta, de medicamentos, deve constar da documentação promocional relativa aos mesmos, bem como da documentação dos participantes e dos trabalhos ou relatórios publicados após a realização dessas mesmas ações e eventos, devendo a entidade patrocinadora comunicar previamente ao INFARMED, I.P., o referido patrocínio”.
Mas essa informação, se entregue, não pode ficar escondida. A lei também determina que “qualquer entidade […] que, diretamente ou por interposta pessoa, singular ou coletiva, conceda ou entregue qualquer benefício a toda e qualquer entidade, pessoa singular ou coletiva, de qualquer tipo, natureza ou forma, incluindo profissional de saúde ou qualquer outro trabalhador do Serviço Nacional de Saúde ou de organismos e serviços do Ministério da Saúde, associação, representativa ou não, de doentes, ou empresa, associação ou sociedade médica de cariz científico ou de estudos clínicos, bem como a estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde, independentemente da sua natureza jurídica e serviços e organismos do Ministério da Saúde nos casos admissíveis por lei, fica obrigada à sua comunicação, no prazo de 30 dias a contar da efetivação do benefício, em local apropriado da página eletrónica”. Ou seja, na Plataforma da Transparência e Publicidade.
Contudo, desde 2013 – ano em que se iniciaram os registos –, nunca nenhuma farmacêutica identificou eventos que resultassem em apoios financeiros ou outras prestações de serviços na área do marketing envolvendo o Expresso ou a SIC, os principais órgãos de comunicação social da Impresa. E realizaram-se centenas nos últimos cinco anos, sobretudo desde o início da pandemia, em 2020.
No ano passado, o Expresso também co-organizou o Flu Summit, mas apesar dos registos dos financiamentos a médicos, a Sanofi não quis indicar quanto pagou à Impresa.
Para não se ser exaustivo, só este ano – isto é, em pouco mais de quatro dezenas de dias –, o Expresso publicou conteúdos, alguns resultantes da cobertura de conferências, patrocinados pela Gilead, pela Bial, pela Johnson & Johnson MedTech, pela Novartis e Laboratórios Germano de Sousa, pela Sanofi. Até ao dia de hoje, e apenas desde 1 de Janeiro contabilizam-se 24 conteúdos associados a estas entidades do sector da saúde na secção denominada ‘Projetos Expresso’. Nenhuma destas entidades, apesar da obrigatoriedade legal, inscreveu qualquer um destes eventos na Plataforma da Transparência e Publicidade como patrocínio à Impresa, nem indicando assim os montantes envolvidos.
E se houver dúvidas sobre a existência de patrocínios nestes eventos, o próprio Expresso as retira. No final de cada um dos conteúdos publicados, quer no site quer na edição do Expresso, desde há uns meses, passou a constar a seguinte informação: “Este projeto é apoiado por patrocinadores, sendo todo o conteúdo criado, editado e produzido pelo Expresso (ver Código de Conduta), sem interferência externa.” Este aviso surgiu, em grande medida, para disfarçar problema: a elaboração destes conteúdos comerciais por jornalistas acreditados, algo que também é ilegal, porque se tratam de prestação de serviços para cumprimento de um contrato externo.
A ausência do registo de eventos patrocinados beneficiando a Impresa – e muitas outras empresas de media – não é um esquecimento; é intencional, com o beneplácito do Infarmed. Com efeito, por exemplo, a Sanofi não se esquece de registar os pagamentos que faz a médicos que participam em concreto no dia da realização da Flu Summit.
No ano passado, para duas edições desta conferência, surge na Plataforma apoios financeiros da Sanofi a uma sociedade médica (Pneumologia) e a seis empresas de médicos, entre os quais Filipe Froes (2.502,80 euros) e Carlos Robalo Cordeiro (1.811,79 euros). Convém, no entanto, referir que, no caso da Impresa, os montantes serão muito mais elevados, sendo expectável que, apenas para a Flu Summit, a factura ultrapasse a fasquia da centena de milhar de euros, tendo em conta preços de mercado. Obviamente, este valor é especulativo, mas desnecessariamente: se a Sanofi cumprisse a lei, e o Infarmed a fizesse cumprir, os valores eram publicamente conhecidos.
Há mais de um ano – e perante a promiscuidade entre farmacêuticas e imprensa – que o PÁGINA UM tem pressionado o Infarmed a esclarecer as razões para que se mantenha uma obscuridade absoluta sobre um negócio – promoção de eventos com eventuais outras contrapartidas – que movimentará milhões de euros. E que, além disso, condiciona a linha editorial dos órgãos de comunicação social.
Em Novembro de 2023, Rui Santos Ivo garantia ao PÁGINA UM, nas poucas vezes que se pronunciou sobre esta matéria, que “sempre que existam razões para crer que assim não acontece ou sempre que chega ao nosso conhecimento, por qualquer meio, (inspeção, denúncias ou outras, etc.) que este procedimento não foi cumprido”, desencadearia “um procedimento de responsabilização, incluindo, a responsabilização contraordenacional, nos termos legais aplicáveis”. Mas nada sucedeu.
Com a intencional passividade do Infarmed, a promiscuidade e a falta de transparência entre farmacêuticas e empresas de comunicação social permite até que se realizem debates em horário nobre para falar sobre temas escolhidos a preceito.
E o silêncio tem prevalecido sobre as relações comerciais à margem da lei, envolvendo tanto a Impresa como a Medialivre, a Media Capital, a Global Media, o Público e o Observador. Em alguns casos, como sucedeu no ano passado, num debate na SIC Notícias, em horário nobre, moderado pela jornalista Nelma Serpa Pinto, o tema da longevidade integrava-se, de forma explícita, num projecto financiado pela Novartis e pela Fidelidade.
Sobre a Flu Summit, o PÁGINA UM colocou questões à Sanofi, questionando as razões para não incluir os pagamentos no Portal da Tranparência que tem feito para a organização e cobertura noticiosa deste evento pelo Expresso. Não houve qualquer resposta. A impunidade e à-vontade são absolutas. O Infarmed e Rui Santos Ivo assim o permitem.
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) condenou a TVI e as jornalistas Ana Leal e Cláudia Rosenbusch – ambas a trabalhar agora no canal Now, da Medialivre – por difamação de um antigo gestor bancário do Montepio em Oliveira de Azeméis, na sequência da transmissão de uma reportagem televisiva em Fevereiro de 2020 que lhe imputava a prática de burlas e desvio de dinheiro. O acórdão do tribunal superior, com data de 16 de Junho, manteve a condenação já decretada em primeira e segunda instâncias, embora tenha reduzido a indemnização de 100 mil para 50 mil euros, considerando excessivo o montante inicialmente fixado pelo Tribunal da Relação.
A disputa judicial teve origem numa peça jornalística emitida pela TVI no programa ‘Ana Leal’ da TVI, onde eram apontadas irregularidades financeiras do gestor bancário. A reportagem, da responsabilidade de Cláudia Rosenbusch – e que tinha Ana Leal como coordenadora – destaca que o gestor teria lesado clientes ao apropriar-se indevidamente de verbas. No entanto, tanto o processo disciplinar interno do banco como a investigação criminal subsequente foram arquivados, não tendo sido provada qualquer ilicitude por parte do autor, se bem que, de acordo com Cláudia Rosenbusch, parte das questões mais graves teriam beneficiado de prescrição. Convém referir, contudo, que o processo criminal sobre a acção do gestor foi arquivado em 2022, ou seja, dois anos após a reportagem da TVI.
Reportagem da TVI de 12 de Fevereiro de 2020 revelava pormenores, com testemunhos, de uma alegada gestão danosa no Montepio de Oliveira de Azeméis.
Curiosamente, esta condenação das duas jornalistas diz respeito apenas à acção cível – ou seja, que se debruça sobre indemnizações –, e não à acção criminal que, segundo Cláudia Rosenbusch, nem sequer chegou à barra do tribunal, tendo sido arquivado. Apesar da pouco lógica desta dualidade – ainda mais no caso do jornalismo, uma actividade constitucionalmente protegida –, em Portugal é possível haver uma absolvição ou arquivamento num processo criminal, mas posteriormente ser condenado numa acção cível com a aplicação de indemnização.
Enquanto no processo criminal a condenação exige prova para além de qualquer dúvida razoável, no cível basta que haja uma maior probabilidade de culpa. Além disso, no crime, o arguido pode optar pelo silêncio, sem que isso o prejudique, enquanto no cível a falta de resposta pode jogar contra si. Assim, mesmo que um tribunal penal não encontre provas suficientes para condenação, um tribunal cível pode determinar que houve responsabilidade e impor o pagamento de uma indemnização.
No caso concreto, no processo criminal não ficou provado que Ana Leal e Cláudia Rosenbusch tenham cometido qualquer crime de difamação, mas na acção cível o gestor bancário conseguiu sustentar que a reportagem da TVI o expôs publicamente como criminoso sem que tivesse sido realizada uma verificação rigorosa dos factos. E que a afectação do seu direito ao bom nome e à reputação foi gravemente prejudicado, levando à perda de oportunidades profissionais e a um impacto significativo na sua vida pessoal.
O Supremo Tribunal de Justiça reafirmou a responsabilidade da TVI e das jornalistas, sublinhando que a liberdade de imprensa não confere um salvo-conduto para a divulgação de informações alegadamente não verificadas, chegando mesmo a defender que não existia “nenhum interesse legítimo em divulgar” que o gestor usava um carro da marca Jaguar e que “teve uma relação com uma ‘acompanhante de luxo’”, algo que, aliás, já fora noticiado em 2017 pelo Correio da Manhã.
Supremo Tribunal de Justiça sancionou TVI mas reduziu indemnização de 100 mil para 50 mil euros.
O acórdão – decretado pelos juízes conselheiros Nuno Pinto Oliveira, António Oliveira Abreu e José Maria Ferreira Lopes – concorda com a decisão do Tribunal da Relação que apresenta a investigação jornalística da TVI como “leviana” e “sensacionalista”. Argumenta também que houve dolo das jornalistas, bem como “ausência de escrúpulos na formulação de graves e delicados juízos de valor sobre a pessoa” do gestor bancário e da divulgação deliberada ou intencional da sua imagem, que incluiu “a captação e divulgação de imagens do seu rosto, em momentos da sua vida privada e até, pasme-se, a conduzir na autoestrada”.
Saliente-se, porém, que o acórdão do STJ nada refere quanto ao facto de a acusação criminal ter caído por terra. A reportagem da TVI já não se encontra online, estando a ligação inactiva, mas uma síntese comentada por Ana Leal num programa matinal com Manuel Luís Goucha está ainda disponível.
Em declarações ao PÁGINA UM, Ana Leal diz-se surpreendida com esta decisão, dizendo que ainda não houve trânsito em julgado, uma vez que o gestor bancário pediu nulidade do acórdão, por não estar satifeito com o valor da indemnização fixada. Por sua vez, a jornalista Cláudia Rosenbusch, autora da reportagem diz estar de consciência tranquila sobre o rigor deste seu trabalho. Garantido parece ser o recurso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos se este acórdão do Supremo for definitivo, o que, embora não inverta a decisão, pode obrigar o Estado a assumir todos os custos com ‘críticas’ à mistura.
Se este caso avançar para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos não será de estranhar que venha juntar-se a outros em que os tribunais portugueses ‘ficam mal na fotografia’. Nos últimos anos, sucedem-se as condenações do Estado português por os tribunais nacionais terem condenado jornalistas, em alguns casos, a indemnizações e multas elevadas.
Por exemplo, no ano passado, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos decidiu que a condenação da jornalista Tânia Laranjo, que incluía o pagamento de uma indemnização pela divulgação televisiva do interrogatório ao ex-ministro Miguel Macedo, violara o direito à liberdade de expressão e era “desnecessária numa sociedade democrática”. O tribunal europeu defendeu que a aplicação de multas e indemnizações a jornalistas era um meio “capaz de desencorajar os meios de comunicação social de discutirem temas de legítimo interesse público”, e quem mesmo na fase de investigação e julgamento, se justifica o interesse mediático e o escrutínio público.
Saliente-se que, particularmente em Portugal, além de decisões em tribunal que condicionam a liberdade de imprensa, também começa a ser prática comum os reguladores, como a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), usarem os seus poderes arbitrários e, com base em análises superficiais, ‘conferirem’ deliberações que acabam por se tornar ‘trunfos de acusação’ contra jornalistas.
A especulação não é recente, e começou logo após a compra do Twitter, agora X, concluída em Outubro de 2022. Em queda bolsista desde o seu então máximo histórico nos 407 dólares em Novembro de 2021, as acções da empresa automóvel de Musk descambariam até aos 113 dólares no início de 2023 – e logo houve quem corresse a atribuir culpas ao empresário pela forma desabrida como geria o seu novo ‘brinquedo’ nas redes sociais.
Mas, como a Economia é a Economia, e mais ainda nos mercados financeiros, sete meses depois, em Julho de 2023, as acções da Tesla já tinham saltado para os 281 dólares, recuando em seguida para os 147 dólares em Abril do ano passado. Normal. A partir daí, sendo certo que os mercados olham para tudo menos para a espuma mediática, uma questão voltou a surgir no último ano, com a aproximação de Elon Musk aos republicanos, e sobretudo a Trump, e agora à sua Administração: afinal, isso é um problema ou uma vantagem para a Tesla? Nos últimos dias há quem, mais uma vez, corra a gritar que sim, e que o fim da Tesla, por causa de Musk, está próximo.
Com efeito, entre os comentários de Elon Musk mais controversos nas redes sociais – e ele escreve todos os dias vários posts provocatórios -, a crescente associação ao espectro político conservador, e apoios tácitos a algumas bandeiras e posições dos partidos populistas e de extrema-direita na Europa, a imprensa tradicional tem vindo a criar uma narrativa dominante sobre um declínio inevitável da Tesla, acentuado pela intensificação da concorrência no mercado dos veículos eléctricos e a crescente presença de marcas chinesas no sector. Na semana passada, o anúncio de queda de vendas de veículos da Tesla em Janeiro na Alemanha e em outros mercados europeus vincou, mais uma vez, essa narrativa, já transformada em percepção. A ‘culpa’, desta vez, foi de uma mão erguida maciçamente interpretada como uma saudação nazi e um ‘encosto’ ao partido alemão AfD.
Contudo, um olhar mais rigoroso sobre os números desmente este cenário catastrofista. Muito pelo contrário. Ao longo de 2024, dentro do sector automóvel, a Tesla tem-se destacado, a grande distância da concorrência (excluindo empresas chinesas) como a marca com melhor comportamento em bolsa, contrariando a retórica pessimista. E mais relevante ainda: a vitória de Donald Trump nas eleições norte-americanas impulsionou de forma ainda mais expressiva a cotação da empresa, contrastando com o argumento de que a associação a Musk poderia afastar consumidores e investidores.
A Tesla encerrou 2024 com uma valorização de 62,6%, ainda mais impressionante por estar ‘encaixada’ numa subida de quase 560% nos últimos cinco anos. E se recuarmos ao início da pandemia, com referência a 20 de Março de 2020 (28,6 dólares), então a Tesla regista uma capitalização bolsista mais de 10 vezes superior, considerando que hoje fechou nos 350 dólares.
Elon Musk.
No lote de 12 das mais relevantes empresas deste sector, uma análise do PÁGINA UM mostra que só a General Motors se aproxima do desempenho da Tesla, tendo registado uma valorização de 47,8%, seguida da Hyundai (21,1%), da Renault (18,3%) e da Toyota (7,3%). Todas as outras sete marcas ficaram no vermelho. E bem no vermelho. Com excepção da Honda (queda de 7,3%), as desvalorizações foram muito significativas ao longo de 2024, sobretudo a partir da Primavera. O pior desempenho foi da Stellantis (-43,4%), que, em certa medida, justifica a queda em desgraça do português Carlos Tavares, que foi demitido de CEO sem contemplações. A Ford, a Volkswagen, a Nissan, a Mercedes e a BMW registaram desvalorizações entre os 18% e os 29%, bastante relevante neste sector.
Mesmo no período posterior às eleições norte-americanas de Novembro do ano passado até ao dia 7 de Fevereiro deste ano – e mesmo havendo, em muitos casos, de cotações em aparente movimento de ‘correcção’ –, a Tesla é, a grande distância, a empresa do sector automóvel com melhor desempenho.
Pese embora estar já bem abaixo do máximo histórico de 479,86 dólares, batido em 17 de Dezembro do ano passado –, a empresa de Musk registou um crescimento adicional de quase 44% entre o dia das eleições e a passada sexta-feira. A Renault ficou a grande distância: ‘apenas’ uma valorização de um pouco menos de 13%, mesmo assim acima das pequenas valorizações da Mercades (8,4%), Toyota (5,3%) e Volkswagen (1,2%). De resto, as outras sete empresas analisadas tiveram quedas, com destaque para a General Motors (-11,8%).
O PÁGINA UM apresenta uma síntese da evolução bolsista das 12 empresas, sendo que a evolução desde 5 de Novembro e desde o início de 2025 tem o intervalo superior no fecho de 7 de Fevereiro
Tesla
Evolução em 2024: Valorização de 62,56%.
Máximo:17 de Dezembro de 2024, com 479,86.
Mínimo:22 de Abril de 2024, com 142,05.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Crescimento de 43,81%.
Evolução em 2025: Queda de 4,66%.
Observações: A Tesla apresentou um crescimento expressivo em 2024, especialmente na recta final do ano. No entanto, 2025 começou com uma ligeira correção.
Evolução das cotações (em dólares) da Tesla desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
General Motors (GM)
Evolução em 2024: Valorização de 47,77%.
Máximo:25 de Novembro de 2024, com 60,20.
Mínimo:18 de Janeiro de 2024, com 34,22.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 11,75%.
Evolução em 2025: Queda de 7,75%.
Observações: GM teve um crescimento sólido em 2024, mas o início de 2025 foi marcado por uma retracção.
Evolução das cotações (em dólares) da General Motors desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Hyundai
Evolução em 2024: Valorização de 21,07%.
Máximo:29 de Agosto de 2024, com 69,25.
Mínimo:4 de Janeiro de 2024, com 38,54.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 4,09%.
Evolução em 2025: Recuperação de 3,85%.
Observações: Hyundai teve um desempenho positivo em 2024, mas com uma correcção nos últimos meses do ano. O início de 2025 mostra sinais de ligeira recuperação.
Evolução das cotações (em dólares) da Hyundai desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Volkswagen (VW)
Evolução em 2024: Queda de 28,27%.
Máximo:4 de Abril de 2024, com 16,13.
Mínimo:26 de Novembro de 2024, com 8,62.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Valorização de 1,22%.
Evolução em 2025: Recuperação de 9,80%.
Observações: 2024 foi um ano muito negativo para a VW, mas há sinais de recuperação no início de 2025.
Evolução das cotações (em dólares) da Volkswagen desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Ford
Evolução em 2024: Queda de 18,59%.
Máximo:18 de Julho de 2024, com 14,55.
Mínimo:5 de Agosto de 2024, com 9,43.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 12,83%.
Evolução em 2025: Queda de 4,25%.
Observações: A Ford apresentou um ano negativo, com tendência de queda prolongada. O início de 2025 também não está a ser promissor.
Evolução das cotações (em dólares) da Ford desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Nissan
Evolução em 2024: Queda de 22,05%.
Máximo:22 de Março de 2024, com 8,45.
Mínimo:16 de Dezembro de 2024, com 4,58.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Recuperação de 5,66%.
Evolução em 2025: Queda de 3,66%.
Observações: A Nissan teve um ano bastante negativo, sobretudo a partir de Março, com alguma recuperação nos últimos meses do ano passado. O início de 2025 foi de nova queda.
Evolução das cotações (em dólares) da Nissan desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Stellantis
Evolução em 2024: Queda de 43,38%.
Máximo:23 de Março de 2024, com 29,40.
Mínimo:2 de Dezembro de 2024, com 12,37.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 6,30%.
Evolução em 2025: Recuperação de 1,25%.
Observações: Stellantis teve um ano fortemente negativo, prolongada sobretudo a partir de finais de Março. No entanto, 2025 começou com uma pequena correcção.
Evolução das cotações (em dólares) da Stellantis desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Toyota
Evolução em 2024: Valorização de 7,30%.
Máximo:22 de Março de 2024, com 254,77.
Mínimo:7 de Agosto de 2024, com 167,18.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Crescimento de 5,29%.
Evolução em 2025: Queda de 4,73%.
Observações: Toyota teve um ano de 2024 de ligeiro crescimento, embora em queda acentuada a partir de finais de Março. O ano de 2025 manteve a tendência de queda.
Evolução das cotações (em dólares) da Toyota desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Mercedes-Benz
Evolução em 2024: Queda de 20,23%.
Máximo:8 de Abril de 2024, com 83,03.
Mínimo:21 de Novembro de 2024, com 54,36,81.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 3,94%.
Evolução em 2025: Recuperação de 8,39%.
Observações: A Mercedes teve um ano bastante negativo, sobretudo a partir de Abril, tendo iniciado 2025 com alguma recuperação.
Evolução das cotações (em dólares) da Mercedes-Benz desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
BMW
Evolução em 2024: Queda de 26,27%.
Máximo:8 de Abril de 2024, com 41,39.
Mínimo:13 de Novembro de 2024, com 23,28.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 1,28%.
Evolução em 2025: Desvalorização de 1,72%.
Observações: BMW teve um ano bastante negativo, sobretudo a partir de meados de Abril, suavizando a queda nos últimos meses de 2024. O início de 2025 manteve a tendência de desvalorização.
Evolução das cotações (em dólares) da BMW desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Honda
Evolução em 2024: Desvalorização de 7,27%.
Máximo:22 de Março de 2024, com 37,68.
Mínimo:19 de Dezembro de 2024, com 23,70.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Queda de 8,02%.
Evolução em 2025: Queda de 1,97%.
Observações: Honda teve um ano ligeiramente negativo, com especial destaque para os últimos meses de 2024. O início de 2025 mostrou ainda não mostrou recuperação.
Evolução das cotações (em dólares) da Honda desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
Renault
Evolução em 2024: Valorização de 18,30%.
Máximo:3 de Junho de 2024, com 11,65.
Mínimo:17 de Janeiro de 2024, com 7,03.
Evolução desde 5 de Novembro de 2024: Subida de 12,93%.
Evolução em 2025: Valorização de 5,02%.
Observações: A Renault teve um ano de franca valorização, que se tem mantido no início de 2025.
Evolução das cotações (em dólares) da Renault desde Janeiro de 2024. Fonte: Yahoo Finance.
O Código Deontológico do Jornalista (CDJ) contém uma incongruência flagrante que tem servido de base para interpretações enviesadas e, mais grave ainda, para a distorção da própria prática jornalística: a imposição de que “os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso”. Esta formulação, que à primeira vista pode parecer um princípio equilibrado, esconde uma armadilha lógica: a ideia de que a comprovação dos factos depende da audição das partes envolvidas, como se a verdade jornalística só pudesse emergir de um processo dialéctico entre os visados.
Ora, os factos existem independentemente da sua comprovação pelas partes. Um documento oficial que ateste um desvio de fundos, um contrato que revele tráfico de influências ou um relatório forense que demonstre um erro médico não precisam da validação dos protagonistas da história para serem verdadeiros. A verdade não se negocia, nem precisa de um carimbo de autenticidade de quem tem um interesse directo na narrativa.
A exigência do contraditório como critério universal para a comprovação dos factos cria um paradoxo: por um lado, exige-se ao jornalista rigor na apresentação de provas; por outro, obriga-se o mesmo jornalista a conceder espaço à parte interessada para que esta relativize, negue ou distorça a informação documentada. Assim, um facto objectivamente comprovado pode ser transformado num “alegado facto” apenas porque uma das partes o contesta. A verdade passa a ser condicionada pela disposição dos intervenientes em confirmá-la ou negá-la, convertendo-se num jogo retórico em vez de uma questão factual.
Além disso, a formulação do código deontológico é ambígua e contraditória. Diz-se que os factos devem ser comprovados, mas o critério subsequente (ouvir as partes) não é uma via de comprovação, mas sim um procedimento de contextualização. Factos não se tornam mais verdadeiros porque as partes os corroboram, nem mais falsos porque os negam. Esta formulação, ao misturar um princípio objectivo (a necessidade de comprovar factos) com uma prática jornalística circunstancial (a audição das partes), resulta numa incoerência conceptual.
O verdadeiro jornalismo assenta na busca pela verdade através de métodos rigorosos: cruzamento de fontes, análise documental, investigação aprofundada. O contraditório pode ser um elemento útil nesse processo, mas não pode ser uma condição obrigatória para validar o que já está demonstrado. Quando um jornalista possui documentos sólidos que sustentam uma investigação, o contraditório não serve para “comprovar” nada – apenas para permitir que a parte visada apresente uma defesa.
O que é um facto? A participação de André Carvalho Ramos em formações de media training? Não! Para a ERC só é um facto quando se concede um ‘direito ao contraditório’, que permitisse André Carvalho Ramos simplesmente negar…
O problema é que a ERC e outros reguladores, ao basearem-se nesta falha estrutural do Código Deontológico, transformaram o contraditório numa regra cega, aplicável acriticamente a qualquer contexto, como mais uma vez se verifica numa recentíssima deliberação contra o PÁGINA UM por causa de ‘um jornalista promíscuo’ da CNN Portugal, André Carvalho Ramos, não ter sido ‘ouvido’. O dito jornalista aceitou ser formador de media training organizado pela empresa onde o filho de António Costa é director-geral. A confirmação desse facto, além de estar no site do curso, foi comprovada numa notícia do jornal Eco em Setembro do ano passado e, cereja em cima do bolo, reconfirmada pelo próprio André Carvalho Ramos no LinkedIn [se, entretanto, ele pensar na ‘chico-espertice’ de apagar o registo, está aqui para memória futura].
Mas, para a ERC, apesar do nome de André Carvalho Ramos continuar a estar no site do curso (que não tem características académicas, por ausência de ECTS, logo é um simples media training, incompatível com a profissão de jornalista), existe um ‘sacrossanto’ direito ao contraditório para eliminar os factos. Na prática, isto significa que a verdade factual pode ser contestada não com provas, mas com declarações de quem tem interesse em desmenti-la. Assim, um mecanismo que deveria servir para enriquecer a investigação jornalística passou a ser um expediente para diluir a responsabilidade de quem é alvo de uma reportagem.
[Já agora, se se quiser escrever, como já se escreveu, que André Carvalho Ramos continua a constar nos formadores do mesmo curso a iniciar em Outubro deste ano, também se deveria dar-lhe um ‘direito ao contraditório’, ou mandar-se a ERC às malvas?]
Cartaz do curso de media training (sem ECTS, portanto sem créditos universitários), organizado pela GCI Media e Universidade Europeia. Como não tem créditos universitários nem sequer se pode assumir que exista corpo docente; apenas formadores.
Se o jornalismo quiser recuperar a sua função essencial – a de expor factos com base na melhor evidência disponível – tem de rejeitar esta visão burocrática e estéril do contraditório. O Código Deontológico dos Jornalistas precisa de ser revisto, clarificando que a comprovação dos factos não depende da aceitação das partes interessadas, mas da força das evidências apresentadas.
O jornalista, com a sua credibilidade e seriedade – sem ingerências de uma ERC, que não aprecia ser investigada e se ‘vinga’ do PÁGINA UM sempre que lhe dão uma oportunidade -, é o garante de um serviço público essencial, e não deve permitir que o seu trabalho seja um simples palco para relativismos factuais onde a verdade depende sempre de quem tem direito de antena.
Considerado uma espécie de ‘Richelieu da Saúde’ – aludindo à sua influência nos corredores do Ministério da Saúde, liderado por Ana Paula Martins –, Eurico Castro Alves tem vindo a coleccionar nos últimos anos um impressionante portefólio empresarial bastante diversificado, com investimentos nos sectores do imobiliário, consultoria, saúde e até canábis medicinal.
Porém, numa investigação do PÁGINA UM, com excepção da WiseHS – que, em breve, merecerá uma análise mais detalhada –, grande parte das empresas que criou ou ajudou a criar nos anos recentes foram descartadas ou acabaram por se ‘esfumar’ literalmente – como foi o caso da empresa Atlantiquality Unipessoal, criada em Abril de 2023 para “o exercício das actividades de cultivo, fabrico, comércio por grosso, importação, exportação, transporte e circulação de medicamentos, preparações e substâncias à base de planta da canábis para fins medicinais, médico-veterinários e de investigação científica”.
No mês passado, no dia 16, foi publicado o anúncio da dissolução desta ‘aventura’ de Castro Alves. As contas de 2023, apresentadas apenas em Novembro do ano passado, mostram uma actividade nula: apenas uma despesa de 5.400 euros e sem qualquer receita.
Sector bastante atractivo, embora burocrático e oneroso por exigir morosas autorizações do Infarmed e investimentos avultados, a produção e comercialização de canábis medicinal tem atraído muitos investidores nacionais e internacionais, desde que foi legalizada através de um diploma de 2018. De acordo com um artigo de análise publicado no jornal Cannareporter, a ascensão de Portugal na indústria global da canábis tem sido uma história de sucesso.
De um início modesto após a legalização da canábis medicinal em 2018, Portugal mostra-se agora uma potência no sector, apenas atrás do Canadá, estimando-se que as exportações no ano passado tenham ultrapassado as 25 toneladas, reflectindo uma taxa de crescimento anual composta superior a 80% durante este período. O negócio mostra-se bastante atractivo, podendo ser vendido sob a forma de flor ou óleo, com efeitos benéficos comprovados em dores crónicas, efeitos colaterais de quimioterapia, doenças neurodegenerativas e diversos transtornos mentais e psiquiátricos.
Eurico Castro Alves.
Castro Alves – que foi presidente do Infarmed entre 2012 e 2015 – estava bem colocado neste sector emergente, e logo em 2018 a sua empresa WiseHS começou a desenvolver acções de formação no sector da canábis medicinal, elaborando mesmo relatórios regulares.
Porém, ao invés de usar a WiseHS, da qual é o sócio exclusivo, acabou por optar por criar uma empresa específica – a Atlantiquality, mas recorrendo a uma outra empresa que criou: a Interbuscon. Fundada em 2018, a Interbuscon tem um capital social de 1.000 euros, distribuído entre Eurico Castro Alves (75%) e Maria Amélia Pelicano Paulos, uma antiga inspectora coordenadora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Pessoa próxima do ‘ministro-sombra’ da Saúde, Amélia Pelicano Paulos foi até finais de Dezembro a directora-geral da WiseHS, e o seu endereço que surge em documentos comerciais é, por regra, o mesmo que o de Castro Alves, uma habitação numa zona residencial nas imediações do Bairro de Bessa Leite, na freguesia de Lordelo do Ouro e Massarelos.
Apesar de objectos sociais muito distintos, em termos formais, a Atlantiquality foi ‘filha’ da Interbuscon – que tem uma actividade bastante residual, com receitas de menos de 43 mil euros em 2022. As contas de 2023 não foram ainda depositadas. Seja como for, a Atlantiquality teve ainda pior sorte, e nem sequer terá conseguido obter qualquer licença junto do Infarmed, não constando da base de dados das entidades do circuito da distribuição e da produção e aquisição directa de canábis medicinal, que integra actualmente 41 empresas.
Apesar de nunca ter constado como sócio, Eurico Castro Alves terá tido uma segunda ‘aventura’ na canábis medicinal que se ‘esfumou’. A sua sócia Amélia Pelicano Paulos também co-fundou em 2019 uma outra empresa neste sector, a Canfimed, detendo uma quota de 23% e tendo sido mesmo gerente. A Canfimed anunciou também no início de Janeiro passado a sua dissolução, e é aqui que existe a ligação a Eurico Castro Alves, porque é o seu nome que surge como depositante, bem como o endereço da WiseHS.
Aliás, mesmo tendo-se ‘esfumado’ estas duas empresas de canábis medicinal associadas directa ou indirectamente a Castro Alves, com ‘morte inglória’, ainda há mais três que lhe estarão associadas. A primeira é a Cannatech, formalmente detida por três residentes londrinos (Sangeeta Mittal, Shristi Mittal e Vartika Mittal Goenka), que comunga a sua sede com a WiseHS. Não existe, porém, qualquer informação comercial e económica sobre esta empresa desde Dezembro de 2020.
A WiseHS, a principal empresa de Castro Alves, chegou a dinamizar diversas acções sobre a canábis medicinal, mas foi através de outras empresas que o ‘ministro sombra’ da Saúde tentou entrar no negócio.
E ainda há mais duas empresas com ligações a Amélia Pelicano Paulos, embora os objectos sociais sejam mais amplos, incidindo no cultivo, transformação e comercialização de plantas medicinais e farmacêuticas. A primeira, a Serioustendency, foi criada em 2019 e tem a sócia de Eurico Castro Alves como detentora de um terço do capital social. Um ano mais tarde, essa novel empresa criou a Serioustendency Madeira, com uma quota de 75% de um capital social de apenas 400 euros, tendo como parceira a Valsa das Ninfas.
O PÁGINA UM colocou diversas questões a Eurico Castro Alves sobre a sua actividade empresarial. No caso das empresas encerradas e a encerrar, Castro Alves diz apenas, laconicamente, que se relacionam “com projetos que não chegaram a concretizar-se”.
O jornalismo é, antes de tudo, um exercício de rigor e de compromisso com a verdade factual. E de confiança com os leitores. O jornalismo verdadeiro e íntegro não é uma caixa de ressonância para declarações convenientes, nem uma plataforma para relativizações artificiais que, sob a capa da imparcialidade, apenas servem para diluir evidências concretas. Contudo, nos últimos tempos, tem-se tentado impor uma ideia perniciosa ao exercício do jornalismo: a obrigatoriedade de um alegado “direito ao contraditório”, como se o dever de comprovar factos fosse substituível pela necessidade de garantir espaço a quem se sente desconfortável com a sua revelação.
A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), que teoricamente deveria defender a liberdade editorial da imprensa, volta e meia incide as suas deliberações sobre este falso problema, ao considerar que um jornal deve conceder destaque a todas as opiniões em pé de igualdade, mesmo quando os factos noticiados se sustentam em provas documentais inequívocas. Sucedeu agora, mais uma vez, com um jornalista promíscuo da TVI, André Carvalho Ramos, que teve – e tem agora de novo – o seu nome associado a uma formação (não-universitária) de media training dirigida a gestores e executivos, organizada por uma agência de comunicação dirigida pelo filho deo ex-primeiro-ministro António Costa.
A ERC censurou o PÁGINA UM por, apesar das evidências documentais, achar que alegado “direito ao contraditório” deveria ter sido respeitado numa investigação que envolvia três dezenas de jornalistas, alguns dos quais (14) até foram identificados pelo próprio reguador.
A exigência do “direito ao contraditório” é particularmente absurda quando aplicada a este caso concreto: uma peça sobre promiscuidade jornalística, onde cada menção é acompanhada por documentos que sustentam as ligações de jornalistas a entidades que deveriam escrutinar.
Ou seja, apesar de o trabalho se basear em evidências objectivas, a ERC decide insistir que deveria ter sido dado espaço a cada um dos visados para apresentar uma versão alternativa – ainda que não haja margem para interpretação de documentos e provas que atestam o que foi relatado. Os factos existem, mas podem ser negados ou esvaziados por uma simples declaração dos visados.
Esta ideia de “direito ao contraditório” aplicado de forma absoluta ao jornalismo não encontra sequer sustentação na Lei da Imprensa nem no Código Deontológico dos Jornalistas. Aquilo que tanto a legislação como o código exigem é que os factos sejam comprovados, ouvindo as partes atendíveis – e deduz-se que essa ‘audição’ serve para confirmar os factos, e nem tal implica que se tenha que transpor todos os comentários. Aquilo que a lei e o código não dizem é que cada notícia tenha de ser um palco de encenações onde qualquer denunciado tenha a oportunidade de relativizar ou distorcer uma verdade documentalmente sustentada.
Nem a lei nem o código dizem, em parte alguma, ser uma obrigação de um jornalista é ouvir todos os envolvidos. Essa é uma escolha editorial, sob a qual pode pender responsabilidade – mas é uma escolha que jamais pode implicar a visão maniqueísta da ERC: há contraditório, há rigor; não há contraditório, não há rigor. Note-se o absurdo: invente-se um facto e oiça-se todas as partes, a ERC dá o OK; comprovem-se facto e decide-se se se mostra relevante ouvir todas as pessoas, e a ERC censura.
A ERC tem de terminar com este tipo de ingerências editoriais, até porque a sua visão é enviesada, e pouco lhe importa a veracidade dos factos. Aquilo que se estabelece é que um órgão de comunicação social tem o dever de assegurar a veracidade das informações publicadas e que os factos apresentados sejam suportados por elementos objetivos – o que, num trabalho baseado em documentos, é plenamente garantido, como tem sido apanágio do PÁGINA UM.
A imposição editorial feita pela ERC sobre esta matéria do “contraditório” não apenas representa uma interferência indevida na liberdade editorial como também pode distorcer a própria percepção do leitor. Se um jornalista revela um facto sustentado por provas documentais e é obrigado a publicar uma resposta de alguém que, sem desmontar a prova, apenas contesta ou nega o seu conteúdo, cria-se artificialmente uma dúvida onde esta não deveria existir. O jornalismo não pode ser refém de uma falsa imparcialidade, que dá o mesmo peso ao documento que prova e à declaração que desmente sem fundamento. O jornalista é um mediador e intérprete da realidade; não um mero pé de microfone.
Se levássemos esta lógica ao extremo, seria necessário, por exemplo, que:
• Sempre que se noticiava uma acusação judicial, fosse obrigatória a audição do arguido por parte do jornalista, independentemente das provas nos autos.
• Quando um sindicato denunciasse uma política ou medida do Governo, o mesmo espaço teria de ser dado ao Governo, sob pena de “falta de contraditório”.
• Sempre que uma peça se baseasse em estatísticas criminais, se tivesse de ouvir simultaneamente polícias e ladrões para dar “as duas versões”.
Este absurdo revela a falácia da argumentação: não é função do jornalismo criar um equilíbrio artificial entre factos e versões. A função do jornalismo é interpretar, conferir, validar e apresentar os factos da forma mais clara e rigorosa possível, assegurando que provas físicas e documentos oficiais não sejam diluídos por declarações defensivas que apenas visam confundir o público.
Foto: PÁGINA UM
É importante ainda notar que o contraditório não se confunde com o direito de resposta. A Lei da Imprensa salvaguarda todas as partes, prevendo expressamente este último, permitindo que qualquer visado por uma notícia possa publicar a sua posição quando se sinta injustiçado ou prejudicado.
O PÁGINA UM – e eu, em particular – já exerceu esse direito noutros órgãos de comunicação social; já publicámos direitos de resposta (como, aliás, nesta edição). Mas isso não significa que o jornalista tenha a obrigação prévia de lhe dar espaço na construção da notícia, sobretudo quando os factos apresentados são incontroversos e se baseiam em documentação robusta.
A exigência da ERC não é apenas errada do ponto de vista legal e jornalístico – é também profundamente perversa na forma como condiciona o trabalho dos jornalistas. O seu efeito prático é claro: criar obstáculos para que determinadas verdades sejam ditas. Se cada jornalista souber que, para noticiar um facto comprovado, terá de gastar tempo e espaço com reações que nada acrescentam ao esclarecimento do público, a tendência natural será evitar determinados temas. E este, no fundo, parece ser o objetivo – desincentivar a investigação, protegendo aqueles que prefeririam que certos factos permanecessem desconhecidos.
A liberdade de imprensa não pode ser condicionada por exigências formais – melhor dizendo, artificiais – que nada acrescentam ao rigor do jornalismo. O contraditório pode ser útil e desejável em muitos casos – e o PÁGINA UM usa-o, preferindo chamar-lhe comentário -, mas a sua imposição como regra cega transformará o jornalismo numa arena de relativismo, onde a verdade dos factos é apenas mais uma “opinião” entre tantas.
No PÁGINA UM, não caímos nesse jogo, mesmo correndo o risco de sucessivis bitates da ERC sobre a forma de deliberações que nem sequer podem ser contestadas em tribunal, porque a esse nível valem como meras opiniões, mesmo se irritantes. Uma coisa é certa e garantimos aos leitores; tudo o que publicamos como notícia é sustentado por provas. Em factos. E o jornalismo são factos, interpretações e comentários; não um palco do comntraditório.
Relatório de avaliação da notícia sobre a Sondagem para as Autárquicas de Lisboa e Porto – Correio da Manhã (3 de Fevereiro de 2025)
1. Introdução
Este relatório apresenta uma avaliação de uma notícia publicada pelo jornal Correio da Manhã no dia 3 de Janeiro de 2025, relativas à sondagem conduzida pela Intercampus para o Correio da Manhã e a CMTV. A peça analisada é a seguinte: :
A sondagem teve como objectivo avaliar as intenções de voto para as Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto, utilizando uma amostra nacional. No entanto, as eleições autárquicas são decididas exclusivamente pelos eleitores de cada concelho, pelo que a ausência de dados desagregados por concelho compromete drasticamente a validade dos resultados apresentados. Além disso, as margens de erro específicas para Lisboa e Porto não são mencionadas, agravando a fragilidade metodológica da análise.
A avaliação foi conduzida com base na metodologia Rigor Jornalístico sobre Sondagens (RJS), previamente definida em articulação com o jornal PÁGINA UM e ajustada para dar maior peso à precisão dos dados (35%) e à transparência na apresentação da informação (30%). A análise de conteúdo e a quantificação dos critérios foram da exclusiva responsabilidade do ChatGPT. A avaliação foi realizada com exigência rigorosa, considerando os princípios do jornalismo transparente e informativo numa sociedade democrática.
2. Metodologia de Avaliação
A avaliação segue a estrutura RJS (Rigor Jornalístico sobre Sondagens) e abrange seis critérios essenciais, aplicados a cada uma das três notícias.
A nota final de cada notícia resulta da aplicação destas ponderações às notas atribuídas a cada critério.
2.1. Processo de Avaliação da Inteligência Artificial
A avaliação das notícias foi realizada utilizando técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (PLN) e avaliação contextual.
O Processamento de Linguagem Natural (PLN) refere-se a um conjunto de técnicas que permitem a um modelo de inteligência artificial compreender, interpretar e analisar textos escritos de forma semelhante a um leitor humano. O PLN envolve análise sintáctica, semântica e pragmática, permitindo identificar factos, opiniões, dados estatísticos e omissões. No contexto desta avaliação, o modelo extrai e processa automaticamente as informações presentes na notícia, identificando padrões e verificando a completude dos dados.
A avaliação contextual complementa o PLN ao interpretar o significado e a relevância das informações no contexto específico da cobertura noticiosa. Esta abordagem analisa a estrutura argumentativa do texto, a escolha de palavras e a ênfase dada a determinados aspectos da notícia, permitindo detectar enviesamentos subtis ou omissões estratégicas. O modelo compara o conteúdo da peça com boas práticas jornalísticas e identifica se a apresentação dos dados pode influenciar indevidamente a percepção pública sobre os resultados da sondagem.
2.2. Etapas do Processo de Avaliação
A avaliação das notícias seguiu três níveis estruturados:
Segmentação e Extração de Informação
Identificação das percentagens apresentadas e verificação da sua completude.
Análise da manchete e do lead para detectar formulações enviesadas.
Verificação da presença e clareza da ficha técnica da sondagem.
Comparação com os Padrões de Rigor Informativo
Análise de omissões relevantes e apresentação de dados.
Identificação de linguagem potencialmente influenciadora da percepção do leitor.
Comparação entre as três notícias para detectar diferenças qualitativas.
Atribuição de Pontuações
Aplicação da escala de 0 a 20 pontos a cada critério, ponderando os resultados de acordo com a sua relevância.
3. Avaliação das Notícias
3. Avaliação da Notícia
A seguir apresenta-se o quadro consolidado com as avaliações de cada critério para cada notícia:
A análise dos resultados evidencia que a notícia analisada falha em critérios fundamentais de rigor jornalístico, com nota negativa nos domínios da precisão dos dados, da transparência e acesso à informaçºao, na qualidade da análise e contextualização e ainda no rigor metodológico e credibilidade..
A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a pior avaliação global (7,85/20), com resultados particularmente críticos nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A peça não apresenta a totalidade dos votos, omite valores essenciais como brancos e nulos e utiliza uma manchete que pode induzir uma percepção enganadora sobre a posição de Gouveia e Melo. A falta de contextualização dos números e a ausência de qualquer explicação sobre a margem de erro agravam ainda mais a falta de rigor informativo.
A notícia “Mendes à direita” teve a melhor nota (13,2/20), mas ainda assim insuficiente para ser considerada uma peça jornalística de qualidade. Embora tenha atingido o mínimo aceitável no critério de imparcialidade (15/20), continua a falhar nos critérios essenciais de precisão (12/20) e transparência (10/20), comprometendo a integridade da informação veiculada. O artigo não apresenta a relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto, omitindo dados essenciais para uma análise completa.
4. Justificação das Avaliações
A seguir apresenta-se a justificação detalhada para cada critério de avaliação aplicado a cada uma das três notícias.
4.1 Precisão dos Dados Apresentados (35%)
Avaliação – 6/20
A notícia apresenta percentagens das intenções de voto, mas a base da sondagem é nacional, o que não reflecte o universo relevante (eleitores de Lisboa e Porto). Sem saber quantos inquiridos pertencem a cada concelho, não é possível calcular a margem de erro específica para cada cidade, o que compromete gravemente a validade dos resultados apresentados. A ausência de dados desagregados impede a compreensão real da vantagem de Carlos Moedas e Manuel Pizarro nos respectivos concelhos.
4.2 Transparência e Acesso à Informação Completa (30%)
Avaliação – 6/20
A Embora a ficha técnica mencione a amostra total e a margem de erro geral (+/- 3,9%), não informa a distribuição dos inquiridos por concelho. Dada a natureza local das eleições autárquicas, esta omissão é extremamente grave, pois torna impossível avaliar a representatividade dos dados. Além disso, não há explicação detalhada sobre a ponderação dos resultados.
4.3 Imparcialidade e Isenção (15%)
Avaliação – 10/20
A notícia utiliza uma linguagem relativamente neutra, mas a manchete e os gráficos destacam os candidatos Carlos Moedas e Manuel Pizarro sem abordar adequadamente as limitações metodológicas da sondagem. A ausência de referências às fragilidades da amostra e das margens de erro específicas sugere um enviesamento implícito.
4.4 Qualidade da Análise e Contextualização (10%)
Avaliação – 7/20
Apesar de mencionar temas relevantes como segurança e imigração, a análise não explora cenários alternativos ou impactos das margens de erro específicas para cada concelho. A ausência de qualquer contextualização histórica das intenções de voto ou comparação com sondagens anteriores enfraquece ainda mais a análise.
4.5 Linguagem e Clareza (5%)
Avaliação – 16/20
A linguagem da notícia é clara e acessível, com gráficos que ajudam a sintetizar os resultados. Contudo, a falta de explicações metodológicas adequadas e a simplificação excessiva comprometem a compreensão do público sobre as limitações da sondagem.
4.6 Rigor Metodológico e Credibilidade (5%)
A ausência de dados desagregados por concelho e a falta de uma explicação clara sobre como a amostra nacional foi ajustada para refletir os universos eleitorais de Lisboa e Porto comprometem a credibilidade da sondagem. Este rigor metodológico insuficiente impacta directamente a validade da notícia.
5. Conclusão detalhada
A análise da notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica para Lisboa e Porto, conduzida pela Intercampus, revelou falhas estruturais graves que comprometem a validade e o rigor informativo da peça. As principais fragilidades detectadas enquadram-se em três domínios fundamentais: precisão dos dados, transparência na apresentação da metodologia e impacto da falta de desagregação da amostra no resultado da sondagem.
O problema da precisão dos dados
A notícia apresenta percentagens de intenções de voto para Carlos Moedas e Alexandra Leitão, em Lisboa, e para Manuel Pizarro e Pedro Duarte, no Porto, sem clarificar a representatividade estatística desses números. Como a sondagem é baseada numa amostra nacional e não numa amostra específica de eleitores de Lisboa e Porto, os valores apresentados são profundamente enganadores para o leitor, pois transmitem uma falsa noção de competitividade entre os candidatos.
Em termos estatísticos, para que uma sondagem autárquica seja precisa, seria necessário garantir um número adequado de inquiridos exclusivamente residentes em Lisboa e no Porto, garantindo que a margem de erro fosse controlada para cada concelho. Como a ficha técnica da sondagem não apresenta essa desagregação, a margem de erro real pode ser muito superior à margem de erro global de +/- 3,9% indicada na notícia.
Por exemplo, se no universo de 638 inquiridos da sondagem apenas 80 a 100 forem de Lisboa e 60 a 80 do Porto (números meramente indicativos, mas realistas, porque a sondagem ainda não se econtra disponível), a margem de erro para cada cidade poderia facilmente ultrapassar os 10% ou 12%, tornando os resultados estatisticamente irrelevantes para prever cenários eleitorais nestes concelhos. Esta falha é crítica e deveria ter sido explicitada no artigo.
➡ Conclusão: A notícia omite o problema da representatividade da amostra e não esclarece que a sondagem não é fiável para prever o comportamento eleitoral nos dois municípios.
Transparência e Omissões na Apresentação da Metodologia
A ficha técnica da sondagem, incluída na notícia, é insuficiente para garantir a transparência necessária para uma interpretação rigorosa dos resultados. Os problemas principais incluem: • Não há qualquer referência ao número de inquiridos por concelho, impedindo que se avalie a validade dos dados apresentados. • A margem de erro global (+/- 3,9%) não se aplica a Lisboa nem ao Porto, já que essa margem só seria válida para a totalidade da amostra nacional. • A forma de ponderação da amostra não é explicada, o que pode distorcer a comparação entre candidatos.
O princípio básico de qualquer sondagem é que os leitores possam compreender o quão fiáveis são os dados apresentados. Como estas informações são omitidas, o artigo induz o público em erro ao sugerir que Moedas e Pizarro lideram as corridas autárquicas com base numa amostra que não representa eleitoralmente esses municípios.
➡ Conclusão: A falta de desagregação e a omissão da margem de erro para cada concelho comprometem a transparência da notícia, tornando os resultados praticamente inutilizáveis como previsão eleitoral.
O Impacto da Interpretação Jornalística e a Construção da Narrativa
O modo como os dados são apresentados na notícia reforça percepções políticas específicas, sem que existam bases metodológicas sólidas para tal. O artigo dá como certo que Moedas e Pizarro estão à frente nas intenções de voto, sem mencionar que os dados não permitem essa conclusão.
Além disso, a escolha de frases como “Moedas ganha a Alexandra” e “Pizarro bate Pedro Duarte” induz o leitor a acreditar que há uma vantagem estatística clara, quando, na realidade, os dados apresentados podem estar dentro de uma margem de erro muito elevada, o que inviabiliza qualquer certeza sobre liderança.
O artigo ainda explora a narrativa temática das campanhas, destacando temas como segurança e imigração, o que pode reforçar um enquadramento favorável para determinados candidatos. Contudo, a relação entre esses temas e as intenções de voto não é demonstrada com dados concretos, tornando-se apenas um exercício de especulação editorial.
➡ Conclusão: A narrativa da notícia é construída de forma a sugerir certezas eleitorais que os dados não permitem sustentar, o que representa uma falha grave do ponto de vista jornalístico.
Considerações Finais
A análise global da notícia revela um conjunto de problemas que a tornam estatisticamente inválida e editorialmente enviesada. As falhas metodológicas são particularmente graves, pois transmitem ao leitor informações que não podem ser sustentadas pela sondagem realizada. As principais conclusões são:
✅ Omissão de dados fundamentais: A falta de desagregação por concelho e a não divulgação da margem de erro específica para Lisboa e Porto tornam a sondagem estatisticamente inútil para prever eleições autárquicas.
✅ Apresentação enganadora dos resultados: A forma como os dados são relatados sugere que existem líderes claros na corrida eleitoral, quando, na realidade, as intenções de voto podem estar dentro da margem de erro ou sequer serem representativas da realidade local.
✅ Narrativa editorial sem suporte estatístico: A tentativa de associar determinados candidatos a temas específicos, como segurança ou imigração, não é sustentada por dados concretos, reforçando um enquadramento tendencioso.
🔴 Conclusão Final: A notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica não cumpre os requisitos mínimos de rigor estatístico e jornalístico. Deveria, no mínimo, alertar para as limitações da sondagem e fornecer transparência sobre os riscos de extrapolação de dados de uma amostra nacional para eleições locais. Sem estas correções, o artigo induz os leitores em erro e compromete a fiabilidade da informação.